Processo nº 0001552-75.2025.8.13.0522
ID: 277719201
Tribunal: TJMG
Órgão: Vara Única da Comarca de Porteirinha
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO
Nº Processo: 0001552-75.2025.8.13.0522
Data de Disponibilização:
23/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LIVIA DANIELLE DE ANDRADE
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Porteirinha / Vara Única da Comarca de Porteirinha Rua Doutor Ailson Mendes Brito Binha, 365, Fórum Tiradentes, Ren…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Porteirinha / Vara Única da Comarca de Porteirinha Rua Doutor Ailson Mendes Brito Binha, 365, Fórum Tiradentes, Renascença, Porteirinha - MG - CEP: 39520-000 PROCESSO Nº: 0001552-75.2025.8.13.0522 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO SUMÁRIO (10943) ASSUNTO: [Extorsão] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: LUIS HENRIQUE LOPES CPF: não informado SENTENÇA 1. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS ofereceu denúncia em face de LUIS HENRIQUE LOPES, qualificado em ID 10400034119 - Pág. 1, sob a acusação de ter o réu violado o comando normativo proibitivo dos tipos penais previstos no art. 158, caput, e no art. 163, parágrafo único, inciso II, ambos do Código Penal, em concurso material. Narra a denúncia, em síntese, que em 12 de fevereiro de 2025, por volta das 19h16min, na Rua São Bernardo do Campo, s/n., Centro de Pai Pedro-MG, o denunciado, prevalecendo-se da relação doméstica com sua avó , teria a constrangido mediante grave ameaça para obter indevida vantagem econômica, exigindo dinheiro sob ameaça de agressão. Diante da negativa da vítima, que já havia lhe entregado dinheiro naquele dia, o denunciado teria ateado fogo à cortina da residência com substância inflamável, colocando em risco a vida e o patrimônio da ofendida. Temendo por sua integridade física, Etelvina simulou que buscaria dinheiro emprestado com uma vizinha e aproveitou para pedir socorro. A Polícia Militar foi acionada e, ao chegar ao local, encontrou o fogo já controlado e efetuou a prisão em flagrante do denunciado. Por tais fatos, o parquet pediu a condenação do réu nas penas do tipo penal previsto no art. 158, caput, e no art. 163, parágrafo único, inciso II, ambos do Código Penal, em concurso material. Com a denúncia vieram: Auto de Prisão em Flagrante delito em IDs 10403706006 - Pág. 1/8 e 10403706007 - Pág. 1/8; Boletim de Ocorrência em IDs 10403706007 - Pág. 9, 10403706008 - Pág. 1/6 e 10403706009 - Pág. 1; Termo de Representação em ID 10403706011 - Pág. 1; Certidão de Antecedentes Criminais de Porteirinha de LUIS HENRIQUE LOPES em ID 10403706012 - Pág. 5/6. A denúncia foi recebida em 08 de março de 2025 (ID 10406254655). Citado (ID 10411403215), o denunciado informou não ter condições financeiras de contratar advogado, motivo pelo qual lhe foi nomeado defensora dativa (ID 10413040456), a qual ofereceu resposta à acusação em ID 10418751956. Na audiência de instrução e julgamento realizada em 22 de abril de 2025 (ID 10435832119), foram ouvidos a vítima e a testemunha Adison Carvalho dos Santos Filho (Policial Militar). Ao final, foi determinada a condução coercitiva da testemunha Vitor Emanuel Lopes. Audiência em continuação realizada em 05 de maio de 2025 (ID 10443452955), oportunidade em que foi ouvido o informante Vitor Emanuel Lopes e, ao final, foi realizado o interrogatório do réu. Em alegações finais constantes do ID 10444707962, o Ministério Público requereu a procedência da pretensão acusatória, nos exatos termos da denúncia, com a condenação do réu pela prática dos crimes tipificados no art. 158, caput, e no art. 163, parágrafo único, inciso II, ambos do Código Penal. Requereu, ainda, a condenação do réu ao pagamento de R$ 1.518,00 (mil quinhentos e dezoito reais), a título de indenização pelos danos morais e materiais causados à vítima. Por sua vez, em sede de alegações finais (ID 10450911672), a defesa pleiteou a absolvição do acusado, com base no art. 386, III e VII, do CPP, por atipicidade ou ausência de provas quanto ao dolo; a desclassificação da imputação do art. 158, caput, e art. 163, parágrafo único, inciso II, ambos do Código Penal, para o crime de ameaça (art. 147 do CP) e dano simples (art. 163, caput, CP); o reconhecimento da semi-imputabilidade do réu, nos termos do art. 26, parágrafo único, do Código Penal; fixação de pena mínima e afastamento da condenação por danos morais. É O RELATÓRIO. DECIDO. 2. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação penal oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, na qual se imputa ao réu LUIS HENRIQUE LOPES os delitos tipificados no art. 158, caput, e no art. 163, parágrafo único, inciso II, ambos do Código Penal, em concurso material. Não se implementou qualquer prazo prescricional. Diante da inexistência de questões preliminares ou prejudiciais a serem enfrentadas, passo ao mérito do processo. I) DO CRIME PREVISTO NO ART. 158, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL 2.1 Materialidade O art. 158, caput, do Código Penal descreve a conduta típica de "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa". Cabe, portanto, analisar se as provas produzidas demonstram a efetiva subsunção da conduta imputada ao denunciado ao tipo ora abordado. Em análise do caso concreto, com efeito, a materialidade do delito restou comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante delito em IDs 10403706006 - Pág. 1/8 e 10403706007 - Pág. 1/8; pelo Boletim de Ocorrência em IDs 10403706007 - Pág. 9, 10403706008 - Pág. 1/6 e 10403706009 - Pág. 1 e pelos demais elementos trazidos aos autos. 2.2 Autoria A autoria, da mesma forma, é inequívoca. Em juízo, o réu LUIS HENRIQUE LOPES confessou a autoria do crime, relatando que cometeu o delito: “que tinha pedido dinheiro a avó mais cedo para jogar sinuca; que a vítima lhe deu o dinheiro e o réu tinha jogado; que depois o réu pediu dinheiro para ir para a feirinha que tem lá quarta-feira à noite; que como a vítima não lhe deu o dinheiro, botou fogo na cortina e não bateu nela; que abriu a porta, a vítima saiu e o declarante foi lá e apagou o fogo depois para não pegar na casa inteira; que botou fogo porque queria o dinheiro [...]” Em juízo, a vítima relatou que o réu chegou à sua residência já no período noturno, quando já estava escurecendo, e lhe pediu a quantia de trinta reais. Informou que já havia entregado dinheiro ao réu anteriormente naquele mesmo dia e que, diante da negativa em lhe dar mais, o réu ameaçou colocar fogo na casa, dizendo que a queimaria junto com suas roupas, caso não fosse atendido. Declarou que, ao sair do local, o réu ateou fogo em uma cortina, mas que as chamas não chegaram a atingir a estrutura da casa. Afirmou ainda que é aposentada, possui apenas um salário mínimo, tem setenta e cinco anos e que não suporta mais essa situação, pois está muito assustada e deseja apenas ter paz. Acrescentou que o réu frequentemente exigia dinheiro, dizendo que queria receber mensalmente, e que, embora não tenha sido agredida fisicamente, não podia se manifestar por medo. Por fim, esclareceu que, no momento dos fatos, estavam apenas ela e o réu na residência. O informante Vitor Emanuel Lopes, em suas declarações em juízo, corroborou os fatos narrados pela vítima e réu: “que é irmão do Luis Henrique; que chegou em casa e a porta estava trancada; que viu a avó chorando do lado de fora e ela falou ao declarante que o réu tinha colocado fogo nas cortinas e queria agredir ela; que quando chegou já tinha acontecido tudo; que a avó contou que Luis ameaçou ela e botou fogo na cortina; que quando chegou a avó estava muito assustada; que quase pegou fogo no telhado, mas não chegou a pegar; que já tem muitas vezes que aconteceu isso do réu constranger a vítima para dar dinheiro a ele; que o réu pede dinheiro para jogar; que o réu não usa drogas; [...]” A autoria do crime encontra-se suficientemente comprovada nos autos, diante da conjugação entre a confissão do réu e os testemunhos colhidos em juízo, os quais são consistentes, convergentes e reforçados por elementos objetivos da realidade fática. A vítima , avó do réu, relatou que esse chegou em sua casa ao anoitecer, exigindo-lhe a quantia de trinta reais, sob ameaça de incendiar a residência e causar dano à sua integridade física e aos seus pertences, caso não fosse atendido. A negativa em entregar o dinheiro culminou com a efetivação da ameaça: o réu ateou fogo à cortina da casa, gerando grande abalo emocional na ofendida e risco concreto ao imóvel, conforme ela própria relatou e como foi constatado pelas testemunhas. O policial militar Adilson Carvalho confirmou ter atendido a ocorrência e constatado que o réu realmente havia iniciado um incêndio na cortina da residência. A vítima, ao ser socorrida, relatou que já havia entregue dinheiro anteriormente ao neto por força de outras ameaças, e que, mais uma vez, foi constrangida a entregar valores. O policial ainda destacou o estado emocional abalado da idosa e o histórico de coações por parte do réu, fatos também confirmados pelo irmão do acusado, Vitor Emanuel, que afirmou ter presenciado situações semelhantes e relatou que a avó estava do lado de fora da casa chorando, afirmando ter sido ameaçada e constrangida novamente. O próprio réu, em interrogatório, confessou que, após pedir dinheiro e ser negado, ateou fogo na cortina da residência de sua avó com o objetivo de obter o valor desejado, o que caracteriza, por sua própria narrativa, o dolo específico exigido para a configuração do crime de extorsão. Portanto, a autoria resta cabalmente demonstrada, sendo o réu identificado como o agente ativo da conduta criminosa, com provas robustas e harmônicas entre si. 2.3 Tipicidade A conduta do réu amolda-se perfeitamente ao tipo penal descrito no art. 158 do Código Penal, que define o crime de extorsão como: "Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa." No caso em análise, a grave ameaça foi concretamente exercida quando o réu afirmou à vítima que colocaria fogo na casa e a queimaria, caso não lhe fosse entregue determinada quantia em dinheiro. Essa ameaça foi efetivada, ainda que parcialmente, com o incêndio da cortina, conduta que demonstra a seriedade e a efetividade do constrangimento ilegal. A vantagem econômica pretendida — trinta reais — tinha natureza indevida, uma vez que o réu não possuía qualquer direito sobre tal quantia, e a exigência se dava unicamente por interesse pessoal, conforme confessado por ele em interrogatório. A vítima, idosa, aposentada e emocionalmente abalada, encontrava-se em posição de evidente vulnerabilidade diante do poder de intimidação do réu, seu neto, que inclusive já havia, segundo testemunhas, praticado atos semelhantes anteriormente. Dessa forma, encontram-se presentes os seguintes elementos que compõem a figura típica da extorsão: (i) a prática de constrangimento mediante grave ameaça, (ii) a finalidade de obtenção de vantagem econômica indevida e (iii) o nexo entre a ameaça e o comportamento que se queria impor à vítima (entrega do dinheiro). No entanto, das circunstâncias fáticas apuradas, verifica-se a ausência do comportamento pretendida pelo acusado por parte da vítima, o que revela a incompletude objetiva do tipo penal em razão de um excesso subjetivo por parte do agente. Trata-se, portanto, de tipo incongruente por excesso subjetivo, situação em que o dolo do agente ultrapassa o que se verifica no mundo dos fatos. Assim, configura-se a tentativa, impondo-se o reconhecimento de nova definição jurídica para o fato imputado ao réu. A desclassificação da extorsão consumada para a forma tentada é juridicamente viável com base no art. 383, caput, do Código de Processo Penal, que consagra a emendatio libelli. Esse dispositivo permite ao juiz, ao proferir a sentença, dar ao fato definição jurídica diversa da constante na denúncia, desde que não modifique a descrição fática da inicial acusatória, preservando o princípio da congruência. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 297.551-MG (6ª Turma, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 5/3/2015), firmou o entendimento de que o réu denunciado por crime na forma consumada pode ser condenado na forma tentada sem necessidade de aditamento da denúncia, pois a tentativa não constitui um delito autônomo, mas uma manifestação do mesmo crime, diferenciada apenas pela não consumação devido a circunstâncias alheias à vontade do agente. A identidade de elementos objetivos (constrangimento mediante violência ou grave ameaça) e subjetivos (dolo de obter vantagem indevida) entre a tentativa e a consumação assegura que a desclassificação não viola o contraditório ou a ampla defesa. O crime de extorsão se classifica como um delito formal, de consumação antecipada, cuja configuração não exige a obtenção da vantagem econômica indevida, conforme consolidado no enunciado 96 da súmula do Superior Tribunal de Justiça: “O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida.” A consumação ocorre no momento em que a vítima, constrangida pela violência ou grave ameaça, realiza o comportamento exigido pelo agente, seja por meio de uma conduta comissiva (fazer algo), omissiva (deixar de fazer algo) ou de tolerância (permitir que algo seja feito). O elemento subjetivo do tipo, expresso pela locução “com o intuito de”, denota o dolo específico de obter uma vantagem econômica indevida, sendo irrelevante, para a consumação, que tal vantagem se concretize. Caso a vantagem seja obtida, configura-se o exaurimento do delito. A extorsão é, em regra, um crime plurissubsistente, pois sua execução pode ser fracionada em múltiplos atos, como a prolação da ameaça, a pressão física ou psicológica sobre a vítima e a tentativa de obtenção da vantagem. Essa característica permite a interrupção do iter criminis por circunstâncias alheias à vontade do agente, configurando a tentativa, nos termos do art. 14, inciso II, do Código Penal. A possibilidade de tentativa no crime de extorsão é reconhecida pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.094.888-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 21/8/2012), que destaca que a tentativa se verifica quando o agente, após empregar violência ou grave ameaça com o intento de obter a vantagem indevida, não logra êxito em compelir a vítima a realizar o comportamento exigido, por fatores externos à sua vontade. Segundo a doutrina (por todos: MASSON, Cleber. Direito penal: parte especial (arts. 121 a 212). 18. ed., rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Método, 2025, p. 435), o iter criminis da extorsão pode ser esquematizado em três estágios: Tentativa: O agente constrange a vítima mediante violência ou grave ameaça, com o objetivo de obter indevida vantagem econômica, mas a vítima não realiza o comportamento exigido, por circunstâncias alheias à vontade do agente. Consumação: A vítima, constrangida, realiza o comportamento exigido (fazer, tolerar ou deixar de fazer algo), independentemente de o agente obter a vantagem econômica. Exaurimento: O agente obtém a vantagem econômica indevida, que não é necessária para a consumação, mas pode agravar a lesividade da conduta na dosimetria. No caso concreto, a denúncia imputou ao réu Luis Henrique Lopes a prática de extorsão consumada, narrando que, o réu, prevalecendo-se da relação doméstica com sua avó, , a constrangeu mediante grave ameaça, exigindo a quantia de trinta reais sob a ameaça de agredi-la e incendiar a residência. Diante da negativa da vítima, que já havia lhe entregado dinheiro naquele dia, o réu ateou fogo à cortina da casa com substância inflamável, gerando risco ao patrimônio e intenso abalo emocional à ofendida. Temendo por sua integridade física, Etelvina simulou que buscaria dinheiro com uma vizinha, aproveitando a oportunidade para pedir socorro, o que culminou na intervenção da Polícia Militar e na prisão em flagrante do réu. A configuração da extorsão consumada, conforme mencionado, exige que a vítima, constrangida pela violência ou grave ameaça, realize o comportamento exigido pelo agente. No presente caso, a vítima não realizou o comportamento exigido pelo réu, qual seja, a entrega da quantia de trinta reais. Pelo contrário, a vítima resistiu à pressão, simulando que buscaria dinheiro com uma vizinha para, na verdade, pedir socorro, o que resultou na intervenção da Polícia Militar e na interrupção da conduta criminosa. Esse desfecho demonstra que a consumação do delito não se perfectibilizou, pois a vítima não se submeteu à vontade do réu, frustrando o resultado pretendido por circunstâncias alheias à sua vontade, como a resistência da vítima e a pronta atuação policial. O réu praticou atos executórios idôneos e inequívocos, iniciando a execução do crime por meio da ameaça verbal e da concretização parcial dessa ameaça com o incêndio da cortina. Tais atos foram aptos a gerar intenso constrangimento psicológico na vítima. Contudo, a ausência de submissão da vítima ao comportamento exigido (entrega do dinheiro) impede a caracterização da consumação, configurando a tentativa, nos termos do art. 14, inciso II, do Código Penal. A jurisprudência do STJ (REsp 1.094.888-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 21/8/2012) é clara ao afirmar que o crime de extorsão não se consuma quando a vítima, embora ameaçada, não se submete à vontade do agente. No caso em tela, a resistência da vítima, aliada à intervenção policial, constitui circunstância alheia à vontade do réu que frustrou a consumação, caracterizando a extorsão na forma tentada. Isso posto, com fundamento no art. 383, caput, do Código de Processo Penal, desclassifico a conduta imputada ao réu Luis Henrique Lopes do crime de extorsão consumada (art. 158, caput, do CP) para o crime de extorsão tentada (art. 158, caput, c/c art. 14, inciso II, do CP). 2.4 Absorção do crime de dano qualificado pelo crime de extorsão em razão da subsidiariedade expressa No caso em análise, o réu, ao exigir de sua avó determinada quantia em dinheiro, empregou grave ameaça consistente na intenção de atear fogo na residência, tendo inclusive iniciado um incêndio ao pôr fogo em uma cortina, o que gerou temor real à vítima e risco à integridade do imóvel. Tal conduta, embora se amolde formalmente ao tipo penal de dano qualificado por emprego de substância inflamável (art. 163, parágrafo único, II, do Código Penal), resta absorvida pelo delito mais grave de extorsão (art. 158 do CP). A absorção se impõe por força do próprio texto legal. O inciso II do parágrafo único do art. 163 do Código Penal contém uma cláusula de subsidiariedade expressa, ao dispor que o delito de dano qualificado "não se aplica se o fato constituir crime mais grave". Trata-se, portanto, de hipótese em que o legislador já antecipa a aplicação do princípio da consunção entre delitos quando um deles se apresenta como meio necessário ou etapa de realização de outro mais abrangente e gravoso. É exatamente o que ocorre na presente hipótese. O incêndio da cortina — conduta típica do crime de dano qualificado — não foi um fim em si mesmo, tampouco teve autonomia delitiva. Foi instrumento de execução da grave ameaça empregada pelo réu para constranger a vítima à entrega de indevida vantagem econômica, elemento essencial para a configuração da extorsão. Assim, o comportamento lesivo ao patrimônio da vítima integra o contexto intimidatório necessário à prática do crime previsto no art. 158 do CP, não havendo falar em autonomia típica do delito de dano. Em situações em que o dano é meio executório ou elemento da ameaça utilizada para consumar o crime de extorsão, ele se subsume ao tipo penal mais grave, por força da regra da subsidiariedade expressa. Portanto, reconhece-se que o delito de dano qualificado praticado mediante fogo (art. 163, parágrafo único, II, do CP) resta absorvido pela extorsão, nos termos da cláusula de subsidiariedade expressa contida no próprio dispositivo legal e com fundamento no princípio da consunção, aplicável à espécie. 2.5 Atenuantes e Agravantes No tocante à dosimetria da pena, requer-se o reconhecimento das circunstâncias agravantes previstas no art. 61 do Código Penal, considerando que restou demonstrado nos autos que o réu: I) Empregou fogo na execução do delito, o que caracteriza meio insidioso ou cruel (art. 61, II, d, do CP); II) Cometeu o crime contra ascendente, sua própria avó, circunstância que agrava a reprovabilidade da conduta (art. 61, II, e, do CP); III) A vítima era pessoa maior de 60 anos, o que também configura agravante específica (art. 61, II, h, do CP); IV) Aproveitou-se de relações domésticas e de coabitação familiar, valendo-se da proximidade e confiança decorrente dessas relações para a prática do delito (art. 61, II, f, do CP). Tais circunstâncias, devidamente comprovadas, devem ser reconhecidas como agravantes genéricas, influenciando na segunda fase da dosimetria da pena. Por outro lado, também devem ser reconhecidas as circunstâncias atenuantes em favor do réu, nos termos do art. 65 do Código Penal: I) A confissão espontânea, ainda que parcial, demonstra colaboração com a instrução processual e revela traços de arrependimento (art. 65, III, d, do CP); II) O réu era menor de 21 anos à época dos fatos, possuindo apenas 19 anos, o que autoriza o reconhecimento da menoridade relativa como atenuante (art. 65, I, do CP). Conforme disposto no art. 67 do Código Penal, quando houver concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes, a pena deve ser fixada com preponderância das circunstâncias relevantes, conforme o caso concreto. Todavia, quando essas circunstâncias forem de igual valor jurídico e fático, admite-se a compensação entre elas, a fim de se alcançar uma dosimetria justa e proporcional. No presente caso, verifica-se o concurso entre quatro agravantes (emprego de fogo, crime contra ascendente, contra pessoa maior de 60 anos e prevalência de relações domésticas de coabitação) e duas atenuantes (confissão espontânea e menoridade relativa). Dessa forma, realizo a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante referente à prática do crime contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos, em consonância com o entendimento consolidado do Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, conforme se verifica na Apelação Criminal n.º 1.0000.22.197037-9/001. Da mesma maneira, promovo a compensação entre a atenuante da menoridade relativa (art. 65, I, do CP) e a agravante prevista no art. 61, II, “f”, do Código Penal, referente à prevalência de relações domésticas e de coabitação familiar, em conformidade com o julgado do TJMG na Apelação Criminal n.º 1.0056.15.022689-4/001. Restando duas circunstâncias agravantes (Emprego de fogo na execução do delito e crime contra ascendente), essas serão utilizadas para justificar um aumento moderado da pena no patamar de 1/3 (1/6+1/6). 2.6 Minorantes e Majorantes Não se verifica, no caso, a incidência de causas de aumento de pena. Por outro lado, a desclassificação da conduta do réu para extorsão tentada implica a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 14, inciso II, do CP, com redução de um terço a dois terços, conforme o grau de execução e a proximidade da consumação. A fixação da fração exige análise do iter criminis. O critério decisivo é a maior ou menor proximidade da consumação, é dizer, a distância percorrida do iter criminis. Para o Supremo Tribunal Federal (STF: HC 118.203/MT, rel. Min. Gilmar Mendes, 2.ª Turma, j. 15.10.2013. No STJ: “A aferição do quantum de redução da pena pela tentativa deve considerar o iter criminis percorrido.” (AgRg no REsp 1.862.078/PR, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, 5.ª Turma, j. 23.06.2020)): “A quantificação da causa de diminuição de pena relativa à tentativa (art. 14, II, CP) há de ser realizada conforme o iter criminis percorrido pelo agente: a redução será inversamente proporcional à maior proximidade do resultado almejado. No caso concreto, o réu executou atos idôneos e inequívocos voltados à consumação, incluindo a ameaça verbal (“queimaria a vítima e suas roupas”) e a ação concreta de incendiar a cortina, que gerou risco real ao patrimônio e à integridade física da vítima. Esses atos demonstram que o réu percorreu quase integralmente o caminho necessário para a consumação, sendo a execução interrompida apenas pela resistência da vítima, que, temendo por sua segurança, simulou buscar dinheiro com uma vizinha para pedir socorro, e pela pronta intervenção da Polícia Militar. A proximidade da consumação é evidente. O acusado avançou consideravelmente na execução, concretizando a ameaça com o ato de incendiar a cortina, o que intensificou o constrangimento e gerou risco concreto, ainda que o fogo tenha sido controlado antes de causar danos maiores. A interrupção da conduta, decorrente da resistência da vítima e da intervenção policial, ocorreu em estágio avançado, justificando a aplicação da redução mínima de um terço, pois o réu esteve muito próximo de alcançar a consumação, faltando apenas a submissão da vítima à sua exigência. 2.7 Teses defensivas 2.7.1 Desclassificação do crime de extorsão para o de ameaça A defesa requereu a desclassificação da imputação penal, pleiteando o enquadramento da conduta do acusado no crime de ameaça (art. 147 do Código Penal), em detrimento da tipificação originalmente atribuída de extorsão (art. 158 do CP). No entanto, tal pretensão não merece acolhimento. O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida, bastando para sua configuração a prática do ato de constranger a vítima mediante violência ou grave ameaça, com o objetivo de obter vantagem econômica (verbete 96 da Súmula do STJ: "O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida"). A consumação, portanto, ocorre com o comportamento (mediante vontade viciada) da vítima (conduta comissiva, omissiva ou de tolerância), ainda que a vantagem econômica pretendida não se concretize. O dolo específico do tipo penal (obtenção de vantagem indevida) resta configurado pela finalidade manifesta do agente, e não pela efetiva obtenção do resultado. No presente caso, ficou demonstrado que o réu utilizou grave ameaça contra a vítima com o intuito de obter proveito econômico, o que afasta a possibilidade de simples reclassificação para o delito de ameaça, que possui natureza distinta e menor gravidade, além de não exigir finalidade patrimonial. Dessa forma, não há que se falar em desclassificação, sendo mantida a capitulação legal do delito como extorsão tentada (art. 158, caput, c/c art. 14, inciso II, do CP), em respeito aos elementos objetivos e subjetivos do tipo penal verificados nos autos. 2.7.2 Reconhecimento da semi-imputabilidade do réu, nos termos do art. 26, parágrafo único, do Código Penal A defesa técnica pleiteia o reconhecimento da semi-imputabilidade do réu, com base no art. 26, parágrafo único, do Código Penal, sob o argumento de que esse, à época dos fatos, apresentaria perturbação de saúde mental que diminuiria sua capacidade de autodeterminação. Contudo, tal pleito não encontra respaldo nos autos. O reconhecimento da semi-imputabilidade exige prova técnica idônea, notadamente por meio de laudo pericial elaborado por profissionais especializados (perícia psiquiátrica ou psicológica oficial), conforme entendimento consolidado nos tribunais superiores. Trata-se de matéria que demanda conhecimento técnico-científico, não podendo ser presumida ou baseada unicamente em alegações genéricas da defesa. No caso em análise, não há qualquer laudo médico ou pericial que ateste a existência de transtorno mental ou qualquer patologia psíquica que, ao menos em grau moderado, tenha comprometido a capacidade de compreensão ou autodeterminação do réu no momento da prática delituosa. Ao contrário, o interrogatório judicial demonstra que o acusado manteve coerência, linearidade e discernimento ao relatar os fatos. O réu confessou de forma clara e lógica a prática dos atos criminosos, demonstrando plena consciência sobre suas ações e seus desdobramentos, o que afasta qualquer dúvida quanto à sua capacidade de entendimento e de autodeterminação. A ausência de qualquer indicativo de desorganização mental, aliado ao relato detalhado e racional do réu em juízo, reforça a plena imputabilidade penal, tornando incabível o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 26, parágrafo único, do Código Penal. Dessa forma, indefiro o pedido de reconhecimento da semi-imputabilidade, por ausência de prova técnica e por não restarem evidenciados, no processo, elementos mínimos que indiquem a redução da capacidade penal do acusado. 2.8 Da ausência de excludentes de ilicitude ou dirimentes da culpabilidade Desse modo, as provas produzidas em juízo corroboram aquelas obtidas na fase inquisitorial, apresentando-se harmônicas, coesas e suficientes para fundamentar a prolação de um decreto condenatório. As condutas do réu configuram-se como típicas, enquadrando-se perfeitamente nas descrições legais aplicáveis. Inexistindo qualquer causa de exclusão da ilicitude, seja legal (art. 23 do Código Penal) ou supralegal, conclui-se pela ilicitude do fato. O réu é plenamente imputável e, diante das circunstâncias, era-lhe exigível conduta diversa. Ademais, possuía consciência potencial da ilicitude de suas ações, o que evidencia sua culpabilidade. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, e considerando o mais que dos autos consta, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal, para, com fundamento no art. 383, caput, do Código de Processo Penal, proceder à emendatio libelli e, por consequência, condenar o réu LUIS HENRIQUE LOPES como incurso nas sanções do art. 158, caput, c/c o art. 14, inciso II, c/c o art. 61, inciso II, alíneas “d”, “e”, “f” e “h”, e art. 65, incisos I e III, alínea “d”, todos do Código Penal. Absolvo-o, por outro lado, da imputação relativa ao crime previsto no art. 163, parágrafo único, inciso II, do Código Penal, nos termos do art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal. - DOSIMETRIA DA PENA - De início, cabe consignar que, no tocante à primeira fase da dosimetria da pena, este juízo adota a fração de 1/8 sobre o intervalo entre a pena máxima e a pena mínima em abstrato, como parâmetro de valoração das circunstâncias judiciais. O quantum de aumento da pena-base deve observar a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que admite a utilização das frações de 1/6 sobre a pena mínima ou de 1/8 sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima. A aplicação de percentual diverso exige fundamentação concreta e objetiva. Nesse sentido, destaca-se o seguinte precedente: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE FURTO. COMPROVAÇÃO DA AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO. PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO. REVISÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7 DO STJ. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. UTILIZAÇÃO DA FRAÇÃO DE 1/8 SOBRE O INTERVALO ENTRE AS PENAS MÍNIMA E MÁXIMA. ACÓRDÃO EM CONSONÂNCIA COM A ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SÚMULA N. 83 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. [...] 2. Para a elevação da pena-base, podem ser utilizadas as frações de 1/6 sobre a pena mínima ou de 1/8 sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima, sendo indispensável a fundamentação concreta e objetiva para a adoção de percentual distinto. Incidência da Súmula n. 83 do STJ. 3. Mantém-se a decisão agravada, cujos fundamentos estão em conformidade com o entendimento do STJ. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no AREsp n. 1.942.233/DF, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 24/5/2022, DJe de 26/5/2022). (Destacou-se). O critério adotado por este juízo permite aferir, com exatidão e proporcionalidade, a valoração de cada circunstância judicial. Isso porque não se estabelece um valor fixo ou pré-determinado, o que seria inadmissível e poderia, inclusive, conduzir a injustiças. Conforme esse método, o patamar de valoração de cada circunstância judicial varia de acordo com o intervalo da pena abstratamente cominada: quanto maior o intervalo, maior o acréscimo; quanto menor o intervalo, menor o acréscimo. A adoção desse critério possibilita a mensuração proporcional e precisa de cada circunstância judicial. Ressalte-se, contudo, que não se trata de um critério absoluto, sendo possível, excepcionalmente, e desde que maneira fundamentada, sua aplicação de forma diferenciada, para mais ou para menos, conforme as particularidades do caso concreto. i) Primeira Fase: a) culpabilidade: essa entendida como o grau de reprovabilidade da conduta no contexto em que foi cometido o delito é normal à espécie, nada tendo a se valorar que extrapole os limites da responsabilidade criminal do condenado; b) antecedentes: o sentenciado não revela possuir maus antecedentes criminais conforme CAC de ID 10403706012 - Pág. 5/6; c) conduta social: não há elementos nos autos que permitam valorar a conduta social do condenado, razão pela qual deixo de valorá-la; d) personalidade: não há elementos nos autos que permitam aferir sua personalidade, razão pela qual deixo de valorar tal circunstância; e) motivo: é o comum à espécie relativo aos crimes desta natureza, assim, deixo de valorá-lo; f) circunstâncias: são as inerentes ao tipo; g) consequências do crime: as consequências do crime são normais à espécie, nada tendo a se valorar que extrapole os limites previstos pelo próprio tipo; h) comportamento da vítima: a vítima em nenhum momento contribuiu para a prática do delito, razão pela qual nada se tem a valorar. Desta forma, considerando as circunstâncias judiciais acima apreciadas, deve a pena-base ser fixada no mínimo legal, ou seja, em 04 (quatro) anos de reclusão e 10 dias-multa. ii) 2ª Fase: Conforme exposto na fundamentação do tópico 2.5, foram reconhecidas quatro circunstâncias agravantes e duas atenuantes. Procedeu-se à compensação entre duas agravantes e duas atenuantes, nos termos da jurisprudência consolidada, restando, portanto, duas agravantes não compensadas. Diante disso, justifica-se o recrudescimento da pena em 1/3, resultante da soma de dois aumentos parciais de 1/6 cada, em razão das agravantes remanescentes. Com esse acréscimo, chega-se à pena intermediária de 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 87 dias-multa. iii) 3ª Fase: Ausente causa de aumento de pena. Contudo, reconhece-se a incidência da causa de diminuição prevista para o crime tentado, nos termos do art. 14, inciso II, do Código Penal, cuja fração, conforme fundamentação supra, fixo em 1/3 (um terço). Assim, estabeleço a pena definitiva em 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, além de 58 (cinquenta e oito) dias-multa. Com base no art. 60 do Código Penal, fixo o valor da multa em 1/30 do valor do salário-mínimo vigente na data do fato, devendo aquele ser atualizado pelo índice oficial de correção até seu efetivo pagamento. Regime inicial do cumprimento da pena e a análise da incidência do art. 387, § 2º, do CPP Tendo em vista que a detração prevista no art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal, não alterará a fixação do regime inicial de pena do acusado, deixo de analisá-la no presente momento, reservando a sua ponderação na execução da pena. Com fundamento no artigo 33, § 2º, alínea 'c', do Código Penal, o condenado deverá iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade, fixada em caráter definitivo, no regime aberto, mediante o cumprimento das seguintes condições: I – permanecer em sua residência durante o repouso noturno, a partir das 22h até às 06h, e nos dias de folga e feriados, somente podendo se ausentar para ir ao trabalho; II – não se ausentar da cidade de sua residência por prazo superior a 08 dias sem autorização do Juízo; III – comparecer bimestralmente em Juízo para informar e justificar suas atividades; IV – comprovação de exercício de emprego lícito, no prazo de 30 dias, ou de frequência a curso de capacitação profissional ou de instrução acadêmica, com carga horária mínima de 02 (duas) horas por semana e com aproveitamento de pelo menos 80% (oitenta por cento) a ser comprovado mediante declaração da instituição responsável; V - não trazer consigo armas ofensivas ou instrumentos capazes de ofender; VI – não frequentar bares, boates, prostíbulos e outros estabelecimentos similares. Análise da aplicabilidade dos art. 44 e 77 (suspensão condicional da pena), ambos do Código Penal Incabível, por sua vez, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou por multa, uma vez que o crime doloso cometido pelo condenado foi praticado com o emprego de grave ameaça à pessoa, circunstância que veda a concessão do referido benefício, nos termos do art. 44, inciso I, do Código Penal. Inviável, da mesma forma, a suspensão condicional da pena, nos termos do artigo 77, caput, do CP, por se tratar de pena privativa de liberdade fixada em patamar superior a 2 (dois) anos. Prisão cautelar Considerando as circunstâncias do caso concreto, reconheço que não se encontram presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Embora o réu tenha sido condenado, não há elementos concretos nos autos que justifiquem a necessidade de sua segregação cautelar durante o trâmite recursal. Ressalte-se que o acusado é primário, não possui antecedentes criminais e não há indícios de que represente risco à ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal. Ademais, não há nos autos qualquer demonstração de que o réu seja pessoa voltada à prática delitiva ou que tenha agido com extrema periculosidade, tratando-se de situação em que o direito de recorrer em liberdade se apresenta como medida proporcional e razoável, em consonância com os princípios constitucionais da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF) e da necessidade da prisão cautelar como medida excepcional. Assim sendo, concedo ao réu o direito de apelar em liberdade, sem prejuízo da possibilidade de decretação de prisão preventiva em momento posterior, caso surjam novos elementos que demonstrem sua imprescindibilidade, nos termos da legislação vigente. Expeça-se alvará de soltura, salvo se por outro motivo estiver preso, cientificando-a que as medidas protetivas deferidas nos autos 5000311-78.2025.8.13.0522, ID 10391497031, de afastamento da residência da vítima Etelvina e proibição de aproximação e contato com ela encontram-se em vigor, advertindo-o que o não cumprimento das medidas poderá implicar na sua prisão preventiva. Valor mínimo de indenização Quanto ao pedido de fixação de indenização mínimo pelo Ministério Público, é de rigor a sua aplicação. Primeiramente, cabe destacar que, com o advento da Lei n. 11.719/08, passa a ser possível que, na própria sentença condenatória, ocorra a fixação de valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pela ofendida. Outrossim, ressalto que o dano moral está configurado como consequência da ilicitude do ato praticado pelo acusado, capaz de gerar abalo emocional, constrangimento e desgaste, extrapolando o mero aborrecimento cotidiano. Nesse sentido o seguinte precedente do STF: “O crime praticado contra a mulher no âmbito doméstico e familiar resulta em dano moral in re ipsa, ou seja, independe de instrução probatória específica para a sua apuração, uma vez que a simples comprovação da prática da conduta delitiva é suficiente para demonstrá-lo, ainda que minimamente.” (STF. 2ª Turma. ARE 1.369.282 AgR/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 19/09/2023). Esse é também o entendimento do STJ: “Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória.” (STJ. 3ª Seção. REsp 1643051-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 28/02/2018 (Recurso Repetitivo – Tema 983)). Se isso não fosse o suficiente, também denoto a constatação do dano extrapatrimonial através dos depoimentos colhidos e das provas documentais acostadas nos autos. Quanto à finalidade da punição, o objetivo é o de fazer com que o acusado repare o dano causado com parte de seu patrimônio. Por fim, a função de prevenção serve de desestimulação, seja quanto ao ofensor, ou até mesmo por parte de terceiros, para que se abstenham da prática de tal conduta. Cumpre destacar, que em relação ao potencial econômico, compulsando os autos, verifico que a ré declarou que exercia trabalho lícito. Nesse prisma, nos moldes do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, fixo em favor da vítima , o valor mínimo, a título de dano moral, de R$1.518,00 (mil quinhentos e dezoito reais). DAS PROVIDÊNCIAS FINAIS: Na forma do art. 804 do Código de Processo Penal, condeno o réu ao pagamento das custas processuais. Intime-se o Ministério Público e o réu, pessoalmente, e por seu advogado, mediante publicação no órgão oficial. Comunique-se à vítima, preferencialmente por meio eletrônico, a respeito da prolação da presente sentença, na forma do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Oportunamente, após o trânsito em julgado desta decisão, tomem-se as seguintes providências: 1. Expeça-se guia de execução definitiva, encaminhando-se ao juízo competente para a execução deste julgado; 2. Em cumprimento ao disposto no artigo 71, § 2º, do Código Eleitoral, oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral deste Estado, comunicando a condenação do réu, com sua devida identificação, acompanhada de cópia da presente sentença, para cumprimento do quanto estatuído no artigo 15, III, da Constituição Federal; 3. Oficie-se ao órgão estadual de cadastro de dados sobre antecedentes criminais, fornecendo as informações sobre a condenação do réu. 4. Remetam-se os autos à Contadoria deste Juízo para que promova o cálculo das custas finais e, se for o caso, da pena de multa. 5. Intime(m)-se o(s) acusado(s) para que, no prazo de 10 dias, realize(m) o pagamento das custas processuais e da multa, se for o caso, nos termos do art. 50 do Código Penal. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Cumpridas as determinações e formalidades legais, arquivem-se com baixa. Porteirinha, data da assinatura eletrônica. RICARDO AUGUSTO DE CASTRO ZINGONI Juiz(íza) de Direito Vara Única da Comarca de Porteirinha
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