Processo nº 5000311-84.2019.4.03.6121
ID: 278582245
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de Taubaté
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5000311-84.2019.4.03.6121
Data de Disponibilização:
26/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JULIO CESAR MANOEL
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5000311-84.2019.4.03.6121 / 2ª Vara Federal de Taubaté AUTOR: MARGARIDA DONIZETI FERREIRA, AGENOR NEVES Advogado do(a) AUTOR: JULIO CESAR MANOEL - SP210492 REU: CAIXA …
PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5000311-84.2019.4.03.6121 / 2ª Vara Federal de Taubaté AUTOR: MARGARIDA DONIZETI FERREIRA, AGENOR NEVES Advogado do(a) AUTOR: JULIO CESAR MANOEL - SP210492 REU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF Advogado do(a) REU: ADRIANO ATHALA DE OLIVEIRA SHCAIRA - SP140055-A S E N T E N Ç A Vistos, etc. MARGARIDA DONIZETI FERREIRA e AGENOR NEVES ajuizaram ação de cobrança pelo procedimento comum contra a CAIXA SEGURADORA S/A, objetivando a condenação da ré no pagamento de reparação material no valor de R$ 61.390,34, em razão de necessidade de reforma do imóvel localizado na Avenida Fraternidade, 1186, em Taubaté/SP, a devolução em dobro dos valores dos encargos mensais relativos ao financiamento do bem, além do pagamento dos aluguéis que foram obrigados a dispender em razão da impossibilidade de utilizar o imóvel. Aduzem os autores que são mutuários do Sistema Financeiro da Habitação denominado “Minha casa, Minha vida”, na forma da Lei 11.977/2009 e estão rigorosamente em dia com os encargos assumidos com a aquisição do imóvel localizado na Avenida Fraternidade, 1.186, em Taubaté/SP. Acrescentam que no dia 30/12/2012 o imóvel foi atingido por fortes chuvas e inundou, culminando no aparecimento de trincas nas paredes e na perda de móveis e utensílios domésticos. Informam que em 18/02/2013 avisaram à ré do sinistro ocorrido e, apesar da gravidade dos danos e do risco iminente de desabamento, a requerida informou que os autores tinham direito à indenização no valor de R$ 871,63, mesmo com a apresentação de documentos – três orçamentos diferentes – em que restou demonstrado que o custo dos reparos chega a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais). Os autores invocam o disposto no artigo 20 da Lei 11.977/2009 e cláusulas contratuais, bem como requerem a aplicação do código de defesa do consumidor. O feito foi inicialmente distribuído perante a Justiça Estadual da Comarca de Taubaté (Num. 14352982 - Pág. 1). A ré Caixa Seguradora S/A apresentou contestação (Num. 14352999 - Pág. 1), arguiu preliminarmente sua ilegitimidade passiva, e denunciou da lide a Caixa Econômica Federal, sob o argumento de que o imóvel tem cobertura do Fundo Garantidor da Habitação, que é administrado e gerido pela CEF. No mérito, a requerida pugnou pela total improcedência da demanda. Os autores apresentaram réplica (Num. 14353416 - Pág. 3/4) e não se opuseram à denunciação da lide à CEF, razão pela qual o Juízo Estadual declinou da competência (Num. 14353417 - Pág. 1/2) e os autos foram redistribuídos a este Juízo. A denunciação da lide foi admitida e foi determinada a inclusão da Caixa Econômica Federal no polo passivo, na condição de parte estipulante da apólice de seguro objeto da ação (Num. 14353421 - Pág. 5). A ré CEF apresentou contestação (Num. 14353426 - Pág. 1), arguindo, em preliminar, ilegitimidade passiva, ao argumento de que atua na condição de agente financeiro, devendo permanecer no feito apenas na condição de gestora do FGHab. No mérito, a ré aduziu que efetuou o pagamento de indenização cabível no caso dos autores, no valor de R$ 871,63. Alegou também que o FGHab é um fundo público, não uma relação contratual, e que o montante apontado na petição inicial se refere a reparos vinculados a vícios de construção, o que não está coberto pelo seguro. Ademais, a CEF ressaltou que eventuais vícios são de responsabilidade da construtora, ressaltando a inexistência de solidariedade entre o agente financeiro e o construtor. Por fim, requereu a denunciação da lide à construtora do imóvel (Num. 14353426 - Pág. 1/29). Juntou documentos (Num. 14353436 - Pág. 1/31). Houve réplica (Num. 14353438 - Pág. 1/4). Instados a se manifestarem sobre a produção de provas, a parte autora requereu a produção de prova pericial e a designação de audiência (Num. 14353440 - Pág. 8/9), enquanto a ré Caixa Seguros reiterou o pedido de exclusão do polo passivo da ação, em razão de ilegitimidade de parte (Num. 14353440 - Pág. 2/5). Foi proferida sentença, que declarou a ilegitimidade da Caixa Seguradora S/A e julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, em razão da ausência de uma das condições da ação (Num. 14353446 - Pág. 1/4). Foi interposto recurso de apelação (Num. 14354054 - Pág. 1/13). Contrarrazões da Caixa Seguradora S/A (Num. 14354063). O E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região julgou prejudicada a apelação, reconheceu, de ofício, a legitimidade passiva da CEF na condição de ré e determinou o retorno dos autos à Vara de origem para prosseguimento da instrução (Num. 33924970). Em fase de especificação de provas, os autores pugnaram pela produção de prova pericial no imóvel e documentos colacionados aos autos, assim como pela prova testemunhal (Num. 41660384), enquanto a CEF resguardou-se no direito de produzir contraprovas (Num. 43866333) Pela decisão de Num. 52844548 foi deferida a prova testemunhal e pericial. O laudo pericial foi juntado (Num. 193612135, Num. 193612136, Num. 193612137, Num. 193612138, Num. 193612139 e Num. 193612140). Manifestação da parte autora e da ré acerca do laudo pericial (Num. 242291788 e Num. 243267196, respectivamente). Realizada audiência de conciliação, instrução e julgamento, foi colhido o depoimento pessoal da autora e ouvida a testemunha Amauri Edson Rodrigues. Os autores, em alegações finais, reiteraram as manifestações feitas nos autos (Num. 260041146). A CEF apresentou alegações finais (Num. 260741769). É o relatório. Fundamento e decido. Preliminares Quanto a preliminar de ilegitimidade de parte, entendo que a questão já foi plenamente decidida por ocasião do acórdão do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que reconheceu, de ofício, a legitimidade passiva da Caixa Econômica Federal para figurar no polo passivo da demanda (Num. 33924970 - Pág. 1/5). Registro que, ao contrário do pontuado, há sim contrato mantido com a Caixa Seguradora (Num. 14351700 - Pág. 3), mas tendo esta sido excluída do polo passivo, e sendo a responsabilidade solidária pela CEF, como gestora da FGHAB, reputo possível a prolação de sentença. Assim, rejeito a preliminar e, uma vez concluída a instrução probatória, passo a análise do mérito propriamente dito. Mérito A parte autora pede, em síntese, que seja realizado o pagamento valores devidos a título de reparação material, necessários à reforma e restauração do imóvel; a restituição em dobro dos encargos mensais vencidos e vincendos, adimplidos desde a data do sinistro (30/12/2012); e os valores relativos a alugueis assumidos enquanto durar a inabitabilidade do imóvel localizado na Avenida da Fraternidade, nº 1186, Vila Olímpia, na cidade de Taubaté-SP. A parte autora reuniu aos autos o Instrumento Particular de Compra e Venda de Unidade Isolada e Mútuo com Obrigações e Alienação Fiduciária (Num. 14351691 - Pág. 11), em que consta a ré Caixa Econômica Federal na condição de credora fiduciária; assim como a matrícula do imóvel nº 109.6028, registrada no Cartório de Registro de Imóveis de Taubaté, ainda em nome do anterior proprietário (Num. 14351700 - Pág. 1). De início, importante destacar que, a requerida não se insurgiu contra isso, de modo que considero incontroverso ser a autora legítima possuidora do imóvel que se objetiva reformar. É indiscutível a legitimidade da empresa pública para responder por vícios construtivos no contrato relacionado ao Programa Minha Casa Minha Vida, pois a CEF atua não apenas como agente financeiro, mas como verdadeira gestora de políticas públicas, com participação na execução do projeto, contratação da construtora, evolução da obra e subsídios para aquisição de moradias para a população de baixa renda, por meio de recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), o que atrai sua pertinência subjetiva para responder pelos vícios construtivos, conforme orientação pacífica do E. STJ (AgInt no REsp 1646130/PE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 30/08/2018, DJe 04/09/2018; AgInt nos EDcl no REsp 1.907.783/PE, Ministro Antônio Carlos Ferreira, 4T, DJe 13/08/2021; AgInt no AREsp 1.791.276/PE, Ministro Raul Araújo, 4T, DJe 30/06/2021; AgInt no AREsp 1.494.052/MT, Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3T, DJe 06/04/2021). No ponto, o Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), instituído pela Lei n. 11.977/2009, constitui política governamental de incentivo à moradia própria, sua aquisição ou melhoria, para famílias de baixa renda, e integra o Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU) e o Programa Nacional de Habilitação Rural (PNHR), com estabelecimento de subvenções econômicas, como forma de reduzir o déficit habitacional existente no país, cumprindo os mandamentos constitucionais de diminuição das desigualdades sociais e melhor qualidade de vida da população brasileira, visando uma melhor autonomia individual, sendo um direito humano universal (artigo 6º da Magna Carta). A Lei n. 11.977/2009 prevê que a gestão operacional dos recursos destinados à concessão da subvenção do Programa Nacional de Habitação Urbana é atribuição da Caixa Econômica Federal (CEF), nos termos do caput do artigo 9º. Logo, entendo que não há qualquer controvérsia sobre a gestão pela CEF do Fundo Garantidor de Habitação Popular, surgindo desta obrigação o seu papel no programa, que é o de cobrir os danos físicos ao imóvel ou infortúnios ao mutuário. Assim, para além de agente financiador e executor do programa, a CEF é responsável gestão do FGHab, emergindo sua responsabilidade em face de eventuais vícios físicos ocasionados ao imóvel nas hipóteses previstas no contrato. Acerca da responsabilização da CEF, faz-se necessário tecer algumas considerações. O instituto da responsabilidade civil revela o dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão que seja imputada para satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais que lhes são impostas, tendo por intento a reparação de um dano sofrido, sendo responsável civilmente quem está obrigado a reparar o dano sofrido por outrem. Nos termos do art. 927 do Código Civil de 2002, “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, sendo independentemente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem (parágrafo único). Também é objetiva a responsabilidade civil decorrente de atividade bancária, já que o § 2° do art. 3° da Lei 8.078/90 inclui essa atividade no conceito de serviço, dispositivo este que foi declarado constitucional pelo STF ao julgar pedido formulado na ADI 2591/DF (rel. orig. Min. Carlos Velloso, rel. p/ o acórdão Min. Eros Grau, 7.6.2006). A propósito, a súmula do STJ n° 297 dispõe que o “Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Ressalte-se que a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos é objetiva, independentemente de culpa, e está prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, “in verbis”: “§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.” São pressupostos da responsabilidade civil: a) a prática de uma ação ou omissão ilícita (ato ilícito); b) a ocorrência de um efetivo dano moral ou patrimonial; c) o nexo de causalidade entre o ato praticado - comissivo ou omissivo. Nos casos de responsabilidade subjetiva, impende ainda verificar a existência de culpa. O caso em apreço ainda envolve relação disciplinada pela Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) em seu artigo 22, abaixo reproduzido: “Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.” Assim, tratando-se de reparação de danos, vigora o princípio da responsabilidade objetiva do fornecedor por danos patrimoniais ou morais causados aos consumidores, consoante disposição de seu art. 14: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” No caso em tela, portanto, mister se torna a conjugação de três elementos para que se configure o dever de indenizar: o ato ilícito, o prejuízo e o nexo de causalidade entre o atuar do ofensor e o dano sofrido pela vítima, sem investigação de culpa. Caso concreto. Visando comprovar os aventados danos do imóvel relatados na inicial, foi determinada a realização de perícia por Engenheiro Civil de confiança do juízo. O laudo pericial oficial produzido nestes autos (Num. 193612135) concluiu que: “A casa apresenta infraestrutura adequada para o tipo de construção. Não foi verificado nenhum indício de comprometimento com a fundação (alicerce) da casa. Foi verificado que o imóvel apresenta: danos causados pela inundação, danos causados por vícios construtivos durante sua edificação e danos por falhas de manutenção devido ela estar desocupada por longo período. Foi verificado que a casa foi construída num nível bem acima do nível da rua indicando que o projetista sabia da possibilidade de inundação no local. Isso pode ser confirmado pela diferença de nível em relação ao nível da rua e pela inclinação acentuada da calçada de pedestre como pode ser verificado pela foto da frente da casa no Relatório Fotográfico ANEXO III página 8/8. Quanto às patologias encontradas, são vícios (ocultos), aqueles que dificilmente pode ser verificado quando se recebe uma obra, como por exemplo, utilização de argamassa com mistura incorreta o que originou fissuras nas paredes, espessura muita fina de argamassa geando fissuras mapeadas como é o de um dos tipo de defeitos no muro, falta de amarração entre a coluna do muro e a alvenaria do muro e entre alvenaria de blocos cerâmicos com as colunas das paredes etc. No caso do muro existe evidências de reparo executado sem êxito para reparar as trincas” Este laudo veio acompanhado de fotos dos danos e dos itens que devem ser reparados/reformados ou substituídos. Constou, ainda, deste documento de prova no tocante à possibilidade de identificação dos vícios na vistoria inicial do imóvel, que “Nenhum dano verificado durante a Vistoria era possível ser constatado na vistoria inicial do imóvel. Tratam-se de ‘VÍCIOS OCULTOS’. Aqueles que são de difícil constatação que podem levar anos para serem verificados como é o caso das trincas verticais e longitudinais”. Quando questionado se haviam sido realizados reparos no imóvel após o surgimento dos danos alegados, ao que respondeu “Não. Também por orientação da Caixa Econômica Federal (CEF) em formulário já impresso com a declaração para não efetuar qualquer reparo em 18/02/2013, conforme consta no documento ‘APSDF-Aviso Preliminar de Sinistro de Danos Físicos’ Num. 14352958 – Pág. 1 a 3”. Sobre a manutenção adequada do imóvel, o perito respondeu que “A Casa foi desocupada por orientação da Caixa Econômica Federal (CEF) em formulário já impresso com a declaração para não efetuar qualquer reparo em 18/02/2013, conforme consta no documento ‘APSDF-Aviso Preliminar de Sinistro de Danos Físicos’ Num. 14352958 – Pág. 1 a 3 (Fls. 81 a 83 do processo). Desde então o imóvel está fechado sem qualquer manutenção”. Quando indagado as fortes chuvas e inundação poderiam ser considerados fatores externos em relação aos danos causados, o perito assegurou que “As ‘chuvas fortes’ são fatores externos, porém previsíveis e que devem ser consideradas para efeito num projeto de construção civil. Devem ser consideradas também as condições de drenagem no entorno do local da edificação”. Quanto aos valores necessários para a correção dos vícios do imóvel, apresentou o perito uma planilha orçamentária dos serviços necessários a restauração da casa para torna-la habitável, com um custo total estimado em R$ 19.715,04, em 12/12/2021. Fazendo-se o cotejo entre todas as respostas constantes do laudo pericial e o objeto desta demanda, entendo que a CEF deve ser responsabilizada - e, consequentemente, deve arcar com as despesas decorrentes dos reparos pelos vícios estruturais, incluindo-se aqueles oriundos do desgaste natural e da falta de manutenção, em razão da determinação constante do Aviso Preliminar de Sinistro de Danos Físicos (Num. 14352958 - Pág. 3) de que não devem ser feitos reparos no imóvel até a vistoria da Seguradora e manifestação a respeito. Assim, sua responsabilidade engloba os reparos ao muro lateral esquerdo, piso lateral (corredor da casa), parede externa da casa, quarto principal, segundo quarto, corredor, banheiro, cozinha, sala de visita e portas sarrafeadas de madeira, considerando que todos os vícios encontrados têm entre as causas determinantes a inundação, os vícios construtivos verificados e a consequente falta de manutenção ocasionada pela desocupação do imóvel. Acerca do laudo acostado aos autos, entendo que este se mostra bem fundamentado, mediante a descrição das condições do imóvel e dos seus danos, em conformidade com a técnica usualmente aceita para as perícias judiciais, tendo sido analisadas todas as alegações e situações referidas na exordial pela parte. Outrossim, o laudo atende aos requisitos legais do artigo 473 do CPC, estando bem fundamentado de modo simples e com coerência lógica. Não vislumbro motivo para discordar da conclusão do perito, profissional qualificado e que goza da confiança deste Juízo, pois fundou sua conclusão no estudo e vistoria realizados no imóvel. Também não verifico contradições entre as informações constantes do laudo, aptas a ensejar dúvidas em relação a este, o que afasta qualquer nulidade. Pelas mesmas razões acima expostas, também não devem ser acolhidas eventuais alegações de cerceamento de defesa, embasadas em impugnação ao laudo elaborado pelo perito do juízo, sob o argumento de que houve discordância e/ou contradição com os demais elementos trazidos aos autos. Todos os elementos dos autos foram vistos, mas nenhum tem aptidão para sobrepor-se à análise clínica realizada pelo expert judicial. Outrossim, descabem esclarecimentos complementares ou mesmo quesitação ulterior, posto que respondidos adequadamente os quesitos formulados elaborados pelas partes, lembrando que compete ao Juiz indeferir os quesitos impertinentes (art. 470, inciso I, CPC). Por fim, entendo ser desnecessária a realização de nova perícia, visto que o laudo se encontra suficientemente fundamentado e convincente, não havendo contradições e imprecisões que justifiquem a repetição do ato. Em audiência realizada, foi ouvida a parte autora e um testemunha que estava no local no dia do evento que desencadeou o aparecimento dos vícios de construção ocultos. Em seu depoimento pessoal, a autora informou que os danos que está pedindo reparo são decorrentes de uma inundação; que antes da ocorrência não havia problema com a causa, mas era imóvel novo; que é casa germinada e o outro casal também sofreu o mesmo problema, e o pessoal da rua toda; que eles também entraram com ação por causa dos danos; que não está residindo no imóvel; que ficou impraticável a residência, tanto por causa dos danos quanto pelo emocional, porque tem pavor de água; que recebeu R$700,00 reais, mas não se lembra qual foi o processo; que a casa foi comprada pela CEF pelo plano "Minha Casa Minha Vida"; que ninguém tinha morado na casa antes. Por sua vez, a testemunha Amauri Edson Rodrigues afirmou que conhece os autores, porque a Margarida é sua cunhada; que no dia da ocorrência foi aniversário da sua sogra e foi chamado para ajudar os autores a levantar os móveis que puderam ser levantados, os outros foram inundados; que já tinha entrado na casa antes, mas depois da inundação acabou tudo; que no dia da inundação a água estava na cintura; que inclusive até hoje não arrumaram a rua; que não se lembra do nome do bairro; que a autora não voltou mais para a casa; que a única coisa que foi aproveitada do imóvel foi o fogão; que não mora no mesmo condomínio, apenas foi chamado para socorrer; que outras casas também tiveram o mesmo problema; que não sabe se hoje a casa está ocupada porque mora em Caçapava e não tem mais contato. Portanto, no caso em análise, tendo por fundamento o laudo pericial oficial, conjugado com as demais provas produzidas pela parte autora, está demonstrada tanto a existência de defeito na construção, que pode ser caracterizado, sem sombra de dúvida, como vício oculto, somente perceptível pelos adquirentes a partir do surgimento dos danos noticiados no laudo pericial, como a existência de danos decorrentes das fortes chuvas e da inundação que acometeu o imóvel. No caso específico, o problema foi agravado a partir da inundação decorrente da enchente ocorrida em 30/12/2012, que ocasionou o aparecimento dos referidos defeitos. Em vista da fundamentação acima exposta, não há dúvidas que a responsabilidade por ressarcir a demandante é da CEF. A despeito da alegação da empresa requerida de que a recuperação de eventuais vícios ocultos decorrentes de má execução de obra incumbe ao responsável técnico e à construtora, além do argumento de má conservação do imóvel, entendo que a CEF é responsável pelas despesas decorrentes de danos físicos no imóvel, pois, como dito, agiu na condição gestora do Fundo Garantidor da Habitação da Habitação (FGHab), além de agente financeiro do imóvel, no Programa MCMV. Outrossim, os vícios estruturais revelam-se persistentes, progressivos e renovados no tempo, de modo que, ainda que a parte autora realizasse a manutenção devida, estes apareceriam, como ocorreu por ocasião do evento da inundação. Além disso, não foi apresentado nos autos quaisquer fatos impeditivos ou modificativos do direito autoral, restando assente que decorreram da má construção do imóvel somada evento natural que revelou os problemas estruturais já existentes. Há de ser observar que no caso dos autos, os autores firmaram contrato de compra e venda no âmbito do Programa MCMV, com cobertura do Fundo Garantidor da Habitação Popular (FGHab), que prevê cobertura securitária em caso de danos físicos causados ao imóvel, conforme previsto no parágrafo sétimo da cláusula vigésima primeira a seguir transcrito (Num. 14351694 - Pág. 3): PARÁGRAFO SÉTIMO – O Fundo Garantidor da Habitação Popular – FGHab assumirá as despesas relativas ao valor necessário à recuperação dos danos físicos ao imóvel, limitado à importância do valor de avaliação do imóvel atualizado mensalmente, na forma contratada, decorrente de: (...) II - Inundação e alagamento, quando um rio ou um canal transbordar e a água atingir o imóvel ou alagamentos causados por agentes externos ao imóvel, chuva ou canos rompidos fora da residência; Desta feita, pelo conjunto probatório constante dos autos, foi possível aferir que os danos sofridos no imóvel foram decorrentes do volume de chuva que atingiu a região no dia 30/12/2012. O laudo pericial confirmou que a existência de fatores externos se somou aos vícios ocultos já existentes anteriormente no imóvel, o que possibilita o enquadramento na referida cláusula contratual que assegura a cobertura dos danos pelo FGHab. No mesmo sentido, colaciono os seguintes julgados do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a seguir: APELAÇÃO. CIVIL. VÍCIOS REDIBITÓRIOS. VÍCIOS OCULTOS. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. DANOS NO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE DO CONSTRUTOR E DO VENDEDOR. COBERTURA FUNDO GARANTIDOR DA HABITAÇÃO. FATOR EXTERNO. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA RÉ IMPROVIDA. I - Pretendeu a parte Autora, em petição inicial, a condenação da corrés por danos materiais e morais, bem como à obrigação de fazer consistente em reformar o imóvel adquirido por meio de financiamento imobiliário, considerando os danos que atingiram o imóvel. Foram incluídos no pólo passivo da ação Banco do Brasil S/A, por ser o agente financeiro que financiou a aquisição do imóvel já construído, a Caixa Econômica Federal, por ser gestora do Fundo Garantidor da Habitação Popular, Veccon Empreendimentos Imobiliários Ltda, empresa responsável pelo loteamento onde se localiza o imóvel, e Nilson Fernandes Mendonça, vendedor do imóvel e responsável por sua construção. Apenas o último réu foi condenado pelo juízo de origem. II - É de rigor confirmar o entendimento que afasta a responsabilidade do Banco do Brasil S/A. Com efeito, é certo que o agente financeiro financiou a aquisição do imóvel, circunstância suficiente para a configuração de sua legitimidade passiva ad causam. No entanto, o réu em questão não teve qualquer participação em eventual financiamento da obra, viabilizando, antes sim, a compra e venda do imóvel após a conclusão de sua construção. Não se cogitando de qualquer atuação administrativa no âmbito da implementação de políticas públicas, a conduta do Banco do Brasil S/A restringiu-se a de uma típica instituição financeira, razão pela qual é pacífico o entendimento que afasta qualquer responsabilidade de sua parte neste contexto. III - Considerando as respostas oferecidas pelo perito de confiança do juízo, a principal causa dos danos que atingiram o imóvel foram os vícios existentes em sua construção. Desta forma resta inequívoca a responsabilidade do corréu Nilson Fernandes Mendonça, uma vez que que figurou como vendedor do imóvel na avença, além de ter sido responsável por sua construção. IV - A conclusão apresentada no laudo pericial enfatizou os vícios de construção, mas foi inconclusiva quanto ao fator externo gerador da condição severa de infiltração e umidade, limitando-se a descrever sua natureza ascensional, ou seja, apontou que as patologias tiveram origem no subsolo saturado. A despeito de tais ressalvas, o perito judicial destacou reiteradamente que não seria possível atribuir qualquer responsabilidade à empresa responsável pelo loteamento, razão pela qual também não merece reforma a decisão no tocante à VeCCon Empreendimentos Imobiliários Ltda. V - A aludida imprecisão do lado não é suficiente, porém, para elidir a configuração do sinistro que dá ensejo à cobertura securitária pelo FGHab. Com efeito, é inequívoco que, para além dos vícios na construção do imóvel, a saturação do subsolo é um fator essencial para que os vícios ocultos se revelassem. Pela narrativa apresentada na petição inicial, há fortes indícios de que os danos surgiram após um período de chuvas intensas. Ainda que assim não fosse, porém, é inequívoco que apenas um fator de ordem externa poderia gerar a saturação do solo e a infiltração ascensional, quer seja a variação do nível de um lençol freático, quer seja problemas com infraestrutura para o escoamento de águas pluviais ou mesmo, quiçá, captação de esgoto. É de se destacar, ademais, que a negativa de cobertura pela CEF não foi acompanhada de vistoria e elaboração de laudos técnicos da Defesa Civil com relação à ocorrência do evento causador do dano, nem há qualquer demonstração de que o imóvel encontra-se em áreas mapeadas com riscos intensificados de desastres. VI - Apelação da parte Ré improvida e apelação da parte Autora parcialmente provida para incluir a CEF, enquanto gestora do FGHab, na condenação fixada a título de danos materiais pela sentença impugnada. Honorários advocatícios devidos pela CEF em 10% do valor da fração de sua condenação. Honorários advocatícios devidos por Nilson Fernandes Mendonça majorados para 11% do valor de sua condenação, nos termos do art. 85, § 11 do CPC. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000422-87.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 30/04/2021, DJEN DATA: 06/05/2021) APELAÇÃO CÍVEL. CEF. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. COBERTURA SECURITÁRIA. FGHAB. FATOR EXTERNO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. - A presente demanda diz respeito à cobertura securitária por danos causados em imóvel objeto de contrato de financiamento e indenização por danos morais. - Da leitura do contrato entabulado entre as partes é possível extrair a informação de que os vícios construtivos não são amparados pela cobertura securitária, conforme previsto no parágrafo oitavo da “Cláusula vigésima primeira – da garantia de cobertura do saldo devedor e recuperação do imóvel”. Todavia, o parágrafo sétimo da referida cláusula dispõe as hipóteses em que o FGHAB assume as despesas. - Os danos sofridos no imóvel foram causados pelo volume de chuva que atingiu a região, tanto que se verificou prejuízos nas residências vizinhas e na própria rua. Logo, foi um fator externo que deteriorou a moradia, não podendo ser mantida a arguição de vício construtivo. - A indenização por danos morais é suscetível quando a parte precisa suportar vexame, sofrimento ou humilhação que fogem da normalidade, causando aflição psicológica no indivíduo. O mero dissabor ou incômodo não caracterizam o dano, visto que tais situações não são intensas e duradouras a ponto de causar desequilíbrio psicológico. - O evento que avariou o imóvel se deu no início de 2016, vindo a Defesa Civil a interditar a área por tempo indeterminado em razão dos riscos. Denota-se, assim, que a autora há muito tempo busca a garantia do seguro, sendo certo que a vistoria realizada pela Defesa Civil era documento apto a comprovar as dificuldades enfrentadas pela segurada. - Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000656-15.2017.4.03.6123, Rel. Desembargador Federal DIANA BRUNSTEIN, julgado em 14/11/2024, DJEN DATA: 25/11/2024) Da indenização pelos danos materiais No caso sub judice, pleiteia a demandante que a CEF seja condenada ao pagamento dos valores necessários para reparar totalmente os danos físicos existentes no imóvel. Diante da situação explanada, tendo em vista a obrigação de preservar a higidez contratual e o cumprimento das cláusulas avençadas, bem como em observância à boa-fé na formação dos contratos, entendo que a CEF deve ser condenada a indenizar a parte autora no valor de R$ R$ 19.715,04, calculados em 12/12/2021, descritos pelo Experto do juízo como necessário à reparação dos vícios estruturais existentes no imóvel. Destaco que, ante o transcurso do prazo desde a realização da perícia até o cumprimento da obrigação, à época do adimplemento, o montante a ser pago deverá ser devidamente corrigido. Nesse ponto, ao contrário do que afirma a CEF, evidentemente insuficiente a indenização de aproximadamente R$ 500,00 (quinhentos reais) pagos à época do evento. A conduta certamente presta como reconhecimento de responsabilidade do FGHAB, mas o valor não contribui minimamente para a realização dos reparos necessários. Assim, devida a obrigação de pagar. Quanto ao requerimento autoral de restituição dos encargos adimplidos desde a data do sinistro em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, entendo que não merecem acolhimento. Determina o referido dispositivo: Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Assim, a hipótese dos autos não se amolda ao teor do regramento legal, posto que são requisitos para a aplicar a referida penalidade: o consumidor ter sido cobrado por quantia indevida; ter pagado essa quantia indevida e que inexista engano justificável. A parte autora não comprovou o cumprimento de nenhum dos requisitos, visto que eventuais encargos que continuou pagando foram regularmente decorrentes do contrato firmado. E, no caso, a CEF realizou o pagamento (ainda que ínfimo) do valor da indenização que entendia devido. A existência do sinistro, todavia, invoca o cumprimento do instrumento contratual em sua totalidade, precipuamente das cláusulas relativas à cobertura securitária e, nesse ponto, existe a previsão de que o FGHAB assuma o pagamento das parcelas pelo tempo necessário para realização dos reparos no imóvel. Senão vejamos (Num. 14352952 - Pág. 4): 25.8 Constatada a inabitabilidade do imóvel em decorrência de sinistro coberto a seguradora passará a responsabilizar-se pela sua guarda e pelo pagamento das prestações mensais devidas pelo financiado à estipulante. 25.8.1 Compete à estipulante fornecer à seguradora o valor das prestações mensais de responsabilidade desta mediante o envio de demonstrativo das prestações em aberto, discriminando valores nominais e atualizações monetárias contratualmente previstas, exceto multa e juros moratórios. 25.8.2 A primeira prestação devida será a que se vencer após: a) a data do sinistro, nos casos em que a seguradora reconhecer a falta de condições de habitabilidade desde a data da ocorrência do evento, e o imóvel esteja desocupado desde aquela data; ou. b) a efetiva desocupação, quando a seguradora autorizar formalmente, nos casos em que constatar a inabitabilidade imediata do imóvel, ou a desocupação se fizer necessária para a realização da obra de reposição. 25.8.3 A última prestação devida será a que se vencer dentro do prazo de 30 (trinta) dias, após a data em que se restituir as condições de habitabilidade ao imóvel, nos casos de reposição, ou após a data em que vencer o prazo para realização dos reparos, nos casos de indenização feita mediante pagamento em espécie. Observo que, no caso, a Casa foi desocupada por orientação da Caixa Econômica Federal (CEF) por obrigação fixada desde 18/02/2013, conforme consta no documento "APSDF-Aviso Preliminar de Sinistro não havia a necessidade de de Danos Físicos" (Num. 14352958 – Pág. 1 a 3). Na ocasião, a parte foi cientificada a não efetuar qualquer reparo no imóvel. A visita do responsável pela CEF no imóvel ocorreu apenas em 26/06/2013. Na ocasião, entendeu-se que não havia a necessidade de desocupar o imóvel, bem como que a descrição dos serviços orçados não era condizente com as anomalias constatadas, tanto que resultou no pagamento de indenização ínfima, limitada ao valor da pintura (Num. 14353436 - Pág. 19/31). A leitura do contrato evidencia, portanto, que é devida a indenização das parcelas vencidas e pagas pela autora entre o sinistro (em 30/12/2012, pois o alagamento é incompatível com a habitabilidade) e a data da liberação do imóvel pela CEF, ou seja, com o protocolo da vistoria em 25/07/2013 (conforme carimbo de protocolo nos documentos que pressupõe coincidir com a ciência da autora), pois nessa data houve a liberação formal da CEF para os reparos. Cabe destacar que em nenhum momento restou demonstrado risco para que a parte autora retornasse ao seu imóvel. O documento da Defesa Civil de Taubaté, que atesta a visita na data dos alagamentos, não aponta qualquer risco à habitação. Existe sim uma recomendação para adoção de providências, ante a constatação de que a tubulação não comportou a vazão das águas por um ponto baixo na via pública, porém, não há qualquer comando de desocupação expresso (Num. 14352958 - Pág. 4). Nesse mesmo sentido se manifestou o perito ao apontar que, mesmo com a desocupação por quase 10 anos do imóvel, os danos não comprometem a integridade do imóvel ou sua segurança, bem como não oferecem risco de desabamento (itens VIII e XII - Num. 193612136 - Pág. 5). Assim, a aplicação da cláusula contratual em sua literalidade, obriga ao ressarcimento simples das parcelas vencidas e pagas pelos autores entre 30/12/2012 e 25/07/2013. Passo à análise do pedido de pagamento dos valores devidos a título de aluguel. Considerando a já aludida responsabilidade da Caixa Econômica Federal quanto aos custos necessários aos reparos no imóvel decorrente de previsão contratual, a imposição de pagamento dos alugueis despendidos pela parte autora enquanto perdurou a indisponibilidade de moradia no imóvel é decorrência lógica da situação vivenciada pelos requerentes. Se após a ocorrência do evento que ocasionou o aparecimento dos vícios estruturais, o imóvel tornou-se sem condições de habitação, tendo, inclusive, a CEF determinado que as partes não procedessem aos reparos necessários até supervisão da seguradora, são devidos pela ré os valores gastos com alugueis, sob pena do esvaziamento da garantia decorrente do seguro. Juntamente com a inicial, a parte autora comprovou a celebração de contrato de aluguel mediante a apresentação de recibo (Num. 14351691 - Pág. 5/6), com referência ao início da contratação em 29/11/2013. É certo que a pretensão, por se tratar de dano material está condicionada à comprovação, mas considerando o longo trâmite processual, entendo possível postergar a demonstração dos valores documentalmente pagos para o momento da liquidação da sentença. Ademais, o pagamento da ínfima indenização de R$ 500,00 (quinhentos reais), insuficiente para o reparo, não pode ser suficiente para justificar o afastamento da obrigação de indenizar até esta data. E a conclusão em nada é contraditória com o tópico anterior, que analisou a aplicabilidade literal das cláusulas contratuais. A questão atinente aos alugueis observa a razoabilidade necessária para a reocupação do imóvel, que dependia de reparos bem mais extensos do que aqueles indenizados pela CEF. A despeito de não comprometerem a segurança, os vícios constatados impediam que os autores residissem de forma digna, sendo a única alternativa o estabelecimento de moradia em outro local até que fossem devidamente indenizados para garantia do reparo integral do imóvel. Acerca da possibilidade de condenação ao pagamento de alugueis, colaciono o seguinte julgado do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região com entendimento semelhante: PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL CELEBRADO COM CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. COMUNICAÇÃO DO SINISTRO. PRESCRIÇÃO. CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL. DANOS. RISCO DE DESMORONAMENTO. COBERTURA CONTRATUAL FGHAB. PAGAMENTO DE ALUGUERES. RECURSO CONHECIDO EM PARTE. APELAÇÃO DESPROVIDA NA PARTE CONHECIDA. 1. Apelação interposta pela CEF em face de sentença de seguinte teor: “Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para condenar a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, gestora do FGHAB, na obrigação de fazer, consistente na reparação dos danos apurados pela perícia judicial, na parte do imóvel dos Autores que foi objeto da garantia contratual e que está acobertada pelo seguro do Fundo Garantidor da Habitação. Condeno a CAIXA, ainda, ao pagamento das despesas a serem despendidas pelos Autores com o aluguel de outro imóvel, compatível com o que atualmente residem, para constituir a moradia enquanto os reparos sejam realizados”. 2. Da prescrição. Da comunicação do sinistro: a orientação sedimentada do C. STJ revela que quando a pretensão do consumidor é de ordem indenizatória, isto é, de ser ressarcido pelo prejuízo decorrente dos vícios do imóvel, não há incidência de prazo decadencial, pois a ação é tipicamente condenatória e sujeita-se ao prazo de prescrição. Incide no caso o prazo decenal previsto no art. 205 do CC. 3. O contrato celebrado entre os autores e a CEF é de novembro/2010 e houve pedido administrativo para a reparação dos danos (comunicado de abertura de sinistro), em fevereiro/2019, ao passo que a ação foi ajuizada em maio/2020. Não consumação do lapso prescricional decenal. 4. Da legitimidade da CEF: a CEF é parte legítima para figurar no polo passivo da presente ação, sendo representante legal do FAR. 5. O C. STJ possui entendimento no sentido de que possui legitimidade passiva a Caixa Econômica Federal para responder, nos casos em que não atua apenas como agente financeiro, "por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis objeto do Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida se, à luz da legislação, do contrato e da atividade por ela desenvolvida, atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda (...)" (AgInt no REsp 1646130/PE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 30/08/2018, DJe 04/09/2018). 6. Da cobertura dos riscos pelo FGHAB: a CEF não foi condenada em primeiro grau a reparar vícios construtivos no imóvel adquirido pelos autores. Ausência de interesse recursal quanto à alegação de “ausência de responsabilidade do FGHAB por reparação de vício construtivo”. 7. Consertos necessários a evitar o desmoronamento de paredes/desabamento: consonância com a garantia do FGHAB estipulada no contrato. 8. Do pagamento de alugueres: a imposição à CEF do pagamento de alugueres enquanto perdurar a interdição do imóvel para a realização dos reparos, visando afastar o risco de desmoronamento, garantido contratualmente, constitui consequência lógica da garantia FGHAB. 9. Se o imóvel oferece risco à integridade física dos moradores relacionados à possibilidade de desabamento e o ajuste firmado entre as partes prevê a responsabilidade do FGHAB na hipótese, o reparo demanda a desocupação do bem e o fornecimento de guarida, de semelhante instalação aos contratantes-mutuários, sob pena de ser inócua a garantia. 10. Da insurgência em relação a dano moral: não houve condenação em dano moral. Ausente interesse recursal para a impugnação. 11. Do valor dos reparos: a sentença não estipulou o montante a ser custeado pela ré com os reparos, reportando-se o juiz à observância da disposição contratual que determina a elaboração de orçamentos para aferir-se o custo do conserto. Mostra-se em descompasso com os autos e a sentença a impugnação recursal “do valor da reparação apurado na perícia”. 12. Apelação conhecida em parte. Na parte conhecida, desprovida. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001246-32.2020.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal RENATO LOPES BECHO, julgado em 30/03/2023, DJEN DATA: 13/04/2023) Diante disso, acolho o pedido autoral referente aos alugueis devidos, que deverão ser devidamente comprovados em fase de liquidação, já que estão condicionados à comprovação dos reparos necessários e recuperação das condições de habitabilidade do imóvel. A comprovação deverá se dar com a apresentação de contrato(s) e/ou recibo(s) de pagamento contemporâneos ao desembolso realizado pelos autores, sendo inadmitida a apresentação de comprovantes ou declarações com data atual, ressalvados se acompanhados de boletos ou extratos bancários que atestem o pagamento na respectiva competência. A indenização deverá ser mantida pelo prazo de 6 (seis) meses a contar do cumprimento da obrigação de pagar a indenização material fixada em desfavor da CEF, intervalo que reputo suficiente para que a parte providencie os reparos no imóvel. Pelo exposto, julgo extinto o processo com resolução de mérito (art. 487, inciso I do CPC), e ACOLHO EM PARTE os pedidos iniciais, a fim de condenar a Caixa Econômica Federal: a) ao pagamento indenização para reparação dos danos materiais causados à parte autora, conforme orçamento fixado no laudo pericial, no montante de R$ 19.715,04, (dezenove mil setecentos e quinze reais e quatro centavos), calculado para dezembro de 2021 (Num. 193612137 - Pág. 1/4), o que deverá ser devidamente atualizado desde a data do orçamento e com a incidência de juros de mora devidos desde a data do sinistro (30/12/2012); b) a restituir as parcelas do financiamento vencidas e pagas pelos autores entre 30/12/2012 e 25/07/2013, devidamente corrigidas e com juros de mora desde a data do pagamento (Súmula 43 do STJ e art. 397 do Código Civil, por se tratar de obrigação contratual e líquida). c) ao pagamento das despesas com aluguel efetivados pelos autores a partir de 30/12/2012, a serem devidamente comprovados em fase de liquidação de sentença com a apresentação de contrato(s) e/ou recibo(s) de pagamento contemporâneos ao desembolso realizado pelos autores. O valor será pago devidamente corrigido, com juros de mora devidos desde a citação (art. 405 do CC). A indenização deverá ser mantida pelo prazo de 6 (seis) meses a contar do cumprimento da obrigação de pagar a indenização material fixada em desfavor da CEF, intervalo que reputo suficiente para que a parte providencie os reparos no imóvel. Condeno a ré, por fim, em custas e honorários de sucumbência, que fixo em 10% sobre o valor total da condenação, consistente na soma do dano material, das parcelas a serem restituídas e dos alugueis a serem indenizados, em montante a ser apurado no cumprimento de sentença. Publique-se. Intimem-se. Taubaté, data da assinatura Natália Arpini Lievore Juíza Federal Substituta
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear