Processo nº 1004331-54.2025.8.11.0000
ID: 256251290
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara Criminal
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 1004331-54.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
14/04/2025
Polo Ativo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1004331-54.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Colaboração com Grupo, Organização ou Associação…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1004331-54.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Colaboração com Grupo, Organização ou Associação Destinados à Produção ou Tráfico de Drogas] Relator: Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JONES GATTASS DIAS] Parte(s): [TAIS FROES COSTA - CPF: 792.791.712-91 (ADVOGADO), GEOVANA APARECIDA DA SILVA CAMPOS - CPF: 062.062.431-09 (INTERESSADO), 1º VARA CRIMINAL DE PRIMAVERA DO LESTE MT (REU), EXMA. SRA. DRA. LUCIANA BRAGA SIMÃO TOMAZETTI - JUÍZA DA 2ª VARA CRIMINAL E CÍVEL DA COMARCA DE PARANATINGA (IMPETRADO), TAIS FROES COSTA - CPF: 792.791.712-91 (IMPETRANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PRIMAVERA DO LESTE (IMPETRADO), ANDRESSA DOS SANTOS HAAK - CPF: 087.341.321-04 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, CONCEDEU A ORDEM. E M E N T A Ementa. Direito processual penal. Habeas corpus. Prisão preventiva de mulher gestante. Pedido de substituição por prisão domiciliar. Ordem concedida. I. Caso em exame 1. Habeas corpus com pedido liminar impetrado contra decisão que converteu a prisão em flagrante de mulher gestante em prisão preventiva, imputando-lhe os crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico (Lei n. 11.343/2006, arts. 33 e 35). A impetrante requereu a substituição da prisão preventiva por domiciliar, com fundamento na proteção integral à maternidade, no Estatuto da Primeira Infância, nas Regras de Bangkok e na decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 143.641/SP. II. Questões em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é cabível a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, diante da gestação da paciente; e (ii) estabelecer se a reiteração delitiva e a gravidade concreta do crime em tese cometido afastam a aplicação do benefício previsto no art. 318 do Código de Processo Penal. III. Razões de decidir 3. A análise da alegada ilegalidade da prisão demanda exame aprofundado das circunstâncias fáticas da abordagem policial e da produção de provas, o que é incompatível com os estreitos limites cognitivos do habeas corpus. 4. A existência de materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria, corroborada por laudo pericial e boletim de ocorrência, justifica a custódia cautelar da paciente. 5. A reiteração delitiva da paciente, comprovada por condenação anterior por crime da mesma natureza, configura risco concreto à ordem pública, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal e do Enunciado Orientativo n. 6 deste Tribunal. 6. A condição de gestante da paciente recomenda a mitigação da medida cautelar extrema, ante a prioridade absoluta conferida à criança pelo ordenamento jurídico, sendo admissível a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico, nos termos do art. 318, IV e V, c/c art. 319, IX, do Código de Processo Penal. IV. Dispositivo e tese 7. Pedido parcialmente procedente. Ordem parcialmente concedida para converter a prisão preventiva em prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico. Teses de julgamento: "1. A via do habeas corpus não comporta análise de mérito sobre a autoria delitiva. 2. A análise de ilegalidade da prisão com base em suposta coação policial demanda dilação probatória incompatível com a via do habeas corpus. 3. Embora a reiteração delitiva justifique a decretação da prisão preventiva, a condição de gestante autoriza a conversão da medida extrema em prisão domiciliar, nos termos do art. 318, IV e V, do Código de Processo Penal." _____________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XLV; CPP, 312, 318, IV e V, 319, IX; Lei n. 13.257/2016, art. 1º; Lei n. 11.343/2006, arts. 33 e 35. Jurisprudências relevantes citadas: STF, HC n. 143.641/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, j. 20.02.2018; STJ, RHC n. 57.334/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, j. 17.09.2015; TJMT, Enunciado Orientativo n. 6 e n. 42. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA: lustres membros da Terceira Câmara de Direito Criminal: Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado pela advogada Taís Costa Magalhães Ribeiro em face de Geovana Aparecida da Silva Campos, apontando como autoridade coatora o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Primavera do Leste/MT. Depreende-se, destes autos, que a paciente foi presa em 18 de janeiro de 2025, em decorrência de AuPrFl 1000454-92.2025.8.11.0037, cuja prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva, sob imputação dos crimes tráfico de drogas e associação para a prática do tráfico, previstos nos arts. 33 e 35 da Lei n. 11.343/2006, ocasião em que foram apreendidos: “23 (vinte e três) porções de substâncias análogas à COCAÍNA, na forma de pó, contidas em sacos plásticos do tipo “zip lock”, pesando 17,64g (dezessete gramas e sessenta e quatro decagramas); 04 (quatro) porções de substâncias análogas à COCAÍNA, na forma de pó, contidas em embalagens de plástico, pesando 62,06g (sessenta e duas gramas e seis decagramas); 06 (seis) porções de substância análogas à COCAÍNA, na forma de pedras, contidas em sacos plásticos do tipo “zip lock”, pesando 23,65g (vinte e três gramas e sessenta e cinco decagramas); 02 (duas) porções de substâncias análogas à METANFETAMINA, popularmente conhecido como “ECSTASY”, na forma de comprimidos, contidos em embalagens do tipo “zip lock”, pesando 1,28g (uma grama e vinte e oito decagrama) e 37 (trinta e sete) porções de substância análogas a SKANK ou SUPER MACONHA, no formato de vegetal seco, acondicionados em embalagens do tipo “zip lock”, pesando 373,09 g (trezentos e setenta e três gramas e nove decagramas), conforme Laudo Pericial n. 512.3.10.9871.2025.002720-A02.” (Extraído da denúncia – ID 184142070 do IP 1001318-33.2025.8.11.0037). Negrito no original Constata-se, também, que o Ministério Público ofereceu denúncia contra a paciente nos autos da Ação Penal n. 1001318-33.2025.8.11.0037, a qual foi recebida em 31 de março de 2025, tendo sido designada audiência de instrução e julgamento para o mês de julho deste ano. A impetrante sustenta, em síntese, que a paciente se encontra gestante, conforme laudo ultrassonográfico e carteira de gestante juntados aos autos, razão pela qual requer a conversão da prisão preventiva em domiciliar, nos termos do art. 318, IV e V, do Código de Processo Penal, com fundamento no Estatuto da Primeira Infância (Lei n. 13.257/2016), nas Regras de Bangkok e no entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus n. 143.641/SP. Aduz, ainda, que não há elementos concretos que justifiquem a manutenção da prisão preventiva, considerando a fragilidade da prova acusatória, uma vez que a prisão em flagrante decorreu de uma denúncia anônima recebida pelos agentes da Agência Regional de Inteligência (ARI), segundo a qual uma mulher estaria realizando entregas de drogas na modalidade "delivery" no bairro Poncho Verde, bem como do depoimento prestado pela suposta cúmplice da paciente, Andressa dos Santos Haak, que teria sido obtido mediante coação física e psicológica por parte dos policiais. Com base nas razões acima consignadas, requereu, liminarmente, o deferimento da prisão domiciliar, ou, subsidiariamente, que sejam aplicadas medidas cautelares diversas da prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, com a expedição de alvará de soltura. E, no mérito, a convolação da medida de urgência, porventura deferida, em definitiva. O pedido de urgência foi indeferido por intermédio das razões encontradiças no ID 269671760, dispensando as informações do juízo de primeiro grau. Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer que se vê no ID 274712895, manifesta-se pelo parcial conhecimento desta ação mandamental; e, na parte conhecida, pela denegação da ordem. É o relatório. V O T O R E L A T O R Cumpre esclarecer, de proêmio, que a alegação de ilegalidade da prisão em flagrante, que segundo a impetrante teria decorrido unicamente de denúncias anônimas e das declarações da coacusada obtidas mediante agressões físicas e psicológicas, demandam, para sua adequada aferição, o exame aprofundado das circunstâncias fáticas em que se desenvolveu a ação policial, o que ultrapassa os estreitos limites cognitivos do presente habeas corpus. Além disso, inexiste, nos autos, comprovação suficiente que permita, de plano, afastar a legalidade da prisão em flagrante. Com efeito, embora o exame de corpo de delito da coacusada Andressa dos Santos Haak tenha atestado a existência de lesão corporal de natureza leve, os policiais alegaram que as escoriações decorreram da intervenção necessária para restringir os movimentos dela, diante de sua tentativa de fuga do local dos fatos. De todo modo, embora referido laudo ostente relevância, sua valoração definitiva deve ocorrer no curso da instrução criminal, no momento próprio para o exame de mérito da ação penal. Ressalte-se, ademais, que o boletim de ocorrência registra sucinto relato no qual se atribui as escoriações encontradas no corpo da coacusada à necessidade de sua contenção física, em razão de tentativa de evasão por parte dela, conforme se depreende dos trechos a seguir transcritos: [...] DE IMEDIATO FOI DADO VOZ DE PRISÃO ONDE A SUSPEITA TENTOU CORRER SENDO NECESSÁRIO O USO MODERADO DA FORÇA PARA ALGEMA-LA. A SUSPEITA ANDRESSA RELATOU PARA EQUIPE QUE FAZ A VENDA DO ENTORPECENTE E QUE ESTARIA COMERCIALIZANDO JUNTAMENTE COM SUA PARCEIRA POR NOME DE GEOVANA ONDE ESTA ESTARIA JANTANDO NA CASA DA MÃE, LOCALIZADA NA RUA FÊNIX [...] A SUSPEITA GEOVANA SUA SÓCIA ESTARIA, E LA A MESMA FOI LOCALIZADA, DESSA FORMA FOI DADO VOZ DE PRISÃO EM CONTINUIDADE AO FLAGRANTE DE DELITO, SENDO ELA ENCAMINHADA PARA UPA (UNIDADE DE PRONTO ATENDIMENTO) ONDE SEGUNDO ELA ESTARIA PASSANDO MAL COM FALTA DE AR, APÓS ATENDIMENTO FOI ENCAMINHADA PARA DEL.POL. [...] A SUSPEITA ANDRESSA APRESENTA UM VERMELHIDÃO NO PESCOÇO E NO ROSTO AÇÃO DECORRENTE DO ATO DE ALGEMAMENTO. [...] (Trechos extraídos do boletim de ocorrência que se vê no ID 269671790, fl. 12-18). Dessa forma, é forçoso reconhecer que a análise dessa tese necessitaria de um exame aprofundado da ação principal, com ampla análise dos elementos de convicção e confronto das versões apresentadas pela paciente e pelos policiais militares que participaram da abordagem, o que é inviável na via eleita. Além disso, a tese de negativa de autoria não pode ser devidamente apreciada na via estreita do habeas corpus. Isso porque, os argumentos voltados ao afastamento das imputações penais exigem análise aprofundada do conjunto fático-probatório dos autos originários, especialmente quando envolvem questionamentos sobre a credibilidade das declarações prestadas, as quais teriam sido, segundo a impetrante, obtidas mediante coação e violência física por parte de policiais militares — matéria, portanto, insuscetível de exame nesta sede mandamental. A propósito, sobre a temática, não se pode olvidar que a Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal de Justiça ao editar o Enunciado Orientativo n. 42, consolidou seu entendimento, ao deixar assentado que “Não se revela cabível na via estreita do habeas corpus discussão acerca da autoria do delito.” Sendo assim, o envolvimento ou não da paciente nos delitos que foram imputados à sua pessoa é matéria cuja análise, conforme dito linhas volvidas, está reservada à ação penal, bastando, para justificar sua prisão cautelar, a existência da materialidade e dos indícios de autoria, que, aliás, estão suficientemente demonstrados nestes autos. Outrossim, a decisão que decretou a prisão preventiva da paciente encontra-se devidamente fundamentada, tendo como alicerce a expressiva quantidade de entorpecente apreendida, bem como a reiteração delitiva, uma vez que há registro de condenação recente da paciente pela prática do mesmo delito de tráfico de drogas, conforme pode ser visto a seguir: [...] Com relação à custodiada Geovana Aparecida da Silva Campos, denoto que há requerimento da Autoridade Policial pela decretação da prisão preventiva, requerimento este endossado pela representante do Ministério Público. Pois bem, examinando os artigos 310 e seguintes do CPP, entendo que deve ser acolhido o pedido, pois é caso de conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva, uma vez presentes os requisitos autorizadores da medida excepcional. Verifico que há demonstração da prova da materialidade e indícios suficientes de autoria delitiva que recai sobre as custodiadas, consoante demonstrado pelo laudo pericial preliminar de constatação de entorpecente e depoimento prestado pelos policiais que realizaram sua prisão, assim como destacado no boletim de ocorrência acima, configurando, portanto, o primeiro pressuposto da prisão preventiva, qual seja, o fumus comissi delicti. Quanto ao periculum libertatis, em consulta ao histórico criminal de Geovana, nota-se que, no ano passado, mais especificamente no mês de abril, Geovana foi presa, também no município de Primavera do Leste, pela prática do crime de tráfico de drogas (autos 1004500-61.2024.8.11.0037). Na oportunidade, foi agraciada com a liberdade provisória, sendo certo que em dezembro do ano passado, mais especificamente no dia 6/12/2024, foi condenada. Sendo imposta uma pena de 1 ano e 8 meses de reclusão pelo juízo da 1ª Vara Criminal de Primavera do Leste. Naquele momento, foram revogadas as medidas cautelares outrora existentes. Embora essa condenação criminal ainda não tenha transitado em julgado, pouco mais de um mês após a prolação desta sentença, observa-se que Geovana, infelizmente, vê-se envolvida, em tese, na prática da mesma infração criminal pela qual já foi condenada anteriormente. Cumpre ressaltar que na ação penal autuada sob o nº 1004500- 61.2024.8.11.0037, Geovana, em comunhão de esforços com outra mulher, utilizando-se de uma motocicleta, comercializava entorpecentes mediante “delivery” e com recebimento de pagamentos via Pix, fatos estes que muito se assemelham àqueles que foram narrados no presente auto de prisão em flagrante. Não se ignora o seu estado gravídico e não se ignora também os precedentes trazidos pela Defesa no sentido de solicitar a imposição de prisão domiciliar. No entanto, não se ignora também a existência de decisões do STJ e do STF, que autoriza uma imposição de prisão preventiva, desde que haja fundamentação idônea nos casos de mulheres gestantes ou mães de crianças de 12 anos, desde que embasado em motivação idônea. A saber: [...] No caso de Geovana, não obstante sua tenra idade (19 anos), viu-se envolvida, em menos de um ano, em duas situações criminosa da mesma natureza. Assim, sabendo-se que já tinha conhecimento de sua gestação, não levou isso em consideração ao se envolver neste novo episódio delituoso. Em tese, diante da prática de novos atos criminosos é que, nesse momento pré-processual, entende-se que a medida de prisão domiciliar não é cabível, não é proporcional e nem adequada à situação de Geovana, razão pela qual é o caso de converter a prisão em flagrante em prisão preventiva. Nada impede que o juízo natural reveja esta decisão, mas neste momento concluo pela necessidade de decretação da prisão preventiva para garantir a ordem pública. Reiterando a existência de situação excepcional apta a ensejar a decretação da medida cautelar extrema, isso porque é a segunda prisão de Geovana, envolvendo o mesmo contexto fático, em menos de um ano, assim como a suspeita, mesmo ciente de sua gravidez, teria prosseguido na empreitada supostamente criminosa e, além disso, teria solicitado o auxílio de Andressa. Ante o exposto, a luz dos fundamentos acima delineados, acolho a manifestação ministerial para CONVERTER A PRISÃO EM FLAGRANTE em PRISÃO PREVENTIVA em desfavor de GEOVANA APARECIDA DA SILVA CAMPOS, nos termos do artigo 310, II, c/c 312 e 313, I , todos do Código de Processo Penal. [...]. Destaques no original. Conforme apontado pelo magistrado na decisão acima reproduzida, a paciente já havia sido presa em flagrante no dia 24 de abril de 2024, pela suposta prática do crime de tráfico de entorpecentes. Contudo, foi beneficiada com liberdade provisória mediante a aplicação de medidas cautelares, concedida por este magistrado, em sede liminar, no âmbito do Habeas Corpus n. 1024386-60.2024.8.11.0000, em decisão prolatada no dia 5 de setembro de 2024, posteriormente confirmada pelo colegiado. Dessa forma, a manutenção da prisão provisória se justifica para evitar a reiteração delitiva da paciente. Acerca da matéria, a Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal de Justiça aprovou o Enunciado Orientativo n. 6, com a seguinte redação: O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência. Daí por que, não é demais repetir que agiu corretamente o juízo de primeiro grau, porque, em se tratando de custódia cautelar, a regra disposta no art. 312 do Código de Processo Penal, estabelece os seguintes requisitos para sua decretação: Art. 312: A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Destacamos Por outro vértice, a impetrante sustenta que a paciente faz jus à substituição da sua prisão cautelar por domiciliar, nos termos do art. 318 do Código de Processo Penal, eis que está grávida. Na espécie, não obstante a gravidade do crime imputado à paciente, a situação que se apresenta indica a possibilidade de se converter sua prisão preventiva em domiciliar, especialmente quando considerado o princípio da proteção integral à criança. Nesse ponto, é imperioso registrar que a adequada aplicação do referido dispositivo passa, antes de qualquer coisa, pela compreensão da sua razão, especificamente no que se refere ao destinatário da norma, eis que, apesar de, em princípio, parecer que a gestante e a mãe são as destinatárias diretas do benefício, indiscutivelmente, o dispositivo tutela os nascituros e crianças que, em detrimento da proteção integral e da prioridade absoluta que a ordem jurídica brasileira lhes confere, ou são obrigados a viver em condições desumanas, pelo menos na maioria das vezes, ou são afastados do convívio com suas mães, logo em uma fase da vida em na qual são definidos importantes traços da personalidade. Logo, tendo em vista a proteção integral e a prioridade absoluta conferidas a crianças e adolescentes, é certo que a substituição da prisão preventiva pela domiciliar, nos casos do inciso VI do art. 318 do Código de Processo Penal deva ser a regra, desde que não descure das restrições elencadas no art. 318-A do Código de Processo Penal. Sendo assim, embora a prisão cautelar da paciente seja compatível com a gravidade concreta da conduta que lhe foi imputada, a medida extrema é incompatível com a atual condição da paciente, enquanto gestante e responsável pela criança que se desenvolve em seu ventre, a quem certamente não podem ser estendidos os efeitos de eventual e futura pena aplicada àquela, nos termos preconizados no art. 5º, XLV, da Constituição Federal. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que, a despeito da gravidade do crime e a presença dos requisitos autorizadores do cárcere preventivo, sua conversão em prisão domiciliar é medida que se impõe quando restarem comprovados os requisitos do art. 318 do Código de Processo Penal, tal como se depreende do julgado prolatado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso em Habeas Corpus n. 57.334/RS, a seguir ementado: PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ARTIGOS 33, CAPUT, E 35 DA LEI 11.343/06. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELARDEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PLEITO DE PRISÃO DOMICILIAR PARA CUIDADOS ESPECIAIS DE CRIANÇA MENOR DE 6 ANOS. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 318, INCISO III, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. I - A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal. A prisão preventiva, portanto, enquanto medida de natureza cautelar, não pode ser utilizada como instrumento de punição antecipada do indiciado ou do réu, nem permite complementação de sua fundamentação pelas instâncias superiores (HC n. 93.498/MS, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJe de 18/10/2012). II - Na hipótese, o decreto prisional encontra-se devidamente fundamentado em dados concretos extraídos dos autos, notadamente a existência de interceptação telefônica que indica que a recorrente, em tese, integraria associação criminosa voltada para a prática de tráfico de entorpecentes, bem como a elevada quantidade e nocividade do entorpecente apreendido (10 buchas de cocaína mais 100 g de cocaína), dados que evidenciam a indispensabilidade da segregação para garantia da ordem pública. III -Não obstante, revela-se viável o parcial provimento do recurso para substituir a custódia preventiva da recorrente pela domiciliar, tendo em vista a documentação idônea apta a comprovar sua imprescindibilidade aos cuidados especiais de suas filhas menores (art. 318, III, do CPP). Recurso ordinário parcialmente provido, tão somente para, confirmando a liminar, substituir a prisão preventiva da recorrente por prisão domiciliar, nos termos do art. 318, III, do Código de Processo Penal, ficando a cargo do em. magistrado singular a fiscalização do cumprimento do benefício.(RHC 57.334/RS, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 17.09.2015 e publicado no DJe de 20.10.2015). Destacamos Se isso não bastasse, não se pode deixar de ter em mente que a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus n. 143.641, concedeu a ordem: para determinar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar - sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 do CPP - de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, nos termos do art. 2º do ECA e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto Legislativo 186/2008 e Lei 13.146/2015), relacionadas neste processo pelo DEPEN e outras autoridades estaduais, enquanto perdurar tal condição”. Ademais, a referida decisão foi estendida às demais as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e de pessoas com deficiência, bem assim às adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas em idêntica situação no território nacional. Negritamos Releva ponderar, mais uma vez, que a prisão domiciliar encontra amparo legal na proteção à maternidade e à infância, bem como na dignidade da pessoa humana, porquanto deve ser priorizado o bem-estar do menor e, momentaneamente, da gestante. Sendo assim, considerando o estado gestacional da paciente, a conversão da sua prisão provisória por prisão domiciliar, com o uso de tornozeleira, é medida que se impõe. Posto isso, em parcial consonância com o parecer da Procuradoria-geral de Justiça, julgo parcialmente procedente o pedido e, via de consequência, concedo em parte a ordem de habeas corpus almejada, para converter a prisão preventiva de Geovana Aparecida da Silva Campos em domiciliar, condicionada ao uso de monitoramento eletrônico por meio de tornozeleira (art. 319, IX, do Código de Processo Penal), sem prejuízo de outras medidas eventualmente fixadas pela autoridade coatora. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025
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