Processo nº 1001445-29.2024.8.11.0029
ID: 298506248
Tribunal: TJMT
Órgão: 1ª VARA DE CANARANA
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 1001445-29.2024.8.11.0029
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MANUELA CARNEIRO DOS SANTOS
OAB/MT XXXXXX
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ELISMAR FRANCISCO DA SILVA OLIVEIRA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE CANARANA SENTENÇA Processo: 1001445-29.2024.8.11.0029 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: GUSTAVO CECATTO Vistos etc. Trata-se de…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE CANARANA SENTENÇA Processo: 1001445-29.2024.8.11.0029 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: GUSTAVO CECATTO Vistos etc. Trata-se de ação penal instaurada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em desfavor de GUSTAVO CECATTO, qualificado nos autos, em razão da suposta prática dos crimes previstos nos artigos 148, § 1º, inciso I, 129, §13 e 147, caput, todos do Código Penal, com as implicações da Lei nº 11.340/2006, em concurso material (art. 69, do CP). A denúncia narrou os seguintes fatos (Num. 169639138): Consta nos autos do inquérito policial incluso que, no dia 01 de junho de 2024, por volta das 07h, em uma residência situada nesta cidade e comarca de CanaranaMT, o denunciado GUSTAVO CECATTO, consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, (i) privou a liberdade da vítima Luana Biguelini Porsch, sua companheira, mediante cárcere privado, bem como (ii) ofendeu sua integridade corporal, por razões da condição do sexo feminino, em contexto de violência doméstica e familiar, causando-lhe lesão corporal, e (iii) ameaçou a referida vítima, por palavras, por gesto ou outro meio simbólico, de causar mal injusto e grave, condutas perpetradas em decorrência de relação íntima de afeto havida entre eles, conforme boletim de ocorrência nº 2024.170025. A denúncia foi recebida em 19.09.2024 (Num. 169646100). O réu foi citado pessoalmente (Num. 171360658), e apresentou resposta à acusação (Num. 172279373). As preliminares suscitadas na resposta à acusação foram rejeitadas, as hipóteses de absolvição sumária foram afastadas e foi designada audiência de instrução e julgamento (Num. 179412003). Durante a audiência de instrução e julgamento (Num. 186218619) foi ouvida a vítima, inquiridas as testemunhas e interrogados os réus. Foi encerrada a instrução. O MINISTÉRIO PÚBLICO apresentou memoriais (Num. 187120973) e formulou os seguintes requerimentos: 1. A procedência de Vossa Excelência a condenação do denunciado Gustavo Cecatto nas sanções dos artigos 148, § 1º, inciso I, 129, §13 e 147, caput, todos do Código Penal, com as implicações da Lei nº 11.340/2006, em concurso material (art. 69, do CP), em concurso material de crimes, aplicando o preceito secundário da norma incriminadora, de forma que seja necessária e suficiente à prevenção e reparação do crime. 2. A fixação de indenização mínima à vítima no valor correspondente a um salário-mínimo, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. O réu GUSTAVO CECATTO apresentou memoriais (Num. 187530056) e formulou os seguintes requerimentos: 1. Sua absolvição em razão da insuficiência de provas, nos termos do art. 386, VII do CPP. 2. Subsidiariamente, o reconhecimento dos predicativos pessoais favoráveis, a fixação da pena no mínimo legal e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. 3. A concessão da justiça gratuita sobre os atos indenizatórios e custas judiciais. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Presentes os pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, ausentes nulidades e vícios e não tendo sido suscitadas questões preliminares, passo ao julgamento do mérito. A MATERIALIDADE encontra-se consubstanciada pelo Boletim de Ocorrência n.º 2024.170025 (Num. 164313888), Termo de Representação n.º 2024.16.273723 (Num. 164314541 - Pág. 16), Relatório de Atendimento de Vítima de Violência Doméstica n.º 2024.13.61742 (Num. 164314541 - Pág. 18/20), assim como pelos demais elementos informativos colhidos na fase investigativa e pelas provas colhidas em Juízo mediante contraditório e ampla defesa. Analiso a AUTORIA. A vítima LUANA BIGUELINI PORSCH narrou em juízo que, à noite, foi a um show como réu e sua família em um ônibus. O réu ingeriu muita bebida alcoólica na ida. As brigas eram constantes por causa da bebida e quando ele bebia. As brigas começaram naquele momento porque a declarante solicitou bastante para o réu parar de beber um pouco e não exagerar, mas o réu disse que não tinha problema e não era para se preocupar, pois iriam voltar dormindo no ônibus e não iriam brigar. A declarante disse que estava tudo bem que iriam se divertir. O réu ingeriu uísque durante o show e, quando entraram no ônibus para retornar, ele começou a tomar cerveja. Nesse momento, começaram a brigar de novo, porque o réu estava misturando bebidas, e vieram brigando durante o trajeto do retorno, esclarecendo que todos que estavam no ônibus estavam quietos e o réu era o único que estava exaltado e bebendo. Quando chegaram à casa do réu, a declarante pegou seu cachorro e foi direto para o quarto do réu. Havia muita gente na casa do réu, sendo que este foi ajudar sua mãe e a declarante não sabe o que eles ficaram fazendo. A declarante vestiu pijama e deitou. Em seguida, o réu entrou no quarto reclamando e a declarante fingiu que estava dormindo para tentar evitar uma briga, contudo o réu se sentou na cama e continuou brigando. A declarante pediu ao réu para parar de brigar e para conversarem no dia seguinte, contudo ele não parou. Como o réu estava falando alto, o cachorro da declarante rosnou para ele e o réu foi para cima do animal. A declarante disse para o réu que não dava mais, que iria para a casa dela e que conversariam no dia seguinte, mas o réu disse que a declarante não sairia do local. A declarante reafirmou que iria para sua casa, pois não iria permanecer ali escutando as baixarias pronunciadas pelo réu. O réu trancou a porta do quarto e a declarante se levantou, trocou a roupa e pegou suas coisas, sendo que continuavam discutindo neste momento. A cada vez que a declarante tentou chegar à porta, o réu a pegou pelos braços e a jogou sobre a cama. Quando a declarante percebeu que o réu não ia parar e que não tinha jeito, ficou desesperada, começou a gritar por socorro e a bater na porta e nas paredes. Quando Andreia apareceu, ela pediu várias vezes para Gustavo abrir a porta, mas ele não o fez. Em seguida, Andreia disse para a declarante ir para a janela. Conforme a declarante conseguia chegar perto da janela, o réu a jogava na cama novamente. Quando conseguiu abrir a janela, o réu a chutou bastante nas pernas, esclarecendo que suas canelas ficaram bem roxas. O réu também investiu contra o cachorro da declarante, mas a declarante conseguiu pegar o animal e “jogá-lo” para Andreia, que estava do lado de fora da casa. Andreia guardou o cachorro no canil e ligou para o tio do réu pedindo ajuda. A declarante acha que o réu perdeu a chave da porta, porque ele pulou a janela do quarto e a declarante saiu do quarto logo em seguida pelo mesmo local. O réu entrou no carro dele e saiu. A mãe do réu colocou a declarante no quarto dela e pediu que a declarante não saísse enquanto ela não voltasse. Logo em seguida, o réu retornou com o carro e o tio dele também chegou ao local. Depois, a declarante foi levada para sua casa. Na época dos fatos, a declarante namorava o réu, contudo, naquele dia iria dormir na casa dele, pois chegaram cedo. A declarante namorou o réu desde os seus 16 (dezesseis) anos de idade, entre idas e vindas. Os fatos aconteceram em um sábado e a declarante pegou o ônibus e retornou para a cidade de Goiânia-GO, onde residia, no domingo à noite. Depois dos fatos, a declarante e o réu até tentaram conversar, mas sem sucesso algum, pois ele sempre culpava a declarante pelos fatos. Desta forma, a declarante o bloqueou e registrou o boletim de ocorrência. A declarante conversou várias vezes com o réu em agosto, mas ele a chantageava dizendo que se não o desbloqueasse ele iria até o seu trabalho, ou não iria parar de procura-la, ou senão iria se matar, ou senão não aguentaria. Atualmente, o réu está namorando, mas ainda procura a declarante e faz várias ligações durante a madrugada ou aos finais de semana, utilizando número restrito, ou seu próprio número ou o telefone de amigos em comum. Nem o novo namoro fez o réu parar de procurar a declarante, que não sabe o que fazer. No momento que o réu proferiu ameaças à declarante, estavam apenas ambos dentro do quarto, não sabendo se a mãe dele chegou a escutar. O réu havia ingerido bebida alcoólica e estava muito alterado, irreconhecível, esclarecendo que nunca havia visto ele daquela forma. Após os fatos, a declarante conversou e se encontrou com o réu, mas ele continuou agindo de forma agressiva, possessiva e ciumenta, ou seja, não mudou nada. Após os fatos, a declarante voltou a morar em Canarana após a conclusão de seus estudos, contudo foi residir com os pais, pois não sente segurança de morar sozinha por causa do réu. A declarante tentou se relacionar com outras pessoas, mas o réu mandou mensagens para elas. Até hoje o réu atrapalha a rotina da declarante. Esclareceu que chegaram do show por volta das 05h30min e a declarante chegou à sua casa por volta das 08h00min, sendo que permaneceu dentro do quarto todo esse tempo, pois foi levada para sua casa logo que saiu do quarto. A declarante não sabe o tempo exato que permaneceu trancada no quarto, mas se lembra que foi muito tempo, pois a declarante se levantou para ir embora logo que o réu começou a xingá-la, esclarecendo que a maior parte da discussão foi a declarante tentando sair do quarto. A declarante não viu armas no quarto. A janela estava apenas encostada e havia uma cortina na frente. A declarante foi até a delegacia acompanhada por seu pai para registrar o boletim de ocorrência. O relacionamento era conturbado e havia muitas brigas, pois o réu era uma pessoa difícil de lidar, era estourado e agressivo e sempre brigava por variados motivos, como ir embora de uma festa, parar de beber, se sairiam ou ficariam em casa, ou seja, tudo se resumia em brigas. O réu pegava a declarante pelos braços, a levantava do chão e a jogava sobre a cama, além de ter chutado bastante. Durante a investigação policial, a vítima LUANA BIGUELINI PORSCH prestou as seguintes declarações (Num. 164314541 - Pág. 11/12): “QUE, a declarante namorou com a pessoa de Gustavo Cecatto por muitos anos, um relacionamento que sempre foi marcado por altos e baixos, especialmente devido ao temperamento dele. QUE, a declarante tentou várias vezes afastar-se para garantir sua segurança, inclusive obtendo medidas protetivas, mas ele sempre encontrava maneiras de contornar essas barreiras, muitas vezes usando celulares de amigos para lhe enviar mensagens. QUE, o episódio que a levou a procurar a polícia novamente ocorreu quando, na tentativa de acreditar nas promessas de mudança de Gustavo, decidiu acompanhá-lo a um evento em Gaúcha do Norte. Durante a viagem, ele bebeu excessivamente, apesar dos apelos da declarante para que parasse, antecipando problemas. Já de volta em Canarana, em sua casa, ele se tornou verbalmente abusivo quando a declarante por medo manifestou a intenção de deixá-lo novamente. QUE, naquele momento, Gustavo a trancou em seu quarto. QUE, a declarante tentou abrir a porta várias vezes, e diante de sua incapacidade, começou a gritar por ajuda. QUE, a mãe de Gustavo, do lado de fora, tentava intervir sem sucesso. Em uma tentativa de silenciar a declarante, Gustavo lhe atirou na cama e começou a lhe chutar, causando várias lesões pelo corpo. QUE, ele frequentemente ameaça a declarante dizendo que se não ficar com ele, ele não permitirá que fique com mais ninguém. QUE, ele sempre usou seu passado e suas amizades alegadas com membros do Comando Vermelho para me intimidar. QUE, atualmente, reside e estuda em Goiânia, mas com o término dos seus estudos, planeja retornar a Canarana. Essa situação lhe deixa extremamente apreensiva sobre sua segurança” (sic). A informante ANDREIA CECATTO narrou em juízo que é mãe do réu. Afirmou que, no dia 31, um grupo de pessoas formado por familiares e amigos da declarante, incluindo seu marido, o réu e a vítima, foi a um show do cantor Leonardo em Gaúcha do Norte-MT. Todos foram e voltaram no mesmo micro-ônibus e todos beberam e estavam alterados. Chegaram em casa clareando o dia e, como estava com visitas, a declarante foi para a cozinha preparar o café da manhã. O réu e a vítima foram para o quarto. A declarante não escutou nada, porque estava preparando o café para as visitas, as quais foram embora logo em seguida, esclarecendo que isso demorou cerca de 01 (uma) hora. Quando a declarante foi se deitar, escutou Luana chorando. Então foi abrir a porta do quarto, mas estava trancada. A declarante foi até a janela do quarto bateu e disse para Gustavo abrir a porta, ocasião em que Gustavo abriu a janela e foi para o banheiro. A declarante viu que Luana estava chorando e o cachorrinho estava por ali. Quando Gustavo foi para o banheiro, Luana viu a chave da porta sobre a cama e fez menção de pegar, mas a declarante disse para ela lhe entregar o cachorro e sair do quarto pela janela, tendo a declarante retirado a vítima do quarto pela janela. A porta estava trancada e deve ter permanecido assim por aproximadamente 01 (uma) hora. A declarante não presenciou nada. A vítima não saiu do quarto pela porta, pois estava trancada. A declarante não percebeu se a vítima apresentava vermelhidão, pois havia ingerido bebida alcoólica. A declarante acha que a briga aconteceu por causa do cachorro, mas não tem certeza, pois não presenciou. Afirmou que não seria possível à declarante ouvir gritos da vítima no local onde estava, mas as pessoas que estavam próximo à piscina teriam escutado. Réu e vítima sempre brigavam por ciúmes quando bebiam, esclarecendo que ambos ingeriram bebida alcoólica no dia dos fatos. A declarante se lembra dos fatos vagamente, pois havia bebido, estava cansada e já não é mais nova, mas acredita que o motivo da briga foi o fato de a vítima querer colocar o cachorro em cima da cama. A porta do quarto estava trancada, mas os fatos aconteceram cerca de uma hora após chegarem da festa no micro-ônibus. Réu e vítima se encontraram após os fatos, mas não reataram o relacionamento, esclarecendo que não teve acesso às conversas deles. Esclareceu que esse tipo de situação era normal entre réu e vítima quando faziam uso de bebida alcoólica. Durante seu interrogatório judicial, o réu GUSTAVO CECATTO narrou que os fatos narrados na denúncia não são verdadeiros, esclarecendo chegaram de Gaúcha do Norte-MT alterados, pois haviam bebido, e discutiram. A família do declarante estava do lado de fora da casa. O declarante segurou a vítima e pediu que ela não saísse para não brigarem na presença dos familiares. Afirmou que não manteve a vítima em cárcere privado. Narrou que foi o declarante quem abriu a janela do quarto e que a vítima optou por sair do local pela janela mesmo estando a porta aberta. A vítima ficou com lesão corporal por ser muito branca, pois o declarante a segurou e a colocou na cama para que ela não saísse do quarto. O relacionamento entre o réu e a vítima durou aproximadamente 06 (seis) anos. Esclareceu que estavam em 08 (oito) pessoas e todas ingeriram bebida alcoólica. Afirmou não ser uma pessoa possessiva, esclarecendo que o maior problema do relacionamento era o pai de Luana, que não o aceitava. Afirmou não ter ameaçado a vítima, esclarecendo que as mensagens trocadas com a vítima foram da boca para fora, sem nada plausível. A vítima nunca saiu de uma festa por causa da presença do declarante, mas o contrário já aconteceu. O declarante e a vítima chegaram a se encontrar e a conversar após os fatos, esclarecendo que até tentaram reatar o relacionamento, mas não deu certo, porque concluíram que já estava desgastado. A vítima disse para o declarante que foi induzido pelo pai dela a registrar o boletim de ocorrência. As visitas que estavam na casa estavam na cozinha da residência, que fica do lado de fora. Analisadas as provas carreadas aos autos, à luz dos artigos 155 e 156 do CPP, concluo que a pretensão acusatória é parcialmente procedente. Vejamos. FATOS 01 E 02 – CÁRCERE PRIVADO QUALIFICADO E LESÃO CORPORAL PRATICADA CONTRA A MULHER, POR RAZÕES DA CONDIÇÃO DO SEXO FEMININO – ARTIGOS 148, §1º, INCISO I, E 129, §13, CP Consta da denúncia que o réu Gustavo Cecatto, no dia 1º de junho de 2024, por volta das 07h, em sua residência, nesta cidade e comarca de Canarana-MT, consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, (i) privou a liberdade da vítima Luana Biguelini Porsch, sua companheira, mediante cárcere privado, bem como (ii) ofendeu sua integridade corporal, por razões da condição do sexo feminino, em contexto de violência doméstica e familiar, causando-lhe lesão corporal. A denúncia narrou os seguintes fatos: Segundo consta dos autos, a ofendida acompanhou o denunciado, juntamente com alguns amigos, a um evento em Gaúcha do Norte/MT. Durante a viagem, o implicado ingeriu bebida alcoólica em excesso, desconsiderando os apelos da vítima para que interrompesse tal conduta, já prevendo as consequências da ingestão. Após o retorno à cidade de Canarana/MT, na residência do denunciado, ele tornou-se verbalmente abusivo quando a ofendida, temendo por sua segurança, manifestou a intenção de deixá-lo. Na sequência, o increpado trancou-a em seu quarto. Na ocasião, a vítima tentou abrir a porta diversas vezes e, diante da impossibilidade, começou a gritar por ajuda. Do lado de fora, a senhora Andreia Cecatto, genitora do indiciado, solicitava que ele abrisse a porta. Para conter a ofendida, o denunciado a lançou sobre a cama e lhe desferiu chutes, causando-lhe lesões corporais, conforme fotografias de Id. 164314541 - Pág. 18/20. Para que se configure o crime de cárcere privado, previsto no artigo 148 do Código Penal, a lei exige que o agente prive a vítima de sua liberdade de locomoção por lapso temporal razoável. O dolo, por sua vez, é a vontade de cercear a liberdade de locomoção da vítima. No que tange ao crime de lesão corporal praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, previsto no artigo 129, §13, CP, para sua configuração exige-se que o agente pratique uma ofensa à integridade corporal da vítima, causando-lhe dano, ou seja, alteração interna ou externa, bem como, que o crime seja praticado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher. As provas produzidas na instrução criminal ratificaram os fatos narrados na denúncia, senão vejamos. Inicialmente, destaco que restou comprovado que réu e vítima mantinham relação íntima de afeto (namoro) à época dos fatos, razão pela qual os fatos narrados na denúncia configuram violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do artigo 5º, inciso III, da Lei n.º 11.340/2006. A vítima Luana Biguelini Porsch narrou em juízo, em síntese, que, após chegarem da viagem a Gaúcha do Norte-MT, ela foi para o quarto do réu, vestiu um pijama e se deitou, contudo o denunciado Gustavo chegou ao local em seguida e iniciou uma discussão. Quando a vítima externou sua intenção de ir embora para sua casa, o réu trancou a porta do quarto e a impediu de sair do local. Esclareceu que o réu a pegou pelos braços e a jogou sobre a cama todas as vezes que tentou abrir a porta. Afirmou que, quando percebeu que o réu não iria parar, entrou em desespero, gritou por socorro e bateu na porta e nas paredes. Em seguida, Andreia, mãe do réu, chegou e pediu para Gustavo abrir a porta, mas ele se recusou. Em seguida, Andreia disse para a vítima ir para a janela, contudo o réu tentou impedi-la, pois ele a jogava novamente sobre a cama toda vez que se aproximava. Afirmou que quando conseguiu abrir a janela, o réu a chutou bastante nas pernas, causando lesões corporais. Em seguida, a ofendida entregou o cachorro para Andreia e saiu do quarto pela janela. A vítima aduziu ainda não saber o tempo exato que sua liberdade foi cerceada, mas afirmou que foi por muito tempo. Destaco que o depoimento judicial da vítima Luana está em harmonia com seu depoimento extrajudicial (Num. 164314541 - Pág. 11/12) e com o Relatório de Atendimento de Vítima de Violência Doméstica n.º 2024.13.61742 (Num. 164314541 - Pág. 18/20), que possui as fotografias das lesões (hematomas) sofridas pela vítima em seus braços e pernas. Assim, o depoimento firme e coerente da vítima, corroborado pelas demais provas produzidas na ação penal, é elemento idôneo para embasar a condenação, mormente porque os fatos em apuração foram praticados mediante violência doméstica e familiar contra a mulher no interior da residência, longe das vistas de qualquer testemunha presencial. Nesse sentido: (...) A jurisprudência do STJ é consolidada no sentido de que, em casos de violência doméstica, a palavra da vítima tem valor probatório relevante, não sendo necessária a presença de outras testemunhas para fundamentar a condenação (...) (STJ. AgRg no AREsp n. 2.481.719/DF, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 30/10/2024.) (...) Em crimes de violência doméstica, a palavra da vítima possui especial relevância probatória quando corroborada por outros elementos de prova (...) (TJMT. N.U 1000008-14.2023.8.11.0020, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 05/11/2024, Publicado no DJE 08/11/2024). A informante Andreia Cecatto, genitora do réu, narrou em juízo que se recorda muito pouco dos fatos, esclarecendo que estava na cozinha da residência preparando café da manhã para as visitas e que, quando foi para seu quarto, ouviu a vítima Luana chorando. Esclareceu que foi até o quarto do réu e se deparou com a porta trancada, ocasião em que foi até a janela do quarto e pediu para o acusado abri-la, sendo atendida. Afirmou que retirou a vítima do quarto pela janela e que os fatos não perduraram por mais de 01 (uma) hora. O réu Gustavo, por sua vez, afirmou em seu interrogatório judicial que impediu a vítima de sair do quarto para que seus parentes não presenciassem a briga do casal, confirmando que a pegou pelos braços e a colocou na cama, resultando em lesão por se tratar de uma pessoa muito branca. No que tange ao crime de cárcere privado, verifico que restou comprovado que o réu Gustavo privou a vítima Luana de sua liberdade por tempo juridicamente relevante, pois trancou a porta do quarto e a impediu de sair do local. O dolo está suficientemente demonstrado, pois o réu impediu a vítima de sair do quarto quando ela tentou abrir a porta e, em seguida, a janela, pegando-a pelos braços e a jogando sobre a cama várias vezes. Destaco que a vítima conseguiu sair do quarto apenas depois da intervenção da mãe do réu, que, para além de pedir para o réu abrir a porta, orientou a vítima a ir para a janela. Restou comprovado que foi a vítima quem abriu a janela, o que se extrai das declarações prestadas por Luana em juízo e das declarações extrajudiciais da vítima Luana (Num. 164314541 - Pág. 11/12) e da informante Andreia (Num. 168832477), não se comprovando a versão do réu no sentido de que ele teria aberto a janela espontaneamente. No que diz respeito à duração da privação da liberdade da vítima, esta narrou em juízo que ficou muito tempo discutindo com o réu e tentando sair do quarto, o que perdurou praticamente desde o momento que chegaram de viagem até o momento que conseguiu sair do quarto. Assim, a privação da liberdade durou por tempo juridicamente relevante, pois a vítima se viu tolhida de seu direito de ir e vir por lapso temporal que não pode ser tido como instantâneo, ou mesmo por poucos minutos, ou seja, 05 (cinco) a 10 (dez) minutos, mas por tempo suficiente para infundir-lhe desespero e ensejar a intervenção da mãe do acusado. Nesse sentido: DIREITO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE CÁRCERE PRIVADO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ORDEM DENEGADA. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado em favor de paciente condenada por crimes de tortura e cárcere privado qualificado, com pedido de absolvição quanto ao crime de cárcere privado, alegando ausência de dolo e tempo ínfimo de contenção. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se o habeas corpus pode ser utilizado para revisar a condenação por cárcere privado, considerando a alegação de ausência de dolo e a duração do cerceamento da liberdade. 3. Determinar se há flagrante ilegalidade na condenação que justifique a concessão da ordem de habeas corpus. III. Razões de decidir 4. O habeas corpus não é substitutivo de recurso ordinário, sendo inadequado para reexame de provas e fatos já analisados nas instâncias ordinárias. 5. A condenação foi fundamentada em elementos concretos que demonstram o dolo específico do crime de cárcere privado, não havendo flagrante ilegalidade a ser reparada. 6. O tempo de privação da liberdade, ainda que breve, é suficiente para caracterizar o crime de cárcere privado, desde que presente o elemento subjetivo do tipo penal. IV. Dispositivo e tese 7. Ordem denegada. Tese de julgamento: "1. O habeas corpus não é substitutivo de recurso ordinário e não se presta ao reexame de provas. 2. A caracterização do crime de cárcere privado não exige duração mínima da privação de liberdade, bastando o dolo específico e o efetivo cerceamento da liberdade da vítima". (STJ. HC n. 874.072/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 19/3/2025, DJEN de 27/3/2025). Logo, a conduta praticada pelo réu Gustavo se amolda perfeitamente ao tipo penal descrito no artigo 148 do Código Penal. A qualificadora prevista no artigo 148, §1º, inciso I, CP, deve ser afastada, pois tal dispositivo legal tem por finalidade a proteção da família, de modo que a expressão “companheiro do agente” deve ser interpretada como o companheiro em uma união estável, o que não se verifica neste caso, pois restou comprovado que a relação existente entre réu e vítima era apenas um namoro. No que tange ao crime de lesão corporal, restou comprovado que o réu Gustavo pegou a vítima Luana pelos braços diversas vezes e a jogou sobre a cama, além de haver desferido chutes em suas pernas, causando as lesões corporais descritas pela ofendida e demonstradas no Relatório de Atendimento de Vítima de Violência Doméstica n.º 2024.13.61742 (Num. 164314541 - Pág. 18/20). Destaco que a ausência de exame de corpo de delito realizado nos moldes do artigo 158 do CPP não enseja a absolvição automática do réu, pois as lesões corporais restaram demonstradas pelo depoimento firme e coerente da vítima e pelo Relatório de Atendimento de Vítima de Violência Doméstica n.º 2024.13.61742 (Num. 164314541 - Pág. 18/20), que possui anexo fotográfico exibindo as lesões corporais (hematomas) sofridas pela vítima em seus braços e pernas. Nesse sentido, o entendimento jurisprudencial firmado pelo C.STJ. Vejamos: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. LESÃO CORPORAL EM ÂMBITO DOMÉSTICO. NÃO REALIZAÇÃO DE EXAME DE CORPO DE DELITO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. ALEGADA AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA. INOCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO BASEADA EM ELEMENTOS CONCRETOS. ACOLHIMENTO DA TESE DEFENSIVA A RECLAMAR REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Como é de conhecimento, esta Corte Superior já se manifestou no sentido de que, em crime de lesão corporal praticado no contexto de violência doméstica, o exame de corpo de delito propriamente dito pode ser dispensado, acaso a materialidade tenha sido demonstrada por outros meios de prova. 2. Na hipótese dos autos, conforme destacado pela Corte local, a condenação do paciente pelo crime de lesão corporal no contexto de violência doméstica foi configurada ante o pormenorizado depoimento da vítima (companheira do paciente), informando com clareza o modo como foi agredida e as datas dos fatos, além das fotografias anexadas aos autos que demonstram as lesões sofridas no rosto da vítima e das provas testemunhais colhidas ao longo da instrução criminal, especialmente o relato de um dos policiais que avistou a vítima logo após as agressões, a qual lhe mostrou as lesões decorrentes da agressão praticada pelo paciente, afirmando terem sido causadas por socos na sua face. Portanto, ao contrário do alegado pela defesa, a condenação do paciente pelo crime previsto no artigo 129, §9°, do Código Penal, baseou-se em elementos concretos, não deixando dúvidas acerca da autoria e da materialidade do delito. 3. Nesse contexto, para alterar o entendimento da Corte Estadual (soberana na análise dos fatos e provas) e atender ao pleito de absolvição por insuficiência de provas seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, o que é sabidamente inviável na via estreita do habeas corpus. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ. AgRg no HC n. 843.482/SE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 11/9/2023, DJe de 13/9/2023). AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME DE LESÃO CORPORAL OCORRIDO NO ÂMBITO DOMÉSTICO. EXAME DE CORPO DE DELITO. AUSÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO POR OUTROS MEIOS. POSSIBILIDADE. PALAVRA DA VÍTIMA QUE ASSUME ESPECIAL IMPORTÂNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO NEGATIVAS. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO. REGIME PRISIONAL INICIAL MAIS GRAVOSO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. O exame de corpo de delito é prescindível para a configuração do delito de lesão corporal ocorrido no âmbito doméstico, podendo a materialidade ser comprovada por outros meios. 2. Ademais, quanto aos crimes cometidos no contexto de violência doméstica e familiar, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a palavra da vítima assume especial importância, pois normalmente são cometidos sem testemunhas. Precedentes. 3. Ao analisar as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, as instâncias de origem consignaram que as circunstâncias do crime despontam da normalidade, uma vez que a vítima foi esganada, recebeu socos, chutes, puxões de cabelo, apanhou com um cinto e perdeu a consciência, mais de uma vez. 4. Assim, o Juízo de origem apresentou fundamentos suficientes para indicar a gravidade concreta do crime, destacando as circunstâncias do crime desfavoráveis ao apelante, as quais extrapolam, em muito, as elementares do tipo. 5. Mantida a pena-base acima do mínimo legal, pela existência de circunstância judicial negativa, inviável a fixação de regime prisional inicialmente mais brando, ante o previsto no art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal. 6. Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg no HC n. 825.448/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/2/2024, DJe de 14/2/2024). Desta forma, a conduta do réu se amolda perfeitamente ao tipo penal previsto no artigo 129, §13, do Código Penal, com a redação da Lei n.º 14.188/2021, vigente à época dos fatos. Nestes termos, a condenação do réu Gustavo Cecatto às penas cominadas no artigo 129, §13, CP, com a redação da Lei n.º 14.188/2021, e no artigo 148, caput, CP, é medida que decorre das provas produzidas nesta ação penal. Por outro lado, o requerimento de absolvição por insuficiência de provas não merece acolhimento, eis que demonstrada a prática dos crimes de lesão corporal e cárcere privado. No que tange à aplicação da pena, teço as seguintes considerações. As circunstâncias dos crimes de lesão corporal e cárcere privado são negativas, pois o réu praticou os crimes em estado de embriaguez. Nesse sentido: (...) 2. Na hipótese, a valoração negativa do vetor atinente às circunstâncias do delito está suficientemente fundamentada, tendo sido declinado elemento que emprestou à conduta do Paciente especial reprovabilidade e que não se afigura inerente ao próprio tipo penal, qual seja, a prática do delito em estado de embriaguez. (...) (STJ. AgRg no HC n. 530.633/ES, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe de 12/11/2020). A agravante prevista no artigo 61, inciso OO, alínea “f”, do Código Penal, deve ser aplicada na segunda fase da dosimetria da pena em relação ao crime de cárcere privado, pois a infração penal foi praticada mediante violência doméstica e familiar contra a mulher. FATO 03 – AMEAÇA – ARTIGO 147, CAPUT, CP Consta da denúncia que o réu Gustavo Cecatto, no dia 1º de junho de 2024, por volta das 07h, em sua residência, nesta cidade e comarca de Canarana-MT, consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, ameaçou a referida vítima, por palavras, por gesto ou outro meio simbólico, de causar mal injusto e grave, condutas perpetradas em decorrência de relação íntima de afeto havida entre eles, conforme boletim de ocorrência nº 2024.170025. A denúncia narrou os seguintes fatos: (...) Além disso, infere-se que GUSTAVO frequentemente ameaçava a vítima dizendo “se você não ficar comigo, não ficará com mais ninguém”, e utilizava supostas amizades com membros do Comando Vermelho como uma forma de intimidação. (...) Durante sua oitiva extrajudicial (Num. 164314541 - Pág. 11/12), a vítima Luana Biguelini Porsch narrou “QUE, ele [Gustavo] frequentemente ameaça a declarante dizendo que se não ficar com ele, ele não permitirá que fique com mais ninguém. QUE, ele sempre usou seu passado e suas amizades alegadas com membros do Comando Vermelho para me intimidar” (sic). Entretanto, ao ser ouvida na fase judicial, a vítima Luana Biguelini Porsch não ratificou os fatos narrados na denúncia. Além disso, não há outras provas ratificando os fatos narrados na denúncia. Desta forma, a absolvição, em relação ao crime de ameaça, é medida que se impõe, pois a condenação não pode se fundamentar apenas nos elementos extrajudiciais. Nesse sentido: INQUÉRITO - ELEMENTOS - CONDENAÇÃO. Surge insubsistente pronunciamento condenatório baseado, unicamente, em elementos coligidos na fase de inquérito. (STF. HC 96356/RS. Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO. Julgamento: 24/08/2010. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação DJe-179 DIVULG 23-09-2010 PUBLIC 24-09-2010). Diante de todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na denúncia para o fim de: 1. CONDENAR o réu GUSTAVO CECATTO, qualificado nos autos, às penas cominadas nos artigos 129, §13, e 148, caput, ambos do Código Penal, com as implicações da Lei n.º 11.340/2006. 2. ABSOLVER o réu GUSTAVO CECATTO, qualificado nos autos, em relação ao crime previsto no artigo 147, caput, do Código Penal, com fundamento legal no artigo 386, inciso VII, CPP. Passo à dosimetria da pena, observando as diretrizes contidas na Constituição Federal, artigo 5º, inciso XLVI, e no Código Penal, artigo 68. 1. DOSIMETRIA DA PENA – ARTIGO 129, §13, CÓDIGO PENAL, COM A REDAÇÃO DA LEI N.º 14.188/2021 O delito previsto no artigo 129, §13, CP, com a redação da Lei n.º 14.188/2021, possui pena privativa de liberdade abstratamente cominada em 01 (um) a 04 (quatro) anos de reclusão. A culpabilidade com que agiu o réu é normal. O réu ostenta bons antecedentes. No que se refere à conduta social e a personalidade, inexistem nos autos elementos concretos para auferi-las. Os motivos do delito não fogem à objetividade jurídica do crime praticado. As circunstâncias do crime são negativas, conforme exposto na fundamentação. Quanto às consequências do delito, são normais à espécie, não exigindo maior reprimenda do que aquela já fixada pelo legislador. O comportamento da vítima igualmente não requer valoração extrapenal. Assim, considerando-se a incidência de uma circunstância judicial negativa, valoro-a em 1/8 sobre o intervalo, na esteira do entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, e fixo a pena-base em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Vejamos o entendimento do C.STJ sobre o tema: (...) No que tange à exasperação da basilar, pela existência de circunstância judicial negativa, essa deve seguir o parâmetro de 1/6 sobre a pena-base ou 1/8 do intervalo entre as penas mínima e máxima, para cada fator desfavorável. Tais frações constituem critérios aceitos pela jurisprudência do STJ, mas não se revestem de caráter obrigatório, exigindo-se apenas que seja proporcional e concretamente justificado o critério utilizado pelas instâncias ordinárias. (...) (STJ - AgRg no AREsp n. 2.418.792/MS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 19/12/2023.) Na segunda fase, verifico não concorrerem agravantes e atenuantes, de modo que mantenho a pena intermediária em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Por fim, não verifico a concorrência entre causas especiais de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva a pena em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. 2. DOSIMETRIA DA PENA – ARTIGO 148, CAPUT, CÓDIGO PENAL O delito previsto no artigo 148, caput, CP, possui pena privativa de liberdade abstratamente cominada em 01 (um) a 03 (três) anos de reclusão. A culpabilidade com que agiu o réu é normal. O réu ostenta bons antecedentes. No que se refere à conduta social e a personalidade, inexistem nos autos elementos concretos para auferi-las. Os motivos do delito não fogem à objetividade jurídica do crime praticado. As circunstâncias do crime são negativas, conforme exposto na fundamentação. Quanto às consequências do delito, são normais à espécie, não exigindo maior reprimenda do que aquela já fixada pelo legislador. O comportamento da vítima igualmente não requer valoração extrapenal. Assim, considerando-se a incidência de uma circunstância judicial negativa, valoro-a em 1/8 sobre o intervalo, na esteira do entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, e fixo a pena-base em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão. Vejamos o entendimento do C.STJ sobre o tema: (...) No que tange à exasperação da basilar, pela existência de circunstância judicial negativa, essa deve seguir o parâmetro de 1/6 sobre a pena-base ou 1/8 do intervalo entre as penas mínima e máxima, para cada fator desfavorável. Tais frações constituem critérios aceitos pela jurisprudência do STJ, mas não se revestem de caráter obrigatório, exigindo-se apenas que seja proporcional e concretamente justificado o critério utilizado pelas instâncias ordinárias. (...) (STJ - AgRg no AREsp n. 2.418.792/MS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 19/12/2023.) Na segunda fase, verifico não concorrerem atenuantes, contudo deve ser aplicada a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea “f”, CP. Desta forma, valoro-a em 1/6 sobre a pena-base, na esteira do entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, e fixo a pena intermediária em 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Vejamos o entendimento do C.STJ sobre o tema: (...) Nesse contexto, a jurisprudência deste Superior Tribunal firmou-se no sentido de que o aumento para cada agravante ou de diminuição para cada atenuante deve ser realizado em 1/6 da pena-base, ante a ausência de critérios para a definição do patamar pelo legislador ordinário, devendo o aumento superior ou a redução inferior à fração paradigma estar concretamente fundamentado. (...) (STJ - AgRg no AgRg no AREsp n. 2.421.452/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 21/11/2023, DJe de 27/11/2023). Por fim, não verifico a concorrência entre causas especiais de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva a pena em 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. 3. DO CONCURSO MATERIAL DE CRIMES – ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL As infrações penais de lesão corporal e cárcere privado possuem desígnios autônomos e objetividades jurídicas diferentes, de modo que deve ser aplicado o concurso material de crimes, nos termos do artigo 69 do Código Penal. Nesse sentido: (...) 4. Não configura bis in idem o reconhecimento do concurso material dos crimes dos arts. 129 e 148, § 2º, do CP, por possuírem objetividades jurídicas distintas. (...) (STJ. REsp n. 939.888/ES, relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 18/8/2009, DJe de 14/9/2009). Assim sendo, as penas fixadas aos crimes de lesão corporal e cárcere privado serão aplicadas cumulativamente e ficam estabelecidas em 02 (dois) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Nos termos do artigo 33, §2º, alínea “c”, CP, fixo o regime ABERTO para início do cumprimento da pena. Não tendo o réu experimentado segregação cautelar, inaplicável o disposto no artigo 387, §2º, CPP. Considerando-se que as infrações penais foram praticadas mediante violência doméstica e familiar contra a mulher, incabível sua substituição por penas restritivas de direitos, consoante entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 588). Os requisitos para suspensão condicional da pena (artigo 77, CP) não se mostram presentes, pois a pena fixada é superior a 02 (dois) anos. O artigo 387, inciso IV, CPP, dispõe que “O juiz, ao proferir sentença condenatória (...) fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido”. Em se tratando da fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração em crime praticado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento de recurso especial submetido ao rito dos repetitivos, fixou a seguinte tese: Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória. (STJ. REsp n. 1.643.051/MS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 28/2/2018, DJe de 8/3/2018). No caso em tela, o Ministério Público formulou na denúncia pedido expresso de fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração. Assim sendo, considerando-se que a prova produzida na presente ação penal corroborou parcialmente os fatos narrados na denúncia, ensejando a condenação do réu pela prática dos crimes de lesão corporal e cárcere privado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher, fixo em 01 (um) salário mínimo (vigente na data dos fatos) o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, o que faço com supedâneo no artigo 387, inciso IV, CPP. A presente decisão não exclui a possibilidade de interposição de ação civil ex delicto pela vítima, nos termos do artigo 63 do CPP, caso entenda que assim deva proceder. Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade. Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais, nos termos do artigo 804 do CPP. Intime-se a vítima, nos termos do artigo 201, §2º, CPP. Após o trânsito em julgado da presente sentença, certifique-se e: 1. Comuniquem-se os institutos de Identificação Criminal em âmbito estadual e federal e a delegacia de Polícia de onde proveio o inquérito policial, nos termos do artigo 441, inciso III, da CNGC. 2. Comunique-se o TRE/MT, para fins do artigo 15, inciso III, da CF, via Sistema INFODIP, nos termos do artigo 443 da CNGC. 3. Expeça-se guia de execução penal definitiva. Após, nada mais havendo, certifique-se e arquivem-se estes autos com baixa na distribuição. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Canarana-MT, datado e assinado digitalmente. CARLOS EDUARDO DE MORAES E SILVA Juiz de Direito
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