Processo nº 1000477-95.2020.8.11.0107
ID: 310370707
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1000477-95.2020.8.11.0107
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANA MARIA MAGRO MARTINS
OAB/MT XXXXXX
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JOAO PEDRO BALESTRERI
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000477-95.2020.8.11.0107 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000477-95.2020.8.11.0107 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), GUILHERME BELOTTO - CPF: 061.069.841-90 (APELANTE), JOAO PEDRO BALESTRERI - CPF: 042.020.291-94 (ADVOGADO), DIELRIVAN OLIVEIRA ASSUNCAO - CPF: 011.615.793-38 (ADVOGADO), LUANA OLIVEIRA CHAVES - CPF: 053.720.851-85 (APELANTE), ANA MARIA MAGRO MARTINS - CPF: 086.287.209-01 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO – IRRESIGNAÇÃO DAS DEFESAS – PRETENSÃO – PRELIMINAR DE NULIDADE POR ILEGALIDADE DA BUSCA PESSOAL E DOMICILIAR SEM MANDADO JUDICIAL – INOCORRÊNCIA – FUNDADAS SUSPEITAS – FLAGRANTE DE CRIME PERMANENTE – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES COERENTES E HARMÔNICOS COM DEMAIS PROVAS – MÉRITO – PEDIDO DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO – INADMISSIBILIDADE – CIRCUNSTÂNCIAS QUE EVIDENCIAM A TRAFICÂNCIA – PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – NÃO CABIMENTO – DEDICAÇÃO À ATIVIDADE CRIMINOSA – CONDENAÇÃO POR ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO – PEDIDO DE REVISÃO DA DOSIMETRIA – PENA-BASE JÁ FIXADA NO MÍNIMO LEGAL – CONFISSÃO QUALIFICADA – SÚMULA 630 DO STJ – IMPOSSIBILIDADE DE ABRANDAMENTO DO REGIME INICIAL – QUANTUM DE PENA SUPERIOR A 4 ANOS – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS – INVIABILIDADE – PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA DE MULTA – VALOR DENTRO DOS LIMITES LEGAIS – DIA-MULTA FIXADO NO MÍNIMO – RESTITUIÇÃO DOS BENS APREENDIDOS – IMPOSSIBILIDADE – PERDIMENTO DECRETADO – RECURSOS DESPROVIDOS. Não há que se falar em ilegalidade da busca pessoal e domiciliar quando existem elementos concretos que configuram fundadas suspeitas da prática criminosa, como as campanas prévias realizadas pela autoridade policial e denúncias recorrentes sobre o local ser ponto de tráfico, havendo ainda a situação de flagrância em crime permanente. Os depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante são meio idôneo e suficiente para a formação do édito condenatório quando em harmonia com as demais provas dos autos e colhidos sob o crivo do contraditório, conforme Enunciado Orientativo nº 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT. As circunstâncias da apreensão, tais como a forma de acondicionamento da droga, a apreensão de valores em espécie, a existência de petrechos utilizados para o preparo e fracionamento de entorpecentes (pratos, giletes, ácido bórico e sacos plásticos), bem como os depoimentos prestados por testemunhas que confirmaram a prática do tráfico no local, afastam a possibilidade de desclassificação para o delito de posse de drogas para consumo pessoal previsto no artigo 28 da Lei nº 11.343/2006. A aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 exige o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: (i) primariedade, (ii) bons antecedentes, (iii) não dedicação às atividades criminosas e (iv) não integração a organização criminosa. A dedicação à atividade criminosa, evidenciada pelo modus operandi, e a condenação pelo crime de associação para o tráfico afastam a incidência do benefício. Sendo a pena-base já fixada no mínimo legal, não há falar em revisão. Igualmente, não há que se falar em reconhecimento da atenuante da confissão quando o réu apenas admite a posse da droga para uso pessoal, negando a traficância, nos termos da Súmula 630 do STJ. Impossível a fixação de regime inicial aberto quando a pena aplicada é de 8 (oito) anos de reclusão, em observância ao disposto no artigo 33, § 2º, "b", do Código Penal, que determina o regime semiaberto para penas superiores a 4 (quatro) anos e não excedentes a 8 (oito) anos. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos quando a pena imposta supera o limite de 4 (quatro) anos estabelecido no art. 44, I, do Código Penal. Mantém-se a pena de multa quando fixada dentro dos limites legais e o valor do dia-multa estabelecido no mínimo legal, não havendo comprovação da alegada hipossuficiência financeira nos autos. Correta a decretação de perdimento dos bens apreendidos, conforme art. 63 da Lei nº 11.343/2006 e tese firmada pelo STF no julgamento do RE 638.491/PR (Tema 647 da Repercussão Geral). Recursos conhecidos e desprovidos. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por Guilherme Belotto e Luana Oliveira Chaves, contra sentença proferida pelo MM. Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, nos autos da ação penal n.º 1000477-95.2020.8.11.0107, que condenaram como incurso no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, aplicando-lhe as penas definitiva de 8 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, para cada um dos réus. Em suas razões recursais (ID 263983007), o apelante GUILHERME BELOTTO requer, preliminarmente, a revisão da dosimetria da pena em relação à aplicação da multa, a qual considera exorbitante. No mérito, pleiteia: sua absolvição, alegando insuficiência de provas; o afastamento da associação para o tráfico de drogas; subsidiariamente, a desclassificação do crime de tráfico para o delito de posse para consumo próprio (art. 28 da Lei nº 11.343/06); aplicação do tráfico privilegiado previsto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas; substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos; redução da multa aplicada; e a restituição da motocicleta Honda CG Titan 150, dos R$ 884,00 e do aparelho celular Samsung apreendidos. A apelante LUANA OLIVEIRA CHAVES (ID 266959258), por sua vez, em suas razões recursais, requer preliminarmente o reconhecimento da nulidade do flagrante em razão da ilicitude da busca pessoal e domiciliar sem mandado judicial. Quanto ao mérito, pleiteia: sua absolvição em relação ao crime de tráfico de drogas por insuficiência probatória; sua absolvição quanto ao delito de associação para o tráfico por ausência de provas de vínculo estável e permanente; subsidiariamente, a desclassificação para o delito de posse para consumo pessoal; alternativamente, a revisão da dosimetria da pena, com a fixação da pena-base no mínimo legal, reconhecimento da atenuante da confissão, aplicação da causa de diminuição do tráfico privilegiado, fixação de regime prisional mais brando e conversão da pena privativa de liberdade em restritivas de direitos. Em contrarrazões aos recursos de ambos os apelantes (ID 263983009 e ID 270607380), o Ministério Público pugnou pelo desprovimento dos recursos e manutenção integral da sentença condenatória. Em sequência, a Procuradoria Geral de Justiça, no parecer subscrito pela i. Procuradora de Justiça Dra. Esther Louise Asvolinsque Peixoto, manifestou-se pelo desprovimento, sintetizando da seguinte forma: (Id. 270999393) APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO – RECURSO DEFENSIVO – AUSÊNCIA DE AUTORIA E MATERIALIDADE – DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 28 – FRAGILIDADE DO DEPOIMENTOS POLICIAIS – APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – REVISÃO DA DOSIMETRIA – IMPROCEDÊNCIA DAS TESES DEFENSIVAS. Preliminar de provas ilícitas – descabida – várias denúncias prévias – prévias diligências policiais. Robustez de provas quando a autoria e materialidade delitiva, tanto do tráfico de drogas quanto da associação para o tráfico – provas derivadas de prévia investigação policial – relevância dos depoimentos policiais – testemunhos. Impossibilidade de aplicação do tráfico privilegiado – habitualidade criminosa – condenação por associação – afastamento do benefício. Regularidade da dosimetria da pena da ré Luana – pena base já fixada no mínimo legal – confissão para usuário de drogas e não para tráfico – higidez do regime prisional. Valor correto da pena de multa do réu Guilherme – razoabilidade na fixação Manutenção do perdimento de bens do réu Guilherme – condenação por tráfico. Parecer pelo desprovimento dos recursos. É o relatório. V O T O R E L A T O R Conheço o presente recurso, por preencher os requisitos de admissibilidade. Conforme relatado, trata-se recurso de apelação interposto por Guilherme Belotto e Luana Oliveira Chaves, contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, nos autos da ação penal n.º 1000477-95.2020.8.11.0107. Segundo consta dos autos, no dia 24 de janeiro de 2020, os apelantes foram presos em flagrante delito quando estavam saindo de motocicleta do bar administrado pela ré Luana. Na ocasião, após busca pessoal realizada pelos policiais militares, foi encontrado na posse da apelante Luana um pedaço de entorpecente aparentando ser pasta base de cocaína, além de R$ 90,00 (noventa reais). Na posse do apelante Guilherme foi apreendida a quantia de R$ 794,00 (setecentos e noventa e quatro reais) em cédulas trocadas. Na motocicleta onde estavam foi encontrada uma sacola contendo um prato e uma caixa de giletes. Posteriormente, os policiais diligenciaram até o "Bar da Luana", onde encontraram a pessoa de Pietra, que afirmou ser a responsável pela administração do estabelecimento sob o comando de Luana. No local, os policiais localizaram um prato sujo com substância esbranquiçada e plásticos de ácido bórico e gilete no quarto que os acusados supostamente utilizavam. Em seguida, diligenciaram até a residência dos acusados, onde encontraram as pessoas de Petrúcio e Marilza, os quais, segundo os policiais, franquearam o acesso ao local, onde foi encontrado ácido bórico. Conforme o laudo pericial definitivo n° 3.14.2020.67001-01, o material apreendido em poder da ré Luana constituía 0,45 g (quarenta e cinco centigramas) de substância positiva para cocaína. Durante a instrução processual, foram ouvidas as testemunhas Lindomar David dos Santos, Michel Mengues da Silva e Lorrayne Golçalves Neves David dos Santos, policiais que participaram da ocorrência. Nessa ocasião, informaram que o local era alvo de diversas denúncias de tráfico de drogas, tendo sido realizadas campanas prévias. Relataram ainda que o bar era conhecido por ter fluxo constante de usuários de drogas. Os réus foram interrogados e negaram a prática de tráfico, alegando serem apenas usuários de entorpecentes. Após o encerramento da instrução, em alegações finais via memoriais, o Ministério Público requereu a procedência integral da denúncia, enquanto as defesas pugnaram pela absolvição ou, subsidiariamente, pela desclassificação para o crime previsto no artigo 28 da Lei n° 11.343/06. Ao final, o magistrado julgou procedente a denúncia, condenando os réus pela prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, nos seguintes termos: “[...] DECIDO. Trata-se de ação penal incondicionada que o Ministério Público Estadual move em face de GUILHERME BELOTTO e LUANA OLIVEIRA CHAVES, pelas supostas condutas tipificadas no artigo 33 e 35 da Lei de Drogas. PRELIMINARMENTE Da inépcia da inicial A defesa de Guilherme Belotto em memoriais finais pleiteou o reconhecimento da inépcia da inicial, com fulcro no artigo 395, II e III. A alegação não merece prosperar, posto que a peça inaugural preenche todos os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal. Deve-se reservar a extinção antecipada do feito, quando o quadro probatório revele a injustiça do pleito, não sendo despida de sentido a exigência de “manifesta” ineptidão, inexistirem pressupostos processuais, condições para o exercício da ação, ou ainda inexistir justa causa (indícios suficientes de autoria e prova da materialidade) para o seu seguimento. Ressalte-se que o contraditório e a ampla defesa existem para ambos polos do processo e deles decorre o direito de provar. Assim, não se pode, também, cercear o direito da acusação de provar sua versão mediante o estancamento prematuro do processo penal. Os fatos imputados aos acusados encontram subsunção legal e, prima facie, não mereciam ser afastados em juízo sumário de cognição. Por fim, não se pode olvidar que o standard probatório para o recebimento da peça inicial é menos rigoroso do que o exigido para um decreto condenatório, conforme tranquilo posicionamento jurisprudencial. [...] Observo, ao fim e ao cabo, que a peça vestibular na forma apresentada não impediu os acusados de exercerem o devido processo legal em seus corolários do contraditório e da ampla defesa, inexistindo qualquer prejuízo. Posto isso, rejeito a preliminar e passo ao exame do mérito. NO MÉRITO I. Do crime descrito no artigo 33 da Lei 11.343/2006 Os autos tramitaram regularmente até o momento, não havendo nulidades e/ou irregularidades processuais que impeçam a prolação da sentença, motivo pelo qual passo ao exame do mérito. Quanto ao crime tipificado no artigo 33 do SISNAD, tenho que a materialidade restou comprovada através do boletim de ocorrência, auto de prisão em flagrante delito, auto de apreensão, depoimentos extrajudiciais (todos no ID 37654723) e judiciais (Ids 68562132 e 74322101) e ainda pelo laudo pericial que atestou que as substâncias apreendidas em posse da acusada Luana, se tratavam de cocaína e ácido bórico (utilizado para diluir a droga, a fim de aumentar o rendimento), conforme ID 75324769. A autoria também não comporta dúvidas, o referido conjunto probatório é suficiente no sentido de demonstrar que Luana e Guilherme praticavam a comercialização de drogas na cidade de Nova Ubiratã/MT, dando especial atenção aos objetos apreendidos, quais sejam sacolas plásticas, lâminas de barbear (“gilete”), ácido bórico e pratos, de conhecimento geral que são elementos utilizados para fins de preparação de substâncias entorpecentes para a comercialização, tornando inconteste os seus envolvimentos com a conduta criminosa, bem como a dinâmica fática que se deu em momento em que os dois estariam iniciando o transporte do entorpecente encontrado com Luana. Apesar das declarações de que Guilherme não estaria envolvido na traficância, as circunstâncias são suficientes para demonstrar que havia participação, inclusive divisão de funções entre eles, principalmente observando que a narrativa por ele adotada no interrogatório que na data dos fatos ele teria ido levar Luana ao bar é notadamente inverídica, considerando que na motocicleta foram encontrados objetos utilizados para a preparação das substâncias para comércio e ele tinha ciência do porte destes. Ouvidas as testemunhas Lindomar, Michel e Lorrayne, todos policiais militares presentes na ocorrência, foi afirmado pelos dois primeiros que já havia diversas denúncias de que o local funcionava como “boca de fumo”, inclusive afirmado por Lindomar que já tinham realizado campanas a fim de averiguar a veracidade das delações, no entanto, apesar do grande fluxo de usuários no local, não foi possível realizar apreensões, porque segundo os próprios frequentadores, eles faziam o uso dos entorpecentes no próprio local. Lorrayne ainda afirmou que durante a busca pessoal realizada em Luana, encontrou uma porção de pasta base de cocaína dentro do sutiã da ré, R$ 90,00 (noventa reais) em cédulas e na motocicleta em que estavam, havia um prato e uma caixa de lâminas, artefatos comumente utilizados para “virar a droga”. Ainda asseverou que o local era bem típico de “boca de fumo”, sujo, era um bar de prostituição e com muitos usuários. Quando questionada pela advogada de defesa de Luana se esses supostos usuários poderiam ser consumidores do bar, declarou que os consumidores do bar entravam pela frente do local e que este era aberto, portanto, bem visível, no entanto, que os usuários ingressavam em local diverso, nos fundos da residência que tinha diversos quartos, inclusive, local onde foram encontradas as sacolas plásticas recortadas, ácido, lâminas e prato. Deste modo, verifico que as declarações dos policiais, tanto em solo policial como judicial, são de preponderante relevância para confirmar a conduta delitiva praticada pelos réus Guilherme e Luana, tendo em vista que o depoimento foi harmônico, lógico, coerente e livre de dúvidas relevantes para a situação fática, desde a fase inquisitiva, repetindo-se na fase judicial, nada indicando intenção deliberada de prejudicar qualquer dos réus. [...] Portanto, dada a coesão dos depoimentos prestados em solo policial e judicial, pelos policiais, proporcionando aos acusados o contraditório e a ampla defesa, a autoria para o delito de tráfico restou devidamente comprovada no que tange aos réus Luana Oliveira Chaves e Guilherme Belotto, inclusive pelos materiais encontrados em posse de ambos, que indicavam a mercancia, especialmente os pratos, as lâminas, o ácido bórico, as embalagens e as diversas cédulas de pequeno valor e como se deu a dinâmica para a prisão destes, depois da localização dos objetos com os suspeitos. Demonstradas a autoria e a materialidade delitiva, de rigor a condenação de LUANA OLIVEIRA CHAVES e GUILHERME BELOTTO, nas penas do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. II. Do crime descrito no artigo 35 da Lei 11.343/2006 Em relação à associação para o tráfico de drogas, notei nos autos prova suficiente de que os acusados estavam previamente ajustados no sentido de cometer o delito, sendo que da dinâmica fática é possível extrair que na data dos fatos, durante o transporte, Guilherme era o motorista e Luana quem carregava consigo a droga. Outrossim, todas as demais provas anteriormente citadas apontam para a prática do delito, com especial atenção ao boletim de ocorrência, auto de prisão em flagrante delito, auto de apreensão, depoimentos extrajudiciais (todos no ID 37654723) e judiciais (Ids 68562132 e 74322101). Vale destacar que o Superior Tribunal de Justiça possui tese firmada no sentido de que “Para a caracterização do crime de associação para o tráfico é imprescindível o dolo de se associar com estabilidade e permanência” (HC 235247/SP; HC 270837/SP; HC 286219/PE; HC 271723/MG; HC 260330/SP; HC 137535/RJ; HC 248844/GO; e HC 239965/RJ). [...] Portanto, dada a existência de prova inequívoca acerca da prática do delito previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/06, a condenação dos réus GUILHERME BELOTTO e LUANA OLIVEIRA CHAVES é medida que se impõe, nas penas do artigo 35 do SISNAD. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal, e assim o faço para CONDENAR os réus GUILHERME BELOTTO e LUANA OLIVEIRA CHAVES, devidamente qualificados nos autos, como incurso nas reprimendas dos artigos 33, caput, e 35, caput, da Lei nº 11.343/06. Passo à dosimetria das penas, de acordo com o critério trifásico do artigo 68, caput, do Código Penal. 1 – RÉU GUILHERME BELOTTO 1.1. Do crime descrito no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 Destaco que a pena cominada para o crime do art. 33, caput, da Lei de Drogas é de 05 (cinco) a 15 (quinze) anos e o pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) dias-multa. Na primeira fase, atenta à regra do artigo 59 do Código Penal tenho que, em relação à reprovabilidade da conduta restou inerente ao tipo penal. Quanto aos antecedentes, não há condenações anteriores que possam ser utilizadas em prejuízo do réu nessa fase. Não existem elementos técnicos que permitam aferir a personalidade e a conduta social do acusado; por seu turno, os motivos, circunstâncias e consequências do crime não ultrapassaram os limites normais do tipo. Por fim, a vítima sendo a coletividade, por razões óbvias, não gerou influência no crime. De rigor a FIXAÇÃO da pena-base no mínimo legal, 05 (cinco) anos de reclusão, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, por considerá-la suficiente para a reprovação e prevenção do crime. Na segunda fase da dosimetria da pena privativa de liberdade não se vislumbram circunstâncias agravantes ou atenuantes em relação ao acusado, por isso, mantenho a pena em 05 (cinco) anos de reclusão, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Por fim, na terceira fase, deixo de aplicar a minorante prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas por haver provas suficientes nos autos de que o réu se dedicava a práticas criminosas (mercancia de entorpecentes e associação para tal), como demonstra todo o conjunto probatório. Torno a pena definitiva em 05 (cinco) anos de reclusão, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. 1.2. Do crime descrito no art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06: De início, cabe lembrar que a pena para o crime de associação para o tráfico de drogas é reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos de reclusão e o pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Na primeira fase, do artigo 59 do CP, tenho que a reprovabilidade da conduta restou inerente ao tipo penal. Não há antecedentes que possam ser prejudiciais ao réu. Não existem elementos técnicos que permitam aferir a personalidade e a conduta social do acusado; por seu turno, os motivos, circunstâncias e consequências do crime não ultrapassaram os limites normais do tipo. Por fim, a vítima sendo a coletividade, por razões óbvias, não gerou influência no crime. De rigor a FIXAÇÃO da pena-base em 03 (três) anos de reclusão, além do pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, por considerá-la suficiente para a reprovação e prevenção do crime. Na segunda fase da dosimetria da pena privativa de liberdade não se vislumbram circunstâncias agravantes ou atenuantes em relação ao acusado. Por isso mantenho a pena em 03 (três) anos de reclusão, além do pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Por fim, na terceira fase, não vislumbro causas de aumento ou diminuição da pena, por isso, torno a pena definitiva em 03 (três) anos de reclusão, além do pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Assim, consideradas as circunstâncias do caso concreto, torno DEFINITIVA a pena de GUILHERME BELOTTO em 08 (oito) anos de reclusão, além do pagamento de 1.200 (um mil e duzentos) dias-multa, estes fixados em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, em observância ao previsto no artigo 43, caput, da Lei nº 11.343/06, atualizável na execução (CP, art. 49, § 2º). Em atenção ao que dispõe o artigo 33, § 2º, alínea “b”, do Código Penal, tendo-se em conta a quantidade da pena e as circunstâncias do caso concreto, fixo o REGIME SEMIABERTO para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade. Ausentes os requisitos legais para a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, conforme o disposto no artigo 44 do Código Penal, revelando-se tal medida como insuficiente à prevenção e repressão do delito no caso concreto. Em atenção ao disposto no § 1º do artigo 387 do Código de Processo Penal, CONCEDO ao acusado o direito de recorrer em liberdade, posto que ausentes novos fatos que justifiquem a imposição da custódia cautelar. 2 – RÉ LUANA OLIVEIRA CHAVES 2.1. Do crime descrito no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/0 Na fase do artigo 59 do Código Penal em relação à reprovabilidade da conduta restou inerente ao tipo penal. Quanto aos antecedentes, não há condenações anteriores que possam ser utilizadas em prejuízo da ré. Não existem elementos técnicos que permitam aferir a personalidade e a conduta social da acusada; por seu turno, os motivos, circunstâncias e consequências do crime não ultrapassaram os limites normais do tipo. Por fim, a vítima sendo a coletividade, por razões óbvias, não gerou influência no crime. De rigor a FIXAÇÃO da pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, por considerá-la suficiente para a reprovação e prevenção do crime. Na segunda fase da dosimetria da pena privativa de liberdade não se vislumbram circunstâncias agravantes ou atenuantes. Por isso, mantenho a pena em 05 (cinco) anos de reclusão, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Por fim, na terceira fase, deixo de aplicar a minorante prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas por haver provas suficientes nos autos de que a ré se dedicava a práticas criminosas (mercancia de entorpecentes e associação para tal), como demonstrado em todo o conjunto probatório. Assim, torno definitiva a pena em 05 (cinco) anos de reclusão, além do pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, estes fixados em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, em observância ao previsto no artigo 43, caput, da Lei nº 11.343/06, atualizável na execução (CP, art. 49, § 2º). 2.2. Do crime descrito no art. 35, caput, da Lei nº 11.343/06: Na primeira fase da individualização da pena privativa de liberdade, nota-se que a reprovabilidade não ultrapassou o próprio tipo penal. Quanto aos antecedentes, não há condenações anteriores que possam ser utilizadas em prejuízo da ré. Não existem elementos técnicos que permitam aferir a personalidade e a conduta social da acusada; por seu turno, os motivos, circunstâncias e consequências do crime não ultrapassaram os limites normais do tipo. O crime é vago, pelo que não há influência de vítima na prática do delito. De rigor a FIXAÇÃO da pena-base em 03 (três) anos de reclusão, além do pagamento de 700 (setecentos) dias-multa, por considerá-la suficiente para a reprovação e prevenção do crime. Na segunda etapa, não há agravantes ou atenuantes. Mantenho a pena em 03 (três) anos de reclusão, além do pagamento de 700 (setecentos) dias-multa. Ausentes causas de aumento ou diminuição da pena, torno a pena definitiva em 03 (três) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa. Assim, consideradas as circunstâncias do caso concreto, torno DEFINITIVA a pena de LUANA OLIVEIRA CHAVES em 08 (oito) anos de reclusão, além do pagamento de 1.200 (um mil duzentos) dias-multa, estes fixados em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, em observância ao previsto no artigo 43, caput, da Lei nº 11.343/06, atualizável na execução (CP, art. 49, § 2º). Em atenção ao que dispõe o artigo 33, § 2º, alínea “a”, do Código Penal, tendo-se em conta a quantidade da pena, fixo o REGIME SEMIABERTO para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade. Ausentes os requisitos legais para a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, conforme o disposto no artigo 44 do Código Penal, revelando-se tal medida como insuficiente à prevenção e repressão do delito no caso concreto. Em atenção ao disposto no § 1º do artigo 387 do Código de Processo Penal, CONCEDO à acusada o direito de recorrer em liberdade, posto que ausentes novos fatos que justifiquem a decretação da custódia cautelar. [...]” (Id. 263982970) I. DA PRELIMINAR DE ILEGALIDADE DA BUSCA PESSOAL E DOMICILIAR Inicialmente, analiso a preliminar suscitada pela apelante Luana, consistente na alegação de ilegalidade da busca pessoal e domiciliar efetuadas sem mandado judicial. A preliminar não merece acolhimento. É cediço, que a Constituição Federal no artigo 5º, XI, “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. Contudo, a inviolabilidade de domicílio não constitui direito absoluto, pois comporta exceção em caso de, por exemplo, flagrante delito. Assim, o STF, ao julgar o RE 603.616-AgR/RO, firmou entendimento, em repercussão geral, de que: “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial é lícita quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa há situação de flagrante delito” (STF,RE 1.298036/RS– Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI– 8.3.2021). Cito o Tema n. 280, da Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal, com a seguinte tese: “Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Repercussão geral. 2. Inviolabilidade de domicílio art. 5º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial em caso de crime permanente. Possibilidade. A Constituição dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em residência em caso de flagrante delito. No crime permanente, a situação de flagrância se protrai no tempo. 3. Período noturno. A cláusula que limita o ingresso ao período do dia é aplicável apenas aos casos em que a busca é determinada por ordem judicial. Nos demais casos flagrante delito, desastre ou para prestar socorro a Constituição não faz exigência quanto ao período do dia. 4. Controle judicial a posteriori. Necessidade de preservação da inviolabilidade domiciliar. Interpretação da Constituição. Proteção contra ingerências arbitrárias no domicílio. Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente. A inexistência de controle judicial, ainda que posterior à execução da medida, esvaziaria o núcleo fundamental da garantia contra a inviolabilidade da casa (art. 5, XI, da CF) e deixaria de proteger contra ingerências arbitrárias no domicílio (Pacto de São José da Costa Rica, artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, artigo 17, 1). O controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da Constituição, quanto da aplicação da proteção consagrada em tratados internacionais sobre direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico. Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa. A entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária. Não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificará a medida. Os agentes estatais devem demonstrar que havia elementos mínimos a caracterizar fundadas razões (justa causa) para a medida. 6. Fixada a interpretação de que a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. 7. Caso concreto. Existência de fundadas razões para suspeitar de flagrante de tráfico de drogas. Negativa de provimento ao recurso”(RE n. 603.616, Relatoro Ministro GILMAR MENDES, Plenário, DJe 10.5.2016). Assim, o ingresso forçado em domicílio sem ordem judicial é admitido quando amparado em fundadas razões que demonstrem, no caso concreto, a ocorrência de situação de flagrante delito no interior da casa. Evidenciada a existência de denúncia anônima sobre tráfico no endereço, a realização de monitoramento prévio que confirmou movimentação típica da mercancia de entorpecentes e a experiência dos agentes em situações similares resta caracterizada a fundadas razões autorizadora do ingresso dos policiais sem ordem judicial. Conforme se extrai dos depoimentos prestados pelos policiais militares Lindomar David dos Santos, Michel Mengues da Silva e Lorrayne Golçalves Neves David dos Santos, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo sob o crivo do contraditório, existiam fundadas suspeitas de tráfico de drogas no local, em razão de várias denúncias recebidas apontando o "Bar da Luana" como ponto de comercialização de entorpecentes. O policial Lindomar afirmou categoricamente em juízo que a equipe já vinha realizando campanas no local após o recebimento de várias denúncias, relatando que observavam a entrada e saída frequente de usuários no local, embora não tenham conseguido flagrar a prática do tráfico em ocasiões anteriores. No dia dos fatos, os policiais, durante patrulhamento, visualizaram os réus saindo rapidamente do estabelecimento em uma motocicleta, o que motivou a abordagem. Durante a revista pessoal, foi encontrada droga em poder da apelante Luana, o que configura situação de flagrância, autorizando não apenas a prisão dos envolvidos, como também a entrada no imóvel sem mandado judicial, por tratar-se de crime permanente. No caso em análise, as diligências policiais anteriores, as denúncias recebidas e o flagrante da apelante portando substância entorpecente tornaram legítimas tanto a abordagem quanto a posterior entrada no estabelecimento e na residência dos réus. Ademais, conforme depoimentos dos policiais, a entrada nesses locais foi franqueada por terceiros que ali se encontravam (Pietra, no bar, e Petrúcio e Marilza, na residência), não havendo que se falar em invasão domiciliar. Desse modo, as provas obtidas são lícitas, não havendo qualquer nulidade a ser declarada. Rejeito, portanto, a preliminar suscitada. II. DO MÉRITO 1. Da materialidade e autoria dos crimes Quanto ao mérito, ambos os apelantes sustentam a insuficiência probatória para a configuração dos delitos de tráfico de drogas e associação para o tráfico, pelos quais foram condenados. Contudo, a materialidade e a autoria delitiva restaram devidamente comprovadas pelo conjunto probatório colhido durante a instrução processual. A materialidade é demonstrada pelo auto de prisão em flagrante (ID 37654723), pelo termo de apreensão (ID 37654723, p. 17) e pelo laudo pericial definitivo (ID 75324769), que atestou que o material apreendido com a ré Luana se tratava de 0,45g de cocaína. Por sua vez, a autoria delitiva de ambos os crimes está comprovada pelos depoimentos dos policiais que realizaram a prisão em flagrante, pelos depoimentos das testemunhas ouvidas na fase inquisitorial e pelos demais elementos de prova carreados ao processo. Os policiais militares Lindomar, Michel e Lorrayne foram unânimes em afirmar que o "Bar da Luana" era alvo de diversas denúncias sobre tráfico de entorpecentes. A testemunha Lindomar relatou que realizaram campanas prévias no local, confirmando a entrada e saída constante de usuários de drogas. Cumpre destacar que "os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal", conforme Enunciado Orientativo nº 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal. Ademais, não há nos autos qualquer elemento que desabone a credibilidade dos depoimentos prestados pelos agentes policiais, que, aliás, encontram respaldo nas demais provas produzidas, como os objetos apreendidos e os depoimentos prestados na fase inquisitorial. No momento da abordagem, foi encontrada a droga na posse da apelante Luana, além de grande quantidade de dinheiro trocado com ambos os réus (R$ 90,00 com Luana e R$ 794,00 com Guilherme). Na motocicleta foi encontrada uma sacola contendo um prato e uma caixa de giletes, materiais comumente utilizados para o preparo e fracionamento de entorpecentes. Nas diligências posteriores, realizadas no "Bar da Luana" e na residência dos réus, foram encontrados mais indícios da prática do tráfico, como ácido bórico, pratos sujos com substância esbranquiçada e pedaços de plásticos utilizados para embalar drogas. Soma-se a isso o depoimento prestado na fase inquisitorial pela testemunha Fabiano Alves Martins (ID 37654723, p. 27), que afirmou ser usuário e frequentador do bar, onde adquiria cocaína, inclusive afirmando que na data dos fatos havia comprado entorpecente da ré Luana no valor de R$ 20,00. Igualmente relevante é o depoimento da testemunha Wanderson Souza Martins (ID 37654723, p. 30), gerente do bar, que afirmou que há cerca de dois meses presenciava dependentes químicos indo até a parte dos fundos do estabelecimento, onde ficava o quarto da ré Luana, tanto para comprar quanto para usar drogas. A alegação dos apelantes de que seriam apenas usuários de drogas não se sustenta diante do contexto probatório. Como bem destacado no Enunciado Orientativo nº 3 deste Tribunal, "a condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006". No que tange ao crime de associação para o tráfico, também restou demonstrado que os réus mantinham vínculo estável e permanente para a prática do tráfico de drogas. Os apelantes mantinham união estável e juntos administravam o estabelecimento utilizado para o comércio de entorpecentes. A ré Luana confessou em juízo ser proprietária do bar, que era gerenciado por Pietra, enquanto o apelante Guilherme confirmou conhecer Luana há aproximadamente 6 meses. Os depoimentos dos policiais e das testemunhas ouvidas na fase inquisitorial evidenciam que os apelantes atuavam em conjunto no comércio de drogas, cada um desempenhando funções específicas. No momento da prisão, por exemplo, Guilherme conduzia a motocicleta e Luana portava consigo a droga, demonstrando uma divisão de tarefas entre eles. Importante destacar que para a configuração do crime previsto no artigo 35 da Lei nº 11.343/2006, basta que duas ou mais pessoas se associem para a prática reiterada ou não dos crimes previstos nos arts. 33 e 34 da mesma lei, o que inequivocamente ocorreu no presente caso. Portanto, a prova dos autos é segura e coesa no sentido de que os apelantes praticaram os crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, não havendo que se falar em absolvição por insuficiência de provas. 2. Da desclassificação para o delito de posse para consumo pessoal Subsidiariamente, ambos os apelantes pleiteiam a desclassificação do crime de tráfico de drogas para o delito de posse para consumo pessoal, previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006. A pretensão, contudo, não merece acolhimento. A diferenciação entre o crime de tráfico e o de posse para consumo pessoal não se limita à quantidade de droga apreendida, mas deve considerar todas as circunstâncias do caso concreto, como prevê o art. 28, § 2º, da Lei nº 11.343/2006. No caso em tela, embora a quantidade de entorpecente apreendida com a ré Luana (0,45g de cocaína) possa ser considerada pequena, as demais circunstâncias do caso afastam por completo a hipótese de consumo próprio. A apreensão de valores em espécie (R$ 90,00 com Luana e R$ 794,00 com Guilherme), a existência de apetrechos utilizados para o preparo e fracionamento de entorpecentes (pratos, giletes, ácido bórico e sacos plásticos), a localização dos entorpecentes (ocultos sob as vestes da ré), bem como os depoimentos das testemunhas que confirmaram a prática do tráfico no local, são todos elementos que apontam para a destinação comercial da droga. Além disso, há nos autos declaração de testemunha (Fabiano Alves Martins) que afirmou ter comprado droga da apelante Luana no próprio dia dos fatos, prova essa que, somada às demais, evidencia a prática do crime de tráfico. A condenação também está plenamente respaldada na Uniformização de Jurisprudência nº 7 do TJMT, que estabelece: "A caracterização do delito de tráfico de drogas prescinde da efetiva comercialização de substâncias entorpecentes, bastando que o agente pratique uma das várias condutas elencadas no caput do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, por se tratar de tipo misto alternativo." A esse respeito, vale citar o exposto por Vicente Greco Filho e João Daniel Rassi, ao comentarem o art. 33 da Lei nº 11.343/2006: "à simples condição de usuário ou dependente de drogas não autoriza desclassificar o artigo 33 para o artigo 28 da Lei n. 11.343/2006, porquanto consabido que o narcotráfico, via de regra, constitui meio para sustento do vício". (Apelação Criminal 2008.077553-4, TJSC. Rel. Des. Amaral e Silva, Dj. 17/03/2009). (sic). Nesta toada colaciono o seguinte aresto desta e. Câmara, de minha relatoria: “[...] Não há que falar-se em desclassificação para a conduta descrita no art. 28 da Lei Antidrogas, quando presentes nos autos elementos aptos a demonstrar, de forma inequívoca, a materialidade e a autoria do delito de tráfico de drogas, não existindo elementos a indicarem que a substancia apreendida seria para consumo próprio, que consubstanciados nas declarações dos Policiais que atuaram na prisão em flagrante do apelante e na apreensão das drogas, resta inviabilizado o acolhimento tese defensiva. [...](N.U 0008946-69.2019.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 08/03/2023, Publicado no DJE 13/03/2023) Pelo exposto, inviável a pretendida desclassificação. 3. Do tráfico privilegiado Subsidiariamente à desclassificação, os apelantes requerem a aplicação da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 (tráfico privilegiado). O pleito, contudo, não merece prosperar. A aplicação do referido benefício depende do preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: (i) primariedade, (ii) bons antecedentes, (iii) não dedicação às atividades criminosas e (iv) não integração a organização criminosa. No caso em tela, embora os apelantes sejam primários e possuam bons antecedentes, não preenchem os demais requisitos legais para a concessão do benefício. Como já exposto anteriormente, as provas carreadas aos autos demonstram que os apelantes se dedicavam à atividade criminosa, fazendo do tráfico de drogas seu meio de vida. A forma como realizavam o tráfico, utilizando o próprio estabelecimento comercial como ponto de venda, bem como a habitualidade na prática delitiva, evidenciada pelas denúncias recebidas e pelos depoimentos das testemunhas, comprovam essa dedicação. Ademais, os apelantes foram condenados também pelo crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/2006), o que, por si só, já seria suficiente para afastar a aplicação do tráfico privilegiado, pois incompatível com o requisito de "não integração a organização criminosa". Sobre o tema, esta Corte já decidiu: “[...] Demonstrada concretamente a dedicação do agente à atividade criminosa inviável a incidência da causa especial de diminuição de pena do tráfico privilegiado, disposta no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06”(N.U 0031559-70.2017.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 14/04/2025, Publicado no DJE 16/04/2025)Portanto, inviável a aplicação do tráfico privilegiado aos apelantes. Portanto, inviável a aplicação do tráfico privilegiado aos apelantes. 4. Da dosimetria da pena - Apelante Luana A apelante Luana pleiteia a revisão da dosimetria da pena, requerendo a fixação da pena-base no mínimo legal e o reconhecimento da atenuante da confissão. Quanto à pena-base, a pretensão não pode ser acolhida, pois o magistrado sentenciante já a fixou no mínimo legal para ambos os crimes. Conforme consta da sentença (ID 263982970), na primeira fase da dosimetria referente ao crime de tráfico, a pena foi estabelecida em 5 (cinco) anos de reclusão, além de 500 (quinhentos) dias-multa, que correspondem exatamente aos patamares mínimos previstos no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006. Da mesma forma, em relação ao crime de associação para o tráfico, a pena-base foi fixada em 3 (três) anos de reclusão, além de 700 (setecentos) dias-multa, também correspondentes aos mínimos legais. No que tange à atenuante da confissão, também não assiste razão à apelante. Isso porque ela não confessou a prática do crime de tráfico de drogas pelo qual foi condenada, mas apenas admitiu a posse da droga para uso pessoal, o que configura crime diverso. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que a confissão da posse para uso próprio não caracteriza a atenuante genérica no crime de tráfico, tendo, inclusive, editado a Súmula 630, segundo a qual "a incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio". Portanto, a dosimetria da pena aplicada à apelante Luana não comporta qualquer reparo. 5. Da fixação de regime inicial menos gravoso - Apelante Luana A apelante Luana requer, ainda, a fixação de regime inicial de cumprimento de pena menos gravoso. O pleito não comporta acolhimento. De acordo com o art. 33, § 2º, "b", do Código Penal, "o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto". No caso, a apelante foi condenada à pena definitiva de 8 (oito) anos de reclusão, e o magistrado fixou o regime semiaberto para o início do cumprimento da pena, que é exatamente o regime adequado para o quantum de pena aplicado, considerando a primariedade da ré. Não há, portanto, como fixar regime mais brando (aberto) à apelante, diante da pena aplicada e das disposições legais vigentes. 6. Da substituição da pena por restritivas de direitos - Apelante Luana A apelante Luana pleiteia, também, a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. O pedido, contudo, não merece acolhimento. O art. 44, I, do Código Penal estabelece como um dos requisitos para a substituição que a pena privativa de liberdade não seja superior a quatro anos. No caso, a apelante foi condenada à pena de 8 (oito) anos de reclusão, superior, portanto, ao limite estabelecido pelo dispositivo legal. Além disso, o crime de tráfico de drogas, pela sua natureza e gravidade, é considerado pela jurisprudência como crime praticado com violência imprópria à sociedade, o que também impediria a substituição da pena, nos termos do mesmo dispositivo legal. Portanto, inviável a substituição pleiteada. 7. Da pena de multa - Apelante Guilherme O apelante Guilherme requer a redução da pena de multa que lhe foi aplicada, ao argumento de que o valor seria exorbitante dada sua condição financeira. O pedido não merece acolhimento. A pena de multa aplicada ao apelante (1.200 dias-multa) encontra-se dentro dos limites legais previstos nos arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/2006, que estabelecem, respectivamente, o pagamento de 500 a 1.500 dias-multa para o crime de tráfico e de 700 a 1.200 dias-multa para o crime de associação para o tráfico. Ressalte-se que o valor do dia-multa foi fixado pelo magistrado no mínimo legal (1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos), considerando a situação econômica do réu. Ademais, não há nos autos comprovação da alegada hipossuficiência financeira do apelante. Pelo contrário, quando da abordagem policial, foi encontrada com ele a quantia de R$ 794,00 em espécie. Por fim, eventual impossibilidade de pagamento da multa deve ser discutida na fase de execução da pena, não sendo o momento processual adequado para tal discussão. Portanto, mantenho a pena de multa aplicada ao apelante. 8. Da restituição dos bens apreendidos - Apelante Guilherme Por fim, o apelante Guilherme pleiteia a restituição dos bens apreendidos, quais sejam: uma motocicleta Honda CG Titan/150, R$ 884,00 (oitocentos e oitenta e quatro reais) e um aparelho celular da marca Samsung. A pretensão, contudo, não merece acolhimento. O art. 63 da Lei nº 11.343/2006 estabelece que "ao proferir a sentença, o juiz decidirá sobre o perdimento do produto, bem, direito ou valor apreendido ou objeto de medidas assecuratórias". No caso, ficou demonstrado que os bens apreendidos foram utilizados na prática do crime de tráfico de drogas, para o qual o apelante foi condenado. Quanto ao tema, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 638.491/PR (Tema 647 da Repercussão Geral), fixou a tese de que "é possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no artigo 243, parágrafo único, da Constituição Federal". Portanto, correta a decretação do perdimento dos bens do apelante. Ante o exposto, em consonância com parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO aos recurso interpostos por Guilherme Belotto e Luana Oliveira Chaves, mantendo integralmente a sentença condenatória de primeiro grau. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025
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