Processo nº 1000256-94.2024.8.11.0100
ID: 310038306
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000256-94.2024.8.11.0100
Data de Disponibilização:
27/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GIOVANNA BARROSO MARTINS DA SILVA
OAB/SP XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000256-94.2024.8.11.0100 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Inter…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000256-94.2024.8.11.0100 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [MARCIO APARECIDO GUIMARAES - CPF: 934.486.601-59 (APELANTE), GIOVANNA BARROSO MARTINS DA SILVA - CPF: 402.972.598-81 (ADVOGADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (APELADO), SERGIO SCHULZE - CPF: 312.387.349-87 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE(S): MARCIO APARECIDO GUIMARAES APELADO(S): BANCO PAN S.A. EMENTA. DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. COBRANÇA DE TARIFAS ABUSIVAS. SEGURO E TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. NÃO ABUSIVIDADE. TEMAS 972 E 958 DO STJ. PEDIDO DE RECÁLCULO DAS PARCELAS E REPETIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação Cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente Ação Revisional de Contrato, tão somente para declarar a abusividade da Tarifa de Registro de Contrato e condenar a instituição financeira à devolução simples do valor cobrado. O Apelante postula a reforma integral da sentença, sustentando a ilegalidade de outras tarifas contratuais (avaliação de bem e seguro), a inexistência de pactuação válida de encargos, o desequilíbrio contratual, a inaplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda nas relações de consumo, e requer o recálculo do financiamento, bem como a restituição em dobro dos valores pagos indevidamente. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se são abusivas as cobranças de tarifas e encargos contratuais como seguro e avaliação de bem; (ii) estabelecer se é devida a restituição em dobro da tarifa considerada indevida; (iii) determinar se é possível afastar o princípio do pacta sunt servanda nas relações de consumo para revisar integralmente o contrato bancário. III. RAZÕES DE DECIDIR A cobrança da tarifa de avaliação de bem é lícita, pois foi prevista contratualmente, comprovada documentalmente sua efetiva prestação, e o valor não se mostra excessivo, afastando-se a tese de onerosidade desproporcional. A contratação do seguro prestamista ocorreu mediante adesão voluntária em documento apartado, não havendo prova de imposição da instituição financeira ou de venda casada, o que legitima a cobrança. A restituição do valor deve ocorrer de forma simples, pois o contrato foi firmado anteriormente à modulação dos efeitos do EAREsp 676.608/RS (STJ), que autorizou a devolução em dobro apenas para cobranças realizadas após 30/03/2021, sendo necessária, antes disso, a demonstração de má-fé, inexistente no caso. A relativização do pacta sunt servanda nas relações de consumo exige a comprovação concreta de abusividade ou desequilíbrio contratual, o que não foi verificado, exceto no tocante à tarifa de registro, sendo legítimos os demais encargos contratados. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: “A cobrança de tarifa de avaliação de bem e seguro é válida quando há pactuação expressa, comprovação da prestação do serviço e ausência de onerosidade excessiva. A restituição em dobro de valores indevidamente cobrados somente é cabível, em contratos anteriores a 30/03/2021, se demonstrada a má-fé da instituição financeira. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 6º, V, 42, parágrafo único e 51, IV; CC, art. 406; CPC, arts. 85, §11, e 98, §3º; EC nº 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, EAREsp 676.608/RS, Tema 958 e 972; TJMT, 1005725-62.2024.8.11.0055, 1011937-47.2024.8.11.0040 e 1014108-76.2021.8.11.0041. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação apresentado por MÁRCIO APARECIDO GUIMARÃES, com o objetivo de reformar a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte, nos autos da Ação Revisional de Contrato em face de BANCO PAN S.A., que julgou o feito parcialmente procedente, nos seguintes termos: Trata-se de Ação Revisional de Contrato ajuizada por Márcio Aparecido Guimarães em face de Banco Pan S.A., devidamente qualificados. Em sua peça inaugural, narra a parte autora que celebrou um contrato de alienação fiduciária com a instituição requerida, comprometendo-se ao pagamento de 60 parcelas mensais. Alega que o contrato contém tarifas indevidas, elevando o valor das prestações, e que houve cobrança de juros acima do pactuado. Sustenta que as cláusulas contratuais são abusivas, contrariando normas do Código de Defesa do Consumidor e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Aduz que a revisão do contrato é necessária para excluir encargos ilegais e readequar o valor das parcelas conforme os princípios do equilíbrio contratual e da boa-fé objetiva. Assevera que a cobrança indevida de tarifas gera o direito à restituição em dobro dos valores pagos, conforme previsto no Código de Defesa do Consumidor. Requer, então, a revisão do contrato, com a exclusão das tarifas abusivas e o recálculo das parcelas, a restituição em dobro dos valores indevidamente cobrados, além da inversão do ônus da prova e a concessão da gratuidade da justiça. Distribuídos os autos, concederam-se à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (id. 144447225). Citada, a parte requerida apresentou contestação (id. 159392819), alegando, inicialmente, a inexistência de pedido certo e determinado na petição inicial, por ausência de especificação das cláusulas contratuais supostamente abusivas. Diz que a parte autora formulou pedido genérico, sem apresentar fundamentos jurídicos claros, o que compromete o direito de defesa e enseja a inépcia da petição inicial. Alega que não há qualquer abusividade nos encargos pactuados no contrato de financiamento, defendendo a legalidade da taxa de juros aplicada, em conformidade com as normas do Conselho Monetário Nacional e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Sustenta que a capitalização de juros está expressamente prevista no contrato e permitida pela legislação vigente, não havendo que se falar em prática abusiva. Assevera que a comissão de permanência, bem como outros encargos moratórios, foram estipulados conforme os limites legais e não resultam em enriquecimento ilícito do credor. Aduz que as tarifas bancárias questionadas foram livremente pactuadas e são cobradas de acordo com regulamentação vigente, sendo indevida qualquer restituição dos valores pagos. Afirma que a parte autora não demonstrou qualquer desequilíbrio contratual que justifique a revisão do contrato, sendo inviável a intervenção judicial para modificar cláusulas livremente pactuadas. Requer, assim, o reconhecimento da inépcia da petição inicial ou, no mérito, a improcedência total dos pedidos formulados na inicial. Remetidos os autos ao CEJUSC, a tentativa de conciliação restou infrutífera (id. 159447827). Intimada, a parte autora apresentou impugnação à contestação (id. 161917802), alegando que a petição inicial é clara e objetiva. Diz que a inicial especifica as cláusulas abusivas do contrato e os encargos ilegais cobrados, sendo descabida a alegação de pedido genérico. Sustenta que há interesse processual na revisão contratual, uma vez que há controvérsia sobre a legalidade das cláusulas pactuadas. Alega que a cobrança de juros capitalizados é indevida e contraria a legislação vigente e a jurisprudência dominante. Assevera que o contrato firmado entre as partes é de adesão e deve ser interpretado conforme o Código de Defesa do Consumidor, possibilitando a revisão de cláusulas abusivas. Aduz que a parte requerida não demonstrou a legalidade das tarifas bancárias cobradas, devendo ser reconhecida sua abusividade e determinado o ressarcimento dos valores pagos indevidamente. Afirma que há onerosidade excessiva no contrato, justificando a revisão judicial dos encargos e taxas aplicadas. Pugna, assim, pela rejeição das preliminares suscitadas, pelo reconhecimento da abusividade das cláusulas contratuais e pela procedência dos pedidos formulados na petição inicial. Proferiu-se decisão saneadora, na qual foram afastadas as preliminares arguidas, fixados os pontos controvertidos, atribuído o ônus da prova e anunciado o julgamento antecipado da lide (id. 177436847). É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. II – FUNDAMENTAÇÃO De plano, ressalta-se que as instituições financeiras não estão sujeitas às limitações impostas pela Lei de Usura, não havendo ilegalidade, per si, na prática de juros remuneratórios superiores a 12% (doze por cento) ao ano, conforme o entendimento condensado na Súmula nº 382/STJ, de que “a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. Isso não significa que as entidades financeiras possuem autorização para prática indiscriminadas de taxas, sem qualquer controle, conforme destacado no julgamento do REsp nº 1.061.530/RS: Logo, diante desse panorama sobre o posicionamento atual da 2ª Seção, conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada. (...) Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros. A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos. O que se conclui, pois, é que a revisão contratual é possível quando se tratar de relação de consumo e ficar demonstrado que a contratação resulta em valor muito excedente àquele praticado no mercado. II.1 – Dos juros No que diz respeito aos juros remuneratórios, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso é no sentido de que são abusivos quando praticados em percentual uma vez e meia a média de mercado. A propósito: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO EM VIRTUDE DE JUROS ABUSIVOS COMBINADO COM DANOS MATERIAIS E MORAIS - BANCÁRIO - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO - TAXA JUROS PREFIXADA NO CONTRATO - ABUSIVIDADE EVIDENCIADA - TAXA MÉDIA DO MERCADO - LIMITAÇÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - APRECIAÇÃO EQUITATIVA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. A revisão dos juros remuneratórios, será possível somente quando superarem substancialmente a taxa média do mercado a época da contratação. Conforme orientação jurisprudencial do E. Superior Tribunal de Justiça externado no julgamento do REsp. 1.061.530/RS, só se considera abusiva a taxa de juros remuneratórios se fixada no mínimo uma vez e meia (50%) acima da taxa média de mercado. O valor estabelecido a título de honorários advocatícios deve ser fixado por apreciação equitativa, consoante previsão do § 8.º do artigo 85 do Código de Processo Civil, somente nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o que se verifica na hipótese dos autos (TJ-MT 10468379220208110041 MT, Relator: SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Data de Julgamento: 01/02/2022, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2022). APELAÇÕES - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL - JUROS REMUNERATÓRIOS - MAIS DE UMA VEZ E MEIA ACIMA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO - ABUSIVIDADE VERIFICADA - LIMITAÇÃO - RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS A MAIOR - FORMA SIMPLES - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - SUCUMBÊNCIA DISTRIBUIDA PROPORCIONALMENTE ENTRE AS PARTES - MANUTENÇÃO - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO - RECURSO DA REQUERIDA PARCIALMENTE PROVIDO. “A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado” (Recurso Especial repetitivo n. 1.112.879/PR e REsp n.1.061.530/RS). Demonstrada a discrepância entre a taxa contratada e aquela divulgada pelo BACEN, é o caso de limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado. A devolução de valores pagos a maior, de forma simples, tem lugar sempre que se verificar o pagamento indevido. A eventual cobrança de encargo abusivo não é suficiente para configurar abalo moral passível de indenização (TJ-MT 10041400320218110015 MT, Relator: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 02/02/2022, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2022). Primeiramente, no que se refere à tese de que a parte requerida praticou juros acima do percentual contratado, não é o que se constata. O autor diz que as taxas contratadas foram de 1,98% a.m. e 26,59% a.a., ao passo que foram praticados nos percentuais de 2,18% a.m. Contudo, essa diferença decorre justamente da pactuação da capitalização de juros e financiamentos das tarifas e seguros, que se encontra expressamente prevista no contrato e, ainda, o percentual praticado está de acordo com o informado no Custo Efetivo Total, que foi de 2,31% ao mês. Cita-se: E, ainda, a jurisprudência é firme no sentido de que a cobrança do CET é lícita, porque engloba não somente os juros, mas também as tarifas, impostos seguros e outras despesas. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO – REDUÇÃO DE JUROS – CONTRATAÇÃO EXPRESSA DE AJUSTE – TARIFAS DE AVALIAÇÃO DO BEM E REGISTRO DE CONTRATO – AVERBAÇÃO DO GRAVAME NO DETRAN – AVALIAÇÃO DE VEÍCULO USADO – LEGALIDADE DAS COBRANÇAS – SENTENÇA MODIFICADA NO PONTO – JUROS REMUNERATÓRIOS – MANUTENÇÃO DA TAXA PACTUADA QUE SE APRESENTA DENTRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO PREVISTO PELO BACEN E CONFORME PREVISTO NO CONTRATO – CUSTO EFETIVO TOTAL – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – 1º APELO CONHECIDO E PROVIDO – 2º APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O índice do Custo Efetivo Total – CET se difere da taxa de juros remuneratórios, pois no primeiro são incluídas as tarifas, impostos, seguros e outras despesas, o que faz com que seu percentual seja maior que o da taxa mensal de juros, sendo sua cobrança totalmente lícita se prevista em contrato (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1011149-81.2023.8.11.0003, Relator: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 06/03/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/03/2024, destaquei). Se não bastasse isso, a taxa média divulgada pelo BACEN para o mês da contratação, março de 2021, foi de 1,58% a.m. e 20,64 a.a. (Disponível em ): Assim, os percentuais contratados, em observância aos precedentes do TJMT somente seriam abusivos se superassem 2,37% a.m. (150%) e 30,96% a.a. (150%), sendo que foram inferiores, razão pela qual não há nenhuma abusividade contratual quanto aos juros. II.2 – Da capitalização de juros Quanto à capitalização de juros, também chamada de anatocismo, trata-se da prática de incorporação de juros não pagos ao saldo devedor, resultando na incidência de novos juros sobre aqueles incorporados ao saldo. A capitalização de juros passou a ser autorizada com a edição da MP nº 2.170-36/2001, sendo legal a sua prática, desde que expressamente pactuada, conforme entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça: Súmula 539 - É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. Nesse sentido, também é a jurisprudência do Eg. Tribunal de Justiça deste Estado: TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000626-28.2018.8.11.0027 APELANTE: FABIANO DALLA VALLE APELADA: BANCO DO BRASIL S/A E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO MONITÓRIA – PROCEDÊNCIA – EMBARGOS MONITÓRIOS JULGADOS IMPROCEDENTES – ‘CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO ROTATIVO – CDC AUTOMÁTICO’, REALIZADO EM 28/05/2015 – CAPITALIZAÇÃO MENSAL E ANUAL EXPRESSA NO CONTRATO – APLICAÇÃO DA SÚMULA 539/STJ – ILEGALIDADE NÃO EVIDENCIADA – JUROS REMUNERATÓRIOS – ABAIXO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – ABUSIVIDADE NÃO EVIDENCIADA – COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – MANUTENÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Nos termos da Súmula 539, do STJ ‘É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada’, sendo que no caso dos autos, os contratos pactuados informam as taxas de juros mensal e a anual, portanto, prevista de forma expressa a capitalização de juros. Segundo entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, a estipulação de juros remuneratórios acima de 12% (doze por cento) ao ano, por si só, não configura abuso, todavia, constatando-se que a referida taxa fora fixada em percentual excessivo, capaz de colocar o consumidor em desvantagem, é cabível a revisão para limitar à taxa média praticada pelo mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil para a mesma espécie contratual. Não se revela abusiva a taxa dos juros remuneratórios aplicada em percentual condizente com a média praticada pelo mercado, devendo ser mantida a r. sentença por seus próprios fundamentos. A comissão de permanência pode ser cobrada quando pactuada durante o período de inadimplência, nos termos previstos pela Resolução nº 1.129/86 do Banco Central do Brasil (BACEN), como ocorreu no caso em análise. Recurso desprovido. Sentença mantida. Honorários majorados (TJ-MT - AC: 00006262820188110027, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 24/05/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/05/2023). No presente caso, a capitalização mensal de juros encontra-se expressamente pactuada em ambos os contratos, na cláusula referente aos encargos: Desse modo, também não há qualquer ilegalidade nos contratos quanto à cobrança de juros capitalizados. II.3 – Das tarifas Quanto à legalidade da contratação de tarifas, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que: 1. Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame de abusividade em cada caso concreto; 2. Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da tarifa de emissão de carnê (TEC) e da tarifa de abertura de crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a tarifa de cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira; 3. Podem as partes convencionar o pagamento do imposto sobre operações financeiras e de crédito (IOF) por meio de financiamento acessório ao mútuo principal, sujeitando-o aos mesmos encargos contratuais (STJ, 2ª Seção, REsp 1255573, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 24/10/2013). De mais a mais, quanto aos serviços de terceiros, registro do contrato e avaliação do bem, a Corte Superior firmou o entendimento de que são legais, desde que efetivamente prestados e os valores cobrados não representem excessiva onerosidade. A propósito: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 958/STJ. DIREITO BANCÁRIO. COBRANÇA POR SERVIÇOS DE TERCEIROS, REGISTRO DO CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. PREVALÊNCIA DAS NORMAS DO DIREITO DO CONSUMIDOR SOBRE A REGULAÇÃO BANCÁRIA. EXISTÊNCIA DE NORMA REGULAMENTAR VEDANDO A COBRANÇA A TÍTULO DE COMISSÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO. DISTINÇÃO ENTRE O CORRESPONDENTE E O TERCEIRO. DESCABIMENTO DA COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO EFETIVAMENTE PRESTADOS. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ABUSIVIDADE DE TARIFAS E DESPESAS EM CADA CASO CONCRETO. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. 3. CASO CONCRETO. 3.1. Aplicação da tese 2.2, declarando-se abusiva, por onerosidade excessiva, a cláusula relativa aos serviços de terceiros (‘serviços prestados pela revenda’). 3.2. Aplicação da tese 2.3, mantendo-se hígidas a despesa de registro do contrato e a tarifa de avaliação do bem dado em garantia. 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO (STJ - REsp: 1578553 SP 2016/0011277-6, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 28/11/2018, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 06/12/2018 RSTJ vol. 253 p. 358). Alega o autor que são abusivas as cobranças das tarifas de Registro de Contrato e de Avaliação. Verifica-se que no instrumento de contrato (id. 144404259), houve a cobrança de R$ 316,00 para registro do contrato perante o órgão de trânsito e R$ 408,00 como Tarifa de avaliação de bem. Não há qualquer ilegalidade na cobrança das referidas tarifas se houver a efetiva prestação do serviço e o valor não foi excessivamente oneroso. No que se refere à Tarifa de avaliação de bem, o requerido juntou comprovação de que o serviço foi efetivamente prestado (id. 159392830) e o valor não se mostra excessivo, razão pela qual não se constata qualquer abusividade. Imperiosa, contudo, a declaração de abusividade da cobrança da Tarifa de Registro de Contrato, posto que o requerido não comprovou que efetivamente realizou o registro do gravame perante o órgão de trânsito. Nessa direção: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO COMBINADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO - CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - ACRÉSCIMO INDEVIDO NAS PARCELAS NÃO CONFIGURADO - TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM E REGISTRO DE CONTRATO NÃO COMPROVADOS - VENDA CASADA DE GARANTIA MECÂNICA, SEGURO PRESTAMISTA E CAPITALIZAÇÃO PREMIÁVEL - RESTITUIÇÃO DE FORMA SIMPLES DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE - IRRISÓRIO PROVEITO ECONÔMICO OBTIDO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. (Súmula n.º 297 do Superior Tribunal de Justiça, Segunda Seção, julgado em 12/05/2004, DJ 09/09/2004 p. 149) 2. No tocante ao suposto acréscimo indevido nas parcelas adimplidas pelo apelante, percebe-se que se trata de juros pré-fixados, em percentual de mercado, com parcelas fixas de prévio conhecimento do consumidor, não tendo como prosperar a argumentação do consumidor sobre abusividade no valor das parcelas. 3. Conforme julgado pelo ínclito Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo ( REsp n.º 1.578.553/SP), as tarifas de registro do contrato, tarifa de avaliação de bem e de serviços de terceiros são válidas, ressalvadas a abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado. 4. Ilegalidade da cobrança da garantia mecânica, porquanto imposta a contratação com seguradora previamente determinada pela instituição credora, configurando venda casada. 5. Em sede de financiamento bancário, é abusiva a contratação concomitante de título de capitalização premiável que, inclusive por não guardar nenhuma relação com o negócio, espelha venda casada repudiada pela norma consumerista. 6. Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada. 7. Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa (TJ-MT 10188420720208110041 MT, Relator: SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Data de Julgamento: 20/04/2021, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/04/2021). II.4 – Do seguro Assevera o autor, também, que é ilegal a contratação de seguro. O entendimento do STJ quanto ao tema é de que “nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”. Não é, portanto, ilegal, “per si”, a contratação de seguro financeiro, mas somente quanto há a imposição ao consumidor, resultando em venda casada. No presente caso, o requerido juntou a proposta de adesão ao seguro (id. 159392824), o qual se encontra devidamente assinado pelo autor em documento apartado. Em não havendo nenhum indício de que a contratação do financiamento foi condicionada à contratação do seguro, não há falar em ilegalidade. A propósito: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO – SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA – OPTANTE DE CONTRATAÇÃO DO SEGURO – LEGALIDADE DA COBRANÇA - VENDA CASADA NÃO CONSTATADA - REPETIÇÃO DE INDÉBITO INDEVIDA – LEGALIDADE DE ENCARGOS COBRADOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO Não se revela abusiva a cláusula que, em contrato celebrado a partir de 30.04.2008, permite ao consumidor optar, com nítida autonomia da vontade, pela contratação de seguro com a instituição financeira. Tese fixada nos Recursos Especiais Repetitivos nos. 1.639.320/SP e 1.639.259/SP – TEMA 972. Se, no ato da celebração do contrato bancário, é facultado ao contratante optar por contratar ou não o seguro prestamista, a opção pela contratação não caracteriza venda casada. ‘No caso, há elementos que comprovam a efetiva pactuação do Seguro de Proteção Financeira, bem assim que a autorização do referido serviço foi expressamente registrada no contrato, em conformidade com o estabelecido na tese fixada nos Recursos Especiais Repetitivos n. 1.639.320/SP e n. 1.639.259/SP - TEMA 972. 6. Então, considerando que a realização do contrato não foi condicionada à adesão ao seguro; inexiste a hipótese do artigo 31, I, do Código de Defesa do Consumidor, de modo a prevalecer a sua contratação, uma vez que optou o apelante por fazê-lo, não havendo que se falar, portanto, em restituição do valor pago a esse título. (...)’ (N.U 1002166-81.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/02/2022, Publicado no DJE 03/02/2022) (N.U 1006374-66.2020.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 29/11/2022, Publicado no DJE 05/12/2022) Se a contratação do seguro de proteção financeira foi feito de livre manifestação de vontade, não há razão para determinar a devolução do valor pago pelo mutuário (TJ-MT - AC: 10245056320228110041, Relator: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 25/07/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/07/2023). Assim, não havendo indícios de irregularidade, a manutenção da cobrança é medida que se impõe. II.5 – Da repetição do indébito O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EAREsp 676608/RS firmou o entendimento de que a repetição do indébito em dobro, na forma prevista no art. 42, do CDC, independe da demonstração do elemento dolo, posto que a cobrança indevida resulta na violação ao princípio da boa-fé objetiva. Mostra-se oportuno citar a ementa do referido julgado: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA FIXA. COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC). DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA. DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL). APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. 1. Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão em que se discute o lapso prescricional cabível aos casos de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia. Discute-se, ainda, acerca da necessidade de comprovação da má-fé pelo consumidor para aplicação do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 2. Na configuração da divergência do presente caso, temos, de um lado, o acórdão embargado da Terceira Turma concluindo que a norma do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor pressupõe a demonstração de que a cobrança indevida decorreu de má-fé do credor fornecedor do serviço, enquanto os acórdãos-paradigmas da Primeira Seção afirmam que a repetição em dobro prescinde de má-fé, bastando a culpa. Ilustrando o posicionamento da Primeira Seção: EREsp 1.155.827/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Primeira Seção, DJe 30/6/2011. Para exemplificar o posicionamento da Segunda Seção, vide: EREsp 1.127.721/RS, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Rel. p/ Acórdão Min. Marco Buzzi, Segunda Seção, DJe 13/3/2013. 3. Quanto ao citado parágrafo único do art. 42 do CDC, abstrai-se que a cobrança indevida será devolvida em dobro, "salvo hipótese de engano justificável". Em outras palavras, se não houver justificativa para a cobrança indevida, a repetição do indébito será em dobro. A divergência aqui constatada diz respeito ao caráter volitivo, a saber: se a ação que acarretou cobrança indevida deve ser voluntária (dolo/má-fé) e/ou involuntária (por culpa). 4. O próprio dispositivo legal caracteriza a conduta como engano e somente exclui a devolução em dobro se ele for justificável. Ou seja, a conduta base para a repetição de indébito é a ocorrência de engano, e a lei, rígida na imposição da boa-fé objetiva do fornecedor do produto ou do serviço, somente exclui a devolução dobrada se a conduta (engano) for justificável (não decorrente de culpa ou dolo do fornecedor). 5. Exigir a má-fé do fornecedor de produto ou de serviço equivale a impor a ocorrência de ação dolosa de prejudicar o consumidor como requisito da devolução em dobro, o que não se coaduna com o preceito legal. Nesse ponto, a construção realizada pela Segunda Seção em seus precedentes, ao invocar a má-fé do fornecedor como fundamento para a afastar a duplicação da repetição do indébito, não me convence, pois atribui requisito não previsto em lei. 6. A tese da exclusividade do dolo inviabiliza, por exemplo, a devolução em dobro de pacotes de serviços, no caso de telefonia, jamais solicitados pelo consumidor e sobre o qual o fornecedor do serviço invoque qualquer "justificativa do seu engano". Isso porque o requisito subjetivo da má-fé é prova substancialmente difícil de produzir. Exigir que o consumidor prove dolo ou má-fé do fornecedor é imputar-lhe prova diabólica, padrão probatório que vai de encontro às próprias filosofia e ratio do CDC. 7. Não vislumbro distinção para os casos em que o indébito provém de contratos que não envolvam fornecimento de serviços públicos, de forma que também deve prevalecer para todas as hipóteses a tese, que defendi acima, de que tanto a conduta dolosa quanto culposa do fornecedor de serviços dá azo à devolução em dobro do indébito, de acordo com o art. 42 do CDC. Nessas modalidades contratuais, também deve prevalecer o critério dúplice do dolo/culpa. Assim, tanto a conduta dolosa quanto a culposa do fornecedor de serviços dão substrato à devolução em dobro do indébito, à luz do art. 42 do CDC. 8. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.113.403/RJ, de relatoria do Ministro Teori Albino Zavascki (DJe 15/9/2009), submetido ao regime dos recursos repetitivos do art. 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução STJ 8/2008, firmou o entendimento de que, ante a ausência de disposição específica acerca do prazo prescricional aplicável à prática comercial indevida de cobrança excessiva, é de rigor a incidência das normas gerais relativas à prescrição insculpidas no Código Civil na ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto. Assim, tem-se prazo vintenário, na forma estabelecida no art. 177 do Código Civil de 1916, ou decenal, de acordo com o previsto no art. 205 do Código Civil de 2002. Diante da mesma conjuntura, não há razões para adotar solução diversa nos casos de repetição de indébito dos serviços de telefonia. 9. A tese adotada no âmbito do acórdão recorrido, de que a pretensão de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia, configuraria enriquecimento sem causa e, portanto, estaria abrangida pelo prazo fixado no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, não parece ser a melhor. A pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos; ausência de causa jurídica; inexistência de ação específica. Trata-se, portanto, de ação subsidiária que depende da inexistência de causa jurídica. A discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica. Doutrina. 10. Na hipótese aqui tratada, a jurisprudência da Segunda Seção, relativa a contratos privados, seguia compreensão que, com o presente julgamento, passa a ser superada, em consonância com a dominante da Primeira Seção, o que faz sobressair a necessidade de privilegiar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos jurisdicionados. 11. Assim, proponho modular os efeitos da presente decisão para que o entendimento aqui fixado seja empregado aos indébitos de natureza contratual não pública pagos após a data da publicação do acórdão. 12. Embargos de divergência conhecidos e providos integralmente, para impor a devolução em dobro do indébito. 13. Fixação das seguintes teses. Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. Segunda tese: A ação de repetição de indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do prazo prescricional decenal, consoante previsto no artigo 205 do Código Civil, a exemplo do que decidido e sumulado no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de tarifas de água e esgoto (Súmula 412/STJ). Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão (EAREsp n. 676.608/RS, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021) (g.n.). A publicação do acórdão se deu em 30/03/2021, de modo que se aplicam seus efeitos às cobranças indevidas realizadas após aquela data, mas, no presente caso, o contrato foi firmado em 19/03/2021, ou seja, somente seria cabível a restituição em dobro se comprovada a má-fé da instituição financeira, o que não ocorreu. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS - REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO - MODULAÇÃO DO EARESP Nº 676608/RS - RECURSO PROVIDO EM PARTE. Nos contratos anteriores a 30/03/2021, a demonstração da má-fé do credor constitui requisito imprescindível para o deferimento do pedido de restituição em dobro do indébito prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, e no art. 940, do Código Civil . Má-fé indemonstrada. Considerando que a grande maioria dos contratos sub judice é anterior a 30/03/2021 e ante a ausência de prova da má-fé da instituição financeira, não há que se falar em restituição em dobro com relação a estes. Quanto ao único contrato revisando assinado em data posterior a 30/03/2021, é cabível a repetição dobrada, por aplicação da modulação do EAREsp nº 676608/RS, bastando a configuração da ausência de boa-fé objetiva (TJ-MG - Apelação Cível: 51451776320218130024, Relator.: Des .(a) Sérgio André da Fonseca Xavier, Data de Julgamento: 13/08/2024, Câmaras Cíveis / 18ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 14/08/2024) Desse modo, a repetição do indébito deverá ser realizada na forma simples. III – DISPOSITIVO Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o feito, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para DECLARAR abusiva a cobrança realizada a título de Tarifa de Registro de Contrato e, ainda, CONDENAR o requerido na repetição do indébito na forma simples, do valor de R$ 316,00 (trezentos e dezesseis reais), a ser corrigido desde a data do desembolso (Súmula nº 43/STJ), pelo IPCA-E até a data da citação, ocasião na qual passará a incidir também juros de mora sobre o valor, devendo a partir de então, incidir exclusivamente a Taxa Selic, nos termos do art. 406, do Código Civil, c/c o art. 3º, da EC nº 113/2021, já que abrange, concomitantemente, a correção monetária e os juros, sendo vedada a cumulação com outro índice. Ante a sucumbência mínima do requerido, CONDENO o autor, nos termos do art. 86, parágrafo único, do CPC, ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios em favor do patrono do autor, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, ressalvada a suspensão da exigibilidade, na forma do art. 98, § 3º, do CPC, posto que litiga sob o pairo da assistência judiciária gratuita. Havendo a interposição de recurso de apelação cível, intime-se a parte recorrida para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal, e, após, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça. Decorrido o prazo para interposição de recurso, sem manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e, após, ARQUIVEM-SE os autos com baixa da distribuição. Intimem-se. Sentença publicada em gabinete. Cumpra-se. Brasnorte/MT, documento assinado e datado eletronicamente. ROMEU DA CUNHA GOMES Juiz Substituto Em suas razões recursais (ID. 291717880), a parte Recorrente invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Tarifas e encargos indevidos e cálculo após exclusão; 2. Repetição do indébito; 3. Inaplicabilidade do pacta sunt servanda; Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar integralmente a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais, notadamente com o reconhecimento da abusividade das tarifas impugnadas, recálculo das parcelas, restituição em dobro dos valores pagos indevidamente e inversão do ônus probatório. Recurso tempestivo (Aba Expedientes – Sentença (39265647) – PJE 1º Grau) e preparo dispensado ante o deferimento da justiça gratuita (ID. 292552389). Intimada a apresentar contrarrazões, a Recorrida deixou transcorrer o prazo in albis (ID. 291717882). Não houve manifestação da Procuradoria de Justiça em razão da matéria. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R APELANTE(S): MARCIO APARECIDO GUIMARAES APELADO(S): BANCO PAN S.A. VOTO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Reitero se tratar de apelação interposta por MÁRCIO APARECIDO GUIMARÃES, visando à reforma da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte, que julgou parcialmente procedente a ação revisional de contrato, tão somente para declarar abusiva a cobrança da Tarifa de Registro de Contrato, com a condenação do banco apelado à repetição do indébito, de forma simples, do valor de R$ 316,00. A parte Apelante, em suma, defende a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à relação contratual, bem como o reconhecimento do contrato como de adesão. Alega a existência de cobrança de tarifas abusivas, sem a devida comprovação da prestação dos serviços e a ilegitimidade da capitalização mensal de juros e a ocorrência de divergência entre a taxa contratada e a efetivamente aplicada, conforme apontado em laudo técnico. Requer, ainda, o reconhecimento da tarifa de ilegalidade da tarifa de avaliação do bem e seguros, a repetição em dobro das quantias tidas como indevidas, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do CDC, o recálculo das parcelas com a exclusão das tarifas ditas como indevidas e a inversão do ônus da prova, diante da hipossuficiência do consumidor. Lado outro, a parte Apelada assevera que a sentença deve ser mantida, uma vez que as tarifas foram regularmente contratadas, a capitalização de juros está prevista em cláusula expressa e a taxa praticada está dentro dos parâmetros legais e jurisprudenciais. Afirma que não há prova de má-fé a justificar a devolução em dobro, e que os serviços contratados foram efetivamente prestados, especialmente quanto ao seguro. Ao fim, pede o desprovimento recursal, sob o fundamento de que não há ilegalidades nos encargos cobrados. Passo à análise das teses recursais. 1. Tarifas e encargos indevidos e cálculo após exclusão; Em suas razões recursais, a Reclamante aponta como indevidas as cobranças de tarifa de avaliação de bem no valor de R$408,00 e tarifa de seguros no importe de R$1.450,00. No que se refere à insurgência da parte apelante quanto à cobrança de tarifas e encargos que reputa indevidos, é necessário destacar que o contrato celebrado entre as partes (ID. 291717853) contempla, além dos encargos remuneratórios e moratórios, a Tarifa de Registro de Contrato declarada como indevida pela sentença recorrida, além de Tarifa de Avaliação de Bem e contratação de seguro. A Apelante sustenta que tais cobranças teriam elevado de forma artificial o valor das parcelas mensais, comprometendo o equilíbrio contratual e violando os princípios da transparência, da boa-fé objetiva e da vulnerabilidade do consumidor, previstos no Código de Defesa do Consumidor. Requer, por conseguinte, a exclusão de tais cobranças do pacto firmado, bem como a realização de novo cálculo do financiamento, com a consequente restituição dos valores pagos indevidamente. Ocorre que, conforme corretamente consignado na sentença, a legalidade de tais encargos deve ser analisada à luz da efetiva prestação do serviço e da comprovação documental nos autos, sendo certo que a jurisprudência pátria, em especial a do Superior Tribunal de Justiça, tem conferido validade a tais cobranças, desde que haja previsão contratual clara e inequívoca, além da efetiva contraprestação. No tocante à Tarifa de Avaliação de Bem, verifica-se que o serviço foi devidamente comprovado nos autos, por meio de documento específico que demonstra a realização da avaliação do veículo dado em garantia (ID. 291717869). Ademais, o valor cobrado, R$ 408,00, não se revela, em juízo de razoabilidade, excessivo ou desproporcional, não se configurando, portanto, hipótese de onerosidade excessiva, tampouco de violação à função social do contrato. Em relação ao seguro, também restou comprovado que sua contratação foi realizada em documento apartado (ID. 291717867), de forma voluntária e autônoma, inexistindo qualquer prova nos autos de que tenha havido imposição ou condição à celebração do contrato de financiamento, o que afastaria a tese de venda casada. A assinatura da proposta de adesão ao seguro, por parte do autor, revela a anuência expressa à contratação, o que inviabiliza a tese recursal de abusividade in re ipsa. Todavia, diversamente ocorre com a Tarifa de Registro de Contrato, cuja cobrança, no importe de R$ 316,00, foi reconhecida na sentença como indevida, ante a ausência de comprovação nos autos de que o serviço correspondente tenha efetivamente sido prestado pela instituição financeira. Não se trata aqui de mera ausência formal de comprovação, mas de efetiva omissão quanto à demonstração da realização do registro do contrato no órgão de trânsito competente, ônus que competia à instituição financeira, na condição de detentora da documentação e responsável pelo repasse do valor. Assim sendo, inexistindo elementos que justifiquem a reforma da sentença, a declaração de inexigibilidade deve ser mantida na forma realizada pelo juízo na origem. Nesse sentido, julgados desta Câmara: DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. JUROS REMUNERATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. TARIFAS E SEGUROS. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta por consumidores contra sentença de improcedência em ação revisional cumulada com consignação em pagamento, ajuizada em desfavor de instituição financeira, visando à supressão de cláusulas contratuais supostamente abusivas em cédula de crédito imobiliário com garantia fiduciária. II. Questão em discussão 2. A controvérsia gira em torno de (i) eventual abusividade nos juros remuneratórios pactuados; (ii) validade da capitalização mensal de juros; (iii) legitimidade da cobrança de tarifas e seguros contratados; e (iv) possibilidade de restituição em dobro dos valores pagos indevidamente. III. Razões de decidir 3. A taxa de juros remuneratórios contratada (0,70% a.m.) é inferior à média de mercado vigente à época da contratação, não havendo comprovação de onerosidade excessiva, conforme jurisprudência consolidada do STJ (Tema 234 e Súmula 382). 4. A capitalização de juros mensais é válida nos contratos firmados após 31.03.2000, desde que expressamente pactuada, hipótese verificada no caso concreto (REsp 973.827/RS e Súmulas 539 e 541/STJ). 5. As tarifas de avaliação, cadastro e registro foram devidamente especificadas, com comprovação da efetiva prestação dos serviços, estando em consonância com o entendimento firmado no Tema 958/STJ. 6. A contratação de seguro prestamista é exigência legal no âmbito do Sistema Financeiro Imobiliário, nos termos do art. 5º, IV, da L. 9.514/1997, não configurando venda casada ou prática abusiva. 7. Ausente demonstração de ilegalidade ou abuso, inexiste direito à restituição em dobro, nos termos do art. 42, p.u., do CDC, tampouco razão para reforma da sentença. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de apelação desprovido. “1. Não se caracteriza como abusiva a pactuação de juros remuneratórios inferiores à média de mercado, mesmo que superiores a 12% ao ano. 2. É válida a capitalização mensal de juros em contratos bancários celebrados após 31.03.2000, desde que expressamente pactuada. 3. A cobrança de tarifas e seguros é lícita quando expressamente prevista, efetivamente prestado o serviço e ausente onerosidade excessiva. 4. A exigência de seguro prestamista em contrato de financiamento imobiliário não configura venda casada, tratando-se de imposição legal prevista na L. 9.514/1997.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 6º, VIII, 14 e 42, p.u.; L. 9.514/1997, art. 5º, IV; MP nº 2.170-36/2001. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas 382, 539 e 541; STJ, Tema 234 e Tema 958; STJ, REsp 973.827/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti; STF, Súmula 596. (N.U 1005725-62.2024.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 14/06/2025, Publicado no DJE 14/06/2025) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. TARIFAS BANCÁRIAS. IOF. DANOS MORAIS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. REQUISITOS DE VALIDADE CONTRATUAL OBSERVADOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível contra sentença que julgou improcedente Ação Revisional de Contrato bancário ajuizada em face de AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A, na qual o autor buscava a nulidade de cláusulas relativas a juros remuneratórios, capitalização mensal de juros, tarifas bancárias (cadastro, registro e avaliação), IOF, seguros, bem como a condenação da ré por danos morais e repetição do indébito. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) examinar as preliminares de nulidade da sentença por ausência de intimação e de admissibilidade do pedido de efeito suspensivo; (ii) verificar a validade das cláusulas contratuais impugnadas à luz do CDC e da jurisprudência do STJ, em especial quanto a juros, capitalização, tarifas bancárias, IOF, repetição do indébito e danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR A intimação da sentença foi regularmente realizada ao advogado constituído, razão pela qual se afasta a preliminar de nulidade por ausência de intimação. O pedido de efeito suspensivo não pode ser conhecido por ter sido formulado inadequadamente como preliminar recursal, contrariando o disposto no art. 1.012, § 3º, do CPC. Os contratos bancários estão sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor, sendo possível a revisão das cláusulas abusivas, nos termos do art. 51, IV, do CDC. A estipulação de juros remuneratórios acima de 12% ao ano não configura abusividade por si só, desde que compatível com a taxa média de mercado (Súmula 382/STJ e Tema 952/STJ). A capitalização mensal de juros é válida quando expressamente pactuada, conforme autorizam a Súmula 539/STJ e a constitucionalidade da MP 2.170-36/2001, reconhecida pelo STF. A cobrança da tarifa de avaliação do bem é legítima quando comprovada a efetiva prestação do serviço, nos termos do Tema 958/STJ, o que foi demonstrado nos autos. A tarifa de cadastro é válida quando cobrada no início da relação contratual e desde que haja previsão contratual clara, conforme a jurisprudência firmada no Tema 620/STJ. A tarifa de registro do contrato é admissível desde que prevista e atrelada à prestação de serviço efetivo, o que foi comprovado por documentos nos autos. A cobrança do IOF é legal quando expressamente prevista no contrato e realizada por meio de financiamento acessório, conforme o Tema 621/STJ. A ausência de ilegalidade nas cobranças contratuais impede a repetição do indébito e a condenação por danos morais. A majoração dos honorários de sucumbência é cabível, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, mantendo-se a suspensão da exigibilidade ante a gratuidade judiciária concedida. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1) A ausência de nulidade da sentença se confirma quando há intimação regular do advogado da parte. 2) O pedido de efeito suspensivo à apelação deve ser apresentado por petição autônoma e não como preliminar recursal, nos termos do art. 1.012, § 3º, do CPC. 3) É válida a estipulação de juros remuneratórios acima de 12% ao ano, desde que dentro da média de mercado. 4) A capitalização mensal de juros é lícita em contratos bancários firmados após 31/03/2000, se houver previsão expressa. 5) As tarifas de cadastro, avaliação e registro são válidas quando previstas no contrato e efetivamente prestados os serviços. 6) A cobrança do IOF por meio de financiamento acessório é legal quando pactuada. 7) A ausência de ilicitude contratual afasta a repetição do indébito e o dano moral. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 1.012, §§ 1º e 3º; 85, § 11; 98, § 3º; CDC, arts. 3º, § 2º, e 51, IV; Decreto 22.626/1933. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas 382, 539 e 541; STF, RE 592.377/RS (repercussão geral); STJ, REsp 1.061.530/RS (Tema 952), REsp 1.578.553/SP (Tema 958), REsp 1.251.331/RS e 1.255.573/RS (Tema 621), REsp 1.251.331/RS (Tema 620); STJ, AgInt no AREsp 1.015.505/BA; TJMT, Apelação Cível nº 1031832-59.2022.8.11.0041. (N.U 1011937-47.2024.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/06/2025, Publicado no DJE 13/06/2025) No que tange à repercussão da exclusão dessa cobrança no saldo devedor, a Apelante requer o recálculo de todo o financiamento, sob o fundamento de que os encargos ilegítimos alteraram substancialmente o valor das prestações mensais. Contudo, não restou demonstrado nos autos que a cobrança dessa tarifa isolada tenha ocasionado descompasso relevante ou onerosidade excessiva a ponto de justificar a revisão integral do contrato. A exclusão do valor específico, devidamente delimitado, já contempla a medida reparatória cabível e proporcional ao vício reconhecido, inexistindo respaldo fático ou jurídico para o refazimento integral das condições pactuadas, sendo que o contrato deve ser preservado em sua estrutura essencial, prestigiando a autonomia privada das partes e o equilíbrio dos ajustes contratuais, ressalvado o ponto específico revisto. 2. Repetição do indébito; No que toca ao pleito de repetição do indébito, a parte Apelante requer que a restituição do valor correspondente à tarifa considerada abusiva se dê em dobro, com fulcro no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à devolução do valor pago em dobro, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. A controvérsia acerca da necessidade de comprovação de má-fé por parte do fornecedor foi objeto de pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial nº 676.608/RS, em que se reconheceu que a restituição em dobro independe da demonstração de dolo, sendo suficiente a existência de cobrança indevida não amparada por engano justificável, em respeito à boa-fé objetiva que deve reger as relações de consumo. O referido acórdão, contudo, teve seus efeitos modulados para incidir apenas nas cobranças efetuadas após sua publicação, ocorrida em 30 de março de 2021. No caso concreto, conforme disposto na sentença, o contrato foi celebrado em 19 de março de 2021 (ID. 291717853), ou seja, anteriormente à modulação referida, de modo que, para os contratos firmados até essa data, prevalece o entendimento anterior, no sentido de que a repetição em dobro somente é cabível mediante demonstração de má-fé da instituição financeira, o que não se verificou na hipótese. Destaco julgados desta Câmara sobre o tema: Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO INEXISTENTE. DEVOLUÇÃO DO INDÉBITO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO ERESP 676.608/RS. EFEITOS INFRINGENTES PARCIAIS. I. CASO EM EXAME 1. Embargos de Declaração opostos por Itaú Consignado S.A. contra acórdão unânime que negou provimento ao recurso de apelação e manteve sentença de procedência dos pedidos de Yolanda Bezerra Ferreira, declarando a inexistência de contrato de empréstimo consignado, condenando o banco à devolução em dobro dos valores descontados indevidamente e ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. O embargante alega omissão no julgado quanto à modulação dos efeitos da decisão proferida no EREsp 676.608/RS, do STJ, requerendo que a devolução dos valores anteriores a 30/03/2021 se dê de forma simples. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em verificar se há omissão no acórdão quanto à modulação dos efeitos fixada pelo STJ no julgamento do EREsp 676.608/RS, e se, em consequência, é cabível a restituição simples dos valores indevidamente descontados antes de 30/03/2021, ante a ausência de comprovação de má-fé do fornecedor. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os embargos de declaração são cabíveis para suprir omissão, obscuridade, contradição ou erro material em decisão judicial, conforme previsto no art. 1.022 do CPC. 4. A jurisprudência admite, excepcionalmente, efeitos modificativos nos embargos de declaração quando a correção do vício resultar, de forma lógica e inevitável, na alteração do julgado. 5. O acórdão embargado omitiu-se quanto à modulação de efeitos fixada pelo STJ no EREsp 676.608/RS, que limitou a aplicação da tese da restituição em dobro do indébito sem necessidade de comprovação de má-fé apenas às cobranças indevidas realizadas a partir de 30/03/2021. 6. Para os descontos anteriores a 30/03/2021, é necessária a análise da má-fé do fornecedor para aplicação da devolução em dobro, o que não foi demonstrado no caso concreto. 7. A inexistência do contrato não implica, por si só, presunção de má-fé do fornecedor, o que impõe a devolução simples dos valores cobrados indevidamente antes da modulação. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, com efeitos infringentes, exclusivamente para determinar a devolução simples dos valores indevidamente cobrados antes de 30/03/2021. Tese de julgamento: 1. A restituição em dobro do indébito prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, sem necessidade de demonstração de má-fé, somente se aplica às cobranças indevidas realizadas após 30/03/2021, conforme modulação fixada no EREsp 676.608/RS. 2. Para os valores cobrados indevidamente antes de 30/03/2021, a devolução deve ocorrer de forma simples, salvo demonstração inequívoca de má-fé do fornecedor. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 1.022; CDC, art. 42, parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 676.608/RS, Corte Especial, j. 30.03.2021. (N.U 1014108-76.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/05/2025, Publicado no DJE 30/05/2025) Inexistente a demonstração de conduta dolosa ou de ciência da irregularidade por parte do banco, correta a sentença ao determinar a devolução de forma simples, respeitando os parâmetros da jurisprudência dominante à época dos fatos. 3. Inaplicabilidade do pacta sunt servanda; A parte Apelante também invoca, como fundamento recursal, a inaplicabilidade do princípio do pacta sunt servanda às relações de consumo, argumentando que os contratos bancários firmados com consumidores são contratos de adesão, caracterizados por cláusulas uniformes, impostas unilateralmente, o que comprometeria a paridade formal e material entre os contratantes. De fato, o princípio da força obrigatória dos contratos cede espaço, no campo das relações de consumo, ao princípio do equilíbrio contratual, à função social do contrato e à boa-fé objetiva, de modo a permitir a intervenção judicial sempre que identificada cláusula abusiva ou desequilíbrio relevante entre os direitos e deveres das partes. O artigo 6º, inciso V, do CDC, reconhece o direito básico do consumidor à modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou que sejam excessivamente onerosas. Todavia, essa relativização não autoriza a revisão genérica ou abstrata das cláusulas contratuais apenas com base na natureza adesiva do contrato, sob pena de comprometer a segurança jurídica e a estabilidade das relações privadas. Para que se afaste o princípio do pacta sunt servanda, exige-se a demonstração concreta de abusividade, vantagem excessiva ou desequilíbrio injustificado, o que, no caso em apreço, não se verificou, à exceção da tarifa de registro, a qual não foi apresentado como realizada pela parte Recorrida. Como já destacado, os demais encargos contestados foram considerados regulares, à vista da comprovação da prestação dos serviços e da ausência de onerosidade excessiva, sendo que a mera alegação genérica de que as cláusulas seriam ilegítimas, por derivarem de contrato de adesão, não basta para autorizar a revisão pretendida. A autonomia da vontade permanece sendo regra nas contratações privadas, sendo sua mitigação possível apenas nos estritos limites autorizados pelo ordenamento jurídico, o que não restou demonstrado no caso da contratação do seguro e da tarifa de avaliação do bem. Deste modo, deve ser mantida a sentença pelos seus próprios fundamentos. Conclusão. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados, pelo Juízo de 1º Grau, em desfavor do recorrente, para o importe de 12% (doze por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC, todavia, a execução de valores ficará suspensa, tendo em vista o benefício da assistência judiciária, de acordo com o art. 98, §3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025
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