Marcio Torres De Aguiar x Banco Pan S.A.
ID: 292940885
Tribunal: TJMT
Órgão: 3ª VARA CÍVEL DE SINOP
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 1000959-52.2025.8.11.0015
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO
OAB/MT XXXXXX
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CARLOS RODRIGUES DA SILVA JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA CÍVEL DE SINOP SENTENÇA Processo n.º 1000959-52.2025.8.11.0015. Trata-se de Ação Revisional de Contrato Bancário ajuizada por Marcio Torres de Aguiar co…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA CÍVEL DE SINOP SENTENÇA Processo n.º 1000959-52.2025.8.11.0015. Trata-se de Ação Revisional de Contrato Bancário ajuizada por Marcio Torres de Aguiar contra Banco PAN S/A, em que relatou, em síntese, que celebrou contrato de mútuo com a empresa requerida e que o negócio contém grande diversidade de ônus, taxas e encargos cobrados, que tornam o contrato extremamente oneroso. Explicitou que o contrato bancário prevê a cobrança abusiva de juros remuneratórios, acima da taxa média, e de taxas e tarifas bancárias. Sustentou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Requereu, por fim, a procedência do pedido, para a finalidade de declarar a nulidade das cláusulas contratuais que preveem: a) a cobrança de juros remuneratórios; b) a cobrança das taxas e tarifas bancárias. Requereu, ainda, a restituição em dobro dos valores quitados, de maneira indevida. Recebida a petição inicial, foi determinada a efetivação da citação da empresa requerida. A requerida veiculou resposta, momento em que arguiu, como teses preliminares, a inépcia da petição inicial e a impugnação à assistência judiciária gratuita. No mérito, registrou que subsiste entre as partes contrato válido e regularmente celebrado e que a cobrança revela-se regular. Defendeu a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios e das taxas e tarifas bancárias. Mostrou oposição com relação à pretensão de reparação por repetição do indébito. Pugnou, ao final, pela improcedência do pedido. Houve réplica, instante em que o requerente, reprisando os argumentos tecidos por ocasião da petição inicial, rechaçou as proposições apresentadas pela defesa. Vieram os autos conclusos para deliberação. É o sucinto relatório. Passo a fundamentar. Primeiramente, impende acentuar, desde logo, que se afigura absolutamente desnecessária a realização de perícia técnica na situação hipotética ‘sub judice’, porquanto que não se revela imprescindível, para efeito de equacionamento/resolução do litígio, haja vista que a dissolução das matérias/pontos controvertidos (a existência de cobrança de encargos ilegais e abusivos) não depende de conhecimento especial técnico [art. 464, parágrafo único, inciso I do Código de Processo Civil] e envolve, neste tópico específico, em caráter de exclusividade e de maneira cumulativa, o exame de cláusulas contratuais e a abordagem de questões de direito — com a consequência de que a prova pericial não ganha qualquer relevância prática e representa inútil e desnecessária tentativa de coleta de prova. Logo, à luz de tais balizamentos, procedo ao julgamento antecipado da lide, na forma do que preconiza o comando normativo preconizado no art. 355, inciso I do Código de Processo Civil. D’outra banda, quanto à matéria preliminar de inépcia da petição inicial, penso que está fadada ao insucesso. Com efeito, de acordo com a norma de regência, a petição inicial da ação que objetiva proceder à revisão de obrigação, derivada de contrato de empréstimo, de financiamento ou de arrendamento mercantil deverá, sob pena de indeferimento, discriminar e identificar as cláusulas contratuais que pretende modificar/alterar, reconhecer ilegais/abusivas e excluir e, ao mesmo tempo, quantificar o valor incontroverso da dívida [art. 330, § 2.º do Código de Processo Civil]. Na hipótese concreta, o autor descreveu e especificou, na petição inicial, as cláusulas contratuais que, segundo seu ponto de vista, expressam situação de abusividade e de ilegalidade (a forma de cobrança de juros remuneratórios e das taxas e tarifas bancárias) e delimitou a exata quantificação do valor incontroverso da dívida. A redação da petição inicial exterioriza, de maneira clara e objetiva, as circunstâncias da relação jurídica firmada entre as partes litigantes e expõe a causa de pedir e o pedido. Por outro lado, com relação à impugnação à assistência judiciária gratuita, penso que está fadada ao insucesso. A assistência judiciária gratuita configura-se como direito fundamental, que objetiva concretizar a garantia do direito de acesso à tutela jurisdicional do Estado, para aquele que não dispõe de recursos financeiros para encampar a defesa de direitos/interesses jurídicos e para viabilizar o credenciamento para o exercício básico de direitos e garantias fundamentais, e acarreta, como consequência direta, na desoneração do pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios e periciais. A assistência judiciária gratuita caracteriza-se como direito subjetivo do indivíduo, menos favorecido, sob o ponto de vista financeiro e econômico, e deve ser compreendida como apanágio natural daquele que busca o acesso à Justiça e não incorpora condições mínimas para arcar com as custas processuais, sem prejuízo do sustento próprio ou da entidade familiar da qual faz parte integrante. O fato de tratar-se de pessoa miserável/pobre, na acepção literal da expressão, mostra-se, por conseguinte, totalmente irrelevante, para efeito de concessão do benefício da assistência judiciária gratuita. Interpretação que resulta da exegese do disposto no art. 1.º c/c o art. 4.º, ambos da Lei n.º 1.050/1.960 e art. 5.º, inciso XXXIV, alínea ‘a’ e inciso XXXV da CRFB/88. A concessão da gratuidade da justiça, como fórmula/regra geral, depende da caracterização de fato objetivo, que se limita/contenta a reclamar a existência de afirmação, na petição inicial, de que não reúne condições de arcar com o pagamento das custas do processo e honorários de advogado [cf.: STJ, AgRg no Ag n.º 1.172.972/RS, 5.ª Turma, Rel.: Min. Jorge Mussi, j. em 20/10/2009; STJ, EDcl nos EDcl no AgRg nos EDcl no Ag n.º 952.186/RS, 3.ª Turma, Rel.: Min. Nancy Andrighi, j. em 20/10/2009]. Isso implicar considerar, por inferência racional, que compete ao impugnante o ônus de provar que o beneficiário não se encontra em estado de miserabilidade jurídica [cf.: STJ, AgRg no Ag em REsp n.º 45.932/MG, 3.ª Turma, Rel.: Min. João Otávio de Noronha, j. em 13/08/2013; STJ, AgRg no AREsp n.º 27.245/MG, 4.ª Turma, Rel.: Min. Antônio Carlos Ferreira, j. em 24/04/2012]. Pois bem. Do confronto/cotejo analítico do material cognitivo produzido no processo, depreende-se que não subsistem provas concretas que demonstram que o requerente reúna condições financeiras suficientes para arcar com o pagamento das despesas do processo, sem o comprometimento do próprio sustento e da família. Portanto, diante desta moldura, não vejo como dar entendimento diverso à questão ‘sub judice’, com a consequência de que a improcedência da pretensão de impugnação é medida que se impõe. Não subsistem outras questões preliminares pendentes que exijam exame e, conforme se depreende da análise do processo, os ditames processuais foram observados, não existindo quaisquer nulidades/vícios processuais a serem decretadas. Destarte, enfrentados estes temas e superada a etapa de realização do exame dos requisitos de admissibilidade da lide (condições da ação e pressupostos processuais), passo a análise da questão de fundo da demanda. 1. Da Possibilidade de Revisão do Contrato Bancário. Com efeito, a sujeição ao efeito vinculante/obrigatório dos contratos (princípio ‘pacta sunt servanda’ — ideia-valor que rege/dirige as relações de direito privado e que prevê a obrigatoriedade de dar-se cumprimento às disposições do contrato) condiciona-se à manutenção e o respeito a função social do contrato e a reverência à normas de ordem/interesse público [art. 421 ‘caput’ e parágrafo único e art. 2.035, parágrafo único, ambos do Código Civil]. A revisão do contrato, portanto, caracteriza regra/fórmula de exceção [art. 421, parágrafo único, e art. 421-A, inciso III, ambos do Código Civil] e apenas se justifica diante da incidência de cláusulas abusivas ou ilegais, representativas da ocorrência de excessiva margem de lucro (dinamizadora de enriquecimento ilícito e que coloca o consumidor em desvantagem exagerada), da configuração de desequilíbrio contratual, da não-observância da boa-fé objetiva ou devido a ocorrência de circunstância superveniente que acarrete onerosidade excessiva — de acordo com os preceitos da teoria da onerosidade excessiva e quebra da base objetiva do negócio jurídico, previstas no art. 6.º, inciso V e no art. 51, inciso IV e § 1.º, ambos da Lei n.º 8.078/1990 e no art. 479 e no art. 480, ambos do Código Civil. Com base nessas considerações, como forma de dar concretude à aplicação dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, conclui-se, conclui-se, por inferência racional, que, diante das circunstâncias da hipótese/caso concreto, é possível mitigar-se e relativizar o efeito obrigatório dos contratos, a ponto de permitir a revisão contratual. Impende enfatizar, por oportuno, que esse entendimento tem prevalecido em sucessivos julgamentos proferidos pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ATO JURÍDICO PERFEITO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. MITIGAÇÃO. TABELA PRICE. LEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A matéria do art. 6º, caput e § 1º, da LICC, possui índole constitucional, motivo pelo qual é vedada sua análise em sede de recurso especial. Precedentes. 2. É permitida a revisão das cláusulas contratuais pactuadas, diante do fato de que o princípio do pacta sunt servanda vem sofrendo mitigações, mormente ante os princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual. 3. Já tendo sido reconhecida pelo Tribunal de origem a legalidade da utilização do sistema Price, não há que se falar em interesse de agir quanto a este ponto. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ, AgRg no AREsp n.º 649.895/MS, 4.ª Turma, Rel.: Ministro Raul Araújo, julgado em 05/05/2015) — com destaques não inseridos no texto original. “CONTRATOS E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. CDC. POSSIBILIDADE MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. LEASING. DEVOLUÇÃO DO BEM ARRENDADO. RESTITUIÇÃO DO VRG PAGO ANTECIPADAMENTE. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÕES RECURSAIS DESASSOCIADAS DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 284/STF. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência do STJ se posiciona firme no sentido que a revisão das cláusulas contratuais pelo Poder Judiciário é permitida, mormente diante dos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual, devendo ser mitigada a força exorbitante que se atribuía ao princípio do pacta sunt servanda. Precedentes. 2. Com a resolução do contrato de arrendamento mercantil por inadimplemento do arrendatário e a consequente reintegração do bem na posse da arrendadora, faz-se devido o cumprimento das parcelas vencidas e em aberto até a retomada do bem pelo arrendatário, ressalvando seu direito quanto à devolução ou compensação em seu favor dos valores pagos antecipadamente a título de VRG. A diluição do valor residual ao longo do prazo contratual, cuja cobrança é feita juntamente com as parcelas das contraprestações, não impede que o arrendatário, por sua livre opção e interesse, desista da compra do bem objeto do contrato de leasing. Retomada a posse direta do bem pela arrendadora, extingue-se a possibilidade de o arrendatário exercer a opção da compra; por conseguinte, o valor residual, que antecipadamente vinha sendo pago para essa finalidade, deve ser devolvido. Precedentes. 3. A alegação de que o acórdão recorrido procedera à alteração no indexador pactuado no contrato de arrendamento mercantil mostra-se completamente desassociada das questões tratadas e decididas pelo acórdão, caracterizando fundamentação deficiente e, por conseguinte, óbice à exata compreensão da controvérsia, o que atrai, de forma inexorável, a dicção da Súmula 284/STF. 5. É pacífico no STJ o entendimento segundo o qual a verificação do grau de sucumbência de cada parte, para fins de aplicação da norma contida no parágrafo único do art. 21 do CPC, enseja incursão à seara fático-probatória dos autos, vedada pela Súmula 7 desta Corte. 6. Agravo regimental não provido” (STJ, AgRg no Ag n.º 1.383.974/SC, 4.ª Turma, Rel.: Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 13/12/2011) — com destaques não inseridos no texto original. 2. Dos Juros Remuneratórios. De efeito, não obstante a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários desponte como medida inquestionável [Súmula n.º 297 do STJ], ainda assim, a limitação da taxa de juros remuneratórios, fruto da incidência de cláusulas abusivas, tem lugar somente diante de demonstração, manifesta e inequívoca, de ocorrência de excessiva margem de lucro e/ou de implementação de desequilíbrio contratual, caracterizado pela adoção de taxa que comprovadamente destoe, de maneira substancial, da média utilizada no mercado financeiro em operações bancárias de idêntica natureza ou devido a ocorrência de circunstância superveniente que dinamize/acarrete onerosidade excessiva — segundo os preceitos derivados da aplicação da teoria da onerosidade excessiva e quebra da base objetiva do negócio jurídico, idealizadas no art. 6.º, inciso V e no art. 51, inciso IV e § 1.º, ambos da Lei n.º 8.078/1990 e no art. 479 e no art. 480, ambos do Código Civil. A circunstância de a taxa de juros remuneratórios, contratualmente instituída, transpor/superar o modulador paradigma de 12% ao ano, isoladamente considerada, totalmente desamparada de qualquer outro subsídio, não induz, ‘ipso facto’, de forma automática e linear, na caracterização de abusividade do contrato, na exata medida em que desponta, como medida de índole imprescindível, deixar-se evidenciado, segundo as particularidades que permeiam cada caso em concreto, a eventual excessiva onerosidade do pacto, mediante o cotejo da média das taxas de juros praticadas pelo mercado financeiro, da modalidade de contrato, da moderna conjuntura econômica do país, do preço e do risco da operação financeira e dos demais fatores que se agregam à definição da taxa dos juros remuneratórios. Não se pode olvidar/desprezar valor ao fato de que o preço dos juros é obtido mediante a realização de operação aritmética, que se adicionam diversos fatores que integram o custo final do dinheiro, em que se destacam: o custo da captação, a taxa de risco (espelhada pelo risco de inadimplência e que dá azo aos prejuízos que a instituição financeira suporta com os devedores que não pagam ou demoram excessivamente para quitar as suas obrigações), os custos administrativos e tributários e, por derradeiro, o lucro do estabelecimento bancário — objetivo intrínseco à própria natureza da atividade desenvolvida. Nessa mesma linha de raciocínio, a ratificar tal posicionamento, apanha-se do acervo de jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça o seguinte aresto, julgado conforme procedimento previsto para os recursos repetitivos, que versa a respeito de questão que guarda relação de similitude com a que se encontra sob enfoque: “(…) ORIENTAÇÃO 1 – JUROS REMUNERATORIOS. a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mutuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1.º do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (…)” (STJ, REsp n.º 1.061.530/RS, 2.ª Seção, Relatora: Ministra Nancy Andrighi, julgado em 22/10/2008) — com destaques não inseridos no texto original. Pois bem. Compulsando o material cognitivo produzido no processo, deflui-se que o autor não declinou, sequer logrou demonstrar, com um grau mínimo de confiabilidade, a caracterização de qualquer fator que pudesse conduzir à conclusão de que, sobre a normalidade contratual, tenha incidido fato superveniente (de natureza previsível, mas inesperada), causador de desequilíbrio contratual. Entretanto, a polêmica instaurada no processo não se circunscreve ao enfrentamento desta questão, pura e simplesmente. É que, segundo consulta realizada no sistema gerenciador de séries temporais, disponibilizado através do site do Banco Central do Brasil, na época da ultimação do contrato, a taxa média de juros praticada pelo mercado financeiro para as operações de financiamento e concessão de crédito pessoal, para pessoa física, para aquisição de veículos (códigos 25471 e 20749), definiu-se na proporção equivalente a 1,91% ao mês e 25,43% ao ano — disponível na internet no endereço eletrônico: https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores. Levando-se por linha de estima que a taxa de juros remuneratórios, prevista no contrato de empréstimo (o contrato prevê a incidência de juros remuneratórios à taxa mensal de 3,03% e à taxa anual de 43,14%), traduz percentual não-expressivo/não-significativo acima (aproximadamente 58,63% acima — ou seja: menos do que o “dobro” superior) da taxa média de juros praticada no mercado financeiro (que não destoa consideravelmente da taxa divulgada pelo Banco Central) e que dado à total falta de evidências que demonstrem a prática de cobrança abusiva de juros, que exprima a existência de margem extremamente exacerbada e excessiva, deflui-se, por inferência racional, que a cobrança de encargos, durante o período de normalidade do contrato (juros remuneratórios), não reflete e representa cobrança abusiva e também não revela onerosidade excessiva. A jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça tem preconizado que a simples exigência de juros remuneratórios em percentual/patamar superior à taxa média de mercado não induz, de maneira automática, em situação de abusividade, devido a necessidade de observar-se uma faixa razoável para variação de juros, de maneira a exigir-se, para efeito de caracterização da abusividade, a existência de taxa que comprovadamente discrepe, de forma substancial, da média do mercado [cf.: STJ, AgRg no AREsp n.º 425.121/MS, 3.ª Turma, Rel.: Min. Sidnei Beneti, j. 10/12/2013; STJ, AgRg no AREsp n.º 382.628/MS, 3.ª Turma, Rel.: Min. Joao Otávio de Noronha, j. 15/10/2013; STJ, AgRg no Ag n.º 1.354.547/RS, 3.ª Turma, Rel.: Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 06/03/2012]. Por via de consequência, nesse diapasão de ideias, partindo do pressuposto de que a taxa de juros remuneratórios pré-estabelecida, no contrato bancário firmado, não exprime margem/vantagem extremamente exacerbada e/ou excessiva, na medida em que vêm lastreada no risco inerente da operação (que foi instrumentalizada por garantia fiduciária), considero que os juros remuneratórios devem se limitar à discriminação materializada no contrato bancário. 3. Da Cobrança de Taxas e Tarifas Bancárias. Com efeito, fruto da competência/atribuição outorgada ao Conselho Monetário Nacional, para efeito de disciplinar as operações de concessão do crédito, limitar as taxas de juros, descontos, comissões e quaisquer outras formas de remuneração de operações e serviços bancários e financeiros [art. 4.º, incisos VI e IX e art. 9.º, ambos da Lei n.º 4.595/1964], deflui-se que a cobrança de taxas e tarifas, derivada da prestação, por parte de instituições financeiras, de serviços, revela-se, como regra/fórmula geral, legal — desde que a cobrança encontre lastro em norma regulamentar, editada pela autoridade monetária, que permita/autorize a realização da exigência do encargo e, ao mesmo tempo, decorra da pré-existência de previsão expressa no âmbito do contrato —, com a consequência de que a decretação de abusividade/invalidade da cobrança somente tem lugar diante de demonstração, de maneira objetiva e não-questionável, de ocorrência de vantagem exagerada e que acarrete excessiva margem de lucro e desequilíbrio contratual [cf.: STJ, AgRg no REsp n.º 1.302.236/RS, 3.ª Turma, Rel.: Min. Sidnei Beneti, j. em 27/03/2012; STJ, AgRg no REsp n.º 1.003.911/RS, 4.ª Turma, Rel.: Min. João Otávio de Noronha, j. em 04/02/2010; STJ, AgRg no REsp n.º 1.295.860/RS, 4.ª Turma, Rel.: Min. Luis Felipe Salomão, j. em 15/05/2012]. D’outra banda, não se pode perder de perspectiva também, por conveniente, que a cobrança das taxas e tarifas bancárias, devidamente pactuadas e em conformidade com a regulamentação normativa do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central, concretizam a aplicabilidade do princípio da transparência e da boa-fé [art. 4.º ‘caput’ e inciso IV da Lei n.º 8.078/1990 e do art. 422 do Código Civil de 2002] e do dever de informação [art. 6.º, inciso III e art. 46, todos da Lei n.º 8.078/1990], ideia-valor que disciplina as relações de direito privado, visto que tão somente o consumidor/cliente que, efetivamente, contratar cada serviço prestado, por parte do banco, realiza o pagamento da respectiva taxa e tarifa; enquanto que, do contrário, se a remuneração desta tipologia de encargo incorporasse, de maneira embutida, a taxa de juros remuneratórios todos os tomadores de contratos bancários arcariam com o custeio, de maneira genérica e totalmente independente de efetiva utilização do serviço. Nesta toada, diante desta perspectiva, compulsando o contingente probatório produzido no processo, principalmente do conteúdo do documento arquivado no evento n.º 186273897, depreende-se que, no dia 22 de março de 2024, as partes celebraram contrato de mútuo bancário, em que se estipulou a cobrança de “tarifa de cadastro” e “tarifa de avaliação”. Consequentemente, diante desta moldura, tomando-se em consideração que a cobrança das taxas e das tarifas detém expressa previsão no contrato e principalmente porque objetivam remunerar a prestação de serviços administrativos, realizada por parte da instituição financeira — vinculados à prévia pesquisa de aprovação do crédito (Tarifa de Contratação ou de Cadastro) e à avaliação do bem (Tarifa de Avaliação) — e levando-se por linha de estima a pré-existência normativa de hipótese de incidência que valida a cobrança das taxas [art. 3.º, inciso I da Resolução n.º 3.919/2010 do Banco Central do Brasil], depreende-se, por força de proposição lógica, que a incidência da taxa de abertura de cadastro não exprime situação de abusividade/ilegalidade ou ocorrência de vantagem extremamente exacerbada ou excessiva. Nessa mesma linha de raciocínio, a ratificar tal posicionamento, apanha-se do acervo de jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça os seguintes arestos, julgado conforme procedimento previsto para os recursos repetitivos, que versam a respeito de questões que guardam relação de similitude com a que se encontra sob enfoque: “(…) 7. Permanece legítima a estipulação da Tarifa de Cadastro, a qual remunera o serviço de ‘realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao inicio de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósito à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente’ (Tabela anexa à vigente Resolução CMN 3.919/2010, com a redação dada pela Resolução 4.021/2011). (…) - 2ª Tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. (…)” (STJ, REsp n.º 1.251.331/RS, 2.ª Seção, Relatora: Ministra Maria Isabel Gallotti, julgado em 28/08/2013) — com destaques não inseridos no texto original. “RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 958/STJ. DIREITO BANCÁRIO. COBRANÇA POR SERVIÇOS DE TERCEIROS, REGISTRO DO CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. PREVALÊNCIA DAS NORMAS DO DIREITO DO CONSUMIDOR SOBRE A REGULAÇÃO BANCÁRIA. EXISTÊNCIA DE NORMA REGULAMENTAR VEDANDO A COBRANÇA A TÍTULO DE COMISSÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO. DISTINÇÃO ENTRE O CORRESPONDENTE E O TERCEIRO. DESCABIMENTO DA COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO EFETIVAMENTE PRESTADOS. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ABUSIVIDADE DE TARIFAS E DESPESAS EM CADA CASO CONCRETO. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. 3. CASO CONCRETO. 3.1. Aplicação da tese 2.2, declarando-se abusiva, por onerosidade excessiva, a cláusula relativa aos serviços de terceiros ("serviços prestados pela revenda"). 3.2. Aplicação da tese 2.3, mantendo-se hígidas a despesa de registro do contrato e a tarifa de avaliação do bem dado em garantia. 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO” (STJ, REsp n.º 1.578.553/SP, 2.ª Seção, Rel.: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 28/11/2018) — com destaques não inseridos no texto original. 4. Da Cobrança do Seguro. Inspirado no efeito da influência do princípio da liberdade de escolha [art. 6.º, incisos II da Lei n.º 8.078/1990], deduz-se, por inferência racional, que é defeso ao fornecedor que, prevalecendo-se de sua superioridade econômica ou técnica, determina/impõe condições negociais desfavoráveis ao consumidor, ao condicionar o fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço [art. 39, inciso I da Lei n.º 8.078/1990] ou que, o efeito de impingir certo produto ou serviço ao consumidor, se prevalece da sua vulnerabilidade [art. 39, inciso IV da Lei n.º 8.078/1990]. É a vedação à prática abusiva da “venda casada”. Cabe registrar, por ser expressivo desse entendimento, o conteúdo do acórdão julgado em conformidade com o procedimento previsto para os recursos repetitivos, em que o Colendo Superior Tribunal de Justiça afirmou essa diretriz, ao registrar, de forma taxativa, que: “(…) 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1 - Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da despesa com o registro do pré-gravame, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula pactuada no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva. 2.2 - Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada. 2.3 - A abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora. (…)” (STJ, REsp n.º 1.639.259/SP, 2.ª Seção, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 12/12/2018) — com destaques não inseridos no texto original. Pois bem. Compulsando o material cognitivo produzido no processo, deflui-se que subsistem evidências concretas que demonstram que a ultimação do contrato de seguro se operacionalizou como condicionante necessária à consumação do contrato de mútuo principal. É que, ao dissecar, de maneira meticulosa, o conteúdo do contrato de financiamento, é possível divisar que, não obstante o contrato de mútuo matriz e a adesão ao contrato de seguro constem registrados em instrumentos contratuais diversos, não subsistem elementos seguros e mínimos que demonstrem a opcionalidade/facultatividade na contratação do seguro e/ou a possibilidade de optar por qualquer outra seguradora da preferencia do autor/consumidor. Examinando, de maneira meticulosa, o conteúdo do instrumento de contrato de financiamento, verifica-se que a contratação do seguro se consumou, exatamente no mesmo instante da ultimação do contrato de mútuo, no mesmo instrumento contratual, e limitou-se, exclusivamente, ao preenchimento eletrônico (e não-manuscrito ou não-manual) da “opção” pela contratação do seguro, não subsistindo, sequer, outra cláusula contratual, no instrumento, facultando/possibilitando ao consumidor contratar e escolher outra seguradora de sua preferência e escolha e a forma como esta contratação deveria se consumar (o que leva a crer que a adesão ao seguro não foi deixado à escolha do consumidor). Estas circunstâncias indiciárias e elementos informativos, analisados de modo contextualizado, demonstram a inexistência de autonomia e de independência das relações jurídicas negociais (contrato de mútuo e o contrato de seguro) e, ao mesmo tempo, também revelam, que o autor/consumidor não teve a opção de escolher a companhia seguradora de sua preferência. A contratação do seguro, como obrigação acessória do contrato de mútuo, não se consolidou como faculdade do consumidor, tampouco decorreu da autonomia da vontade, o quê denota que a ultimação do contrato de seguro decorreu como condição obrigatória para a concessão do empréstimo/financiamento e, por via de arrastamento, traduz evidente violação à regra proibitiva modelada no conteúdo normativo do art. 39, inciso I da Lei n.º 8.078/1990. 5. Da Repetição do Indébito. Dado à vedação ao enriquecimento ilícito, àquele indivíduo, que foi submetido à cobrança indevida de valores, exceto na situação de engano justificável, desperta o direito de auferir o ressarcimento do valor correspondente ao dobro da quantia que efetivamente quitou, de maneira indevida, independentemente da prova do erro [art. 42, parágrafo único da Lei n.º 8.078/1990; art. 876 do Código Civil; Súmula n.º 322 do STJ]. Por via de consequência, nesse influxo de ideias, partindo do pressuposto de que a cobrança do seguro se consolida como postura indevida e que caracterizou a realização de pagamento indevido, executado pelo requerente, e principalmente porque o tema configura-se como matéria/assunto consolidada no âmbito da jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (o quê desvela a má-fé da instituição financeira requerida, que efetivou a cobrança do encargo de maneira ilegal), penso que a repetição do indébito em dobro em prol do autor, é medida que se impõe. Todavia, afigura-se necessário assinalar, neste ponto, por conveniente, que, não obstante a repetição do indébito desponte como consequência lógica da revisão do contrato bancário e imponha, àquele que recebeu, de maneira indevida, valores, o dever de restituir, não se pode olvidar que, logo em seguida à apuração contábil dos débitos e créditos, como forma de dar-se vazão ao comando normativo do art. 368 e art. 369, ambos do Código Civil e prestar-se reverência ao princípio da efetividade da prestação jurisdicional [art. 4.º do Código de Processo Civil], dado à homogeneidade/fungibilidade das obrigações jurídicas e à reciprocidade das dívidas, deve-se concretizar a compensação dos valores identificados [cf.: STJ, AgRg no EDcl no EDcl no REsp n.º 706.127/RS, 4.ª Turma, Rel.: Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 24/05/2011; STJ, AgRg no Agravo de Instrumento n.º 1.028.568/RS, 4.ª Turma, Rel.: Ministro João Otávio de Noronha, j. em 27/004/2010]. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial por Marcio Torres de Aguiar contra Banco PAN S/A, para a finalidade de: a) Decretar a nulidade da cláusula contratual, prevista no âmbito da cédula de crédito bancário n.º 109077155, e que prevê a cobrança de seguro; b) Condenar a companhia requerida, no pagamento de indenização, por repetição do indébito, no valor equivalente ao dobro da quantia que o requerente efetivamente quitou, fruto da cobrança indevida de seguro, no âmbito da cédula de crédito bancário n.º 109077155, ressalvado o direito à compensação, e, como corolário natural, Determinar a realização de cálculo contábil da dívida, a ser devidamente quantificado em sede de liquidação de sentença, por arbitramento [art. 509, inciso I do Código de Processo Civil], consoante as diretrizes anteriormente difundidas e as demais condições contratuais que restaram incólumes; c) Indeferir os demais requerimentos; d) Declarar encerrada a atividade cognitiva, resolvendo-se o mérito do feito, com supedâneo no art. 487, inciso I do Código de Processo Civil. Pelo princípio da sucumbência, dado à sucumbência parcial [art. 86 do Código de Processo Civil], deverá arcar, o autor, com 80% das custas processuais e a requerida com os demais 20% remanescentes. Com espeque no conteúdo do art. 85, § 2.º do Código de Processo Civil, Condeno o requerente, no pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, fixados no percentual de 10% do valor atribuído à causa e, também, a requerida no pagamento de honorários de advogado, arbitrados na proporção de 10% do valor da condenação, considerando-se a natureza da demanda, o trabalho desenvolvido por parte dos advogados e o lapso de tempo em que o processo tramitou, vedada a possibilidade de compensação [art. 85, § 14.º do Código de Processo Civil]. Fica suspensa a exigibilidade do pagamento das custas judiciais e honorários de advogado, destinadas ao patrono da parte adversa, infligido ao autor, devido à concessão do benefício da assistência judiciária gratuita [art. 98, § 3.º do Código de Processo Civil]. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Sinop/MT, em 6 de junho de 2025. Cristiano dos Santos Fialho, Juiz de Direito.
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