Processo nº 1000663-10.2024.8.11.0033
ID: 257091699
Tribunal: TJMT
Órgão: 1ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 1000663-10.2024.8.11.0033
Data de Disponibilização:
15/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO Processo n° 1000663-10.2024.8.11.0033 SENTENÇA Vistos. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PRECEITO CONDENATÓRIO COM PEDIDO LIMI…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO Processo n° 1000663-10.2024.8.11.0033 SENTENÇA Vistos. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PRECEITO CONDENATÓRIO COM PEDIDO LIMINAR promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em face de CARLOS TADEU PIANTAVINHA, todos devidamente qualificados nos autos. Em síntese, narra a inicial que, no ano de 2019, na propriedade rural denominada Fazenda Santa Bárbara, situada na zona rural de Nova Maringá/MT, pertencente ao requerido, foram destruídos a corte raso 192,95 hectares de floresta nativa em área objeto de especial preservação (bioma amazônico), sem a devida autorização e/ou licença da autoridade ambiental competente. Requereu, em sede de liminar: a) seja decretada a indisponibilidade de bens do demandado, até o valor de R$ 1.226.176,02 (um milhão, duzentos e vinte e seis mil, cento e setenta e seis reais e três centavos); a.1) inclusão de ordem de bloqueio via BacenJud; a.2) inclusão de ordem de bloqueio via RenaJud; a.3) expedição de ofício aos Cartórios de Registro de Imóveis de São José do Rio Claro/MT, Nova Maringá/MT, Lucas do Rio Verde/MT, Diamantino/MT, Nova Mutum/MT, Sorriso/MT, Tapurah/MT e Cuiabá/MT, para que informem a existência de imóveis registrados em nome do requerido e anotem, assim, a sua indisponibilidade; a.4) expedição de ofício ao Banco Central, para que este noticie a decisão de indisponibilidade às instituições financeiras, em face da existência de possíveis aplicações financeiras e/ou investimentos em nome do acionado, exceto se for possível efetivar o bloqueio imediato dos valores depositados em contas bancárias, em montante suficiente para a garantia do ressarcimento do dano ambiental, independentemente de ofício, por intermédio do sistema BacenJud; b) seja decretado o embargo judicial da área degradada e seja imposta obrigação de não fazer (abstenção de praticar atividades lesivas ao meio ambiente), com ordem para que o atual proprietário: b.1) suspenda todas as atividades lesivas ao meio ambiente que estejam sendo realizadas sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, no prazo de 30 [trinta] dias, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00. c) seja imposta obrigação de fazer consistente em recompor a área degradada, com a apresentação à SEMA/MT, no prazo de 90 (noventa) dias, a contar da intimação da decisão liminar, de Plano de Recuperação de Área Degradada – PRADA, que atenda as diretrizes indicadas pelo órgão ambiental, e a implementação/execução do PRA, no prazo de 30 [trinta] dias contados de sua aprovação; d) a cominação de multa diária de R$ 10.000,00 [dez mil reais] para o caso de abstenção do réu em apresentar e/ou implementar o referido projeto, conforme consta do artigo 11 da Lei nº 7.347/1985, a ser recolhida em favor do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá/MT; e) seja oficiado ao Banco Central, com ordem de suspensão da participação do requerido em linhas de financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito, bem como em incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público; f) a inversão do ônus da prova. No mérito, pugnou pela condenação do requerido: a) a promover a recuperação da área degradada, na forma acima indicada [PRADA aprovado pela SEMA/MT e executado no lapso temporal indicado. A cominação de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais), para o caso de abstenção em apresentar e/ou implementar o referido projeto, conforme consta do artigo 11 da Lei nº 7.347/85, a ser recolhida em favor do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá/MT; b) ao pagamento dos danos materiais ambientais não passíveis de recuperação, sendo que o valor deverá ser arbitrado pelo Juiz de acordo com as peculiaridades do caso concreto, no valor de sugestivo de R$ 1.226.176,02 (um milhão, duzentos e vinte e seis mil, cento e setenta e seis reais e três centavos), em favor do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá/MT, ou para financiamento de projetos ambientais, inclusive relacionados à fiscalização ambiental, a serem indicados pelo Ministério Público; c) ao pagamento da indenização a título de compensação pelo dano moral ambiental, em montante não inferior a R$ 1.226.176,02 (um milhão, duzentos e vinte e seis mil, cento e setenta e seis reais e três centavos); d) a perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público; e) a perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito. Pedido liminar deferido apenas quanto à inversão do ônus da prova (ID 153099073). Devidamente citado (ID 169183887), o réu não compareceu à audiência de conciliação (ID 171055697) tampouco apresentou contestação (ID 176143824). Intimado, o Parquet requereu a decretação de revelia e o julgamento antecipado da lide (ID 176188077). Os autos vieram-me conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. De início, DECRETO a revelia do requerido (art. 344 do CPC), em virtude da ausência de contestação (ID 176143824), nos termos do art. 344 do CPC. Sobre a presunção de veracidade, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (in Código de processo civil comentado, 16ª edição revista e ampliada, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016), ao comentar o dispositivo acima referido, discorrem com muita propriedade (p. 1041): Contra o réu revel há a presunção de veracidade dos fatos não contestados. Trata-se de presunção relativa. Os fatos atingidos pelos efeitos da revelia não necessitam de prova (CPC 374 III). Mesmo não podendo o réu fazer prova de fato sobre o qual pesa a presunção de veracidade, como esta é relativa, pelo conjunto probatório pode resultar a comprovação da prova em contrário àquele fato, derrubando a presunção que inicialmente favorecia o autor. Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do mérito. Do mérito Do dever de reparação Os danos ambientais são regidos pela teoria do risco integral, segundo a qual aquele que explora a atividade econômica ocupa a posição de garantidor da preservação ambiental, sendo sempre considerado responsável pelos danos vinculados à atividade, cabendo apenas a demonstração do dano e do nexo de causalidade. Segundo apontam os doutrinadores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[1], o nexo de causalidade é o “que liga o resultado danoso ao agente infrator”, sendo “indispensável para que se possa concluir pela responsabilidade jurídica” do agente. Trata-se, portanto, do “liame que une a conduta do agente (positiva ou negativa) ao dano. Por óbvio, somente se poderá responsabilizar alguém cujo comportamento houvesse dado causa ao prejuízo”[2]. A responsabilidade, em matéria ambiental, é objetiva, de acordo com o art. 14, §1º da Lei nº 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente) e art. 20 da Lei 11.105/2005. No caso em tela, a responsabilidade civil do requerido foi constatada. Isso porque, à época dos fatos, era o possuidor legítimo do imóvel, além de exercer a atividade exploratória da área e auferir lucros com o empreendimento. O Ministro OG Fernandes, relator no julgamento do Recurso Especial nº 1940030 – SP, esclareceu que existem três espécies de reparação do dano ambiental material: “i) primária, que restitui plenamente a natureza ao estado anterior à degradação; ii) complementar, que remedia a natureza pela impossibilidade de plena restauração ao estado anterior, como pela restauração de local alternativo ao danificado; iii) compensatória, que compensa perdas transitórias de recursos ambientais, como aquelas havidas entre a ocorrência do dano e sua efetiva reparação integral”. Nessa perspectiva, “a reparação primária (restituição) será, por definição in natura. Também por definição, sendo primária, é mesmo a preferencial. Somente se inviável sua implementação integral é que haverá hipótese de reparação complementar, pelos danos residuais, permanentes ou definitivos”. In casu, o Auto de Infração nº 20033516 (ID 152854260 - Pág. 5), o Termo de Embargo nº 20034186 (ID 152854260 - Pág. 21) e o Relatório Técnico nº 371/CFFL/SUF/SEMA/2020 (ID 152854260 - Pág. 22) revelam o desmatamento irregular de 192,95 hectares de vegetação nativa em área objeto de especial preservação. Nesse ponto, remanesce a obrigação do réu poluidor em proceder a recomposição da área explorada in natura. Todavia, ainda que o réu proceda com a regeneração da área desmatada, é cabível a indenização pecuniária pelo dano cometido, em razão das perdas transitórias de recursos ambientais. A mera regeneração, natural ou artificial, não é capaz de recompor todos os prejuízos causados ao meio ambiente. Nesse sentido, são os excertos de julgados a seguir colacionados: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DESMATAMENTO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - REGENERAÇÃO NATURAL DA ÁREA - SUBSISTÊNCIA DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - ART. 14, § 1º DA LEI 6.938/81. - Os danos causados ao meio ambiente nunca são reparados pela mera regeneração natural, que deve ser buscada, mas é sempre insuficiente, visto que não cobre os prejuízos causados, por exemplo, à flora e à fauna locais, que são, na verdade, irreparáveis e imensuráveis. - Constatado o desmatamento ilegal de área de preservação permanente, mesmo que a área se encontre em processo de regeneração natural ou artificial subsiste a obrigação de indenizar os danos causados, já que a mera recuperação natural da área não é suficiente para recompor a totalidade dos prejuízos causados ao meio ambiente. Tal indenização tem como parâmetros o dano provocado e a condição financeira do agente. Todas as medidas para possibilitar a mais ampla recuperação da área degradada devem ser tomadas pelo agente poluidor. V.V. (TJ-MG 104000401223110011 MG 1.0400.04.012231-1/001(1), Relator: EDIVALDO GEORGE DOS SANTOS, Data de Julgamento: 01/07/2008, Data de Publicação: 08/08/2008) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DA PARTE DEMONSTRADA – CERCEAMENTO DE DEFESA - NÃO OCORRÊNCIA – PRELIMINAR AFASTADA – DANO AMBIENTAL – SUPRESSÃO DE FLORESTA NATIVA SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE COMPETENTE – COMPROVAÇÃO – FISCALIZAÇÃO PELO IBAMA – AUTO DE INFRAÇÃO – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – OBRIGAÇÃO PROPTER REM – DEVER DE REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA – DANO MORAL COLETIVO – NÃO EVIDENCIADO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não há que se falar em cerceamento de defesa quando as partes, devidamente intimadas, deixam injustificadamente de comparecer à audiência de instrução e julgamento, mormente quando, por se tratar de obrigação propter rem, a demonstração de quem causou o dano em nada alterará o resultado. 2. De acordo com a Súmula nº 623 do STJ, as obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual, mesmo que não tenha contribuído para a deflagração do dano. 3. Os documentos emanados pelos órgãos ambientais, no caso em tela, pelo IBAMA, possuem presunção de veracidade, prevalecendo até prova robusta produzida em contrário. 4. A regeneração natural da área degradada não afasta a responsabilidade do agente causador do dano no tocante à reparação dos danos causados e de não mais degradar. 5. A caracterização do dano moral coletivo, em razão de dano ao meio ambiente, requer a demonstração de que o fato transgressor, ultrapasse a esfera individual do agente, e ultrapasse os limites da tolerabilidade a ponto de produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na comunidade local, situação não visualizada na espécie. (TJ-MT 10004299620178110025 MT, Relator: GILBERTO LOPES BUSSIKI, Data de Julgamento: 10/11/2021, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 24/11/2021) (Grifos apostos) Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme em permitir a condenação do poluidor em indenização pecuniária pelo dano ambiental em conjunto com a obrigação de repará-lo in natura. Vejamos: ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. EDIFICAÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E EM TERRENO DE MARINHA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO E LICENÇAS AMBIENTAIS IMPERIOSAS. REPARAÇÃO INTEGRAL DO DANO AMBIENTAL. MEDIDAS PARA RECUPERAÇÃO E COMPENSAÇÃO PELO PERÍODO EM QUE FORAM DESRESPEITADAS AS NORMAS AMBIENTAIS. CABÍVEL A CUMULAÇÃO DAS CONDENAÇÕES IN CASU. PRECEDENTES. I - Na origem, trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra Márcio Soares da Costa objetivando a demolição de barraca de praia irregularmente construída, por se tratar de área de preservação permanente e terreno de marinha, na Praia de Quixaba, no Município de Aracati/CE, bem como a reparação dos danos ambientais e a condenação ao pagamento de indenização ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. II - A sentença acolheu os pedidos, condenando o réu recuperar a área degradada, com a demolição da edificação irregular e remoção de todos os materiais e entulhos decorrentes de sua ocupação, devendo, para tanto, apresentar Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), bem como indenização pecuniária em favor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. III - O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em sede recursal, reformou a decisão para afastar a condenação à reparação do dano ambiental e indenização imposta, remanescendo, apenas, a condenação com relação à demolição da construção irregular. IV - Em relação à apontada afronta a dispositivos da Lei n. 4.771/1965 e Lei n. 6.938/1981, constata-se que o Tribunal a quo, apesar de consignar acerca da irregularidade da edificação inserida nos limites de área de preservação permanente e em terreno de marinha, que perdura por mais de 30 (trinta) anos, entendeu pela improcedência dos pedidos de reparação do dano ambiental e indenização pecuniária. V - Nesse diapasão, o acórdão objurgado se encontra em dissonância com o entendimento consolidado desta Corte segundo o qual, a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente autoriza a cumulação das condenações supracitadas, porquanto, além de devido o pleito cominatório - a fim de restaurar a área degradada, a indenização in casu não corresponde ao dano a ser reparado, mas aos seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios. VI - Recurso especial provido para restabelecer integralmente a sentença monocrática. (STJ - REsp: 1869672 CE 2020/0078428-0, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 15/09/2020, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/09/2020) (Grifos apostos) Assim, o dever de indenizar subsiste para a área degrada, em virtude da necessidade de total reparação dos danos ambientais causados, sobretudo quanto aos efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios até a completa regeneração. Do quantum indenizatório – dano ambiental material O valor da indenização deve considerar a extensão e o conteúdo do dano causado. No caso em apreço, não há nos autos elementos suficientes para determinar de pronto o montante em pecúnia a título de indenização, devendo o valor ser apurado na fase de liquidação da sentença, por meio de perícia. Esse entendimento está em consonância com a jurisprudência deste Egrégio Tribunal, conforme ementa de julgado transcrita a seguir: EMENTA PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL – RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – IMPUGNAÇÃO – NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL DO ANTIGO PROPRIETÁRIO NA FASE DE CONHECIMENTO – NÃO OCORRÊNCIA – SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL – POSSIBILIDADE – RESPONSABILIDADE PROPTER REM – ALIENAÇÃO NO CURSO DA AÇÃO – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS – NÃO EVIDENCIADA – DÚVIDAS QUANTO À EXTENSÃO DO DANO – NECESSIDADE DE LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA – PROVIMENTO PARCIAL. Não há falar em nulidade da citação por edital do antigo proprietário, na fase de conhecimento, se ficar demonstrado que houve o esgotamento das possibilidades de sua localização pessoal. A responsabilidade pelo dano ambiental tem natureza propter rem e, por isso, mostra-se legítima a substituição do antigo proprietário pelo atual, ainda que na fase de cumprimento da sentença. A alienação do imóvel, no curso da ação, nos termos do artigo 109, § 3o, do CPC, implica reconhecer que os efeitos da sentença transitada em julgado se estendem ao adquirente. Inexiste violação aos princípios do devido processo legal, contraditório, isonomia processual e inafastabilidade da tutela jurisdicional, quando não se analisam os argumentos que visam à rediscussão da coisa julgada. Havendo dúvidas relevantes, no que tange à extensão do dano ambiental, deve ser determinada a realização da liquidação da sentença. (TJ-MT 10212506020218110000 MT, Relator: MARCIO VIDAL, Data de Julgamento: 22/08/2022, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 03/09/2022) (Grifos apostos) Assim, a apuração do quantum indenizatório deve ser realizada em fase posterior, nos termos do art. 509 do CPC. Do dano ambiental moral difuso coletivo O Ministério Público requereu a condenação do requerido em dano moral coletivo. Pois bem. A Ministra Eliana Calmon, relatora no julgamento do Recurso Especial nº 1.269.494 – MG, elucida que o dano moral ambiental “deve ser averiguado de acordo com as características próprias aos interesses difusos e coletivos, distanciando-se quanto aos caracteres próprios das pessoas físicas que compõem determinada coletividade ou grupo determinado ou indeterminado de pessoas, sem olvidar que é a confluência dos valores individuais que dão singularidade ao valor coletivo”. Isso porque, esse tipo de dano extrapatrimonial “atinge direitos de personalidade do grupo ou coletividade enquanto realidade massificada, que a cada dia reclama mais soluções jurídicas para sua proteção. É evidente que uma coletividade pode sofrer ofensa à sua honra, à sua dignidade, à sua boa reputação, à sua história, costumes, tradições e ao seu direito a um meio ambiente salutar para si e seus descendentes. Isso não importa exigir que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado. Essas decorrem do sentimento de participar de determinado grupo ou coletividade, relacionando a própria individualidade à ideia do coletivo”. Dessa forma, não é necessária a demonstração de dor, repulsa ou indignação, tal qual aconteceria no dano moral individual. No presente caso, o desmatamento desordenado e irregular é capaz de causar danos à coletividade. Em relação ao quanto indenizatório, em virtude da impossibilidade de se mensurar a extensão do dano moral, faz-se necessário utilizar critérios objetivos para a fixação do valor devido. Nesse sentido, é a ementa de julgado do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. SÚMULA 284/STF. DANO AMBIENTAL E DEVER DE INDENIZAR. DESMATAMENTO DE FLORESTA NATIVA. SOLIDARIEDADE. LICENÇA OU AUTORIZAÇÃO AMBIENTAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. DANO MORAL COLETIVO. CABIMENTO. CRITÉRIO DO METRO QUADRADO OU HECTARE DEGRADADO. SÚMULA 126 DO STJ. ALÍNEA C. PREJUDICADA 1. Cuida-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso com o fito de condenar o ora recorrente a recuperar a área degradada e ressarcir dano ambiental material e moral coletivo. 2. A Corte de origem entendeu que ficou demonstrado nos autos que o recorrente desmatou área rural sem a devida autorização do IBAMA e que houve dano moral coletivo, existindo, portanto, o dever de indenizar. Rever tal conclusão demanda reexame dos fatos e provas constantes dos autos, o que é vedado ao Recurso Especial, nos termos da Súmula 7/STJ. Licença ou autorização posterior ao dano ambiental causado não o legitima, regulariza ou sana, nem o expurga de ilicitude ou faz as vezes de salvo-conduto retroativo. Ademais, a responsabilidade civil objetiva, ilimitada e solidária pelo dano ambiental impõe-se não só ao proprietário mas também a qualquer um que, direta ou indiretamente, contribua, por ação ou omissão, para a degradação ou dela se beneficie, aí incluídos, em pé de igualdade, posseiro, arrendatário, empreiteiro, madeireiro, transportador ou terceiro sem vínculo jurídico com o bem móvel ou imóvel. 3. Quanto à possibilidade de arbitramento de danos morais coletivos, o acórdão estadual está de acordo com a jurisprudência do STJ, que reconhece o seu cabimento, sem necessidade de avaliação individual ou coletiva de sofrimento. "O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado." (REsp 1269494/MG, Rel.Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 01/10/2013). Em casos de desmatamento, é correto que o juiz utilize, no arbitramento do dano moral coletivo, critério de metro quadrado ou hectare degradado (conforme o modo de comercialização de imóveis na área, p. ex., terrenos urbanos ou rurais) para, em seguida, após a totalização, chegar ao valor final a ser fixado. 4. Recurso Especial não provido. (STJ - REsp: 1555220 MT 2015/0077945-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 20/10/2016, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/08/2020) Também devem ser observados os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade, submetidos ao prudente arbítrio judicial, com observância das peculiaridades inerentes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso concreto, bem assim em consonância com a função sancionatória e pedagógica da reparação. Na hipótese em exame, sopesadas as variáveis elencadas pelo Ministério Público, decorrentes das ações agressoras do réu, quais sejam: desmatamento de área de floresta amazônica nativa, com reincidência no ilícito, reputa-se razoável, na espécie, fixar o valor da indenização a esse título, no montante correspondente a R$ 3.000,00 (três mil reais) por hectare degradado. DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I do CPC, EXTINGO o feito com resolução do mérito e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos autorais, para CONDENAR o réu CARLOS TADEU PIANTAVINHA a reparar integralmente os danos causados ao meio ambiente, nos seguintes termos: 1. Obrigação de fazer - recuperar integralmente área degradada, com a apresentação à SEMA/MT, no prazo de 90 (noventa) dias, a contar da intimação da decisão liminar, de Plano de Recuperação de Área Degradada – PRADA, que atenda as diretrizes indicadas pelo órgão ambiental, e a implementação/execução do PRA, no prazo de 30 [trinta] dias contados de sua aprovação; 2. Pagamento a título de indenização por dano material ambiental, no valor a ser apurado em liquidação de sentença, corrigido conforme súmulas 43 e 54 do STJ, devendo ser depositada a quantia na conta do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá. 3. Pagamento a título de indenização por dano moral coletivo, no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) por hectare degradado, corrigido conforme súmula 362 do STJ, devendo ser depositada a quantia na conta do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá. INTIMESE o Ministério Público. Incabíveis honorários de sucumbência em ações civis públicas propostas pelo Ministério Público. Custas pela parte ré. Interposto recurso de apelação, dê-se vista à(s) parte(s) recorrida(s) para contrarrazões. Após, independentemente de juízo de admissibilidade, REMETAM-SE os autos ao E. Tribunal de Justiça, nos termos do art. 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil. Com o trânsito em julgado, aguarde-se a manifestação das partes pelo prazo de 15 (quinze) dias e, sem a qual, determino que sejam os autos remetidos ao ARQUIVO, com as baixas e anotações necessárias. Cumpra-se, expedindo o necessário e com as cautelas de estilo. São José do Rio Claro – MT, data da assinatura eletrônica. RAISA TAVARES PESSOA NICOLAU Juíza de Direito [1] GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, v. 3: responsabilidade civil, 17. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 144. [2] Idem.
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