Processo nº 1000963-06.2022.8.11.0109
ID: 257059217
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE MARCELÂNDIA
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 1000963-06.2022.8.11.0109
Data de Disponibilização:
15/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GEORGE HEVERTON ANTONIO SILVA
OAB/MT XXXXXX
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LEANDRO JOSE DOS SANTOS
OAB/MT XXXXXX
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JADEIR CANGUSSU NOGUEIRA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE MARCELÂNDIA SENTENÇA Processo: 1000963-06.2022.8.11.0109 Autor: POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO e outros Réu: LUIZ CARLOS DOS SA…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE MARCELÂNDIA SENTENÇA Processo: 1000963-06.2022.8.11.0109 Autor: POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO e outros Réu: LUIZ CARLOS DOS SANTOS e outros I – Relatório O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ofereceu denúncia em face de Luiz Carlos dos Santos e Valdemar Casenote, qualificado nos autos, atribuindo-os a prática do delito previsto no artigo 217-A do CP, por várias vezes, na forma do art. 69 do Código Penal, por terem, segundo consta, praticado a conduta delituosa a seguir descrita, conforme denúncia de id. 104388964: FATO 01 Consta nos autos do inquérito policial incluso que, datas imprecisas, mas comunicadas ao Conselho Tutelar em 21 de julho de 2022, na residência situada na Rua Osvaldo de Souza Aguiar, bairro Vila Esperança, Marcelândia/MT, VALDEMAR CASENOTE, vulgo “Gauchinho”, por diversas vezes, praticou atos libidinosos com Charliane Nunes Figueiredo, menor de 14 (quatorze) anos. Restou apurado que, em meados do primeiro semestre de 2022, na residência situada na Rua Osvaldo de Souza Aguiar, bairro Vila Esperança, Marcelândia/MT, VALDEMAR CASENOTE tentava por vezes aliciar a menor Charliane Nunes Figueiredo, de apenas 8 (oito) anos de idade, fazendo gestos libidinosos, levando a infante para passear sentada no tanque de sua motocicleta, momento em que se aproveitava para tocar na menor, sendo tais fatos presenciados por sua irmã mais velha A. T. N. D. S.. Em determinada ocasião VALDEMAR CASENOTE levou as infantes e a genitora Cirleide da Silva Nunes no Balneário Cachoeirinha, momento que o denunciado, aproveitando-se da ausência de vigilância de outras pessoas, passou por reiteradas vezes as mãos na genitália de Charliane Nunes Figueiredo, fazendo com o que a vítima pegasse em seu pênis por debaixo da roupa. Ato contínuo, em razão dos bárbaros abusos cometidos pelo denunciado, a vítima contou os fatos ao seu genitor (João Silva Figueiredo Junior) que acionou o Conselho Tutelar. Impende registrar que o acusado foi preso preventivamente em conforme decisão prolatada nos autos do processo n. 1000924-09.2022.8.11.0109 – representação por prisão preventiva ajuizada pelo Ministério Público – face ao descumprimento da medida de afastamento das vítimas estabelecida por esse MM. Juízo nos autos da medida cautelar de antecipação de provas autuada sob o n. 1000751-82.2022.8.11.0109. FATO 02 Consta nos autos do inquérito policial incluso que, em datas imprecisas, mas comunicadas ao Conselho Tutelar em 21 de julho de 2022, na residência situada na Rua Osvaldo de Souza Aguiar, bairro Vila Esperança, Marcelândia/MT, LUIZ CARLOS DOS SANTOS, vulgo “Negão” ou “Nego”, praticou contra Charliane Nunes Figueiredo, sem o seu consentimento, ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia, bem como praticou atos libidinosos com A. T. N. D. S., menor de 14 (quatorze) anos. Consoante restou apurado, em meados do primeiro semestre de 2022, na residência situada na Rua Osvaldo de Souza Aguiar, bairro Vila Esperança Marcelândia/MT, o denunciado LUIZ CARLOS DOS SANTOS, frequentador assíduo da residência das infantes, aproveitando-se da ausência de vigilância da genitora Cirleide da Silva Nunes, com a intenção de satisfação de seu desejo sexual, abriu a cortina e ali se manteve parado enquanto a infante Charliane Nunes Figueiredo, com 08 (oito) anos de idade à época dos fatos, trocava de roupa após o banho. Ao perceber sua presença, o acusado fez sinal para que a vítima ficasse em silêncio, contudo, a vítima clamou por sua mãe, cessando, assim, a atividade criminosa do acusado naquele momento. Noutra oportunidade, o acusado LUIZ CARLOS DOS SANTOS, mais uma vez aproveitando-se de oportunidade de distração da genitora, com intuito lascivo, passou a mão nas nádegas da infante A. T. N. D. S. – à época com 12 (doze) anos de idade – sendo imediatamente repreendido pela vítima, cessando a execução criminosa. Nesse contexto, após as informações colhidas pelo Conselho Tutelar, foi realizada a produção antecipada de prova do depoimento especial das vítimas, sob o rito da lei 13.431/17, nos autos do processo n. 1000751- 82.2022.8.11.0109, restando comprovada a prática dos crimes sexuais perpetrados pelos denunciados VALDEMAR CASENOTE e LUIZ CARLOS DOS SANTOS. O denunciado Valdemar Casenote foi preso em razão de decreto prisional determinado nos autos de n. 1000924-09.2022.8.11.0109, no dia 25/10/2022 (id. 103053051, às págs. 46-56). Termo de depoimento especial das vítimas (id 103170712). A denúncia foi recebida na data de 21 de novembro 2022, determinando-se a citação dos acusados para os fins do art. 396 do Código de Processo Penal (id. 104466336). O réu Luiz Carlos dos Santos foi pessoalmente citado em 6 de dezembro de 2022 (id 105658215) e apresentou resposta à acusação (id 107538731), por intermédio de defensor dativo (id. 106273322). Já o réu Valdemar Casenote, citado em 22/11/2022, apresentou resposta à acusação por intermédio de advogado constituído (id 109972954), momento em que o referido patrono renunciou aos poderes. Não havendo quaisquer das causas ensejadoras da absolvição sumária, previstas no art. 397 do Código de Processo Penal, foi determinado o prosseguimento do feito, com a designação de audiência de instrução para colheita da prova oral (id. 110053955). Certidão de nomeação de defensor dativo para representar o réu Valdemar Casenote (id. 111745088). Juntada de procuração de advogado constituído pelo réu Valdemar Casenote (id 113195723). Durante a instrução processual (id. 113767778), foram ouvidas as testemunhas Cirleide da Silva Nunes, João Silva Figueiredo, Ozana Alves e Celia Gomes, bem como realizado os interrogatórios dos réus Valdemar Casenote e Luiz Carlos dos Santos. Após, encerrada a instrução processual foram formulados requerimentos pelas defesas nos seguintes termos: Dr. Jadeir Cangussu requereu a concessão da liberdade provisória de Valdemar Casenote alegando em síntese que neste momento processual não mais subsistem os requisitos ensejadores da segregação cautelar. Por sua vez, a defesa do acusado Luiz Carlos requereu o reconhecimento de pessoas, nos termos do artigo 226 do Código de Processo Penal, alegando-se em síntese que, diante dos depoimentos prestados nesta audiência, paira-se dúvida acerca da identidade do autor dos fatos, pois o acusado Luiz Carlos teria apenas o apelido de “Nego”, já as vítimas e testemunhas se reportaram ao autor de apelido “Negão”, bem como a Conselheira Tutelar teria descrito “um homem moreno e alto” características diferentes da do seu cliente. O Ministério Público anuiu com o pedido formulado pela defesa de Valdemar Casenote, concordando-se com a revogação da prisão preventiva do acusado. Por outro lado, pleiteou pelo indeferimento do pedido formulado pela defesa do outro réu em razão da inadequação do momento processual, bem como pela existência de características indicadas pelas vítimas e testemunhas que não trazem dúvidas acerca da identidade do autor do fato. Em análise aos requerimentos formulados pelas partes, este juízo deferiu o pedido e revogou a prisão preventiva do réu Valdemar Casenote, fixando-se medidas cautelares diversas. Já com relação ao pedido da defesa de Luiz Carlos dos Santos, foi indeferido, uma vez que o acervo probatório teria lhe identificado como sendo o autor dos fatos. Em memoriais finais escritos, o Ministério Público pugnou pela condenação dos acusados, nos exatos termos da exordial acusatória, ou seja, como incurso nas sanções do art. 217-A do Código Penal (id 115390398). A Defesa do réu Valdemar Casenote apresentou alegações finais escritas, ocasião em que requereu a absolvição do acusado por insuficiência de provas para condenação. Subsidiariamente, a desclassificação da conduta para o delito do art. 215-A do CP e, havendo condenação, a fixação da pena no mínimo legal (id 117364753). A defesa técnica do réu Luiz Carlos dos Santos apresentou alegações finais escrita (id 117795141), em que defende a atipicidade da conduta em relação a vítima Charliane Nunes Figueiredo; Absolvição por falta de provas. Subsidiariamente, a desclassificação da conduta para o delito do art. 215-A do CP, e na sua modalidade tentada. Em caso de condenação, a fixação da pena base abaixo do mínimo legal. É o relatório. Decido. II – Fundamentação Não há questões prévias a enfrentar. Presentes os pressupostos de existência válida do processo e condições para o exercício regular do direito de ação penal. Passo ao exame do mérito. II.1 Do delito do art. 217-A do Código Penal imputado a Valdemar Casenote Nos presentes autos, inculpa-se a Valdemar Casenote a prática do crime tipificado no artigo 217-A do Código Penal, in verbis: Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. A materialidade e autoria do crime encontram-se plenamente satisfeitas pelo boletim de ocorrência (id. 103053051, às págs. 3-4); ofício n. 190/2022, oriundo do Conselho Tutelar de Marcelândia/MT (id. 103053051, às págs. 14-21); cópia integral da medida cautelar de produção antecipada de provas (id. 103053051, às págs. 32-52; e id 103170712); além da prova oral produzida em Juízo. Em sede de depoimento especial, as vítimas declararam o seguinte com relação ao réu Valdemar Casenote, vulgo “gauchinho”: C. N. F., disse que o Gauchinho mexeu com ela. Ele é amigo da mãe dela e um dia foram para o rio, para cachoeirinha, tomar banho e que ele as levou. Que ela queria tomar banho e ele mexeu com ela dentro do rio, com a mão. Que teria pego em suas partes íntimas, mostrando para a psicóloga o local (tendo a profissional confirmado ser a sua parte íntima). O réu teria tocado com as mãos, não por muito tempo, por cima do seu biquini, além de ter colocado a mão da vítima na parte íntima dele, por baixo da roupa. Que ele pediu para ela não contar para ninguém, mas ela disse que iria falar. Que a mãe e a irmã estavam na cachoeirinha, mas elas não viram. A irmã estava de costas e a mãe longe. A. T. N. da S., irmã da vítima, relatou que conhece o Gauchinho, que ele era amigo da sua mãe e frequentava a residência. Que ele lhe tratava bem e não chegou a fazer alguma coisa com ela. Que ele deve ter feito alguma coisa com a irmã dela, que ele ficava olhando entre as pernas da Charliane quando ela sentava de vestido. Que dizia para ele parar de olhar, que a mãe delas iria brigar com ele. Que ele levou elas para o rio, umas três vezes. Que só iam ela, a irmã, a mãe e o Gauchinho. Que em uma das vezes a sua irmã pediu para ele ensinar ela a nadar, mas que ela não sabe o que houve, que estava do outro lado do rio. Que a mãe delas estava dentro d’água também, e a água era escura. Que ele estava ensinando a Charliene a nadar, mas foi por pouco tempo. Que ele é muito saliente e fica fazendo sinais para a irmã dela e chamando as meninas para ir para o mato. Que o Gauchinho disse pra ela que se a irmã não tivesse feito aquilo com ele, ele ia dar uma bicicleta pra ela, que era para ela falar que era tudo mentira, mais de uma vez. Em juízo, a genitora das vítimas, Cirleide da Silva Nunes, disse que o Gauchinho foi na casa dela, após a polícia intimar eles para o interrogatório, e falou que se as meninas falassem que era mentira, para não dar pesado, ele ia dar três bicicletas. Que no dia dos fatos, o Gauchinho a levou para o rio, juntamente com as meninas. Que ficaram o tempo todo lá dentro do rio tomando banho. Que viu o acusado ensinando a filha a nadar, pegou ela no colo, ela batendo os pés, ele com a mão na região do peitoral e com a outra mão entre meio das pernas dela (vítima) ensinando-a nadar, mas que não suspeitou de nada. Que soube do ocorrido após o pai dela levar ela no Conselho Tutelar. Que não se recorda se a filha disse para ela no momento do banho se ele tinha pego nas partes íntimas dela. Que depois disso, soube de outras situações envolvendo o Gauchinho. Que foi o próprio acusado quem chamou elas para ir ao rio, e que não foi a primeira vez. Que quando estavam todos dentro do rio se banhando, ela estava de roupa. As testemunhas Ozana Alves e Celia Gomes, conselheiras tutelares (à época) em que ocorridos os fatos, confirmaram em juízo as declarações das vítimas constantes do relatório existente nos autos. Ainda, que a vítima foi ouvida após insistência do pai, que estava indignado com o narrado. Que fizeram o acompanhamento familiar posteriormente. O genitor da vítima, João Silva Figueiredo Junior, disse que soube dos fatos pela filha. Que ante a insistência dela de que ele continuava, ele a levou no conselho. Que soube dos detalhes dos fatos pelo conselho tutelar. Por sua vez, o réu Valdemar Casenote, vulgo “gauchinho", interrogado em juízo, negou os fatos. Disse que foi a genitora da vítima quem pediu para ele as levar no rio. Que a vítima, no rio, ficou lhe pedindo dinheiro e ele negando. Que a mãe das crianças, Cirleide, teria alertado ele que elas iriam “falar coisa”. Que não teria entrado na água para tomar banho, apenas elas. Afirma que essa história foi inventada por não ter dado dinheiro para a mãe e para a filha. Que frequentou a casa da Cirleide umas quatro vezes. Negou ainda ter oferecido as bicicletas para que as crianças não falassem nada, e que, na verdade, a mãe é quem teria solicitado que ele comprasse a bicicleta para pagar a ele aos poucos. Que depois do banho, levou as crianças e a mãe para casa. Que a mãe esteve a todo o momento por perto. O réu Luiz Carlos dos Santos, interrogado em juízo, em nada acrescentou ao deslinde dos fatos imputados ao acusado Valdemar. Sendo essas as provas colhidas, ficou demonstrado que o réu Valdemar Casenote, vulgo “gauchinho", agindo de forma ardil contra criança, que naturalmente não possui capacidade de se defender e entender a gravidade do ato, praticou atos libidinosos contra ela, consistente em carícias e manipulação dos órgãos genitais, e de também colocar a mão da vítima em seu órgão genital, em pelo menos uma ocasião. O réu se aproveitou do momento em que a criança teria pedido auxílio para nadar e em que estava sozinho com a vítima. Ao final, teria dito para a criança não contar para ninguém, de modo a manter suas atitudes em sigilo e impedir que suas ação fosse descortinada. A irmã da vítima Charliane, já teria notado os olhares do réu para as partes íntimas da vítima quando estava de vestido e sentava-se sem shorts, inclusive repreendendo-o. As declarações extrajudiciais prestadas pela vítima, além de guardar uma acentuada harmonia quanto ao ocorrido, chama a atenção por descrever com uma impressionante riqueza de detalhes os acontecimentos, os quais convencem acerca da efetiva ocorrência do crime e sua autoria. Por outro lado, a versão do réu não guarda coerência com as demais provas, notadamente acerca do seu ingresso no rio para se banhar com as meninas, auxiliando a vítima a nadar e, neste momento, cometido o ato objeto desta ação. Nesse ponto, a mãe da vítima, Sra. Cirleide, disse expressamente que viu o réu com a mão entre as pernas da criança. Como se sabe, em se tratando de crimes sexuais, nos quais o agente atua, em regra, na surdina, sem a presença de testemunhas oculares, a palavra da vítima assume relevância fundamental na formação do convencimento judicial, mormente quando marcada pela riqueza de detalhes e pela coerência com os demais elementos de provas coligidos no processo, hipótese dos autos. Acerca do valor do depoimento da vítima na apuração de crimes contra a dignidade sexual assim já se manifestou o STJ: REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PALAVRA DA VÍTIMA. RELEVANTE IMPORTÂNCIA. ABSOLVIÇÃO OU DECOTE DO RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. O Tribunal local, ao analisar os elementos constantes nos autos, entendeu pela ratificação da decisão de primeira instância que condenou o ora agravante pelo crime de estupro de vulnerável em continuidade delitiva. 2. A pretensão de desconstituir o julgado por suposta contrariedade à lei federal, pugnando pela absolvição ou o mero redimensionamento da pena referente à continuidade delitiva não encontra campo na via eleita, dada a necessidade de revolvimento do material probante, procedimento de análise vedado a esta Corte Superior de Justiça, a teor da Súmula 7/STJ. 3. Este Sodalício há muito firmou jurisprudência no sentido de que, nos crimes contra a dignidade sexual, a palavra da vítima adquire especial importância, mormente porque quase sempre ocorrem na clandestinidade. 4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no AREsp: 578515 PR 2014/0228247-4, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 18/11/2014, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/11/2014) Chama atenção a forma como a vítima narrou e reafirmou os fatos, inexistindo elementos que indiquem que esteja mentindo e/ou fantasiando. Ainda, não se pode esquecer que o relatório do Conselho Tutelar de Marcelândia/MT dá conta que a vítima, relacionou com os mesmos detalhes a situação narrada em seu depoimento especial; que a criança tinha medo de sua mãe, não querendo que fosse contado para ela, além de ter pedido que o carro do conselho passasse devagar na rua da sua casa, para que desse tempo de fazer um gesto caso precisasse de ajuda. Assim, o fato de a criança não ter relatado nada para a genitora no mesmo momento em que os fatos ocorreram, não os desqualificam e/ou os tornam falsos. Os atos libidinosos praticados pelo réu (carícias e manipulação da genitália da vítima) e de forçar que a vítima pegasse na sua genitália, não deixam qualquer vestígio identificável por prova pericial, devendo-se se valer, para sua constatação, das demais provas produzidas nos autos. Portanto, tem-se que o depoimento da vítima não está solitário, pois há também as declarações das informantes/testemunhas de acusação e o relatório do Conselho Tutelar que corroboram sua fala. A conduta é típica e está prevista no artigo 217-A, caput, do Código Penal. Dessa forma, após a devida instrução processual, não há dúvidas de que o réu Valdemar Casenote, vulgo “gauchinho", consciente da ilicitude e com vontade de praticá-la, cometeu as condutas delitivas a ele atribuída na inicial acusatória em face da vítima Charliane Nunes Figueiredo, havendo provas suficientes para a condenação pela prática do art. 217-A do Código Penal. II.2 Do delito do art. 217-A do Código Penal imputado a Luiz Carlos dos Santos Nos presentes autos, inculpa-se a Luiz Carlos dos Santos a prática do crime tipificado no artigo 217-A do Código Penal, in verbis: Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. A materialidade e autoria do crime encontram-se plenamente satisfeitas pelo boletim de ocorrência (id. 103053051, às págs. 3-4); ofício n. 190/2022, oriundo do Conselho Tutelar de Marcelândia/MT (id. 103053051, às págs. 14-21); cópia integral da medida cautelar de produção antecipada de provas (id. 103053051, às págs. 32-52; e id 103170712); além da prova oral produzida em Juízo. Em sede de depoimento especial, as vítimas declararam o seguinte com relação ao réu Luiz Carlos dos Santos, vulgo “Negão”: A. T. N. da S., relatou que sua irmã, Charliane, lhe falou que o acusado “Negão” entrou dentro do quarto e olhou ela nua. Que sua irmã mandou ele sair; Que sua irmã teria chamado a mãe, mas ela estava no banheiro, e então foi lá e o encontrou na saída do banheiro, tendo dito “para ele tomar vergonha na cara dele”. Relata que não viu ele olhando para a sua irmã, mas que ele falou para ela calar a boca. Disse que o réu estava perto do pano que a mãe coloca no quarto, parecendo uma cortina. Afirma que sua irmã estava realmente se trocando e ficou com ela no quarto, enquanto ele saiu sem falar nada. Relatou também que o réu a tratava bem, mas em outro momento, quando ela estava passando na porta, bateu em sua bunda, tendo dito para ele “toma vergonha na sua cara”. Que então o acusado disse para ela não contar para a sua mãe, mas que ela falou. Que ele só fez isso essa vez. Que a mãe delas falou com ele e disse para ele não ir mais lá. C. N. F., também vítima, disse que conhece o Negão e viu ele bater na bunda da irmã dela (Aynara), na sua casa. Declarou também que, após tomar banho, ela estava se trocando e ele abriu a cortina e pediu para ela não falar nada, mas que gritou por sua mãe. Que estava sozinha se trocando, a irmã estava no banho. Que a irmã foi até lá e mandou ele sair. Em juízo, a genitora das vítimas, Cirleide da Silva Nunes, disse conhecer o Negão da rua em que mora e que ele frequentava pouco o imóvel. Que tinha recordação sobre o fato do tapa na bunda da sua filha, dado pelo Negão. Disse também que conheceu o réu Luiz Carlos pelo apelido de Negão. Que tem outros conhecidos com esse apelido, mas que não passou pela sua cabeça outro, uma vez que a filha disse que era o Negão sem dente, e o réu não tem dente na frente. Que o chama de Negão e ele lhe escuta. Afirma que sua filha Aynara lhe contou que foi passando e o Negão deu um tapa em sua bunda. Que só teve conhecimento dos fatos com a Aynara, que bateu na bunda dela, não com a Charliane. As testemunhas Ozana Alves e Celia Gomes, conselheiras tutelares (à época) em que ocorridos os fatos, confirmaram em juízo as declarações das vítimas constantes do relatório existente nos autos. Ainda, que as vítimas foram ouvidas após insistência do pai, que estava indignado com o narrado. Que fizeram o acompanhamento familiar posteriormente. Por sua vez, o réu Luiz Carlos dos Santos, vulgo “Negão, interrogado em juízo, negou os fatos. Disse que quando frequentava a residência da mãe da vítima, ficava do lado de fora e sempre pedia permissão para entrar e ir ao banheiro. Que imagina que essas conversas foram inventadas pelo pai das crianças, que não gostava dele. Negou ter apertado a bunda da Aynara, tendo em vista que quando ia na residência da Cirleide, a Aynara não estava, porque ela estudava o dia inteiro e só voltava 17h. Que quando ia lá só estavam as duas pequenas e não a maior. Depois, relatou que só viu duas vezes a criança maior no local, e que ia só algumas vezes por lá. Confirmou que não tem os dentes na frente. Sendo essas as provas colhidas, ficou demonstrado que o réu Luiz Carlos dos Santos, vulgo “Negão”, agindo de forma ardil contra criança, que naturalmente não possui capacidade de se defender e entender a gravidade do ato, praticou atos libidinosos contra ela, consistente em observar a vítima (Charliane) nua se trocar; e ter batido na bunda da outra criança (Aynara), quando esta passou em sua frente, em momentos diferentes. Em ambas situações, pediu que as vítimas não contassem para ninguém, de modo a manter suas atitudes em sigilo e impedir que suas ação fossem descortinadas. As declarações extrajudiciais prestadas pelas vítimas, além de guardar uma acentuada harmonia quanto ao ocorrido, chama a atenção por descrever com uma impressionante riqueza de detalhes os acontecimentos, os quais convencem acerca da efetiva ocorrência do crime e sua autoria. Por outro lado, a versão do réu não guarda coerência com as demais provas, notadamente acerca do seu contato/convívio com as vítimas e o seu ingresso na residência. Inclusive, foi contraditório ao, inicialmente, afirmar que a vítima maior (Aynara) nunca estava lá quando ele ia no imóvel e, posteriormente, afirmado ter encontrado com ela duas vezes no local, embora tenha mantido a negativa dos atos. Como se sabe, em se tratando de crimes sexuais, nos quais o agente atua, em regra, na surdina, sem a presença de testemunhas oculares, a palavra da vítima assume relevância fundamental na formação do convencimento judicial, mormente quando marcada pela riqueza de detalhes e pela coerência com os demais elementos de provas coligidos no processo, hipótese dos autos. Acerca do valor do depoimento da vítima na apuração de crimes contra a dignidade sexual assim já se manifestou o STJ, consoante já colacionado acima. Chama atenção a forma como as vítimas narraram e reafirmaram os fatos, inexistindo elementos que indiquem que estejam mentindo e/ou fantasiando. Os atos libidinosos praticados pelo réu [tocar a parte íntima (“bunda”) da criança e observar a outra, nua, enquanto se trocava], não deixam qualquer vestígio identificável por prova pericial, devendo-se se valer, para sua constatação, das demais provas produzidas nos autos. Nesse aspecto, o STJ, em precedente obrigatório (Tema Repetitivo 1121), assevera que “Presente o dolo específico de satisfazer à lascívia, própria ou de terceiro, a prática de ato libidinoso com menor de 14 anos configura o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), independentemente da ligeireza ou da superficialidade da conduta, não sendo possível a desclassificação para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP)” (grifo nosso). Ainda, “o delito de estupro de vulnerável prescinde de contato físico entre o agente e a vítima, bastando a prática de atos libidinosos que comprometam a dignidade sexual do menor, ainda que por meio virtual” (AgRg no AREsp n. 2.775.572/MG, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 18/2/2025, DJEN de 25/2/2025.). O mero ato de ter o réu puxado a cortina para observar a criança nua se trocar, presente o dolo de satisfazer à lascívia, basta à configuração da infração penal. Por esses motivos, a tese defensiva de desclassificação para o delito de importunação sexual (art. 215 do CP) ou mesmo para considerar a forma tentada do delito não prosperam, porquanto preenchidos integralmente os elementos do tipo penal do art. 217-A do CP. Portanto, tem-se que o depoimento das vítimas não estão solitários, pois há também as declarações das informantes/testemunhas de acusação e o relatório do Conselho Tutelar que corroboram suas falas. A conduta é típica e está prevista no artigo 217-A, caput, do Código Penal. Dessa forma, após a devida instrução processual, não há dúvidas de que o réu Luiz Carlos dos Santos, vulgo “Negão”, consciente da ilicitude e com vontade de praticá-la, cometeu as condutas delitivas a ele atribuída na inicial acusatória em face das vítimas Charliane Nunes Figueiredo (1 vez), à época com 8 anos de idade, e A. T. N. D. S. (1 vez), à época com 12 anos de idade, havendo provas suficientes para a condenação pela prática do art. 217-A do Código Penal. II.3 Do concurso de crimes Por derradeiro, passo a analisar a hipótese de concurso material ventilada pelo Ministério Público. Restou inconteste no conjunto probatório, principalmente pelo depoimento da própria vítima, que os fatos ocorreram, pelo menos, duas vezes: a) a primeira, quando o réu passou a mão na nádega da infante A. T. N. da S; b) na segunda vez, o réu Luiz Carlos dos Santos, teria puxado a cortina para ver a criança C. N. F nua, enquanto trocava de roupas, após o banho. Os delitos cometidos possuem a mesma natureza, ou seja, tratam-se de crimes contra a dignidade sexual; tem-se que os fatos se deram em período de tempo próximo, conforme relato das vítimas, em que se constata que as condições de tempo entre os crimes são semelhantes; todos os crimes ocorreram no Município de Marcelândia/MT, no interior da residência onde as vítimas moravam, e era frequentada pelo acusado; e, por fim, no tocante à maneira de execução, constata-se que o réu agiu de forma semelhante em todos os casos, aproveitando-se da ingenuidade e do isolamento com as crianças, uma vez que a genitora não estava por perto quando executados os atos. Além das condições objetivas acima analisadas, constata-se também a unidade de desígnio nas condutas delituosas praticadas pelo acusado, denotando o prolongamento de um crime no outro, ficando, portanto, evidente a continuidade delitiva. Em que pese os atos terem sido cometidos em face de vítimas diferentes, o STJ entende pela aplicação da continuidade delitiva se presentes os requisitos, ainda que diversas as vítimas. Na hipótese, inclusive, cabível a continuidade delitiva simples, porquanto desprovidos de violência real, contando apenas com a presunção absoluta e legal de violência do próprio delito. Confira-se: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ESTUPROS DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA. PLEITO DE APLICAÇÃO DO ART. 215-A, DO CP. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA ESPECÍFICA. PROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE VIOLÊNCIA REAL. QUANTUM DE AUMENTO PELA CONTINUIDADE DELITIVA COMUM. NÚMERO DE DELITOS. FRAÇÃO DE 2/3. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO.- O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento firmado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, não tem admitido a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso próprio, prestigiando o sistema recursal ao tempo que preserva a importância e a utilidade do habeas corpus, visto permitir a concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.- A tese de que as condutas do paciente devem ser examinadas sob a ótica do novo art. 215-A, do Código Penal, é aventada, pela primeira vez, no presente writ, não havendo manifestação do juiz singular e da Corte de origem sobre a matéria. Em casos como o presente, entende-se que este Superior Tribunal de Justiça não deve se pronunciar, originariamente, sobre a questão, sendo vedada a supressão de instância.- O crime continuado é benefício penal, modalidade de concurso de crimes, que, por ficção legal, consagra unidade incindível entre os crimes que o formam, para fins específicos de aplicação da pena.Para a sua aplicação, o art. 71, caput, do Código Penal exige, concomitantemente, três requisitos objetivos: I) pluralidade de condutas; II) pluralidade de crimes da mesma espécie; e III) condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes.- A continuidade delitiva específica, descrita no art. 71, parágrafo único, do Código Penal, além daqueles exigidos para a aplicação do benefício penal da continuidade delitiva simples, exige que os crimes praticados: I) sejam dolosos; II) realizados contra vítimas diferentes; e III) cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa.- No caso em tela, os atos libidinosos praticados contra as vítimas vulneráveis foram desprovidos de qualquer violência real, contando apenas com a presunção absoluta e legal de violência do próprio tipo delitivo.- 'A violência de que trata a continuidade delitiva especial (art.71, parágrafo único, do Código Penal) é real, sendo inviável aplicar limites mais gravosos do benefício penal da continuidade delitiva com base, exclusivamente, na ficção jurídica de violência do legislador utilizada para criar o tipo penal de estupro de vulnerável, se efetivamente a conjunção carnal ou ato libidinoso executado contra vulnerável foi desprovido de qualquer violência real [...]' (HC 232.709/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 25/10/2016, DJe 09/11/2016).- Esta Corte Superior firmou a compreensão de que o aumento no crime continuado comum é determinado em função da quantidade de delitos cometidos.- Assim, no caso, tendo sido cometidos crimes de estupro de vulnerável, com violência presumida, contra 8 vítimas diferentes, incide a continuidade delitiva simples, devendo ser aplicado o aumento de 2/3, que resulta na reprimenda definitiva de 13 anos e 4 meses de reclusão.- Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para reduzir a pena do paciente ao novo patamar de 13 anos e 4 meses de reclusão, mantidos os demais termos da condenação.(HC n. 483.468/GO, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 5/2/2019, DJe de 14/2/2019.) Frise-se, que o aumento deve ser na fração de 1/6, em atenção ao número de delitos perpetrados pelo acusado (dois crimes), na linha do entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça: Súmula 659-STJ: A fração de aumento em razão da prática de crime continuado deve ser fixada de acordo com o número de delitos cometidos, aplicando-se 1/6 pela prática de duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais infrações. Embora o representante do órgão ministerial tenha pugnado pela aplicação do concurso material (art. 69 do CP), mas levando em consideração a unidade de desígnios, requisitos de tempo e lugar, é notória a incidência da ficção jurídica da continuidade delitiva ao acusado Luiz Carlos dos Santos, vulgo “Negão”. III – Dispositivo Ante ao exposto, e por tudo mais que dos autos consta, julgo procedente a pretensão punitiva contida na denúncia, para o fim de: a) condenar o acusado Luiz Carlos dos Santos como incurso nas penas do art. 217-A do CP, por duas vezes, na forma do art. 71, caput, do CP; e b) condenar o acusado Valdemar Casenote como incurso nas penas do art. 217-A do CP. IV – Dosimetria da pena Nos termos do artigo 68 do Código Penal, passo a dosar a pena a ser aplicada ao réu. Do réu Valdemar Casenote Valdemar Casenote é plenamente imputável e possuía total consciência da ilicitude do seu agir, o que lhe exigia um comportamento diverso do empreendido, restando presentes os elementos da culpabilidade; o grau de reprovabilidade de sua conduta é adequado à espécie delitiva. Quanto aos antecedentes, o réu é primário e portador de bons antecedentes. Não há informações suficientes para aferir sobre a conduta social do acusado. Inexistem nos autos quaisquer elementos aptos a permitir uma análise acurada acerca de sua personalidade, que depende de laudo específico para tanto. Quanto aos motivos, agiu pelo desejo de satisfazer suas necessidades sexuais, como geralmente acontece nos crimes sexuais. As circunstâncias do crime não fogem além das já previstas pelo legislador. As consequências do crime são inerentes à espécie delitiva e já consideradas quando da tipificação. Por fim, a vítima em nada contribuiu para a prática dos delitos. O delito do artigo 217-A do Código Penal prevê pena de reclusão de 8 a 15 anos. Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, e não sendo nenhuma delas desfavorável, fixo ao réu, na primeira fase, a pena de 8 anos de reclusão. Na segunda fase, não verifico a presença das agravantes e/ou atenuantes, de modo que mantenho a pena no mínimo legal. Na terceira fase, não há causas de aumento ou de diminuição de pena. Assim, à míngua de outras circunstâncias modificativas, torno a pena definitiva, em 8 anos de reclusão. Do réu Luiz Carlos dos Santos Luiz Carlos dos Santos é plenamente imputável e possuía total consciência da ilicitude do seu agir, o que lhe exigia um comportamento diverso do empreendido, restando presentes os elementos da culpabilidade; o grau de reprovabilidade de sua conduta é adequado à espécie delitiva, nos dois crimes. Quanto aos antecedentes, o réu é primário e portador de bons antecedentes. Não há informações suficientes para aferir sobre a conduta social do acusado. Inexistem nos autos quaisquer elementos aptos a permitir uma análise acurada acerca de sua personalidade, que depende de laudo específico para tanto. Quanto aos motivos, nos quatros delitos, agiu pelo desejo de satisfazer suas necessidades sexuais, como geralmente acontece nos crimes sexuais. As circunstâncias dos dois crimes não fogem além das já previstas pelo legislador. As consequências dos dois crimes são inerentes à espécie delitiva e já consideradas quando da tipificação. Por fim, a vítima em nada contribuiu para a prática dos delitos. O delito do artigo 217-A do Código Penal prevê pena de reclusão de 8 a 15 anos. Ante a similitude dos crimes e de suas circunstâncias, passarei a dosar as penas de forma conjunta: Analisadas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, e não sendo nenhuma delas desfavorável, fixo ao réu, para cada um dos dois delitos de estupro de vulnerável, na primeira fase, a pena de 8 anos de reclusão. Na segunda fase, não verifico a presença das agravantes e/ou atenuantes, de modo que mantenho a pena no mínimo legal. Na terceira fase, não há causas de aumento ou de diminuição de pena. Assim, à míngua de outras circunstâncias modificativas, torno a pena definitiva, para cada um dos dois crimes de estupro de vulnerável, em 8 anos de reclusão. Em atenção à regra estabelecida pelo artigo 71, caput, do Código Penal, que prevê a continuidade delitiva, aplico a pena de um só dos crimes, por serem idênticas, majorada em 1/6, nos termos da fundamentação, fração que perfaz 1 ano e 4 meses de reclusão, tornando-a definitiva em 9 anos e 4 meses de reclusão. IV.1 Do regime inicial Considerando a quantidade de pena aplicada e observado, ainda, o artigo 33, §1º, “a” e “b”, do Código Penal, estabeleço ao réu Luiz Carlos dos Santos o regime inicial fechado para o cumprimento da reprimenda ao réu; e o regime semiaberto ao réu Valdemar Casenote. IV.2 Da detração Não há detração a considerar, pois, aplicando o art. 387, §2º, do CPP, não haverá alteração do regime inicial. Tal deverá ser feito na execução da pena. IV.3 Da substituição e suspensão condicional da pena Impossível a substituição da pena privativa de liberdade imposta por restritiva de direitos, uma vez que a pena extrapola o patamar de 4 anos, não atendendo, portanto, aos requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal. Da mesma forma, inaplicável a suspensão condicional da pena, prevista no artigo 77 do Código Penal, pois a pena privativa de liberdade extrapola o patamar de 2 anos, o que inviabiliza a concessão do benefício. V – Disposições finais Condeno os réus ao pagamento das custas processuais (art. 804, CPP). Deixo de fixar valor mínimo para reparação de danos (art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal), visto que não houve comprovação de dano material sofrido pela vítima, mediante contraditório, sem se olvidar que não há requerimento específico do Ministério Público nesse sentido, devendo a questão ser dirimida no juízo cível. Comuniquem-se as vítimas, por meio de seu responsável legal, acerca da prolação desta sentença, a fim de atender o disposto no artigo 201, §2º, do Código de Processo Penal. Confiro a possibilidade de os réus recorrerem em liberdade, uma vez que respondeu em liberdade à parte final do processo sem incidentes após a revogação da preventiva (Valdemar Casenote) e Luiz Carlos dos Santos respondeu integralmente em liberdade. Ausentes, portanto, os requisitos do art. 312 do CPP. Após o trânsito em julgado, comuniquem-se ao Instituto de Identificação e ao Cartório Distribuidor, nos termos do Código de Normas; comunique-se também a Justiça Eleitoral, para fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal; calculem-se as custas processuais; e expeça-se a competente guia de recolhimento definitiva. Com o cálculo das custas processuais, intime-se o réu para pagamento, no prazo de 10 dias, conforme a disposição do artigo 686 do Código de Processo Penal, advertindo-o acerca da possibilidade de protesto e execução, caso não o faça. Arbitro a título de honorários advocatícios ao defensor dativo nomeado, Dr. Leandro José dos Santos (OAB/MT 25.906-O), o montante de 3 URHs, concernente à defesa em processo de ordinário e observado os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Tal quantia deverá ser suportada pelo Estado de Mato Grosso. Expeça-se a competente certidão. Publicação e registro automáticos. Intimem-se, observando o artigo 392 do Código de Processo Penal. Cumpridas as diligências necessárias, arquive-se. Marcelândia/MT, datado eletronicamente. Louísa Rachel Medeiros Florentino Imperador Juíza Substituta
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