Processo nº 0805967-05.2024.8.20.5600
ID: 339107228
Tribunal: TJRN
Órgão: 2ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 0805967-05.2024.8.20.5600
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GIDEAO MARROCOS SILVA
OAB/RN XXXXXX
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FRANCISCO DE ASSIS DA SILVA
OAB/RN XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 2ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró Alameda das Carnaubeiras, 355, Presidente Costa e Silva, MOSSORÓ - RN - CEP: 59625-410 Contato: (84) 36739885 …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 2ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró Alameda das Carnaubeiras, 355, Presidente Costa e Silva, MOSSORÓ - RN - CEP: 59625-410 Contato: (84) 36739885 - Email: mrosucri@tjrn.jus.br Processo nº:0805967-05.2024.8.20.5600 Autor: Delegacia Especializada de Defesa da Propriedade de Veículos e Cargas de Mossoró (DEPROV-Mossoró) e outros Réu: EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS e outros SENTENÇA Vistos, etc., I. RELATÓRIO Trata o presente feito de ação penal pública incondicionada ajuizada pelo Ministério Público Estadual imputando a acusada EMILLY VITÓRIA DA COSTA MORAIS, pela prática dos crimes tipificados nos artigos 33, caput, 35 da Lei 11.343/2006, e MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA, pela prática dos crimes tipificados nos artigos 33, caput, e 35 da Lei 11.343/06 e artigo 180, § 1º, do Código Penal. Aduz a inicial acusatória (ID 140087129) que: “Os denunciados Emilly Vitória da Costa Morais e Marcos Mateus Santana de Lima, no dia 13 de novembro de 2024, por volta das 10h30, em residência situada na Rua Travessa Ferreira Néo, 161, nesta cidade de Mossoró-RN, estavam associados para o tráfico de drogas e, de fato, guardavam drogas para a disseminação, sem autorização e em desacordo com determinação legal. Além disso, o denunciado Marcos Mateus, na mesma ocasião e lugar, ocultava, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime. As drogas apreendidas foram cocaína, distribuída em 6 (seis) papelotes, em um total de 3 g (três gramas), e maconha, fracionada em 26 (vinte e seis) porções, no total de 313 g (trezentos e treze gramas), conforme consignado no laudo pericial (ID 138487751). Além disso, também foram apreendidos, no imóvel, vários aparelhos celulares, balança de precisão, faca, embalagens plásticas, dentre outros objetos. Um desses aparelhos celulares apreendidos, o Motorola, de cor azul, IMEI 355064695014279, era roubado da vítima Germalli Ribeiro Bezerra de Souza, em crime ocorrido no dia 22 de novembro de 2022, conforme B.O. nº 183778/2022 (ID 136283152, p. 34/36). As apreensões ocorreram durante cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido contra o denunciado, nos autos nº 0824210-24.2024.8.20.5106, relativos a investigações realizadas pela DEPROV. As drogas estavam na cozinha da casa. Ambos os denunciados estavam no imóvel, durante as buscas. determinação legal. Interrogada formalmente, a denunciada assumiu toda a propriedade das drogas apreendidas. Disse que é namorada do denunciado e frequentava a sua casa, levava a droga em uma bolsa e escondia na cozinha, quando ele dormia. Por sua vez, o denunciado confirmou o relacionamento com a denunciada e negou ciência sobre a existência da droga no imóvel, mas afirmou que os vários telefones celulares apreendidos no local são de clientes seus que os deixaram para conserto, e o aparelho roubado pertencia a um vizinho. As circunstâncias verificadas, porém, sobretudo pelo fato de os denunciados manterem relacionamento amoroso e convívio no mesmo imóvel, indicam que eles agiam de forma associada, com relação ao tráfico de drogas. Também indicam que o denunciado devia saber da origem ilícita do aparelho telefônico mencionado, recebido, segundo ele, no exercício de atividade comercial de prestação de serviço de conserto.” Na forma do art. 55 da Lei 11.343/06, certificada nos autos a notificação de Emilly Vitoria da Costa Morais, conforme ID 144694583 e de Marcos Mateus Santana de Lima, conforme ID 151226340. O réu Marcos Mateus Santana de Lima apresentou defesa prévia, juntada no ID 146076193. Defesa prévia da ré Emilly Vitoria da Costa Morais constante no ID 146504190 Recebida a denúncia em 26 de março de 2025 (ID 146686847). Os réus foram devidamente citados, conforme certidões de ID 152019162 e ID 155811705. Laudo químico toxicológico juntado aos autos em ID 138487751. Foi realizada audiência de instrução em 26 de junho de 2025, conforme termo de ID 154301371, ocasião em que foram ouvidas as testemunhas e realizado os interrogatórios dos réus. O Ministério Público apresentou alegações finais por memoriais, requerendo a condenação dos acusados nos termos da denúncia, quanto ao delito de tráfico de drogas e receptação. Por outro lado, requereu a absolvição de ambos, quanto ao delito de associação para o tráfico (ID 157054337). Alegações finais da Defesa de Emilly Vitoria apresentadas no ID 158033581, nas quais requereu a absolvição da ré quanto ao crime de associação para o tráfico; e aplicação da atenuante da confissão e redução da pena no patamar máximo, em razão do tráfico privilegiado. Alegações finais da Defesa de Marcos Mateus, nas quais requereu a absolvição de Marcos Mateus de todas as imputações; subsidiariamente, a desclassificação do crime de receptação dolosa para culposa (ID 158316486). É a síntese do necessário. Fundamento. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO Concluída a instrução processual, estando o feito pronto para julgamento, impõe-se o exame sobre as provas produzidas, a fim de serem valoradas as pretensões do Ministério Público e da Defesa, de modo a ser aplicado, diante dos fatos que ensejam a presente persecução criminal, o direito cabível. Neste sentido, compulsando-se os autos, estão presentes as condições da ação e os pressupostos processuais. Passo, então, à análise do mérito. II.1. DA MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS (ARTS. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06) Coligindo o caderno processual, percebe-se que as condutas delituosas informadas na denúncia do Ministério Público encontram-se afeitas ao tipo penal previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, in verbis: Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Primeiramente, verifica-se a materialidade do delito, conforme o Auto de exibição e apreensão de ID 136283152, p. 22-24 e p.30, uma vez que houve a identificação e apreensão dos seguintes itens e substâncias: a) 26(vinte e seis) porções retangulares análogos a maconha; b) duas balanças de precisão; c) 06(seis) papelotes análogos à cocaína; d) um fraco de liquido conhecido como loló; e) uma faca; e, f) embalagens plásticas. Além disso, foi apresentado o Laudo de Exame Químico Toxicológico de ID 138487751 que comprovou que as substâncias apreendidas na residência dos acusados são ilícitas. O referido laudo constatou a presença de THC (313,0 g) substância relacionada na Lista F2 - Substâncias Psicotrópicas de uso proscrito no Brasil da Portaria nº 344/98 – ANVISA e cocaína (3,0 g), substância relacionada na Lista F1 - Substâncias Entorpecentes de uso proscrito no Brasil da Portaria nº 344/98-SVS/MS (Regulamento Técnico sobre substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial). Passo à análise das demais provas produzidas, para aferição da autoria delitiva do delito de tráfico de drogas imputado na denúncia. Quanto aos fatos, o agente da polícia civil Hideilton de Oliveira Galvão, em audiência de instrução, relatou que: “A polícia civil recebeu uma denúncia no disque 181 de que o acusado Mateus guardaria em sua casa motos roubadas e adulteradas; então, requereram um mandado de busca e apreensão e ao dar cumprimento dele encontraram as drogas. Participou da busca e encontraram na residência os materiais constantes no auto de exibição e apreensão. O policial encontrou a maioria dos materiais na cozinha. Emilly assumiu ser a proprietária das drogas. A investigação era em face de Mateus, e ao chegar no endereço do mandado encontraram Emilly. Ele morava na casa e os dois tinham um relacionamento e ela estaria morando há pouco tempo com ele. Além das drogas, havia apetrechos como balança de precisão” (Mídia ID 155907753). O agente da polícia civil Fabio Sterfson Torres de Souza, em relação aos fatos, relatou que: “Essa investigação teve como objetivo averiguar supostamente adulteração de veículo e receptação. Dirigiram-se a residência para cumprimento do mandado de busca e apreensão, e se depararam com o material apreendido, quais drogas, celulares e outros objetos como faca e balança de precisão. Ficou provado que os acusados eram um casal e que residiam juntos. A droga estava de fácil acesso; encontrava-se na cozinha dentro de uma vasilha; havia, seis papelotes de cocaína e vinte e seis porções de maconha; uma faca para corte; duas balanças de precisão sendo uma delas, junto com as drogas. Marcos Mateus já era investigado pela DEPROV. Informalmente e formalmente na oitiva, Emilly assumiu a propriedade da droga, mas acredita ser de Mateus, pois a casa era dele, residia os dois e as drogas estavam em um local aberto; logo, ambos teriam conhecimento dela. Quando entraram na casa, os dois acusados estavam próximos a porta de entrada. Não foi identificado usuários saindo do local, durante as campanas” (Mídia ID 155907765). Em interrogatório judicial, a ré Emilly Vitoria da Costa Morais afirmou que é verdadeira a acusação que está lhe sendo feita. Nesse sentido, relatou que: “Estava precisando de dinheiro. Soube que uma pessoa estava vendendo droga e comprou dela para revendê-la. Até então Marcos não sabia de nada, pois naquele dia levou a droga escondida para casa dele, sem ele saber. Escondeu as coisas dentro airfryer. Tinha um relacionamento com Mateus e costumava dormir na casa dele. Havia comprado a droga antes de ir pra casa dele, um dia antes da polícia aparecer. Não se recorda do valor das drogas. Foi a primeira vez que comprou. Conhece pessoas que usam e eles iam pegar na sua casa. Foi para casa de Marcos Mateus no fim da tarde, início da noite do dia anterior a prisão. Seu filho menor de um ano foi para casa dele também. Levou as drogas e os utensílios em sua bolsa, para casa de Marcos Mateus, com medo de alguém ver em sua casa. Esperou Marcos dormir para tirá-la da bolsa e esconder na airfryer. Havia balança de precisão também, sacos de dindim. Confirmou para a polícia que as drogas eram dela. Marcos ficou surpreso e ele não vendia drogas. A balança de precisão já tinha. Foi a primeira e a última vez que fez isso” (Mídia ID 155907760). Em interrogatório judicial, o réu Marcos Mateus Santana de Lima, negou a acusação que está lhe sendo feita. Nesse sentido, declarou que: “No dia anterior a prisão, Emilly foi para sua casa e chegou de Uber. A polícia ao realizar uma busca na casa, encontrou uns pedaços de maconha e perguntou de quem era. Respondeu que não tinha conhecimento e perguntou a Emily. Ela assumiu que as drogas eram dela. Emily nunca falou nada sobre vender drogas. Ela disse a ele, e na audiência de custódia, que antes de ir a sua casa, estava na casa de uma pessoa que supostamente teria repassado as drogas para ela. Uma pessoa do bairro em que ela mora, teria lhe oferecido uma quantia em dinheiro, para que ela transportasse as drogas de onde ela estava para lá; e, considerando que iria dormir em sua casa, deixou para entregar no outro dia. A criança não chegou a dormir em sua casa” (Mídia ID 155907767). Depreende-se da instrução probatória que os depoimentos dos policiais civis foram uníssonos no sentido de que, ao cumprirem mandado de busca e apreensão na residência do acusado Marcos Mateus Santana de Lima, depararam-se com substâncias entorpecentes, maconha, cocaína e “loló”, além de instrumentos típicos do tráfico de drogas, todos em local de fácil acesso e desprovido de obstáculos. Ademais, os agentes afirmaram que os acusados mantinham um relacionamento e residiam juntos, estando ambos presentes no imóvel no momento da apreensão. Desse modo, não consta nos autos quaisquer elementos que contrariem as informações prestadas pelas testemunhas, as quais são idôneas e compatíveis com os depoimentos prestados no auto de prisão em flagrante constante no ID 136283152, págs.12-13 e p.15. Verifica-se que em juízo a ré Emilly Vitoria da Costa Morais confessou a prática delitiva, relatando que adquiriu os entorpecentes de um terceiro não mencionado, com intenção de vendê-los. Posteriormente, transportou as drogas para a casa de Marcos Mateus Santana de Lima, local onde as guardou. Assim, a acusada praticou a conduta do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, uma vez que adquiriu, transportou, guardou e expôs à venda drogas em desacordo com a determinação legal. Em relação ao réu Marcos Mateus Santana de Lima, também restou comprovada a autoria delitiva, apesar de não ter confessado o crime. Nesse contexto, observa-se que não se sustenta a versão dos fatos apresentados pelo acusado, sobretudo, quando confrontado com os demais elementos dispostos nos autos. Primeiramente, o réu afirmou, em juízo, que não tinha conhecimento das drogas armazenadas em sua residência e que, ao questionar Emilly Vitória, esta lhe dissera que realizaria a entrega das substâncias entorpecentes em favor de um terceiro, de quem receberia uma quantia em dinheiro como pagamento. Nota-se que, em audiência de custódia, a ré Emilly Vitória, de fato, declarou guardar a droga para uma pessoa, conforme se depreende da mídia de ID 136372014. No entanto, em interrogatório extrajudicial, acompanhada de advogado, afirmou: “levou a citada droga para conseguir vender, sem conhecimento deste; que já tinha levado droga outra vez para a casa de Marcos Mateus para vender sem o conhecimento dele” (ID 136283152, p. 49-50). Assim, nota-se que a ré apresentou mais de uma versão dos mesmos fatos. Ademais, em juízo, a ré declarou teria levado para a casa do réu instrumentos característicos do tráfico, como balança de precisão e sacos plásticos, com o intuito de ocultá-los de sua família. Afirmou ainda que, antes de se dirigir à residência do réu, passou na casa do suposto fornecedor das drogas, informação confirmada pelo acusado Marcos Mateus. Além disso, declarou, em interrogatório judicial, que “não se recordava do valor das drogas” (Mídia ID 155907760). Percebe-se contradições e incompatibilidade entre as informações prestadas pelos acusados, visto que, enquanto a ré Emilly Vitória declarou que adquiriu as drogas com a intenção de comercializá-las para obter lucro, em virtude de dificuldades financeiras, o réu alegou que ela teria lhe dito tratar-se apenas de transporte em favor de terceiro, na condição de “mula”. Por sua vez, os fatos narrados por ambos carecem de veracidade, pois, se a ré teria saído de casa portando instrumentos do tráfico para, posteriormente, buscar as drogas com o fornecedor e, ao final, levá-las à casa de Marcos Mateus, não se sustenta a alegação de que o transporte seria realizado em favor de terceiro. Ademais, não haveria justificativa plausível para carregar objetos típicos da traficância caso as drogas, de fato, pertencessem a outra pessoa. Ressalte-se, ainda, que a ré declarou não saber o valor de aquisição das substâncias ilícitas, logo, contradizendo-se em sua versão. Destaca-se que os policiais civis afirmaram que os acusados residiam juntos e se encontravam no local no momento do cumprimento do mandado de busca e apreensão, razão pela qual foram presos em flagrante. Ademais, as drogas não teriam sido encontradas dentro de eletrodoméstico, mas sim acondicionadas em uma vasilha, localizada na cozinha, em local visível e de fácil acesso, conforme depoimento do agente Fábio Sterfson. Sendo assim, não é crível acolher a tese da defesa apresentada em juízo pelo sr. Marcos Mateus Santana de Lima, que desconhecia que havia drogas em sua residência e que não possui nenhum envolvimento com a traficância. Considerando o conjunto probatório constante dos autos, bem como as contradições verificadas nos depoimentos dos acusados, infere-se que a versão defensiva apresentada pelo réu Marcos Mateus Santana de Lima teve como única finalidade esquivar-se da aplicação da lei penal. Por sua vez, depreende-se que a ré buscava ocultar a coautoria delitiva, assumindo integralmente a responsabilidade pelos fatos. No entanto, não restam dúvidas de que também praticou o crime de tráfico de drogas, em razão das apreensões realizadas e das sucessivas confissões prestadas, todas com a devida assistência de advogado. Portanto, comprovado a materialidade e autoria delitiva, impõe-se a condenação dos réus Emilly Vitoria da Costa Morais e Marcos Mateus Santana de Lima, pela prática do delito tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. II.2. DA MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ART. 35 DA LEI Nº 11.343/06). A inicial acusatória também imputa aos réus a prática de associação para o tráfico de drogas, a qual encontra-se prevista no art. 35 da Lei nº 11.343/2006, in verbis: Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 desta Lei: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Em alegações finais, o Ministério Público requereu a absolvição dos réus pela prática desse delito, uma vez que não restou comprovado de fato os elementos caracterizadores desse tipo penal (ID 157054337). Nessa esteira, para comprovar a materialidade e a autoria delitiva do crime de associação para o tráfico, é necessário que os autos contenham provas de que havia uma organização estável, habitual e permanente entre o casal. Conforme mencionado no tópico anterior desta sentença, os acusados conviviam e há elementos probatórios que permitem concluir que ambos exerciam o tráfico de drogas. Contudo, não há elementos suficientes para a condenação pelo crime de associação para o tráfico, o qual exige a comprovação de uma organização criminosa estável. A mera união de pessoas não configura, por si só, o delito de associação para o tráfico, sendo, portanto, necessária a absolvição, quando há insuficiência de provas, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nos seguintes termos: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AUSÊNCIA DE PROVAS DE ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. INSUFICIÊNCIA DE INDÍCIOS PARA CONFIGURAÇÃO DO DELITO ASSOCIATIVO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA. ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. RECONHECIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Habeas corpus impetrado em favor de Wallace Pereira de Meireles e Felipe Barbosa da Silva, condenados por tráfico de drogas e associação para o tráfico. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro reduziu a pena para 8 anos de reclusão e 1.200 dias-multa, mantendo a condenação pelo tráfico de drogas (art. 33 da Lei 11.343/2006) e associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006). A defesa requer absolvição quanto ao delito de associação, aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, e alteração do regime prisional. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) se há provas suficientes para condenar os pacientes pelo crime de associação para o tráfico, nos termos do art. 35 da Lei de Drogas; (ii) se é cabível a aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A condenação pelo crime de associação para o tráfico exige prova do dolo associativo, bem como a demonstração de estabilidade e permanência na associação criminosa, o que não foi suficientemente comprovado nos autos. A reunião eventual de pessoas para a prática do tráfico não configura, por si só, o delito de associação. 4. As provas apresentadas são insuficientes para sustentar a condenação pelo art. 35 da Lei de Drogas, pois a coautoria no tráfico não prova a existência de uma organização criminosa estável. 5. Diante da ausência de elementos concretos que demonstrem o vínculo associativo, é necessária a absolvição dos pacientes quanto ao delito de associação para o tráfico, aplicando-se o princípio do "in dubio pro reo". 6. A causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas deve ser aplicada no patamar máximo de 2/3, considerando a não expressiva quantidade de entorpecentes apreendida, que os pacientes são primários e que não há provas de que integrem organização criminosa. IV. DISPOSITIVO 7. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 814.817/RJ, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 16/10/2024, DJe de 4/11/2024.) Dessa forma, considerando a insuficiência de provas para fundamentar a condenação pelo delito de associação para o tráfico, impõe-se a absolvição dos réus quanto a este crime, em observância ao disposto no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. II.3. DA APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO (ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06) Em caso de condenações de tráfico de drogas, prevê a legislação causa de diminuição do tráfico privilegiado, previsto no § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06. Diante disso, observa-se o disposto no supracitado dispositivo: § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. Pois bem, inicialmente observa-se que o tráfico privilegiado exige o cumprimento de algumas circunstâncias, quais sejam: a) a primariedade e bons antecedentes do agente; b) a ausência de elementos que indiquem a dedicação às atividades criminosas; e c) a ausência de elementos que confirmem integração organização criminosa. Em relação ao réu Marcos Mateus Santana de Lima, conforme certidão de ID 136293814 este possui condenação anterior por crime de roubo, o que afasta a aplicação da causa de diminuição, ante a ausência de bons antecedentes do agente. Quanto à ré Emilly Vitória da Costa Morais, verifica-se na certidão de ID 136293019, que ela não possui outras condenações transitadas em julgado. Além disso, não constam nos autos elementos que indiquem dedicação às atividades criminosas ou integração de organização criminosa. Desse modo, aplica-se somente à ré Emilly Vitória da Costa Morais, a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º, da lei nº 11.346/2006. II.4 DA MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO DE RECEPTAÇÃO QUALIFICADA (art. 180, § 1º, do Código Penal) Na denúncia do Ministério Público encontra-se também, em face do réu Marcos Mateus Santana de Lima, a imputação do delito previsto no art. 180, §1º do Código Penal, in verbis: Receptação qualificada § 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime: Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa. Em relação à atividade comercial, prevê o art. 180, §2º do Código Penal que “equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência”. A respeito desta qualificadora, tem-se a jurisprudência: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. NÃO COMPROVAÇÃO DA HABITUALIDADE. ATIVIDADE QUE NÃO SE ENQUADRA NO CONCEITO LEGAL DE ATIVIDADE COMERCIAL OU INDUSTRIAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Para que se configure a modalidade qualificada há a exigência legal de que a prática de um dos verbos nucleares ocorra no exercício de atividade comercial ou industrial. Inteligência do art. 180, § 1º, do CP. 2. A expressão "no exercício de atividade comercial ou industrial" pressupõe, segundo abalizada doutrina, habitualidade no exercício do comércio ou da indústria, "pois é sabido que a atividade comercial (em sentido amplo) não se aperfeiçoa com um único ato, sem continuidade no tempo" (MASSON, Cleber. Código Penal Comentado, 6ª ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Método, 2018. 3. Concluir que os agravados estavam inseridos no contexto de atividade comercial, diversamente do que afirmou o Tribunal local, é medida que esbarra na Súmula 7/STJ. 4. Agravo regimental não provido. (Informativo nº 771/2023, AgRg no AREsp n. 2.259.297/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 18/4/2023, DJe de 24/4/2023). EMENTA HABEAS CORPUS. PENAL RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. CONSTITUCIONALIDADE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES. 1. Esta Corte Suprema já se posicionou acerca da constitucionalidade do § 1º do art. 180 do Código Penal, em razão da maior gravidade e reprovabilidade social da receptação qualificada; infração penal relacionada à pessoa do comerciante ou do industrial, que, no exercício dessas atividades, valendo-se da maior facilidade para agir como receptador, adquire, recebe, transporta, conduz, oculta, tem em depósito, desmonta, monta, remonta, vende, expõe a venda, ou de qualquer forma utiliza, em proveito próprio ou alheio, coisa a qual deve saber ser produto de crime a justificar, por isso mesmo, a atuação mais severa. Precedentes. 2. Recurso ordinário a que se nega provimento. (Informativo 712 STF, RHC 117143, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 25/06/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-158 DIVULG 13-08-2013 PUBLIC 14-08-2013). A materialidade do delito de receptação restou comprovada com a apreensão, na residência do réu Marcos Mateus Santana de Lima, do aparelho celular motorola, cor azul, IMEI 355084695014279 constante no auto de exibição e apreensão de ID 136283152, p.30, somado à comprovação de que este foi roubado, conforme boletim de ocorrência nº 183778/2022, registrado pela vítima Germalli Ribeiro Bezerra de Souza, no ID 136283152, p.34-36. Passo à análise das demais provas produzidas. Em relação aos celulares apreendidos, o agente da polícia civil Hideilton de Oliveira Galvão, em audiência de instrução, relatou que: “Na casa havia vários celulares, no quarto, e um deles havia registro de roubo. O Mateus assumiu a propriedade dos celulares. Não viu nenhum material relacionado a conserto de celulares na casa” (Mídia ID 155907753). Além disso, o agente da polícia civil Fabio Sterfson Torres de Souza, quanto aos fatos, relatou que: “Os celulares estavam espalhados na casa, um em cima da geladeira, dois ou três na cozinha, outro no quarto. Desses celulares, ao verificar na delegacia o IMEI, constataram que era produto de roubo” (Mídia ID 155907765). Por sua vez, a defesa arrolou a testemunha Eriberto Pereira de Souza, que prestou as seguintes informações: “Conhece Marcos Mateus há muitos anos. Ele trabalha com conserto de aparelhos e também com venda de acessórios. Trabalha no vuco-vuco e em casa. Confia nele para o conserto do seus celulares. Conversou com ele após responder por processo e ele disse que não queria mais se envolver e queria sair dessa vida. Disse que as drogas eram de Emilly. Teve conhecimento que Marcos Mateus tinha um celular de propriedade de um homem chamado “Tales” para que ele consertasse. Fez um conserto no celular com ele há três anos; foi cobrado R$250,00. Normalmente ele levava para o vuco-vuco para consertar os celulares. Não sabe o nome do box do vuco-vuco, nem se ele ainda tem. Estava com Marcos Mateus na calçada, quando viu Tales entregando um celular para conserto. Soube que este era roubado depois da prisão. Marcos que lhe disse sobre se era roubado” (Mídia ID 155907759). Em interrogatório judicial, a ré Emilly Vitoria da Costa Morais afirmou que: “Na casa havia também os celulares no quarto. Esses aparelhos eram para conserto. Ele trabalhava no vuco-vuco, mas não sabe dizer o local específico” (Mídia ID 155907760). Por sua vez, em interrogatório judicial, o réu Marcos Mateus Santana de Lima negou a acusação de receptação que está lhe sendo feita. Nesse sentido, declarou que: “Utiliza o box no vuco-vuco MD CEL de um conhecido seu. A respeito do celular motorola cor azul, era do sobrinho de sua vizinha Talyson, que havia deixado para consertar; inclusive este já estava pronto pra entrega e naquele dia da prisão ele foi buscá-lo. Talyson disse que ia na delegacia tomar ciência desse celular; e que foi lá e assumiu. Sobre o celular LG de cor escura era de um cliente Ricardo do vuco-vuco; um Xiaomi azul escuro, era de Alyson pedreiro, seu vizinho; um Iphone 7, rosé era de Leonardo; Iphone 7 plus red, de Emilly vitória; Moto E7 azul era de Talyson; LG tela quebrada, Alyson. A maioria dos clientes o procuram em casa, e depois de criar amizades passou a trabalhar no vuco-vuco. Quando consertava antes do prazo, levava para guardar em casa; sempre tinha celulares em casa” (Mídia ID 155907767). Depreende-se da instrução probatória que o réu Marcos Mateus Santana de Lima, no exercício de atividade comercial, recebeu e manteve em depósito aparelho celular motorola cor azul, produto de crime, visto que roubado da vítima Germalli Ribeiro Bezerra de Souza. Registra-se que a forma qualificada do crime de receptação, prevista no art. 180, §1º, do Código Penal, prevê sanção penal àqueles que, embora não tenham participado do delito originário, trabalham com produtos de crime, situação comumente verificada em desmanches de motocicletas ou também em locais de conserto de aparelhos celulares. Assim, aquele que desmonta, monta ou remonta bem proveniente de ilícito penal enquadra-se como receptador. Logo, a controvérsia dos autos limita-se ao efetivo conhecimento do réu acerca da origem ilícita do objeto, que foi recebido e mantido em depósito para um suposto conserto. Pois bem, constata-se que os depoimentos prestados em juízo pelas testemunhas policiais reforçam a materialidade delitiva, bem como atribuem a autoria delitiva. Nesse contexto, as informações dos agentes são uníssonas no sentido de que haviam vários aparelhos celulares espalhados pela casa, sem instrumentos ou indicativos de conserto de celulares, o que demonstra a clandestinidade da atividade. No que se refere ao conhecimento do recebimento de produto de crime, embora o réu negue o caráter ilícito, constam nos autos provas de que ele tinha ciência da ilicitude de sua conduta. Primeiramente, observam-se incongruências na versão apresentada pelo réu. Este afirmou que realizava consertos de aparelhos celulares no ‘vuco-vuco’; contudo, os celulares foram apreendidos em sua residência. Alegou ainda que os clientes também o procuravam em sua casa, inclusive a pessoa que anteriormente detinha a posse do celular roubado, o que se mostra incomum no contexto de uma atividade comercial regular. Ressalta-se que a defesa arrolou testemunha, que em juízo declarou ter visto “Thalysson levar um aparelho celular para conserto e que, posteriormente, soube pelo próprio réu tratar-se do aparelho roubado em questão”. Todavia, o depoimento dessa testemunha não se revela crível, pois não foi capaz de afirmar, com segurança, que o aparelho apreendido era o mesmo entregue por referido terceiro. Ademais, ainda que assim pudesse fazê-lo, tal circunstância não afastaria a ciência do réu acerca da origem ilícita do bem. Cumpre mencionar, ainda, que o réu não demonstrou em juízo desconhecer que o celular Motorola, de cor azul, que pretendia consertar, era produto de roubo. A simples menção a um suposto cliente, sem que este tenha sido arrolado como testemunha, não comprova que o acusado não tinha ciência da origem ilícita do bem. Frise-se que as circunstâncias narradas acerca do recebimento do aparelho, entregue em sua residência fora do horário comercial, sem registro de conversas e sem o termo de responsabilidade para conserto mencionado em seu depoimento ou qualquer recibo, evidenciam que o réu tinha plena ciência de que o objeto era produto de crime. Em relação à tese da defesa, sobre a ausência de dolo na conduta da ré, importa ressaltar o entendimento jurisprudencial quanto ao crime de receptação: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. EXCLUDENTE DE EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. HIPÓTESES NÃO VERIFICADAS. REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP DEVIDAMENTE PREENCHIDOS. RECURSO IMPROVIDO. 1. A decisão monocrática deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos. 2. O trancamento da ação penal, assim como do inquérito policial, é medida excepcional, só sendo admitida quando dos autos emergirem, de plano, e sem a necessidade de exame aprofundado e exauriente das provas, a atipicidade da conduta, a existência de causa de extinção da punibilidade e a ausência de indícios de autoria de provas sobre a materialidade do delito, o que não ocorre na espécie. 3. No presente caso, a denúncia narrou que, "no dia 26/07/2018, por volta das 14h00 (elemento temporal), no estacionamento do Shopping Center Pantanal, nesta capital (elemento espacial), o paciente Henrique foi abordado e preso em flagrante na posse do notebook receptado (objeto delimitado), além de tê-lo colocado à venda, juntamente com a corré, no sítio eletrônico denominado OLX (forma de execução)", estando, portanto, atendidos os requisitos do art. 41 do CPP. 4. Destaca-se, ainda, que, "no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova" (HC n. 433.679/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/3/2018, REPDJe de 17/4/2018, DJe de 12/3/2018). 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no RHC n. 214.145/MT, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 21/5/2025, DJEN de 27/5/2025.) Desta forma, caberia ao réu apresentar provas concretas de que não sabia acerca da procedência ilícita do bem recebido e mantido em depósito, o que não se configura no caso em análise, tendo em vista os elementos mencionados anteriormente. Compreende-se, assim, pelo conjunto probatório acima apresentado, que o réu sabia ou, ao menos deveria saber que o aparelho telefônico em sua posse se tratava de produto de crime. Não assiste razão, portanto, à tese defensiva de ausência de dolo, tendo em vista que não houve demonstração de um motivo concreto para afastar o dolo de sua conduta. Ressalta-se que o exercício de atividade comercial restou comprovado, ainda que o o réu exercesse à época dos fatos de forma informal e clandestina. Nesse contexto, o réu afirmou que trabalhava com conserto de celulares e sua testemunha acrescentou que este também vendia acessórios. Dessa maneira, incide a qualificadora prevista no art. 180, §1º do Código Penal. Não restam dúvidas, igualmente, quanto à comprovação do proveito próprio previsto no tipo penal da receptação, uma vez que o réu recebeu aparelho celular oriundo de crime para conserto, enquadrando-se nos verbos ‘desmontar, montar ou remontar’, descritos no art. 180, §1º, do Código Penal, com o intuito de obter vantagem financeira. Caberia, portanto, ao réu agir com a devida prudência, abstendo-se de trabalhar com aparelhos celulares provenientes de roubo. Ressalte-se, ainda, que o acusado, em interrogatório judicial, embora tenha negado que sabia da origem ilícita, confessou que recebeu e manteve em depósito o aparelho celular pertencente à vítima Germalli Ribeiro Bezerra de Souza, no contexto de atividade comercial, o que configura a hipótese prevista no tipo penal mencionado. Portanto, consideram-se suficientes as provas de materialidade e autoria do delito de receptação qualificada, previsto no art. 180, §§1º e 2º, do CP, praticado pelo réu Marcos Mateus Santana de Lima, motivo pelo qual impõe-se a sua condenação. II.5. DO CONCURSO DE CRIMES No concurso material de crimes, o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não. A consequência jurídica é que serão aplicadas cumulativamente as penas privativas de liberdade de todos os crimes praticados, na forma do art. 69 do Código Penal. Sob esse contexto, analisando o caso concreto, compreende-se pelo concurso material de crimes a ser aplicado em relação aos delitos de tráfico de drogas e receptação, por terem configuração autônoma. Assim, o réu Marcos Mateus praticou duas condutas distintas, em momentos diferentes, incorrendo em crimes igualmente diversos, que não guardam entre si conexão quanto ao tempo, ao local ou ao modo de execução. Com efeito, aplicar-se-á, para fins penais, o concurso material de crimes, nos moldes do art. 69 do Código Penal, em relação aos delitos tipificados no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 e art. 180, §1º do Código Penal. III. DISPOSITIVO Diante do exposto, decido nos seguintes termos: a) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE com esteio no art. 387 do CPP a denúncia ofertada pelo Ministério Público para fins de CONDENAR a ré EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS, como incurso nas penas do delito previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. b) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE com esteio no art. 387 do CPP a denúncia ofertada pelo Ministério Público para fins de CONDENAR o réu MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA, como incurso nas penas do delito previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 e art. 180, §1º c/c art. 69, ambos do Código Penal; e, c) ABSOLVO os réus MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA e EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS, qualificados nos autos, quanto à acusação pela prática do delito de associação para o tráfico, tipificado no artigo 35, caput, da lei nº 11.343/2006. Em observância aos regramentos existentes no Código Penal e art. 42 da Lei 11.343/06, passo a individualizar a pena dos acusados. IV. DA DOSIMETRIA DE PENA DA RÉ EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS IV.1. DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS Analisadas as diretrizes do artigo 59, do Código Penal e observando as disposições do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, passo a fixar a pena-base da ré: a) Culpabilidade (favorável): normal à espécie, nada tendo a se valorar; b) Antecedentes Criminais (favorável): a ré não possui outras condenações transitadas em julgado, conforme certidão de ID 136293019. c) Conduta Social: não foram colhidos elementos capazes de valorar negativamente a conduta social; d) Personalidade: poucos elementos foram coletados a respeito da personalidade dos agentes, razão pela qual deixo de valorá-la; e) Motivos do crime: os motivos do crime não ultrapassam aos próprios tipos; f) Circunstâncias do crime: desfavoráveis, pois foi comprovada nos autos a presença de uma criança de menos de 2(dois) anos de idade na residência na qual ocorreu a apreensão de drogas e dos instrumentos do crime, conforme depoimento da ré e dos policiais civis em juízo. Com efeito, expor criança ao convívio direto com drogas e com a dinâmica própria do tráfico representa grave risco à sua integridade física e psicológica. Tal conduta normaliza, no imaginário infantil, práticas criminosas como se fossem parte cotidiana e aceitável da vida social, contribuindo para a formação de um ambiente nocivo ao seu desenvolvimento. Além disso, a proximidade com substâncias ilícitas e com os riscos associados à atividade delituosa, como violência, repressão estatal e conflitos interpessoais, compromete não apenas a segurança imediata da criança, mas também seu pleno e saudável desenvolvimento. Trata-se, portanto, de circunstância que denota especial reprovabilidade da conduta, justificando o agravamento da resposta penal na primeira fase da dosimetria, por ultrapassar os elementos típicos inerentes ao crime de tráfico de drogas. Quanto à natureza e quantidade da droga, em que pese variedade qualitativa, com a presença de cocaína, considero que sua quantidade não enseja uma valoração negativa específica. Por fim, deve-se considerar que o crime foi praticado em concurso de agentes, circunstância que também deve ser valorada negativamente. g) Consequências do crime: não há informações sobre consequências. h) Comportamento da vítima: prejudicado, porque os crimes não possuem vítima determinada. Desta forma, fixo-lhe a pena-base para a ré Emilly Vitória da Costa Morais em: 06(seis) anos e 3(três) meses de reclusão, para o crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06. Para esse cômputo, foram convertidas as penas em meses e subtraída a máxima da mínima, chegou-se a uma média entre elas, passando-se então na sua divisão pelas oito circunstâncias judiciais, de forma que foram aumentados 15(quinze) meses para cada circunstância desfavorável. IV.2. DAS ATENUANTES E AGRAVANTES No caso em tela, verifico que não há nenhuma circunstância agravante a ser aplicada. Por outro lado, incide a atenuante da confissão, prevista no art. 65, inciso III, alínea “d” do Código Penal, visto que a ré confessou a prática dos fatos em parte, conforme descrito na fundamentação. Por sua vez, também incide a atenuante da menoridade relativa, prevista no art. 65, inciso I, do Código Penal, uma vez que na época dos fatos, a ré era menor de 21(vinte e um) anos, conforme certidão de ID 136293019. Desse modo, em consonância com a jurisprudência do STJ, reduzo a pena base em 1/6 (um sexto) em relação a cada circunstância atenuante e observando o limite da pena mínima, fixo a pena intermediária da ré em: 5(cinco) anos de reclusão para o crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. IV.3. DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E AUMENTO DA PENA Não vislumbro a hipótese de incidência de causas de aumento de pena em relação à pena do delito de tráfico de drogas, quanto à ré Emilly Vitória da Costa Morais. Por outro lado, vislumbro a possibilidade de incidência da causa de diminuição da pena, prevista no art. 33, §4º da Lei nº 11.343/2006, referente à figura de tráfico privilegiado. Em relação ao quantum de redução da pena, conforme jurisprudência do STJ, “fica a cargo do julgador no âmbito da discricionariedade fundamentada, determinar a fração de redução adequada ao caso concreto; bem como o julgador não está obrigado a aplicar o patamar máximo de redução da pena, possuindo discricionariedade à luz das peculiaridades do caso concreto, efetivar a diminuição no quantum que entenda suficiente e necessário para a prevenção e a repressão do delito perpetrado” (precedentes AgRg no REsp n. 2.044.306/PR e AgRg no AREsp n. 2.482.132/PR). Além disso, tem-se a jurisprudência no sentido de que nos casos em que há cocaína e circunstâncias judiciais desfavoráveis, é legal a diminuição na fração mínima: Direito penal. Agravo regimental EM HABEAS CORPUS. Tráfico de drogas. Dosimetria da pena. Regime inicial fechado. Agravo regimental IMprovido. I. Caso em exame 1. Agravo regimental interposto contra decisão que indeferiu liminarmente habeas corpus impetrado em favor de condenado por tráfico de drogas, com pena de 6 anos e 3 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 625 dias-multa, nos termos do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006. 2. Fato relevante. A dosimetria da pena considerou a modulação do tráfico privilegiado em 1/6, devido às circunstâncias judiciais desfavoráveis, como a utilização de uma criança de colo para camuflar o comércio ilícito de entorpecentes. 3. As decisões anteriores. A decisão agravada foi amparada em precedentes do Superior Tribunal de Justiça, que consideram as circunstâncias do art. 59 do Código Penal na definição do índice de redução da pena por tráfico privilegiado. II. Questão em discussão 4. A questão em discussão consiste em saber se a fixação do regime inicial fechado para cumprimento de pena é compatível com o reconhecimento do tráfico privilegiado, considerando as condições pessoais favoráveis do condenado, como primariedade e bons antecedentes. III. Razões de decidir 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça permite a consideração das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal na modulação do redutor do tráfico privilegiado, justificando a fixação do regime inicial fechado. 6. A utilização de uma criança de colo para camuflar o tráfico de drogas caracteriza extrema reprovabilidade da conduta, justificando a pena-base acima do mínimo legal e o regime inicial fechado. 7. A decisão agravada está em harmonia com a jurisprudência dominante, não havendo ilegalidade a ser sanada. IV. Dispositivo e tese 8. Agravo regimental improvido. Tese de julgamento: "1. As circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal podem ser utilizadas na definição do índice de redução da pena por tráfico privilegiado. 2. A utilização de uma criança de colo para camuflar o tráfico de drogas justifica a fixação do regime inicial fechado, mesmo com o reconhecimento do tráfico privilegiado". Dispositivos relevantes citados: Lei n. 11.343/2006, art. 33, § 4º; Código Penal, art. 59. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 768.936/SP, de minha relatoria, Sexta Turma, DJe 10/03/2023; STJ, AgRg no REsp 2.188.464/PR, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJEN 25/5/2023; STJ, HC 384.936/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 5/4/2017; STJ, HC 385.941/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 8/5/2017; STJ, AgRg no HC 761.814/MS, Rel. Min. Messod Azulay Neto, Quinta Turma, DJe 25/5/2023. (AgRg no HC n. 991.113/AP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 21/5/2025.) DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. FRAÇÃO DE REDUÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. COISA JULGADA. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo regimental interposto por GILVAN ROCHA FERREIRA contra decisão monocrática que não conheceu de habeas corpus substitutivo de recurso especial e não concedeu a ordem de ofício. O paciente foi condenado, em segunda instância, à pena de 4 anos, 3 meses e 18 dias de reclusão em regime semiaberto, além de 416 dias-multa, por tráfico de drogas, com reconhecimento da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, no patamar de 1/6, em razão da quantidade e natureza das substâncias apreendidas (0,8g de maconha e 14g de cocaína). A defesa pleiteia a aplicação da causa de diminuição no grau máximo de 2/3, com fixação de regime aberto e expedição de alvará de soltura. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a modulação da fração redutora da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, no patamar de 1/6, foi devidamente fundamentada; (ii) estabelecer se a via do habeas corpus substitutivo é adequada para rediscutir matéria já apreciada em recurso especial não conhecido, em face da coisa julgada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A quantidade, variedade e natureza das drogas apreendidas - especialmente a cocaína, de alta nocividade - constituem fundamentos idôneos para a modulação da fração redutora do tráfico privilegiado no patamar de 1/6, conforme jurisprudência consolidada do STJ. 4. A decisão do Tribunal de origem que dosou a pena considerou concretamente os elementos do caso, em conformidade com o art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 5. A interposição de habeas corpus substitutivo de recurso especial não é admitida quando ausente flagrante ilegalidade, sendo incabível sua utilização para rediscutir matéria já acobertada pela coisa julgada. 6. Não se conheceu do recurso especial anteriormente interposto pela defesa (AREsp n. 1.891.260/PI), o que confirma a ausência de violação da lei federal e a consolidação da coisa julgada no âmbito do STJ. 7. A rediscussão da dosimetria da pena, especialmente quanto à fração da minorante, por meio de habeas corpus, após quase quatro anos do trânsito em julgado, compromete a segurança jurídica e viola a autoridade da coisa julgada. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: a) a natureza e a quantidade de drogas apreendidas são elementos suficientes para justificar a fixação da fração de redução da causa de diminuição do tráfico privilegiado no patamar mínimo. b) a utilização do habeas corpus substitutivo não é cabível para reabrir discussão sobre matéria já decidida em recurso especial não conhecido, diante da proteção conferida à coisa julgada. (AgRg no HC n. 976.555/PI, relator Ministro Carlos Cini Marchionatti (Desembargador Convocado TJRS), Quinta Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 21/5/2025.) No caso em tela, foi apreendido uma quantidade de maconha elevada, qual seja, aproximadamente 313,0 g(trezentos e treze) gramas de maconha, divididas em 26 porções prontas para venda, e seis papelotes de cocaína no total de 3g (três gramas). Desse modo, ante as peculiaridades do caso, por extrapolarem o ordinário, considero adequado a redução na fração mínima da pena, mais precisamente em 1/6 (um sexto). Portanto, torno concreta e definitiva, a pena privativa de liberdade, em relação à ré, para o crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, em: 4(quatro) anos e 2(dois) meses de reclusão. IV.4. DA PENA DE MULTA DA RÉ EMILLY VITÓRIA DA COSTA MORAIS Em decorrência da pena privativa de liberdade dosada e verificando que o tipo penal do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 possui pena de multa cominada no seu preceito secundário, a qual deverá guardar exata proporcionalidade com aquela, bem como com a situação econômica do réu a teor do art. 60 do CP, a ré Emilly Vitória da Costa Morais ficará condenada ao pagamento de 416(quatrocentos e dezesseis) dias-multa, cada dia-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo, vigente à época do fato, ante a inexistência de informações a respeito da situação financeira da ré. Para o referido cálculo, considerando que a pena em concreto foi fixada abaixo do mínimo legal, nos termos da doutrina de Ricardo Augusto Schmidt em "Sentença Penal Condenatória" (Editora Juspodivm, 14ª, 2020), utilizou-se a seguinte fórmula matemática: PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PENA DE MULTA Pena mínima prevista em abstrato para o tipo penal Pena mínima prevista em abstrato para o tipo penal Pena em concreto aplicada Pena em concreto aplicada Convertidas as penas em meses em relação ao máximo da pena corporal, "x" como valor da pena de multa em concreto e 1500 (um mil e quinhentos) dias-multa como sendo o valor máximo da pena de multa previsto para o delito de tráfico de drogas, é realizada a fórmula da "regra de 3" para chegar-se ao valor de "x", e, assim, ao valor da pena de multa em exata proporcionalidade com a pena corporal. Desse modo, considerando que a pena privativa de liberdade permaneceu abaixo do mínimo legal, a pena de multa também deverá ser fixada abaixo do mínimo, em observância a proporcionalidade entre as sanções. V. DA PENA DEFINITIVA DE EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS Assim sendo, torno concreta e definitiva a pena de EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS em: 4(quatro) anos e 2(dois) meses de reclusão e 416(quatrocentos e dezesseis) dias-multa, cada dia-multa no valor 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo, em razão da prática do crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06. VI. DO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA DE EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS Considerando a pena dosada e as circunstâncias judiciais desfavoráveis (já analisadas na primeira fase da dosimetria), determino à condenada EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS, o cumprimento inicial de pena no regime FECHADO, nos termos do §§ 2º, a, e 3º do art. 33 do Código Penal. VII. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE DE EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS Verifico que na situação em tela torna-se incabível a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, tendo em vista o cômputo da pena cominada ao réu e a presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, condições impeditivas constantes no art. 44 do Código Penal. VIII. DO DIREITO DE EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS DE RECORRER EM LIBERDADE Considerando que não houve decretação da prisão preventiva no decorrer do processo e não há requerimento do Ministério Público, CONCEDO o direito a ré de recorrer em liberdade. Revogo as medidas cautelares impostas à ré no ID 136306756. IX. DA DETRAÇÃO DE EMILLY VITORIA DA COSTA MORAIS (art. 387, § 2º, do CPP) Deixo de realizar a detração, porque não há período de prisão cautelar a ser contabilizado e porque entendo que tal encargo é de competência do Juízo da Execução Penal. X. DA DOSIMETRIA DE PENA DO RÉU DE MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA X.1. DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS Analisadas as diretrizes do artigo 59, do Código Penal e observando as disposições do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, passo a fixar a pena-base do acusado: a) Culpabilidade: desfavorável, pois observa que o réu praticou o delito ora dosado em 13.11.2024, enquanto cumpria pena no regime semiaberto, referente ao processo de execução nº 5000017-86.2023.8.20.0106, conforme relatório de ID 136293813. Compreende-se, portanto, que para além das ofensas aos bens jurídicos tutelados nos tipos penais, houve ofensa à confiança empregada pelo Poder Judiciário ao progredir seu cumprimento de pena. Conforme o entendimento jurisprudencial disciplina, não há que se falar, também, em bis in idem, tendo em vista que não se busca punir o agente pela reincidência, mas sim valorar negativamente sua culpabilidade pela quebra de confiança perante o Estado. Nesse sentido, observemos a jurisprudência: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PENA-BASE MAJORADA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CULPABILIDADE. RÉU COMETEU O DELITO ENQUANTO CUMPRIA PENA EM REGIME ABERTO PELA PRÁTICA DE OUTRO CRIME. NATUREZA E NOCIVIDADE DA DROGA APREENDIDA. PLEITO DE FIXAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO ARGUIDO TÃO SOMENTE NAS RAZÕES DO AGRAVO REGIMENTAL. INOVAÇÃO RECURSAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Quanto à fixação da pena-base acima do mínimo legal, cumpre registrar que a dosimetria da pena está inserida no âmbito de discricionariedade do julgador, estando ela atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas do agente, elementos que somente podem ser revistos por esta Corte em situações excepcionais, quando malferida alguma regra de direito. 2. As instâncias ordinárias sopesaram negativamente a culpabilidade pelo fato de ter o recorrente cometido o crime enquanto cumpria pena em regime aberto pela prática de outro delito. Trata-se, indubitavelmente, de circunstância que indica maior reprovabilidade da conduta, porquanto atesta a total imunidade de réu ao caráter preventivo individual negativo da pena, bem como a indiferença com as decisões judiciais. 3. In casu, o Tribunal de origem fundamentou expressamente a majoração da pena-base, considerando a quantidade e, em especial, da nocividade da droga apreendida (19,3 gramas de crack e 47,2 gramas de maconha), nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006. Daí, não se mostra desproporcional ou desarrazoada, porquanto fundamentada a fração em elementos concretos e dentro do critério da discricionariedade vinculada do julgador. 4. Ademais, considerando os limites máximo e mínimo previstos no preceito secundário do tipo do artigo 33, caput, da Lei 11.343/06 (mínimo de 5 anos e máximo de 15 anos), o aumento da pena-base em 2 (dois) anos em razão de 2 (duas) circunstâncias judiciais devidamente fundamentadas não se revela desproporcional ou excessivo. 5. A tese de violação do artigo 33, § 2º, "b", do Código Penal, ao argumento de que houve flagrante ilegalidade na fixação do regime inicial fechado, tal como formulada pelo agravante, configura indevida inovação recursal, pois não foi arguida no momento oportuno, qual seja, nas razões do recurso especial, o que impede seja apreciada no âmbito deste agravo regimental. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 1.490.583/SE, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 5/9/2019, DJe de 12/9/2019.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. CULPABILIDADE. CRIME COMETIDO ENQUANTO O AGENTE CUMPRIA PENA POR CRIME ANTERIOR. VALORAÇÃO NEGATIVA. POSSIBILIDADE. REINCIDÊNCIA. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A dosimetria da pena é o procedimento em que o magistrado, utilizando-se do sistema trifásico de cálculo, chega ao quantum ideal da pena com base em suas convicções e nos critérios previstos abstratamente pelo legislador. 2. A valoração negativa da culpabilidade fundada na maior reprovabilidade do comportamento do agente em razão de o delito ter sido cometido enquanto cumpria pena pela prática de crime anterior não configura bis in idem quando reconhecida a reincidência, que se refere a acréscimo objetivo operado apenas em função da existência de condenação definitiva anterior. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 639.218/SC, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 14/9/2021, DJe de 20/9/2021). Desse modo, entendo que essa circunstância deve ser valorada negativamente. b) Antecedentes Criminais: conforme certidão de ID 136293814, o réu possui outra condenação transitada em julgado, que será considerada como reincidência, na segunda fase da dosimetria, motivo pelo qual será considerada a circunstância neutra. c) Conduta Social: não foram colhidos elementos capazes de valorar negativamente a conduta social; d) Personalidade: poucos elementos foram coletados a respeito da personalidade dos agentes, razão pela qual deixo de valorá-la; e) Motivos do crime: os motivos do crime não ultrapassam aos próprios tipos; f) Circunstâncias do crime: desfavoráveis em relação ao crime de tráfico de drogas, pois foi comprovado nos autos a presença de uma criança de menos de 2(dois) anos de idade na residência na qual ocorreu a apreensão de drogas e dos instrumentos do crime, conforme depoimento da ré e dos policiais civis em juízo. Com efeito, expor criança ao convívio direto com drogas e com a dinâmica própria do tráfico representa grave risco à sua integridade física e psicológica. Tal conduta normaliza, no imaginário infantil, práticas criminosas como se fossem parte cotidiana e aceitável da vida social, contribuindo para a formação de um ambiente nocivo ao seu desenvolvimento. Além disso, a proximidade com substâncias ilícitas e com os riscos associados à atividade delituosa, como violência, repressão estatal e conflitos interpessoais, compromete não apenas a segurança imediata da criança, mas também seu pleno e saudável desenvolvimento. Trata-se, portanto, de circunstância que denota especial reprovabilidade da conduta, justificando o agravamento da resposta penal na primeira fase da dosimetria, por ultrapassar os elementos típicos inerentes ao crime de tráfico de drogas. Quanto à natureza e quantidade da droga, em que pese variedade qualitativa, com a presença de cocaína, considero que sua quantidade não enseja uma valoração negativa específica. Por fim, deve-se considerar que o crime foi praticado em concurso de agentes, circunstância que também deve ser valorada negativamente g) Consequências do crime: não há informações sobre consequências. h) Comportamento da vítima: prejudicado, porque os crimes não possuem vítima determinada. Desta forma, fixo-lhe a pena-base em relação ao réu em: 1) 7(sete) anos e 6(seis) meses de reclusão, ante a presença de duas circunstâncias judiciais desfavoráveis, em razão da prática do crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06. 2) 3(três) anos, 7(sete) meses e 15(quinze) dias de reclusão, ante a presença de uma circunstância judicial desfavorável, para o crime de receptação qualificada, previsto no art. 180, §1º, do Código Penal. Para esse cômputo, foram convertidas as penas em meses e subtraída a máxima da mínima, chegou-se a uma média entre elas, passando-se então na sua divisão pelas oito circunstâncias judiciais, de forma que foram aumentados 15(quinze) meses para cada circunstância desfavorável, em relação ao crime de tráfico de drogas, e 7(sete) meses e 15(quinze) dias, quando ao crime de receptação qualificada. X.2. DAS CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES E AGRAVANTES No caso em tela, verifico que não há nenhuma circunstância atenuante a ser aplicada. Por outro lado, há incidência da circunstância agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal. Nesse contexto, o réu possui condenação nos autos de nº 0809372-81.2021.8.20.5106, cuja data da infração foi em 02.05.2021 e trânsito em julgado em 06.02.2023. Desse modo, em consonância com a jurisprudência do STJ, aumento a pena base em 1/6(um sexto) e fixo a pena intermediária do réu: 1) 8(oito) anos e 9(nove) meses de reclusão, em razão da prática do crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06. 2) 4(quatro) anos, 2(dois) meses e 22(vinte e dois) dias de reclusão, em razão da prática do crime de receptação qualificada, previsto no art. 180, §1º, do Código Penal. X.3. DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E AUMENTO DA PENA Não vislumbro a hipótese de incidência de causas de aumento ou de diminuição de pena em relação a ambos os delitos. Portanto, torno concreta e definitiva, a pena privativa de liberdade, em relação ao réu em: 1) 8(oito) anos e 9(nove) meses de reclusão, em razão da prática do crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06. 2) 4(quatro) anos, 2(dois) meses e 22(vinte e dois) dias de reclusão, em razão da prática do crime de receptação qualificada, previsto no art. 180, §1º, do Código Penal. X.4. DA PENA DE MULTA Em decorrência da pena privativa de liberdade dosada e verificando que o tipo penal do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 possui pena de multa cominada no seu preceito secundário, a qual deverá guardar exata proporcionalidade com aquela, bem como com a situação econômica do réu a teor do art. 60 do CP, o réu ficará condenado ao pagamento de 875(oitocentos e setenta e cinco) dias-multa, em relação ao crime de tráfico, e 95(noventa e cinco) dias-multa em relação ao crime de receptação qualificada, sendo cada dia-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo, vigente à época do fato, ante a inexistência de informações a respeito da situação financeira dos réus. Para o referido cálculo, nos termos da doutrina de Ricardo Augusto Schmitt em "Sentença Penal Condenatória" (Editora Juspodivm, 14ª, 2020), utilizou-se a seguinte fórmula matemática: PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PENA DE MULTA Pena Aplicada - Pena Mínima Pena Aplicada - Pena Mínima Pena Máxima - Pena Mínima Pena Máxima - Pena Mínima Pena Aplicada = pena privativa de liberdade aplicada em concreto; Pena Aplicada = pena de multa aplicada em concreto (atribuído o valor de "X"); Pena Mínima = pena mínima privativa de liberdade prevista em abstrato para o tipo penal; Pena Mínima = pena mínima de multa prevista em abstrato para o tipo penal; Pena Máxima = pena máxima privativa de liberdade prevista em abstrato para o tipo penal; Pena Máxima = pena máxima de multa prevista em abstrato para o tipo penal; Convertidas as penas em meses em relação ao máximo da pena corporal, "x" como valor da pena de multa em concreto e 1500 (um mil e quinhentos) dias-multa como sendo o valor máximo da pena de multa previsto para o delito de tráfico de drogas, e 360(trezentos e sessenta) dias-multa como sendo o valor máximo da pena de multa para o delito de receptação, é realizada a fórmula da "regra de 3" para chegar-se ao valor de "x", e, assim, ao valor da pena de multa em exata proporcionalidade com a pena corporal. X.5. DO CONCURSO MATERIAL Após ter realizado a individualização da pena de cada evento delituoso nos termos da legislação vigente, passo à análise da somatória das penas para, ao fim, fixar em definitivo a pena em concreto em face do acusado. Conforme aduzido na fundamentação da respectiva sentença as penas anteriormente dosadas serão agora somadas, conforme preceito normativo do art. 69 do Código Penal. Desta forma, da soma das penas obtém-se um total de: 12(doze) anos, 11(onze) meses e 22(vinte e dois) dias de reclusão. XI. DA PENA DEFINITIVA DE MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA Assim sendo, fixo e torno concreta e definitiva a pena de MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA em: 12(doze) anos, 11(onze) meses e 22(vinte e dois) dias de reclusão e 970(novecentos e setenta) dias-multa, cada um no valor de 1/30(um trigésimo) do salário mínimo, em razão da prática do crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, e de receptação qualificada previsto no art. 180, §1º, do Código Penal c/c art. 69 do Código Penal. XII. DO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA DE MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA Considerando a pena dosada e as circunstâncias judiciais desfavoráveis, já analisadas na primeira fase da dosimetria, determino ao condenado Marcos Mateus Santana de Lima, o cumprimento inicial de pena no regime FECHADO, nos termos do §§ 2º, a, e 3º do art. 33 do Código Penal. XIII. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE DE MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA Verifico que na situação em tela torna-se incabível a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, tendo em vista o cômputo da pena cominada ao réu, condição que atrai impeditivo constante no art. 44 do Código Penal. XIV. DO DIREITO DO RÉU MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA DE RECORRER EM LIBERDADE Considerando que não houve decretação da prisão preventiva no decorrer do processo e não há requerimento do Ministério Público, CONCEDO o direito ao réu de recorrer em liberdade. Revogo as medidas cautelares impostas ao réu no ID 136306756. XV. DA DETRAÇÃO DE MARCOS MATEUS SANTANA DE LIMA (art. 387, § 2º, do CPP) Deixo de realizar a detração, porque não há período de prisão cautelar a ser contabilizado, e porque entendo que tal encargo é de competência do Juízo da Execução Penal. XVI. DAS PROVIDÊNCIAS FINAIS Condeno aos réus ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP. Intimem-se os condenados, por seus advogados, bem como o representante do Ministério Público, na forma do art. 392 do CPP. Oportunamente, após o trânsito em julgado, tomem-se as seguintes providências: I. Comunique-se ao Cartório Eleitoral para os fins do art. 15, caput e III, da CF pelo INFODIP; II. Com relação à pena pecuniária (multa), em conformidade com o art. 51 do CP, comunique-se ao Juízo da Execução Penal, a quem caberá fazer a compensação em caso de fiança depositada em Juízo ou cobrar os valores devidos. III. Expeça-se a Guia de Execução definitiva. Quanto aos bens constantes no auto de exibição e apreensão (ID 136283152, p.30) delibero da seguinte forma: a) Quanto aos aparelhos celulares, LG cor escura, Xiaomi azul-escuro, Iphone 7 plus gold, Iphone rosé e LG preto, considerando que não houve identificação dos proprietários, bem como ausente requerimentos de devolução, decreto seu perdimento. Em relação ao aparelho celular Iphone 7 plus vermelho de propriedade da ré Emilly Vitória da Costa Morais, compreendendo que o crime de tráfico de drogas se beneficia do meio virtual para sua consumação, também decreto seu perdimento. Em razão disso, considerando a natureza do delito e o caráter temerário de eventual arrematação dos aparelhos por terceiro de boa-fé em hasta pública, proceda-se com a destruição destes aparelhos. b) Quanto ao aparelho celular Moto E7 Power Azul, intime-se a autoridade policial, a fim de que no prazo de 10(dez) dias, informe o destino do aparelho, considerando a ausência de remessa ao depósito (ID 137395656) e de termo de devolução à vítima de roubo, legítima proprietária. b) Em relação ao anel dourado e o relógio de pulso Apple Watch, intimem-se os réus, para que no prazo de 10(dez) dias, manifeste-se sobre o interesse de reavê-los, mediante comprovação da propriedade lícita, sob pena de perdimento dos bens. c) Reitero o conteúdo da decisão de ID 141952599 e ordeno a INCINERAÇÃO das drogas e substâncias apreendidas, nos termos do art. 72, da Lei n. 11.343/2006, e a DESTRUIÇÃO dos bens inservíveis (balança de precisão, faca e sacos plásticos). Havendo informação de ausência de remessa de quaisquer desses bens a essa Secretaria, expeçam-se os ofícios necessários. De tudo se certifique. Publique-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Cumpra-se. Mossoró/RN, data da assinatura eletrônica. ANA ORGETTE DE SOUZA FERNANDES VIEIRA Juíza de Direito. (documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)
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