Processo nº 5354640-33.2025.8.09.0051
ID: 330689165
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 1ª UPJ Juizados Especiais Cíveis: 1º, 2º, 3º, 4º e 5º
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5354640-33.2025.8.09.0051
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LUCAS FREITAS CARDOSO PEREIRA
OAB/GO XXXXXX
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Poder JudiciárioTribunal de Justiça do Estado de GoiásComarca de Goiânia - 5º Juizado Especial CívelAvenida Olinda, esquina com a Avenida PL-3, quadra G, lote 04, Parque Lozandes, Goiânia/GO, CEP 74.…
Poder JudiciárioTribunal de Justiça do Estado de GoiásComarca de Goiânia - 5º Juizado Especial CívelAvenida Olinda, esquina com a Avenida PL-3, quadra G, lote 04, Parque Lozandes, Goiânia/GO, CEP 74.884-120Processo nº: 5354640-33.2025.8.09.0051Parte Autora: Leyle Reis Duarte De MenezesParte Ré: British Airways PlcNatureza da Ação: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento do Juizado Especial Cível SENTENÇA / MANDADO / OFÍCIO1 Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais proposta por Leyle Reis Duarte De Menezes, Marisa Helena Reis Duarte e Rossane Reis Duarte em face de British Airways Plc, todos já qualificados nos autos.Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38, caput, da Lei nº 9.099/95. Decido.Os pressupostos processuais de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo fazem-se presentes. As partes estão devidamente representadas, não restando irregularidades ou vícios capazes de invalidar a presente demanda.De logo, tenho como praticável o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, eis que a discussão se trata de matéria exclusivamente de direito, sendo que os documentos juntados são hábeis à comprovação da matéria fática, sendo prescindíveis a produção de outras provas, motivo pelo qual conheço diretamente do pedido.Conforme recente orientação emanada do Supremo Tribunal Federal, os conflitos que envolvem extravios de bagagem e prazos prescricionais ligados à relação de consumo em transporte aéreo internacional de passageiros devem ser resolvidos pelas regras estabelecidas pelas convenções internacionais sobre a matéria, ratificadas pelo Brasil.A tese aprovada diz que “por força do artigo 178 da Constituição Federal, as normas e tratados internacionais limitadoras da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor”.Assim, a presente demanda deve ser analisada conforme a Convenção de Varsóvia.No entanto, referida convenção prevê limites para a indenização por danos materiais sofridos pelos passageiros em voos internacionais, de forma que não menciona limites indenizatórios para danos morais.Nesta esteira raciocínio, os danos materiais pleiteados na inicial serão analisados com base na Convenção de Varsóvia e os danos morais de acordo com o Código de Defesa do Consumidor.Em breve síntese, as autoras alegam que firmaram contrato de prestação de serviços turísticos com a inclusão de passagens aéreas internacionais, com saída do Brasil em 20/03/2025 e retorno previsto para 30/03/2025, passando por diversas conexões. Aduzem que, embora o embarque inicial tenha ocorrido normalmente, um incêndio no Aeroporto de Heathrow, em Londres, causou o desvio do voo para Madri.Suscitam que, ao desembarcarem na Espanha, não receberam qualquer assistência da companhia aérea ré quanto ao translado para o destino final nem sobre as bagagens, ficando mais de três horas sem informações e arcando com os próprios custos de alimentação. Afirmam que, somente após insistência, conseguiram prosseguir viagem até Roma, mas sem acesso às malas.Narram que os pertences, inclusive medicamentos de uso contínuo da autora Marisa Helena, permaneceram retidos, o que teria comprometido o controle de enfermidades como hipertensão e diabetes. Aduzem que, diante disso, tiveram de adquirir roupas e itens essenciais com recursos próprios, conforme comprovantes anexados.Sustentam que os transtornos ultrapassam o mero aborrecimento, configurando falha na prestação do serviço por parte da ré, em afronta ao Código de Defesa do Consumidor. Requerem, ao final, o ressarcimento dos valores gastos com alimentação e vestuário e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.Juntam aos autos os contratos, comprovantes de embarque, comunicações com a companhia aérea, recibos de gastos realizados durante a viagem e laudos médicos, buscando demonstrar a extensão do dano sofrido e a responsabilidade da requerida.A requerida apresentou defesa onde alega alega que não houve falha na prestação do serviço, pois a bagagem das autoras foi entregue no prazo de 15 dias após o desembarque, conforme estabelece o art. 32, §2º, II da Resolução 400 da ANAC. Sustenta, portanto, que inexiste obrigação de indenizar, já que o prazo regulamentar foi observado.Aduz que o extravio temporário das bagagens decorreu de fatores alheios à sua atuação direta, ressaltando que a manipulação física das bagagens é feita por funcionários do aeroporto, e não da companhia aérea. Nessa linha, suscita a ausência de responsabilidade por fato de terceiro.Quanto ao cancelamento do voo, sustenta que decorreu de caso fortuito externo — um incêndio no aeroporto de Londres —, sem qualquer relação com falha da ré. Alega que prestou toda a assistência necessária, inclusive remanejando as autoras para outro voo sem custos adicionais.Suscita ainda que os danos alegados pelas autoras não configuram prejuízo material, pois os bens adquiridos (roupas, medicamentos, alimentação) foram incorporados ao patrimônio das mesmas, não havendo perda financeira indenizável. Rechaça também o pedido de danos morais, apontando que os fatos representam meros aborrecimentos cotidianos.Por fim, aduz que o Código de Defesa do Consumidor é inaplicável ao caso, por se tratar de transporte aéreo internacional, regido por normas internacionais, como as Convenções de Montreal e Varsóvia. Com base nesses fundamentos, requer a total improcedência dos pedidos formulados na inicial.As autoras apresentaram impugnação à contestação reiterando, in totum, os pedidos exordiais.É o sucinto relatório, tendo em vista o disposto no artigo 38 da Lei 9.099/95, portanto, passo a fundamentar e decidir.Reputo que o processo se encontra apto a receber julgamento, uma vez que perfeitamente aplicável, neste caso, o disposto no inciso I, do artigo 355, do Código de Processo Civil, dispensando-se a realização da audiência de instrução e julgamento, eis que os elementos do ato colhido em nada modificariam o livre convencimento, sendo o conjunto probatório coligido aos autos suficiente para prolação da sentença, já que se trata de matéria exclusivamente de direito.Ressalte-se ainda que o Código de Defesa do Consumidor, supletivamente à Convenção de Montreal, dispõe a respeito da reparação por danos morais e que a responsabilidade entre os fornecedores será objetiva e solidária entre si, em se tratando de eventual prejuízo causado ao consumidor (art. 7º, parágrafo único e art. 18).É matéria incontroversa que as autoras adquiriram passagens aéreas, sendo matéria controvertida se teriam direito ao reembolso integral com despesas realizadas para aquisição de novos itens pessoais e, por corolário, à compensação por dano moral. De início, registro que, em se tratando dos pedidos de danos morais, a presente demanda será analisada em observância ao Código de Defesa do Consumidor e quanto aos danos materiais pela Convenção de Varsóvia, porquanto as partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor previstos, respectivamente, nos arts. 2º e 3º do referido diploma legal.É cediço que, nas relações de consumo, a responsabilidade do fornecedor de serviços tem natureza objetiva, cabendo ao consumidor demonstrar apenas a ocorrência do defeito em sua prestação, o dano sofrido e o nexo de causalidade, nos termos do que preceitua o art. 14 do CDC, confira-se:Art. 14. "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos."Embora a relação versada seja típica de consumo em que é autorizada a inversão do ônus da prova, o Magistrado também deve apreciar o caso de acordo com as regras de distribuição do ônus da prova, consubstanciada no artigo 373 e incisos, do Código de Processo Civil, de forma que incumbe ao autor, produzir a prova quanto aos fatos constitutivos do seu direito e à ré, produzir a prova quanto aos fatos modificativos, impeditivos ou extintivos.Quanto ao fato constitutivo de seu direito (artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil), verifica-se que as partes autoras juntaram contrato de prestação de serviços de turismo; confirmação de reserva; cartões de embarque; despesas com alimentação; despesas com roupas; relatório de irregularidade de bagagem; comprovante de entrega de bagagem e receituário médico, todos do Evento 01.Em que pese a Resolução nº 400/16 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) dispor que a companhia aérea possui um prazo de até 21 (vinte e um) dias para restituição de bagagem extraviada em voo internacional, não se exime a responsabilidade da ré quanto aos prejuízos materiais identificados na necessidade de aquisição de itens essenciais no período de estadia dos autores.Neste sentido, é o entendimento jurisprudencial:EMENTA: JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EXTRAVIO TEMPORÁRIO DE BAGAGEM EM VOO INTERNACIONAL. DANOS MATERIAIS. PREVALÊNCIA DAS CONVENÇÕES DE VARSÓVIA E MONTREAL SOBRE AS DISPOSIÇÕES DO CDC. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. MÉTODO BIFÁSICO DE FIXAÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. VALOR ADEQUADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Na inicial, verbera o autor que adquiriu passagens aéreas da requerida, ora recorrente, cujos voos seriam operados pela empresa aérea Tam. Alega que ao chegar em Lyon, detectou que sua bagagem não foi encontrada e fez comunicação de seu extravio, cuja bagagem continha itens essenciais e imprescindíveis à viagem. Aduz que diante de tal fato, fez compras para suportar o clima frio que assolava referida cidade, perfazendo o montante de R$ 9.273,85 (nove mil e duzentos e setenta e três reais e oitenta e cinco centavos). Afirma que após dois dias lhe fora entregue sua bagagem. Diante disso, pleitou indenização por danos materiais e morais. Na sentença, o juiz a quo julgou procedentes os pedidos e condenou as reclamadas ao pagamento, solidário, de R$ 8.903,74 a título de dano material, e R$ 10.000,00 a título de dano moral. No recurso, a parte Societ Air France insiste na aplicação das disposições da Convenção de Montreal, aduzindo a não comprovação do dano material e inexistência do dano moral. Contrarrazões no evento 45. 2. O Supremo Tribunal Federal, por meio do Tema 210, entendeu que no caso de extravio de bagagem em transporte aéreo internacional, não é aplicável o CDC, mas sim a Convenção de Varsóvia/Montreal e demais acordos internacionais. Contudo, tal entendimento ? prevalência de acordos internacionais em detrimento do CDC em transporte aéreo internacional ? relaciona-se a indenizações por danos materiais, de modo que o Código de Defesa do Consumidor continua plenamente aplicável em relação a indenizações por danos morais. 3. Dito isto e, adentrando ao mérito causal, em relação aos danos materiais, não comungo do mesmo argumento da empresa recorrente ao dizer em suas razões recursais que ?não há provas da existência do dano?. O dano surge a partir do momento em que o autor se viu obrigado a dispender de quantia própria para adquirir itens pessoais os quais, por conduta da requerida, não esteve em sua posse quando do desembarque no destino - cidade de Lyon/França. A utilização de recursos não planejados afetaram a sua viagem e comprometeram a verba que tinha para o lazer, logo deverá ser ressarcido pelos gastos com roupas e pertences pessoais adquiridos obrigatoriamente e sem nenhuma necessidade até aquele momento por culpa exclusiva da parte reclamada. 4. A alegação da empresa recorrente de que os documentos (notas fiscais) deveriam estar acompanhada de tradução juramentada sob fundamento de dificuldade de identificação dos itens adquiridos, é de somenos importância e não tem fundamento visto que, embora em língua estrangeira, tais itens são de fáceis deduções, interpretações e percepções eis que voltados ao dia a dia do homem médio. 5. Em casos como vertente, o prévio registro dos objetos de bagagens não é exigido pelas companhias na prática, e ainda que o fosse, o recorrido comprovou, ônus que lhe incumbia (art. 373, inciso I, do CPC). Assim, não obstante o recorrido ter registrado o extravio da bagagem, e em cumprimento com o seu dever juntou documentos a demonstrar os itens adquiridos no período em que se encontrava sem seus pertences, sobretudo levando em consideração a verossimilhança entre os objetos adquiridos e diante da ausência da exigibilidade da relação dos objetos constantes na mala quando do embarque por parte da promovida, aplicando o paradigma da verossimilhança. 6. Em relação ao quantum arbitrado a título de danos materiais, tem-se que a quantia fixada pelo juízo a quo não se mostra razoável, uma vez que, no caso em apreço, será aplicado com base nos Direitos Especiais de Saque, em observância ao art. 22, item 2, da Convenção de Montreal. 7. Com efeito, observando a cotação do dia 04/03/2022 (data do evento danoso) dos Direitos Especiais de Saque, constata-se que era equivalente a R$ 7,05 (sete reais e cinco centavos), conforme o site do conversor de moedas CUEX (https://cuex.com/pt/xdr-brl), assim, a fixação do dano material em 1.000 Direitos Especiais de Saque pelo extravio da bagagem, resultaria em R$ 7.050,00 (sete mil e cinquenta reais). 8. Dessa maneira, conforme os parâmetros do art. 22, item 2, da Convenção de Montreal, 1.000 Direitos Especiais de Saque é o limite de referida Convenção em casos de extravio de bagagem, não podendo ser ultrapassado, contudo, deve ser tal valor corrigido monetariamente, bem como incidir os devidos juros. 9. Neste sentido, é o entendimento das Turmas Recursais do Sistemas dos Juizados Especiais: autos nº5085169.22, de Relatoria da Dra. Stefane Fiuza Cançado Machado; autos nº5541051.92 de Relatoria do Dr. José Carlos Duarte; autos nº5171854.63 de relatoria da Dra. Mônica Cezar Moreno Senhorelo. 10. O Superior Tribunal de Justiça, nesse sentido, também já decidiu no Recurso Especial nº1.820.698, sob Relatoria do Ministro Marco Buzzi. 11. No tocante ao dano moral, o Recurso Extraordinário julgado pelo Supremo Tribunal Federal, objeto do Tema 210 da repercussão geral, define a aplicação da citada Convenção somente para os efeitos de limitação de indenização por danos decorrentes de danos materiais, nada se referindo quanto aos danos morais postulados. Desse modo, no caso em questão, o dano moral deve ser analisado sobre o viés do Código de Defesa do Consumidor. Assim, resta inconteste a falha da prestação dos serviços pela privação do consumidor de seus pertences, por extravio de bagagem, esta que ultrapassa o mero dissabor da vida, sendo devida a reparação cível. 11. Analisando os argumentos apresentados pela recorrente, tem-se que o simples extravio de bagagem não é capaz de gerar dano moral, na esteira do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.329.189/RN). Contudo, o extravio de bagagem no voo de ida em viagem ao exterior, leva o consumidor a enfrentar dificuldades, como na presente demanda, com necessidade de aquisição de itens mínimos para higiene pessoal e vestimentas, ultrapassando a esfera do simples aborrecimento e redundando em danos morais passíveis de indenização. Não se pode perder de vista a perda do tempo útil do autor, que ao chegar em seu destino se viu obrigado a realizar compra de necessidades básicas, inclusive, agasalhos diante do frio que assolava a cidade. O extravio da bagagem, sem dúvida, gerou aflição e preocupação no consumidor, sentimentos esses que não eram necessários porque era de se entender que todos os pertences necessários, os quais foram extraviados, estavam na bagagem do autor, sendo certo que era só chegar no destino e aproveitar a viagem. Contudo, não foi o que ocorreu já que teve que despender de seu tempo - que poderia curtir a viagem ? para realizar compras para sua estadia em Lyon. 12. Para fixação do dano moral deve o julgador guiar-se de modo a não provocar enriquecimento ilícito, mas atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e o montante de R$10.000,00 (dez mil reais), fixado pelo juízo singular, atende a tais finalidades. 13. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, reformando a sentença, em parte, no sentido de alterar a condenação de danos materiais, a fim de seguir os parâmetros da Convenção de Varsóvia e Montreal, adequando para 1.000 Direitos Especiais de Saque (cotação da data de 04/03/2022 ? busca realizada no site https://cuex.com/pt/xdr-brl), correspondente a R$ 7.050,00 (sete mil e cinquenta reais), devendo a correção permanecer a contida na sentença, mandando no mais, a sentença, tal como lançada. 14. Nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95, fica a parte Recorrente dispensada do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, diante do resultado do julgamento com o parcial provimento do recurso interposto. (Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, 5396178-96.2022.8.09.0051, ROBERTO NEIVA BORGES, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 13/07/2023 15:57:31)Por outra via, a responsabilidade da companhia aérea pelos danos materiais advindos do extravio temporário limita-se a itens essenciais:Apelação. Indenização. Dano moral e material. transporte aéreo. Extravio de bagagem. Devolução após 7 (sete) dias do desembarque do autor. 1. Dano material. Itens adquiridos de valor considerável, que não retratam essencialidade, necessidade básica ou emergência. 2. Dano moral configurado. Valor da indenização reduzido para R$ 2.000,00 (dois mil reais). R. sentença reformada. Recurso parcialmente provido. (1035573-39.2024.8.26.0100 e o código A15952B. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Voto no 49.269 Processo no: 1035573-39.2024.8.26.0100 Classe Assunto: Apelação Cível - Transporte Aéreo Apelante: Swiss International Airlines Ag Apelado: Christiano Kunzler)Neste diapasão, o dano material está adstrito à efetiva comprovação dos itens essenciais adquiridos pelos autores.Infere-se que os autores efetuaram gastos com blazer, camisa e calças no valor de € 470,38 em relação à vestuário e € 30,35 com alimentação e que totalizam € 500,73.Desta forma, reconheço os danos materiais atinentes aos itens comprovadamente adquiridos como essenciais (documento 15, 16 e 17 do Evento 01) e que limitam-se a € 500,73 (quinhentos euros e setenta e três cêntimos).A cotação do Euro na data de 20 de março de 2025 era de R$3.247,66 (https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/historicocotacoes).Desta forma, julgo procedente o pedido de danos materiais no total de R$3.247,66 (três mil duzentos e quarenta e sete reais e sessenta e seis centavos).No que tange aos danos morais, infere-se que as autoras não gozaram plenamente da viagem planejada, diante da ausência da bagagem das requerentes e busca incessante (documentos 18, 19, 20 e 21 do Evento 01) pelo rastreamento da bagagem juntamente com a requerida.Neste sentido, a jurisprudência reconhece os danos morais experimentados pelas autoras pelo desvio produtivo e pela privação das Autoras quanto aos itens pessoais levados e extraviados até o final da viagem:EMENTA: JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EXTRAVIO TEMPORÁRIO DE BAGAGEM EM VOO INTERNACIONAL. DANOS MATERIAIS. PREVALÊNCIA DAS CONVENÇÕES DE VARSÓVIA E MONTREAL SOBRE AS DISPOSIÇÕES DO CDC. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. MÉTODO BIFÁSICO DE FIXAÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. VALOR ADEQUADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Na inicial, verbera o autor que adquiriu passagens aéreas da requerida, ora recorrente, cujos voos seriam operados pela empresa aérea Tam. Alega que ao chegar em Lyon, detectou que sua bagagem não foi encontrada e fez comunicação de seu extravio, cuja bagagem continha itens essenciais e imprescindíveis à viagem. Aduz que diante de tal fato, fez compras para suportar o clima frio que assolava referida cidade, perfazendo o montante de R$ 9.273,85 (nove mil e duzentos e setenta e três reais e oitenta e cinco centavos). Afirma que após dois dias lhe fora entregue sua bagagem. Diante disso, pleitou indenização por danos materiais e morais. Na sentença, o juiz a quo julgou procedentes os pedidos e condenou as reclamadas ao pagamento, solidário, de R$ 8.903,74 a título de dano material, e R$ 10.000,00 a título de dano moral. No recurso, a parte Societ Air France insiste na aplicação das disposições da Convenção de Montreal, aduzindo a não comprovação do dano material e inexistência do dano moral. Contrarrazões no evento 45. 2. O Supremo Tribunal Federal, por meio do Tema 210, entendeu que no caso de extravio de bagagem em transporte aéreo internacional, não é aplicável o CDC, mas sim a Convenção de Varsóvia/Montreal e demais acordos internacionais. Contudo, tal entendimento ? prevalência de acordos internacionais em detrimento do CDC em transporte aéreo internacional ? relaciona-se a indenizações por danos materiais, de modo que o Código de Defesa do Consumidor continua plenamente aplicável em relação a indenizações por danos morais. 3. Dito isto e, adentrando ao mérito causal, em relação aos danos materiais, não comungo do mesmo argumento da empresa recorrente ao dizer em suas razões recursais que ?não há provas da existência do dano?. O dano surge a partir do momento em que o autor se viu obrigado a dispender de quantia própria para adquirir itens pessoais os quais, por conduta da requerida, não esteve em sua posse quando do desembarque no destino - cidade de Lyon/França. A utilização de recursos não planejados afetaram a sua viagem e comprometeram a verba que tinha para o lazer, logo deverá ser ressarcido pelos gastos com roupas e pertences pessoais adquiridos obrigatoriamente e sem nenhuma necessidade até aquele momento por culpa exclusiva da parte reclamada. 4. A alegação da empresa recorrente de que os documentos (notas fiscais) deveriam estar acompanhada de tradução juramentada sob fundamento de dificuldade de identificação dos itens adquiridos, é de somenos importância e não tem fundamento visto que, embora em língua estrangeira, tais itens são de fáceis deduções, interpretações e percepções eis que voltados ao dia a dia do homem médio. 5. Em casos como vertente, o prévio registro dos objetos de bagagens não é exigido pelas companhias na prática, e ainda que o fosse, o recorrido comprovou, ônus que lhe incumbia (art. 373, inciso I, do CPC). Assim, não obstante o recorrido ter registrado o extravio da bagagem, e em cumprimento com o seu dever juntou documentos a demonstrar os itens adquiridos no período em que se encontrava sem seus pertences, sobretudo levando em consideração a verossimilhança entre os objetos adquiridos e diante da ausência da exigibilidade da relação dos objetos constantes na mala quando do embarque por parte da promovida, aplicando o paradigma da verossimilhança. 6. Em relação ao quantum arbitrado a título de danos materiais, tem-se que a quantia fixada pelo juízo a quo não se mostra razoável, uma vez que, no caso em apreço, será aplicado com base nos Direitos Especiais de Saque, em observância ao art. 22, item 2, da Convenção de Montreal. 7. Com efeito, observando a cotação do dia 04/03/2022 (data do evento danoso) dos Direitos Especiais de Saque, constata-se que era equivalente a R$ 7,05 (sete reais e cinco centavos), conforme o site do conversor de moedas CUEX (https://cuex.com/pt/xdr-brl), assim, a fixação do dano material em 1.000 Direitos Especiais de Saque pelo extravio da bagagem, resultaria em R$ 7.050,00 (sete mil e cinquenta reais). 8. Dessa maneira, conforme os parâmetros do art. 22, item 2, da Convenção de Montreal, 1.000 Direitos Especiais de Saque é o limite de referida Convenção em casos de extravio de bagagem, não podendo ser ultrapassado, contudo, deve ser tal valor corrigido monetariamente, bem como incidir os devidos juros. 9. Neste sentido, é o entendimento das Turmas Recursais do Sistemas dos Juizados Especiais: autos nº5085169.22, de Relatoria da Dra. Stefane Fiuza Cançado Machado; autos nº5541051.92 de Relatoria do Dr. José Carlos Duarte; autos nº5171854.63 de relatoria da Dra. Mônica Cezar Moreno Senhorelo. 10. O Superior Tribunal de Justiça, nesse sentido, também já decidiu no Recurso Especial nº1.820.698, sob Relatoria do Ministro Marco Buzzi. 11. No tocante ao dano moral, o Recurso Extraordinário julgado pelo Supremo Tribunal Federal, objeto do Tema 210 da repercussão geral, define a aplicação da citada Convenção somente para os efeitos de limitação de indenização por danos decorrentes de danos materiais, nada se referindo quanto aos danos morais postulados. Desse modo, no caso em questão, o dano moral deve ser analisado sobre o viés do Código de Defesa do Consumidor. Assim, resta inconteste a falha da prestação dos serviços pela privação do consumidor de seus pertences, por extravio de bagagem, esta que ultrapassa o mero dissabor da vida, sendo devida a reparação cível. 11. Analisando os argumentos apresentados pela recorrente, tem-se que o simples extravio de bagagem não é capaz de gerar dano moral, na esteira do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.329.189/RN). Contudo, o extravio de bagagem no voo de ida em viagem ao exterior, leva o consumidor a enfrentar dificuldades, como na presente demanda, com necessidade de aquisição de itens mínimos para higiene pessoal e vestimentas, ultrapassando a esfera do simples aborrecimento e redundando em danos morais passíveis de indenização. Não se pode perder de vista a perda do tempo útil do autor, que ao chegar em seu destino se viu obrigado a realizar compra de necessidades básicas, inclusive, agasalhos diante do frio que assolava a cidade. O extravio da bagagem, sem dúvida, gerou aflição e preocupação no consumidor, sentimentos esses que não eram necessários porque era de se entender que todos os pertences necessários, os quais foram extraviados, estavam na bagagem do autor, sendo certo que era só chegar no destino e aproveitar a viagem. Contudo, não foi o que ocorreu já que teve que despender de seu tempo - que poderia curtir a viagem ? para realizar compras para sua estadia em Lyon. 12. Para fixação do dano moral deve o julgador guiar-se de modo a não provocar enriquecimento ilícito, mas atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e o montante de R$10.000,00 (dez mil reais), fixado pelo juízo singular, atende a tais finalidades. 13. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, reformando a sentença, em parte, no sentido de alterar a condenação de danos materiais, a fim de seguir os parâmetros da Convenção de Varsóvia e Montreal, adequando para 1.000 Direitos Especiais de Saque (cotação da data de 04/03/2022 ? busca realizada no site https://cuex.com/pt/xdr-brl), correspondente a R$ 7.050,00 (sete mil e cinquenta reais), devendo a correção permanecer a contida na sentença, mandando no mais, a sentença, tal como lançada. 14. Nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95, fica a parte Recorrente dispensada do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, diante do resultado do julgamento com o parcial provimento do recurso interposto. (Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, 5396178-96.2022.8.09.0051, ROBERTO NEIVA BORGES, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 13/07/2023 15:57:31)Logo, infere-se que as autoras experimentaram privação de 10 (dez) dias para restituição de suas bagagens.Resta evidente que o fato deixou as consumidoras em estado vulnerável, vez que gerou quebra de confiança e expectativa, o que, com certeza, contribuiu para gerar constrangimento que vai além do dissabor cotidiano, restando caracterizado o dano moral.Destarte, a empresa reclamada deve arcar com os prejuízos causados a reclamante, pelo ilícito praticado, que violou direito subjetivo individual da mesma, uma vez que sofreu humilhação e constrangimento moral desmerecido, superiores a meros aborrecimentos ou dissabores cotidianos.Quanto ao montante a ser indenizado, como corolário de decisões anteriores deste juízo, observa-se que no momento da fixação do montante do dano a ser ressarcido, cabe ao julgador a estipulação do mesmo, obedecendo os critérios da razoabilidade, de maneira que, atendidas as circunstâncias do caso analisado, atendam a natureza compensatória e pedagógica da medida, sem se converter em enriquecimento ilícito.Concluo, então, que deve ser fixada a indenização na proporção de R$3.000,00 (três mil reais), a cada uma das reclamantes, a título de danos morais suportados.Ante o exposto, opino pela PARCIAL PROCEDÊNCIA dos pedidos formulados por Leyle Reis Duarte De Menezes, Marisa Helena Reis Duarte e Rossane Reis Duarte em face de British Airways Plc, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de:JULGAR PROCEDENTE o pedido de indenização por danos materiais, no total de R$3.247,66 (três mil duzentos e quarenta e sete reais e sessenta e seis centavos), referente às despesas com itens essenciais até a devolução da bagagem, corrigido monetariamente pelo IPCA desde o efetivo pagamento e acrescido de juros de mora mensais nos termos do artigo 406 e seus parágrafos do Código Civil (alterado pela Lei 14.905/2024) a partir da citação.CONDENAR a requerida ao pagamento total de R$9.000,00 (nove mil reais), sendo R$3.000,00 (três mil reais) a cada uma das autoras, a título de indenização por danos morais, com correção monetária (IPCA) a partir desta sentença (Súmula 362 do STJ) e juros moratórios mensais nos termos do artigo 406 e seus parágrafos do Código Civil (alterado pela Lei 14.905/2024), desde a citação efetivada.Sem custas e honorários advocatícios, conforme o artigo 55, da Lei nº 9.099/95.À consideração do Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito em substituição neste Juizado Especial Cível.Goiânia, datado e assinado digitalmente. Fernando Luiz Dias Morais FernandesJuiz Leigo HOMOLOGAÇÃOExaminei os presentes autos, avaliei os fundamentos apresentados acima e aprovo a conclusão externada pelo juiz leigo, razão pela qual homologo o projeto de sentença, para que surta seus efeitos jurídicos, nos termos do art. 40 da Lei 9.099/1995.Sem custas e honorários advocatícios, conforme o art. 55 da Lei 9.099/95.Havendo recurso com pedido de assistência judiciária, o recorrente deverá juntar documentos para comprovar a necessidade do benefício (comprovante de renda, extratos bancários dos últimos três meses, declaração de imposto de renda dos últimos dois anos, inscrição CADÚnico – retirada no CRAS – Centro de Referência de Assistência Social – ou outros que acha pertinente), com as razões do recurso, sob pena de perempção e deserção.Implementado o trânsito em julgado e cumpridas as determinações pela UPJ, ARQUIVE-SE.Publicado e registrado eletronicamente. Intime-se as partes.Goiânia, datado e assinado digitalmente. DANILO FARIAS BATISTA CORDEIROJuiz de Direito(assinado digitalmente)
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