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Processo nº 1013837-54.2023.8.11.0055

ID: 299923666

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1013837-54.2023.8.11.0055

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

COMERCIAL DE CALCARIO TANGARA LTDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOACIR JOLANDO NEVES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

TIAGO SHIOJI TIUMAN

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013837-54.2023.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Nota Fiscal ou Fatura, Espécies de Títulos de Cr… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013837-54.2023.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Nota Fiscal ou Fatura, Espécies de Títulos de Crédito] Relator: Des(a). SERLY MARCONDES ALVES Turma Julgadora: [DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [COMERCIAL DE CALCARIO TANGARA LTDA - CNPJ: 47.139.610/0001-34 (APELANTE), TIAGO SHIOJI TIUMAN - CPF: 032.902.089-74 (ADVOGADO), JOACIR JOLANDO NEVES - CPF: 200.348.651-87 (ADVOGADO), AGROFORTE COMERCIO DE PRODUTOS AGRICOLAS LTDA - CNPJ: 36.759.921/0003-41 (APELADO), HITLER SANSAO SOBRINHO - CPF: 029.309.581-70 (ADVOGADO), JOSE FABIO PANTOLFI FERRARINI - CPF: 014.546.781-35 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: NÃO PROVIDO, UNÂNIME E M E N T A EMENTA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. “GOLPE DO BOLETO FALSO”. DOCUMENTO CONTENDO DADOS SIMILARES AO DO CREDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR. VULNERABILIDADE DA EMPRESA COMPRADORA. APLICAÇÃO EXCEPCIONAL DO CDC. FORTUITO INTERNO. BOA-FÉ DA DEVEDORA EVIDENCIADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado em ação de cobrança, condenando a autora ao pagamento de custas e honorários. A autora pleiteava o pagamento de R$ 4.882,50 decorrentes da venda de 46.500 kg de calcário, alegando inadimplemento. A ré/apelada sustentou ter pago a quantia via boleto enviado por e-mail supostamente oriundo da autora, mas posteriormente descoberto como fraudulento. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica entre as partes, ambas pessoas jurídicas; e (ii) estabelecer se a responsabilidade pela fraude decorrente de boleto falso recai sobre a fornecedora que permitiu a utilização de seu canal de comunicação por terceiro fraudador. III. RAZÕES DE DECIDIR O Código de Defesa do Consumidor é aplicável excepcionalmente às relações entre pessoas jurídicas quando demonstrada vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica da adquirente, nos termos da teoria finalista mitigada, como reconhecido na jurisprudência do STJ (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.223.089/SE). A vulnerabilidade da apelada restou evidenciada diante do uso do e-mail oficial da apelante para envio do boleto fraudulento, caracterizando falha na prestação do serviço de cobrança e justificando a proteção consumerista prevista no art. 29 do CDC. A fraude praticada por terceiro mediante uso do canal de comunicação da fornecedora configura fortuito interno, vinculado à atividade empresarial da apelante, cuja responsabilidade é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC. A apelada agiu de boa-fé ao efetuar o pagamento de boleto aparentemente legítimo, enviado por endereço eletrônico regularmente utilizado pela fornecedora e contendo informações da nota fiscal correspondente. A responsabilização da apelante é reforçada pelo fato de que os dados constantes no boleto fraudulento — número da nota fiscal, valor e remetente — somente poderiam ter sido acessados por quem tivesse contato com as informações da negociação, evidenciando falha no controle dessas informações sensíveis. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: É admissível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor a relações entre pessoas jurídicas quando configurada situação de vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica da adquirente. O envio de boleto fraudulento por meio de canal oficial da fornecedora configura falha na prestação do serviço e caracteriza fortuito interno, não excludente da responsabilidade civil do fornecedor. A boa-fé do adquirente no pagamento do boleto recebido de canal oficial afasta o inadimplemento contratual, transferindo à fornecedora a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes da fraude. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 2º, 3º, 14 e 29; CC, art. 309; CPC, arts. 487, I, e 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.223.089/SE, rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, j. 11.11.2024, DJe 13.11.2024; TJMT, ApCiv 1033179-59.2024.8.11.0041, rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 21.01.2025, DJE 22.01.2025; TJMT, ApCiv 1043434-81.2021.8.11.0041, rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 05.02.2025, DJE 11.02.2025. R E L A T Ó R I O AP 1013837-54.2023.8.11.0055 COMERCIAL DE CALCÁRIO TANGARÁ LTDA X AGROFORTE COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA RELATÓRIO Eminentes pares: Trata-se de recurso de Apelação interposto por COMERCIAL DE CALCÁRIO TANGARÁ LTDA, com o fito de reformar a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra que, nos autos da ação de cobrança ajuizada em face de AGROFORTE COMÉRCIO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA, nos termos do art. 487, I, do CPC, julgou improcedentes a pretensão inicial. Por conseguinte, condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor da causa. A apelante alega a impossibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, ao argumento de que a relação jurídica não configura relação de consumo, pois o insumo agrícola foi adquirido pela apelada para implementação de sua atividade econômica, não se enquadrando como consumidor final. Afirma que o boleto fraudulento foi emitido e encaminhado por terceiro estranho à lide, não havendo sua participação no envio do documento fraudado. Aduz que a ré/apelada não demonstrou qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, máxime a prova da quitação da dívida em seu favor. Posto isso, pugna pela reforma da sentença. Contrarrazões pelo desprovimento do recurso apresentadas à id de n. 288231415. É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO Eminentes pares: Na hipótese, a requerente ajuizou ação de cobrança narrando que realizou a venda de 46.500 kg de calcário agrícola magnesiano à parte requerida, pelo valor de R$ 4.882,50 (quatro mil, oitocentos e oitenta e dois reais e cinquenta centavos), com pagamento previsto para o dia 23 de abril de 2023, conforme Nota Fiscal nº 0009916. Afirmou que o pagamento não foi efetuado, razão pela qual postulou pela condenação da ré ao adimplemento da obrigação. Em sua defesa, a requerida alegou que efetuou o pagamento da dívida por meio de boleto bancário que teria sido enviado pelo e-mail oficial da autora/apelante. Afirmou que posteriormente descobriu que o boleto era fraudulento e que o valor pago foi direcionado a terceiro estranho à relação negocial. Defendeu não ser responsável pelo prejuízo, uma vez que agiu de boa-fé ao efetuar o pagamento de documento aparentemente idôneo, enviado pelo canal oficial de comunicação da credora. A sentença julgou improcedentes os pedidos iniciais, conforme relatório. Nesta ocasião, a requerente ora apelante busca a reforma da sentença com base nos argumentos já mencionados. Pois bem. No que diz respeito a inaplicabilidade do CDC, A Lei consumerista em seus arts. 2º e 3º, define a classificação de consumidor e fornecedor, in verbis: “Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” Contudo, o mesmo regramento jurídico em seu capítulo V, no qual trata sobre as práticas comerciais, estabelece que, sob a ótica da vulnerabilidade, poderá uma pessoa determinável ou não ser equiparada à consumidora. Art. 29 Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas. No presente caso, não se discute propriamente o produto adquirido (calcário), mas a prática comercial de cobrança adotada pela apelante, que envolvia o envio de boletos bancários por meio de e-mail, sem a adoção de mecanismos adequados de segurança para evitar fraudes, o que torna evidente a vulnerabilidade da apelada em relação à forma de pagamento disponibilizada pela apelante. Ademais, cumpre esclarecer que a Corte Superior também tem admitido a aplicação excepcional da norma consumerista nas relações interempresariais quando evidenciada situação de vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica da pessoa jurídica que adquire o produto ou serviço, em uma mitigação da teoria finalista. A propósito: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA. ABRANDAMENTO. SÚMULA N. 83 DO STJ. DEMONSTRAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA, JURÍDICA OU ECONÔMICA. VERIFICAÇÃO. SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Inexiste negativa de prestação jurisdicional quando a corte de origem examina e decide, de modo claro e objetivo, as questões que delimitam a controvérsia, não ocorrendo nenhum vício que possa nulificar o acórdão recorrido. 2. A inversão do ônus da prova é realizada a critério do juiz e se caracteriza como regra de instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina deve ocorrer, preferencialmente, antes da etapa instrutória, ou quando proferida em momento posterior, garantir a parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas. 3. É possível a aplicação das normas de proteção ao consumidor à pessoa física ou jurídica que, mesmo não sendo destinatária final do produto ou serviço, tenha reconhecida sua situação de vulnerabilidade. 4. Rever o entendimento do tribunal de origem acerca das premissas firmadas com base na análise do acervo fático-probatório dos autos atrai a incidência da Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.223.089/SE, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 11/11/2024, DJe de 13/11/2024.) Portanto, não há que se falar em inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Com efeito, no caso dos autos é fato incontroverso que a apelada recebeu boleto bancário fraudulento por meio de e-mail aparentemente oriundo da apelante, efetuando o pagamento na crença de estar quitando sua dívida junto à credora. Também é incontroverso que o valor pago foi destinado a terceiro estranho à relação negocial. Analisando os documentos juntados aos autos, verifica-se que o boleto fraudulento foi enviado pelo mesmo endereço de e-mail utilizado habitualmente pela apelante para comunicações com a apelada (), contendo referência expressa à Nota Fiscal nº 0009916 e apresentando dados bastante similares ao boleto original. (ID. 288231380) Logo, a alegação da apelante de que não enviou o boleto fraudulento não é suficiente para afastar sua responsabilidade, uma vez que a fraude ocorreu no âmbito de seu sistema de comunicação com os clientes, utilizando seu e-mail comercial oficial. O fato de o sistema de cobrança da apelante ter sido alvo de fraude por terceiros constitui fortuito interno, relacionado aos riscos da própria atividade empresarial desenvolvida, não sendo razoável transferir esse ônus para a apelada, que agiu de boa-fé ao efetuar o pagamento de documento que aparentava ser legítimo. A apelada, por sua vez, agiu com diligência compatível com o homem médio, não sendo razoável exigir que identificasse a fraude, considerando que o boleto continha dados corretos da transação e, como dito, foi recebido do canal oficial de comunicação da apelante. Vale destacar que a apelada, ao tomar conhecimento da fraude, registrou boletim de ocorrência e notificou extrajudicialmente a apelante, demonstrando sua boa-fé. (Id’s. 288231384 e 288231385) Em casos análogos, nesse sentido tem decidido este Sodalício: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. "GOLPE DO BOLETO FALSO". PAGAMENTO DE BOA-FÉ A TERCEIROS. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO BANCÁRIO. DESCONSTITUIÇÃO DA MORA. RESTITUIÇÃO DO BEM. CLÁUSULAS CONTRATUAIS. VALIDADE E ADEQUAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em Exame 1. Recurso de apelação interposto contra sentença que, em ação de busca e apreensão ajuizada pela instituição financeira, consolidou a posse e o domínio do veículo alienado fiduciariamente em favor da autora. II. Questão em Discussão 2. As questões em discussão consistem em verificar: (i) se o pagamento de parcelas de financiamento a terceiros, mediante fraude, descaracteriza a mora contratual; (ii) a existência de abusividade nas cláusulas contratuais firmadas entre as partes. III. Razões de Decidir 3. A fraude conhecida como "golpe do boleto falso" decorreu do uso de dados sensíveis do contrato, cuja proteção era de responsabilidade exclusiva da instituição financeira, caracterizando falha na prestação do serviço. 4. O pagamento realizado de boa-fé, induzido por informações contratuais verdadeiras e pela aparência de legitimidade do boleto, descaracteriza a mora do consumidor, conforme a Súmula 479 do STJ. 5. Determina-se a restituição imediata do bem ao Apelante. Caso o veículo tenha sido alienado, o banco deverá indenizar o apelante pelo valor correspondente na Tabela FIPE à época da apreensão. 6. As cláusulas contratuais foram pactuadas de acordo com os parâmetros legais e de mercado, observando a boa-fé objetiva e a transparência, não havendo abusividade ou excessiva onerosidade que justifique sua revisão. IV. Dispositivo e Tese 7. Recurso parcialmente provido. Tese de Julgamento: "1. O pagamento de parcelas de financiamento realizado de boa-fé a terceiro, mediante fraude, não caracteriza mora contratual quando a falha na segurança bancária é imputável à instituição financeira. 2. Não há abusividade em cláusulas contratuais que observem parâmetros legais, jurisprudenciais e de mercado, bem como os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual.” _____________________ Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 1012, §§ 1º, III e §3, I e II; CDC, art. 14; CC, art. 309; CPC, art. 85, §11. Jurisprudência relevante citada: TJMT, ApCiv 1031832-59.2022.8.11.0041; STJ, REsp 2.015.732/SP; TJMS, AI 1417843-80.2023.8.12.0000; TJSP, ApCiv 1008543-57.2022.8.26.0566; STJ, REsp 973827 RS 2007/0179072-3; STJ, REsp 1.251.331/RS; stj, Súmula 379 do STJ. (N.U 1033179-59.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/01/2025, Publicado no DJE 22/01/2025) DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E RECONHECIMENTO DE QUITAÇÃO DE CONTRATO. GOLPE DO BOLETO FALSO. INDÍCIOS DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. VALOR INDENIZATÓRIO MANTIDO. RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente a Ação Declaratória de Inexistência de Débito e Reconhecimento de Quitação do Contrato, cumulada com pedido de indenização por danos morais, condenando a instituição financeira ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais, à declaração de quitação do contrato e à baixa do gravame do veículo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) a necessidade de retificação do polo passivo em razão da incorporação da BV Financeira pelo Banco Votorantim; (ii) a configuração da responsabilidade civil da instituição financeira pelo golpe do boleto falso; (iii) a ocorrência e a quantificação do dano moral; e (iv) a adequação dos critérios de correção monetária e juros de mora. III. RAZÕES DE DECIDIR A retificação do polo passivo deve ser acolhida, pois comprovada a cisão da BV Financeira S.A. e sua incorporação pelo Banco Votorantim S.A., nos termos do Protocolo e Justificação de Cisão aprovado pelo Banco Central do Brasil. O fornecedor de serviços responde objetivamente pelos danos decorrentes de falha na prestação do serviço, conforme o art. 14 do CDC, sendo necessária a prova de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro para excluir sua responsabilidade. No caso, os elementos dos autos indicam que a fraude foi facilitada por falha na segurança das informações fornecidas pela instituição financeira, evidenciando o vazamento de dados internos. O golpe do boleto falso configura falha na prestação do serviço, pois o boleto utilizado continha informações específicas do contrato, acessíveis apenas às partes envolvidas. A alegação de culpa exclusiva da vítima não encontra amparo nos autos, uma vez que a apelada seguiu os procedimentos indicados pela empresa para quitação do contrato. O dano moral está configurado em razão da cobrança indevida, da ameaça de busca e apreensão do veículo e do abalo psicológico decorrente da situação. O valor de R$ 5.000,00 fixado na sentença respeita os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, considerando o caráter compensatório, punitivo e preventivo da indenização. Quanto à correção monetária e aos juros de mora, a adoção do INPC como índice de atualização reflete a prática usual em decisões judiciais e está de acordo com a realidade inflacionária. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso Parcialmente Provido. Tese de julgamento: O fornecedor de serviços responde objetivamente por falha na prestação do serviço, salvo prova de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme o art. 14 do CDC. O golpe do boleto falso caracteriza falha na prestação do serviço quando o boleto emitido contém informações restritas ao contrato e acessíveis apenas às partes envolvidas. O dano moral decorrente de cobrança indevida e ameaça de apreensão do veículo deve ser fixado de acordo com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, considerando suas funções compensatória, punitiva e preventiva. A correção monetária deve ser atualizada pelo INPC, e os juros de mora devem ser fixados em 1% ao mês a partir da citação, conforme definido na sentença. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 14 e 25; CC, arts. 186 e 927; CPC, art. 85, §2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1917237/TO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 13/12/2021; TJMT, AP 1005817-61.2019.8.11.0040, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 1º/3/2024. (N.U 1043434-81.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/02/2025, Publicado no DJE 11/02/2025) Logo, inexistindo qualquer desacerto na sentença recorrida imperiosa sua manutenção. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, via de consequência, majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, em razão do trabalho adicional realizado pelo patrono da requerida em grau recursal. É como voto. ata da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Processo nº 1013837-54.2023.8.11.0055

ID: 299923673

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1013837-54.2023.8.11.0055

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

AGROFORTE COMERCIO DE PRODUTOS AGRICOLAS LTDA

Acórdão

Advogados:

JOSE FABIO PANTOLFI FERRARINI

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