Resultados para "1013982-03.2021.8.26.0625" – Página 20 de 20

Processo nº 1013982-13.2025.8.11.0000

ID: 336142186

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013982-13.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

FLAVIA SALEM GONCALVES - ME

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

LUCAS HENRIQUE MULLER PIROVANI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013982-13.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Rescisão / Resolução, Imissão, Interven… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013982-13.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Rescisão / Resolução, Imissão, Intervenção de Terceiros] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [LUCAS HENRIQUE MULLER PIROVANI - CPF: 078.081.649-84 (ADVOGADO), FLAVIA SALEM GONCALVES - ME - CNPJ: 12.596.072/0001-22 (AGRAVANTE), MIRANTE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA - CNPJ: 46.499.028/0001-16 (AGRAVADO), IZAC WILLIAN LENZI CORREA - CPF: 010.848.921-38 (TERCEIRO INTERESSADO), JOSE INGENIEROS DE MELO - CPF: 922.312.098-53 (TERCEIRO INTERESSADO), LUCCA PIENARO PRADO ALENCAR DE MELO - CPF: 063.140.171-73 (TERCEIRO INTERESSADO), RAISA GLORIA CASSIMIRO - CPF: 036.655.391-70 (TERCEIRO INTERESSADO), GILMAR CARVALHO LIMA - CPF: 810.352.761-00 (TERCEIRO INTERESSADO), RAFAEL GALVAN - CPF: 903.679.281-91 (TERCEIRO INTERESSADO), AUGUSTO BARROS DE MACEDO - CPF: 825.428.641-87 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Processual Civil. Agravo de Instrumento. Embargos de Terceiro. Rejeitadas as Preliminares de Intempestividade, Ilegitimidade Ativa e Litisconsórcio Passivo Necessário. Decisão Mantida. Recurso Desprovido. I. Caso em Exame 1. Agravo de Instrumento interposto em virtude de decisão proferida nos autos de Embargos de Terceiro ajuizados com o objetivo de proteger a posse e a propriedade de imóveis objeto de imissão na posse determinada em processo do qual a Embargante não participou. A decisão agravada reconheceu a tempestividade da Ação, a legitimidade ativa da Embargante e a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário. II. Questão em Discussão 2. Há três questões em discussão: (i) definir se os Embargos de Terceiro foram opostos tempestivamente; (ii) estabelecer se a Embargante possui legitimidade ativa para ajuizar a Ação; (iii) determinar se há necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com terceiros envolvidos na cadeia dominial. III. Razões de Decidir 3. O prazo de cinco dias para oposição de Embargos de Terceiro, previsto no art. 675 do CPC, tem como termo inicial a ciência inequívoca do ato de constrição, não se confundindo com o mero acesso ao sistema eletrônico. A ciência somente se perfectibiliza com a formal intimação do esbulho, como ocorreu em 22 de abril de 2024. 4. O acesso do patrono da parte aos autos do processo originário, por si só, não caracteriza ciência inequívoca do ato constritivo, especialmente sem comprovação de leitura do conteúdo específico da decisão de imissão na posse. 5. A Embargante comprovou posse indireta e titularidade registral do imóvel atingido, mediante certidão de matrícula e contrato de arrendamento, o que basta para configurar sua legitimidade ativa, ainda que haja discussão sobre a higidez da cadeia dominial. 6. A existência de controvérsia sobre a origem do domínio não afasta, por si, a possibilidade de ajuizamento de embargos, cuja admissibilidade exige apenas demonstração de posse ou titularidade, não o julgamento de validade do título. 7. Não se exige litisconsórcio passivo necessário em Embargos de Terceiro, conforme o art. 677, § 4º, do CPC, sendo suficiente a citação do Autor do ato de constrição, que no caso é a Embargada. A responsabilização de terceiros deve ser discutida em via própria. IV. Dispositivo e Tese 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. O prazo para oposição dos Embargos de Terceiro conta-se da ciência inequívoca do ato de constrição, não se presumindo por simples acesso ao sistema eletrônico. 2. A legitimidade ativa em Embargos de Terceiro se configura com a demonstração de posse ou titularidade aparente do bem atingido. 3. O litisconsórcio passivo necessário não é exigido em Embargos de Terceiro, bastando a citação do sujeito responsável pelo ato de constrição.” _________ Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 675, 677, § 4º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp n. 2.283.371/MG, rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. 18.11.2024, DJEN de 29.11.2024. R E L A T Ó R I O RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 1013982-13.2025.8.11.0000 Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por Flávia Salem Gonçalves - ME. em virtude da decisão proferida pelo Juiz da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá nos autos dos Embargos de Terceiro Cível movidos por Mirante Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. O Juiz a quo rejeitou as preliminares suscitadas pela Embargada, ora Agravante, reconheceu a tempestividade dos Embargos de Terceiro, bem como a legitimidade ativa da parte Embargante/Agravada e a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com os demais envolvidos na ação principal. Em suas razões recursais, a Agravante sustenta a intempestividade dos Embargos de Terceiro, sob o argumento de que o patrono da Agravada teve ciência inequívoca do ato constritivo desde o dia 17 de abril de 2024, ao acessar os autos do processo originário, de modo que o prazo decadencial de cinco dias previsto no artigo 675 do CPC teria se encerrado em 24 de abril de 2024. Alega, ainda, a ilegitimidade ativa da parte Embargante, sob o fundamento de que a aquisição do imóvel decorreu de usucapião extrajudicial fraudulento, praticado por terceiros que jamais exerceram posse com animus domini, mas apenas como prepostos da empresa Agravante. Defende, ademais, a ilegitimidade passiva da Agravada, bem como a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com Gilmar Carvalho Lima e Rafael Galvan, que teriam figurado como protagonistas do vício dominial que contaminaria a cadeia aquisitiva do imóvel. Sustenta que os Embargos de Terceiro foram manejados com base em títulos inverídicos e arrendamento fictício, como forma de impedir o cumprimento de sentença regularmente transitada em julgado nos autos da Ação n. 1040451-46.2020.8.11.0041. Sob tais argumentos, pugna pelo provimento do recurso para que seja reconhecida a decadência dos embargos de terceiro, com a consequente extinção do processo sem resolução do mérito, ou, subsidiariamente, a decretação de sua ilegitimidade ativa e a necessidade de litisconsórcio passivo necessário. Contrarrazões no ID. 289907861. É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Ressai dos autos que Mirante Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. ajuizou Embargos de Terceiro com pedido de tutela de urgência em face de Flávia Salem Gonçalves - ME, com fundamento na aquisição de boa-fé de dois imóveis registrados nas matrículas n. 24.960 e 24.961 do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Chapada dos Guimarães/MT, totalizando a área de 101,9049 hectares. Aduziu em sua inicial que a primeira aquisição ocorreu em agosto de 2022, e a segunda, contígua à primeira, foi concretizada em setembro de 2022, ambas oriundas de negócios realizados com Rafael Galvan, que, por sua vez, adquirira parte da área de Gilmar Carvalho de Lima. Afirmou que após a aquisição dos imóveis, os arrendou a terceiro (David Rocha Alves) por meio de contrato celebrado em 02/01/2023. Alegou, ainda, que por volta de um ano após a aquisição e posse dos imóveis foi procurada por Pérsio Briante e por Flávia Salem Gonçalves, que se apresentaram como supostos proprietários da área correspondente à matrícula n. 24.961, com 6,0032 hectares, e afirmaram que em breve apresentariam a documentação comprobatória de sua alegada titularidade, o que, contudo, jamais foi efetivado. Ressaltou, inclusive, que a própria Sra. Flávia iniciou tratativas de recompra do referido imóvel, conforme comprova por ata notarial que registra troca de mensagens e áudios enviados via aplicativo WhatsApp à Sra. Adriana Kozoff Oliveira, representante da Mirante, nos quais reconhece a titularidade da empresa sobre o bem e manifesta intenção de formalizar novo negócio jurídico para a sua aquisição. Relatou que, em abril de 2024, foi surpreendida com a tentativa de cumprimento de decisão judicial proferida nos autos da Ação Ordinária n. 1040451-46.2020.8.11.0041, promovida por Flávia Salem Gonçalves Ltda., a qual resultou em imissão na posse em desfavor da arrendatária, sem que a atual proprietária, Mirante, tivesse sido parte do referido processo. Em decorrência dessa situação, a Embargante alegou ter sofrido esbulho possessório e manejou estes Embargos de Terceiro para proteção de sua posse e propriedade, sustentando ter adquirido os bens de forma regular, sem qualquer ciência de litígio anterior ou restrição na matrícula, uma vez que a averbação premonitória determinada judicialmente em 2020 jamais foi efetivada por ausência de indicação da matrícula correta pela parte Autora da Ação Ordinária n. 1040451-46.2020.8.11.0041. Destacou que a própria representante legal da Autora da referida Ação, Sra. Flávia Salem, negociou, em 2023, a recompra da área com representantes da Mirante, o que demonstra o reconhecimento da titularidade e posse da Embargante. Sob tais argumentos, a Embargante pleiteou a concessão de tutela de urgência para ser mantida na posse dos imóveis, bem como o reconhecimento da ilegitimidade da constrição imposta, reiterando a inexistência de má-fé e a nulidade dos atos de imissão em posse por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Os Embargos foram recebidos sem o efeito suspensivo (ID. 156890667 dos autos principais). Na Contestação, a Embargada, ora Agravante, sustentou que os Embargos de Terceiro seriam intempestivos, eis que o patrono da Embargante teve ciência inequívoca do ato constritivo em 17 de abril de 2024, data em que acessou os autos do processo originário, de modo que o prazo de quinze dias previsto no artigo 675, II, do Código de Processo Civil teria se iniciado naquele momento, tornando o protocolo realizado em 29 de abril de 2024 extemporâneo. Arguiu, ainda, a ilegitimidade ativa da Embargante, sob o fundamento de que a aquisição do imóvel decorreu de usucapião extrajudicial viciado, baseado em declarações inverídicas quanto ao exercício da posse, conduzido por Gilmar Carvalho de Lima, que teria atuado como simples preposto da empresa autora, sem animus domini. Assim, defendeu que a Embargante não teria posse legítima ou domínio apto a justificar a propositura da demanda. Ademais, a Embargada apontou a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com Gilmar Carvalho de Lima e Rafael Galvan, por entender que ambos teriam participado diretamente da fraude na origem da cadeia dominial do imóvel, sendo imprescindível sua inclusão para o deslinde da controvérsia, especialmente diante da reconvenção proposta. No mérito, a Embargada sustentou que a ordem judicial de imissão na posse foi proferida com fundamento em sentença homologatória transitada em julgado, sendo legítima sua execução, e que os Embargos de Terceiro visam, na verdade, rediscutir matéria já definitivamente decidida, em afronta à coisa julgada. O Juiz da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá rejeitou as preliminares suscitadas pela Embargada, ora Agravante, reconheceu a tempestividade dos Embargos de Terceiro, bem como a legitimidade ativa da parte Embargante/Agravada e a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com os demais envolvidos na ação principal. Na mesma decisão, o Julgador de primeiro grau acolheu o pedido formulado pela parte Reconvinte e determinou a inclusão de Gilmar Carvalho de Lima e Rafael Galvan no polo passivo da Reconvenção, bem como determinou a averbação da existência desta demanda nas matrículas n. 24.961, 24.960 e 24.720 do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Chapada dos Guimarães/MT, com o objetivo de resguardar o direito possessório discutido na ação e prevenir terceiros acerca da controvérsia jurídica sobre o domínio do imóvel. Inconformada, a Agravante sustenta a intempestividade dos Embargos de Terceiro, sob o argumento de que o patrono da Agravada teve ciência inequívoca do ato constritivo desde o dia 17 de abril de 2024, ao acessar os autos do processo originário, de modo que o prazo decadencial de cinco dias previsto no artigo 675 do CPC teria se encerrado em 24 de abril de 2024. Alega, ainda, a ilegitimidade ativa da parte Embargante, sob o fundamento de que a aquisição do imóvel decorreu de usucapião extrajudicial fraudulento, praticado por terceiros que jamais exerceram posse com animus domini, mas apenas como prepostos da empresa Agravante. Defende, ademais, a ilegitimidade passiva da Agravada, bem como a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com Gilmar Carvalho Lima e Rafael Galvan, que teriam figurado como protagonistas do vício dominial que contaminaria a cadeia aquisitiva do imóvel. Sustenta que os Embargos de Terceiro foram manejados com base em títulos inverídicos e arrendamento fictício, como forma de impedir o cumprimento de sentença regularmente transitada em julgado nos autos da Ação n. 1040451-46.2020.8.11.0041. Pois bem. Quanto à alegada intempestividade dos embargos de terceiro tem-se que não assiste razão à Agravante. Com efeito, o prazo decadencial de cinco dias estabelecido pelo art. 675 do CPC, ao tratar do cabimento dos Embargos de Terceiro, tem como termo inicial a ciência inequívoca do ato de constrição, o que, por óbvio, não se confunde com mera possibilidade abstrata de conhecimento jurídico mediante consulta aos autos públicos. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é clara ao distinguir o acesso teórico ao processo da efetiva ciência prática e real do esbulho, exigida como condição para fluência do prazo decadencial. O STJ, inclusive, vem decidindo reiteradamente que a ciência inequívoca não pode ser presumida pelo simples fato de os autos tramitarem eletronicamente ou por constarem em sistemas públicos, sendo necessário que o Embargante tenha sido efetivamente comunicado do ato constritivo que atingiu o bem de sua posse ou de sua propriedade, in verbis: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. AJUIZAMENTO APÓS 5 (CINCO) MESES DA ASSINATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. TEMPESTIVIDADE DOS EMBARGOS DE TERCEIRO. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA, EM NOVO JULGAMENTO. CONHECER DO AGRAVO E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Na hipótese em que o proprietário do bem objeto de constrição não é cientificado de nenhum ato executivo, o prazo para o ajuizamento dos embargos de terceiro é contado ou da turbação/esbulho ou da ciência inequívoca acerca da constrição judicial. Precedentes. 2. Agravo interno provido para, em novo julgamento, conhecer do agravo e dar provimento ao recurso especial. (STJ. AgInt no AREsp n. 2.283.371/MG, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 18/11/2024, DJEN de 29/11/2024). No caso, a decisão agravada acolheu de forma fundamentada a tese da Embargante de que a ciência do esbulho somente se consumou em 22 de abril de 2024, data em que o Oficial de Justiça, no cumprimento da ordem de imissão na posse, compareceu ao imóvel e comunicou formalmente a decisão ao arrendatário da Embargante, Sr. David Rocha Alves. O documento de intimação consta dos autos e foi validamente considerado pelo Juiz de primeiro grau como marco da ciência inequívoca, nos termos da norma processual. Não se trata aqui de mera estratégia argumentativa, mas de ato processual formal, certificado por agente do Poder Judiciário, o que confere presunção relativa de veracidade ao ato e, portanto, legitimidade ao marco temporal considerado. O argumento da Agravante de que o prazo deveria correr a partir de 17/04/2024, em razão de suposto acesso do patrono da Embargante ao sistema PJe, não encontra respaldo nem em prova robusta, nem em norma legal. Ainda que eventual acesso tenha sido realizado, esse fato, por si só, não comprova a existência de ciência do conteúdo específico da decisão de imissão, tampouco da afetação direta do imóvel em questão. Trata-se de presunção que não encontra respaldo na sistemática processual, especialmente diante da incerteza quanto ao conhecimento técnico e ao escopo efetivo de tal consulta. Portanto, o prazo de cinco dias, contado a partir de 22 de abril de 2024, findaria em 29 de abril de 2024, data exata do protocolo dos embargos. Não há, pois, que se falar em decadência, razão pela qual deve ser mantida a rejeição da preliminar de intempestividade. No que concerne à alegação de ilegitimidade ativa da Embargante, o que se extrai dos autos é justamente o contrário: a Embargante demonstrou, desde a inicial, que possui título dominial regularmente transcrito no registro de imóveis, além de exercer posse indireta por meio de contrato de arrendamento com terceiro. Ainda que haja controvérsia sobre a higidez da cadeia dominial, especialmente quanto à origem do título e à suposta fraude na usucapião extrajudicial que originou o domínio de Rafael Galvan, tais alegações não infirmam, de plano, a posse e a aparência de titularidade ostentadas pela Embargante. A jurisprudência e a doutrina são pacíficas ao reconhecer que, para efeitos de legitimidade ativa nos embargos de terceiro, basta que o demandante comprove posse ou domínio, ainda que aparente, sobre o bem atingido por constrição judicial proferida em processo do qual não participou. A verificação de eventual má-fé ou simulação, como alegado pela Agravante, demanda instrução probatória específica, que está sendo oportunamente promovida nos autos por meio da Reconvenção já apresentada. O processamento dos embargos, por sua vez, não depende do prévio reconhecimento da validade plena da cadeia dominial, mas sim da demonstração da existência de situação possessória ou de titularidade registral atingida por decisão judicial sem o devido contraditório. Ao revés, o indeferimento liminar dos Embargos de Terceiro com base na simples suspeita de irregularidade dominial configuraria indevido julgamento antecipado de mérito, vulnerando os princípios do contraditório, da ampla defesa e da segurança jurídica. Os documentos colacionados pela Embargante — certidão de matrícula, escritura pública, contrato de arrendamento e provas de ciência do esbulho — são suficientes para reconhecer sua legitimidade ativa no feito. Por fim, quanto à alegada ausência de litisconsórcio passivo necessário, não se sustenta a tese da Agravante de que Rafael Galvan e Gilmar Carvalho Lima deveriam necessariamente figurar no polo passivo desta demanda. O art. 677, §4º, do CPC é expresso ao dispor que, nos Embargos de Terceiro, será citado tão somente aquele que promoveu a constrição, ou seja, o embargado direto, que neste caso é a própria Flávia Salem Gonçalves - Me. O litisconsórcio com terceiros que participaram de fases anteriores da cadeia dominial é facultativo, jamais obrigatório, pois não são eles os autores do ato de esbulho ou constrição que motiva a ação. Eventual responsabilização de tais terceiros — seja pela invalidade da usucapião extrajudicial, seja pela alegada simulação ou má-fé — deve ser discutida na via própria, inclusive na reconvenção já manejada, que tem por objeto a nulidade dos atos registrais e a responsabilização de todos os envolvidos. Inexistindo vínculo processual direto entre Rafael e Gilmar com o ato de esbulho judicial (imissão na posse determinada em ação da qual não participaram), inexiste obrigatoriedade de sua inclusão nos Embargos. Portanto, diante de todos esses elementos, não há razões jurídicas para reformar a decisão agravada. Os Embargos de Terceiro foram propostos dentro do prazo legal, por parte legítima, com fundamentos suficientes e com citação válida da parte responsável pela constrição. A instrução processual já em curso permitirá o esclarecimento dos aspectos fáticos controvertidos, não cabendo ao Tribunal, nesta sede recursal de cognição limitada, substituir-se ao juízo de primeiro grau na análise aprofundada das provas. Com essas considerações, nego provimento ao Recurso e mantenho intacta a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1013982-13.2025.8.11.0000

ID: 336142191

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013982-13.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MIRANTE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA

Acórdão

Advogados:

AUGUSTO BARROS DE MACEDO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013982-13.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Rescisão / Resolução, Imissão, Interven… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013982-13.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Rescisão / Resolução, Imissão, Intervenção de Terceiros] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [LUCAS HENRIQUE MULLER PIROVANI - CPF: 078.081.649-84 (ADVOGADO), FLAVIA SALEM GONCALVES - ME - CNPJ: 12.596.072/0001-22 (AGRAVANTE), MIRANTE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA - CNPJ: 46.499.028/0001-16 (AGRAVADO), IZAC WILLIAN LENZI CORREA - CPF: 010.848.921-38 (TERCEIRO INTERESSADO), JOSE INGENIEROS DE MELO - CPF: 922.312.098-53 (TERCEIRO INTERESSADO), LUCCA PIENARO PRADO ALENCAR DE MELO - CPF: 063.140.171-73 (TERCEIRO INTERESSADO), RAISA GLORIA CASSIMIRO - CPF: 036.655.391-70 (TERCEIRO INTERESSADO), GILMAR CARVALHO LIMA - CPF: 810.352.761-00 (TERCEIRO INTERESSADO), RAFAEL GALVAN - CPF: 903.679.281-91 (TERCEIRO INTERESSADO), AUGUSTO BARROS DE MACEDO - CPF: 825.428.641-87 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Processual Civil. Agravo de Instrumento. Embargos de Terceiro. Rejeitadas as Preliminares de Intempestividade, Ilegitimidade Ativa e Litisconsórcio Passivo Necessário. Decisão Mantida. Recurso Desprovido. I. Caso em Exame 1. Agravo de Instrumento interposto em virtude de decisão proferida nos autos de Embargos de Terceiro ajuizados com o objetivo de proteger a posse e a propriedade de imóveis objeto de imissão na posse determinada em processo do qual a Embargante não participou. A decisão agravada reconheceu a tempestividade da Ação, a legitimidade ativa da Embargante e a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário. II. Questão em Discussão 2. Há três questões em discussão: (i) definir se os Embargos de Terceiro foram opostos tempestivamente; (ii) estabelecer se a Embargante possui legitimidade ativa para ajuizar a Ação; (iii) determinar se há necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com terceiros envolvidos na cadeia dominial. III. Razões de Decidir 3. O prazo de cinco dias para oposição de Embargos de Terceiro, previsto no art. 675 do CPC, tem como termo inicial a ciência inequívoca do ato de constrição, não se confundindo com o mero acesso ao sistema eletrônico. A ciência somente se perfectibiliza com a formal intimação do esbulho, como ocorreu em 22 de abril de 2024. 4. O acesso do patrono da parte aos autos do processo originário, por si só, não caracteriza ciência inequívoca do ato constritivo, especialmente sem comprovação de leitura do conteúdo específico da decisão de imissão na posse. 5. A Embargante comprovou posse indireta e titularidade registral do imóvel atingido, mediante certidão de matrícula e contrato de arrendamento, o que basta para configurar sua legitimidade ativa, ainda que haja discussão sobre a higidez da cadeia dominial. 6. A existência de controvérsia sobre a origem do domínio não afasta, por si, a possibilidade de ajuizamento de embargos, cuja admissibilidade exige apenas demonstração de posse ou titularidade, não o julgamento de validade do título. 7. Não se exige litisconsórcio passivo necessário em Embargos de Terceiro, conforme o art. 677, § 4º, do CPC, sendo suficiente a citação do Autor do ato de constrição, que no caso é a Embargada. A responsabilização de terceiros deve ser discutida em via própria. IV. Dispositivo e Tese 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. O prazo para oposição dos Embargos de Terceiro conta-se da ciência inequívoca do ato de constrição, não se presumindo por simples acesso ao sistema eletrônico. 2. A legitimidade ativa em Embargos de Terceiro se configura com a demonstração de posse ou titularidade aparente do bem atingido. 3. O litisconsórcio passivo necessário não é exigido em Embargos de Terceiro, bastando a citação do sujeito responsável pelo ato de constrição.” _________ Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 675, 677, § 4º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp n. 2.283.371/MG, rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. 18.11.2024, DJEN de 29.11.2024. R E L A T Ó R I O RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 1013982-13.2025.8.11.0000 Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento interposto por Flávia Salem Gonçalves - ME. em virtude da decisão proferida pelo Juiz da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá nos autos dos Embargos de Terceiro Cível movidos por Mirante Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. O Juiz a quo rejeitou as preliminares suscitadas pela Embargada, ora Agravante, reconheceu a tempestividade dos Embargos de Terceiro, bem como a legitimidade ativa da parte Embargante/Agravada e a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com os demais envolvidos na ação principal. Em suas razões recursais, a Agravante sustenta a intempestividade dos Embargos de Terceiro, sob o argumento de que o patrono da Agravada teve ciência inequívoca do ato constritivo desde o dia 17 de abril de 2024, ao acessar os autos do processo originário, de modo que o prazo decadencial de cinco dias previsto no artigo 675 do CPC teria se encerrado em 24 de abril de 2024. Alega, ainda, a ilegitimidade ativa da parte Embargante, sob o fundamento de que a aquisição do imóvel decorreu de usucapião extrajudicial fraudulento, praticado por terceiros que jamais exerceram posse com animus domini, mas apenas como prepostos da empresa Agravante. Defende, ademais, a ilegitimidade passiva da Agravada, bem como a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com Gilmar Carvalho Lima e Rafael Galvan, que teriam figurado como protagonistas do vício dominial que contaminaria a cadeia aquisitiva do imóvel. Sustenta que os Embargos de Terceiro foram manejados com base em títulos inverídicos e arrendamento fictício, como forma de impedir o cumprimento de sentença regularmente transitada em julgado nos autos da Ação n. 1040451-46.2020.8.11.0041. Sob tais argumentos, pugna pelo provimento do recurso para que seja reconhecida a decadência dos embargos de terceiro, com a consequente extinção do processo sem resolução do mérito, ou, subsidiariamente, a decretação de sua ilegitimidade ativa e a necessidade de litisconsórcio passivo necessário. Contrarrazões no ID. 289907861. É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Ressai dos autos que Mirante Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. ajuizou Embargos de Terceiro com pedido de tutela de urgência em face de Flávia Salem Gonçalves - ME, com fundamento na aquisição de boa-fé de dois imóveis registrados nas matrículas n. 24.960 e 24.961 do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Chapada dos Guimarães/MT, totalizando a área de 101,9049 hectares. Aduziu em sua inicial que a primeira aquisição ocorreu em agosto de 2022, e a segunda, contígua à primeira, foi concretizada em setembro de 2022, ambas oriundas de negócios realizados com Rafael Galvan, que, por sua vez, adquirira parte da área de Gilmar Carvalho de Lima. Afirmou que após a aquisição dos imóveis, os arrendou a terceiro (David Rocha Alves) por meio de contrato celebrado em 02/01/2023. Alegou, ainda, que por volta de um ano após a aquisição e posse dos imóveis foi procurada por Pérsio Briante e por Flávia Salem Gonçalves, que se apresentaram como supostos proprietários da área correspondente à matrícula n. 24.961, com 6,0032 hectares, e afirmaram que em breve apresentariam a documentação comprobatória de sua alegada titularidade, o que, contudo, jamais foi efetivado. Ressaltou, inclusive, que a própria Sra. Flávia iniciou tratativas de recompra do referido imóvel, conforme comprova por ata notarial que registra troca de mensagens e áudios enviados via aplicativo WhatsApp à Sra. Adriana Kozoff Oliveira, representante da Mirante, nos quais reconhece a titularidade da empresa sobre o bem e manifesta intenção de formalizar novo negócio jurídico para a sua aquisição. Relatou que, em abril de 2024, foi surpreendida com a tentativa de cumprimento de decisão judicial proferida nos autos da Ação Ordinária n. 1040451-46.2020.8.11.0041, promovida por Flávia Salem Gonçalves Ltda., a qual resultou em imissão na posse em desfavor da arrendatária, sem que a atual proprietária, Mirante, tivesse sido parte do referido processo. Em decorrência dessa situação, a Embargante alegou ter sofrido esbulho possessório e manejou estes Embargos de Terceiro para proteção de sua posse e propriedade, sustentando ter adquirido os bens de forma regular, sem qualquer ciência de litígio anterior ou restrição na matrícula, uma vez que a averbação premonitória determinada judicialmente em 2020 jamais foi efetivada por ausência de indicação da matrícula correta pela parte Autora da Ação Ordinária n. 1040451-46.2020.8.11.0041. Destacou que a própria representante legal da Autora da referida Ação, Sra. Flávia Salem, negociou, em 2023, a recompra da área com representantes da Mirante, o que demonstra o reconhecimento da titularidade e posse da Embargante. Sob tais argumentos, a Embargante pleiteou a concessão de tutela de urgência para ser mantida na posse dos imóveis, bem como o reconhecimento da ilegitimidade da constrição imposta, reiterando a inexistência de má-fé e a nulidade dos atos de imissão em posse por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Os Embargos foram recebidos sem o efeito suspensivo (ID. 156890667 dos autos principais). Na Contestação, a Embargada, ora Agravante, sustentou que os Embargos de Terceiro seriam intempestivos, eis que o patrono da Embargante teve ciência inequívoca do ato constritivo em 17 de abril de 2024, data em que acessou os autos do processo originário, de modo que o prazo de quinze dias previsto no artigo 675, II, do Código de Processo Civil teria se iniciado naquele momento, tornando o protocolo realizado em 29 de abril de 2024 extemporâneo. Arguiu, ainda, a ilegitimidade ativa da Embargante, sob o fundamento de que a aquisição do imóvel decorreu de usucapião extrajudicial viciado, baseado em declarações inverídicas quanto ao exercício da posse, conduzido por Gilmar Carvalho de Lima, que teria atuado como simples preposto da empresa autora, sem animus domini. Assim, defendeu que a Embargante não teria posse legítima ou domínio apto a justificar a propositura da demanda. Ademais, a Embargada apontou a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com Gilmar Carvalho de Lima e Rafael Galvan, por entender que ambos teriam participado diretamente da fraude na origem da cadeia dominial do imóvel, sendo imprescindível sua inclusão para o deslinde da controvérsia, especialmente diante da reconvenção proposta. No mérito, a Embargada sustentou que a ordem judicial de imissão na posse foi proferida com fundamento em sentença homologatória transitada em julgado, sendo legítima sua execução, e que os Embargos de Terceiro visam, na verdade, rediscutir matéria já definitivamente decidida, em afronta à coisa julgada. O Juiz da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá rejeitou as preliminares suscitadas pela Embargada, ora Agravante, reconheceu a tempestividade dos Embargos de Terceiro, bem como a legitimidade ativa da parte Embargante/Agravada e a desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com os demais envolvidos na ação principal. Na mesma decisão, o Julgador de primeiro grau acolheu o pedido formulado pela parte Reconvinte e determinou a inclusão de Gilmar Carvalho de Lima e Rafael Galvan no polo passivo da Reconvenção, bem como determinou a averbação da existência desta demanda nas matrículas n. 24.961, 24.960 e 24.720 do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Chapada dos Guimarães/MT, com o objetivo de resguardar o direito possessório discutido na ação e prevenir terceiros acerca da controvérsia jurídica sobre o domínio do imóvel. Inconformada, a Agravante sustenta a intempestividade dos Embargos de Terceiro, sob o argumento de que o patrono da Agravada teve ciência inequívoca do ato constritivo desde o dia 17 de abril de 2024, ao acessar os autos do processo originário, de modo que o prazo decadencial de cinco dias previsto no artigo 675 do CPC teria se encerrado em 24 de abril de 2024. Alega, ainda, a ilegitimidade ativa da parte Embargante, sob o fundamento de que a aquisição do imóvel decorreu de usucapião extrajudicial fraudulento, praticado por terceiros que jamais exerceram posse com animus domini, mas apenas como prepostos da empresa Agravante. Defende, ademais, a ilegitimidade passiva da Agravada, bem como a necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário com Gilmar Carvalho Lima e Rafael Galvan, que teriam figurado como protagonistas do vício dominial que contaminaria a cadeia aquisitiva do imóvel. Sustenta que os Embargos de Terceiro foram manejados com base em títulos inverídicos e arrendamento fictício, como forma de impedir o cumprimento de sentença regularmente transitada em julgado nos autos da Ação n. 1040451-46.2020.8.11.0041. Pois bem. Quanto à alegada intempestividade dos embargos de terceiro tem-se que não assiste razão à Agravante. Com efeito, o prazo decadencial de cinco dias estabelecido pelo art. 675 do CPC, ao tratar do cabimento dos Embargos de Terceiro, tem como termo inicial a ciência inequívoca do ato de constrição, o que, por óbvio, não se confunde com mera possibilidade abstrata de conhecimento jurídico mediante consulta aos autos públicos. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é clara ao distinguir o acesso teórico ao processo da efetiva ciência prática e real do esbulho, exigida como condição para fluência do prazo decadencial. O STJ, inclusive, vem decidindo reiteradamente que a ciência inequívoca não pode ser presumida pelo simples fato de os autos tramitarem eletronicamente ou por constarem em sistemas públicos, sendo necessário que o Embargante tenha sido efetivamente comunicado do ato constritivo que atingiu o bem de sua posse ou de sua propriedade, in verbis: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. AJUIZAMENTO APÓS 5 (CINCO) MESES DA ASSINATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL. TEMPESTIVIDADE DOS EMBARGOS DE TERCEIRO. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA, EM NOVO JULGAMENTO. CONHECER DO AGRAVO E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Na hipótese em que o proprietário do bem objeto de constrição não é cientificado de nenhum ato executivo, o prazo para o ajuizamento dos embargos de terceiro é contado ou da turbação/esbulho ou da ciência inequívoca acerca da constrição judicial. Precedentes. 2. Agravo interno provido para, em novo julgamento, conhecer do agravo e dar provimento ao recurso especial. (STJ. AgInt no AREsp n. 2.283.371/MG, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 18/11/2024, DJEN de 29/11/2024). No caso, a decisão agravada acolheu de forma fundamentada a tese da Embargante de que a ciência do esbulho somente se consumou em 22 de abril de 2024, data em que o Oficial de Justiça, no cumprimento da ordem de imissão na posse, compareceu ao imóvel e comunicou formalmente a decisão ao arrendatário da Embargante, Sr. David Rocha Alves. O documento de intimação consta dos autos e foi validamente considerado pelo Juiz de primeiro grau como marco da ciência inequívoca, nos termos da norma processual. Não se trata aqui de mera estratégia argumentativa, mas de ato processual formal, certificado por agente do Poder Judiciário, o que confere presunção relativa de veracidade ao ato e, portanto, legitimidade ao marco temporal considerado. O argumento da Agravante de que o prazo deveria correr a partir de 17/04/2024, em razão de suposto acesso do patrono da Embargante ao sistema PJe, não encontra respaldo nem em prova robusta, nem em norma legal. Ainda que eventual acesso tenha sido realizado, esse fato, por si só, não comprova a existência de ciência do conteúdo específico da decisão de imissão, tampouco da afetação direta do imóvel em questão. Trata-se de presunção que não encontra respaldo na sistemática processual, especialmente diante da incerteza quanto ao conhecimento técnico e ao escopo efetivo de tal consulta. Portanto, o prazo de cinco dias, contado a partir de 22 de abril de 2024, findaria em 29 de abril de 2024, data exata do protocolo dos embargos. Não há, pois, que se falar em decadência, razão pela qual deve ser mantida a rejeição da preliminar de intempestividade. No que concerne à alegação de ilegitimidade ativa da Embargante, o que se extrai dos autos é justamente o contrário: a Embargante demonstrou, desde a inicial, que possui título dominial regularmente transcrito no registro de imóveis, além de exercer posse indireta por meio de contrato de arrendamento com terceiro. Ainda que haja controvérsia sobre a higidez da cadeia dominial, especialmente quanto à origem do título e à suposta fraude na usucapião extrajudicial que originou o domínio de Rafael Galvan, tais alegações não infirmam, de plano, a posse e a aparência de titularidade ostentadas pela Embargante. A jurisprudência e a doutrina são pacíficas ao reconhecer que, para efeitos de legitimidade ativa nos embargos de terceiro, basta que o demandante comprove posse ou domínio, ainda que aparente, sobre o bem atingido por constrição judicial proferida em processo do qual não participou. A verificação de eventual má-fé ou simulação, como alegado pela Agravante, demanda instrução probatória específica, que está sendo oportunamente promovida nos autos por meio da Reconvenção já apresentada. O processamento dos embargos, por sua vez, não depende do prévio reconhecimento da validade plena da cadeia dominial, mas sim da demonstração da existência de situação possessória ou de titularidade registral atingida por decisão judicial sem o devido contraditório. Ao revés, o indeferimento liminar dos Embargos de Terceiro com base na simples suspeita de irregularidade dominial configuraria indevido julgamento antecipado de mérito, vulnerando os princípios do contraditório, da ampla defesa e da segurança jurídica. Os documentos colacionados pela Embargante — certidão de matrícula, escritura pública, contrato de arrendamento e provas de ciência do esbulho — são suficientes para reconhecer sua legitimidade ativa no feito. Por fim, quanto à alegada ausência de litisconsórcio passivo necessário, não se sustenta a tese da Agravante de que Rafael Galvan e Gilmar Carvalho Lima deveriam necessariamente figurar no polo passivo desta demanda. O art. 677, §4º, do CPC é expresso ao dispor que, nos Embargos de Terceiro, será citado tão somente aquele que promoveu a constrição, ou seja, o embargado direto, que neste caso é a própria Flávia Salem Gonçalves - Me. O litisconsórcio com terceiros que participaram de fases anteriores da cadeia dominial é facultativo, jamais obrigatório, pois não são eles os autores do ato de esbulho ou constrição que motiva a ação. Eventual responsabilização de tais terceiros — seja pela invalidade da usucapião extrajudicial, seja pela alegada simulação ou má-fé — deve ser discutida na via própria, inclusive na reconvenção já manejada, que tem por objeto a nulidade dos atos registrais e a responsabilização de todos os envolvidos. Inexistindo vínculo processual direto entre Rafael e Gilmar com o ato de esbulho judicial (imissão na posse determinada em ação da qual não participaram), inexiste obrigatoriedade de sua inclusão nos Embargos. Portanto, diante de todos esses elementos, não há razões jurídicas para reformar a decisão agravada. Os Embargos de Terceiro foram propostos dentro do prazo legal, por parte legítima, com fundamentos suficientes e com citação válida da parte responsável pela constrição. A instrução processual já em curso permitirá o esclarecimento dos aspectos fáticos controvertidos, não cabendo ao Tribunal, nesta sede recursal de cognição limitada, substituir-se ao juízo de primeiro grau na análise aprofundada das provas. Com essas considerações, nego provimento ao Recurso e mantenho intacta a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou o que procurava? Faça login para ver mais resultados e detalhes completos.

Fazer Login para Ver Mais

Alberico Ramos Cordeiro x Banco Master S/A

ID: 325621685

Tribunal: TJPE Órgão: Vara Única da Comarca de Catende Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0001343-79.2023.8.17.2490

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

ALBERICO RAMOS CORDEIRO

Polo Passivo:

BANCO MASTER S/A

Despacho_Intimação_Intimação (Outros)

Advogados:

GIOVANNA BASTOS SAMPAIO CORREIA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

HIGO ALBUQUERQUE DE PAULA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

MARIO DE MORAES TAVARES

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Vara Única da Comarca de Catende Pc Costa Azevedo, 120, Centro, CATENDE - PE - CEP: 54505-000 - F:(81) 36735978 Processo nº 0001343-79.2023.8.17.249… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Vara Única da Comarca de Catende Pc Costa Azevedo, 120, Centro, CATENDE - PE - CEP: 54505-000 - F:(81) 36735978 Processo nº 0001343-79.2023.8.17.2490 AUTOR(A): ALBERICO RAMOS CORDEIRO RÉU: BANCO MASTER S/A SENTENÇA Vistos, etc. Trata-se de ação de AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE QUANTIA PAGA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS EXTRAPATRIMONIAIS, movida por ALBÉRICO RAMOS CORDEIRO, em face de BANCO MASTER S.A, alegando, em síntese, que estão sendo efetivados descontos irregulares em seus vencimentos, referentes a contratos de empréstimo, que nunca firmou com o banco demandado. Juntou documentos pessoais e ficha financeira. Citado, o reu apresentou defesa arguindo preliminar de interesse de agir, impugnando o deferimento do pedido de justiça gratuita. No mérito, alegando, sucintamente, que o autor contratou os empréstimos e que, nos contratos, constam a assinatura do autor, que estava ciente de todas as condições dos empréstimos e concordou com todas as etapas. Por fim, que os contratos foram firmados por meio de biometria facial. Juntou documentos societários e cópias dos contratos. Houve replica. Sobre novas provas, a parte ré pugnou pela produção da prova pericial digital e pelo depoimento do autor. Este, por sua vez, pugnou pelo julgamento antecipado da lide. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. O processo comporta julgamento antecipado, na forma do disposto no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que não carece de produção de outras provas além das já apresentadas pelas partes. Inicialmente, rejeita-se a preliminar de falta de interesse de agir suscitada pelo requerido. Vale lembrar que o ordenamento jurídico não exige o esgotamento da via administrativa como pré-requisito para o ajuizamento da demanda que, no caso, era imprescindível para a solução da controvérsia, já que a autora alega que a negativação é indevida ante a falta de contratação, ao passo que o réu sustenta a validade do contrato. Há interesse de agir, já que os provimentos são necessários na medida em que a parte requerida apresenta resistência às pretensões; logo sem a intervenção judicial, não se poderá ser alcançado o que se pede. Os provimentos também são úteis, pois trarão benefícios à parte autora. Em razão da declaração de pobreza juntada aos autos como a inicial e demais documentos que a instruem, rejeito a preliminar de impugnação à justiça gratuita, mantendo o benefício autoral. Afastadas as preliminares, adentro ao mérito. Deixo claro que a demanda envolve nítida relação de consumo e seu mérito deve ser interpretado à luz do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o requerido é pessoa jurídica, isto é, instituição financeira, direcionada ao fornecimento de serviços a seu destinatário final (parte autora), nos termos dos artigos 2.º e 3.º do aludido diploma legal. Cabe, ainda, mencionar o enunciado da Súmula 297 do C. STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. De acordo com o que determina o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. Ato contínuo, “(...) § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”. Não se pode olvidar também do enunciado da Súmula 479 do C. STJ: As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. A demanda é improcedente, pelos fundamentos a seguir expostos: A autora ajuizou esta demanda objetivando ver a condenação do demandado em danos extrapatrimoniais e em restituição em dobro dos descontos indevidos efetivados em seus vencimentos. In casu, a parte autora negou a existência de qualquer relação jurídica com a instituição financeira ré, isto é, afirmou que os descontos em seus vencimentos ocorreram sem que houvesse manifestação de sua vontade. Então, passou a ser ônus dela, instituição financeira ré, a prova da existência de negócio válido, nos termos do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil. E desse ônus, o réu se desincumbiu. Exponho. O Banco réu instruiu sua contestação, dentre outros documentos, com os contratos virtuais e documento pessoal do autor utilizado quando da contratação (ID’s 176398667 e 176398665). Nesse ponto, convém salientar que em tais documentos há informações claras e adequadas acerca da natureza do serviço contratado, com autorização para averbação no benefício previdenciário. Frise-se que nas contratações por meio eletrônico, como as combatidas nos presentes autos, faz-se necessário o envio de foto (ID’s 176398664 e 176398663), que foi comparada com a foto do RG do autor (nos mesmos ID’s), evitando-se, assim, a ocorrência de fraude. A propósito, é a jurisprudência dos nossos Tribunais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, senão, confira-se: Ação declaratória de inexistência de débito c/c danos materiais e morais. Empréstimo consignado. Contrato eletrônico. Insurgência da autora contra descontos no seu benefício previdenciário com base em empréstimo que não contratou. Sentença de improcedência. Pretensão de reforma. Descabimento. Ausência de verossimilhança das alegações. Comprovação da relação jurídica entre as partes. Apresentação do contrato eletrônico, acompanhado de documento pessoal e selfie, com geolocalização que coincide com o endereço residencial indicado na inicial. Demonstração da regularidade do empréstimo e dos descontos. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1023676-58.2023.8.26.0032 Araçatuba, Relator: Simões de Almeida, Data de Julgamento: 19/06/2024, 13ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/06/2024) APELAÇÃO CÍVEL. Contrato bancário. Ação Declaratória cumulada com obrigação de fazer e reparação por danos materiais e morais. Negativa de contratação. Relação de consumo. Banco que provou que o contrato em questão foi celebrado por meio eletrônico e destinado a repactuação de mútuo anterior não impugnado. Prova da transferência bancária pertinente ao troco realizada na conta da consumidora. Ação julgada improcedente. Sentença confirmada, exceto na sanção imposta, que ora se revoga. - RECURSO PROVIDO EM PARTE. (Apelação Cível 1000648-75.2021.8.26.0438, TJSP, Rel. Des. Edgard Rosa; 22ª Câmara de Direito Privado; julgado em 18/08/2021, grifei) APELAÇÃO Ação declaratória cumulada com pedido indenizatório Desconto em benefício previdenciário Pedidos iniciais julgados improcedentes Pleito de Reforma Impossibilidade Alegação de erro - Instituição requerida que, no entanto, desincumbiu-se do ônus de comprovar a existência de fato impeditivo do direito da requerente (artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil) AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – ASSINATURA DE CONTRATO POR MEIO ELETRÔNICO – VALIDADE - Alegação de inexistência de débito e negativação indevida nos órgãos de proteção ao crédito – Ausência de negativação – Legitimidade da cobrança que restou comprovada mediante os documentos apresentados pela ré – Serviço de transmissão "on line" de filmes e séries de televisão – Contrato celebrado por meio eletrônico, cuja cobrança das parcelas foi autorizada pelo consumidor ao informar seus dados bancários – Documentos que comprovam a contratação e a utilização dos serviços - Sentença de improcedência mantida – RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP 10139829320168260005 SP 1013982-93.2016.8.26.0005, Relator: Sérgio Shimura, Data de Julgamento: 21/02/2018, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/02/2018) AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. MÚTUO. CONTRATO ELETRÔNICO. ASSINATURA DIGITAL. FORÇA EXECUTIVA. PRECEDENTE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Esta Corte Superior possui jurisprudência no sentido de que, diante da nova realidade comercial, em que se verifica elevado grau de relações virtuais, é possível reconhecer a força executiva de contratos assinados eletronicamente, porquanto a assinatura eletrônica atesta a autenticidade do documento, certificando que o contrato foi efetivamente assinado pelo usuário daquela assinatura ( REsp 1.495.920/DF, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 15/5/2018, DJe 7/6/2018). 2. Havendo pactuação por meio de assinatura digital em contrato eletrônico, certificado por terceiro desinteressado (autoridade certificadora), é possível reconhecer a executividade do contrato. 3. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1978859 DF 2021/0402058-7, Data de Julgamento: 23/05/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/05/2022) Vale dizer, a parte autora assinou eletronicamente os contratos objetos dos autos. Nas oportunidades nas quais foram apuradas a sua geolocalização, "LATITUDE e LONGITUDE " (ID’s 189144685, 176398664 e 176398663), ela se encontrava na cidade de Catende e Palmares, respectivamente, no momento da contratação, conforme se extrai da pesquisa no https://www.google.com.br/maps/place/8%C2%B041'31.8%22S+35%C2%B043'15.7%22W/@-8.6921562,-35.7235974,17z/data=!3m1!4b1!4m4!3m3!8m2!3d-8.6921615!4d-35.7210225!5m1!1e1?hl=pt-BR&entry=ttu&g_ep=EgoyMDI1MDUyNy4wIKXMDSoJLDEwMjExNDU1SAFQAw%3D%3D, e https://www.google.com.br/maps/place/8%C2%B041'09.2%22S+35%C2%B035'35.7%22W/@-8.6858808,-35.5958261,17z/data=!3m1!4b1!4m4!3m3!8m2!3d-8.6858861!4d-35.5932512!5m1!1e1?hl=pt-BR&entry=ttu&g_ep=EgoyMDI1MDUyNy4wIKXMDSoJLDEwMjExNDU1SAFQAw%3D%3D Desse modo, percebe-se que o réu se desincumbiu do ônus probatório que lhe cabia, posto que comprovou que o autor aderiu aos contratos de Crédito Consignado. Ademais, houve a disponibilização dos valores ao autor, fato incontroverso, vez que foram realizadas transferências, através de TED’s (176398662) para conta do autor no Banco do Brasil S/A, agência Catende. Deste modo, não se vislumbra quaisquer irregularidades na contratação firmada entre as partes. Em decorrência, inexiste ato ilícito do requerido a dar ensejo a indenização por danos morais. A improcedência se impõe. Quanto às demais teses: “O magistrado não está obrigado a abordar todas as questões levantadas pelas partes, quando já encontrou motivo suficiente ao desfecho que vem proclamar” (Apelação nº. 17942-4/2, 5ª Câmara de Direito Privado, Relator Des Ivan Sartori). Ante ao exposto, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos contidos na inicial e revogo liminar deferida, se houver, e assim o faço na forma do art. 487, I, CPC. Pelo princípio da causalidade (artigo 85, caput do Código de Processo Civil), condeno o vencido no pagamento de custas e despesas processuais (artigo 84 do Código de Processo Civil), além de honorários advocatícios que fixo, considerados os parâmetros do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil, em 10% do valor da causa, incidindo correção monetária, nos termos da súmula 14 do STJ a partir do ajuizamento da ação e juros moratórios, nos termos do artigo 85, § 16 do Código de Processo Civil, a partir da data do trânsito em julgado da sentença. Ante a concessão do benefício da gratuidade de justiça e limitado aos atos para os quais concedida (artigo 98, § 5º do CPC), as obrigações do vencido ficam sob condição suspensiva de exigibilidade pelos 05 anos seguintes, contados do trânsito em julgado desta sentença, nos termos do artigo 98, § 3º do Código de Processo, não compreendida na suspensão de exigibilidade eventuais multas processuais que lhe foram impostas. P.I.C. Havendo recurso de apelação, VISTA a parte contraria e, após, REMETA-SE ao E. TJPE. Transitada em julgado, ARQUIVEM-SE os autos. CATENDE, 29 de maio de 2025 PAULO RICARDO CASSARO DOS SANTOS Juiz de Direito em substituição

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Estado De São Paulo x José Carlos Bedran

ID: 333131404

Tribunal: TJSP Órgão: Processamento 4º Grupo - 8ª Câmara Direito Público - Praça Almeida Jr., 72 - 1º andar, sala 12 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 3009919-88.2025.8.26.0000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

ESTADO DE SãO PAULO

Polo Passivo:

JOSé CARLOS BEDRAN

Despacho

Advogados:

GLEISON MAZONI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

VINICIUS TEIXEIRA PEREIRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

MARINA GRISANTI REIS MEJIAS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

DESPACHO Nº 3009919-88.2025.8.26.0000 - Processo Digital. Petições para juntada devem ser apresentadas exclusivamente por meio eletrônico, nos termos do artigo 7º da Res. 551/2011 - Agravo de Inst… DESPACHO Nº 3009919-88.2025.8.26.0000 - Processo Digital. Petições para juntada devem ser apresentadas exclusivamente por meio eletrônico, nos termos do artigo 7º da Res. 551/2011 - Agravo de Instrumento - São Paulo - Agravante: Estado de São Paulo - Agravado: José Carlos Bedran - Interessado: Diretor do Departamento de Administração e Planejamento da Polícia Civil do Estado de São Paulo - Agravo de Instrumento nº 3009919-88.2025.8.26.0000 Comarca de São Paulo Agravante: Fazenda Pública do Estado de São Paulo Agravado: José Carlos Bedran Vistos. Trata-se de agravo de instrumento interposto pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo contra a r. decisão que deferiu a liminar no mandado de segurança nº 1063451-46.2025.8.26.005, a fim de determinar a suspensão imediata das exigências editalícias e de chamamento ou convocação ou posse do concurso ML01/2023 baseadas no art. 44, II, da Lei Complementar nº 207/1979, determinando-se à autoridade impetrada que assegure e mantenha a participação da parte impetrante nos procedimentos de posse e exercício, bem como de frequência no Curso de Formação Técnico-Profissional da ACADEPOL, sem a proibição de acumulação de cargos ou empregos e sem a exigência de desvinculação da atividade que atualmente exerce, ficando a análise da compatibilidade de horários para momento posterior à sua designação para uma unidade de serviço médico-legal, até ulterior deliberação deste Juízo. A agravante aduz, em suma, que: a) Dispõe a Lei Federal n.º 12.016/09: Art. 7.º. §2º Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. No caso dos autos, a liminar concedida permitirá a cumulação de dois cargos de médico, bem como a percepção dos vencimentos respectivos. Propiciou, assim, pagamento de qualquer natureza ao servidor como também a extensão de vantagens que seriam cabíveis somente àqueles aos quais o exercício concomitante de dois cargos é legalmente permitido. Nessa linha de interpretação, restam configuradas, no caso em exame, duas das hipóteses que ensejam a não concessão de liminar no presente caso, bem como delineado está que o presente recurso há que ser recebido no efeito suspensivo; b) De outro turno, o dispositivo legal acima proíbe a simples reclassificação de funcionários por decisão liminar. Ora, se a lei veda a reclassificação, como admitir que posse de funcionário por força de liminar? Se a lei proíbe o menos (reclassificação), evidentemente não se pode fazer o mais (dar posse); c) À primeira vista, poder-se-ia dizer que permitido seria ao autor exercer a sua função nas duas instituições médicas, posto que, consoante afirmado na exordial, haveria a comprovação posterior da compatibilidade de horários e o autor enquadra-se na condição de profissional de saúde. Contudo, a correta interpretação do mandamento constitucional não autoriza extrair a conclusão de que as ressalvas à proibição de acúmulo de cargos públicos atribuiria, aos profissionais ali referidos, direito subjetivo à acumulação (...). A limitação se deve aos riscos à saúde em que se acham expostos esses profissionais da saúde, principalmente ocupante de cargo de médico legista, em razão da própria natureza da atividade que desempenham; d) E, no caso tratado, o impetrante quer pertencer a categoria especial de médico com profissão regulamentada, em cargo público e vinculado à Polícia Civil, sujeito à legislação própria que, de forma lícita, expressamente proíbe o exercício de outra atividade remunerada, senão quando relacionadas ao ensino e à difusão da cultura (art. 44 da lei Complementar nº 207/79, alterada pela Lei Complementar nº 922/02); e) Por fim, deve-se ressaltar a ausência do requisito da compatibilidade de horários previsto no dispositivo constitucional, desde que a disponibilidade de 40 (quarenta) horas semanais a qualquer período do dia, imprescindível para a atividade do Médico Legista, não se coaduna com a carga dos vínculos existentes, o que, repita-se, evidencia a inconstitucionalidade da acumulação de cargos no caso em exame e a consequente violação à dispositivo constitucional. Requer - a atribuição de EFEITO SUSPENSIVO, ao presente Agravo de Instrumento, revogando-se a liminar concedida, até o julgamento deste recurso; - o PROVIMENTO do presente AGRAVO DE INSTRUMENTO, reformando-se a r. decisão agravada, para revogar definitivamente a liminar concedida, como medida de direito que se impõe. É o relatório. Consta dos autos que o agravado foi aprovado em concurso público para o cargo de Médico Legista, mas pode ter a posse negada diante da alegada vedação à acumulação deste cargo com outro cargo de médico. Pois bem. A concessão da medida liminar requerida, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, demanda a demonstração da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, o que, na hipótese dos autos, se verifica. O perigo de dano resta evidente, na medida em que o agravado pode ter a posse negada e pode vir a ser impedido de assumir o cargo público para o qual foi aprovado após regular concurso público. De outro lado, a probabilidade do direito também se mostra presente, tendo em vista que a Constituição Federal permite, expressamente, a acumulação remunerada de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas, desde que a haja compatibilidade de horários (art. 37, XVI, c). A necessária compatibilidade de horários, por seu turno, deve ser apurada após a posse do candidato aprovado, momento em que, depois de divulgada a designação de sua lotação e horário de trabalho, será possível aferir a possibilidade de compatibilização das jornadas. Frise-se, ainda, que, caso não seja possível a acumulação, terá o direito de optar por um dos dois cargos. Observa-se que a liminar concedida pelo juízo a quo não determina pagamento de qualquer natureza, ao contrário do alegado pela FESP, mas sim o cumprimento do quanto determinado na Constituição Federal sobre a acumulação remunerada de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde. Além disso, este E. Tribunal de Justiça tem se posicionado no sentido de que a vedação do art. 44, III, da LCE nº 207/79 não se aplica aos médicos legistas, porquanto a Superintendência da Polícia Técnico-Científica, regulamentada pela LCE nº 756/94, desvinculou seus integrantes dos quadros da polícia civil, de modo que os médicos legistas não constituem mais categoria da classe policial civil, embora vinculados à Secretaria de Segurança Pública. Nesse sentido: Apelação cível Mandado de segurança Médicos da rede pública Aprovação em concurso público para provimento de cargo de médico legista Compatibilidade de horários Direito líquido e certo à posse no cargo A Superintendência da Polícia Técnico-Científica, regulamentada pela LCE nº 756/94, desvinculou os seus integrantes dos quadros da polícia civil, dando-lhes atribuições específicas, de sorte que os médicos legistas não constituem mais categoria da classe policial civil, não obstante estarem vinculados à Secretaria de Segurança Pública. R. Sentença mantida. Recurso desprovido. (Apelação nº 1014049-11.2016.8.26.0053, Relator Desembargador Sidney Romano dos Reis, 6ª Câmara de Direito Público, j. 29.05.2017). CUMULAÇÃO DE CARGOS. Médico Legista e Perito do IMESC. Indeferimento da inscrição para cadastramento junto ao IMESC. Art. 44 da LCE nº 207/79. LCE nº 756/94. DE nº 42.847/98. Liminar negada. 1. Bom direito. A Superintendência da Polícia Técnico-Científica, instituída pela LCE nº 756/94, e regulamentada pelo DE nº 42.847/98, desvincula seus integrantes dos quadros da Polícia Civil, não se aplicando aos médicos legistas as restrições impostas pelo art. 44, I e II da LCE nº 207/79. Entendimento esposado pela Seção de Direito Público. Permissão constitucional preceituada no art. 37, XVI, "c". Atestado de horário de trabalho. Item 7.4 do Edital nº 2/2014 do IMESC. Presença do bom direito. 3. Perigo de dano. O perigo de dano decorre do chamamento de outros médicos cadastrados para a mesma especialidade desempenhada pela agravante, esgotando o número de vagas e do prejuízo financeiro caso a autora cumpra os demais requisitos exigidos pelo IMESC. Agravo provido para conceder a liminar. (Agravo de Instrumento nº 20966-34.2016.8.26.0000, Relator Desembargador Torres de Carvalho, 10ª Câmara de Direito Público, j. 13.06.2016). AGRAVO DE INSTRUMENTO Concurso Público para o cargo de médico legista Mandado de segurança Liminar deferida para o imediato empossamento. Admissibilidade Possibilidade, em tese, de cumulação de dois cargos de médico, desde que os horários sejam compatíveis Inteligência do art. 37, XVI, "b", da CF Presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora Recurso desprovido. (Agravo de Instrumento nº 2026695-06.2013.8.26.0000, Relatora Desembargadora Silvia Meirelles, 6ª Câmara de Direito Público, j. 17.02.2014). Mandado de Segurança Acúmulo de Cargos Públicos Médico legista e cargo privativo de médico Art. 37, XVI, b da Constituição Federal Acúmulo possível, ressalvada a compatibilidade de horários Segurança concedida. (Apelação nº 1014128-87.2016.8.26.0053, Relator Desembargador José Luiz Gavião de Almeida, 3ª Câmara de Direito Público, j. 23.05.2017). APELAÇÃO CÍVEL MANDADO DE SEGURANÇA ATO ADMINISTRATIVO CUMULAÇÃO DE CARGOS. Direito líquido e certo Violação Aprovação em concurso público para o cargo de médico legista Cumulação de cargos privativos de profissionais da saúde permitida desde que observada a compatibilidade de horários (artigo 37, inciso XVI, alínea "c" da Constituição da República) Ato administrativo que obriga a rescisão contratual sob argumentos insubsistentes Mera alegação de transgressão administrativa Não demonstrada a incompatibilidade de horários que justifique a exigibilidade do rompimento do vínculo de emprego. Recurso desprovido. (Apelação nº 1013982-46.2016.8.26.0053, Relatora Desembargadora Cristina Cotrofe, 8ª Câmara de Direito Público, j. 07.04.2017). Mandado de segurança. Médicos legistas. Pleito de inscrição como Peritos junto ao IMESC indeferido administrativamente. Impossibilidade. Vedação à acumulação de cargos públicos prevista na LCE 207/79 (Lei Orgânica da Polícia de São Paulo) que conflita com o disposto na CF/88. Inaplicabilidade, ademais, aos médicos legistas. LCE 756/94, regulamentada pelo Decreto Estadual 42.847/1998 que determinou a subordinação direta da Superintendência da Polícia Técnico-Científica ao Secretário da Segurança Pública. Sentença concessiva da segurança. Recurso não provido. (Apelação nº 1009262-70.2015.8.26.0053, Relator Desembargador Carlos Violante, 2ª Câmara de Direito Público, j. 14.03.2017). MANDADO DE SEGURANÇA Cadastramento no IMESC Médico legista Acumulação de funções Possibilidade prevista no art. 37, inc. XVI da CF Lei Completar Estadual que não pode vedar situação permitida na CF Médicos legistas não equiparados a policiais civis Sentença concessiva da ordem, confirmada Recurso de apelação e reexame necessário, desprovidos. (Apelação / Reexame Necessário nº 1017099-45.2016.8.26.0053, Relator Desembargador J. M. Ribeiro de Paula, 12ª Câmara de Direito Público, j. 16.02.2017). 1- Assim, INDEFIRO A CONCESSÃO DO EFEITO SUSPENSIVO, uma vez ausentes os requisitos do artigo 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil. Apesar dos fatos e fundamentos de direito apresentados, não vislumbro, por ora, relevante fundamentação ou risco iminente de lesão grave ou de difícil reparação que justifique a concessão da medida enquanto se aguarda a solução final deste recurso, o que não exclui a possibilidade de modificação do decisum, quando do julgamento deste recurso. 2- Intime-se o agravado, para apresentar contraminuta, no prazo legal. 3- Após, retornem conclusos para julgamento virtual. Int. São Paulo, 21 de julho de 2025. ANTONIO CELSO FARIA Relator - Magistrado(a) Antonio Celso Faria - Advs: Marina Grisanti Reis Mejias (OAB: 139753/SP) - Vinicius Teixeira Pereira (OAB: 285497/SP) - Gleison Mazoni (OAB: 286155/SP) - 1° andar

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1013982-35.2024.4.01.3500

ID: 283494420

Tribunal: TRF1 Órgão: 6ª Vara Federal Cível da SJGO Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1013982-35.2024.4.01.3500

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM GOIANIA

Sentença Tipo A

PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL 6ª Vara da SJGO PROCESSO: 1013982-35.2024.4.01.3500 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: REGIA COMERCIO DE INFORMATICA LTDA IMPETRADO: UNIAO FEDERAL… PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL 6ª Vara da SJGO PROCESSO: 1013982-35.2024.4.01.3500 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: REGIA COMERCIO DE INFORMATICA LTDA IMPETRADO: UNIAO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM GOIANIA SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de ação mandamental com pedido de liminar impetrada por REGIA COMÉRCIO DE INFORMÁTICA LTDA. contra ato coator do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM GOIANIA, objetivando reconhecer a inexistência de relação jurídico-tributária que o obrigue a recolhimento de PIS e COFINS com a inclusão de ICMS-DIFAL nas respectivas bases de cálculo, bem como assegurar o direito de compensação desses valores indevidamente recolhidos nos últimos 5 (cinco) anos, atualizados pela SELIC. Inicial instruída com documentos. A União requer seu ingresso no feito. Informação prestada pela autoridade impetrada, pugnando pela denegação da segurança. O MPF não se manifesta no tocante ao mérito. É o relatório. II – FUNDAMENTAÇÃO O processo comporta julgamento no estado em que se encontra (CPC, art. 355, I). Cinge-se a controvérsia à possibilidade ou não da exclusão do ICMS–DIFAL da base de cálculo do PIS e da COFINS e, por consequência, seja reconhecida a existência de créditos decorrentes dos pagamentos efetuados indevidamente. Exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 574.706/PR, sob a sistemática de repercussão geral, firmou a compreensão de que o valor arrecadado, a título de ICMS, não se incorpora ao patrimônio do contribuinte e, dessa forma, não pode integrar as bases de cálculo da contribuição a PIS e da COFINS, que são destinadas ao financiamento da seguridade social. O acórdão do aludido paradigma restou assim ementado: “RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em determinado momento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS (...).” (STF, Tribunal Pleno, RE 574706/PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/03/2017, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-223, Divulg 29/09/2017, Public 02/10/2017) (grifamos). Ainda, da análise do voto da eminente relatora, Ministra Carmen Lúcia, extrai-se que: “(...) o regime da não cumulatividade impõe concluir, embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não pode ele compor a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS. Enfatize-se que o ICMS incide sobre todo o valor da operação, pelo que o regime de compensação importa na circunstância de, em algum momento da cadeia de operações, somente haver saldo a pagar do tributo se a venda for realizada em montante superior ao da aquisição e na medida dessa mais valia, ou seja, é indeterminável até se efetivar a operação, afastando-se, pois, da composição do custo, devendo ser excluído da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS (...).” A tese de repercussão geral fixada foi a de que "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS". Ressalta-se, por oportuno, que esse entendimento se aplica inclusive ao período posterior às alterações promovidas pela Lei n.º 12.973/14, a qual, em obediência ao art. 97 da CF, foi o objeto da Arguição de Inconstitucionalidade n.º 5051557-64.2015.404.0000, em que restou firmada a orientação no sentido de que "ainda que as supervenientes mudanças legislativas, ocorridas com a conversão da Medida Provisória nº 627/2013 na Lei nº 12.973/2014, dando nova redação aos dispositivos legais questionados nos presentes autos (artigo 3º, caput, da Lei nº 9.718/1998, artigo 1º, § 1º, da Lei nº 10.637/2002 e artigo 1º, § 1º, da Lei nº 10.833/2003), não tenham integrado a pretensão recursal inicial, certo que tais mudanças foram levadas em conta em diversas passagens quando do julgamento da tese ocorrido em março de 2017, posterior, portanto, ao advento da lei nova". Em relação ao valor a ser efetivamente excluído da base de cálculo, impende ressaltar que se trata do valor destacado das notas fiscais, conforme entendem as turmas deste Tribunal, especializadas em Direito Tributário (TRF4, AG 5012378-50.2020.4.04.0000, 2ª Turma, Rel. Des. Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, juntado aos autos em 31/03/2020). De se concluir, então, que o ICMS destacado nas notas fiscais não deve compor a base de cálculo da COFINS e da contribuição ao PIS, quer se considere o faturamento (art. 195, inc. I, da CF - redação original) ou a receita (art. 195, I, "b" - redação dada pela EC nº 20/98). Essa conclusão também se aplica no período de vigência das Leis 10.637/02 e 10.833/03 (regime não cumulativo) e até mesmo da Lei nº 12.973/14. Exclusão do ICMS-DIFAL (Diferencial de Alíquota) da base de cálculo do PIS/COFINS. A Constituição Federal, em seu art. 155, § 2º, VIII, “b”, previu que o regime Diferencial de Alíquotas (DIFAL) tanto para mercadorias quanto para serviços sujeitos ao ICMS. Trata-se da diferença entre as alíquotas interna e interestadual de ICMS, cobradas nas vendas interestaduais de bens ou serviços destinados à consumidor final (contribuinte ou não do ICMS). Transcrevo: “(...) Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (...) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...) VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) (Produção de efeito) (...) VIII- a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) (Produção de efeito) a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) (...).” Vale dizer então, que o fato gerador do DIFAL do ICMS ocorre nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, sendo que a responsabilidade pelo recolhimento será devida: a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; ou b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto. Trata-se, portanto, de sistemática de arrecadação que busca equilibrar a cobrança do ICMS entre os diversos estados, mas que ao final é recolhida pelo contribuinte aos cofres públicos e, “Assim como o ICMS cobrado nas operações internas, também o diferencial de alíquota do ICMS cobrado nas operações interestaduais apenas transita pela contabilidade da empresa até ser recolhido aos cofres estatais, razão pela qual deve ser excluído da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS” (TRF4, 2ª Turma, 5003278-02.2020.4.04.7201, Rel. Alexandre Rossato da Silva Ávila, juntado aos autos em 22/07/2020). Nesse sentido, os precedentes: “TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EXCLUSÃO DO ICMS PRÓPRIO E DO ICMS-DIFAL DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. TEMA 69 DO STF. ICMS-ST NA BASE DE CÁLCULO DE PIS E COFINS. MERCADORIAS ADQUIRIDAS PELO SUBSTITUÍDO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme estabelecido pelo STF, no Tema 69, "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS" (Recurso Extraordinário com repercussão geral nº 574.706), haja vista não consubstanciar receita. 2. Assim sendo, o ICMS não deve compor a base de cálculo da COFINS e da contribuição ao PIS, quer se considere o faturamento (art. 195, inc. I, da CF - redação original) ou a receita (art. 195, I,"b" - redação dada pela EC nº 20/98), inclusive no período de vigência das Leis 10.637/02 e 10.833/03 (regime não cumulativo). 3. As alterações produzidas pela Lei nº 12.973/2014 nas Leis nº 9.718/96, nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, não legitimam a incidência da COFINS e do PIS sobre o ICMS, porquanto a lei ordinária não pode alterar conceitos constitucionais (art. 110 do CTN) e, dessa forma, há de respeitar o conceito constitucional de receita, conforme assentou o STF ao julgar o precitado RE n.º 574.706. 4. No cálculo dos valores recolhidos indevidamente, deverá ser considerada a integralidade do ICMS destacado nas notas fiscais de saída, independentemente da utilização de créditos para a redução do quantum a ser recolhido aos cofres públicos. 5. A pendência de julgamento dos embargos de declaração opostos pela União não tem o condão de suspender a tramitação dos processos sobre o tema. Resta sedimentada a jurisprudência no STF no sentido de que, para a aplicação de decisão proferida em RE com repercussão geral, não é necessário se aguardar o trânsito em julgado ou eventual modulação de efeitos 6. Adoção da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal (Tema 69), segundo o qual "o ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS". 7. Da mesma forma como o ICMS cobrado nas operações internas, também o ICMS cobrado sobre o diferencial de alíquotas - ICMS-DIFAL -, apenas transita pela contabilidade da empresa até ser recolhido ao Estado, daí porque sobre tais valores não deve incidir as contribuições ao PIS e à COFINS, forte na decisão do SF no RE 574.706. 8. Não se reconhece o direito do contribuinte ao abatimento, da base de cálculo do PIS e da COFINS, dos valores pagos a título de ICMS-ST, seja pelo substituto, seja pelo substituído. (TRF4, 2ª Turma, 5014210-07.2019.4.04.7000, Rel. Des. Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, juntado aos autos em 05/05/2020). TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EXCLUSÃO DO ICMS-DIFAL DAS BASES DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. TEMA 69/STF. Assim como o ICMS cobrado nas operações internas, também o diferencial de alíquota do ICMS cobrado nas operações interestaduais apenas transita pela contabilidade da empresa até ser recolhido aos cofres estatais, razão pela qual deve ser excluído da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS (...).” (TRF4, 2ª Turma, 5003278-02.2020.4.04.7201, Rel. Des. Fed. Alexandre Rossato da Silva Ávila, juntado aos autos em 22/07/2020). Esse o contexto, é o caso de reconhecer o direito da impetrante de excluir da base de cálculo do PIS/COFINS o valor integral do ICMS-DIFAL destacado nas notas fiscais, a título de diferença de alíquota na hipótese de transporte interestadual de mercadorias destinadas a consumidor final, transitando pela contabilidade de empresa mas não representando faturamento ou receita, inclusive após o advento da Lei nº 12.973/14. A orientação fixada, no sentido de que a complementação do ICMS resultante da diferença entre os valores cobrados do referido imposto entre os Estados-Membros que participam da transação comercial (DIFAL) deve ser excluída da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS, tal como destacado nas notas fiscais, seja se “VALOR DIFERENCIAL ...” ou “VALOR PARTILHA DESTINO ....”, não havendo necessidade de consignar referidas expressões na sua parte dispositiva para fins de futura compensação dos valores recolhidos indevidamente. III - DISPOSITIVO Do exposto, concedo a segurança para afastar a incidência do ICMS-DIFAL – destacado nas notas fiscais - na base de cálculo da COFINS e do PIS, inclusive após o advento da Lei nº 12.973/14. Extinção do processo com resolução do mérito. Declaro, ainda, o direito à restituição, após o trânsito em julgado da sentença, dos valores recolhidos indevidamente, sob a forma de compensação, observada a prescrição das parcelas anteriores a 13-08-2015 (prescrição quinquenal). Incidência da Taxa SELIC, excluindo-se qualquer índice de correção monetária ou juros de mora (AC 83965-63.2014.4.01.3800, TRF1, 8ª Turma, Rel. Desembargador Federal Novély Vilanova, e-DJF1 de 5-7-2019; AC 64773-20.2013.4.01.3400, TRF1, 7ª Turma, Rel. Desembargador Federal Hércules Fajoses, e-DJF1 de 30-8-2019), balizamento jurisprudencial com amparo no art. 39, § 4º da Lei 9.250/95 e art. 89 da Lei 8.212/91. Custas de lei. Sem condenação em honorária (art. 25 da Lei n. 12.016/2009 e Súmula 512/STF). Reexame necessário (Lei nº 12.016/2009, art. 14, § 1º), mas de cumprimento imediato quanto à obrigação de fazer. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Dê-se vista ao MPF. (data e assinatura eletrônicas). << >> Paulo Ernane Moreira Barros Juiz Federal

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1013982-35.2024.4.01.3500

ID: 283494428

Tribunal: TRF1 Órgão: 6ª Vara Federal Cível da SJGO Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1013982-35.2024.4.01.3500

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

REGIA COMERCIO DE INFORMATICA LTDA

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

WEVERTON DIAS ALEXANDRINO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL 6ª Vara da SJGO PROCESSO: 1013982-35.2024.4.01.3500 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: REGIA COMERCIO DE INFORMATICA LTDA IMPETRADO: UNIAO FEDERAL… PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL 6ª Vara da SJGO PROCESSO: 1013982-35.2024.4.01.3500 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: REGIA COMERCIO DE INFORMATICA LTDA IMPETRADO: UNIAO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM GOIANIA SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de ação mandamental com pedido de liminar impetrada por REGIA COMÉRCIO DE INFORMÁTICA LTDA. contra ato coator do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM GOIANIA, objetivando reconhecer a inexistência de relação jurídico-tributária que o obrigue a recolhimento de PIS e COFINS com a inclusão de ICMS-DIFAL nas respectivas bases de cálculo, bem como assegurar o direito de compensação desses valores indevidamente recolhidos nos últimos 5 (cinco) anos, atualizados pela SELIC. Inicial instruída com documentos. A União requer seu ingresso no feito. Informação prestada pela autoridade impetrada, pugnando pela denegação da segurança. O MPF não se manifesta no tocante ao mérito. É o relatório. II – FUNDAMENTAÇÃO O processo comporta julgamento no estado em que se encontra (CPC, art. 355, I). Cinge-se a controvérsia à possibilidade ou não da exclusão do ICMS–DIFAL da base de cálculo do PIS e da COFINS e, por consequência, seja reconhecida a existência de créditos decorrentes dos pagamentos efetuados indevidamente. Exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 574.706/PR, sob a sistemática de repercussão geral, firmou a compreensão de que o valor arrecadado, a título de ICMS, não se incorpora ao patrimônio do contribuinte e, dessa forma, não pode integrar as bases de cálculo da contribuição a PIS e da COFINS, que são destinadas ao financiamento da seguridade social. O acórdão do aludido paradigma restou assim ementado: “RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em determinado momento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS (...).” (STF, Tribunal Pleno, RE 574706/PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/03/2017, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-223, Divulg 29/09/2017, Public 02/10/2017) (grifamos). Ainda, da análise do voto da eminente relatora, Ministra Carmen Lúcia, extrai-se que: “(...) o regime da não cumulatividade impõe concluir, embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não pode ele compor a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS. Enfatize-se que o ICMS incide sobre todo o valor da operação, pelo que o regime de compensação importa na circunstância de, em algum momento da cadeia de operações, somente haver saldo a pagar do tributo se a venda for realizada em montante superior ao da aquisição e na medida dessa mais valia, ou seja, é indeterminável até se efetivar a operação, afastando-se, pois, da composição do custo, devendo ser excluído da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS (...).” A tese de repercussão geral fixada foi a de que "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS". Ressalta-se, por oportuno, que esse entendimento se aplica inclusive ao período posterior às alterações promovidas pela Lei n.º 12.973/14, a qual, em obediência ao art. 97 da CF, foi o objeto da Arguição de Inconstitucionalidade n.º 5051557-64.2015.404.0000, em que restou firmada a orientação no sentido de que "ainda que as supervenientes mudanças legislativas, ocorridas com a conversão da Medida Provisória nº 627/2013 na Lei nº 12.973/2014, dando nova redação aos dispositivos legais questionados nos presentes autos (artigo 3º, caput, da Lei nº 9.718/1998, artigo 1º, § 1º, da Lei nº 10.637/2002 e artigo 1º, § 1º, da Lei nº 10.833/2003), não tenham integrado a pretensão recursal inicial, certo que tais mudanças foram levadas em conta em diversas passagens quando do julgamento da tese ocorrido em março de 2017, posterior, portanto, ao advento da lei nova". Em relação ao valor a ser efetivamente excluído da base de cálculo, impende ressaltar que se trata do valor destacado das notas fiscais, conforme entendem as turmas deste Tribunal, especializadas em Direito Tributário (TRF4, AG 5012378-50.2020.4.04.0000, 2ª Turma, Rel. Des. Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, juntado aos autos em 31/03/2020). De se concluir, então, que o ICMS destacado nas notas fiscais não deve compor a base de cálculo da COFINS e da contribuição ao PIS, quer se considere o faturamento (art. 195, inc. I, da CF - redação original) ou a receita (art. 195, I, "b" - redação dada pela EC nº 20/98). Essa conclusão também se aplica no período de vigência das Leis 10.637/02 e 10.833/03 (regime não cumulativo) e até mesmo da Lei nº 12.973/14. Exclusão do ICMS-DIFAL (Diferencial de Alíquota) da base de cálculo do PIS/COFINS. A Constituição Federal, em seu art. 155, § 2º, VIII, “b”, previu que o regime Diferencial de Alíquotas (DIFAL) tanto para mercadorias quanto para serviços sujeitos ao ICMS. Trata-se da diferença entre as alíquotas interna e interestadual de ICMS, cobradas nas vendas interestaduais de bens ou serviços destinados à consumidor final (contribuinte ou não do ICMS). Transcrevo: “(...) Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (...) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...) VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) (Produção de efeito) (...) VIII- a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) (Produção de efeito) a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 87, de 2015) (...).” Vale dizer então, que o fato gerador do DIFAL do ICMS ocorre nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, sendo que a responsabilidade pelo recolhimento será devida: a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto; ou b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto. Trata-se, portanto, de sistemática de arrecadação que busca equilibrar a cobrança do ICMS entre os diversos estados, mas que ao final é recolhida pelo contribuinte aos cofres públicos e, “Assim como o ICMS cobrado nas operações internas, também o diferencial de alíquota do ICMS cobrado nas operações interestaduais apenas transita pela contabilidade da empresa até ser recolhido aos cofres estatais, razão pela qual deve ser excluído da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS” (TRF4, 2ª Turma, 5003278-02.2020.4.04.7201, Rel. Alexandre Rossato da Silva Ávila, juntado aos autos em 22/07/2020). Nesse sentido, os precedentes: “TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EXCLUSÃO DO ICMS PRÓPRIO E DO ICMS-DIFAL DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. TEMA 69 DO STF. ICMS-ST NA BASE DE CÁLCULO DE PIS E COFINS. MERCADORIAS ADQUIRIDAS PELO SUBSTITUÍDO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme estabelecido pelo STF, no Tema 69, "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS" (Recurso Extraordinário com repercussão geral nº 574.706), haja vista não consubstanciar receita. 2. Assim sendo, o ICMS não deve compor a base de cálculo da COFINS e da contribuição ao PIS, quer se considere o faturamento (art. 195, inc. I, da CF - redação original) ou a receita (art. 195, I,"b" - redação dada pela EC nº 20/98), inclusive no período de vigência das Leis 10.637/02 e 10.833/03 (regime não cumulativo). 3. As alterações produzidas pela Lei nº 12.973/2014 nas Leis nº 9.718/96, nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, não legitimam a incidência da COFINS e do PIS sobre o ICMS, porquanto a lei ordinária não pode alterar conceitos constitucionais (art. 110 do CTN) e, dessa forma, há de respeitar o conceito constitucional de receita, conforme assentou o STF ao julgar o precitado RE n.º 574.706. 4. No cálculo dos valores recolhidos indevidamente, deverá ser considerada a integralidade do ICMS destacado nas notas fiscais de saída, independentemente da utilização de créditos para a redução do quantum a ser recolhido aos cofres públicos. 5. A pendência de julgamento dos embargos de declaração opostos pela União não tem o condão de suspender a tramitação dos processos sobre o tema. Resta sedimentada a jurisprudência no STF no sentido de que, para a aplicação de decisão proferida em RE com repercussão geral, não é necessário se aguardar o trânsito em julgado ou eventual modulação de efeitos 6. Adoção da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal (Tema 69), segundo o qual "o ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS". 7. Da mesma forma como o ICMS cobrado nas operações internas, também o ICMS cobrado sobre o diferencial de alíquotas - ICMS-DIFAL -, apenas transita pela contabilidade da empresa até ser recolhido ao Estado, daí porque sobre tais valores não deve incidir as contribuições ao PIS e à COFINS, forte na decisão do SF no RE 574.706. 8. Não se reconhece o direito do contribuinte ao abatimento, da base de cálculo do PIS e da COFINS, dos valores pagos a título de ICMS-ST, seja pelo substituto, seja pelo substituído. (TRF4, 2ª Turma, 5014210-07.2019.4.04.7000, Rel. Des. Fed. Maria de Fátima Freitas Labarrère, juntado aos autos em 05/05/2020). TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EXCLUSÃO DO ICMS-DIFAL DAS BASES DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. TEMA 69/STF. Assim como o ICMS cobrado nas operações internas, também o diferencial de alíquota do ICMS cobrado nas operações interestaduais apenas transita pela contabilidade da empresa até ser recolhido aos cofres estatais, razão pela qual deve ser excluído da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS (...).” (TRF4, 2ª Turma, 5003278-02.2020.4.04.7201, Rel. Des. Fed. Alexandre Rossato da Silva Ávila, juntado aos autos em 22/07/2020). Esse o contexto, é o caso de reconhecer o direito da impetrante de excluir da base de cálculo do PIS/COFINS o valor integral do ICMS-DIFAL destacado nas notas fiscais, a título de diferença de alíquota na hipótese de transporte interestadual de mercadorias destinadas a consumidor final, transitando pela contabilidade de empresa mas não representando faturamento ou receita, inclusive após o advento da Lei nº 12.973/14. A orientação fixada, no sentido de que a complementação do ICMS resultante da diferença entre os valores cobrados do referido imposto entre os Estados-Membros que participam da transação comercial (DIFAL) deve ser excluída da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS, tal como destacado nas notas fiscais, seja se “VALOR DIFERENCIAL ...” ou “VALOR PARTILHA DESTINO ....”, não havendo necessidade de consignar referidas expressões na sua parte dispositiva para fins de futura compensação dos valores recolhidos indevidamente. III - DISPOSITIVO Do exposto, concedo a segurança para afastar a incidência do ICMS-DIFAL – destacado nas notas fiscais - na base de cálculo da COFINS e do PIS, inclusive após o advento da Lei nº 12.973/14. Extinção do processo com resolução do mérito. Declaro, ainda, o direito à restituição, após o trânsito em julgado da sentença, dos valores recolhidos indevidamente, sob a forma de compensação, observada a prescrição das parcelas anteriores a 13-08-2015 (prescrição quinquenal). Incidência da Taxa SELIC, excluindo-se qualquer índice de correção monetária ou juros de mora (AC 83965-63.2014.4.01.3800, TRF1, 8ª Turma, Rel. Desembargador Federal Novély Vilanova, e-DJF1 de 5-7-2019; AC 64773-20.2013.4.01.3400, TRF1, 7ª Turma, Rel. Desembargador Federal Hércules Fajoses, e-DJF1 de 30-8-2019), balizamento jurisprudencial com amparo no art. 39, § 4º da Lei 9.250/95 e art. 89 da Lei 8.212/91. Custas de lei. Sem condenação em honorária (art. 25 da Lei n. 12.016/2009 e Súmula 512/STF). Reexame necessário (Lei nº 12.016/2009, art. 14, § 1º), mas de cumprimento imediato quanto à obrigação de fazer. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Dê-se vista ao MPF. (data e assinatura eletrônicas). << >> Paulo Ernane Moreira Barros Juiz Federal

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Varley Lopo Da Costa x Atual Intermediacoes Financeiras Ltda e outros

ID: 300821452

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1009472-82.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

VARLEY LOPO DA COSTA

Polo Passivo:

ATUAL INTERMEDIACOES FINANCEIRAS LTDA BANCO PAN S.A.

Sentença

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

CAROLINA PATRICIA BARROS DORILEO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo: 1009472-82.2024.8.11.0002. AUTOR: VARLEY LOPO DA COSTA REU: BANCO PAN S.A., ATUAL INT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ESPECIALIZADA EM DIREITO BANCÁRIO DE VÁRZEA GRANDE SENTENÇA Processo: 1009472-82.2024.8.11.0002. AUTOR: VARLEY LOPO DA COSTA REU: BANCO PAN S.A., ATUAL INTERMEDIACOES FINANCEIRAS LTDA Vistos. Trata-se de “AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS” ajuizada por VARLEY LOPO DA COSTA em desfavor de ATUAL INTERMEDIACOES FINANCEIRAS LTDA e BANCO PAN S.A., todos qualificados nos autos. Relatou o autor, em breve resumo, que foi surpreendido com uma contratação com o requerido Banco Pan de um empréstimo consignado em seu nome no dia 17 de agosto de 2022 no valor de R$ 38.677,83 (trinta e oito mil seiscentos e setenta e sete reais e oitenta e três centavos). Assevera que, posteriormente, recebeu várias ligações de um suposto funcionário do banco, e sob orientação deste realizou a transferência bancária do valor objeto do empréstimo consignado para fins de devolução e quitação do empréstimo. Afirmou que a transferência do valor informado se deu em favor do requerido ATUAL INTERMEDIAÇÕES FINANCEIRAS LTDA. Entretanto, percebeu que se tratava de um golpe, já que não obteve retorno do banco após a transferência bancária. Assim, pede indenização por dano material e moral em desfavor de cada requerido. A inicial foi recebida e a liminar indeferida. Citado, o requerido Banco Pan apresentou contestação levantando preliminares e, no mérito, pugnou pela improcedência dos pedidos. Citado, o requerido Atual Intermediacoes Financeiras Ltda deixou de se defender. A parte autora apresentou impugnação à contestação. Vieram-me os autos conclusos. É o relatório do necessário. FUNDAMENTO E DECIDO: DO JULGAMENTO ANTECIPADO Analisando os autos, verifico que o feito comporta o julgamento antecipado, nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC, por se tratar de matéria exclusivamente de direito e por não haver necessidade de produção de outras provas além daquelas já constantes nos autos. A controvérsia instaurada não demanda dilação probatória, sendo possível ao Juízo formar convicção com base na prova documental acostada, assegurando-se, assim, o princípio da celeridade processual, sem prejuízo ao contraditório e à ampla defesa. Ressalta-se que o julgamento antecipado, longe de configurar cerceamento de defesa, constitui instrumento legítimo de efetividade jurisdicional, quando a instrução probatória revela-se prescindível para a solução da controvérsia posta. Nesse sentido: “JUSTIÇA GRATUITA. IMPUGNAÇÃO. AFASTAMENTO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO. INADMISSIBILIDADE. CASO EM QUE COMPROVADA A IMPOSSIBILIDADE ECONÔMICA DO DEMANDANTE. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA QUE DEVE SER RESERVADA ÀQUELES CASOS EM QUE A IMPOSSIBILIDADE SE REVELE. PRELIMINAR REJEITADA. CERCEAMENTO DE DEFESA . INOCORRÊNCIA. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. ALEGADA NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA ORAL. HIPÓTESE, CONTUDO, EM QUE ELA SE MOSTRA ABSOLUTAMENTE DESNECESSÁRIA PARA O DESLINDE DA CAUSA. MATÉRIA EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO. PRELIMINAR REJEITADA. CONDOMÍNIO . COISA COMUM INDIVISÍVEL. ADMISSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO JUDICIAL. AUTOR QUE NÃO É OBRIGADO A MANTER O CONDOMÍNIO ETERNAMENTE. EXTINÇÃO DO CONDOMÍNIO QUE CONFIGURA DIREITO POTESTATIVO DO COPROPRIETÁRIO . SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.” (TJ-SP - Apelação Cível: 1012665-16.2022 .8.26.0566 São Carlos, Data de Julgamento: 08/02/2024, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2024) (negrito nosso) PRELIMINARES IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA A parte ré impugna a assistência judiciária gratuita pleiteada. No entanto, não traz elementos concretos que desconstituam a hipossuficiência alegada, ora de sua incumbência na condição de impugnante. Assim, a impugnação ao pleito de gratuidade da justiça não apresenta elementos concretos que desconstituam a hipossuficiência alegada. Desse modo, ante a alegação de insuficiência firmada por pessoa natural, a documentação acostada nos autos e a ausência de prova em contrário, é o caso de manutenção da benesse, nos termos do artigo 99, § 3º, do Código de Processo Civil. Vejamos a jurisprudência: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C DANOS MORAIS. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. IMPUGNAÇÃO AO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. REJEITADA. PRELIMINAR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. REJEITADA. AUSÊNCIA DE INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. REGISTRO NA PLATAFORMA SERASA. COBRANÇA EXTRAJUDICIAL. DANO MORAL INEXISTENTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A impugnação ao pleito de gratuidade da justiça não apresenta elementos concretos que desconstituam a hipossuficiência alegada. 2. Preliminar de falta de interesse de agir. Rejeitada. 3. A mera cobrança indevida via plataformas de cobrança extrajudicial não induz ao pleito de condenação por danos morais, ainda que o débito seja indevido. 4. Recurso conhecido e desprovido. (N.U 1032166-16.2022.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Segunda Turma Recursal, Julgado em 06/11/2023, Publicado no DJE 21/11/2023) Portanto, rejeito a preliminar. DEMAIS PRELIMINARES Quanto às demais preliminares suscitadas, procede-se à análise nos termos do art. 488 do Código de Processo Civil, que assim dispõe: “Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485.” Nos termos do art. 282, § 2º, e do art. 488 do Código de Processo Civil de 2015, o exame das preliminares, incluindo as prejudiciais de mérito, pode ser dispensado quando a decisão de mérito se revela favorável à parte que se beneficiaria do acolhimento dessas questões. Tal interpretação privilegia o princípio da primazia do julgamento do mérito, que busca assegurar uma prestação jurisdicional plena, justa e efetiva, evitando decisões meramente formais e promovendo uma análise substancial do direito em litígio. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina já se manifestou, destacando que a resolução direta do mérito deve ser preferida sempre que possível, conforme decidido no julgamento da Apelação Cível n. 0302245-18.2017.8.24.0018, de Chapecó, Relator Des. Henry Petry Junior, em 28 de novembro de 2017. A propósito: “MANDADO DE SEGURANÇA. QUESTÕES PRELIMINARES SUSCITADAS. DESNECESSIDADE DE ENFRENTAMENTO. SUPREMACIA DO MÉRITO . EXTENSÃO DOS EFEITOS DE ACORDOS FIRMADOS EM MANDADOS DE INJUNÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. EFEITOS INTER PARS. POSIÇÃO CONCRETISTA INDIVIDUAL . 1. Em observância aos princípios da primazia da decisão de mérito e da instrumentalidade das formas, desnecessária análise das preliminares, porquanto o artigo 488 do CPC dispensa tal exigência quando o julgamento do mérito for favorável à parte a quem aproveitaria o acolhimento daquelas arguições. 2. De acordo com o artigo 9º, § 1º da lei 13.300/2016 a decisão proferida em mandado de injunção tem eficácia subjetiva limitada as partes, podendo ser conferida eficácia erga omnes quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração, consoante a teoria concretista individual. 3. Não se revela admissível o manejo do mandado de segurança para implementação judicial da revisão geral anual da remuneração de servidores públicos estaduais, cujos acordos firmados nos Mandados de Injunção informados, possuem vinculação limitada às partes. SEGURANÇA DENEGADA.” (TJ-GO - MS: 51939705320208090000 GOIÂNIA, Relator.: Des(a) . MARCUS DA COSTA FERREIRA, Órgão Especial, Data de Publicação: (S/R)) (grifo nosso) DA APLICAÇÃO DO CDC. Cumpre-me consignar a aplicabilidade do Código do Consumidor e consequente inversão do ônus da prova. Como se sabe nos termos do inciso VIII do artigo 6º da Lei nº 8.078/90, os requisitos para o seu deferimento são a verossimilhança ou a hipossuficiência. Vejamos: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; (...) É certo que a hipossuficiência tratada não é a financeira, mas sim a técnica, decorrente da dificuldade do consumidor em produzir a prova em razão de estar ela ao alcance do prestador do serviço. Ela é analisada em cada caso concreto, entre o consumidor e o fornecedor. Ressalto que esse, inclusive, é o entendimento deste Tribunal, conforme se infere da ementa a seguir transcrita: “EMENTA RECURSO INOMINADO – RELAÇÃO DE CONSUMO – INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO – ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – INSURGÊNCIA DA PARTE PROMOVIDA – PLEITO DE IMPROCEDÊNCIA OU REDUÇÃO DO DANO MORAL – PROTESTO PREEXISTENTE – AUSÊNCIA DE PROVA DE SUA ILEGITIMIDADE – APLICAÇÃO DA SÚMULA 385, DO STJ, – AUSÊNCIA DE DANO MORAL – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA PARA EXCLUIR O DANO MORAL – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Havendo alegação de inexistência de relação jurídica pelo consumidor, incumbe ao fornecedor de produtos e serviços que requereu a negativação comprovar que houve a contratação, a contraprestação do serviço e o respectivo inadimplemento. A contratação, quando negada, se prova mediante a juntada do contrato escrito ou do áudio oriundo de “call center”, o que não ocorreu no presente caso. A inscrição indevida do nome do consumidor nos órgãos de proteção ao crédito é causa que enseja o recebimento de indenização por dano moral, uma vez que se trata de dano moral “in re ipsa” e, portanto, dispensa a comprovação da extensão dos danos suportados.A Súmula 385, do Superior Tribunal de Justiça, exclui o direito à indenização por dano moral quando há inscrição preexistente legítima. Havendo protesto preexistente em relação à inscrição discutida, sem prova de sua ilegitimidade, de rigor a aplicabilidade da Súmula 385, do STJ, afastando o dano moral pretendido. Sentença parcialmente reformada. Recurso parcialmente provido. (TJ-MT 10429372720208110001 MT, Relator: LUCIA PERUFFO, Data de Julgamento: 08/06/2021, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 10/06/2021). Assim, tratando-se de relação de consumo e sendo patente a hipossuficiência do requerente frente à requerida, de rigor o deferimento da inversão do ônus da prova. DO MÉRITO – BANCO PAN S.A. A controvérsia com relação ao Banco Pan consiste em analisar acerca da responsabilidade da instituição financeira pela contratação e fraude que ensejou nas transferências de valores, os quais, segundo o autor, foram realizados sob orientação de preposto do banco requerido, pretendendo que sejam reconhecidos indevidos os descontos efetuados em seu benefício previdenciário; bem como pede a devolução em dobro do montante descontado e indenização por danos morais, ao argumento de que não teria contratado. Ao contestar o pedido, o requerido apresentou o contrato que deu ensejo aos descontos (termo de adesão), instruído com cópias de seus documentos pessoais. Além disso, apresentou selfie da parte autora do momento da contratação e o comprovante de transferência eletrônica em favor da parte requerente. De início, necessário ressaltar que não há que se falar em vício algum no contrato, que preenche todos os requisitos legais. Não há necessidade alguma de que o instrumento seja firmado por instrumento público, por absoluta ausência de amparo legal para tal exigência. Outrossim, ao contrário do que sugere a parte requerente, a prova da transferência do valor para sua conta bancária é idônea a demonstrar a contratação; competia à parte autora provar que não recebeu os valores, o que poderia fazer mediante juntada de extratos bancários do período. Não o tendo feito, deve ser considerada a força probante do documento anexado pelo réu. Logo, extrai-se que a parte autora contratou livremente e não há qualquer conduta ilícita do requerido, sendo, portanto, improcedentes os pedidos de declaração de inexistência do débito. Quanto o fato da ocorrência do golpe, importante consignar que, para se reconhecer o dever de indenizar, cumpre estabelecer a relação de causalidade entre o evento tido como danoso e a conduta imputada ao banco requerido. No caso dos autos, verifica-se que o autor sofreu um golpe via telefone, onde terceiro se identificou como sendo preposto do banco requerido, induzindo-o a seguir orientações repassadas pelo fraudador. Evidencia-se que o autor foi vítima de golpe por telefone, sem a participação, conivência ou omissão do banco requerido, de maneira que, apesar da responsabilidade dos bancos ser objetiva, no caso, não há como responsabilizá-lo quando atuou tão somente no empréstimo de maneira prévia. A situação enseja o rompimento do nexo de causalidade entre a conduta e o dano experimentado pelo réu, não estando presente, portanto, um dos requisitos da responsabilidade civil. Não se olvide que as operações ora questionadas só poderiam ter sido realizadas com a imposição de senha pessoal do próprio requerente, a qual foi utilizada pelo autor quando seguiu o passo a passo arquitetado pelos golpistas junto à ligação. Diante desse cenário, não se trata de fortuito interno, tendo em vista que resta caracterizada a culpa exclusiva do consumidor, o que afasta a responsabilidade do banco requerido, a teor do que dispõe o art. 14, § 3º, II, do CDC. Colaciono: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...). § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Cabe ao autor ter total zelo quanto ao uso e sigilo dos dados bancários, transferências e principalmente senha. É certo que, caso o correntista tivesse entrado em contato com o banco antes de seguir a orientação de desconhecidos, teria sido prevenido sobre a prática ilícita que estava por acontecer. Assim, verifica-se que o próprio autor, mediante sua conduta, acabou por realizar transferência bancária a terceiro, cuja responsabilidade pelo ato é exclusivamente sua. No caso, é público e amplamente divulgado pelas instituições financeiras que o banco não entra em contato com os clientes para solicitar seus dados e auxiliar remotamente para acesso em caixa eletrônico ou outro mecanismo de acesso à sua conta e dados. Outrossim, denota-se que as transações efetivadas não ocorreram por falha do banco, mas por culpa exclusiva do autor que realizou a transferência. Destaca-se que, o dever de indenizar decorre da necessária comprovação dos elementos configuradores da responsabilidade civil, quais sejam: o dano, a ilicitude da conduta e o nexo causal, o que não ocorre no caso. Logo, não demonstrado que a instituição financeira contribuiu com o evento danoso, não é possível imputar-lhe a responsabilidade pelos danos alegados, de forma que a situação narrada ocorreu por culpa exclusiva do autor, afastando a responsabilidade da instituição financeira. Nesse sentido são inúmeros os julgados: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. TRANSAÇÕES FRAUDULENTAS REALIZADAS POR TERCEIROS. GOLPE DA FALSA CENTRAL DE ATENDIMENTO. CONFISSÃO AUTORAL DE QUE INFORMOU SEUS DADOS BANCÁRIOS E SENHA POR MEIO DE CONTATO TELEFÔNICO. DEVER DE SIGILO DA SENHA NÃO OBSERVADO. INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO BANCO PARA A OCORRÊNCIA DO EVENTO. CULPA EXCLUSIVA DA CORRENTISTA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. Para que o Banco seja responsabilizado é imperiosa a verificação de falhas na prestação de serviço, conforme predispõe o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Resta caracterizada a culpa exclusiva do consumidor, nos termos do artigo 14, § 3.º, inciso II do CDC, quando este não age com a cautela necessária ao acreditar na ligação recebida, sem qualquer confirmação junto ao Banco, bem como ao informar seus dados bancários e senha sigilosa pelo telefone a estranho, sendo inadmissível a responsabilização da instituição bancária, quando demonstrado que o consumidor não agiu com a diligência adequada, devendo este suportar os prejuízos sofridos. Recurso Provido. (TJ-MT - RI: 10078408620228110003, Relator: VALMIR ALAERCIO DOS SANTOS, Data de Julgamento: 26/06/2023, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 29/06/2023). (negrito nosso). APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ORDINÁRIA - RESPONSABILIDADE - VÍTIMA DE GOLPE POR TELEFONE - CLIENTE QUE SEGUE AS SUAS INSTRUÇÕES - CADASTRAMENTO DE ACESSO A TERCEIRO A CONTA CORRENTE - CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR. Parte que foi vítima de golpe por telefone, sem a participação, conivência ou omissão da instituição financeira, e cadastra acesso de terceiro a sua conta. Responsabilidade da instituição financeira afastada, por culpa exclusiva da vítima que não é diligente em guardar seus dados e senhas. É dever do correntista manter a guarda de seus dados e o sigilo da senha pessoal, não respondendo a instituição financeira por eventual contratação de empréstimo realizado no terminal de autoatendimento mediante utilização dos dados pessoais do correntista. Aplicação do disposto no art. 14, § 3º, II, do CDC. (TJ-MG, Apelação Cível 1.0000.20.580018-8/001, Relator: Des. Marco Aurelio Ferenzini, 14a Câmara Cível, DJ 04/02/2021). Direito do Consumidor. Golpe por telefone. Transferência de valor realizada por terceiro em Internet Banking. Senha e token fornecidos pelo consumidor. Violação do dever de sigilo da senha. Fortuito externo. Provimento do primeiro apelo. 1. Conquanto seja objetiva a responsabilidade do fornecedor, nos termos do art. 14 do CDC, é indispensável a comprovação do nexo causal. 2. No caso vertente, o consumidor foi vítima de golpe, no qual pessoa se passando por funcionário do banco réu o compeliu a digitar a senha pessoal e token, possibilitando a transação fraudulenta. 3. Hipótese que configura fortuito externo, porquanto ocorrida fora da esfera de controle do fornecedor. 4. Violação do dever de guarda/sigilo da senha pelo consumidor. Excludente de responsabilidade do fornecedor, na forma do art. 14, § 3º., II, CDC. 5. Primeira apelação a que se dá provimento. Segundo apelo desprovido. (TJ-RJ, Apelação 0166014-73.2017.8.19.0001, Relator: HORÁCIO DOS SANTOS RIBEIRO NETO, 15a Câmara Cível, DJ 01/02/2021). (negrito nosso). APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - VÍTIMA DE GOLPE POR TELEFONE - AUSÊNCIA DE CONDUTA ILÍCITA PELA EMPRESA REQUERIDA - AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A CONDUTA DA RÉ E OS DANOS EXPERIMENTADOS PELA AUTORA - RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DA CONSUMIDORA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Se a própria autora reconhece ter sido vítima e golpe praticado por terceiro, não há qualquer responsabilidade por parte da empresa de telefonia, restando caracterizada uma excludente de responsabilidade, com supedâneo no artigo 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor. 2. Não configurada conduta ilícita perpetrada pela requerida ou nexo de causalidade a ensejar uma responsabilidade civil, não há que se falar em indenização. (TJ-MS, Apelação Cível n. 0805497-85.2019.8.12.0001, Relator: Des. Fernando Mauro Moreira Marinho, 2a Câmara Cível, DJ 16/07/2021). (negrito nosso). Diante do exposto, tendo a transferência bancária sido realizada mediante senha pessoal utilizada pelo autor, fica comprovada a culpa exclusiva do requerente, o qual não teve o cuidado de guarda de seus dados pessoais, ficando, via de consequência, afastada a responsabilidade civil do banco requerido, nos termos do art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor. Arremato: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. FRAUDE BANCÁRIA. RESPONSABILIDADE. VÍTIMA DE GOLPE POR TELEFONE. CLIENTE QUE SEGUE AS INSTRUÇÕES DE FALSÁRIO E PROMOVE O CADASTRAMENTO DE ACESSO A TERCEIRO À CONTA CORRENTE. CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO 1. Parte que foi vítima de golpe por telefone, sem a participação, conivência ou omissão da instituição financeira, e cadastra acesso de terceiro a sua conta. Responsabilidade da instituição financeira afastada, por culpa exclusiva da vítima que não é diligente em guardar seus dados e senhas. É dever do correntista manter a guarda de seus dados e o sigilo da senha pessoal, não respondendo a instituição financeira por eventual contratação de empréstimo realizado no terminal de autoatendimento mediante utilização dos dados pessoais do correntista. Aplicação do disposto no art. 14, § 3º, II, do CDC. 2. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJ-AC - AC: 07016431320218010001 AC 0701643-13.2021.8.01.0001, Relator: Des. Júnior Alberto, Data de Julgamento: 19/07/2022, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 29/07/2022). DO MÉRITO – ATUAL INTERMEDIACOES FINANCEIRAS LTDA Quanto ao requerido ATUAL INTERMEDIACOES FINANCEIRAS LTDA, o deslinde da controvérsia depende em verificar se o autor realizou depósito de maneira induzida e indevida à parte Requerida. Da análise do caderno processual observa-se que a parte Requerente colacionou documento hábil a comprovar suas alegações de que tinha intenção em proceder com o pagamento de valores referente a empréstimo contratado, entretanto foi induzido a erro ao ser instruída para realizar depósito na conta bancária do Requerida André ao invés da instituição bancária correta. Assim, resta evidente que a vontade do autor era a de pagar os valores para a instituição bancária a qual fez empréstimo anterior, e não de depositar os valores para uma pessoa que não tinha vínculo com o empréstimo. É certo que a ação de ressarcimento configura meio adequado para ingressar em Juízo, quando o autor não tem outra forma de ser ressarcido. E faz uso das provas disponíveis para demonstração do crédito, no caso dos autos, o comprovante de transferência TED acostado no Id. 143893728 nos valores de R$ 38.528,04. Ou seja: a parte autora fez prova do fato constitutivo do seu direito, na forma do artigo 373, inciso I, do CPC. Por outro lado, mormente em razão da ausência de impugnação específica aos fatos e documentos trazidos pela parte autora, à míngua de qualquer elemento de convicção que coloque em dúvida o acervo probatório apresentado pela parte autora, visto que, incumbia à parte demandada a prova da existência de fato impeditivo, modificativo e extintivo, do direito do autor, na forma do artigo 373, inciso II, do CPC, entretanto sequer apresentou contestação no feito, a procedência parcial dos pedidos é medida de rigor. Ainda, deve ser observado o que determina o artigo 884, do Código Civil: aquele que, sem justa causa, se enriquecer às custas de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.”. Perante o autor, o requerido participou do ato fraudulento ao receber valores em sua conta bancária e mantê-los sem questionar a origem, devendo responder pelos danos materiais causados. Vejamos o posicionamento do e. Tribunal de Justiça de Mato Grosso em um caso análogo: RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – GOLPE DO BOLETO BANCÁRIO – PAGAMENTO EFETUADO – BENEFICIÁRIA PAGSEGURO – RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA – REQUERIDO QUE CONFIRMA A SUSPEITA DE CONTA CRIADA POR FALSÁRIOS – RESTITUIÇÃO NÃO EFETUADA – PREJUÍZO CONFIGURADO – DEVER DE RESSARCIMENTO – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DANO MORAL CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – DANO MATERIAL – RESTITUIÇÃO DEVIDA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O recorrido não se desincumbiu do ônus de comprovar fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito do recorrente. 2. No caso, o recorrente demonstrou que em razão do pagamento de boleto fraudado emitido de conta com suspeita de fraude da plataforma do requerido, realizou reclamação no consumidor.gov nº 2021.02/00004273852, ocasião em que o requerido reconhece a suspeita de fraude, inclusive, propõe o reembolso do valor, no entanto, exige abertura de conta na sua plataforma pelo reclamante. 3. Restando demonstrado à retenção de valor indevidamente e a tentativa frustrada do consumidor em solucionar a lide na seara administrativa, configura falha na prestação do serviço e esta falha enseja a responsabilização objetiva pelos danos morais causados. 4. Ressalte-se ser desnecessária a comprovação específica do prejuízo, pois o dano se extrai pela só verificação da conduta, ocorrendo o chamado dano in re ipsa. 5. A devolução do valor a título de danos materiais é medida que se impõe diante da falha na prestação do serviço e da privação da quantia que o requerido detinha posse indevidamente. 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-MT – N.U 1013982-49.2021.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALDECI MORAES SIQUEIRA, Turma Recursal Única, Julgado em 17/03/2023, Publicado no DJE 22/03/2023) (negrito nosso) No mesmo sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA PREJUDICADA - PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS - REVELIA - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. Não se decreta a nulidade, por cerceamento de defesa, se, no mérito, o pedido da apelante é atendido. Opera-se a revelia, quando ausentes qualquer das hipóteses do art. 320, do Código de Processo Civil, principalmente se o réu não contesta o pedido de cobrança ou queda-se inerte, presumindo-se verdadeiras as alegações exordiais, nos termos do art. 319, do Código de Processo Civil, julgando procedente o pedido. V.V: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - CERCEAMENTO DE DEFESA - NÃO CARACTERIZAÇÃO - REVELIA - PRESUNÇÃO RELATIVA - VERACIDADE DAS ALEGAÇÕES DO AUTOR - NÃO COMPROVAÇÃO - ÔNUS NÃO CUMPRIDO - IMPROCEDÊNCIA - Tendo em vista que a parte autora apresentou petição pugnando pela decretação da revelia e prolação da sentença, não tendo especificado, no momento oportuno, as prova que pretendia produzir, não há falar em cerceamento de defesa. Embora decretada a revelia do réu, é relativa a presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial, o que leva à improcedência do pedido se o autor não comprovar os fatos constitutivos do seu direito. (TJ-MG - AC: 10686130161793001 MG, Relator: Newton Teixeira Carvalho, Data de Julgamento: 03/09/2015, Data de Publicação: 14/09/2015) (negrito nosso) Ressalto que não há nos autos qualquer elemento que refute as alegações da parte autora no que tange ao débito que se busca ressarcimento em face da requerida ATUAL INTERMEDIAÇÕES FINANCEIRAS. DOS DANOS MORAIS No que concerne aos danos morais praticados pela parte requerida ATUAL INTERMEDIAÇÕES FINANCEIRAS, os fatos relatados são suficientes a ensejar a exacerbação dos sentimentos do homem médio, acarretando ao réu a obrigação de indenizar o autor pelo abalo moral sofrido, o qual entendo por reconhecê-lo na modalidade in re ipsa. Ora, há evidente violação da boa-fé e indevida exposição da parte Autora a sentimentos como insegurança jurídica e revolta, ao ter o requerido recebido valores que não são devidos e por sequer ter tomado cautela sobre a origem dos valores. É indiscutível ser vedado o enriquecimento à custa de outrem, cautela esta que sequer fora observada pelo réu André ao não ter questionado o depósito de um montante considerável em sua conta bancária. Logo, não havendo a devolução dos valores de maneira espontânea pelo requerido em favor do autor, induz que aquele participou do ato fraudulento e até com suposta prática de apropriação indébita ao receber valores em sua conta bancária e mantê-los sem questionar a origem ou proceder com sua devolução, devendo responder pelos danos morais causados. Assim aduz a jurisprudência: ECURSO INOMINADO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – GOLPE DO BOLETO BANCÁRIO – PAGAMENTO EFETUADO – BENEFICIÁRIA PAGSEGURO – RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA – REQUERIDO QUE CONFIRMA A SUSPEITA DE CONTA CRIADA POR FALSÁRIOS – RESTITUIÇÃO NÃO EFETUADA – PREJUÍZO CONFIGURADO – DEVER DE RESSARCIMENTO – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DANO MORAL CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – DANO MATERIAL – RESTITUIÇÃO DEVIDA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O recorrido não se desincumbiu do ônus de comprovar fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito do recorrente. 2. No caso, o recorrente demonstrou que em razão do pagamento de boleto fraudado emitido de conta com suspeita de fraude da plataforma do requerido, realizou reclamação no consumidor.gov nº 2021.02/00004273852, ocasião em que o requerido reconhece a suspeita de fraude, inclusive, propõe o reembolso do valor, no entanto, exige abertura de conta na sua plataforma pelo reclamante. 3. Restando demonstrado à retenção de valor indevidamente e a tentativa frustrada do consumidor em solucionar a lide na seara administrativa, configura falha na prestação do serviço e esta falha enseja a responsabilização objetiva pelos danos morais causados. 4. Ressalte-se ser desnecessária a comprovação específica do prejuízo, pois o dano se extrai pela só verificação da conduta, ocorrendo o chamado dano in re ipsa. (...). 6. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-MT – N.U 1013982-49.2021.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALDECI MORAES SIQUEIRA, Turma Recursal Única, Julgado em 17/03/2023, Publicado no DJE 22/03/2023) E, no que tange à quantificação do dano moral, insta ressaltar que não há critérios legais e pré-estabelecidos para o seu arbitramento incumbindo ao Juiz, por seu prudente arbítrio, estimar, atento às peculiaridades de cada caso concreto, um valor justo a título de indenização, tendo-se em mente os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Deve-se apurar um montante equilibrado que sirva como desestímulo para a repetição do fato danoso, e represente à vítima uma compensação financeira que, de alguma forma, amenize o seu sofrimento injustamente suportado, levando em consideração, dentre outros, a situação econômica da parte ré, a intensidade do sofrimento, a gravidade e grau de culpa do réu André, bem como as circunstâncias que envolveram os fatos, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante na causadora do mal. Sopesando os fatos ocorridos e incontroversos nos autos e, ainda, os critérios comumente utilizados pelos Tribunais para sua fixação, reputo justa e razoável a condenação da parte Ré ATUAL INTERMEDIAÇÕES FINANCEIRAS ao pagamento da importância de R$ 8.000,00 (oito mil reais), como medida de caráter pedagógico. DISPOSITIVO Isto posto, com fulcro no disposto no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido exordial formulado em face da parte requerida Banco Pan S.A. Por outro lado, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na exordial quanto ao requerido ATUAL INTERMEDIAÇÕES FINANCEIRAS, para CONDENÁ-LO à devolução dos valores indevidamente recebidos em sua conta bancária, no montante de R$ 38.528,04 (trinta e oito mil, quinhentos e vinte e oito reais e quatro centavos), bem como na obrigação de pagamento da quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais em favor da parte autora. Sobre ambas as obrigações ora fixadas deverá incidir juros de mora legais ao mês com base na taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), e correção monetária pelo IPCA, com fulcro nos arts. 389, p. único, e 406, ambos da Lei n. 14.905/24; os acréscimos ora fixados incidem, no caso da indenização por dano material, a partir do evento danoso (data do pagamento), e os relativos ao dano moral a partir da data desta sentença. Quanto à sucumbência, considerando a improcedência com relação ao requerido Banco Pan, condeno o requerente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor atualizado da causa, em observância ao disposto no artigo 85, §2º, incisos I a IV, do CPC – devendo ser observada a Justiça Gratuita deferida, que leva à suspensão da condenação. Já quanto a sucumbência pela procedência com relação ao requerido Atual Intermediações Financeiras, condeno este ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da condenação, em observância ao disposto no artigo 85, §2º, incisos I a IV, do CPC. Transitada em julgado, arquivem-se os autos, promovendo-se as baixas e anotações necessárias. Intimem-se. Cumpra-se. Várzea Grande-MT, data e horário registrados no sistema. ANGELO JUDAI JUNIOR Juiz de Direito

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Carla Oliveira Da Silva Matos x Gesse Alves Dos Santos

ID: 317873452

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE RONDONÓPOLIS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1013982-38.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

CARLA OLIVEIRA DA SILVA MATOS

Polo Passivo:

GESSE ALVES DOS SANTOS

Sentença

Advogados:

ALVINO EVANGELISTA DO CARMO NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ANDRE MARTINS KAWABATA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE RONDONÓPOLIS SENTENÇA Processo: 1013982-38.2024.8.11.0003. AUTOR(A): CARLA OLIVEIRA DA SILVA MATOS REQUERIDO: GESSE ALVES DOS SANTOS Vistos e e… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE RONDONÓPOLIS SENTENÇA Processo: 1013982-38.2024.8.11.0003. AUTOR(A): CARLA OLIVEIRA DA SILVA MATOS REQUERIDO: GESSE ALVES DOS SANTOS Vistos e examinados. Trata-se de AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ajuizada por CARLA OLIVEIRA DA SILVA MATOS EM FACE DE GESSE ALVES DOS SANTOS E ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., pela qual busca a condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, decorrente de corte de energia elétrica realizado no imóvel que ocupava. Relata a parte requerente, em apertada síntese que: I – firmou contrato verbal de locação com o requerido Gesse Alves dos Santos para residir em imóvel na Avenida Canindé, 1.403, Jardim Iguassu, mediante pagamento mensal de R$ 800,00; II – enfrentava dificuldades financeiras agravadas pela grave enfermidade de seu filho e desemprego temporário; III – após cobrança realizada em 19/02/2024 pelo locador, quatro dias depois teve a energia elétrica do imóvel desligada, incluindo a retirada do relógio medidor, supostamente a pedido do locador, mesmo após protestar como locatária perante a equipe da Energisa; IV – diante da situação, viu-se forçada a deixar o imóvel com os filhos e buscar refúgio na casa da irmã, permanecendo ali de 23/02 a 08/03/2024, em condições precárias. Em sede de contestação, a parte demandada Energisa refuta a pretensão autoral sob os seguintes argumentos defensivos: I – ilegitimidade ativa da autora, por não ser titular da unidade consumidora ou comprovar vínculo jurídico com o imóvel; II – ilegitimidade passiva da concessionária, que apenas cumpriu solicitação regular da titular da unidade consumidora, Sra. Silvana Pinheiro do Nascimento; III – denunciação à lide da titular da unidade consumidora; IV – no mérito, nega qualquer responsabilidade pelo corte, apontando regularidade do procedimento e ausência de ato ilícito. Por sua vez, o requerido Gesse Alves dos Santos apresentou contestação acompanhada de reconvenção (Id. 163292603), alegando: I – inépcia da inicial; II – preclusão do direito de produção de provas pela autora; III – litigância de má-fé; IV – no mérito, defende-se afirmando que não solicitou o corte de energia e que a autora estava inadimplente com aluguéis e contas de consumo, os quais totalizariam R$ 2.577,60, valor cobrado na reconvenção. A parte autora apresentou réplica à contestação da Energisa e do corréu Gesse, sob Id. nº 166540188, rebatendo todas as preliminares e reafirmando os pedidos iniciais, além de contestar especificamente a reconvenção. Foi proferida decisão interlocutória no Id. nº 169827108, afastando as preliminares do Réu Gesse e reconhecendo a ilegitimidade passiva da empresa Energisa, que apenas teria cumprido ordem formal de desligamento formulada pela titular da unidade consumidora, afastando sua responsabilidade civil, por configurar estrito cumprimento de dever legal e culpa exclusiva de terceiro. Os autos foram enviados ao CEJUSC para audiência de conciliação, contudo, resultou inexitosa. Vieram-me os autos conclusos. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. Nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a questão de fato for incontroversa ou estiver provada documentalmente, e não houver necessidade de produção de outras provas. No caso em apreço, verifica-se que todas as alegações relevantes para o deslinde da controvérsia encontram-se devidamente instruídas por prova documental, sendo desnecessária a abertura de fase instrutória. Os documentos acostados pelas partes são suficientes para o esclarecimento dos fatos controvertidos, em especial quanto à existência do contrato de locação, inadimplemento de valores e rescisão contratual com a concessionária de energia elétrica. Ressalte-se que eventuais documentos que não tenham sido oportunamente apresentados restam preclusos, uma vez que, conforme dispõe o art. 434 do CPC, incumbia às partes instruir suas manifestações iniciais com os documentos destinados a comprovar suas alegações. Não se vislumbra, portanto, justificativa plausível para apresentação extemporânea de provas, tampouco se configuram as hipóteses excepcionais previstas no §1º do art. 435 do CPC. Ilustro: Ementa: CIVIL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CANCELAMENTO DE VOO. REMARCAÇÃO PARA O DIA SEGUINTE. PERDA DO VOO REMARCADO. JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO. TEMA ÚNICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA DOCUMENTAL INSUFICIENTE. PERDA DO MOMENTO OPORTUNO PARA COLIGIR A DOCUMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 434 DO CPC. PRECLUSÃO. 1. O cerceamento de defesa se caracteriza pela limitação ou tolhimento do direito de a parte exercitar o contraditório ou produzir as provas necessárias aos fatos alegados para o julgamento da causa deduzida no processo em juízo. 1.1. Em conformidade com os artigos 370 e 371 do Código de Processo Civil, o magistrado é o destinatário da prova, cabendo-lhe determinar a realização das diligências imprescindíveis à instrução do processo para formação do seu livre convencimento, assim como indeferir as diligências inúteis ou protelatórias. 2. Segundo o artigo 434 do Código de Processo Civil, incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações, de modo que, em qualquer das situações, a não apresentação de documentos no momento oportuno acarreta a preclusão desta faculdade processual. 3. No caso dos autos, as provas documentais pretendidas pelo apelante guardam relação direta com os fatos narrados em fase postulatória, não se enquadrando em nenhuma das exceções previstas no artigo 435 do Código de Processo Civil, razão pela qual deveriam instruir a petição inicial, não havendo que se falar em cerceamento de defesa. 3.1. Além da preclusão da prova documental pretendida pelo apelante, os elementos de prova carreados aos autos mostraram-se suficientes para nortear a solução da controvérsia e subsidiar o julgamento antecipado do mérito, não se verificando danos materiais ou morais decorrentes de eventual falha no serviço prestado pela companhia aérea apelada. 4. Apelação cível conhecida e desprovida. Sentença mantida. Honorários recursais majorados. (TJ-DF 07453794520238070001 1923193, Relator.: CARMEN BITTENCOURT, Data de Julgamento: 17/09/2024, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: 01/10/2024) Dessa forma, estando o feito devidamente instruído com elementos suficientes para a formação do convencimento judicial, impõe-se o julgamento antecipado da lide, como medida que prestigia os princípios da celeridade e economia processual. DO MÉRITO. Uma vez acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela ré Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. - prossegue o julgamento apenas em relação ao corréu GESSE ALVES DOS SANTOS. A controvérsia dos autos gira em torno da responsabilidade civil decorrente do desligamento do fornecimento de energia elétrica em imóvel ocupado pela autora, o qual, segundo sustenta, teria sido promovido de forma ilícita e abusiva pelo réu, com o intuito de forçá-la a desocupar o bem locado. A autora alega ter sofrido prejuízos de ordem moral em razão da interrupção do serviço essencial, requerendo a correspondente indenização. Por sua vez, o réu Gesse Alves dos Santos nega qualquer envolvimento com o pedido de desligamento, atribuindo a solicitação à legítima titular da unidade consumidora à época dos fatos. O cerne da demanda, portanto, está em verificar se houve ou não a prática de ato ilícito apto a gerar a obrigação de indenizar. A própria parte autora, em sua narrativa e nos documentos acostados aos autos, admite de forma expressa que se encontrava inadimplente tanto em relação às faturas de energia elétrica quanto aos aluguéis pactuados no contrato verbal de locação. Tal confissão, somada à ausência de qualquer justificativa jurídica plausível, reforça a regularidade das consequências enfrentadas. No tocante ao encerramento do contrato de fornecimento de energia elétrica, cumpre ressaltar que o procedimento adotado pela concessionária encontra respaldo no art. 140 da Resolução Normativa nº 1.000/2021 da ANEEL, que autoriza expressamente o encerramento do vínculo contratual por diversas hipóteses legais, dentre elas, por solicitação do próprio consumidor (inciso I), por pedido de alteração de titularidade por novo usuário (inciso II), pelo término contratual (inciso III) ou por inadimplemento perante a CCEE (inciso IV). No presente caso, ficou devidamente comprovado que a solicitação de encerramento do fornecimento foi realizada por Silvana Pinheiro do Nascimento, então titular da unidade consumidora. Não há nos autos qualquer indício de que o réu Gesse Alves dos Santos tenha solicitado tal requerimento. A documentação juntada confirma que a iniciativa partiu exclusivamente da titular da conta, o que refuta, por completo, a alegação de que o requerido teria agido de forma abusiva ou ilícita com o objetivo de forçar a desocupação do imóvel. Vejamos: APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PEDIDO DE DESLIGAMENTO FEITO PELO ANTIGO PROPRIETÁRIO. TITULAR DO SERVIÇO PERANTE A CONCESSIONÁRIA. ATO ILÍCITO INEXISTENTE. INDENIZAÇÃO NÃO DEVIDA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS RECURSAIS INDEVIDOS. 1 - Verificando-se que a interrupção do fornecimento de energia elétrica deu-se a pedido daquele que ainda figurava como consumidor nos cadastros da concessionária ré, não há ilicitude no corte efetuado, não havendo se falar, por conseguinte, em dano moral a ser indenizado. 2 - Na hipótese de sucumbência recíproca fixada na sentença, em que cada uma das partes é, ao mesmo tempo, vencida e vencedora, e, mantida esta condenação no acórdão recorrido, não há a incidência da verba recursal, nos termos do § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - APL: 03187770720168090152, Relator.: JEOVA SARDINHA DE MORAES, Data de Julgamento: 19/06/2019, 6ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 19/06/2019) Dessa forma, é incabível atribuir ao réu Gesse qualquer responsabilidade pela suspensão do fornecimento de energia elétrica, seja por ausência de competência legal para tal medida, seja pela inexistência de prova de conduta voluntária nesse sentido. A pretensão de responsabilizá-lo por ato que não praticou, portanto, revela-se indevida. Ainda que se reconheça a condição pessoal delicada da autora — em especial quanto à enfermidade de seu filho e às dificuldades financeiras enfrentadas — tais circunstâncias, por mais lamentáveis que sejam, não geram, por si sós, o dever de indenizar. Isso porque, inexistente qualquer ato ilícito atribuível ao réu, não se configura o pressuposto essencial da responsabilidade civil. Sem ilicitude, não há que se falar em dano moral indenizável, restando desamparada de fundamento legal a pretensão indenizatória deduzida pela parte autora. No que se refere à alegação de litigância de má-fé por parte da autora, entendo que não merece acolhimento. Ainda que a tese autoral tenha sido rejeitada, o exercício do direito de ação, por si só, não configura má-fé processual, sobretudo quando os fatos narrados guardam alguma plausibilidade e se amparam em elementos subjetivos relacionados à vivência da parte. Não houve, no curso do processo, demonstração de conduta dolosa, alteração maliciosa da verdade dos fatos, resistência injustificada ao andamento do feito ou qualquer outro comportamento tipificado nos incisos do art. 80 do Código de Processo Civil. Por tais razões, afasto a preliminar de litigância de má-fé, considerando que o ajuizamento da presente ação se deu dentro do exercício legítimo do direito de petição. DA RECONVENÇÃO. No tocante ao pedido reconvencional de Gesse Alves dos Santos, constata-se que os valores cobrados são devidamente especificados e se referem a aluguéis e contas de consumo inadimplidos pela autora, que, embora tenha alegado ter sido forçada a deixar o imóvel, não apresentou qualquer prova cabal da ilicitude ou de coação que justificasse a ausência de pagamento. Como corolário do princípio da aptidão para a prova e da boa-fé objetiva, incumbe ao devedor demonstrar o pagamento (art. 319, CPC c/c art. 373, II, CPC), ônus do qual não se desincumbiu. A propósito: APELAÇÃO – AÇÃO DE DESPEJO COM COBRANÇA DE ALUGUÉIS – ADITIVOS VERBAIS – INADIMPLÊNCIA – ÔNUS DO LOCATÁRIO – ART. 373, II, CPC – IMÓVEL ABANDONADO – CONDENAÇÃO DEVIDA – AFASTAMENTO DA MULTA POR RESCISÃO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 - Não havendo o pagamento do aluguel, conforme estabelecido, materializa-se para o locador o direito de rescindir o ajuste e retomar o bem. 2 - O ônus de comprovar o pagamento de todos os aluguéis e encargos locatícios é da parte apelante/locatária, do qual não se desincumbiu a contento, mostrando-se acertada a sentença condenatória. 3 – Passando o contrato a vigorar por prazo indeterminado, não é devida a multa por rescisão estabelecida no contrato originário. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1001707-23.2022.8.11.0037, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 05/12/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/12/2023) AÇÃO DE DESPEJO C/C COBRANÇA DE ALUGUEL – CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL POR PRAZO INDETERMINADO – INADIMPLÊNCIA DEMONSTRADA – NOTIFICAÇÃO PRÉVIA – DESNECESSIDADE – REALIZAÇÃO DE OBRAS – ABATIMENTO DO MONTANTE – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO – ÔNUS DA PROVA – ART. 373, II, DO CPC – SENTENÇA MANTIDA – HONORÁRIOS RECURSAIS – RECURSO DESPROVIDO. O art. 9º, da Lei n. 8.245/1991 é suficientemente claro ao dispor que a falta de pagamento dos aluguéis autoriza a rescisão do contrato, pois, a mora, per si, é suficiente para autorizar o despejo. Na forma do art. 373, inc. II, do CPC, compete ao réu a comprovação da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, ônus do qual não se desincumbiu. Em razão do trabalho adicional empregado pelo advogado, da natureza e da importância da causa, majoram-se os honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, § 11, do CPC. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1004280-73.2021.8.11.0003, Relator.: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 12/04/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/04/2023) Assim, resta configurada a inadimplência, sendo devida a cobrança dos aluguéis vencidos e seus encargos. Por outro lado, no tocante ao pedido de indenização por danos morais formulados pelo reconvinte, observa-se ausência de qualquer comprovação mínima de dano efetivo ou abalo de ordem extrapatrimonial que justificasse reparação pecuniária. A simples alegação de abalo de imagem ou de incômodo não é suficiente para ensejar a condenação ao pagamento de indenização, devendo haver demonstração de repercussão negativa concreta. Assim, por ausência de prova do alegado, julga-se improcedente o pedido de dano moral reconvencional. DISPOSITIVO. Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTES os pedidos formulados por Carla Oliveira da Silva Matos, e PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido reconvencional de Gesse Alves dos Santos, para: CONDENAR a autora ao pagamento de R$ 2.577,60 (dois mil, quinhentos e setenta e sete reais e sessenta centavos), referente a aluguéis e encargos locatícios vencidos, que deverá ser atualizada monetariamente pelo IPCA-E, e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, ambos contados a partir do pagamento, conforme dispõe o art. 1º da Lei nº 14.905/2024, que alterou o §1º do art. 406 do Código Civil e assegura a incidência da taxa legal de juros, quando não convencionada pelas partes. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º do CPC. Todavia, fica suspensa a exigibilidade dessas verbas, nos termos do art. 98, §3º, do Código de Processo Civil, em razão da concessão da gratuidade da justiça, enquanto perdurarem os requisitos legais que justificaram o deferimento do benefício. Por fim, declaro extinto o processo com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Com o trânsito em julgado, após o cumprimento de todas as formalidades, procedendo às anotações de estilo, arquivem-se os autos. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se, expedindo o necessário e com as cautelas de estilo.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1013982-52.2023.8.11.0042

ID: 307219932

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE CUIABÁ Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO Nº Processo: 1013982-52.2023.8.11.0042

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ANTONIO FERNANDO RODRIGUES DOS SANTOS

Sentença

Advogados:

PABLO AUGUSTO BRITO VIEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1013982-52.2023.8.11.0042. Vistos. O Ministério Público do Estado de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA ESP. DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 1013982-52.2023.8.11.0042. Vistos. O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ofereceu denúncia contra ANTONIO FERNANDO RODRIGUES DOS SANTOS, pela prática, em tese, dos delitos previstos nos artigos 24-A da Lei 11.340/2006 c.c art. 147, “caput” c/c art. 61, II, “f” na forma do artigo 69, todos do Código Penal, aplicando-se, no que couber as disposições da Lei 11.340/2006, tendo como vítima MILENA MANCINELLI GONCALVES. Narra a denúncia, em suma, que: · Fato 01 – Do crime de Descumprimento de Medidas Protetivas - no dia 23 de junho de 2023, durante a madrugada, em residência situada na rua Lindomar Jairo dos Santos, número 290, bairro Jardim Itália, nesta Comarca de Cuiabá/MT, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, o denunciado ANTONIO FERNANDO RODRIGUES DOS SANTOS, descumpriu decisão judicial que deferiu medidas protetivas de urgência à vítima Milena Mancinelli Gonçalves, sua ex-companheira; · FATO 02 – Do Crime de Ameaça - no dia 23 de junho de 2023, em residência situada na rua Lindomar Jairo dos Santos, número 290, bairro Jardim Itália, nesta Comarca de Cuiabá/MT, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, o denunciado ANTONIO FERNANDO RODRIGUES DOS SANTOS, ameaçou causar mal injusto e grave a vítima Milena Mancinelli Gonçalves, sua ex-companheira. A denúncia foi recebida em 28/09/2023 (ID 130440909) e devidamente citado (ID 134688550), o denunciado apresentou resposta à acusação (ID 135555236). Entre um ato e outro, a audiência de instrução foi realizada em 29/10/2024 (ID 173887357), ocasião em que foi colhido o depoimento da vítima, da informante Natália Rodrigues dos Santos, homologada a desistência com relação ao depoimento das testemunhas Eurico Parreiras Moreira e Gilcelio Augusto Alves e, por fim, realizado o interrogatório do acusado. Em alegações finais, apresentadas na forma de memoriais escritos (ID 182967397), o Ministério Público requereu seja julgada procedente a demanda para a condenação de ANTÔNIO FERNANDO RODRIGUES DOS SANTOS como incurso no art. 24-A da lei 11.340/2006 e art. 147 do Código Penal, com as implicações da lei nº 11.340/2006, aplicando as penas necessárias e suficientes para a reprovação e prevenção do crime, bem como requereu seja fixado o valor mínimo a título de danos morais para reparação dos danos em favor da vítima, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. A Defesa, por sua vez, também em memoriais escritos, requereu a absolvição do réu por insuficiência de provas, nos termos do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, uma vez que não há elementos robustos que comprovem a materialidade e a autoria dos crimes imputados, bem como o não provimento do pedido de fixação de danos morais, por ausência de fundamento legal e fático (ID 187325992). Vieram os autos conclusos para sentença. Eis o relato necessário. Fundamento e decido. O acusado responde perante este Juízo pela prática, em tese, dos delitos previstos nos artigos 24-A da Lei 11.340/2006 c.c art. 147, “caput” c/c art. 61, II, “f” na forma do artigo 69, todos do Código Penal, aplicando-se, no que couber as disposições da Lei 11.340/2006, tendo como vítima MILENA MANCINELLI GONCALVES. I. DAS PRELIMINARES ARGUIDAS EM SEDE DE RESPOSTA À ACUSAÇÃO. Primeiramente, antes de adentrarmos ao mérito da presente denúncia, necessário se faz deliberar quanto as preliminares arguidas pela defesa em sede de resposta à acusação, cuja apreciação restou oportunamente reservada para o momento da prolação da sentença. Pois bem, a defesa suscita preliminares de inépcia da denúncia e ausência de justa causa para a ação penal, sob o argumento de que não haveria provas suficientes de autoria e materialidade, sustentando-se que a acusação estaria baseada exclusivamente nas declarações da vítima. No entanto, razão não assiste à defesa. A denúncia preenche todos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, expondo com clareza os fatos delituosos, suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a classificação dos crimes imputados (art. 24-A da Lei 11.340/06 e art. 147 do Código Penal). Ademais, há nos autos boletim de ocorrência, declarações da vítima e elementos indiciários mínimos que justificam a instauração da ação penal, sendo essa fase processual adequada à instrução e eventual produção de provas. Ressalte-se que a alegação de ausência de autoria ou materialidade não configura vício formal da denúncia, mas matéria de mérito a ser analisada após a instrução probatória. Diante disso, REJEITO as preliminares suscitadas pela defesa. II. DO JULGAMENTO COM PERSPECTIVA DE GÊNERO Inicialmente, importante registrar que, conforme se extrai do conjunto probatório, o crime imputado ao acusado foi praticado no contexto de violência doméstica contra a mulher, com motivações ligadas a questões de gênero. Diante disso, impõe-se a análise do caso sob a perspectiva de gênero, conforme preconizam a Constituição Federal e os tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, a fim de promover uma igualdade substancial no julgamento. Durante a instrução processual, essa abordagem foi observada, evitando a revitimização da ofendida e assegurando que apenas perguntas essenciais fossem dirigidas à vítima. Considerando a natureza dos crimes de violência doméstica, frequentemente praticados sem testemunhas, a palavra da vítima deve ter especial relevância, desde que apresentada de forma coerente e sem contradições. Ressalta-se, por fim, que o Conselho Nacional de Justiça instituiu o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, reforçando a necessidade de decisões judiciais que combatam padrões que perpetuam a violência de gênero, como no caso em análise. III. DO MÉRITO Primeiramente, denoto que os autos tramitaram regularmente, não havendo nenhuma irregularidade ou nulidade que impeça a prolação da sentença. Diante da incidência da Lei 11.340/06 este Juízo se torna competente para o presente julgamento. No que tange a materialidade dos delitos descritos na denúncia, está suficientemente demonstrada através do Boletim de Ocorrência (ID 126522579); pela decisão que deferiu as medidas protetivas em favor da vítima ID 126522583 - com certidão de intimação do réu no ID 126522584; termos de depoimentos; bem como pelos demais elementos de provas constantes nos autos. A autoria, por sua vez, está comprovada através dos depoimentos colhidos em Juízo que corroboram com as alegações prestadas em sede policial e com as provas juntadas nos autos. Durante a instrução processual, a vítima foi ouvida perante este Juízo, evento em que ratificou sua alegação prestada em sede policial, nos seguintes termos: “(…) Ele descumpriu na verdade, porque ele vivia me perseguindo, ele descumpriu. Promotora: Mas ele chegou a ir na casa da senhora? Ele descumpriu como? Vítima: Ele chegou a entrar, ele arrebentou minha porta, tanto que minha porta está arrebentada. (…) Promotora: É verdade que ele efetuou disparo de arma de fogo? Vítima: Sim. Promotora: Como que foi isso? Vítima: Então, ele entrou atirando, no chão, nas paredes. Promotora: Na casa da senhora? Vítima: Sim, é porque eu moro em uma kitnet né, entre a casa, o chão, as escadas, na parte de cima e na parte de baixo. (…) Promotora: Ele chegou a fazer ligações telefônicas para você também ou ele só comparecia lá na residência? Vítima: Ele fazia também, ligações, mensagens no whatsapp. (…). Promotora: Nesse dia que ele foi lá na casa da senhora atirando, a senhora estava no local? Vítima: Sim. (…) até então, quando ele entrou com a arma, ele começou a falar as coisas, ele não disparou em mim os tiros, ele ficava ameaçando dando tiros nas paredes, no chão. (…) Promotora: E o que ele falava? Vítima: Ele dizia que se eu não fosse ficar com ele, eu não ia ficar com mais ninguém, dizia isso, não aceitava o término. Promotora: A senhora ficou com medo dele? Vítima: Então, estou fazendo terapia justamente, sim, fiquei um tempo sem conseguir sair de casa (…) bastante, muito medo mesmo.” (Depoimento da vítima Milena Mancinelli Gonçalves em juízo) A informante Natália Rodrigues dos Santos (irmã do acusado), ouvida em juízo, relatou que acompanhou o relacionamento da vítima e do réu de longe. Que o réu a procurava quando brigava com a vítima. Informou que já o acusado já chegou machucado pela vítima. Nunca ouviu relatos sobre armas. Que nunca presenciou brigas, que apenas viu filmagens onde a vítima agredia o réu. O réu, quando interrogado em juízo, informou que não se lembrar se havia sido intimado das medidas protetivas. Negou ter proferido disparos de arma de fogo. Negou ter ido na residência da vítima na data dos fatos. Questionado sobre ligações e mensagens para a vítima, o acusado negou ter proferido ameaças. Pois bem, diante de todo o conjunto probatório, verifico que as afirmações da vítima, não deixam margens de dúvidas quanto à autoria delitiva do crime de lesão corporal. A palavra da vítima durante a sua oitiva na fase judicial mostrou-se coesa, uniforme e compatível com seus relatos durante a fase inquisitorial, ratificando a narrativa da peça acusatória. Cabe salientar que a palavra da vítima, nos crimes de violência doméstica e familiar, assume especial relevância, na medida em que geralmente perpetrados na clandestinidade, a salvo da presença de possíveis espectadores (STJ, HC 385.290/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 06/04/2017, DJe 18/04/2017). Registro que, as provas constantes nos autos revelam, de maneira segura, que o acusado tinha plena ciência da existência das medidas protetivas de urgência deferidas nos autos de n. 1007014-06.2023.8.11.0042 (ID 126522583), conforme se constata através da certidão de intimação de ID 126522584, que atesta que o réu fora intimado em 24/04/2023, contudo, mesmo ciente, desrespeitou as medidas impostas, se aproximando da vítima, indo até sua residência e proferindo e ameaças que a deixaram temerosa. Pois bem, diante de todo o conjunto probatório, verifico que as afirmações da vítima não deixam margens de dúvidas quanto a autoria dos delitos de descumprimento de medida protetiva e ameaça. A. Da circunstância agravante do art. 61, II, “f”, do Código Penal Com relação aos delitos de ameaça, aplico a circunstância agravante da alínea “f” do Código Penal, em razão do delito ter sido cometido com violência contra a mulher nos termos da lei 11.340/2006. Entretanto, no que tange ao crime de descumprimento de medida protetiva (artigo 24-A da Lei 11.340/06), deixo de aplicar a circunstância agravante, tendo em vista que configuraria o bis in idem, em razão de que a violência doméstica constitui elementar do crime. B. Da agravante da reincidência (art. 61, I, do CP) Em consulta ao sistema SEEU - Sistema Eletrônico de Execução Unificado, foi possível verificar que o réu possui um executivo de pena sob o número 20028897520238110042, por condenação pelo crime de Uso de documento falso (Processo 0015793-16.2013.8.11.0042), anterior a data dos fatos, o que justifica a aplicação da agravante da reincidência em seu desfavor. IV. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia para CONDENAR o denunciado ANTONIO FERNANDO RODRIGUES DOS SANTOS pela prática dos crimes previstos nos artigos 24-A da Lei 11.340/2006 c.c art. 147, “caput” c/c art. 61, II, “f” na forma do artigo 69, todos do Código Penal, aplicando-se, no que couber as disposições da Lei 11.340/2006. No que concerne à reparação dos danos causados pela infração, observadas as circunstâncias do caso, considerando o princípio da proporcionalidade/razoabilidade e levando-se em conta os prejuízos experimentados pela vítima, com espeque no art. 91, inc. I, do CP; c/c 387, inc. IV, do CPP; e Tema Repetitivo 983, do STJ, a fixação de indenização é medida que se impõe, motivo pelo qual fixo a INDENIZAÇÃO mínima no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais). V. DOSIMETRIA DE PENA a) Descumprimento de Medida Protetiva – art. 24-A da Lei 11.340/2006 A pena prevista para o crime de descumprimento de medidas protetivas é de detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, nos termos do artigo 24-A da Lei n. 11.340/06. Na primeira fase da dosimetria da pena a culpabilidade normal; reconheço que o réu é possuidor de maus antecedentes, mas deixo de agravá-los nesta fase, pois serão considerados para fins de reincidência na segunda fase, evitando o bis in idem; conduta social nada que agrave; personalidade do agente não há dados para mensurar; os motivos não há elementos que o prejudique; circunstâncias e consequência não existem dados que prejudiquem e quanto ao comportamento da vítima em nada influenciou na prática do crime. Assim, fixo a pena base em 03 (três) meses de detenção. No que tange à segunda fase, RECONHEÇO a agravante previstas no art. 61, incisos I (reincidência), do Código Penal e aumento a pena na proporção de 1/6 (um sexto), incidente sobre a pena-base, encontrando a pena de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção, uma vez que não há outras agravantes, nem atenuantes. Por fim, na terceira fase por não existir majorante ou minorante, torno a PENA provisória em DEFINITIVA, correspondendo em 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção. b) Da ameaça – art. 147 do Código Penal A pena prevista para o crime de ameaça é de detenção, de 01 (um) a 06 (seis) meses, ou multa, nos termos do artigo 147 do Código Penal. Na primeira fase da dosimetria da pena a culpabilidade normal; reconheço que o réu é possuidor de maus antecedentes, mas deixo de agravá-los nesta fase, pois serão considerados para fins de reincidência na segunda fase, evitando o bis in idem; conduta social nada que agrave; personalidade do agente não há dados para mensurar; os motivos não há elementos que o prejudique; circunstâncias e consequência não existem dados que prejudiquem, quanto ao comportamento da vítima em nada influenciou na prática do crime. Assim, fixo a pena base em 01 (um) mês de detenção. Na segunda fase, RECONHEÇO as agravantes previstas no art. 61, incisos I e II, alínea “f”, do Código Penal e aumento a pena na proporção de 1/4 (um quarto), incidente sobre a pena-base, encontrando a pena de 1 (um) mês e 7 (sete) dias de detenção, uma vez que não há outras agravantes, nem atenuantes. Por fim, na terceira fase por não existir majorante ou minorante, torno a PENA provisória em DEFINITIVA, correspondendo em 1 (um) mês e 07 (sete) dias de detenção. c) Do concurso material Constata-se que o acusado praticou mais de uma ação ocasionando na prática de dois delitos. Assim, a teor do artigo 69 do Código Penal, a consequência jurídica do concurso material requer as somas das penas, portanto a condenação resulta na pena final de 04 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção. VI. DA PENA DEFINITIVA Considerando a dosimetria da pena aplicada de forma individualizada a cada delito, com a aplicação do artigo 69 do Código Penal, A PENA FINAL RESULTA em 04 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção, a ser cumprida, em regime semiaberto, em razão de ser reincidente, segundo o artigo 33, §2º, alínea “b e c”, e §3°, do Código Penal. Quanto a substituição da pena privativa de liberdade para pena restritiva de direitos, deixo de aplicar a hipótese do artigo 44 do Código Penal, uma vez que o delito fora praticado no âmbito da Lei 11.340/2006, conforme ADI 4424 e Súmula 588 do STJ. Comunique-se o Juízo das Execuções acerca da pena imposta ao réu. Havendo objetos apreendidos, intimem-se os interessados para que manifestem interesse na sua restituição, em cinco dias. Nada sendo requerido, oficie-se a Diretoria do Foro desta Comarca para que adote as providências cabíveis quanto aos referidos objetos, a fim de que sejam destruídos/inutilizados, observado, no que couber, o disposto no art. 123 do Código de Processo Penal. Transitada em julgado, oficie-se à Justiça Eleitoral (art. 15, III da CF/88), forme-se o PEP, escrevendo-se o nome do réu no rol dos culpados. Expeça-se o necessário. Expeça-se a carta de execução de pena instruindo-a com cópia da denúncia, da sentença e do trânsito em julgado, nos moldes do artigo 1.555 da CNGC/TJMT. CONDENO o réu ao pagamento das custas processuais. CIÊNCIA ao Ministério Público e a Defesa. INTIME-SE o réu através de sua defesa constituída nos autos, nos termos do artigo 392, inciso II, do Código de Processo Penal. INTIME-SE a vítima. Publique-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Tatyana Lopes de Araújo Borges Juíza de Direito

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Ronildo Pereira Medeiros x Águas Cuiabá S.A. - Concessionária De Serviços Públicos De Água E Esgoto

ID: 309915586

Tribunal: TJMT Órgão: 11ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1013982-94.2019.8.11.0041

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

RONILDO PEREIRA MEDEIROS

Polo Passivo:

ÁGUAS CUIABÁ S.A. - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA E ESGOTO

Sentença

Advogados:

ANA CAROLINE APARECIDA SOUZA PEREIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RONILDO PEREIRA DE MEDEIROS JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE SENTENÇA Processo: 1013982-94.2019.8.11.0041 AUTOR(A): RONILDO PEREIRA MEDEIROS REU: ÁGUAS CUIABÁ S.A. - … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE SENTENÇA Processo: 1013982-94.2019.8.11.0041 AUTOR(A): RONILDO PEREIRA MEDEIROS REU: ÁGUAS CUIABÁ S.A. - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA E ESGOTO VISTOS. Trata-se de ação AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA movida RONILDO PEREIRA MEDEIROS em face de ÁGUAS CUIABÁ S.A. - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA E ESGOTO, ambos devidamente qualificados nos autos. Consta na inicial que o autor, alegando ser consumidor dos serviços de fornecimento de água prestados pela requerida, narra que houve aumento injustificado nas faturas de consumo nos meses de janeiro, fevereiro e março de 2019, culminando no corte do fornecimento de água em sua residência sem aviso prévio. Sustenta ter solicitado administrativamente vistoria e revisão das cobranças, além de alegar inexistência de vazamentos internos. Requereu o restabelecimento do serviço, a declaração de inexigibilidade dos débitos e indenização por danos morais, além da inversão do ônus da prova. (ID. 19166370) Recebida a inicial, foi proferida decisão interlocutória em que se deferiu o pedido de tutela provisória de urgência para o restabelecimento do fornecimento de água. Ainda, foi concedida a gratuidade da justiça. (ID. 19883948) Realizada audiência de conciliação em 22/07/2019, esta restou infrutífera, não havendo composição entre as partes. (ID. 21950851) A parte requerida apresentou contestação (ID. 22299343), ocasião em que alegou que as faturas discutidas decorrem de fraude no hidrômetro, com adulteração detectada por seus prepostos. Defendeu a legalidade das cobranças, inexistência de falha na prestação do serviço e ausência de danos morais, arguindo também culpa exclusiva do autor e litigância de má-fé. Requereu a improcedência dos pedidos autorais. (ID. 22299343) Intimada, a parte autora apresentou impugnação (ID. 22811243), oportunidade em que reiterou suas alegações iniciais, refutou a acusação de fraude no hidrômetro e sustentou a inexistência de vazamentos, reiterando os pedidos formulados na exordial. (ID. 22811243) Foi proferida decisão de declínio de competência, reconhecendo-se a conexão a ação n. 1040110-88.2018.8.11.0041 previamente ajuizadas pelo autor, sendo determinada a redistribuição para a 11ª Vara Cível. (ID. 35755133) Posteriormente, foi proferida decisão de saneamento, na qual o feito foi declarado saneado e fixados como pontos controvertidos a ilicitude da conduta da requerida, eventual má prestação do serviço, a existência de dano moral e o nexo de causalidade. Determinou-se que as partes manifestassem sobre a produção de provas no prazo legal. (ID. 41753737) A parte requerida requereu a produção de prova testemunhal e depoimento pessoal do autor, com o objetivo de comprovar os fatos narrados em sua contestação. Declarou não ter interesse na produção de prova pericial, alegando tratar-se de prova impossível, pois foi realizada a substituição do antigo aparelho medidor. (ID. 42598435). A parte requerente deixou transcorrer o prazo sem manifestação. Na sequência (ID. 87226281), determinou-se o aguardo da conclusão dos trabalhos periciais designados nos autos associados (Processo n. 1028074-14.2018.8.11.0041). Instado, a reclamada manifestou favorável ao laudo pericial produzido nos autos n. 1028074-14.2018.8.11.0041, bem como requereu o julgamento antecipado (ID. 141706884). Em seguida, os autos vieram conclusos para prolação de sentença. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Verifico que o presente feito se ocupa de matéria unicamente de direito, comportando julgamento no estado em que se encontra, revelando, por conseguinte, a desnecessidade de iniciar fase instrutória (Código de Processo Civil, Art. 355, inciso I). Inicialmente, cumpre salientar que a relação estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, nos termos dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), sendo o autor destinatário final do serviço público essencial de fornecimento de água prestado pela ré, concessionária de serviço público. Aplica-se, portanto, ao presente feito, o microssistema protetivo consumerista, inclusive quanto à possibilidade de inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Extrai-se dos autos que o autor foi surpreendido com elevação significativa e injustificada nos valores das faturas de consumo de água referentes aos meses de janeiro, fevereiro e março de 2019, sem que houvesse qualquer alteração nos hábitos de consumo ou indícios de vazamento interno no imóvel. Mesmo após a apresentação de requerimento administrativo para revisão das cobranças, a concessionária manteve os valores integralmente e, posteriormente, promoveu o corte no fornecimento de água na residência do autor, sem a devida notificação prévia. Em sede de contestação, a requerida alegou que os valores cobrados decorreram de suposta fraude no hidrômetro, identificada por seus prepostos, consistente em adulteração do equipamento. Consta nos autos do Processo n. 1028074-14.2018.8.11.0041 que, por ocasião de vistoria realizada para fins periciais, foi constatada a substituição do hidrômetro, tendo-se ainda registrado que o equipamento estaria em desconformidade com os padrões estabelecidos pelo INMETRO. Apesar da impossibilidade de realização de perícia técnica no hidrômetro originalmente instalado à época dos fatos, verifica-se que os valores das faturas impugnadas são significativamente discrepantes em comparação com os meses anteriores, o que evidencia a existência de cobrança indevida. Ressalte-se, ademais, que a parte autora ostenta a condição de hipossuficiente frente à concessionária de serviços públicos, a qual detém o ônus de demonstrar a regularidade de suas cobranças mediante os meios técnicos adequados. A condução unilateral de procedimentos administrativos, sem a efetiva participação do consumidor, configura violação aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Nesse sentido, colacionam-se os seguintes precedentes do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE FATURAS C/C DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA E ESGOTO. ALEGAÇÃO DE FRAUDE EM HIDRÔMETRO. NULIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. INOBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. COBRANÇA INDEVIDA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por MARIA SIRLEY ROCHA contra sentença que julgou totalmente improcedentes os pedidos formulados em ação revisional de faturas c/c declaração de inexistência de débito e indenização por danos morais, movida em face da concessionária ÁGUAS CUIABÁ S.A. A consumidora contesta a exigibilidade de multas no valor de R$ 1.010,57 cada uma, bem como a revisão de faturas com consumo elevado nos meses de janeiro (39m³) e fevereiro (56m³) de 2018, sob alegação de cobrança indevida decorrente de fraude no hidrômetro. II. Questão em discussão 2. Há três questões centrais em discussão: (i) saber se o procedimento administrativo instaurado pela concessionária para apuração de fraude no hidrômetro observou os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa; (ii) verificar se as cobranças impugnadas possuem fundamento técnico e legal adequado, considerando as irregularidades identificadas na prestação do serviço; e (iii) determinar se a suspensão do fornecimento de água com base em débito constituído irregularmente configura dano moral indenizável. III. Razões de decidir 3. O laudo pericial demonstrou que a concessionária não notificou previamente a consumidora para acompanhar a vistoria realizada no hidrômetro, violando os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa no procedimento administrativo, conforme orientação fixada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º 1.412.433/RS. 4. A perícia técnica constatou que o hidrômetro que registrou os consumos questionados foi substituído pela concessionária sem aferição por órgão oficial e sem preservação adequada para análise judicial, comprometendo significativamente a possibilidade de comprovação técnica das alegações da empresa. 5. Ficou demonstrado que a concessionária emitiu faturas com base em estimativa de consumo durante longo período (05/2012 a 09/2018), sem realizar leitura efetiva do hidrômetro na maioria dos meses, prática irregular que viola a Resolução AMAES nº 05/2012 e compromete a confiabilidade das medições. 6. A perícia revelou deficiência na prestação do serviço, com pressão manométrica de apenas 6,0 m.c.a., muito inferior ao mínimo de 10,0 m.c.a. estabelecido pela norma ABNT NBR 12218, obrigando os moradores a adotarem medidas paliativas para armazenamento de água. 7. O hidrômetro encontrado na residência durante a perícia foi reprovado em teste laboratorial realizado pelo IPEM-MT, apresentando desempenho desfavorável aos ensaios do Regulamento Técnico Metrológico, demonstrando a precariedade dos equipamentos utilizados pela concessionária. 8. A inobservância do dever de preservação do hidrômetro originalmente instalado configura conduta processual contrária aos postulados da boa-fé objetiva e ao dever de cooperação previsto no artigo 6º do Código de Processo Civil, não podendo ser interpretada em desfavor da consumidora hipossuficiente. 9. Configura-se dano moral in re ipsa a suspensão indevida do fornecimento de água, serviço público essencial, com fundamento em débito constituído à margem do devido processo legal administrativo, dispensando comprovação específica do prejuízo extrapatrimonial. IV. Dispositivo e tese 10. Recurso conhecido e provido para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais, declarando a inexigibilidade das faturas de janeiro e fevereiro de 2018 e das multas aplicadas, condenando a apelada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. Tese de julgamento: "1. A constatação de fraude em medidor de consumo de água deve observar os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, sob pena de nulidade do procedimento administrativo e inexigibilidade dos débitos dele decorrentes. 2. A substituição de hidrômetro sem preservação adequada para perícia técnica e a emissão sistemática de faturas por estimativa sem justificativa legal configuram falha na prestação do serviço e comprometem a legitimidade das cobranças. 3. A suspensão indevida de serviço público essencial com base em débito irregularmente constituído caracteriza dano moral in re ipsa, dispensando prova específica do prejuízo extrapatrimonial." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, LIV e LV; Lei nº 8.078/90, art. 14; CPC, art. 6º; Resolução AMAES nº 05/2012, art. 58; ABNT NBR 12218. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.412.433/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 25/04/2018; STJ, REsp 1.694.437/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 16/11/2017; Súmula 362/STJ. (N.U 1017143-49.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025) DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. SUSPENSÃO INDEVIDA DE FORNECIMENTO DE ÁGUA. COBRANÇA ABUSIVA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DO VALOR ARBITRADO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais para declarar inexistente débito de R$ 183,12, determinar revisão da fatura com base na média de consumo dos últimos seis ciclos anteriores e condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00, decorrente de suspensão indevida do fornecimento de água motivada por cobrança abusiva de valores inexistentes. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em analisar a adequação do quantum indenizatório fixado a título de danos morais, pretendendo a apelante sua majoração sob o argumento de insuficiência do valor arbitrado diante da gravidade dos fatos, considerando a abusividade da cobrança de R$ 1.587,49 referente à suposta fraude no hidrômetro e R$ 183,12 de serviço de esgoto não prestado, confirmada por laudo pericial que comprovou vazamento no hidrômetro e erro na medição. III. Razões de decidir 3. O dano moral resultante da suspensão indevida do fornecimento de água constitui dano in re ipsa, dispensando comprovação específica do prejuízo, pois presumida a ofensa à honra e à dignidade do consumidor quando privado de serviço essencial por cobrança abusiva. 4. A fixação do quantum indenizatório deve observar os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, considerando as circunstâncias do caso concreto, a gravidade do dano, a situação do ofensor, a condição do lesado e a finalidade compensatória e pedagógica da indenização, evitando tanto o enriquecimento sem causa quanto a irrelevância do valor. 5. O valor de R$ 3.000,00 arbitrado pelo juízo de origem revela-se adequado e proporcional às particularidades da causa, contemplando a suspensão de serviço essencial decorrente de cobrança de valores indevidos comprovadamente inexistentes, atendendo ao caráter compensatório e dissuasório da reparação civil. IV. Dispositivo e tese 6. Apelação cível desprovida. Tese de julgamento: "O quantum indenizatório por danos morais decorrente de suspensão indevida de fornecimento de água deve observar os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, mantendo-se o valor arbitrado quando adequado às circunstâncias do caso concreto e à finalidade compensatória e pedagógica da reparação civil." Dispositivos relevantes citados: CC/2002, arts. 186, 927; CDC, arts. 6º, VI, 14; CPC/2015, art. 85. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, Apelação Cível nº 10130911020188110041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 26/06/2024. (N.U 1015116-93.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025). Posto isso, revela-se indevida a cobrança constante nas faturas impugnadas, porquanto desprovida de fundamento fático e jurídico apto a justificar a elevação abrupta dos valores. Diante da ausência de prova robusta quanto à suposta fraude no medidor, e considerando-se a inversão do ônus da prova, imposta em razão da hipossuficiência do consumidor e da verossimilhança das alegações, impõe-se o reconhecimento da irregularidade das cobranças, nos termos do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. No que tange aos danos morais, é cediço que a configuração da responsabilidade civil exige a presença concomitante de três elementos: a prática de ato ilícito, seja comissivo ou omissivo; a ocorrência de dano; e o nexo causal entre ambos. Nesse sentido, dispõem os artigos 186 e 927 do Código Civil: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. A simples cobrança indevida não gera obrigação de indenizar a título de dano moral, entretanto, a interrupção do fornecimento de água, como ocorreu no caso em apreço, constitui dano in re ipsa, dispensando comprovação específica do prejuízo, pois presumida a ofensa à honra e à dignidade do consumidor quando privado de serviço essencial por cobrança abusiva, razão pela qual arbitro o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a fim de reparar o dano alegado na inicial. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para: a) Tornar definitiva a tutela de urgência concedida no ID. 19883948; b) DECLARAR indevidos os débitos das faturas referentes aos meses janeiro, fevereiro e março de 2019, determinando o seu cancelamento e revisão das faturas pela média de consumo dos seis meses anteriores; c) CONDENAR a requerida a pagar à parte autora a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), à título de dano moral, sobre o qual incidirão juros de mora de 1% ao mês, a partir do evento danoso (abril/2019), e correção monetária (IPCA/IBGE) a partir do arbitramento, a título de dano moral (art. 398 do CC/02, e súmulas 54 e 362 do STJ). d) Condenar, ainda, a parte requerida ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85 do Código de Processo Civil. Interposto eventual Recurso de Apelação, INTIME-SE a parte recorrida para a apresentação de contrarrazões. Caso contrário e operado o trânsito em julgado, certifique-se. Observadas as formalidades legais, proceda-se à baixa dos autos no sistema eletrônico, arquivando-se o feito com as cautelas de estilo. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE. CUMPRA-SE expedindo o necessário. ÀS PROVIDÊNCIAS. Sapezal (MT) para Cuiabá (MT), data da assinatura digital. (assinado eletronicamente) LUIZ GUILHERME CARVALHO GUIMARÃES Juiz de Direito designado para o NAE Portaria TJMT/CM n. 866/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou 200 resultados. Faça login para ver detalhes completos e mais informações.

Fazer Login para Ver Detalhes