Processo nº 1000140-53.2018.8.11.0018
ID: 321687602
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000140-53.2018.8.11.0018
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LINDOMAR EDUARDO BROL RODRIGUES
OAB/MS XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 1000140-53.2018.8.11.0018 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, INDENIZA…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 1000140-53.2018.8.11.0018 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL] RELATOR: EXMO. SR. DES. MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA TURMA JULGADORA: [EXMO. SR. DES. MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JUNIOR, EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS, EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, EXMA. SRA. DESA. VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] PARTE(S): [DANIEL SARMENTO SILVA - CPF: 203.056.561-04 (APELANTE), LINDOMAR EDUARDO BROL RODRIGUES - CPF: 984.465.761-04 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (APELADO), Show de Notícias (APELADO), FERNANDO DO NASCIMENTO MELO - CPF: 933.166.151-72 (ADVOGADO), Guiame.com.br (APELADO), DANIELLA VIERI ITAYA - CPF: 272.308.588-01 (ADVOGADO), GAZETA DIGITAL LTDA - ME - CNPJ: 03.978.714/0001-67 (APELADO), LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO - CPF: 054.525.141-98 (ADVOGADO), CLAUDIO STABILE RIBEIRO - CPF: 365.942.709-82 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELADO), M. C. DA ROZA PROMOCOES E EVENTOS - CNPJ: 10.210.000/0001-70 (APELADO), PORTAL GUIA-ME SERVICOS DE PROCESSAMENTO DE DADOS LTDA - CNPJ: 08.140.174/0001-61 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS IN IPSA. ACUSAÇÃO CRIMINAL INDEVIDA. PRISÃO CAUTELAR POR 10 MESES. POSTERIOR ABSOLVIÇÃO. EXCESSO DE PRAZO CONFIGURADO. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. PEDIDO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de Apelação interposto contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de indenização por danos morais formulados pelo Apelante em face do Estado de Mato Grosso e veículos de comunicação. O Apelante foi acusado injustamente de crimes graves, permanecendo preso cautelarmente por 10 meses, sendo posteriormente absolvido por falta de provas. Busca o reconhecimento da responsabilidade civil do Estado pelos danos morais decorrentes da prisão excessiva. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a manutenção da prisão cautelar do Apelante por 10 meses, seguida de absolvição, configura excesso passível de indenização por danos morais; (ii) estabelecer se os veículos de comunicação extrapolaram os limites da liberdade de imprensa ao divulgar notícias sobre a prisão do Apelante. III. RAZÕES DE DECIDIR A prisão cautelar do Apelante por 10 meses, seguida de sua absolvição por falta de provas, configura manifesto excesso e violação aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e presunção de inocência. O prazo excessivo de privação da liberdade, sem lastro probatório suficiente para condenação, ultrapassa os limites aceitáveis da prisão cautelar e caracteriza erro judiciário indenizável. Estão presentes os requisitos para a responsabilização civil objetiva do Estado: o fato (prisão por 10 meses), o dano moral e o nexo causal entre a prisão e os danos sofridos. As notícias veiculadas pelos veículos de comunicação não extrapolaram os limites do exercício regular do direito de informar, não havendo comprovação de dolo ou culpa grave. IV. DISPOSITIVO E TESE Pedido julgado parcialmente procedente. Recurso provido para condenar o Estado de Mato Grosso ao pagamento de R$ 50.000,00 a título de indenização por danos morais, mantida a improcedência em relação aos veículos de comunicação. A prisão cautelar indevida por período excessivo, seguida de absolvição por falta de provas, configura erro judiciário e gera dano moral presumido, ensejando a responsabilização civil objetiva do Estado. O exercício regular do direito de informar pela imprensa, sem dolo ou culpa grave, afasta o dever de indenizar por danos morais decorrentes da divulgação de notícias sobre investigações criminais. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LVII, LXXV, art. 37, § 6º; CC, art. 927. Jurisprudência relevante citada: (AgInt no REsp n. 1.947.432/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 9/12/2024, DJEN de 12/12/2024.) R E L A T O R I O EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA(RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação interposto por Daniel Sarmento Silva em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Juara-MT que, nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais proposta pelo apelante em desfavor do Estado de Mato Grosso, Show de Notícias, Gazeta Digital e Portal Guia -ME, julgou improcedentes os pedidos contidos na exordial e julgou extinto o feito, com resolução de mérito , nos termos do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil. Irresignado, em suas razões, o apelante aduz que permaneceu preso por 10 (dez) meses, sob a acusação da prática dos crimes de homicídio qualificado, apropriação indébita e estelionato, previstos nos artigos 121, §2º, incisos II, III e IV, 168 e 171, respectivamente, todos do Código Penal. Consigna que a Ação Penal tramitou de 2007 até o ano de 2016 e, resultou na absolvição do réu de todas as acusações, por falta de provas. No decorrer do trâmite processual, afirma que constantemente foi acusado pelos crimes os quais lhe foram imputados, alega que a mídia explorou de maneira exaustiva o caso, e, o condenou antes mesmo da promulgação da sentença judicial. Nesse cenário, alega que sofreu agressões físicas e morais por parte de populares, em decorrência das divulgações e notícias veiculadas nas mídias, que o vinculavam à prática de crimes hediondos. Assevera também que tal situação culminou na perda de emprego, bem como teve sua residência destruída por populares. Além disso, afirma que perdeu amizades, rompeu com relações familiares o que resultou em severos prejuízos materiais e psicológicos. Afirma que enfrentou severas dificuldades financeiras, as quais foram agravadas pela grande repercussão da acusação que o apontava como autor dos crimes citados anteriormente. Argumenta ainda que, apesar da sua absolvição, as consequências da acusação não foram consideradas, que permanece estigmatizado como criminoso perante a sociedade. Consigna que, apesar de ter sido absolvido por meio do júri popular, encontra-se efetivamente condenado de outras formas. Registra que a manutenção de sua prisão além do prazo razoável, sem que houvesse condenação definitiva demonstra falha do Estado e falha no sistema de proteção de seus direitos fundamentais. Alega que houve erro do Judiciário ao entender que a prisão cautelar era devida e a manteve por um período prolongado, o que acarretou danos irreparáveis. Aduz que a prisão cautelar do Autor perdurou por 10 meses, o que, por si só, evidencia um desrespeito ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, previstos no art. 5º, LIV, da CF/88. Quanto aos veículos de comunicação apelados, afirma que ao divulgarem as notícias sobre a prisão do Apelante, não se limitaram a informar os fatos. Ao contrário, procederam à publicação de matérias sensacionalistas, repletas de juízos de valor, que induziram a opinião pública a acreditar na culpa do Apelante, antes mesmo de qualquer julgamento. Que tal conduta violou o princípio da presunção de inocência, assegurado pelo artigo 5º, LVII da Constituição Federal, e configurou abuso de direito. Diante da configuração dos elementos da responsabilidade civil – conduta ilícita, dano e nexo causal – alega que é imperativa a condenação dos veículos de comunicação ao pagamento de indenização por danos morais. Ao final, requer seja conhecido e provido o presente recurso de apelação para reconhecer o direito do Apelante à indenização pelos danos sofridos, condenando os Apelados à devida reparação dos prejuízos causados. Devidamente intimados, os apelados, Portal Guia-ME Serviços de Processamento de Dados LTDA, Show de Notícias, e Gazeta Digital apresentaram contrarrazões, oportunidade em que, pugnam pelo desprovimento recursal. (ids. 276361010, 276361011 e 276361012 respectivamente.) O Estado de Mato Grosso, apesar de devidamente intimado, deixou de apresentar contrarrazões. (id. 276361013) Sem parecer da Procuradoria Geral de Justiça. É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (RELATOR): Egrégia Câmara: Conforme relatado, trata-se de recurso de Apelação interposto por Daniel Sarmento Silva em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Juara-MT que, nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais proposta pelo apelante em desfavor do Estado de Mato Grosso, Show de Notícias, Gazeta Digital e Portal Guia -ME, julgou improcedentes os pedidos contidos na exordial e, julgou extinto o feito, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil. O Eminente Julgador a quo realizou uma análise criteriosa e fundamentada dos fatos e das provas carreadas aos autos, concluindo acertadamente pela improcedência dos pedidos formulados em face do Estado de Mato Grosso e das requeridas veículos de comunicação (Show de Notícias, Gazeta Digital e Portal Guia-ME). Pois bem. Embora a prisão tenha sido inicialmente decretada com base em indícios, a manutenção do Apelante na prisão pelo período de 10 (dez) meses, seguida de sua absolvição por meio do julgamento perante o Tribunal do Juri por falta de provas, configura manifesto excesso e violação aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e presunção de inocência. Nesse contexto, o prazo de 10 (dez) meses de privação da liberdade, sem que houvesse lastro probatório suficiente para uma condenação, ultrapassa os limites aceitáveis da prisão cautelar e caracteriza erro judiciário indenizável. A jurisprudência é pacífica no sentido de que a prisão cautelar indevida, ainda que decretada com base em indícios iniciais, seguida de absolvição por insuficiência de provas, configura dano moral presumido e gera o dever de indenizar por parte do Estado, independentemente da demonstração de erro processual ou abuso. Vejamos a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRISÃO ILEGAL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. EFETIVO DEBATE DA TESE RECURSAL. AUSÊNCIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 282/STJ. 1. Conquanto tenha o acórdão recorrido estabelecido um termo inicial para a incidência dos juros de mora, ou seja, tenha resolvido a lide quanto ao ponto, não apreciou, tampouco se pronunciou a respeito da tese desenvolvida no apelo nobre, segundo a qual, por se tratar de indenização por dano moral, os consectários legais devem ser considerados apenas após o arbitramento do valor devido. 2. Para que seja considerada prequestionada a tese suscitada em recurso especial, não é suficiente que a Corte de origem tenha dado solução para a questão, mas deve ter apreciado e se manifestado a respeito do argumento provocado, ensejando efetivo debate sobre a tese recursal. Dessarte, inafastável a incidência da vedação prevista na Súmula 282/STF. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.947.432/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 9/12/2024, DJEN de 12/12/2024.) Nesse sentido, o excesso de prazo na prisão cautelar, associado à posterior absolvição por falta de provas, evidencia a falha do sistema na proteção dos direitos fundamentais do Apelante, especialmente o princípio da presunção de inocência. Nesse cenário, evidente que, no período em que o Apelante permaneceu com sua liberdade segregada, deixou de auferir lucros, bem como de exercer a sua função de Pastor perante à comunidade, e lhe ocasionou abalo moral, ainda que não haja irregularidade na tramitação processual deve-se considerar que, cabia ao Ministério Público Estadual demonstrar o ônus da prova ao passo que deveria comprovar as alegações inseridas na denúncia, bem como a materialidade e indícios de autoria dos crimes imputados ao apelante, o que não ocorreu. Nesse contexto o cidadão merece ser recompensado pelo tempo em que permaneceu segregado, ainda que não houvesse provas suficientes para a manutenção da prisão, assim sendo, o Estado deve ser responsabilizado pelos danos morais decorrentes dessa injustiça. Corroboro, é inegável o abalo psicológico e emocional sofrido pelo Apelante em decorrência da prisão prolongada e da posterior estigmatização social, mesmo após a sua absolvição. Portanto, estão presentes os requisitos para a responsabilização civil objetiva do Estado, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal: o fato (prisão cautelar por 10 meses), o dano moral (abalo psicológico, constrangimento social e violação à presunção de inocência) e o nexo causal (a prisão excessiva foi a causa direta dos danos sofridos). Colaciono entendimento: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – AUTOR QUE RESPONDEU POR PROCESSO CRIMINAL PELO DELITO DE HOMICIDIO QUALIFICADO – ABSOLVIÇÃO PELO TRIBUNAL DE JÚRI QUE NÃO RECONHECEU A AUTORIA DELITIVA - DECRETAÇÃO DA CUSTÓDIA PREVENTIVA – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – CONDUTA LÍCITA QUE CAUSOU DANO E ENSEJA O DEVER REPARATÓRIO – DANO MORAL CONFIGURADO- AÇÃO PROCEDENTE- INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA- RECURSO PROVIDO. Para a responsabilidade do Estado não se exige a ilicitude de sua atuação, basta que fique comprovado dano causado pela conduta do ente estatal. Inadmissível que uma pessoa fique presa, não se comprove sua responsabilidade penal e ao final tenha como adequada a prisão. A absolvição é prova cabal que a pessoa suportou dano, ainda que provinda de uma conduta lícita.(N.U 1012486-93.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 16/11/2021, Publicado no DJE 03/12/2021) Insta consignar que não há um critério estabelecido por lei para fixar o valor da indenização dos danos morais, cabendo ao julgador, de acordo com o seu prudente arbítrio e sopesando as circunstâncias do caso concreto, a possibilidade econômica do ofendido e do ofensor, estimar uma quantia que se mostre razoável e proporcional. Nesse sentido, é o ensinamento do ilustre doutrinador Sergio Cavalieri Filho (in Programa de Responsabilidade Civil, ed. 10, 2012, p. 105), in verbis: “(...)Creio que na fixação do quantum debeatur da indenização, mormente tratando-se de lucro cessante e dano moral, deve o juiz ter em mente o princípio de que o dano não pode ser fonte de lucro.A indenização, não há dúvida, deve ser suficiente para reparar o dano, o mais completamente possível, e nada mais.Qualquer quantia a maior importará enriquecimento sem causa, ensejador de novo dano. Creio, também, que este é outro ponto onde o princípio da lógica do razoável deve ser a bússola norteadora do julgador. Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda uma certa proporcionalidade. Enfim, razoável é aquilo que é, ao mesmo tempo, adequado, necessário e proporcional . (...)Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes” (Destaquei). Diante do exposto, quanto ao valor da indenização, fixo-a em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), quantia que se mostra razoável e proporcional para reparar os danos morais suportados pelo Apelante, considerando a gravidade do fato, o período prolongado de privação de liberdade, os impactos psicológicos e sociais sofridos, bem como os parâmetros adotados pela jurisprudência em casos semelhantes. No que tange a responsabilidade civil dos veículos de comunicação, acompanho o entendimento do Juízo a quo no sentido de que não houve comprovação de que as reportagens tenham extrapolado os limites do exercício regular do direito de informar, razão pela qual deve ser mantida a improcedência do pedido indenizatório em relação a estas requeridas. A responsabilidade civil dos veículos de comunicação, releva-se os limites do exercício do direito constitucional à liberdade de imprensa, assim conclui-se que as notícias veiculadas não extrapolaram os referidos limites, tendo se pautado em fatos públicos e informações repassadas pelos órgãos de persecução penal. Nesse contexto, ausente a comprovação de dolo ou culpa grave por parte dos veículos de comunicação na apuração e divulgação dos fatos, não há que se falar em dever de indenização, sob pena de configuração de censura prévia e violação à liberdade de expressão. Ante o exposto, conheço e dou parcial provimento ao recurso de apelação interposto por Daniel Sarmento Silva. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR (2º VOGAL): Egrégia Câmara: Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação interposto por Daniel Sarmento Silva contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Juara/MT que, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais proposta em desfavor do Estado de Mato Grosso, bem como dos veículos de comunicação denominados Show de Notícias, Gazeta Digital e Portal Guia-ME, julgou improcedentes os pedidos formulados na exordial, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. O juízo de origem, mediante criteriosa análise dos elementos fático-probatórios constantes dos autos, concluiu pela inexistência de responsabilidade civil dos requeridos, reconhecendo a legalidade dos atos praticados e a ausência de ilicitude apta a ensejar a reparação pleiteada, tanto no tocante ao ente público quanto aos órgãos de imprensa. Inconformado, o apelante sustenta que permaneceu encarcerado por aproximadamente dez meses, em decorrência de denúncia que lhe imputava a prática dos crimes de homicídio qualificado, apropriação indébita e estelionato, tipificados, respectivamente, nos artigos 121, §2º, incisos II, III e IV; 168; e 171, todos do Código Penal. Alega que, ao final da persecução penal, que se estendeu de 2007 a 2016, foi absolvido de todas as acusações por insuficiência de provas. Com base em tais alegações, pugna pela reforma da sentença, com o reconhecimento do dever dos apelados de indenizá-lo pelos danos materiais e morais que afirma ter suportado em virtude da persecução penal injusta e da ampla exposição negativa promovida pelos meios de comunicação demandados. O eminente Desembargador Relator, Mário Roberto Kono de Oliveira, deu parcial provimento ao recurso, afastando a responsabilidade dos veículos de comunicação, mas reconhecendo o direito à indenização por danos morais, condenando o Estado de Mato Grosso ao pagamento da quantia de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), valor que entendeu justo e proporcional, em face da gravidade da privação de liberdade e dos efeitos presumidamente sofridos pelo apelante, à luz da jurisprudência em casos semelhantes. Com a devida vênia, divirjo do entendimento do ilustre Relator, por entender que o caso em apreço não configura qualquer das hipóteses excepcionais previstas no ordenamento jurídico que autorizariam a responsabilização civil objetiva do Estado por ato jurisdicional. A responsabilidade objetiva do Estado, prevista no artigo 37, §6º, da Constituição da República, não se aplica indistintamente aos atos praticados no exercício da função jurisdicional, cuja responsabilização depende da configuração de erro judiciário, prisão além do tempo fixado em sentença condenatória ou mora irrazoável na prestação jurisdicional, nos termos do artigo 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal e da jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, destaco o julgamento do ARE 833909 AgR/SC, de relatoria do Ministro Roberto Barroso, no qual a Suprema Corte reafirmou que a mera existência de denúncia criminal ou a posterior absolvição do réu não configuram, por si só, fundamento para a indenização por danos morais, ausente erro judiciário ou excesso de prazo na prisão, senão vejamos: "DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. VINCULAÇÃO AO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO TRIBUNAL DE ORIGEM. INVIABILIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO JUDICIAL. HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. PRECEDENTES. 1. O relator não precisa rebater, nem está vinculado aos fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem no juízo de admissibilidade. Precedentes. 2. A responsabilidade objetiva do Estado por atos judiciais só é possível nas hipóteses previstas em lei, sob pena de contenção da atividade do Estado na atividade jurisdicional regular. No caso dos autos, não houve prisão além de tempo fixado em sentença, nem erro judiciário. A mera denúncia pelos promotores não enseja dano moral indenizável, mesmo que posteriormente o acusado tenha sido considerado inocente. Precedentes. 3. Agravo interno a que se nega provimento." (Grifei). (STF. ARE 833909 AgR/SC. Relator Ministro Roberto Barroso. Dje 02/05/2017)(g.n) Este Egrégio Tribunal de Justiça, em consonância com tal entendimento, tem reiteradamente decidido que a prisão cautelar regularmente decretada, ainda que ao final sucedida de absolvição, não gera automaticamente o dever de indenizar, quando fundada em indícios concretos de autoria e materialidade e proferida nos estritos limites legais, conforme demonstram os julgados a seguir colacionados: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – RESPONSABILIDADE CIVIL – ERRO JUDICIÁRIO – INOCORRÊNCIA – PRISÃO EM FLAGRANTE – INDÍCIOS DA PRÁTICA DO CRIME – POSTERIOR COMPROVAÇÃO DE AUSÊNCIA DE CONCORRÊNCIA PARA INFRAÇÃO PENAL – EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO – RECURSO DESPROVIDO – SENTENÇA MANTIDA. Embora a prisão cautelar possa causar transtornos emocionais ao preso, não pode ensejar, per si, a responsabilização do Estado por dano moral, quando, após a conclusão do inquérito policial, dentro do prazo estabelecido em lei, for apurado a ausência de provas da autoria dos delitos. (N.U 0038624-95.2012.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA RIBEIRO, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 16/05/2019, Publicado no DJE 16/05/2019)(g.n) “APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRISÃO INDEVIDA – INOCORRÊNCIA – EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE – PRISÃO PREVENTIVA – POSSIBILIDADE – INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR – RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO CONFIGURADA – DANOS MORAIS INDEVIDOS – RECURSO PROVIDO. O dever de indenizar do Estado ocorre somente quando há prisão ilegal, com abuso de poder, excesso ou desvio na execução do ato, hipóteses inocorrentes nos autos. O decreto de prisão preventiva requer prova da materialidade e indícios suficientes da autoria e as razões que justificam a urgência”. (Ap 80483/2015, Des. JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 13-09-2016).(g.n) "APELAÇÃO — INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS — PRISÃO — RESPONSABILIDADE DO ESTADO — NÃO VERIFICAÇÃO — EXERCÍCIO REGULAR DA ATIVIDADE ESTATAL — CONSTATAÇÃO. “[...] O exercício regular da atividade estatal não pode ser capaz de gerar indenização. Afinal, é preciso que tenha o agente margem de segurança e largueza para fazer o seu trabalho repressivo [...]”. (Trecho do voto da relatora: STJ, Segunda Turma, REsp 337.225/SP, Ministra Eliana Calmon, DJ 14/4/2003). Recurso do Estado de Mato Grosso provido. Recurso de Domingos Guimarães Soares prejudicado." (Ap 173541/2014, DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 10/11/2015, Publicado no DJE 30/11/2015).(g.n) No caso em exame, não se verifica excesso de prazo na prisão preventiva, tampouco qualquer indício de conduta dolosa, fraudulenta ou abusiva por parte das autoridades envolvidas na persecução penal. A prisão foi decretada com base em elementos concretos reunidos na fase investigativa, os quais apontavam a materialidade delitiva e indícios de autoria, agravados por circunstâncias objetivas como a ausência de domicílio fixo e a evasão do apelante da comarca, fatos que, à época, justificaram a adoção da medida extrema nos termos dos artigos 312 e seguintes do Código de Processo Penal, conforme bem fundamentado na decisão judicial inserida no id. 276360923. A absolvição final, fundada na insuficiência de provas, não configura, por si só, erro judiciário, nem possui eficácia retroativa para invalidar os atos processuais praticados de forma regular e sob a jurisdição competente. Os documentos constantes dos autos demonstram apenas a regularidade formal da ação penal, compreendendo a decretação, prorrogação e posterior revogação da prisão preventiva, culminando na absolvição do apelante pelo Tribunal do Júri. Desse modo, inexistindo nos autos qualquer prova de ilegalidade, abuso de autoridade, erro técnico ou vício processual, e não estando caracterizadas as hipóteses legais excepcionais de responsabilização objetiva do Estado por ato jurisdicional, resta afastada a configuração de dano moral indenizável. Ante o exposto, com a devida vênia ao eminente Relator, nego provimento ao recurso de apelação interposto por Daniel Sarmento Silva, mantendo-se incólume a sentença que julgou improcedente o pedido indenizatório formulado em desfavor dos apelados. É como voto. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (1ª VOGAL): Acompanho a divergência inaugurada pelo desembargador Deosdete Cruz Júnior. EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE): Em razão da divergência, o julgamento, prosseguirá com aplicação da técnica de ampliação do colegiado, prevista no art. 942 do CPC, nos termos do art. 23-A do RITJ/MT, em sessão futura. SESSÃO DE 08 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O EXMA. SRA. DESA. VANDYMARA GALVÃO RAMOS PAIVA ZANOLO (3ª VOGAL – CONVOCADA): Eminentes pares, Acompanho o voto do eminente Relator, dando provimento parcial ao recurso. Considero que a prisão cautelar por 10 meses seguida de absolvição por falta de provas configura excesso que viola os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e presunção de inocência. Os elementos fático-probatórios demonstram inequívoca violação à dignidade humana decorrente especificamente da prisão excessiva: o apelante perdeu seu emprego, teve sua residência invadida e destruída por populares, sofreu agressões físicas e morais, experimentou rompimento de vínculos familiares e sociais, além de enfrentar severas dificuldades financeiras. A manutenção da prisão por período desproporcional, sem lastro probatório suficiente para condenação, caracteriza dano moral presumido. Entendo aplicável a responsabilidade objetiva do Estado quando o cidadão suporta ônus desproporcional. Concordo com o valor de R$ 50.000,00 como adequado. Quanto aos veículos de comunicação, mantenho a improcedência, pois exerceram regularmente o direito de informar sobre fatos públicos, sem comprovação de dolo ou culpa grave. É como voto V O T O EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS (4º VOGAL CONVOCADO): Acompanho o voto do Relator. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025
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