Processo nº 1030662-86.2021.8.11.0041
ID: 336412611
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1030662-86.2021.8.11.0041
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1030662-86.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). LUI…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1030662-86.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MARIA DE FATIMA AZOIA PINOTI - CPF: 405.567.861-49 (APELADO), MAURO AUGUSTO LAURINDO DA SILVA - CPF: 828.398.321-00 (ADVOGADO), CAMILA CARAM LAURINDO - CPF: 039.024.331-08 (ADVOGADO), ELIDA SYLBENE LAURINDO DA SILVA - CPF: 075.236.157-08 (ADVOGADO), FERNANDO ROBERTO LAURINDO DA SILVA - CPF: 783.307.261-34 (ADVOGADO), REDE D'OR SAO LUIZ S.A. - CNPJ: 06.047.087/0002-10 (APELANTE), GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - CPF: 020.382.917-48 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PASSAGEM INCORRETA DE SONDA NASOENTERAL. PNEUMOTÓRAX HIPERTENSIVO. ÓBITO. PRELIMINAR CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEITADA. APLICAÇÃO DO CDC. RESPONSABILIDADE CIVIL HOSPITALAR. NEXO CAUSAL DEMONSTRADO. DEVER DE INDENIZAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO PROPORCIONAL. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso de apelação interposto por hospital contra sentença que julgou procedente ação de indenização por danos morais, condenando-o ao pagamento de R$ 200.000,00 e à correção da declaração de óbito, em razão de erro médico na passagem de sonda nasoenteral que causou pneumotórax hipertensivo e morte da paciente idosa internada com COVID-19. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se houve cerceamento de defesa pela suposta insuficiência da prova pericial e indeferimento de esclarecimentos adicionais; (ii) saber se existe responsabilidade civil do hospital por erro na passagem de sonda nasoenteral que teria causado pneumotórax hipertensivo e óbito da paciente; (iii) saber se é aplicável a teoria da perda de uma chance em substituição à responsabilização integral pelo evento morte; e (iv) saber se o quantum indenizatório de R$ 200.000,00 mostra-se excessivo e desproporcional às circunstâncias do caso. III. Razões de decidir 3. Não há cerceamento de defesa quando o magistrado considera suficientes os elementos probatórios para formar seu convencimento, sendo que a prova pericial respondeu adequadamente aos quesitos essenciais, cabendo ao julgador exercer o poder instrutório para indeferir diligências desnecessárias. 4. O laudo pericial foi categórico ao demonstrar que houve erro técnico na passagem da sonda nasoenteral, que percorreu trajeto anômalo perfurando o pulmão da paciente e causando pneumotórax hipertensivo, constituindo causa direta e determinante do óbito, não obstante o quadro de COVID-19 preexistente. 5. A responsabilidade civil hospitalar é objetiva nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor quando relacionada aos serviços próprios do estabelecimento, sendo que o hospital somente se exime de responsabilidade mediante prova da inexistência do defeito ou da culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. 6. A teoria da perda de uma chance não se aplica quando há nexo causal direto entre a conduta negligente e o dano final, destinando-se apenas aos casos em que não é possível estabelecer relação causal direta, mas apenas com a perda da oportunidade de obter vantagem ou evitar prejuízo. 7. O quantum indenizatório deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a gravidade do dano, a natureza da conduta lesiva e o caráter pedagógico-punitivo da reparação, mostrando-se o valor de R$ 200.000,00 adequado às circunstâncias do caso concreto. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso de apelação conhecido e desprovido. Tese de julgamento:"1. Não configura cerceamento de defesa o indeferimento de esclarecimentos periciais adicionais quando o laudo responde adequadamente aos quesitos essenciais para o deslinde da controvérsia. 2. A responsabilidade civil hospitalar é objetiva quando relacionada aos serviços próprios do estabelecimento, respondendo o hospital pelos danos causados por erro técnico na realização de procedimentos assistenciais. 3. A teoria da perda de uma chance não se aplica quando há nexo causal direto entre a conduta negligente e o evento danoso. 4. O quantum indenizatório por danos morais decorrentes de erro médico que resulta em óbito deve observar os critérios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando a gravidade do dano e o caráter pedagógico-punitivo da reparação." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 14, caput e §§ 3º e 4º; CPC, arts. 370, 373, II, e 479; CC, arts. 932, III, e 933. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.526.467/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva; STJ, REsp 1.254.141/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 04.12.2012; STJ, AgInt no AREsp 661.203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24.04.2023. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de apelação cível interposta por REDE D’OR SÃO LUIZ S/A - UNIDADE ITAIM (SÃO LUIZ) contra sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT que, nos autos da ação de indenização por danos morais nº 1030662-86.2021.8.11.0041, ajuizada por MARIA DE FATIMA AZOIA PINOTI, julgou procedentes os pedidos da autora para determinar que o réu proceda à correção da causa da morte na declaração de óbito e seu atestado de óbito, bem como para condenar a instituição hospitalar ao pagamento de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescidos de juros SELIC a partir da citação e correção monetária pelo IPCA a partir da sentença. Em suas razões recursais, o hospital apelante suscita, preliminarmente, cerceamento de defesa, alegando que a prova pericial não atendeu à sua finalidade, contendo omissões que comprometeram sua defesa. Sustenta que requereu esclarecimentos adicionais ao perito, mas o juízo de origem não os encaminhou, proferindo sentença sem a devida complementação pericial. Argumenta que tal conduta violou seu direito ao contraditório e à ampla defesa, prejudicando a apreciação adequada da matéria técnica discutida. No mérito, o apelante sustenta a inexistência de defeitos no serviço médico-hospitalar prestado, alegando que não houve erro médico, tendo o óbito decorrido da frágil condição clínica da paciente, que apresentou piora significativa no transporte aéreo. Argumenta que a paciente foi recebida já intubada e com medicação vasoativa para evitar choque, sendo que o pneumotórax teria sido decorrente da passagem de cateter venoso central na veia jugular direita, procedimento necessário e realizado conforme literatura médica, e não da sonda nasoenteral. Subsidiariamente, o recorrente invoca a teoria da perda de uma chance, argumentando que, na remota hipótese de se reconhecer falha no serviço, não poderia ser responsabilizado pelo evento morte em si, mas tão somente pela perda da chance de sobrevivência, uma vez que não há como garantir que um atendimento diferente poderia evitar o óbito. Por fim, caso mantida a condenação, requer a redução do valor indenizatório, sustentando que o montante fixado em R$ 200.000,00 é excessivo, caracterizando enriquecimento sem causa e superando as condenações arbitradas em casos semelhantes. Em contrarrazões, a apelada rebate a preliminar de cerceamento de defesa, sustentando que a prova pericial foi produzida regularmente, tendo a expert respondido adequadamente aos quesitos essenciais, sendo que o juízo exerceu corretamente seu poder instrutório ao indeferir novos esclarecimentos por considerá-los desnecessários ao deslinde da controvérsia. Requer o desprovimento do recurso de apelação, com a consequente manutenção da sentença (Id. 295311463). Preparo recursal comprovado no id. 296399387. Desnecessária a manifesta da Procuradoria-Geral de Justiça diante da matéria. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO (RELATOR) Egrégia Câmara: Versam os autos acerca do recurso de apelação cível interposto por REDE D’OR SÃO LUIZ S/A - UNIDADE ITAIM (SÃO LUIZ) contra sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT que, nos autos da ação de indenização por danos morais nº 1030662-86.2021.8.11.0041, ajuizada por MARIA DE FATIMA AZOIA PINOTI, julgou procedentes os pedidos da autora para determinar que o réu proceda à correção da causa da morte na declaração de óbito e seu atestado de óbito, bem como para condenar a instituição hospitalar ao pagamento de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescidos de juros SELIC a partir da citação e correção monetária pelo IPCA a partir da sentença. O recurso é tempestivo, estando acompanhado do devido preparo, conforme comprovante acostado aos autos. As razões recursais guardam pertinência com a matéria decidida na sentença, atacando-a diretamente. Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso. DA PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA Passo à análise da preliminar suscitada pelo apelante relativa ao cerceamento de defesa decorrente de suposta insuficiência da prova pericial. Alega o apelante que a prova pericial não atendeu adequadamente à sua finalidade, contendo omissões que comprometeram o exercício de seu direito de defesa. Sustenta que requereu esclarecimentos adicionais à perita judicial, os quais não foram encaminhados pelo juízo a quo, que proferiu sentença sem a devida complementação pericial, em violação ao contraditório e à ampla defesa. A preliminar, contudo, não merece acolhimento. O cerceamento de defesa caracteriza-se pela injustificada negativa de produção de provas requeridas pelas partes que sejam necessárias ao deslinde da controvérsia. No entanto, compete ao magistrado, no exercício do poder instrutório conferido pelo artigo 370 do Código de Processo Civil, apreciar a necessidade e a utilidade das provas requeridas, indeferindo aquelas que considere desnecessárias, impertinentes ou protelatórias. No caso em apreço, verifica-se que foi deferida a realização de prova pericial, sendo apresentados quesitos e indicado assistentes técnicos, tendo a expert nomeada pelo juízo apresentado laudo pericial (ID 166685860) e posterior complementação (ID 172382119) em resposta aos quesitos formulados pelas partes. O magistrado considerou que os esclarecimentos prestados foram suficientes para formar seu convencimento sobre os pontos controvertidos, razão pela qual deixou de submeter à perita novos questionamentos que considerou desnecessários. O exame dos autos revela que as questões técnicas relevantes para o deslinde da causa foram adequadamente abordadas no laudo pericial e em sua complementação. A perita respondeu de maneira clara e objetiva aos quesitos formulados pelas partes, especialmente aqueles relacionados à passagem da sonda nasoenteral, à ocorrência de pneumotórax e à causa do óbito da paciente. Ressalto que o julgador não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com base em outros elementos probatórios constantes dos autos, conforme preconiza o artigo 479 do Código de Processo Civil. A valoração da prova pericial, assim como das demais provas produzidas, insere-se no âmbito do livre convencimento motivado do magistrado. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. 2. Alterar a conclusão do acórdão do Tribunal a quo acerca da análise das provas e da ausência de cerceamento de defesa demandaria reexame do acervo fático-probatório dos autos, procedimento vedado em recurso especial, ante a incidência da Súmula n. 7 do STJ. Precedentes. 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes. Agravo interno provido.” (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023) (grifo nosso) “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PARTO. ERRO MÉDICO. SEQUELAS NEUROLÓGICAS EM RECÉM-NASCIDO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. Segundo a Jurisprudência do STJ, havendo elementos de prova suficientes nos autos, mostra-se possível o julgamento antecipado da lide, sendo certo que o juiz, como destinatário das provas, pode indeferir aquelas que considerar desnecessárias, nos termos do princípio do livre convencimento motivado. Precedentes. 2. No caso dos autos, a Corte de origem, após ampla análise do conjunto fático-probatório, firmou compreensão de que não houve o alegado cerceamento de defesa diante do indeferimento do pedido de prova pericial, pois a causa já se encontrava madura para julgamento em virtude "de conjunto probatório robusto" (fl. 1366). Assim, tem-se que a revisão a que chegou o Tribunal de origem sobre a questão demanda o reexame dos fatos e provas constantes nos autos, o que é vedado no âmbito do recurso especial. Incide à hipótese a Súmula 7/STJ. 3 Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ, AgInt no AREsp n. 1.406.364/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 14.10.2019). (grifo nosso) Da mesma forma, este Tribunal de Justiça tem decidido que não há que se falar em cerceamento de defesa se o juiz, como destinatário final da prova, dispensa a sua produção por considerar que já possui elementos suficientes para formar seu convencimento. Vejamos: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA E HOSPITALAR. MORTE NEONATAL. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. CONTRADITÓRIO RESPEITADO. LAUDO PERICIAL COMPLETO E DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO. CONCLUSÃO PELA AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. INEXISTÊNCIA DE PROVA CONTRÁRIA. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação de indenização por danos materiais e morais proposta em razão de alegada negligência médica no atendimento obstétrico que teria ocasionado parto prematuro e óbito neonatal. 2. Os autores sustentaram que a perícia desconsiderou documentos médicos relevantes e baseou-se apenas em entrevistas, pleiteando a anulação da sentença por cerceamento de defesa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em saber se houve cerceamento de defesa por suposta deficiência na perícia, decorrente da ausência de análise dos prontuários médicos e do indeferimento de pedido de esclarecimentos e complementação do laudo. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. O laudo pericial foi elaborado de forma técnica, abrangendo análise documental, exame médico, avaliação do atendimento prestado e dos prontuários médicos constantes nos autos. 5. A alegação de que o laudo se baseou unicamente em entrevista não encontra respaldo nos autos. 6. As partes foram intimadas para apresentação de quesitos, oportunidade em que os apelantes quedaram inertes, e a impugnação ao laudo foi genérica, sem formulação de questionamentos específicos. 7. A jurisprudência é pacífica no sentido de que a impugnação genérica ao laudo não obriga o juízo a determinar esclarecimentos ou nova perícia. 8. Não há nulidade por cerceamento de defesa, estando a sentença devidamente fundamentada na prova técnica produzida. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso não provido. Tese de julgamento: "1. Não há cerceamento de defesa quando o laudo pericial é elaborado de forma completa, com análise dos prontuários médicos e documentos dos autos. 2. A impugnação genérica ao laudo não obriga o juízo a determinar esclarecimentos ou nova perícia." Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1057901-02.2020.8.11.0041, Rel. Des. Dirceu dos Santos, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 29.04.2025, DJE 30.04.2025; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661.203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24.04.2023, DJe 28.04.2023. (N.U 0004107-04.2014.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/06/2025, Publicado no DJE 18/06/2025). (grifo nosso) Pelo exposto, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa. DO MÉRITO Da Responsabilidade Civil do Hospital Conforme se extrai dos autos, a ação indenizatória foi proposta em razão do falecimento da genitora da autora, Sra. Laurinda Viana Azoia Pinoti, ocorrido em dezembro de 2020 nas dependências do hospital réu. A autora sustentou que sua mãe foi internada inicialmente no Hospital Santa Rosa em 30/11/2020, com quadro de pneumonia viral por COVID-19, sendo posteriormente transferida para o Hospital São Luiz (réu) em 03/12/2020, onde foi admitida às 19h48min na UTI. Segundo a narrativa inicial, o plano terapêutico prescrito incluía a passagem de sonda nasoenteral, procedimento que teria sido realizado de forma negligente, percorrendo trajeto anômalo até perfurar o pulmão da paciente, o que causou pneumotórax hipertensivo e levou a óbito. Alegou, ainda, que houve erro no preenchimento da declaração de óbito, indicando como causa da morte "pneumonia por COVID-19", quando na verdade o falecimento teria decorrido de trauma pela passagem incorreta da sonda nasoenteral. Na sentença, o juiz de primeiro grau acatou a conclusão do laudo pericial, reconhecendo a falha no procedimento de passagem da sonda nasoenteral, que teria perfurado o pulmão da paciente, causando sua morte. Determinou a correção da causa de morte na declaração de óbito e condenou o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). A controvérsia recursal cinge-se, em síntese, está na responsabilidade civil do hospital devido a defeito na prestação dos serviços em que foi vítima a mãe da Autora, bem como à fixação do quantum indenizatório. Inicialmente, cumpre destacar que, em se tratando de relação entre hospital e paciente, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento consolidado na jurisprudência pátria. Os hospitais, na qualidade de fornecedores de serviços, respondem objetivamente pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do artigo 14 do CDC. “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.” Contudo, nos termos do §4º citado, a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. Assim, no que tange especificamente à atuação médica, a responsabilidade é subjetiva, dependendo da demonstração de culpa. Já quanto aos serviços próprios e típicos de hospital, como internação, instalações, equipamentos e serviços auxiliares, a responsabilidade permanece objetiva. Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. PARTO. USO DE FÓRCEPS. CESARIANA. INDICAÇÃO. NÃO OBSERVÂNCIA. LESÃO NO MEMBRO SUPERIOR ESQUERDO. MÉDICO CONTRATADO. CULPA CONFIGURADA. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. AÇÃO DE REGRESSO. PROCEDÊNCIA. DANOS MORAIS. VALOR. RAZOABILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte encontra-se consolidada no sentido de que a responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação dos médicos contratados que neles trabalham, é subjetiva, dependendo da demonstração da culpa do preposto. 2. A responsabilidade objetiva para o prestador do serviço prevista no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, no caso o hospital, limita-se aos serviços relacionados ao estabelecimento empresarial, tais como a estadia do paciente (internação e alimentação), as instalações, os equipamentos e os serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia). Precedentes. 3. No caso em apreço, ambas as instâncias de cognição plena, com base na prova dos autos, concluíram que houve falha médica seja porque o peso do feto (4.100 gramas) indicava a necessidade de realização de parto por cesariana, seja porque a utilização da técnica de fórceps não se encontra justificada em prontuário médico. 4. A comprovação da culpa do médico atrai a responsabilidade do hospital embasada no artigo 932, inciso III, do Código Civil ("São também responsáveis pela reparação civil: (...) III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;"), mas permite ação de regresso contra o causador do dano. 5. O Superior Tribunal de Justiça, afastando a incidência da Súmula nº 7/STJ, tem reexaminado o montante fixado pelas instâncias ordinárias apenas quando irrisório ou abusivo, circunstâncias inexistentes no presente caso, em que arbitrada indenização no valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais). 6. Recurso especial parcialmente provido.” (Recurso Especial nº 1.526.467 - RJ (2014/0143277-8); Relator: Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA). (destaquei No caso em apreço, a sentença recorrida fundamentou-se no laudo pericial para reconhecer a ocorrência de erro médico na passagem da sonda nasoenteral, que teria causado pneumotórax hipertensivo e, consequentemente, o óbito da paciente. Alega o apelante que não houve falha na prestação do serviço, tendo o óbito ocorrido em razão da frágil condição clínica da paciente, que já apresentava quadro grave de COVID-19, tendo sido intubada durante o transporte aéreo e recebendo drogas vasoativas para evitar choque. Sustenta ainda que o pneumotórax seria decorrente da passagem de cateter venoso central na veia jugular direita, procedimento realizado conforme as normas técnicas. Analisando detidamente o conjunto probatório, especialmente o laudo pericial emitido pela Perita Médica Forense indicada pelo juízo, Dra. Giovanna Lemos Maia – CRM/MT 10.704, verifico que a conclusão é categórica ao afirmar que: "Este laudo pautou-se apenas em provas materiais, sendo que todos os quesitos foram devidamente respondidos, resultando que houve erro na prestação de serviços da parte requerida, uma vez que a profissional que realizou a passagem da sonda nasoenteral claramente não seguiu o protocolo que incluem medir o tamanho da sonda a ser introduzida no corpo do paciente, introduzindo o material em trajeto 2 x maior do que o ideal e por esse motivo houve perfuração pulmonar que culminou na morte da paciente. Além disso, houve demora no diagnóstico da sondagem errada e principalmente houve erro no preenchimento da declaração de óbito onde a morte não foi de causa natural e sim acidental e o corpo deveria ter sido encaminhado ao IML." (Id. 295311429 – pág. 14) Em resposta específica ao quesito sobre a adequação dos procedimentos adotados pelo hospital, a perita foi enfática: "Os procedimentos realizados pela requerida não foram adequados, uma vez que a técnica para passagem de sonda nasoenteral não foi realizada corretamente, pois quando o profissional da enfermagem segue a técnica e mede a sonda conforme indicado e descrito nas considerações médicas deste laudo, não há possibilidade de introduzir a sonda tão além do recomendado a ponto de perfurar um órgão da paciente, como ocorreu no caso em tela." (Id. 295311429 – pág. 8) Quanto à alegação do apelante de que o pneumotórax teria sido causado pela passagem do cateter venoso central e não pela sonda nasoenteral, a perita foi categórica ao afirmar que a causa do óbito foi a perfuração pulmonar ocasionada pela passagem incorreta da sonda nasoenteral, conforme evidenciado pelo raio-X que demonstrou o trajeto anômalo da sonda. (Id. 295311437 – pág. 4) Em relação ao estado de saúde da paciente quando de sua admissão no hospital apelante, a perita esclareceu, em resposta ao quesito formulado pelo próprio réu, que: "Na admissão da senhora Laurinda no SÃO LUIZ é possível afirmar que sua condição clínica era grave? R: Não, pois apesar de se tratar de uma idosa com pneumonia viral por COVID, o acometimento pulmonar era moderado e a paciente estava estável hemodinamicamente." Diante desse quadro probatório, não há como acolher a tese defensiva do apelante. O laudo pericial é conclusivo quanto à ocorrência de erro técnico na passagem da sonda nasoenteral, que percorreu trajeto anômalo perfurando o pulmão da paciente e ocasionando pneumotórax hipertensivo, evento que culminou em seu falecimento. Constata-se, portanto, que houve além da imperícia em realizar a colocação da sonda nasoenteral, houve uma omissão ante a ausência de anotação na ficha médica, para informar a ocorrência de Pneumotórax Hipertensivo pós trauma em via aérea por SNE. Ressalte-se que o hospital, na qualidade de fornecedor de serviços, somente se eximiria de responsabilidade se comprovasse que, tendo prestado o serviço, o defeito inexistiu ou se demonstrasse a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, nos termos do artigo 14, §3º, do CDC, o que não ocorreu na espécie. Ainda que se considere que a paciente possuía comorbidades e quadro de COVID-19, não há como afastar o nexo causal entre a conduta negligente na passagem da sonda nasoenteral e o óbito, conforme conclusão pericial. O agravamento do quadro clínico e consequente falecimento decorreu diretamente da perfuração pulmonar causada pela incorreta passagem da sonda, conforme atestado pela prova técnica produzida nos autos. Em relação à conduta omissiva do apelante, destaca-se que caso tivesse sido informada a correta causa da morte, o corpo deveria ter sido encaminhado ao IML (Instituto Médico Legal), que é o competente para tais casos, conforme determina a legislação vigente e o Código de Ética Médica. Nesse contexto, referida imperícia e omissão acarreta a culpa. Acerca da responsabilidade dos hospitais em casos como o que se ora analisa, lecionam os doutrinadores Cristiano Chaves, Nelson Rosenvald e Felipe Peixoto Braga Netto, vejamos, verbis: “Ninguém põe em dúvida que a relação médico-paciente, sob o prisma jurídico, é uma relação de consumo. Estejamos diante da relação clássica entre médico privado e paciente ou estejamos diante da relação entre empresa médica ou entidade hospitalar e paciente. [...] Os danos que os pacientes podem sofrer em hospitais são divisíveis em dois grandes grupos: (a) danos sofridos em decorrência de erro médico, ainda que omissivo; (b) danos sofridos em decorrência da própria estrutura hospitalar. [...] Quando o dano guardar relação com a conduta médica strito sensu o hospital responde objetivamente, porém essa responsabilidade traz uma nota específica: ela depende da prova da culpa do médico. [...] o hospital não responde objetivamente, mesmo depois da vigência do Código de Defesa do Consumidor, quando se trata de indenizar dano produto por médico integrante de seus quadros. Os hospitais, nessa linha, só podem ser chamados a responder de modo solidário se havia dever de indenizar por parte do médico. [...] Já a situação descrita no item b se põe de modo distinto. Aqui os danos guardam relação com própria estrutura hospitalar, não propriamente com atos dos médicos. [...] O STJ já decidiu que a responsabilidade objetiva do art. 14 do CDC “prevista para os prestadores de serviços, no presente caso, o hospital, circunscreve-se apenas aos serviços única e exclusivamente relacionados com o estabelecimento empresarial propriamente dito, ou seja, aqueles que digam respeito à estadia do paciente (internação), instalações, equipamento, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia) etc. e não aos serviços técnico-profissionais dos médicos que ali atuam, permanecendo estes na relação subjetiva de preposição (culpa)” (Curso de Direito Civil – Responsabilidade Civil. Bahia: Ed. Jus Podivm, 2016, p.806). Desse modo, de acordo com entendimento acima elencado, o hospital possui dois tipos de responsabilidade, a primeira diz respeito à conduta do médico stricto sensu, onde o nosocômio responde objetivamente, desde que comprovada a culpa do preposto; por outro lado, o hospital possui responsabilidade objetiva, sem qualquer condicionante, quando ficar comprovado que os danos decorreram da própria estrutura do hospital, e não de conduta do médico preposto/empregado, uma vez que essa responsabilidade decorreria da própria falha na prestação do serviço, cuja atribuição é afeta única e exclusivamente ao hospital. Assim, em que pese a responsabilidade do nosocômio seja objetiva no caso em voga, o certo é que para surgir o dever de reparação, seja de ordem material ou moral, necessário se faz comprovar a prática do ato ilícito, a existência do dano e o nexo de causalidade entre eles. Diante disso, na hipótese em tela, em que pese todo o alegado pelo apelante, não há como fechar os olhos para o fato de que o conjunto probatório produzido nos autos aponta para a sua responsabilização, em razão da falha na prestação do serviço alegada. Por conseguinte, incumbe a parte apelante, requerida, a demonstração da ocorrência de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor (art. 373, II, do CPC), o que definitivamente não ocorreu na hipótese em voga, devendo permanecer a responsabilidade solidária que lhes foi imposta. Nesse sentido, “RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTE DE ERRO MÉDICO - MORTE DE RECÉM-NASCIDO - ERRO MÉDICO – AUSÊNCIA DE DIAGNÓSTICO NO HOSPITAL QUE REALIZOU O PARTO - DANOS MORAIS – QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL – JUROS DE MORA A PARTIR DA CITAÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. Configura-se agir culposo a ausência de diagnóstico, por parte da equipe médica do hospital, de patologia de recém-nascido, que recebeu alta e, levado à outros hospitais, passando para cirurgia, veio a óbito, em razão de diagnostico tardio. Resta caracterizado o dever de indenizar o genitor pelos danos morais decorrentes do mencionado falecimento. [...]” (RAC n. 141.701/2016, 1ª Câm. Cív., Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, j. 21.02.2017). (grifo nosso) Subsidiariamente, o apelante invoca a aplicação da teoria da perda de uma chance, argumentando que, caso reconhecida alguma falha no serviço, não poderia ser responsabilizado pelo evento morte em si, mas tão somente pela perda da chance de sobrevivência. A teoria da perda de uma chance, de origem francesa e recepcionada pela doutrina e jurisprudência brasileiras, é aplicável em situações nas quais a conduta do agente retira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor, como um prognóstico mais favorável em termos de cura ou sobrevivência, desde que essa chance seja real e séria. No entanto, sua aplicação pressupõe a impossibilidade de se estabelecer nexo causal direto entre a conduta do agente e o dano final (morte ou agravamento da doença), existindo apenas relação causal com a perda da oportunidade de obter uma vantagem ou evitar um prejuízo. No caso dos autos, conforme já analisado, o laudo pericial foi categórico ao estabelecer nexo causal direto entre a incorreta passagem da sonda nasoenteral e o óbito da paciente, não havendo que se falar em mera perda de chance. A prova técnica demonstrou que a perfuração pulmonar ocasionada pela sonda foi a causa determinante do pneumotórax hipertensivo que levou à morte da paciente. A teoria da perda de uma chance não se presta para reparar danos que consistam em resultados certos e determinados, que possam ser atribuídos diretamente à conduta do agente. No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu: "A teoria da perda de uma chance aplica-se quando o evento danoso representa a perda de uma chance de se obter um resultado ou de se evitar um prejuízo. Todavia, quando a conduta negligente do agente não interrompe um processo aleatório, mas, ao contrário, é causa direta e imediata do dano, não há que se falar em aplicação da teoria da perda de uma chance, mas em dano material direto e integral." (STJ - REsp 1254141/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 20/02/2013) Dessa forma, não sendo hipótese de aplicação da teoria da perda de uma chance, deve ser mantida a condenação do hospital apelante pelo dano na sua integralidade. Do Quantum Indenizatório Por fim, o apelante questiona o valor arbitrado a título de danos morais, sustentando que o montante de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) é excessivo e desproporcional. Na quantificação do dano moral, cabe ao julgador observar os critérios da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como as circunstâncias do caso concreto, a gravidade do dano, a situação do ofensor, a condição do lesado e a finalidade da reparação moral, que possui tanto caráter compensatório quanto pedagógico-punitivo. O Superior Tribunal de Justiça tem enfatizado que o valor da indenização deve ser fixado em patamar que atenda aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando-se, de um lado, o enriquecimento sem causa do lesado e, de outro, o estímulo à reiteração da conduta lesiva pelo ofensor. Também este Tribunal de Justiça tem arbitrado indenizações em patamares similares em casos análogos: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MORTE DA GENITORA DA AUTORA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDUTOR E DA EMPREGADORA. REVELIA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE DOS FATOS. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPREGADORA. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO POR DANOS MORAIS. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta contra sentença que julgou procedente ação de indenização por acidente de trânsito, condenando os réus ao pagamento de danos materiais e morais, em decorrência do falecimento da genitora da autora em colisão causada por veículo conduzido pelo réu e pertencente à empresa empregadora. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há quatro questões em discussão: (i) se houve cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide; (ii) se a revelia do réu implica presunção absoluta de veracidade dos fatos alegados pela autora; (iii) se restou comprovada a responsabilidade do condutor e da empresa empregadora pelo acidente; e (iv) se o valor fixado a título de danos morais é proporcional ao dano sofrido. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A revelia acarreta a presunção relativa de veracidade dos fatos alegados pela parte autora, podendo ser afastada por provas constantes dos autos, conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça. 4. No caso concreto, além da revelia, há provas suficientes a demonstrar a responsabilidade do réu pelo acidente, incluindo boletim de ocorrência, inquérito policial e declarações do próprio apelante, que admitiu não ter observado devidamente o cruzamento. 5. A empresa empregadora responde objetivamente pelos atos ilícitos de seus empregados no exercício de suas funções, nos termos dos artigos 932, III, e 933 do Código Civil, estando demonstrado o nexo causal entre a conduta do motorista e o dano suportado pela autora. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal, de modo que eventual ausência de condenação criminal não afasta a obrigação de indenizar, conforme artigo 935 do Código Civil. 7. O quantum indenizatório deve observar os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a extensão do dano e a condição econômica das partes, razão pela qual se justifica a redução do valor dos danos morais para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). 8.Demonstrada a hipossuficiência econômica do apelante, é cabível a concessão da gratuidade da justiça, nos termos do artigo 98 do Código de Processo Civil. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso parcialmente provido para reduzir o valor da indenização por danos morais para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), concedendo ao apelante os benefícios da justiça gratuita e mantendo-se a sentença nos demais pontos. Tese de julgamento: 1. A revelia acarreta presunção relativa de veracidade dos fatos alegados, a qual pode ser afastada por provas constantes dos autos. 2. O empregador responde objetivamente pelos atos ilícitos de seus empregados no exercício de suas funções, bastando a comprovação do dano e do nexo causal. 3. A responsabilidade civil é independente da penal, de modo que eventual absolvição criminal não impede a obrigação de indenizar. 4. O valor da indenização por danos morais deve observar os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a gravidade do dano e a condição econômica das partes. 5. A gratuidade da justiça deve ser concedida à parte que comprovar insuficiência de recursos, nos termos do artigo 98 do CPC. Dispositivos relevantes citados: Código Civil, arts. 932, III, 933, 935 e 944; Código de Processo Civil, arts. 344 e 98. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, Apelação Cível nº 1015569-10.2021.8.11.0000, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, Quarta Câmara de Direito Privado, julgado em 21/09/2022.” (N.U 1028840-82.2021.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 11/02/2025). (grifo nosso) “AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAL DECORRENTE DE ERRO MÉDICO – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA – ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PLANO DE SAÚDE AFASTADA – APLICAÇÃO DO CDC – POSSIBILIDADE – ÓBITO DO FETO NO ÚTERO – ANOXIA INTRAUTERINA ORIUNDA DE CIRCULAR CERVICAL DE CORDÃO UMBILICAL – ALEGADA EXISTÊNCIA DE CULPA, NEGLIGÊNCIA E IMPERÍCIA – NEXO CAUSAL DEMONSTRADO – ERRO MÉDICO CONFIGURADO – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS RÉUS – DANO MORAL – DEVER DE INDENIZAR – QUANTUM JUSTO E RAZOÁVEL – SENTENÇA MANTIDA – HONORÁRIO RECURSAL – RECURSOS DESPROVIDOS. Não se consubstancia cerceamento de defesa o indeferimento de produção de determinada prova, na hipótese do magistrado, seu destinatário, considerá-la despicienda para o deslinde da controvérsia, mormente se a questão for de direito, hipótese em que cabe à parte trazer aos autos toda a documentação que entende necessária para o deslinde de sua pretensão. Precedentes do STJ. É pacífico nos Tribunais que os contratos de plano de saúde, sejam eles individuais ou coletivos, salvo os administrados por entidades de autogestão, o que não é o caso dos autos, devem ser regidas pelos ditames consumeristas, estando tal matéria inclusive inserida no verbete sumular 608 do STJ. O princípio da responsabilidade objetiva do prestador de serviços, consagrado no Código de Defesa do Consumidor, estabelece uma única exceção no §4º, do art. 14, ao dispor que a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. Na espécie, cumpre observar que ficando demonstrado no conjunto probatório produzido nos autos, que houve negligência, imprudência ou imperícia dos profissionais, em decorrência de anoxia intrauterina oriunda de circular cervical de cordão umbilical que ocasionou a morte do feto ainda no útero, ante a demora na realização do parto, caracterizando falha na prestação do serviço, de modo que merece prosperar o pleito indenizatório. O STJ tem entendimento assente no sentido de que configura obrigação de resultado, a implicar responsabilidade objetiva do hospital em caso de culpa do médico. A operadora do plano de saúde, na condição de fornecedora de serviço, responde perante o consumidor pelos defeitos em sua prestação, seja quando os fornece por meio de hospital próprio e médicos contratados ou por meio de médicos e hospitais credenciados, nos termos dos arts. 2º, 3º, 14 e 34, todos do CDC. Precedentes do STJ. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes, devendo ser mantido o valor arbitrado na sentença, quando se apresenta consentâneo com a realidade do caso concreto. “devendo permanecer a quantia de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), cuja condenação foi imputada de forma solidária aos réus.” Em razão do trabalho adicional empregado pelo advogado, da natureza e da importância da causa, majoram-se os honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, §11, do CPC.” (N.U 0015177-93.2015.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Vice-Presidência, Julgado em 31/07/2024, Publicado no DJE 31/07/2024). (grifo nosso) Considerando as particularidades do caso concreto, especialmente a gravidade do dano (falecimento da genitora da autora), a natureza da conduta lesiva (erro médico na passagem de sonda nasoenteral), bem como o caráter pedagógico e punitivo da indenização, entendo que o montante fixado na sentença (R$ 200.000,00) mostra-se proporcional e razoável, não se revelando exorbitante a ponto de caracterizar enriquecimento sem causa da parte autora, não comportando redução. Quanto ao pedido de correção da declaração de óbito, verifica-se que o laudo pericial apontou expressamente que "houve erro no preenchimento da declaração de óbito onde a morte não foi de causa natural e sim acidental e o corpo deveria ter sido encaminhado ao IML". Conforme atestado pela perícia, a causa da morte foi o pneumotórax hipertensivo decorrente da perfuração pulmonar causada pela sonda nasoenteral, e não pneumonia por COVID-19 como constou no atestado de óbito. Trata-se, portanto, de morte por causa acidental e não natural, o que impõe a correção da declaração de óbito, conforme determinado na sentença recorrida. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso de apelação, REJEITO a preliminar de cerceamento de defesa e, no mérito, NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo integralmente a sentença recorrida. Deixo de majorar os honorários advocatícios, em razão da condenação na primeira instância em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025
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