Processo nº 0036787-14.2015.4.01.3500
ID: 331178907
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0036787-14.2015.4.01.3500
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOAO VICTOR MARCAL DE ALMEIDA
OAB/GO XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0036787-14.2015.4.01.3500 PROCESSO REFERÊNCIA: 0036787-14.2015.4.01.3500 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: HULDRA ALVES CARDOSO…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0036787-14.2015.4.01.3500 PROCESSO REFERÊNCIA: 0036787-14.2015.4.01.3500 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: HULDRA ALVES CARDOSO REPRESENTANTES POLO ATIVO: JOAO VICTOR MARCAL DE ALMEIDA - GO52537-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros RELATOR(A):JOAO CARLOS MAYER SOARES PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da Primeira Região Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0036787-14.2015.4.01.3500 R E L A T Ó R I O O EXMO SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER SOARES (RELATOR): Trata-se de apelação, interposta pela parte autora, em face da sentença (fls. 282/297), proferida em ação ordinária, na qual foi julgado improcedente o pedido de indenização por danos morais motivado por doença decorrente do acidente radiológico com Césio-137, ocorrido em Goiânia/GO. Não houve condenação em custas processuais e honorários advocatícios em razão da concessão da justiça gratuita. Na peça recursal (fls. 300/313), a parte apelante alega, em síntese, que o laudo pericial produzido pela Junta Médica Oficial é prova suficiente do nexo de causalidade, pois atestou que sua enfermidade (miomatose uterina) "pode ter nexo de causalidade com exposição à substância radioativa" (fl. 301). Assevera a credibilidade do referido órgão técnico e a aplicação da Teoria da Redução do Módulo da Prova diante da impossibilidade de prova científica cabal em casos de contaminação radioativa. Continua e defende que sua condição de irradiada não pode ser afastada pelo fato de não constar na lista de monitoramento da Cnen, pois comprovou documentalmente seu trabalho nos locais atingidos. Aduz que a prova produzida, especialmente o laudo da Junta Médica especializada, somada à negligência dos entes públicos na gestão do acidente, é suficiente para estabelecer o nexo de causalidade e o consequente dever de indenizar pelo dano moral sofrido. Donde pugna pelo provimento do recurso para reformar a sentença e julgar procedente o pedido exordial. Contrarrazões apresentadas (fls. 317/320; 323/330 e 332). Nesta instância, o Ministério Público Federal opina pelo não provimento do recurso de apelação (fl. 342/348). É o breve relatório. Desembargador Federal JOÃO CARLOS MAYER SOARES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da Primeira Região Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0036787-14.2015.4.01.3500 V O T O O EXMO SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER SOARES (RELATOR): Presentes os pressupostos genéricos e específicos de admissibilidade, conheço da apelação para negar-lhe provimento e, em relação ao Estado de Goiás, extinguir, de ofício, o feito sem resolução do mérito. A questão recursal controvertida diz respeito à responsabilidade estatal em indenizar moralmente a parte apelante, a qual teria sofrido consequências advindas do acidente radiológico do Césio-137, especialmente problemas de saúde. De saída, como se sabe, a teor do art. 109 da Constituição Federal de 1988, compete aos juízes federais julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes, ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. Não é demais lembrar que o Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que a competência da Justiça Federal, fixada no art. 109, inciso I, da Constituição Federal, tem por base critério objetivo, levando-se em conta não a natureza da relação litigiosa, mas, sim, a identidade dos figurantes da relação processual (competência ratione personae). Assim, a preservação da competência federal, ou o deslocamento da causa para a esfera federal, somente se justifica com a presença da União, suas autarquias ou empresas públicas na condição de autora, ré, assistente ou opoente. (Cf. CC 170.256/DF, decisão monocrática do ministro Mauro Campbell marques DJ 04/05/2020; AgRg no CC 137.235/PR, Primeira Seção, da relatoria da ministra Assusete Magalhães, DJ 03/09/2015; CC 114.777/PI, Primeira Seção, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 18/09/2012; AgRg no CC 93.074/SP, Segunda Seção, da relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJ 05/10/2011; CC 115.202/PI, Primeira Seção, da relatoria do ministro Castro Meira, DJ 13/09/2011; CC 115.789/SP, Primeira Seção, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 29/04/2011; CC 35.972/SP, Primeira Seção, relator para o acórdão o ministro Teori Albino Zavascki, DJ 07/06/2004.) Partindo de tal compreensão, a referida Corte adota o posicionamento de que “[a] competência para a causa é fixada levando em consideração a situação da demanda, tal como objetivamente proposta. Relativamente ao art. 109, I, a, da Constituição, que trata de competência em razão da pessoa, o que se considera são os entes que efetivamente figuram na relação processual e não os que dela poderiam ou deveriam figurar, cuja participação é fato futuro e incerto, dependente do que vier a ser decidido, pelo juiz competente, no curso do processo” (cf. STJ, AgRg no CC 100.390/SC, Primeira Seção, da relatoria do ministro Teori Albino Zavascki, DJ 25/05/2009). Nessa perspectiva, impende pontuar que a nossa Corte Regional assentou o posicionamento jurisprudencial de que é vedada a cumulação de pedidos contra réus distintos, ainda que fundamentados no mesmo fato, quando o Juízo não é competente para conhecer de todos os pedidos formulados, considerando que a competência absoluta não pode ser modificada por conexão. (Cf. AI 10149-94.2017.4.01.0000/DF, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Daniel Paes Ribeiro, DJ 19/02/2018; AC 79703-70.2014.4.01.3800, Sexta Turma, da relatoria da juíza federal convocada Daniele Maranhão Costa, DJ 11/03/2015; AC 11705-14.2006.4.01.3300, Quinta Turma, da relatoria da desembargadora federal Selene Maria de Almeida, DJ 28/11/2011.) Outrossim, o Código de Processo Civil estabelece que, tramitando o processo perante outro juízo, os autos serão remetidos ao juízo federal competente se nele intervier a União, suas empresas públicas, entidades autárquicas e fundações, ou conselho de fiscalização de atividade profissional, na qualidade de parte ou de terceiro interveniente, e, ainda, que o juiz, ao não admitir a cumulação de pedidos em razão da incompetência para apreciar qualquer deles, não examinará o mérito daquele em que exista interesse da União, de suas entidades autárquicas ou de suas empresas públicas, devendo o juízo federal restituirá os autos ao juízo estadual sem suscitar conflito se o ente federal cuja presença ensejou a remessa for excluído do processo (CPC/2015, art. 45, caput e §§ 2.º e 3.º). Nessa contextura, dispõe o enunciado da Súmula 170 do Tribunal Infraconstitucional que “[c]ompete ao juízo onde primeiro for intentada a ação envolvendo acumulação de pedidos, trabalhista e estatutário, decidi-la nos limites da sua jurisdição, sem prejuízo do ajuizamento de nova causa, com o pedido remanescente, no juízo próprio”. De outro lado, é de se mencionar que, diante da cumulação de pedidos em litisconsórcio facultativo simples, há de ser observada a limitação segundo a qual só é lícita a sua cumulação se o juízo em que ajuizada a ação for igualmente competente para conhecer de todos eles. Por essa razão, a presença de uma parte que tem foro na Justiça Federal, como a União, não atrairia a competência do Juízo Federal para conhecer do pedido quanto à parte incompetente, conforme a regra estabelecida no art. 327, § 1.º, inciso II, do CPC/2015, devendo o juízo de origem da demanda decidi-la nos limites da sua jurisdição, sem prejuízo do ajuizamento de nova causa, com o pedido remanescente, no juízo próprio (Súmula 170/STJ, aplicada analogicamente). Consequentemente, tendo a ação sido proposta perante o juízo federal e não sendo ele competente para apreciação de parte do pedido, deve o processo ser extinto sem resolução do mérito diante da inépcia da inicial e ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular (CPC/2015, art. 330, § 1.º, inciso IV, c/c o art. 485, incisos I e IV). E como se sabe, em sede de questões cognoscíveis de ofício (CPC/2015, art. 485, § 3.º; CPC/73, art. 267, § 3.º), "as matérias de ordem pública (e.g. prescrição, decadência, condições da ação, pressupostos processuais, consectários legais, incompetência absoluta, impenhorabilidade, etc) não se sujeitam à preclusão, podendo ser apreciadas a qualquer momento nas instâncias ordinárias" (cf. STJ, AgRg no AREsp 223.196/RS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 24/10/2012). (Cf. ainda: EAREsp 146.473/ES, Primeira Seção, da relatoria da ministra Assusete Magalhães, DJ 19/10/2023; RMS 63.004/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Sérgio Kukina, DJ 24/08/2020; AgRg na MC 19.276/RJ, Segunda Turma, da relatoria do ministro Castro Meira, DJ 21/08/2012; REsp 1.252.842/SC, Segunda Turma, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 14/06/2011.) Dessa forma, no que se refere ao pedido indenizatório em face do Estado de Goiás, tem-se que a responsabilidade dos entes públicos pelo acidente com o Césio-137 é solidária. Contudo, nessa modalidade, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que não há litisconsórcio necessário, sendo facultado ao credor optar pelo ajuizamento da ação contra um, alguns ou todos os responsáveis, motivo pelo qual não se vislumbra a competência da Justiça Federal para análise em relação a tal pessoa jurídica de direito público. (Cf. REsp 1.625.833/PR, Primeira Turma, da relatoria do ministro Benedito Gonçalves, DJ 05/09/2019; AgRg no REsp 1.164.933/RJ, Primeira Turma, da relatoria da ministra Regina Helena Costa, DJ 09/12/2015; EDcl no AgRg no AREsp 604.505/RJ, Quarta Turma, da relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, DJ 27/05/2015; AgRg no AREsp 566.921/RS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 17/11/2014.) Sendo assim, no ponto, de ofício, em razão da incompetência absoluta, é o caso de extinção do processo sem resolução do mérito em relação ao Estado de Goiás (CPC/2015, arts. 64, § 1.º; art. 327, inciso II; c/c o art. 485, incisos I e IV). Quanto ao mérito, impende consignar que a responsabilidade do Estado decorre da teoria objetiva, consagrada no art. 37, § 6.º, da Constituição Federal, com base no risco administrativo, o qual prevê a obrigação de indenizar, independentemente de culpa ou dolo, desde que comprovado o nexo de causalidade entre o dano e o ato do agente. (Cf. STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.428.475/PR, Primeira Turma, da relatoria do ministro Sérgio Kukina, DJ 02/09/2016; EREsp 1.388.822/RN, Primeira Seção, da relatoria do ministro Og Fernandes, DJ 03/06/2015; REsp 1.117.258/PR, Segunda Turma, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 11/12/2009.) Em consonância com a teoria do risco administrativo, consagrada no plano constitucional desde a Carta Política de 1946, o Poder Público responde objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros (CF/88, art. 37, § 6.º). Os elementos que compõem a responsabilidade objetiva do Estado compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público, que, nessa condição funcional, tenha incidido em conduta comissiva, independentemente da licitude ou não do seu comportamento funcional, e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (o caso fortuito, a força maior ou a culpa exclusiva da vítima). (Cf. STF, RE 603.626-AgR-segundo/MS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 12/06/2012; ARE 655.277-ED/MG, Segunda Turma, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 12/06/2012; RE 481.110-AgR-ED/PE, Segunda Turma, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 25/09/2009; RE 495.740-AgR/DF, Segunda Turma, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 14/08/2009; RE 109.615/RJ, Primeira Turma, da relatoria do ministro Celso de Mello, DJ 02/08/1996.) (Cf. ainda: TRF1, AC 0000723-79.2004.4.01.3600/MT, Quinta Turma, da relatoria do juiz federal convocado Leão Aparecido Alves, DJ 20/04/2016; AC 0011463-39.2008.4.01.3800/MG, Quinta Turma, da relatoria do juiz federal convocado Leão Aparecido Alves, DJ 20/04/2016; AC 0008557-14.2001.4.01.3900/PA, Segunda Turma Suplementar, da relatoria da juíza federal convocada Rosimayre Gonçalves de Carvalho, DJ 04/10/2012; AC 0013024-95.1998.4.01.3300/BA, Sexta Turma, da relatoria do juiz federal convocado João Carlos Costa Mayer Soares, DJ 27/04/2009.) Nesse rumo de ideias, a orientação firmada no âmbito do Supremo Tribunal Federal, sob o rito da repercussão geral (Tema 592), aponta no sentido de que a responsabilidade objetiva prevista no § 6.º do art. 37 da Constituição Federal abrange as condutas omissivas do Poder Público. Assim é que “a omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso” (cf. RE 841.526/RS, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 1.º/08/2016). Em outras oportunidades tal tese foi reforçada pela Suprema Corte, inclusive com aplicabilidade quanto às pessoas jurídicas de direito público ou às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. (Cf. RE 608.880/MT, Tribunal Pleno, relator para o acórdão ministro Alexandre de Moraes, DJ 1.º/10/2020; ARE 991.086-AgR/MG, Primeira Turma, da relatoria da ministra Rosa Weber, DJ 21/03/2018; ARE 1.043.232-AgR/RS, Primeira Turma, da relatoria do ministro Alexandre de Moraes, DJ 13/09/2017; ARE 951.552-AgR/ES, Segunda Turma, da relatoria do ministro Dias Toffoli, DJ 26/08/2016.) De fato, o dever de ressarcir os danos causados pela inadequação ou falha na prestação de serviços públicos, por omissão estatal, decorre diretamente do art. 37, § 6.º, da Carta Constitucional, bastando, para a sua configuração, a comprovação do dano, do nexo de causalidade e da deficiência na prestação do serviço. (Cf. STF, RE 580.252/MS, Tribunal Pleno, relator para o acórdão ministro Gilmar Mendes, DJ 11/09/2017; RE 990.117-AgR/AC, Primeira Turma, da relatoria da ministra Rosa Weber, DJ 14/12/2016; AI 724.098-AgR-segundo/RJ, Segunda Turma, da relatoria do ministro Teori Zavascki, DJ 29/04/2013; RE 633.138-AgR/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 21/09/2012.) Portanto, é indispensável a presença do nexo de causalidade, ponto crucial para o deslinde da lide. E na seara de enfermidades decorrentes de exposição ao Césio-137, em que pese a possível aplicação da teoria da redução do módulo da prova, é necessário a existência de algum elemento indiciário a permitir a possibilidade de existir nexo de causalidade entre as enfermidades apontadas e qualquer espécie de contado indireto com a radiação proveniente de tal elemento radioisótopo. (Cf. TRF1, AC 0012970-81.2016.4.01.3500, julg. cit; AC 0023780-96.2008.4.01.3500, Sexta Turma, da relatoria do juiz federal convocado Rafael Paulo Soares Pinto, PJe 10/03/2021; AC 0002203-28.2009.4.01.3500, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Jirair Aram Meguerian, DJ 31/03/2017.) Continuando sobre a temática, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal são assentes no sentido de que, “[a] despeito de o julgador não estar adstrito à perícia judicial, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, por força do art. 145 do CPC [CPC/2015, art. 156], o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo se houver motivo relevante, uma vez que o perito judicial se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade” (cf. AgRg no AREsp 500.108/PE, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 15/08/2014). (Cf. ainda: STJ, REsp 1.865.264/SP, Primeira Turma, da relatoria do ministro Sérgio Kukina, DJ 12/09/2023; AgInt no REsp 1.424.417/PR, Segunda Turma, da relatoria da ministra Assusete Magalhães, DJ 16/02/2022; TRF1, AC 1024154-32.2021.4.01.3600, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Flávio Jaime de Moraes Jardim, PJe 15/05/2024.) Destarte, a nossa Corte Regional tem manifestado o reiterado entendimento de que o laudo do perito oficial, quando bem elaborado, fundamentado e apoiado em elementos de fato objetivos, deve ser acatado pelo juiz, mormente diante da imparcialidade que o perito oficial assume à vista dos interesses em conflito das partes. (Cf. AC 1024154-32.2021.4.01.3600, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Flávio Jaime de Moraes Jardim, PJe 15/05/2024; AC 0003873-97.2016.4.01.4004, Quarta Turma, da relatoria do juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, PJe 13/05/2021; AC 0000168-57.2017.4.01.4004, Terceira Turma, da relatoria do desembargador federal Ney Bello, DJ 20/10/2017.) Na concreta situação dos autos, verifica-se que o laudo pericial foi inconclusivo quanto ao nexo causalidade entre a doença apresentada pela parte autora e o fatídico sinistro com o Césio-137, somente concluindo que pode haver nexo de causalidade entre as enfermidades apresentadas pelo periciado e o acidente (fl. 231). Contudo, também aponta que não há comprovação que a demandante tenha sido contaminada ou irradiada pelo elemento radioativo (fl. 232) e que as enfermidades indicadas podem ser causadas por diversas causas, dentre elas, distúrbios alimentares, hormonais, genéticos, ligados ao envelhecimento e radioatividade (fl. 231). Nesse contexto e considerado que a parte recorrente autora alega que iniciou seus trabalhos com as vítimas somente um ano após o desponte do acidente, além da ausência de prova quanto à possível exposição à radiação, ônus que era seu (CPC/2015, art. 373, inciso I), somente produzindo documentos médicos (fls. 32/39) e outro que indica somente seu período de trabalho (fl. 40), reputam-se inexistentes elementos indiciários a amparar a aplicação da teoria da redução do módulo da prova e configurar o necessário nexo causal para estabelecer a responsabilidade objetiva na espécie. À vista do exposto, em relação ao Estado de Goiás, de ofício, em razão da incompetência absoluta, julgo extinto o processo sem resolução do mérito (CPC/2015, arts. 64, § 1.º; art. 327, inciso II; c/c art. 485, incisos I e IV), e, quanto às demais partes, nego provimento à apelação. Incabível a majoração dos honorários de que trata o art. 85, § 11, do CPC/2015, visto que os honorários recursais não têm autonomia e existência independente da sucumbência fixada na origem e representam um acréscimo ao ônus estabelecido previamente, motivo por que na hipótese de descabimento ou de ausência de fixação anterior, inclusive em desfavor da parte recorrente, não há falar-se em tal verba. (Cf. STJ, AgInt no AREsp 1.124.937/SP, Primeira Turma, da relatoria do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/08/2019; AREsp. 1.050.334/PR, Segunda Turma, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 03/04/2017.) Em relação ao Estado de Goiás, considerado que a sua inclusão decorreu de ato do juízo de origem, sem qualquer pedido ou manifestação das partes, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios ante a ausência de sucumbência ou causalidade, princípios esses norteadores de tal verba sucumbencial. É como voto. Desembargador Federal JOÃO CARLOS MAYER SOARES Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da Primeira Região Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0036787-14.2015.4.01.3500 PROCESSO REFERÊNCIA: 0036787-14.2015.4.01.3500 APELANTE: HULDRA ALVES CARDOSO Advogado do(a) APELANTE: JOAO VICTOR MARCAL DE ALMEIDA - GO52537-A APELADO: ESTADO DE GOIAS, COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, UNIÃO FEDERAL E M E N T A CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. FORMA OBJETIVA. CONTAMINAÇÃO POR CÉSIO-137. PEDIDO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. ESTADO DE GOIÁS. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. SÚMULA 170/STJ. EXTINÇÃO PARCIAL DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INCABÍVEIS. INEXISTÊNCIA DE SUCUMBÊNCIA OU CAUSALIDADE. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE EVENTO DANOSO E ENFERMIDADE. AUSÊNCIA. NÃO APLICAÇÃO DA TEORIA DA REDUÇÃO DO MÓDULO DE PROVA. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS MÍNIMOS. NÃO CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE. DIREITO NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS ARBITRADOS. 1. A questão recursal controvertida diz respeito à responsabilidade estatal em indenizar moralmente a parte apelante, a qual teria sofrido consequências advindas do acidente radiológico do Césio-137, especialmente problemas de saúde. 2. A competência da Justiça Federal, fixada no art. 109, inciso I, da Constituição Federal, tem por base critério objetivo, levando-se em conta não a natureza da relação litigiosa, mas sim a identidade dos figurantes da relação processual (competência ratione personae). Assim, o deslocamento da causa para a Justiça Federal somente se justifica com a presença da União, suas autarquias ou empresas públicas na condição de autora, ré, assistente ou opoente. Precedentes do STJ. 3. A nossa Corte Regional assentou o posicionamento jurisprudencial de que é vedada a cumulação de pedidos contra réus distintos, ainda que fundamentados no mesmo fato, quando o Juízo não é competente para conhecer de todos os pedidos formulados, considerando que a competência absoluta não pode ser modificada por conexão. Jurisprudência selecionada. 4. Dispõe o enunciado da Súmula 170 do Tribunal Infraconstitucional que “[c]ompete ao juízo onde primeiro for intentada a ação envolvendo acumulação de pedidos, trabalhista e estatutário, decidi-la nos limites da sua jurisdição, sem prejuízo do ajuizamento de nova causa, com o pedido remanescente, no juízo próprio”. Consequentemente, tendo a ação sido proposta perante o juízo federal e não sendo ele competente para apreciação de parte do pedido, deve o processo ser extinto sem resolução do mérito diante da inépcia da inicial e ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular (CPC/2015, art. 330, § 1.º, inciso IV, c/c o art. 485, incisos I e IV). 5. Em sede de questões cognoscíveis de ofício (CPC/2015, art. 485, § 3.º; CPC/73, art. 267, § 3.º), "as matérias de ordem pública (e.g. prescrição, decadência, condições da ação, pressupostos processuais, consectários legais, incompetência absoluta, impenhorabilidade, etc) não se sujeitam à preclusão, podendo ser apreciadas a qualquer momento nas instâncias ordinárias" (cf. STJ, AgRg no AREsp 223.196/RS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 24/10/2012). Precedentes do STJ. 6. No que se refere ao pedido indenizatório em face do Estado de Goiás, tem-se que a responsabilidade dos entes públicos pelo acidente com o Césio-137 é solidária. Contudo, nessa modalidade, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que não há litisconsórcio necessário, sendo facultado ao credor optar pelo ajuizamento da ação contra um, alguns ou todos os responsáveis, motivo pelo qual não se vislumbra a competência da Justiça Federal para análise em relação a tal pessoa jurídica de direito público. No ponto, reconhecida, de ofício, a incompetência absoluta da Justiça Federal para julgamento, sendo o caso de extinção do processo sem resolução do mérito em relação ao referido ente (CPC/2015, arts. 64, § 1.º; art. 327, inciso II; c/c o art. 485, incisos I e IV). Jurisprudência selecionada. 7. A responsabilidade do Estado decorre da teoria objetiva, consagrada no art. 37, § 6.º, da Constituição Federal, com base no risco administrativo, o qual prevê a obrigação de indenizar, independentemente de culpa ou dolo, desde que comprovado o nexo de causalidade entre o dano e o ato do agente. A orientação firmada no âmbito do Supremo Tribunal Federal aponta no sentido de que a referida responsabilidade objetiva abrange as condutas omissivas do Poder Público, inclusive com aplicabilidade quanto às pessoas jurídicas de direito público ou às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. Jurisprudência selecionada. 8. Na seara de enfermidades decorrentes de exposição ao Césio-137, em que pese a possível aplicação da teoria da redução do módulo da prova, é necessário a existência de algum elemento indiciário a permitir a possibilidade de existir nexo de causalidade entre as enfermidades apontadas e qualquer espécie de contado indireto com a radiação proveniente de tal elemento radioisótopo. Precedentes desta Corte. 9. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal são assentes no sentido de que, “[a] despeito de o julgador não estar adstrito à perícia judicial, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, por força do art. 145 do CPC [CPC/2015, art. 156], o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo se houver motivo relevante, uma vez que o perito judicial se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade” (cf. AgRg no AREsp 500.108/PE, Segunda Turma, da relatoria do ministro Humberto Martins, DJ 15/08/2014). Jurisprudência selecionada. 10. Na concreta situação dos autos, verifica-se que o laudo pericial foi inconclusivo quanto ao nexo causalidade entre a doença apresentada pela parte autora e o fatídico sinistro com o Césio-137, somente concluindo que pode haver nexo de causalidade entre as enfermidades apresentadas pelo periciado e o acidente. Contudo, também aponta que não há comprovação que a demandante tenha sido contaminada ou irradiada pelo elemento radioativo e que as enfermidades indicadas podem ser causadas por diversas causas, dentre elas, distúrbios alimentares, hormonais, genéticos, ligados ao envelhecimento e radioatividade. 11. Nesse contexto e considerado que a parte recorrente autora alega que iniciou seus trabalhos com as vítimas somente um ano após o desponte do acidente, além da ausência de prova quanto à possível exposição à radiação, ônus que era seu (CPC/2015, art. 373, inciso I), somente produzindo documentos médicos e outro que indica somente seu período de trabalho, reputam-se inexistentes elementos indiciários a amparar a aplicação da teoria da redução do módulo da prova e configurar o necessário nexo causal para estabelecer a responsabilidade objetiva na espécie. 12. De ofício, em relação ao Estado de Goiás, declarada a incompetência da Justiça Federal, julgando extinto o processo sem resolução do mérito (CPC/2015, arts. 64, § 1.º; art. 327, inciso II; c/c art. 485, incisos I e IV). Quanto às demais partes, apelação não provida. 13. Incabível a majoração dos honorários de que trata o art. 85, § 11, do CPC/2015, visto que os honorários recursais não têm autonomia e existência independente da sucumbência fixada na origem e representam um acréscimo ao ônus estabelecido previamente, motivo por que na hipótese de descabimento ou de ausência de fixação anterior, inclusive em desfavor da parte recorrente, não há falar-se em tal verba. Precedentes do STJ. 14. Em relação ao Estado de Goiás, considerado que a sua inclusão decorreu de ato do juízo de origem, sem qualquer pedido ou manifestação das partes, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios ante a ausência de sucumbência ou causalidade, princípios esses norteadores de tal verba sucumbencial. A C Ó R D Ã O Decide a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, por unanimidade, dar por extinto o processo sem resolução do mérito em relação ao Estado de Goiás e, quanto às demais partes, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator. Brasília/DF, 2 de julho de 2025. Desembargador Federal JOÃO CARLOS MAYER SOARES Relator
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