Processo nº 5001419-32.2024.4.03.6103
ID: 276578013
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de São José dos Campos
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5001419-32.2024.4.03.6103
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RENATA MIHE SUGAWARA
OAB/SP XXXXXX
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EDVALDO CHERUBIM
OAB/SP XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001419-32.2024.4.03.6103 / 2ª Vara Federal de São José dos Campos AUTOR: L. W. S. D. R. REPRESENTANTE: D. C. D. S. Advogados do(a) AUTOR: EDVALDO CHERUBIM - SP315864,…
PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001419-32.2024.4.03.6103 / 2ª Vara Federal de São José dos Campos AUTOR: L. W. S. D. R. REPRESENTANTE: D. C. D. S. Advogados do(a) AUTOR: EDVALDO CHERUBIM - SP315864, RENATA MIHE SUGAWARA - SP208015, REU: U. F. FISCAL DA LEI: M. P. F. -. P. TERCEIRO INTERESSADO: H. C. D. A. M. H. L. ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: MARIA LUISA DE CASTRO CORREIA - DF70186 S E N T E N Ç A Trata-se de demanda pelo procedimento comum, com pedido de tutela de urgência, no qual a parte autora requer o fornecimento do medicamento ZOLGENSMA, nos termos da prescrição médica, bem como o custeio das despesas médicas e hospitalares para a infusão do medicamento e todos os custos com o transporte terrestre e aéreo (se necessário) do autor e de seus acompanhantes, ainda que necessária eventual UTI aérea, a depender de relatório médico na época da infusão do medicamento, além de estadia no local da infusão, pois tanto o hospital, quanto o médico responsável pela infusão do medicamento devem ser habilitados junto à fabricante NOVARTIS, com todos os consectários legais. Alega, em apertada síntese, que é portador de Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME), tipo 1 (um) (CID: G12.0), doença rara e progressiva, a qual pode levar o portador ao óbito precoce. Aduz que à época da propositura da demanda, com 11 (onze) meses de vida, e, por não apresentar evolução ou ganho de mobilidades de uma criança de pouco menos de um ano, procurou-se atendimento médico. Realizou-se um exame genético na parte autora e constatou-se a total ausência de cópias do gene SMN1 e duas cópias do gene SMN2, o que ensejou o diagnóstico em questão. Narra que o medicamento Zolgensma foi aprovado pela ANVISA, por meio da Resolução - RE nº3.061, de 14 de agosto de 2020, e encontra-se registrado sob nº100681174, desde 17/08/2020. Informa que ao procurar o fornecimento do medicamento pelo Sistema Único de Saúde, tomou conhecimento de que o medicamento Zolgensma foi incorporado ao SUS para pacientes de até 6 (seis) meses de idade. Contudo, como o autor possuía 11 (onze) meses de idade, encontrava-se fora do requisito etário para o fornecimento pela rede pública. Indeferida a tutela de urgência, deferida a prioridade na tramitação, concedidos os benefícios da gratuidade processual e determinada a realização de perícia médica e consulta ao Nat-Jus (ID321651911). Houve interposição de agravo de instrumento pela parte autora, com deferimento da tutela recursal, aos 18/04/2024, com determinação de intimação da União para cumprimento em 48 (quarenta e oito) horas (ID322265045). A União foi intimada na referida data para cumprimento (ID322281392), oportunidade na qual informou o encaminhamento de Parecer de Força Executória para o órgão responsável (ID322320875). Reiterou-se a intimação da parte ré para cumprimento da determinação judicial (ID322600713). A parte autora comunicou o descumprimento da decisão (ID322637645). O r. do Ministério Público Federal manifestou-se nos autos (ID322783251). A União contestou o feito (ID323053882). Em sede de preliminar requer o indeferimento da justiça gratuita, a inclusão no processo do Município, Estado e do plano de saúde; pugna pela consideração de eventual campanha de arrecadação de doações; além de apresentar insurgência quanto ao valor da causa. No mérito, pede a improcedência. A União informou o envio de ofício ao agente responsável pelo cumprimento de decisões judiciais no Ministério da Saúde, a fim de que adotasse as providências necessárias ao cumprimento da decisão judicial (ID323276144). Por meio do ID 323390687, determinou-se nova emissão de nota técnica ao Nat-Jus, foi designada a perícia médica e a intimação da parte autora para apresentação de réplica (ID323390687). Nas petições ID323555616 e ID323556834, a parte autora informa a desídia da União no cumprimento da decisão, além de requerer o bloqueio de verbas públicas. A Nota Técnica 212576 – Nat-Jus foi juntada (ID323648793), na qual consta conclusão de “não favorável” ao fornecimento do medicamento. Intimou-se a União para esclarecer sobre o procedimento para aquisição do medicamento (ID323789291). O r. do Ministério Público Federal manifestou-se favorável à adoção de medidas coercitivas para compelir a parte ré ao cumprimento da decisão (ID323827484). A parte ré informou o envio de novo ofício para o órgão responsável para fins de esclarecimentos sobre o cumprimento da decisão (ID323842037). A parte autora reiterou o pedido de bloqueio de verbas públicas, pois a União não deu cumprimento à ordem (ID 323932350). O membro do Parquet novamente manifestou-se favorável à determinação de bloqueio de verbas da União (ID323970984). Foi determinado o encaminhamento de cópia da Nota Técnica do Nat-Jus para o E. TRF da 3ª Região para instruir o agravo de instrumento, além de ser determinado à parte autora que apresentasse esclarecimentos sobre a prescrição do medicamento pleiteado (ID323978109). O representante do Parquet apresentou esclarecimentos sobre o medicamento e reiterou o pedido para adoção de medidas coercitivas (ID324062323). A parte autora reiterou o pedido para adoção de medidas coercitivas para bloqueio de verbas públicas, além de apresentar documentos justificando os motivos para prescrição do medicamento pleiteado (ID324229723). A decisão ID324317133 concedeu o prazo de 48 (quarenta e oito) horas para cumprimento da decisão, sob pena de multa diária, fixada em R$2.000,00, de incidência nos crimes de desobediência e prevaricação, em outras responsabilidades no âmbito cível e administrativo, assim como, o bloqueio de verbas públicas (ID324317133). A União comunicou novo envio de ofício para o órgão responsável para cumprimento da tutela (ID324462401). Requereu, ainda, o cumprimento da decisão de forma alternativa, por meio de depósito judicial em montante constante de acordo firmado entre o Ministério da Saúde e a empresa Novartis (ID324521905). Cientificou-se a parte autora (ID324530118). Sobreveio aos autos decisão proferida no agravo de instrumento inicialmente interposto pela parte autora, ao qual foi dado provimento pela Superior Instância (ID324576539). Ante a ausência de cumprimento da decisão pela União, a parte autora reiterou o pedido de bloqueio de verbas públicas, conforme determinado na decisão proferida sob ID324317133 (ID 324744798). O r. do Ministério Público Federal requereu a intimação da parte autora para manifestação sobre o valor sugerido pela União para fins de depósito (ID324769329). Expediu-se ofício para o Banco Central para o bloqueio de verbas públicas, além de ofícios para apurações relativas ao descumprimento de ordem judicial (ID325237950, ID325239351 e ID325239352), conforme determinado na decisão proferida sob ID324317133 (ID 325023604). O Banco Central comunicou não deter competência para bloqueios de valores da União, os quais são de responsabilidade da Secretaria do Tesouro Nacional (ID325354135). A União comunicou providências relativas à autorização de despesa para fins de depósito judicial (ID325359755). Foi dada ciência às partes da resposta do BACEN, além de ser concedido prazo para que a União efetuasse o depósito judicial (ID325362475). A parte autora requereu o adiamento de perícia anteriormente designada por estar hospitalizado e internado em UTI (ID325473311). Determinou-se a manifestação das partes sobre a possibilidade de perícia indireta e à parte autora que informasse os dados para futura transferência dos valores (ID325477856). A parte autora não se opôs à realização de perícia indireta ou mesmo perícia realizada no hospital, onde o autor estava internado (ID325812688). Nova reiteração de pedido de bloqueio de verbas públicas, por meio de expedição de ofício à Secretaria do Tesouro Nacional (ID326022932). A União discordou da realização de perícia indireta e requereu a autorização para o depósito fosse feito em valor de propostas comerciais de venda do medicamento (ID326122105). Foi determinada a realização de perícia do autor no ambiente hospitalar; deferido o pedido da União para realização de depósito no montante de R$5.981.729,59; a apresentação de esclarecimentos pela parte autora, pois pleiteou o bloqueio de R$10.400.000,00, dentre outras deliberações (ID326183658). A União comunicou o encaminhamento de ofício para cumprimento da determinação judicial (ID326790827). Concedido prazo suplementar para a União efetuar o depósito, além de ser designada perícia médica (ID326849611). A União comunicou o encaminhamento de ofício para cumprimento da determinação judicial e justificou que os prazos concedidos são exíguos e dificultam o efetivo cumprimento da ordem judicial (ID326940817). A União comunicou providências relativas à autorização de despesa para fins de depósito judicial (ID327321071 e ID327585968). Foi dada ciência à parte autora acerca das manifestações da União, concedido novo prazo para a União efetuar o depósito, além de ser determinado o cumprimento de deliberações anteriores pela parte autora (ID327660448). A União informou as providências tomadas na via administrativa para cumprimento da ordem judicial (ID327847846). A parte autora apresentou orçamento para aplicação do medicamento, reiterou o pedido de bloqueio de verbas públicas e comunicou que houve alta hospitalar (ID328247263). Foi dada ciência à parte autora sobre as informações dos trâmites para realização do depósito judicial, assim como, à União sobre os documentos e orçamento apresentados pela parte autora. Determinado à parte autora que esclarecesse o motivo de ter apresentado orçamento, com UTI aérea, de Hospital localizado em Campina Grande do Sul/PR, uma vez que o autor reside em São José dos Campos/SP. Concedido novo prazo para União comprovar o depósito judicial, e, se acaso não efetuado, foi determinado o bloqueio de verbas públicas via Sisbajud. Por fim, foi designada nova data para realização de perícia nas dependências deste Fórum Federal (ID328334967). Réplica apresentada (ID328378097). A União informou as providências tomadas na via administrativa para cumprimento da ordem judicial (ID328399681). Juntado aos autos correio eletrônico enviado pelo patrono da parte autora, comunicando que não haveria como comparecer na perícia, pois estava em internação domiciliar (ID328575260). Designada nova perícia médica a ser realizada no domicílio do autor (ID328612856). A União juntou comprovante de depósito judicial, no montante de R$5.981.729,59 (ID328687571). A parte autora apresentou justificativas sobre o orçamento apresentado de hospital localizado no Paraná, e, ainda, pleiteou a transferência dos valores depositados (ID328835472). A União manifestou-se desfavorável ao pedido de UTI aérea requerida pela parte autora (ID329098727). A decisão ID329054566 determinou a aplicação do medicamento em hospital da mesma unidade da federação da residência do autor (São Paulo), bem como, para que a União apresentasse o orçamento respectivo. A União pleiteou a reconsideração da determinação para apresentar orçamento em hospital de São Paulo (ID329168848). O membro do Parquet registrou ciência (ID329258650). A parte autora apresentou quesitos e indicou assistente técnico (ID329279786). A União informou que não foi possível a obtenção de orçamento hospitalar (ID329980942). A parte autora apresentou orçamento de hospital localizado na cidade de São Paulo/SP (ID329980942). Foi dada ciência à União do orçamento apresentado pela parte autora no montante de R$6.317.607,93 e determinada a complementação do depósito (ID330202984). A União pleiteou a reconsideração da decisão que determinou o depósito complementar, pois o orçamento não teria incluído desconto de 3% sobre o Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVC), que reduziria o preço para R$6.045.290,00, conforme oferecido pela fabricante do remédio (ID330439005 e ID330435922). O r. do Ministério Público Federal requereu nova intimação da União para complementação do depósito (ID330535909). A parte autora informou que o mencionado acordo firmado com a empresa fabricante não chegou a ser formalizado pelo governo e reiterou o pedido de complementação do depósito (ID330609475). Pela decisão ID330632309 indeferiu-se o pedido de reconsideração da União, determinou-se a transferência bancária do valor depositado para o Hospital Dia em São Paulo para providenciar o traslado, internação e aplicação da medicação (ID330632309). Laudo pericial juntado aos autos (ID330671394). Ofício de transferência eletrônica dos valores depositados para o Hospital Dia em São Paulo (ID330684521 e ID330870844). A parte autora manifestou-se sobre o laudo pericial (ID330763241) e requereu a cobrança de comprovante de intimação do Hospital Dia, além do bloqueio do valor complementar, ante a inércia da União em efetuar o depósito (ID331820962). A União, com base em relatório de assistente técnica que acompanhou a perícia, requereu a suspensão cautelar da ordem de aplicação do medicamento, a intimação do perito para pronunciamento sobre os pontos indicados pela assistente técnica e a intimação da médica que prescreveu o medicamento. Por fim, requereu a concessão de prazo para manifestação sobre o laudo pericial (ID331987951). Indeferido o pedido da União e oportunizado à ré se manifestar sobre o laudo pericial, com a determinação de providenciar a complementação do depósito, conforme anteriormente determinado (ID332166071). Prestados esclarecimentos pelo perito judicial (ID332511488). Informou o Hospital HDIA que recebeu o valor de R$5.981.729,59 (cinco milhões novecentos e oitenta e um mil setecentos e vinte e nove reais e cinquenta e nove centavos), conforme consta na determinação judicial, sendo necessária a complementação do valor de R$250.528,34 (duzentos e cinquenta mil quinhentos e vinte e oito reais e trinta e quatro centavos) (ID332568077). NOVARTIS BIOCIÊNCIAS S.A. (NOVARTIS) como fornecedora do medicamento Zolgensma® requereu sua habilitação nos autos, com juntada de documentos (ID333829757 e seguintes). A União juntou sugestão do Ministério da Saúde (NOTA TÉCNICA Nº 248/2024-CGRAR/DAET/SAES/MS) e requereu o refazimento da perícia, com os esclarecimentos relativos às impugnações do Ministério da Saúde e com as respostas aos quesitos complementares formulados (ID334244856). O autor requereu o bloqueio das contas bancárias da União pelo Sistema Sisbajud no valor complementar necessário a fim de garantir o fornecimento do medicamento (ID335230205). Indeferido o pedido de habilitação e ingresso da empresa NOVARTIS BIOCIÊNCIAS S.A.(ID337098379). Determinado o sequestro / bloqueio do valor de R$250.528,34 (duzentos e cinquenta mil, quinhentos e vinte e oito reais e trinta e quatro centavos), via SISBAJUD, no CNPJ da Secretaria do Tesouro Nacional – Ministério da Fazenda, além de ouras determinações (ID337200216). O perito judicial apresentou resposta às pontuações técnicas feitas ao laudo pericial (ID337761303). A União reiterou integralmente os temos de sua impugnação ao Laudo Pericial de ID 334244856, fundada na Nota Técnica nº 248/2924 de ID 33424857, e requer seja revogada a tutela provisória de urgência e, ao final, julgado improcedentes os pedidos autorais (ID338125670). Sobreveio comunicado da CEF informação a transferência do valor de R$ 5.981.729,59 em favor do HDIA (ID339256736). Juntado resultado negativo da tentativa de bloqueio do valor complementar pelo sistema SISBAJUD (ID340321148). O autor informou que recebeu o medicamento pleiteado, Zolgensma, na data de 27/09/2024, conforme relatório médico e demais documentos do prontuário acostado aos autos. Nesta oportunidade, juntou documento comprovando que a União depositou judicialmente o importe de R$ 335.878,34, o qual requer seja liberado ao HDIA, com posterior prestação de contas (ID340522930 e seguintes). A União reiterou argumentos no sentido de que a demanda deveria ser julgada improcedente e juntou a bula do medicamento (ID341351611). Deferida a inclusão do HDIA CENTRO DE ATENDIMENTO MÉDICO HOSPITALAR LTDA na condição de terceiro interessado (ID345697280). O Ministério Público Federal não se opôs ao levantamento do valor remanescente a ser pago ao Hospital HDIA (ID346747070). O autor manifestou-se pela procedência da ação (ID346723222). Intimada a União para apresentar o comprovante do depósito judicial do valor de R$335.878,34 e o HDIA para prestação de contas dos valores despendidos na aplicação do medicamento ZOLGENSMA ao autor (ID352204124). Juntados documentos e esclarecimentos pela União (ID354443247 e seguintes) e pelo HDIA (ID358064694 e seguintes), seguido de manifestação do autor (ID360132254). O Ministério Público Federal manifestou-se favoravelmente ao pleito, a fim de que os pedidos iniciais serem julgados procedentes, confirmando-se a tutela antecipada de urgência (ID362270972). Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Fundamento e decido. Nos termos do art. 355, inciso I do Código de Processo Civil, passo ao julgamento antecipado da lide. Preliminarmente, não merece guarida a impugnação à concessão da justiça gratuita ao autor. Notória a situação nos autos a demonstrar que o autor não dispõe de recursos suficientes para o pagamento das custas processuais, da perícia médica e dos honorários advocatícios da parte contrária, caso seja vencido na demanda, sobretudo diante do fato de que a parte padece de grave enfermidade, e que o medicamento solicitado é de altíssimo custo, além dos demais gastos demandados com despesas médicas. Pugna a União que seja revogado o benefício da gratuidade de justiça, ao fundamento de que não há informações sobre os rendimentos do núcleo familiar. No entanto, é pacífico o entendimento do Tribunal Regional Federal da Terceira Região segundo o qual, para a concessão das isenções legais da assistência judiciária, basta somente a afirmação da parte, de não poder arcar com as custas e despesas processuais sem privar-se dos meios indispensáveis à subsistência. Para que seja concedido o benefício da justiça gratuita, não é necessário comprovar a miserabilidade absoluta do requerente. Exige o Tribunal que sejam apresentados fatos concretos demonstrando que, em razão do pagamento das custas e despesas processuais, a parte não seja prejudicada na alimentação, educação, lazer, saúde etc. Neste sentido, a seguinte ementa: PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DO ESTADO DE NECESSIDADE. CONCESSÃO DA BENESSE. 1. A concessão da assistência judiciária gratuita não está atrelada à comprovação de miserabilidade absoluta do postulante, mas sim à impossibilidade deste arcar com custas do processo e verba honorária, sem prejuízo ao atendimento de suas necessidades básicas e de sua família. 2. Apelação da parte autora provida. (TRF3. AC 00029545020124036120 AC - APELAÇÃO CÍVEL – 1831934. RELATOR(A): DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA. ÓRGÃO JULGADOR: DÉVIMA TURMA. FONTE: e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/05/2013. DATA DA DECISÃO: 21/05/2013). Neste caso o impugnante não trouxe provas concretas sobre tais fatos, tecendo alegações genéricas. Diante disso, rejeito a impugnação aos benefícios da gratuidade processual. Afasto a arguição de necessidade de formação de litisconsórcio necessário feita pela União em face do Município. Certo é que, embora as ações e serviços públicos de saúde integrem uma rede regionalizada e hierarquizada, marcada pela descentralização, constituem um sistema único (art. 198, caput, da CF), de responsabilidade de todos os entes políticos. A despeito disso, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que embora a obrigação de fornecimento de tratamento de saúde e medicamentos seja solidária entre os entes da federação (União, Estado e Município), o litisconsórcio em Juízo é facultativo e não necessário, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles, em conjunto ou isoladamente. No caso, a presente ação foi ajuizada em face da União, devendo, assim, contra ele prosseguir. Da mesma forma, rejeito o pedido da União de denunciação da lide ao plano de saúde do autor. Conquanto a Lei nº 9656/98 preveja o ressarcimento ao SUS pelas operadoras de plano de saúde, a questão discutida nestes autos envolve o fornecimento de fármaco, não havendo prova de que o contrato firmado entre o autor e a respectiva operadora de plano de saúde contemple esse tipo de prestação, em especial do medicamento pretendido nesta demanda. Ademais, a pretensão de ressarcimento ao SUS deverá ser exercida conforme as normas da ANS em âmbito administrativo e, na hipótese de não pagamento, por meio de execução de título extrajudicial, não havendo que se trazer a discussão para esta demanda de conhecimento. Por fim, rechaço a impugnação ao valor da causa, nos moldes deduzidos pela União. Constata-se que o valor dado à causa corresponde ao proveito econômico perseguido pelo autor, o qual levou em consideração o preço do medicamento pretendido, conforme comercializado para o público em geral, sendo impossível estimar, à época da propositura da ação, a existência de “acordo de compartilhamento de risco relativo a tal medicamento” a sugerir o preço indicado, conforme aludido pela União. Por derradeiro, informou o autor que não organizou campanhas de arrecadação e vaquinhas virtuais para o fim específico de financiar o seu tratamento, que pudessem interferir no auxílio do custeio do medicamento pretendido pela ré. Passo à análise do mérito propriamente dito. Busca o autor seja-lhe fornecida a medicação ZOLGENSMA (Onasemmogene), que alega ser a única forma de obstar a evolução da doença de que afirma ser portador (Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME), tipo 1. Importa repisar que os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inatos à pessoa humana, irrenunciáveis, indisponíveis e inalienáveis, constitucionalmente protegidos, cujo fundamento, em um Estado Democrático de Direito, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais. O art. 6º da Constituição da República estabelece que os direitos à saúde e a proteção à infância constituem direitos sociais, impondo, desta feita, ao Poder Público o dever de concretizá-los por meio de ações e serviços públicos que assegurem a sua efetiva proteção. Por sua vez, o art. 196 da Constituição estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo o acesso igualitário e universal aos serviços de saúde. Dispõe, ainda, que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único a ser financiado com recursos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes (art. 198). Com relação à criança e ao adolescente, o art. 227 da Constituição Federal ordena, de forma incisiva, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, dentre outros, o direito à vida, à saúde e à alimentação, sendo obrigação do Estado promover programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente. De modo a efetivar operacionalidade ao comando constitucional, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) assegura à criança e ao adolescente o direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso (art. 7º). Já a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, dispõe que o Sistema Único de Saúde - SUS é constituído pelo conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, estabelecendo as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bem como para a organização e funcionamento dos serviços correspondentes. O art. 6º do diploma acima citado (com a redação dada pela Lei nº12.401/2011), dispõe estar incluída no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS) a execução de ações de vigilância sanitária, de vigilância epidemiológica, de saúde do trabalhador e de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica. No entanto, segundo o art. 19-M da Lei nº12.401/2011, a assistência terapêutica integral em questão consiste na “dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art.19-P” (ou seja, de acordo com relatório a cargo da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, vinculada ao Ministério da Saúde, considerando as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do medicamento, produto ou procedimento e a avaliação econômica comparativa dos benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas). Pois bem. Não se pode negar que, em casos tais (em que se busca a tutela do direito à saúde, especificamente o fornecimento de medicamento de alto custo não contemplado em protocolo do SUS), a imposição ao(s) ente(s) público(s) do fornecimento de fármaco com tal natureza ocasiona impacto financeiro aos cofres públicos, notadamente em razão da ausência de previsão orçamentária para tanto (embora seja sabido que há várias fontes de receita e meios orçamentários legais para recolocação de verbas). Todavia, sobrepõe-se a tal entrave (a meu ver, contornável) o direito à vida, sem o qual nenhum outro direito (propriedade, liberdade, educação etc), sustenta-se isoladamente, tem razão de existir. Com efeito, o direito à vida (direito fundamental assegurado pelo art. 5º da CF/88) deve sobrepor-se a qualquer outro, quando confrontado sobre sua maior ou menor relevância de valor. Todo e qualquer empenho destinado a salvar uma vida é digno de louvor, não sendo plausível nenhuma tentativa de escusa por parte do Poder Público de propiciar a concessão de tratamento e medicamento aos necessitados, seja sob o argumento do alto custo de dispêndio monetário ou da falta de previsão orçamentária para tanto. A propósito, a “Teoria da Reserva do Possível” não é oponível ao mínimo existencial a que todo ser humano tem direito, no qual estão inclusos os direitos à vida e à saúde. Nesse sentido, colaciono precedentes do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: “ADMINISTRATIVO – CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS – POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS – DIREITO À SAÚDE – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – MANIFESTA NECESSIDADE – OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES – NÃO OPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. 1. Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria uma distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente fundamentais. 2. Tratando-se de direito fundamental, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. 3. In casu, não há empecilho jurídico para que a ação, que visa a assegurar o fornecimento de medicamentos, seja dirigida contra o município, tendo em vista a consolidada jurisprudência desta Corte, no sentido de que "o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros" (REsp 771.537/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 3.10.2005). Agravo regimental improvido.” (AGRESP 200900766912, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:21/06/2010) “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA. – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – ART. 461, § 5º, DO CPC – BLOQUEIO DE VALORES PARA ASSEGURAR O CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL – POSSIBILIDADE. 1. Inexiste omissão capaz de ensejar a ofensa ao art. 535 do CPC se o Tribunal de origem examina, ainda que implicitamente, a questão dita omissa. 2. É vedada a esta Corte, em sede de recurso especial, analisar suposta violação a dispositivos constitucionais. 3. Inexistência de similitude fática entre os arestos confrontados no recurso especial, sendo inviável o conhecimento do recurso pela alínea "c" do permissivo constitucional. 4. Tem prevalecido no STJ o entendimento de que é possível, com amparo no art. 461, § 5º, do CPC, o bloqueio de verbas públicas para garantir o fornecimento de medicamentos pelo Estado. 5. Embora venha o STF adotando a "Teoria da Reserva do Possível" em algumas hipóteses, em matéria de preservação dos direitos à vida e à saúde, aquela Corte não aplica tal entendimento, por considerar que ambos são bens máximos e impossíveis de ter sua proteção postergada. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido.” (RESP 200501603248, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:23/04/2008) O ponto crucial a ser esclarecido por meio da presente ação é definir se o autor, de fato, é portador de Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME), tipo 1 (um), enfermidade de origem genética, com alto potencial de, ao longo do tempo, acarretar o comprometimento de seu desenvolvimento, a justificar a utilização do medicamento ZOLGENSMA (Onasemmogene) – aprovado pela ANVISA (mas ainda não incorporado ao SUS para a idade do autor) -, na forma prescrita pelo médico assistente do requerente. Neste tópico, a questão não comporta maiores digressões. Não se desconhece que, a partir do julgamento dos temas 1234 e 6 pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, a concessão judicial de medicamentos não incorporados ao SUS deve se limitar a casos excepcionais, considerando a escassez de recursos e eficiência de polícias públicas, igualdade no acesso à saúde e respeito à expertise técnica e medicina baseada em evidências. Todavia, no caso dos autos, por r. decisão prolatada anteriormente ao julgamento dos temas referidos, em sede de agravo de instrumento, o E. TRF da 3ª Região deferiu a antecipação dos efeitos da tutela recursal e determinou o fornecimento do medicamento pleiteado ao autor (ID 322265045). Ainda, na sequência, foi dado provimento ao recurso pela Superior Instância, confirmando a tutela de urgência anteriormente concedida (ID324576539). E, mais, restou devidamente comprovado nos autos o cumprimento da r. decisão do E. TRF da 3ª Região, sendo o medicamento pleiteado ministrado ao autor na data de 27/09/2024 (ID340522930) cuja evolução do procedimento foi descrita pelo HOSPITAL DIA / H-DIA sob ID340522941. Nesse passo, ante o caráter satisfativo da liminar deferida, não há se falar em perda de objeto, mas impõe-se a confirmação da decisão proferida, cujos efeitos somente subsistem mediante o pronunciamento jurisdicional definitivo, que se concretiza no presente julgamento. Destarte, à vista da relevância do direito envolvido na causa, passo o julgamento do mérito da causa utilizando-me, para tanto, dos mesmos fundamentos que alicerçaram o decisum acima referido, os quais adoto como razão de decidir, nos seguintes termos: “Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto pela parte autora contra a r. decisão, proferida em sede de processo de conhecimento em que se objetiva o fornecimento de medicamento de alto custo, que indeferiu o requerimento de concessão de tutela de urgência, determinando a prévia realização de trabalho pericial. A parte autora afirma sua hipossuficiência, sustenta a necessidade e a urgência de que o Poder Público forneça o que restou prescrito pelo médico, com a finalidade de manutenção de sua saúde. Aponta probabilidade de piora do quadro clínico e até mesmo risco à vida pelos óbices supostamente criados pela parte contrária. O requerimento de antecipação da tutela foi concedido por esta Relatoria, ao que a União opôs embargos de declaração. Com contraminuta. O Juízo a quo comunicou a prolação de decisão a fim de dar viabilidade à tutela. É o relatório. DECIDO. De início, observa-se que o artigo 932, IV e V, do Código de Processo Civil – CPC, Lei nº 13.105/15, autoriza o Relator, por mera decisão monocrática, a negar ou dar provimento a recursos. Apesar das mencionadas alíneas do dispositivo elencarem as hipóteses em que o julgador pode exercer tal prerrogativa, o entendimento da melhor doutrina é no sentido de que o mencionado rol é meramente exemplificativo. Conforme já firmado na orientação deste Colegiado: [...] Manifestando esse entendimento, asseveram Marinoni, Arenhart e Mitidiero: Assim como em outras passagens, o art. 932 do Código revela um equívoco de orientação em que incidiu o legislador a respeito do tema dos precedentes. O que autoriza o julgamento monocrático do relator não é o fato de a tese do autor encontrar-se fundamentada em "súmulas" e "julgamento de casos repetitivos" (leia -se, incidente de resolução de demandas repetitivas, arts. 976 e ss., e recursos repetitivos, arts. 1.036 e ss.) ou em incidente de "assunção de competência". É o fato de se encontrar fundamentado em precedente do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em jurisprudência formada nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais em sede de incidente de resolução de demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência capaz de revelar razões adequadas e suficientes para solução do caso concreto. O que os preceitos mencionados autorizam, portanto, é o julgamento monocrático no caso de haver precedente do STF ou do STJ ou jurisprudência firmada em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência nos Tribunais de Justiça ou nos Tribunais Regionais Federais. Esses precedentes podem ou não ser oriundos de casos repetitivos e podem ou não ter adequadamente suas razões retratadas em súmulas. (Curso de Processo Civil, 3ª e., v. 2, São Paulo, RT, 2017). Os mesmos autores, em outra obra, explicam ainda que"a alusão do legislador a súmulas ou a casos repetitivos constitui apenas um indício - não necessário e não suficiente - a respeito da existência ou não de precedentes sobre a questão que deve ser decidida. O que interessa para incidência do art. 932, IV, a e b, CPC, é que exista precedente sobre a matéria - que pode ou não estar subjacente a súmulas e pode ou não decorrer do julgamento de recursos repetitivos" ("Novo Código de Processo Civil comentado", 3ª e., São Paulo, RT, 2017, p. 1014, grifos nossos). Também Hermes Zaneti Jr. posiciona-se pela não taxatividade do elenco do art. 932, incisos IV e V (Poderes do Relator e Precedentes no CPC/2015: perfil analítico do art. 932, IV e V, in "A nova aplicação da jurisprudência e precedentes no CPC/2015: estudos em homenagem à professora Teresa Arruda Alvim", Dierle José Coelho Nunes, São Paulo, RT, 2017, pp. 525-544).(...)”. (ApCiv nº 0013620-05.2014.403.6100, Rel. Des. Fed. SOUZA RIBEIRO, decisão de 23/03/2023) Desta feita, à Súmula nº 568 do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ ("O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema") une-se a posição da doutrina majoritária retro transcrita, que entende pela exemplificatividade do listado do artigo 932 do CPC. Impende consignar que o princípio da colegialidade não resta ferido, prejudicado ou tolhido, vez que as decisões singulares são recorríveis pela via do agravo interno (art. 1.021, caput, CPC). Nesta esteira, a jurisprudência deste E. Tribunal: TRIBUTÁRIO - DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO INTERNO – ART. 1021, CPC - POSSIBILIDADE DA DECISÃO UNIPESSOAL, AINDA QUE NÃO SE AMOLDE ESPECIFICAMENTE AO QUANTO ABRIGADO NO NCPC. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DAS EFICIÊNCIA (ART. 37, CF), ANÁLISE ECONÔMICA DO PROCESSO E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO (ART. 5º, LXXVIII, CF - ART. 4º NCPC). ACESSO DA PARTE À VIA RECURSAL (AGRAVO) – ARGUMENTOS QUE NÃO MODIFICAM A FUNDAMENTAÇÃO E A CONCLUSÃO EXARADAS NA DECISÃO MONOCRÁTICA - EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – EXCESSO DE EXECUÇÃO NÃO DEMONSTRADO - ICMS NA BASE DE CÁLCULOS DO PIS/COFINS – RE 574.706 – MODULAÇÃO DOS EFEITOS – OPOSIÇÃO DOS EMBARGOS APÓS 15/03/2017 - AFASTADAS AS ALEGAÇÕES DE CERCEAMENTO DE DEFESA E DE OFENSA À AMPLA DEFESA – LEGALIDADE DO ENCARGO PREVISTO PELO DECRETO-LEI Nº 1025/69 - AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Eficiência e utilitarismo podem nortear interpretações de normas legais de modo a que se atinja, com rapidez sem excessos, o fim almejado pelas normas e desejado pela sociedade a justificar a ampliação interpretativa das regras do NCPC que permitem as decisões unipessoais em sede recursal, para além do que a letra fria do estatuto processual previu, dizendo menos do que deveria. A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático - controlado por meio do agravo - está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37, CF; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF; art. 4º do NCPC). 2. O ponto crucial da questão consiste em, à vista de decisão monocrática, assegurar à parte acesso ao colegiado. O pleno cabimento de agravo interno - AQUI UTILIZADO PELA PARTE - contra o decisum, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da colegialidade e de cerceamento de defesa; ainda que haja impossibilidade de realização de sustentação oral, a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à apreciação da Turma, onde a parte poderá acompanhar o julgamento colegiado, inclusive valendo-se de prévia distribuição de memoriais. 3. Argumentos apresentados no agravo não abalaram a fundamentação e a conclusão exaradas por este Relator, adotando-as como razão de decidir deste agravo. 4. A sentença considerou, no que tange à inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, que esse pedido se trata de alegação de excesso de execução e que a inicial não foi instruída com o demonstrativo discriminado e atualizado do valor devido, conforme exigido pelo art. 917, § 3º, do CPC, o que inviabiliza o julgamento de mérito dos embargos, pois ausente pressuposto processual para seu processamento e, sob esse aspecto, julgou-os extintos, com base no art. 485, IV, c/c art. 917, §§ 3º e 4º, do CPC, entendimento tem sido acolhido por Turmas que compõem a Segunda Seção desta Corte. 5. A pretensão da recorrente de produção de prova não encontra amparo, uma vez que devem ser observados os efeitos da modulação definida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos embargos declaratórios opostos no RE nº 574.706, que fixou como marco inicial da tese de inconstitucionalidade o dia 15/03/2017, ressalvando os contribuintes exercentes de pretensão contra a incidência tributária até essa data pela via administrativa ou judicial. [...] 11. O agravo interno não trouxe qualquer argumento novo capaz de modificar a conclusão deste Relator, que por isso a mantém por seus próprios fundamentos. Precedentes desta Sexta Turma e do E. Superior Tribunal de Justiça. 12. Negado provimento ao agravo interno. (ApCiv nº 5000069-41.2022.4.03.6115/SP, Rel. Des. Fed. JOHONSOM DI SALVO, 6ª Turma, j. 14/07/2023, Intimação via sistema DATA: 20/07/2023. Mais: ApCiv nº 0013620-05.2014.4.03.6100, Rel. Des. Fed. SOUZA RIBEIRO, 6ª Turma, j. 14/07/2023, DJEN 20/07/2023; ApReeNec nº 00248207820164039999, Des. Fed. GILBERTO JORDAN, 9ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/10/2017. Dispõe o art. 109, da Constituição Federal: Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; VII - os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição; VIII - os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais; IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar; X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização; XI - a disputa sobre direitos indígenas. [...] § 3º Lei poderá autorizar que as causas de competência da Justiça Federal em que forem parte instituição de previdência social e segurado possam ser processadas e julgadas na justiça estadual quando a comarca do domicílio do segurado não for sede de vara federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019) Com efeito, infere-se do referido dispositivo constitucional que a competência federal, regra geral, define-se em razão da pessoa, a Administração Pública Federal, cabendo a esta E. Corte Federal o julgamento das demandas que envolvam o interesse da União Federal direta ou indiretamente, observando-se o disposto no art. 108, II, da CF no tocante à competência delegada. Sobre a cumulação de pedidos, estabelecem os arts. 327, § 1º, II, do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. Importante destacar, ainda, a Súmula nº 150 do Superior Tribunal de Justiça, que prevê: "Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas". Sobre a legitimidade ad causam enquanto condição da ação, Humberto Theodoro Júnior ensina: [...] para que o provimento de mérito seja alcançado, para que a lide seja efetivamente solucionada, não basta existir um sujeito ativo e um sujeito passivo. É preciso que os sujeitos sejam, de acordo com a lei, partes legítimas, pois, se tal não ocorrer, o processo se extinguirá sem resolução do mérito (art. 267, VI). [...] A legitimação ativa caberá ao titular do interesse afirmado na pretensão, e a passiva ao titular do interesse que se opõe ou resiste à pretensão. (Curso de Direito Processual Civil - Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2011) Segundo a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, as condições da ação são aferidas conforme a teoria da asserção, ou seja, tão somente a partir do que foi narrado na petição inicial. Com efeito, tudo que exige cotejo probatório pertence ao mérito, pois, "se o juiz realizar cognição profunda sobre as alegações contidas na petição, após esgotados os meios probatórios, terá, na verdade, proferido juízo sobre o mérito da questão" (Direito e Processo, São Paulo: RT, 1995, p. 78)." (BEDAQUE, José Roberto Santos, apud REsp 1157383/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 17/08/2012). Neste sentido, o E. STJ, no julgamento do REsp 1551968/SP sob a sistemática dos recursos repetitivos, já decidiu que, quanto às condições da ação, "prevalece a teoria da asserção" (Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2016, DJe 06/09/2016). Neste mesmo sentido, já decidiu esta E. Corte Federal: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. PROTESTO DE DUPLICATA MERCANTIL RECEBIDA POR ENDOSSO-MANDATO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE PROMOVEU O PROTESTO. TEORIA DA ASSERÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA. I.A Jurisprudência fixou o entendimento de que o ordenamento jurídico acolheu, para fins de legitimidade passiva, a teoria da asserção, segundo a qual é parte legítima para o processo, em princípio, aquele que o autor indicar como tal, devendo esta premissa ser afastada apenas nos casos em que esta indicação transbordar os limites da razoabilidade e proporcionalidade. II.Apelação provida. (TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1715822 - 0001087-19.2011.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, julgado em 10/04/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/04/2018) CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SFH. SINISTRO DE MORTE. QUITAÇÃO POR COBERTURA SECURITÁRIA. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS APÓS A MORTE DO SEGURADO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. RECURSO PROVIDO. 1. Considerando a matéria em discussão no caso concreto, não há que se falar na ausência de interesse processual da agravante em relação à agravada, eis que a parte autora não tem o seu exercício do direito de ação condicionado à prévia discussão administrativa no que tange à devolução das parcelas de contrato de mútuo que entende terem sido indevidamente pagas, ainda que condicionada a uma questão prejudicial relativa ao efetivo direito à cobertura securitária. 2. Quanto à cobertura securitária em contrato de mútuo habitacional vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação - SFH, tem-se que eventual interesse da CEF na lide é pautado pela natureza da apólice contratada. Assim, na qualidade de gestora do Fundo de Compensação de Variações Salariais - FCVS , o interesse da CEF em ações que versem sobre cobertura securitária no âmbito do SFH apenas estará configurado se a apólice de seguro habitacional pertencer ao "ramo 66 ", de natureza pública, o que não é o caso dos autos. 3. Todavia, na hipótese, verifica-se que a ação promovida pelo autor não tem por objeto unicamente a cobertura securitária, decorrente de doença grave que acomete o agravante, a qual daria ensejo à quitação do contrato. Com efeito, há também pedido de devolução de valores pagos indevidamente a partir de 17/05/2013, em face da CEF. 4. Se o autor apenas pretendesse a cobertura securitária, de fato, somente a CAIXA SEGURADORA S/A teria legitimidade para figurar no polo passivo, sendo da Justiça Comum Estadual a competência para julgamento da ação, mas, em razão dos outros pedidos, tenho que, levando-se em consideração a teoria da asserção, a CEF tem legitimidade para integrar o polo passivo da demanda. 5. Agravo provido. (TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 537701 - 0019796-64.2014.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 02/05/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/05/2017) PROCESSO CIVIL. LEGITIMIDADE. TEORIA DA ASSERÇÃO. Caso concreto em que a peça inicial não descreve a conduta omissiva da SUSEP que, outrossim, não se faz corresponsável pelo simples exercício de seu poder regulamentar, policial e sancionatório sobre as atividades financeiras. Apelação a que se nega provimento. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1869346 - 0013127-09.2006.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 19/02/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/02/2019) Pois bem. Estabelece o Texto Constitucional, orientando-se pelo princípio da dignidade da pessoa humana enquanto fundamento da República Federativa do Brasil, que a saúde é um direito social: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. [...] Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Com efeito, previu o constituinte a competência comum dos entes federativos para "II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência" (art. 23, CF). Neste sentido, resguardando o quanto positivado no Texto Constitucional, o E. Supremo Tribunal Federal já definiu, no julgamento do RE 855178, leading case do tema 793 de repercussão geral, a tese: Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Se é um direito social basilar do cidadão o acesso à saúde, e se é dever do Poder Público (de maneira solidária entre os entes federativos) dela cuidar, todas as alternativas cientificamente comprovadas e/ou prescritas destinadas ao resguardo deste devem ser consideradas, buscadas, e, quando devido, custeadas pelo Estado. Em havendo solidariedade entre os entes federativos quanto ao dever de fornecimento de medicamentos, faculta-se à parte autora o ajuizamento da ação em face de todos, de um ou mais entes, como sua estratégia processual entender mais adequada à proteção do direito almejado. A fixação da tese 793 pelo E. STF no tocante à solidariedade entre os entes federativos diz respeito expressamente ao cumprimento do dever, e não à fase de conhecimento, interessando mais aos entes entre si, no tocante ao ressarcimento do que um ou mais tenha suportado em detrimento dos demais. Não se confunde com a opção da parte de demandar e exigir de qualquer deles a obrigação por inteiro, que, se o caso, por haver solidariedade, podem demandar em regresso em face dos demais, sem tumultuar o processo da parte adoentada. A propósito, já decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça em diversas oportunidades: PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. JUSTIÇA ESTADUAL QUE DETERMINA A EMENDA DA INICIAL PARA INCLUSÃO DA UNIÃO. JUSTIÇA FEDERAL. RECONHECIMENTO DO LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. AFASTAMENTO DA UNIÃO DO POLO PASSIVO. SÚMULA 150/STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. Afastada a legitimidade da União para figurar no polo passivo da demanda pela Justiça Federal, deve-se reconhecer a competência da Justiça Estadual para o deslinde da controvérsia, na linha da Súmula 150/STJ e dos inúmeros precedentes desta Corte Superior. 2. No caso, a Justiça Federal excluiu a União da lide, pois a Justiça Estadual não poderia ter determinado a emenda da inicial para que houvesse a inclusão do referido ente público federal no litígio, haja vista que se está diante de um litisconsórcio facultativo. 3. A tese firmada no julgamento do Tema 793 pelo Supremo Tribunal Federal, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença e às regras de ressarcimento aplicáveis ao ente público que suportou o ônus financeiro decorrente do provimento jurisdicional que assegurou o direito à saúde. Logo, a referida orientação jurisprudencial não modifica a interpretação da Súmula 150/STJ, mormente porque o Juízo Federal, na situação em apreço, não afastou a solidariedade entre os entes federativos, mas apenas reconheceu a existência do litisconsórcio facultativo. 4. Ademais, no âmbito do conflito de competência, não se discute o mérito da ação, tampouco qual seria o rol de responsabilidades atribuído a cada ente federativo em relação ao Sistema Único de Saúde. Cumpre apenas a análise do juízo competente para o exame do litígio, nos termos em que apresentados o pedido e a causa de pedir. 5. Agravo interno a que se nega provimento.(AINTCC - AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 166964 2019.01.97527-7, OG FERNANDES, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJE DATA:19/11/2019 ..DTPB:.) PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PELO MUNICÍPIO DE UBERABA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. 1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público estadual contra o Município de Uberaba para que este forneça o medicamento oxcarbazepina, 600 mg; 90 cumprimidos ao mês. 2. Rejeito o pedido de suspensão deste recurso, haja vista que a questão tratada neste processo não se refere ao fornecimento de medicamento de alto custo, mas a existência de solidariedade entre a União, Estado e Municípios no fornecimento de medicamentos. Por outro lado, acrescento que o REsp 1.144.382/AL, que tratava da matéria, teve a sua afetação cancelada. 3. O Tribunal pleno do STF, em 5.3.2015, julgou o RE 855.178/SE, com repercussão geral reconhecida, reafirmou sua jurisprudência no sentido de que o polo passivo da relação de direito processual pode ser composto por qualquer dos entes federados, porquanto a obrigação de fornecimento de medicamentos é solidária. 4. O direito constitucional à saúde faculta ao cidadão obter de qualquer dos Estados da federação (ou Distrito Federal) os medicamentos de que necessite, sendo dispensável o chamamento ao processo dos demais entes públicos não demandados. Desse modo, fica claro o entendimento de que a responsabilidade em matéria de saúde, aqui traduzida pela distribuição gratuita de medicamentos em favor de pessoas carentes, é dever do Estado, compreendidos aí todos os entes federativos. 5. Agravo Interno não provido. (AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1710679 2017.02.80328-3, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:05/11/2019 ..DTPB:.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. SAÚDE. PRESTAÇÃO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. SOLIDARIEDADE ENTRE OS MEMBROS FEDERATIVOS. 1. É solidária a responsabilidade da União, dos Estados-membros e dos Municípios em ação que objetiva a garantia do acesso a tratamento de saúde, razão pela qual o polo passivo da demanda pode ser ocupado por qualquer um deles, isolada ou conjuntamente. 2. Matéria pacificada pelo STF no julgamento do RE 855.178- RG/SE, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 16/3/2015, sob o rito da repercussão geral. 3. Agravo interno a que se nega provimento.(AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1010069 2007.02.80767-5, OG FERNANDES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:11/10/2019 ..DTPB:.) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. PRESCRIÇÃO POR MÉDICO PARTICULAR. OBRIGATORIEDADE DO ESTADO FORNECER A MEDICAÇÃO. RESPEITO AO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. SÚMULA 284/STF. LITISCONSÓRCIO. UNIÃO E MUNICÍPIO DE TERESINA. AÇÃO PODE SER PROPOSTA CONTRA OS ENTES DE MODO CONJUNTO OU ISOLADO. SOLIDARIEDADE. PRECEDENTES DO STJ. ÔNUS DA PROVA. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Da análise do recurso especial verifica-se que o recorrente não indicou qual dispositivo legal estaria violado quanto as teses de incompetência absoluta da justiça estadual, impossibilidade de fornecimento de medicamento prescrito por médico particular, que o Estado do Piauí não é obrigado a fornecer o medicamento solicitado, além da necessidade de respeito ao princípio da reserva do possível, o que atrai a incidência da Súmula 284/STF. 2. A jurisprudência desta Corte Superior orienta-se no sentido de que que o funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses Entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de lide que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problemas de saúde. 3. Alterar o decidido no acórdão impugnado, no que se refere à distribuição do ônus da prova exige o reexame de fatos e provas, o que é vedado em recurso especial em razão do óbice da Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno não provido. (AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1799103 2019.00.56001-5, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:24/09/2019 ..DTPB:.) Vale mencionar, ainda, julgamento proferido pelo próprio E. STF advertindo da natureza protelatória de se pretender incluir no polo passivo da lide todos os entes solidariamente responsáveis: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À SAÚDE (ART. 196, CF). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SOLIDARIEDADE PASSIVA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. CHAMAMENTO AO PROCESSO. DESLOCAMENTO DO FEITO PARA JUSTIÇA FEDERAL. MEDIDA PROTELATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O artigo 196 da CF impõe o dever estatal de implementação das políticas públicas, no sentido de conferir efetividade ao acesso da população à redução dos riscos de doenças e às medidas necessárias para proteção e recuperação dos cidadãos. 2. O Estado deve criar meios para prover serviços médico-hospitalares e fornecimento de medicamentos, além da implementação de políticas públicas preventivas, mercê de os entes federativos garantirem recursos em seus orçamentos para implementação das mesmas. (arts. 23, II, e 198, § 1º, da CF). 3. O recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios. Isto por que, uma vez satisfeitos tais requisitos, o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional. 4. In casu, o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida. 5. Agravo regimental no recurso extraordinário desprovido. (RE-AgR - AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, LUIZ FUX, STF.) Mais recentemente, o E. STF, reconhecendo a existência de repercussão geral, elegeu o RE 1366243 como leading case do tema 1234, in verbis: "Legitimidade passiva da União e competência da Justiça Federal, nas demandas que versem sobre fornecimento de medicamentos registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, mas não padronizados no Sistema Único de Saúde – SUS.". Referido RE "discute, à luz dos artigos 23, II, 109, I, 196, 197 e 198, I, da Constituição Federal, a obrigatoriedade de a União constar do polo passivo de lide que verse sobre a obtenção de medicamento ou tratamento não incorporado nas políticas públicas do SUS, embora registrado pela Anvisa.". Naquela oportunidade, ao analisar o requerimento de concessão de tutela de urgência, o E. STF assim determinou: REFERENDO NA TUTELA PROVISÓRIA INCIDENTAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 1.234. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL NAS DEMANDAS QUE VERSAM SOBRE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS REGISTRADOS NA ANVISA, MAS NÃO PADRONIZADOS NO SUS. DECISÃO DO STJ NO IAC 14. DEFERIMENTO PARCIAL DA MEDIDA CAUTELAR PLEITEADA. 1. O julgamento do IAC 14 pelo Superior Tribunal de Justiça constitui fato novo relevante que impacta diretamente o desfecho do Tema 1234, tanto pela coincidência da matéria controvertida – que foi expressamente apontada na decisão de suspensão nacional dos processos – quanto pelas próprias conclusões da Corte Superior no que concerne à solidariedade dos entes federativos nas ações e serviços de saúde. 2. Reflexões conduzidas desde o julgamento da STA 175, em 2009, inclusive da respectiva audiência pública, incentivaram os Poderes Legislativo e Executivo a buscar organizar e refinar a repartição de responsabilidades no âmbito do Sistema Único de Saúde. Reporto-me especificamente (i) às modificações introduzidas pelas Leis 12.401/2011 e 12.466/2010 na Lei 8.080/1990, (ii) ao Decreto 7.508/2011; e (iii) às sucessivas pactuações no âmbito da Comissão Intergestores Tripartite. 3. Há um esforço de construção dialógica e verdadeiramente federativa do conceito constitucional de solidariedade ao qual o Poder Judiciário não pode permanecer alheio, sob pena de incutir graves desprogramações orçamentárias e de desorganizar a complexa estrutura do SUS, sobretudo quando não estabelecida dinâmica adequada de ressarcimento. O conceito de solidariedade no âmbito da saúde deve contemplar e dialogar com o arcabouço institucional que o Legislador, no exercício de sua liberdade de conformação, deu ao Sistema Único de Saúde. 4. No julgamento do Tema 793 da sistemática a repercussão geral, a compreensão majoritária da Corte formou-se no sentido de observar, na composição do polo passivo de demandas judiciais relativas a medicamentos padronizados, a repartição de atribuições no SUS. A solidariedade constitucional pode ter se revestido de inúmeros significados ao longo do desenvolvimento da jurisprudência desta Corte, mas não se equiparou, sobretudo após a reforma do SUS e o julgamento do Tema 793, à livre escolha do cidadão do ente federativo contra o qual pretende litigar. 5. Tutela provisória concedida em parte para estabelecer que, até o julgamento definitivo do Tema 1.234 da Repercussão Geral, sejam observados os seguintes parâmetros: 5.1. nas demandas judiciais envolvendo medicamentos ou tratamentos padronizados: a composição do polo passivo deve observar a repartição de responsabilidades estruturada no Sistema Único de Saúde, ainda que isso implique deslocamento de competência, cabendo ao magistrado verificar a correta formação da relação processual; 5.2. nas demandas judiciais relativas a medicamentos não incorporados: devem ser processadas e julgadas pelo Juízo, estadual ou federal, ao qual foram direcionadas pelo cidadão, sendo vedada, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a declinação da competência ou determinação de inclusão da União no polo passivo; 5.3. diante da necessidade de evitar cenário de insegurança jurídica, esses parâmetros devem ser observados pelos processos sem sentença prolatada; diferentemente, os processos com sentença prolatada até a data desta decisão (17 de abril de 2023) devem permanecer no ramo da Justiça do magistrado sentenciante até o trânsito em julgado e respectiva execução (adotei essa regra de julgamento em: RE 960429 ED-segundos Tema 992, de minha relatoria, DJe de 5.2.2021); 5.4. ficam mantidas as demais determinações contidas na decisão de suspensão nacional de processos na fase de recursos especial e extraordinário. 6. Tutela provisória referendada. (RE 1366243 TPI-Ref, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 19/04/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 24-04-2023 PUBLIC 25-04-2023) No tocante ao mérito da terapêutica pretendida, cabe ao médico, devidamente habilitado para o exercício de sua atividade profissional e conhecedor das técnicas e tratamentos, indicar o procedimento e/ou medicamento mais adequado para a preservação da vida e da saúde, o que excepcionalmente pode implicar em sua realização de maneira diversa daquela ordinariamente praticada, seja pelo custo ou pelo método. A título de informação, adotando este raciocínio de maneira reiterada, o E. Tribunal de Justiça de São Paulo editou as seguintes súmulas: Súmula 90: Havendo expressa indicação médica para a utilização dos serviços de “home care”, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não pode prevalecer. Súmula 95: Havendo expressa indicação médica, não prevalece a negativa de cobertura do custeio ou fornecimento de medicamentos associados a tratamento quimioterápico. Súmula 96: Havendo expressa indicação médica de exames associados a enfermidade coberta pelo contrato, não prevalece a negativa de cobertura do procedimento. Súmula 97: Não pode ser considerada simplesmente estética a cirurgia plástica complementar de tratamento de obesidade mórbida, havendo indicação médica. Súmula 102: Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS. Com efeito, este é o entendimento já sedimentado pelo E. Superior Tribunal de Justiça e também ostensivamente aplicado por esta E. Corte Federal: "Nas ações em que se busca o fornecimento de medicamentos, a escolha do fármaco compete a médico habilitado e conhecedor do quadro clínico do paciente, podendo ser tanto um profissional particular quanto um da rede pública." Julgados: AgInt no REsp 1373566/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/08/2020, DJe 27/08/2020; EDcl no REsp 1801213/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/12/2019, DJe 20/08/2020; RMS 61891/GO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 19/12/2019; AgInt no AREsp 405126/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/09/2016, DJe 26/10/2016; AgInt no REsp 1658552/RJ (decisão monocrática), Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 29/03/2021, publicado em 05/04/2021; REsp 1866082/MG (decisão monocrática), Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, publicado em 02/06/2020. In casu, o relatório médico juntado aos autos é documento suficiente a comprovar a necessidade do tratamento do modo postulado e a urgência com que tal procedimento deve ocorrer. Inclusive, a jurisprudência pátria já fixou o entendimento de que a prova pericial é dispensável, bastando o receituário/relatório apresentado pelo próprio profissional que conhece as mazelas de seu paciente, não havendo que se falar, portanto, em cerceamento de defesa: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. DESNECESSIDADE DE PERÍCIA MÉDICA JUDICIAL. 1. Hipótese em que a Corte a quo anulou a sentença que havia determinado o fornecimento de medicamento ao agravante, porque não houve a realização de perícia judicial, tendo o medicamento sido prescrito por médico que acompanha o paciente. 2. O STJ, no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe DJe 4/5/2018, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, entendeu que a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na Anvisa, observados os usos autorizados pela agência. 3. Dessa forma, não prospera a tese do acórdão recorrido de que todo medicamento pleiteado em juízo depende da realização de prévia perícia oficial, uma vez que o STJ admite o fornecimento de medicamentos com base em laudo do médico que assiste o paciente. 4. Assim, o recurso deve ser provido, com o retorno dos autos para a instância de origem aferir a comprovação da necessidade do medicamento a partir dos parâmetros fixados pelo Superior Tribunal de Justiça no precedente repetitivo indicado acima. 5. Agravo conhecido para dar provimento ao Recurso Especial. (ARESP - AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - 1534208 2019.01.92917-2, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:06/09/2019 ..DTPB:.) AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. TUTELA DE URGÊNCIA EM DEMANDA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER VOLTADA AO FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. TRIKAFTA (ELEXACAFOR + TEZACAFTOR + IVACAFTOR 100MG/50MG/75MG E 150MG). APLICABILIDADE DO PARADIGMA FIRMADO NO JULGAMENTO DO RESP Nº 1.657.156/RJ. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. PRESCINDIBILIDADE DE PRÉVIA PERÍCIA MÉDICA. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA EM PRIMEIRO GRAU MANTIDA. DILAÇÃO DE PRAZO PARA CUMPRIMENTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1. Trata-se de agravo de instrumento interposto pela União Federal contra a decisão que, nos autos da ação ordinária de obrigação de fazer aforada por Pâmela Roberta Ramelo contra a União Federal, deferiu a tutela de urgência requerida e determinou que a agravante providencie o fornecimento do medicamento TRIKAFTA (elexacafor + tezacaftor + ivacaftor 100mg/50mg/75mg e 150mg em dose suficiente para maior período possível, nunca inferior a 12 (doze) meses, 13 caixas, observado o fato de que a Requerente deverá tomar tal medicamento pelo resto de sua vida, na quantidade e na periodicidade descrita prescrita. 2. O acesso a medicamentos de alto custo não fornecidos pelo SUS pela via judicial ao hipossuficiente exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento. Recurso Especial nº 1.657.156/RJ. Recurso repetitivo (Tema 106) 3. No caso presente, impõe-se reconhecer a presença dos requisitos necessários para a manutenção da tutela de urgência concedida em primeiro grau. 4. A documentação médica apresentada demonstra a necessidade urgente do medicamento pleiteado. A agravada está acometida de grave enfermidade progressiva/degenerativa e necessita do fármaco a fim de garantir o controle da doença e evitar o surgimento mais lesões irreversíveis. 5. O C. Superior Tribunal de Justiça – STJ firmou entendimento no sentido de que a realização de perícia prévia não é imprescindível para prolação de decisão que determina o fornecimento de medicamentos. REsp n. 1.534.208/RN. 6. O risco de dano emerge da gravidade da doença que acomete a autora, da premência do tratamento para o seu controle e o iminente risco de vida imposto no caso de postergação da tutela. 7. Considerando a urgência do uso do medicamento e não havendo nos autos elementos que efetivamente comprovem a impossibilidade de cumprimento da ordem judicial no prazo fixado pelo MM. Juízo a quo, não há que se falar em dilação do prazo fixado 8. Agravo de instrumento interposto pela União não provido. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015041-28.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, julgado em 28/11/2022, DJEN DATA: 02/12/2022) Isto ocorre porque, regra geral, a controvérsia em ação em que se objetiva o fornecimento de medicamento ou a realização de cirurgia é se a Administração Pública tem ou não o dever de custear o tratamento, e não se, por exemplo, ele é (o mais) eficaz, ou se há substitutos, ou o quão grave é o quadro de saúde da parte, ou se há efeitos colaterais etc. É importante ponderar que a Medicina não é uma ciência exata, e o corpo humano é estrutura extremamente complexa e diversa, que por vezes responde aos mesmos estímulos de maneiras distintas, não sendo possível impor a todos os indivíduos que se submetam a um só tratamento e produzam os mesmos resultados. Ainda, conforme a evolução do quadro clínico do paciente e, no curso do processo, a terapêutica pode se modificar. No tocante ao fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS (e o raciocínio equipara-se à realização de cirurgias), o E. STJ, no julgamento do REsp 1657156, sob a sistemática dos recursos repetitivos, fixou a tese 106 in verbis: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 106. JULGAMENTO SOB O RITO DO ART. 1.036 DO CPC/2015. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO CONSTANTES DOS ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL. REQUISITOS CUMULATIVOS PARA O FORNECIMENTO. 1. Caso dos autos: A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico (fls. 14-15, e-STJ), é portadora de glaucoma crônico bilateral (CID 440.1), necessitando fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga 5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por médico em atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS. A Corte de origem entendeu que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como a ausência de condições financeiras para aquisição dos medicamentos. 2. Alegações da recorrente: Destacou-se que a assistência farmacêutica estatal apenas pode ser prestada por intermédio da entrega de medicamentos prescritos em conformidade com os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS ou, na hipótese de inexistência de protocolo, com o fornecimento de medicamentos constantes em listas editadas pelos entes públicos. Subsidiariamente, pede que seja reconhecida a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados. 3. Tese afetada: Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (Tema 106). Trata-se, portanto, exclusivamente do fornecimento de medicamento, previsto no inciso I do art. 19-M da Lei n. 8.080/1990, não se analisando os casos de outras alternativas terapêuticas. 4. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015 A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento. 5. Recurso especial do Estado do Rio de Janeiro não provido. Acórdão submetido à sistemática do art. 1.036 do CPC/2015. (REsp n. 1.657.156/RJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25/4/2018, DJe de 4/5/2018.) Ao fixar a tese ementada acima, o E. Superior Tribunal passou a exigir o preenchimento de três requisitos cumulativos para a concessão de medicamento não incorporado ao SUS: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento. Sobre o primeiro requisito, basta que um profissional médico laude as circunstâncias em que se encontra o paciente e o medicamento indicado para o tratamento da moléstia; a partir daí, como já fundamentado anteriormente, há presunção de idoneidade do diagnóstico emitido pelo médico. Quanto ao segundo requisito, a incapacidade financeira para arcar com tratamento de alto custo, de ordinário, tende a ser presumida em razão do próprio valor elevado do medicamento pleiteado, comumente muito superior à remuneração anual do homem médio. Já sobre o último requisito, isto é, a existência de registro na ANVISA, também há jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal, que, ao julgar o RE 657718, leading case do tema 500, afastou sua exigência, fixando a seguinte tese: 1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Vale pontuar, ainda, que esta C. Sexta Turma, reportando-se à jurisprudência do E. STF, já concedeu a tutela de urgência para fornecer medicamento sem registro na ANVISA, bem como já concedeu a tutela de urgência para determinar a realização de cirurgia com a utilização de material não coberto/padronizado pelo SUS, reconhecendo a prioridade do direito à vida sobre qualquer outro bem jurídico: PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. TUTELA DE URGÊNCIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO E SEM REGISTRO NA ANVISA. CARÁTER EXCEPCIONAL. POSSIBILIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA E À SAÚDE. NECESSIDADE DEMONSTRADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Em 25.04.2018, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.657.156/RJ, representativo de controvérsia (Tema 106), submetido a julgamento sob o rito do art. 1036 do Código de Processo Civil de 2015, firmou tese no sentido de que "a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento". 2. Em sessão de julgamento do dia 04.05.2018, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, ao modular os efeitos do julgamento do REsp 1.657.156/RJ, pois vinculativo (art. 927, inciso III, do CPC/2015), decidiu que "os critérios e requisitos estipulados somente serão exigidos para os processos que forem distribuídos a partir da conclusão do presente julgamento." (trecho do acórdão publicado no DJe de 04.05.2018). 3. Tratando-se de ação distribuída antes de 05.04.2018, não são exigíveis os requisitos estipulados no REsp 1.657.156/RJ. 4. Pretende o autor o fornecimento de medicamento de alto custo e sem registro na ANVISA, denominado “Eteplirsen/Exondys 51”, para tratamento da doença denominada de Distrofia Muscular de Duchenne - DMD, doença genética ligada ao cromossomo X, progressivamente degenerativa e sem cura. 5. A análise da documentação colacionada aos autos autoriza dessumir a presença dos pressupostos necessários à concessão da medida emergencial. 6. O E. Supremo Tribunal Federal assentou entendimento no sentido de que, "apesar do caráter meramente programático atribuído ao art. 196 da Constituição Federal, o Estado não pode se eximir do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde dos cidadãos" (ARE 870174, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 13/03/2015, publicado em DJe-055 DIVULG 19/03/2015 PUBLIC 20/03/2015). 7. O alegado alto custo do medicamento não é, por si só, motivo suficiente para caracterizar a ocorrência de grave lesão à economia e ordem públicas, visto que a política pública de medicamentos excepcionais tem por objetivo contemplar o acesso da população acometida por enfermidades raras aos tratamentos disponíveis (SS n.º 4316/RO, Rel. Min. Cezar Peluso (Presidente), j. 10/06/2011, publicada em 13/06/2011). 8. Frise-se que o óbice da inexistência de registro do medicamento na ANVISA foi superado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da SS n.º 4316/RO, Rel. Min. Cezar Peluso (Presidente), j. 10/06/2011, publicada em 13/06/2011. 9. O C. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido ao regime do artigo 543-C do Código de Processo Civil, firmou entendimento no sentido de caber ao juiz adotar medidas eficazes à efetivação da tutela nos casos de fornecimento de medicamentos (REsp 1203244/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/04/2014, DJe 17/06/2014). 10. No presente caso, existe comprovação a respeito da enfermidade de que padece o autor, a Distrofia Muscular de Duchenne (DMD), conforme se verifica do Laudo Médico do Perito Judicial e exames carreados aos autos. No que diz respeito à necessidade do Tratamento, depreende-se dos autos que o medicamento em questão é o único eficaz no combate da enfermidade de que padece o autor. Os tratamentos paliativos não apresentaram a mesma eficácia em relação ao medicamento pleiteado nestes autos. 11. O não fornecimento do medicamento “Eteplirsen / Exondys 51” acarreta risco à saúde e à vida do agravante, o que está a malferir a norma do artigo 196 da Constituição da República, razão por que é de rigor a concessão da medida emergencial. 12. Agravo de instrumento provido. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5025527-14.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal DIVA PRESTES MARCONDES MALERBI, julgado em 10/08/2019, Intimação via sistema DATA: 20/08/2019) ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE PRÓTESE DE CERÂMICA. NECROSE ASSÉPTICA DA CABEÇA FEMORAL. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Pacificou-se no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é solidária a responsabilidade dos entes da Federação na execução das ações e no dever fundamental de prestação de serviço público de saúde, consoante previsto no artigo 198, caput e §§, da Constituição Federal e na Lei n. 8.080/1990. 2. In casu, há documentos médicos que comprovam a gravidade da moléstia (necrose asséptica da cabeça femoral), bem como a necessidade de a autora se submeter à cirurgia para colocação de prótese no quadril. 3. A prótese de cerâmica, pleiteada pela autora, tem vida útil muito superior àquela fornecida pela rede pública de saúde, razão pela qual, demandando menos substituições ao longo da vida do paciente, reduz o risco de infecção e perda óssea. 4. Não seria razoável impor à autora, com 25 anos de idade, o uso de prótese fornecida pelo SUS (Sistema Único de Saúde) quando há riscos à sua saúde e comprometimento de sua qualidade de vida. 5. Diante do alto custo da prótese de cerâmica e não tendo a autora condições de custeá-la, negar-lhe o fornecimento pretendido implicaria desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde e à vida. 6. A autora faz jus à antecipação da tutela para o imediato fornecimento da prótese de cerâmica e para se submeter, com urgência, à realização de cirurgia pelo SUS, com o tratamento pós-operatório necessário para sua recuperação. 7. Inversão do ônus de sucumbência. 8. Apelação provida. (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1511232 - 0007298-85.2008.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, julgado em 22/09/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/09/2016) Assim, o que se conclui da digressão histórica da jurisprudência uniformizada acima é a preocupação dos tribunais pátrios com a proteção do direito à vida e à saúde, que se revela de natureza jurídico-administrativa e não de natureza biológico-médica. Isto porque, como já fundamentado anteriormente, compete à Medicina (e não ao Direito) o estudo da saúde e da vida biológica, bem como sua manutenção; já à Ciência Jurídica, cabe a proteção da esfera que resguarde tais direitos de relevância constitucional, o que, em processos judiciais como o presente, corresponde a verificar o preenchimento de requisitos autorizadores para a concessão desta ou daquela medida (de ordinário, a condenação ao pagamento do tratamento). Neste sentido, as nomenclaturas exclusivamente médicas, como a classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados com a saúde (CID) ou a denominação comum internacional (DCI) de medicamentos, com o devido acatamento, são codificações utilizadas para o exercício preciso do ofício médico, sendo descabido, na seara do Direito, o prolongamento de discussão terminológica, farmacológica ou excessivamente rebuscada sobre a patologia ou medicamento pleiteado, como corriqueiramente faz o Poder Público em sede de defesa, opondo resistência de ordem burocrática a um receituário médico válido. Dada a urgência, deve ser fornecida a terapêutica cuja eficácia já atestou o profissional de saúde que acompanha a parte adoentada, domina a área do conhecimento com a qual trabalha e o quadro clínico sui generis de seu paciente, sendo responsável pela escolha do tratamento e seus resultados (inteligência do Juramento de Hipócrates). Não é função do Judiciário escolher o tratamento que será experienciado pelo jurisdicionado, mas garantir que ele possa realizá-lo conforme receitado, ainda que não tenha condições de pagar. Dito de outro modo, se um paciente que não seja hipossuficiente apresentar-se em estabelecimento farmacêutico desejando a aquisição de medicamento de alto custo, ser-lhe-ão exigidos: documento de identificação pessoal, receituário médico válido e o preço do medicamento; não haverá exigência nem de comprovação de eficácia do medicamento nem de demonstração dos sintomas, pontos que já foram enfrentados, respectivamente, pela agência reguladora e pelo profissional que atendeu o paciente e receitou o fármaco. Da mesma forma, quando a parte hipossuficiente apresenta-se em Juízo, munida de receita médica e pedindo a concessão de medicamento ou a realização de cirurgia de alto custo, o que pretende, em verdade, é a determinação que imponha ao Poder Público conduta de natureza administrativa, consistente no custeio do tratamento, em virtude da proteção isonômica que deve ser dada aos direitos à vida e à saúde tanto de quem pode quanto de quem não pode pagar. Vejamos: ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. SPINRAZA (NUSINERSENA). AUTORA PORTADORA DE ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL (AME 5q) TIPO III. PERÍCIA MÉDICA. DESNECESSIDADE. IMPRESCINDIBILIDADE PARA VIDA E SAÚDE DA POSTULANTE. EXISTÊNCIA DE REGISTRO NA ANVISA. ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO PARA SALVAGUARDAR DIREITO FUNDAMENTAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÕES E REMESSA NECESSÁRIA PROVIDAS EM PARTE. 1. Tendo em vista o entendimento jurisprudencial firme, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, no sentido da desnecessidade da realização de perícia médica para constatar se o fármaco postulado é necessário e adequado ao tratamento da patologia para a qual está sendo indicado, uma vez que o relatório do profissional médico que acompanha do tratamento do autor da demanda é suficiente para demonstrar a necessidade da terapêutica prescrita, resta afastada a matéria preliminar suscitada pela União Federal. Precedentes. 2. Os direitos fundamentais do cidadão à vida e à saúde são direitos subjetivos inatos à pessoa humana, irrenunciáveis, indisponíveis e inalienáveis, constitucionalmente protegidos, cujo fundamento, em um Estado Democrático de Direito, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais. 3. É assente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser obrigação inafastável do Estado assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, mormente as mais graves, bem como de haver responsabilidade solidária entre os entes federativos no exercício desse múnus constitucional. Precedentes. 4. A jurisprudência se assentou no sentido de que, havendo conflito entre o direito fundamental à vida (art. 5º, Constituição Federal) e à saúde (art. 6º, Constituição Federal) do cidadão hipossuficiente e eventual custo financeiro imposto ao Poder Público, deve ser dada prioridade àqueles, pois o Sistema Único de Saúde - SUS - deve prover os meios para se fornecer medicação e tratamentos que sejam necessários a preservação da vida, saúde e dignidade do paciente sem condições financeiras para custeio pessoal ou familiar, segundo prescrição médica. Precedentes. 5. Respeitada a orientação do CNJ, o óbice referente à inexistência de registro do medicamento pleiteado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, restou superado em precedente do Supremo Tribunal Federal, consulte-se: STF, SS n.º 4316/RO, Rel. Min. Cezar Peluso (Presidente), j. em 10.6.2011, p. em 13.6.2011, bem como pelo fato de que o medicamento possui o devido registro na ANVISA. 6. O E. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, estabeleceu os requisitos para a concessão judicial de medicamentos não previstos pelo SUS. 7. Assim, como a demanda é posterior ao marco temporal previsto no REsp 1.657.156/RJ (publicação do acórdão em 04/05/2018), aplica-se o entendimento assentado no julgamento retro assinalado. 8. Os documentos dos autos são conclusivos ao atestarem que a postulante é portadora de doença rara e grave, Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo III, sendo o medicamento pleiteado, Nusinersena, nome comercial Spinraza, registrado na ANVISA, o único tratamento capaz de deter a evolução da doença, promovendo a recuperação de força muscular, a melhora de tônus e movimentação dos membros inferiores e superiores, e controle cervical e dorsal da menor, com evidente aumento de sua qualidade de vida e independência funcional. 9. Patente, portanto, a imprescindibilidade do fármaco para assegurar à apelada, o cumprimento do direito fundamental à saúde (CF, art. 6º e 196) e, consequentemente, ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). 10. Honorários advocatícios, fixados na sentença, reduzidos. 11. Preliminar rejeitada. Apelações e remessa oficial, providas em parte. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5022606-18.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, julgado em 05/08/2022, Intimação via sistema DATA: 09/08/2022) Conclui-se, pois, que é despicienda a rediscussão acerca da viabilidade da terapêutica. Esta C. Sexta Turma já definiu que não se admite que o Judiciário ou o Executivo crie óbices quanto à adoção de tratamento e/ou fornecimento de medicamento que já restou atestado pela ciência médica. O entendimento é de que cabe exclusivamente ao médico, por sua (e somente sua) conveniência, eleger o tratamento adequado para o seu paciente: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. SITUAÇÃO QUE SE AMOLDA AO TEMA 106/STJ. RECURSO DA UNIÃO IMPROVIDO. [...] 2 Aqui, há relatório médico particular, expressamente referido e descrito na decisão agravada, que recomenda e justifica a ministração do tratamento [...]. 3. Não há que se discutir a eficácia do remédio [...] 4. A propósito, quanto ao tipo de medicamento sugerido, a conveniência ou não do uso de determinado fármaco ou tratamento, tudo isso é de competência exclusiva do médico que acompanha o doente (Resolução nº 1.246, de 8/1/88, do Conselho Federal de Medicina - Código de Ética Profissional), sendo inadmissível ao Juízo ou ao Poder Público limitar a indicação médica, tampouco questionar – por meras conjecturas – a efetividade dos medicamentos indicados para o tratamento da enfermidade de que sofre a parte autora. 5. Agravo interno não provido. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5023222-18.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 28/11/2022, DJEN DATA: 01/12/2022) Desta feita, os elementos de prova acostados aos autos demonstram que parte preenche os requisitos para a concessão do que restou prescrito pelo profissional da área da saúde que a acompanha, em especial a imprescindibilidade do tratamento e a ínfima capacidade pagadora. Outrossim, observo a reversibilidade da medida que causa impacto apenas e tão somente no patrimônio do polo passivo, caso se conclua, com o contraditório e a instrução, que a parte autora não faz(ia) jus ao tratamento médico pleiteado, ou que ele não surtiu o efeito desejado no curso do processo. O risco à vida da parte autora na hipótese de demora, por outro lado, não se reverte. É dizer: a vida deve ser priorizada sobre qualquer outro bem jurídico discutido neste processo. Ante o exposto, nos termos da fundamentação e com fulcro no art. 932 do CPC, dou provimento ao agravo de instrumento, confirmando a tutela de urgência anteriormente concedida, para determinar à União Federal o fornecimento da terapêutica prescrita pelo médico da parte autora, observando que, quanto à hipótese de descumprimento, já há determinação exarada pelo Juízo a quo prevendo, inclusive, a cobrança de multa. Como consequência, julgo prejudicados os embargos de declaração opostos pela União Federal. Comunique-se ao MM. Juízo a quo, com urgência, a quem incumbe analisar eventual manifestação de descumprimento do julgado, vedada a supressão de instância (inteligência do art. 1.008 do CPC). Dê-se vista ao Ministério Público Federal. P. I”. Ademais, confirmou-se, na instrução processual, preenchidos os requisitos para o fornecimento do ZOLGENSMA, haja vista a eficácia constatada para o tratamento da enfermidade que acomete o autor, não havendo substituto terapêutico fornecido pelo SUS. No caso concreto, a perícia judicial confirmou que o autor sofre de Atrofia Muscular Espinhal (AME) Tipo I e, “(...) a despeito de o periciado não se enquadrar estritamente nos critérios de idade estabelecidos pelo SUS para o uso de Zolgensma®, a análise das circunstâncias clínicas pode justificar sua consideração como uma intervenção terapêutica potencialmente benéfica” (ID 330671394). A fim de afastar as impugnações da União, transcrevo arguta manifestação do Parquet federal, in verbis: “De início, importante esclarecer que, em 6 de dezembro de 2022, por meio da Portaria SCTIE/MS Nº 172, a Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde incorporou o medicamento ZOLGENSMA (Onasemmogene) no âmbito do SUS. Vê-se que os órgãos técnicos do SUS reconhecem a eficácia da medicação no combate à enfermidade AME Tipo I, bem como sua superioridade em relação a outros fármacos, embora a incorporação tenha sido restrita, após análise de custo-efetividade própria dos sistemas públicos de saúde. Embora no Brasil o medicamento tenha sido aprovado pela ANVISA para uso em crianças de até 2 anos de idade (ou 06 meses pela CONITEC), em alguns países da Europa a regra de utilização é pelo peso da criança (até 21 kg), sem a limitação etária. Apesar da indicação contida na bula, não há estipulação de idade máxima ou limite para concessão do medicamento em tela a pacientes com AME Tipo 1. É exatamente a situação que se tem nos autos. Ao que se percebe, o medicamente foi prescrito considerando o peso do autor, abaixo de 13,5 kg (vide relatório médico de ID 321553131). A fotografia que consta no ID 323932350 - Pág. 13 evidencia que o autor possuía estrutura corpórea muito aquém do esperado. Embora a UNIÃO tenha sustentado em sua contestação que existe alternativa terapêutica para o medicamento pleiteado, por meio da utilização do SPINRAZA - mais barato, inclusive -, há evidências de que o SPINRAZA não é substituto terapêutico do ZOLGENSMA. O SPINRAZA tem a função apenas de controle dos efeitos da doença, enquanto o princípio do ZOLGENSMA é substituir a função do gene do neurônio motor de sobrevivência 1 (SMN1) ausente nos portadores de AME, por uma nova cópia de um gene SMN humano. Sem contar que existem alguns estudos internacionais avaliando custo-efetividade no qual o ZOLGENSMA em dose única foi melhor custo-efetivo em comparação com o SPINRAZA de uso crônico para pacientes com AME do tipo 1 (fonte: https://www.tjdft.jus.br/informacoes/notas-laudos-e-pareceres/natijus-df/nt485.pdf). Nesse sentido, a Comissão Europeia (CE) aprovou o uso do ZOLGENSMA para o tratamento de pacientes com Atrofia Muscular Espinhal (AME) e diagnóstico clínico de tipo 1, ou para aqueles com até três cópias do gene SMN2, sem indicação de idade-limite, mas abrangendo casos de bebês e crianças pequenas com SMA que pesam até 21 kg (cerca de 46 libras), o que geralmente inclui crianças até cerca de 5 anos de idade, de acordo com a orientação de dosagem aprovada da terapia (fonte: https://smanewstoday.com/zolgensma). Importante ressaltar, nesse ponto, que o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a eficácia e importância do fármaco em questão no tratamento da doença também em relação às crianças acima de 2 anos de idade, não sendo este um obstáculo ao fornecimento do ZOLGENSMA para o tratamento da AME (RE 1399165 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, DJe 12.mai.2023). Conclui-se que estão preenchidos, in casu, os requisitos para o fornecimento do ZOLGENSMA (Onasemmogene), visto ter eficácia constatada para o tratamento da enfermidade que acomete o menor LEVI WILLIAM SILVA REIS, não havendo substituto terapêutico fornecido pelo SUS. Outrossim, o medicamento pleiteado é de altíssimo custo, considerado o "mais caro do mundo", segundo veiculado na internet, valorado atualmente em torno de dois milhões de dólares americanos, não havendo qualquer possibilidade de ser adquirido pela família por seus próprios meios. O medicamento também conta com registro na ANVISA, sendo possível a sua dispensação ao autor, assim como fora feito em sede de antecipação de tutela. LEVI WILLIAM SILVA REIS estava internado na UTI pediátrica de São José dos Campos, mas teve alta e passou para o sistema de home care, sob os cuidados de seus familiares. A perícia judicial foi feita na residência do menor. Diante de todo o exposto, o Ministério Público Federal, na condição de custos legis, manifesta-se favoravelmente ao pleito, devendo os pedidos iniciais serem julgados procedentes, confirmando-se a tutela antecipada de urgência.” (ID 362270972). Desta forma, impõe-se a procedência da demanda, devendo a União arcar com todas as despesas para custeio da aplicação do medicamento ZOLGENSMA ao autor, no valor total indicado pelo Hospital HDIA, no montante de R$ 6.317.607,93 (seis milhões trezentos e dezessete mil seiscentos e sete reais e noventa e três centavos) - ID 358064694. Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido, confirmando a tutela de urgência deferida para condenar a União a fornecer o medicamento ZOLGENSMA (Onasemmogene) na forma prescrita pela médica do autor, bem como o custeio de todas despesas médicas e hospitalares para a infusão do fármaco, no montante total de R$ 6.317.607,93 (seis milhões trezentos e dezessete mil seiscentos e sete reais e noventa e três centavos). Custas na forma da lei. Condeno a parte ré ao reembolso das despesas da parte autora e ao pagamento de honorários advocatícios incidentes sobre o valor atribuído à causa, que fixo nos percentuais mínimos previstos no artigo 85, §§ 3º, 4º e 5º, do Código de Processo Civil. Petições ID 358064694: Tendo em vista que a União já efetuou o pagamento do valor de R$5.981.729,59 (ID328687572), defiro a transferência bancária imediata do valor remanescente depositado nos autos pela ré (R$335.878,34 - ID 354443248) nos termos requeridos pelo Hospital HDIA sob ID358064694. Sentença sujeita ao reexame necessário. Publique-se e intimem-se. São José dos Campos, data da assinatura digital.
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