Processo nº 1010558-60.2025.8.11.0000
ID: 293722925
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1010558-60.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GILMAR MATEUS RODIGHERI FAVRETTO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010558-60.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Despejo por Inadimplemento] Relator: Des(…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010558-60.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Despejo por Inadimplemento] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [GILMAR MATEUS RODIGHERI FAVRETTO - CPF: 008.024.051-85 (ADVOGADO), TREVISOL EQUIPAMENTOS AGRICOLAS LTDA - CNPJ: 43.249.172/0001-06 (AGRAVANTE), CRISTIANO BARBIERI LTDA - CNPJ: 41.915.301/0001-22 (AGRAVADO), CRISTIANO BARBIERI - CPF: 053.789.789-55 (AGRAVADO), HENRIQUE ALBERTO TREVISOL - CPF: 983.227.451-68 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. INADIMPLÊNCIA CONTRATUAL DESDE O PRIMEIRO MÊS. CAUÇÃO CONTRATUAL INSUFICIENTE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 59, §1º, IX, DA LEI Nº 8.245/91. EXTINÇÃO TÁCITA DA GARANTIA. REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC EVIDENCIADOS. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento com pedido de antecipação da tutela recursal interposto contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT que, nos autos da ação de despejo por falta de pagamento c/c cobrança de aluguéis em atraso, indeferiu pedido de tutela de urgência para desocupação liminar de imóvel comercial cujo contrato de locação encontra-se inadimplido desde o primeiro mês de vigência, sob o fundamento de existência de caução contratual. O contrato de locação comercial firmado entre as partes, com início em 09 de outubro de 2024 e término previsto para 09 de outubro de 2027, pelo valor mensal de R$ 17.000,00, previa caução no valor de R$ 51.000,00, correspondente a três meses de aluguel. Entretanto, o débito locatício já alcança R$ 93.456,90, além de multa contratual de R$ 45.333,33, totalizando R$ 122.925,30, valor significativamente superior ao da garantia prestada. II. Questão em discussão 2. (i) verificar se a existência formal de caução no contrato de locação constitui óbice intransponível à concessão da tutela de urgência para desocupação do imóvel, ou se tal garantia pode ser considerada materialmente extinta quando o débito acumulado supera significativamente seu valor; e (ii) analisar se estão presentes os requisitos autorizadores da tutela de urgência previstos no art. 300 do CPC, especialmente o perigo de dano, quando o locatário permanece no imóvel sem adimplir com sua obrigação principal, privando o locador tanto da posse do bem quanto da contraprestação pecuniária. III. Razões de decidir 3. O inadimplemento contratual pelos agravados é incontroverso e perdura desde o início da relação locatícia, alcançando o montante de R$ 93.456,90, além da multa contratual, totalizando R$ 122.925,30, valor que corresponde a mais de cinco meses de aluguel. 4. Embora o contrato preveja caução no valor de R$ 51.000,00 (equivalente a três aluguéis), o débito locatício já superou significativamente essa garantia, tornando-a materialmente ineficaz para resguardar os direitos do locador, o que caracteriza a extinção tácita da garantia contratual. 5. A interpretação teleológica e sistemática do art. 59, §1º, IX, da Lei nº 8.245/91 permite equiparar a situação de garantia materialmente ineficaz à hipótese de contrato "desprovido de qualquer garantia", sob pena de desvirtuar a própria ratio essendi da norma, que é proteger o locador contra o inadimplemento contumaz. 6. Estão presentes os requisitos da tutela de urgência (art. 300 do CPC): a probabilidade do direito evidenciada pelo contrato e pela inadimplência incontroversa, e o perigo de dano manifestado pela impossibilidade de fruição do bem pelo proprietário e pelos prejuízos patrimoniais contínuos decorrentes da ocupação sem contraprestação. 7. A tutela de urgência na ação de despejo, quando presentes seus requisitos legais, não configura antecipação indevida do mérito, mas medida necessária à preservação do resultado útil do processo e à efetividade da prestação jurisdicional, especialmente considerando a morosidade do trâmite processual regular e a aparente ausência de patrimônio dos agravados para garantir a dívida. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso conhecido e provido para reformar a decisão agravada, autorizando o despejo dos agravados do imóvel objeto da lide e a imissão do agravante na posse do referido bem. Tese de julgamento:"1. A garantia contratual considera-se tacitamente extinta quando o valor do débito locatício supera significativamente o montante caucionado, equiparando-se à hipótese de contrato desprovido de garantia para fins de aplicação do art. 59, §1º, IX, da Lei nº 8.245/91. 2. A interpretação teleológica e sistemática das normas processuais e materiais que regem a locação imobiliária autoriza a concessão de tutela de urgência para desocupação do imóvel quando a caução se revela materialmente ineficaz para resguardar os direitos do locador. 3. Configura perigo de dano, para fins do art. 300 do CPC, a privação simultânea da posse do imóvel e da contraprestação pecuniária, especialmente quando o inadimplemento perdura desde o início da relação locatícia." Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.245/91, arts. 9º, 37, 59, §1º, IX; CPC/2015, art. 300. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, N.U 1037016-51.2024.8.11.0000, Rel. Desa. Maria Helena Gargaglione Povoas, j. 26/03/2025; TJ-MT, N.U 1015495-50.2024.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 21/08/2024; TJSC, Agravo de Instrumento n. 5082779-44.2024.8.24.0000, j. 13/03/2025. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação da tutela recursal, interposto por TREVISOL EQUIPAMENTOS AGRÍCOLAS LTDA contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, que nos autos da ação de despejo por falta de pagamento c/c cobrança de aluguéis em atraso e antecipação de tutela nº 1007759-38.2025.8.11.0002, ajuizada contra CRISTIANO BARBIERI LTDA e CRISTIANO BARBIERI, indeferiu o pedido de tutela de urgência, consistente na desocupação liminar do imóvel locado. Em suas razões recursais, o agravante sustenta, em síntese, a existência de inadimplemento contratual desde o primeiro mês da locação com a ocorrência de prejuízo contínuo com o indeferimento da liminar. Aduz a presença do periculum in mora, considerando que a permanência da ocupação irregular impede a relocação do imóvel a terceiros. Argumenta, ainda, haver perigo de dano iminente, uma vez que depende dos valores provenientes da locação para a manutenção de seu sustento e de seus colaboradores. Defende, outrossim, a possibilidade de concessão do despejo liminar, mesmo na hipótese de existência de caução, quando o valor dos aluguéis inadimplidos supera o montante da garantia contratual. Aponta, nesse sentido, a existência de jurisprudência favorável em casos análogos. Em razão disso, requer, liminarmente, a concessão de efeito ativo ao recurso, para determinar a desocupação imediata do imóvel, sob pena de multa diária. No mérito, pugna pelo provimento do agravo para reformar a decisão agravada, determinando o despejo dos agravados no prazo de 15 dias. Foram juntados aos autos o comprovante de preparo (Id. 278996374). Em decisão monocrática anterior, este Relator concedeu a tutela recursal para determinar a desocupação do imóvel no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de despejo, nos termos do art. 59, §1º, IX, da Lei nº 8.245/91. (Id. 279092395). Devidamente intimado, o juízo a quo prestou informações (Id. 281974982), informando que, diante da ausência de juntada da cópia do recurso de agravo de instrumento nos autos de origem, não foi possível exercer eventual juízo de retratação. Não foram apresentadas as contrarrazões ao presente recurso, em razão da ausência de citação da parte agravada no processo de origem. Desnecessária a intervenção ministerial em razão da matéria. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Cuida-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação da tutela recursal, interposto por TREVISOL EQUIPAMENTOS AGRÍCOLAS LTDA contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT que, nos autos da ação de despejo por falta de pagamento c/c cobrança de aluguéis em atraso e antecipação de tutela nº 1007759-38.2025.8.11.0002, indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado pela parte autora, ora agravante. Alega o agravante ter celebrado contrato de locação comercial com os agravados Cristiano Barbieri Ltda. e Cristiano Barbieri, referente a um barracão comercial situado na Rua 01, sem número, Quadra 03, Lotes 07 e 08, Bairro Novo Mundo, município de Várzea Grande/MT, com início em 09 de outubro de 2024 e término previsto para 09 de outubro de 2027, pelo valor mensal de R$ 17.000,00 (dezessete mil reais). Informa que, desde o primeiro mês da locação, os agravados não efetuaram o pagamento dos aluguéis, acumulando débito no valor de R$ 76.456,90 (setenta e seis mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais e noventa centavos), além da multa contratual de R$ 45.333,33 (quarenta e cinco mil, trezentos e trinta e três reais e trinta e três centavos), perfazendo o montante total de R$ 122.925,30 (cento e vinte e dois mil, novecentos e vinte e cinco reais e trinta centavos). Diante desse cenário, requereu a concessão de tutela de urgência para desocupação do imóvel no prazo de 15 (quinze) dias, sob o argumento de que a caução contratual pode ser substituída pelos valores devidos pelos requeridos. Tal pedido, contudo, foi indeferido pelo juízo de primeiro grau. A decisão recorrida considerou que: “(...) Pois bem. Tenho como inviável a concessão de medida liminar de desocupação do imóvel com fulcro no art. 59 da Lei n.º 8.245/91 (Lei do Inquilinato), na medida em que o Contrato de Locação que instrumentaliza os autos é garantido por caução, à luz do art. 59, §1º, IX, c/c art. 37, II. Por outro lado, como sabido, é possível o deferimento de tutela de urgência antecipada em ações de despejo, caso em que a decretação liminar de despejo ou o pedido de imissão de posse ficará condicionado ao atendimento dos requisitos do art. 300 do Código de Processo Civil. Conforme o art. 300 do CPC, a tutela de urgência depende da coexistência dos seguintes requisitos: probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Com efeito, nas ações locatícias há que se proceder com cautela na apreciação do pedido, o qual somente poderá ter lugar naquelas situações em que restar de plano evidenciado que a realização do direito do locador não pode ser postergada para o final do processo, sob pena de suportar prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação. Nesse aspecto, analisando os autos, em que pese à demonstração da probabilidade do direito alegado, por meio do Contrato de Locação (ID 185906880), não restou demonstrado o perigo de dano, uma vez que os prejuízos relativos aos débitos devidos não caracterizam, diretamente, um dano irreparável ou de difícil reparação. Isso porque, o risco de aumento do valor da dívida, em virtude do inadimplemento do locatário, é inerente ao despejo por falta de pagamento, sendo que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que não se dispensa a comprovação da urgência da medida quando da análise de tutela antecipada em ações de despejo (REsp 1207161/AL). AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE DESPEJO – TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA – DÉBITO QUE SE ESTENDE POR MAIS DE 03 ANOS – AUMENTO DA DÍVIDA PELO INADIMPLEMENTO DO LOCATÁRIO QUE NÃO DISPENSA A COMPROVAÇÃO DE DANO IRREPARÁVEL A SER SUPORTADO PELO LOCADOR – AUSÊNCIA DE PROVA – REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC NÃO DEMONSTRADOS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. O artigo 300 do Código de Processo Civil prevê que a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Se, por ora, não há nos autos elementos que evidenciem o risco de dano grave ao locador, impõe-se a manutenção do decisum que bem indeferiu o pedido inaugural de urgência. (TJ-MT - AI: 10179619020198110000 MT, Relator: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 29/04/2020, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/05/2020) AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE DESPEJO C/C COBRANÇA DE ALUGUERES E ENCARGOS - DECISÃO QUE INDEFERE O PEDIDO LIMINAR DE DESPEJO – RECURSO DA PARTE AUTORA – NÃO PROVIMENTO – CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR COM FUNDAMENTO NO ART. 300, DO CPC (TUTELA DE URGÊNCIA) QUE NÃO SE FAZ POSSÍVEL, CONSIDERANDO O NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO DO PERIGO DE DANO – FALTA DE PAGAMENTO DOS ALUGUERES QUE, A PAR DOS PREJUÍZOS QUE POSSAM CAUSAR AO LOCADOR, POR SI SÓ, NÃO CARACTERIZAM UM DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO – POSSIBILIDADE, ADEMAIS, DE O LOCATÁRIO LIQUIDAR O DÉBITO NO PRAZO DE 15 (QUINZE) DIAS A CONTAR DA CITAÇÃO PARA EVITAR A RESCISÃO CONTRATUAL E O DESPEJO – INTELIGÊNCIA DO ART. 62, INC. II, DA LEI N. 8.245/91. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 18ª C. Cível - 0072668-16.2021.8.16.0000 - Cascavel - Rel.: DESEMBARGADOR FERNANDO ANTONIO PRAZERES - J. 13.06.2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO DE IMÓVEL NÃO RESIDENCIAL. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. INDEFERIMENTO DO DESPEJO LIMINAR EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE GARANTIA CONTRATUAL (FIANÇA). DECISÃO CORRETA. INTELIGÊNCIA DO ART. 59, IX, DA LEI Nº 8.245/1991. NÃO ENQUADRAMENTO DA SITUAÇÃO NA MERA RETOMADA DA PROPRIEDADE AMPARADA NO DESINTERESSE EM MANTER O CONTRATO. RECURSO IMPROVIDO. Não se admite a concessão de liminar de despejo, com base no art. 59, § 1º, IX, da Lei nº 8.245/91, se o contrato de locação contempla uma das modalidades de garantia locatícia prevista no art. 37 da Lei do Inquilinato que, no caso, é a fiança. Excepcionalidade da situação a permitir o deferimento da tutela liminar não verificada. Ausência de demonstração objetiva da urgência. (TJ-SP - Agravo de Instrumento: 2288023-35.2022.8.26.0000 São Paulo, Relator: Adilson de Araujo, Data de Julgamento: 09/01/2023, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/01/2023) Posto isso, indefiro o pedido de tutela de urgência e determino a citação da parte requerida para, no prazo de 15 (quinze) dias, contestar a ação na parte que lhe toca (art. 62, I, Lei n.º 8.245/91), sob pena de aplicação da confissão e da revelia, no que for cabível (art. 344, CPC). (...)” (Id. 186441827 -autos de origem) In casu, compulsando-se os autos, verifica-se, em juízo preliminar, que a inadimplência dos agravados é incontroversa, sendo certo que, até a data da propositura da demanda, já havia vencido mais uma parcela do aluguel, em 09/03/2025, elevando o montante devido para R$ 93.456,90 (noventa e três mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais e noventa centavos). Tal constatação se reforça, sobretudo, diante da ausência, ao menos neste estágio processual, de qualquer prova em sentido contrário, inclusive quanto à existência de tentativa substancial de quitação do débito por parte dos agravados. Assim, o art. 9º da Lei n. 8.245/1991 é suficientemente claro ao dispor que a falta de pagamento dos aluguéis autoriza a rescisão do contrato de locação, pois a mora, por si só, é causa suficiente para ensejar o despejo, revelando-se inaplicável, no caso em análise, o art. 47 da mencionada norma legal. Nesse contexto, “a hipótese versa de mora ex re, independe de prévia interpelação do locatário, restando configurada pelo simples vencimento do prazo para pagamento das obrigações pecuniárias previstas no contrato de locação”. Nessa trilha, o art. 59, §1º, inc. IX, da Lei n. 8245/91 (Lei do Inquilinato) prevê: “Art. 59. Com as modificações constantes deste capítulo, as ações de despejo terão o rito ordinário. §1º Conceder - se - á liminar para desocupação em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária e desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo: (...) IX – a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independentemente de motivo”. Ocorre que, ao analisar detidamente as circunstâncias do caso concreto, é forçoso reconhecer que a mera existência formal de caução, por si só, não pode servir como obstáculo intransponível à concessão da tutela de urgência quando tal garantia se revela materialmente ineficaz diante da magnitude do débito acumulado. In casu, verifica-se que o contrato de locação previa uma caução no valor de R$ 51.000,00 (cinquenta e um mil reais), correspondente a três meses de aluguel. Entretanto, o débito locatício já alcança o montante de R$ 93.456,90 (noventa e três mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais e noventa centavos), sem contar a multa contratual, o que perfaz, aproximadamente, o valor correspondente a mais de 5 (cinco) meses de locação. Ora, é incontestável que a caução prestada, que deveria servir como garantia do contrato, encontra-se totalmente absorvida e superada pelo expressivo valor da dívida, tornando-se, na prática, absolutamente ineficaz para resguardar os direitos do locador. Isso porque o débito locatício, incluindo a multa contratual, alcança o valor de R$ 122.925,30 (cento e vinte e dois mil, novecentos e vinte e cinco reais e trinta centavos), valor significativamente superior ao da caução ofertada, o que compromete a finalidade da garantia e evidencia sua insuficiência para a adequada proteção dos interesses do locador. A exegese do art. 59, §1º, IX, da Lei nº 8.245/91 não pode ser realizada de maneira meramente literal ou formalista, sob pena de se desvirtuar a própria ratio essendi da norma, que é proteger o locador contra o inadimplemento contumaz do locatário. Essa norma é justamente para garantir celeridade e efetividade à retomada do imóvel quando o locatário descumpre sua obrigação principal – o pagamento do aluguel – e não há garantia eficaz que respalde o inadimplemento. Nesse contexto, quando a garantia contratualmente prevista se mostra materialmente insuficiente ou ineficaz, tal situação equipara-se, para fins de tutela de urgência, à hipótese de contrato "desprovido de qualquer garantia" nos termos do mencionado dispositivo legal, viabilizando, assim, a concessão da medida liminar. Tal interpretação teleológica e sistemática encontra respaldo na jurisprudência desta Corte: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. ART. 59, §1º, DA LEI Nº 8.245/1991. INADIMPLÊNCIA DO LOCATÁRIO. REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC PREENCHIDOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de agravo de instrumento interposto por Marileide Carvalho de Lima contra decisão da Vara Única da Comarca de Poconé, que deferiu tutela de urgência para determinar sua desocupação do imóvel locado, em razão do inadimplemento dos aluguéis. II. Questão em discussão 2. A controvérsia cinge-se à legalidade da decisão que determinou a desocupação do imóvel com fundamento no art. 59, §1º, da Lei nº 8.245/1991, diante da alegação da agravante de que o contrato de locação não delimitava corretamente o objeto e de que a área em questão pertenceria a terceiro. III. Razões de decidir 3. A tutela de urgência exige a presença cumulativa da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC). 4. Restou evidenciado nos autos que a agravante se encontra inadimplente e que a agravada é legítima possuidora do imóvel, preenchendo o requisito da probabilidade do direito. 5. O perigo de dano se manifesta na impossibilidade de o locador exercer plenamente seu direito de posse e fruição do bem, situação que poderia gerar prejuízos irreparáveis. 6. O art. 59, §1º, da Lei nº 8.245/1991 autoriza a concessão de despejo liminar em casos de inadimplência, entendimento consolidado na jurisprudência dos Tribunais Superiores. 7. A posse do imóvel pelo locador independe da prova de domínio, sendo suficiente a existência de contrato de locação regularmente firmado. 8. Inexistência de ilegalidade ou abuso de poder na decisão agravada, que se fundamentou na efetividade da tutela jurisdicional e no equilíbrio da relação locatícia. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "A concessão de tutela antecipada para desocupação de imóvel por inadimplência do locatário encontra respaldo no art. 59, §1º, da Lei nº 8.245/1991, sendo suficiente a demonstração do vínculo locatício e do débito locatício, independentemente da comprovação da titularidade dominial pelo locador." Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 300; Lei nº 8.245/1991, art. 59, §1º.” (N.U 1037016-51.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/03/2025, Publicado no DJE 31/03/2025). (grifo nosso) “AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO C/C RESCISÃO DE CONTRATO – INADIMPLÊNCIA DEMONSTRADA – PEDIDO LIMINAR DE DESPEJO – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – ART. 300, CPC – PRESENÇA DOS REQUISITOS ENSEJADORES – DESOCUPAÇÃO IMEDIATA DO IMÓVEL – INEXISTÊNCIA DE FIANÇA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A presença da probabilidade do direito, do perigo de dano e risco de resultado útil do processo (art. 300, CPC), são pressupostos que devem estar presentes para a concessão de tutela de urgência. No caso, restou incontroverso o débito de grande monta oriundo do contrato de aluguel firmado entre as partes, bem como a inexistência de fiança e do contrato de mútuo, de modo que o deferimento da liminar de despejo fundada na falta de pagamento de aluguéis e acessórios da locação é medida que se impõe.” (N.U 1015495-50.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/08/2024, Publicado no DJE 21/08/2024). (grifo nosso) “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO C/C COBRANÇA. TUTELA DE URGÊNCIA. INADIMPLÊNCIA. AUSÊNCIA DE GARANTIA LOCATÍCIA. DESOCUPAÇÃO LIMINAR. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo de Instrumento interposto por Jefferson Augusto Sales de Almeida contra decisão do Juízo da Vara Única da Comarca de Rosário Oeste, que concedeu tutela de urgência para desocupação do imóvel, em Ação de Despejo por Falta de Pagamento c/c Cobrança, movida pela Recorrida, alegando inadimplência e ausência de garantias locatícias exigidas. II. Questão em discussão2. A questão em discussão consiste em: (i) verificar se foram cumpridos os requisitos para a concessão de tutela de urgência na Ação de Despejo, especificamente quanto à inadimplência do locatário e à ausência de garantias; e (ii) avaliar a alegação do Recorrente quanto à ausência de comprovação da propriedade do imóvel pela Recorrida e possível infração ao direito de preferência. III. Razões de decidir3. A inadimplência do Recorrente foi devidamente comprovada nos autos, conforme documentação e notificação extrajudicial, enquanto a ausência de garantias locatícias exime a necessidade de caução.4. A argumentação do Recorrente sobre a titularidade do imóvel não se sustenta nesta fase processual, pois o contrato de locação foi firmado entre as partes e houve pagamentos em nome da Recorrida.5. Em relação ao direito de preferência, não há indício de interesse do Recorrente em adquirir o imóvel, sendo, portanto, válida a decisão de despejo. IV. Dispositivo e tese6. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido. Tese de julgamento: "O cumprimento dos requisitos legais para a concessão de tutela de urgência em ação de despejo, incluindo a comprovação de inadimplência e ausência de garantias, autoriza a desocupação liminar do imóvel, não havendo necessidade de caução em casos onde a parte autora é beneficiária da gratuidade de justiça." Dispositivos relevantes citados: L. 8.245/1991, art. 59, §1º; CPC, art. 300Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, AI n. 1009859-06.2024.8.11.0000, Rel. Desa. Marilsen Andrade Addario.” (N.U 1021174-31.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/11/2024, Publicado no DJE 17/11/2024) (grifo nosso) Ademais, ainda que se entenda pela inaplicabilidade do art. 59, § 1º, inciso IX, da Lei do Inquilinato, a concessão da tutela de urgência encontra amparo no art. 300 do Código de Processo Civil, o qual exige a demonstração da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. No tocante à probabilidade do direito, esta se mostra inconteste pela existência do contrato de locação (devidamente comprovado nos autos) e pela inadimplência dos agravados desde o primeiro mês de vigência contratual, sem qualquer pagamento ou justificativa plausível. Quanto ao perigo de dano, diversamente do entendido pelo juízo a quo, este se evidencia pela impossibilidade de o locador exercer plenamente seu direito de posse e fruição do bem, situação que gera prejuízos patrimoniais expressivos e contínuos. O simples fato de o agravante ficar privado, por tempo indeterminado, de um imóvel comercial avaliado em mais de R$ 500.000,00, sem receber qualquer contraprestação pelo uso, já configura, por si só, dano irreparável ou de difícil reparação. Ressalte-se que o risco de aumento do débito não se trata de mera conjectura, mas de uma realidade concreta e atual, como demonstra o vencimento de nova parcela do aluguel após o ajuizamento da ação, também inadimplida pelos agravados. Ademais, a dependência financeira do agravante em relação aos valores da locação para a manutenção de sua atividade empresarial e para o cumprimento de suas próprias obrigações acentua o perigo de dano. Dessarte, tal quadro evidencia que a caução prestada já não se mostra suficiente para a manutenção da relação locatícia, caracterizando verdadeira extinção tácita da garantia contratual, o que autoriza a relativização da regra prevista no art. 59, § 1º, inciso IX, da Lei n. 8.245/1991. Nesse sentido, é o julgado dos Tribunais Pátrios, verbis: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. CONCESSÃO DE LIMINAR. INSURGÊNCIA DA RÉ. ADMISSIBILIDADE. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. SUPERVENIENTE RECOLHIMENTO DO PREPARO. ATO INCOMPATÍVEL COM A ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. RECURSO NÃO CONHECIDO NO PONTO. MÉRITO. SUSTENTOU QUE A DECISÃO É ILEGAL, POIS A LOCAÇÃO POSSUÍA GARANTIA NA MODALIDADE CAUÇÃO E QUE A EXISTÊNCIA DESSA GARANTIA INVIABILIZA A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR DE DESPEJO. TESE RECHAÇADA. O EXAURIMENTO DA GARANTIA LOCATÍCIA, EM RAZÃO DO SALDO DEVEDOR SUPERAR O MONTANTE CAUCIONADO, AUTORIZA A CONCESSÃO DA LIMINAR DE DESPEJO. EXTINÇÃO DA GARANTIA LOCATÍCIA. POSSIBILIDADE DE RELATIVIZAÇÃO DO ART. 59, § 1º, IX, DA LEI N. 8.245/91. PRECEDENTES DESTE COLEGIADO. DEFENDEU QUE A DISPENSA DA CAUÇÃO DO LOCADOR AFRONTA O ART. 59, § 1º, IX, DA LEI N. 8.245/91. ACOLHIMENTO. NECESSIDADE DE PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO PELO LOCADOR. EXIGÊNCIA LEGAL INDISPENSÁVEL. REFORMA NO PONTO.RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5082779-44.2024.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, desta Relatora, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 13-03-2025). (grifo nosso) “Agravo de instrumento. Tutela antecipada. Ação de despejo. Pressupostos da Lei do Inquilinato. Requisitos do CPC integralmente preenchidos. Deferimento da liminar cabível. Conforme entendimento jurisprudencial, as condições para concessão de tutela antecipada de despejo por falta de pagamento de aluguéis e encargos não se restringem àquelas previstas na Lei n. 8 .245/91, sendo possível ao magistrado autorizar a desocupação mediante comprovação dos requisitos dispostos no art. 300 do Código de Processo Civil. AGRAVO DE INSTRUMENTO, Processo nº 0802519-86.2024 .822.0000, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, 1ª Câmara Cível, Relator (a) do Acórdão: Juiz Aldemir de Oliveira, Data de julgamento: 30/05/2024.” (TJ-RO - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 08025198620248220000, Relator.: Juiz Aldemir de Oliveira, Data de Julgamento: 30/05/2024). (grifo nosso) Outro aspecto relevante a ser considerado é a conduta processual dos agravados, que, ao que tudo indica, vêm se esquivando do recebimento das intimações judiciais, conforme se depreende das devoluções das correspondências com a anotação “não existe o número indicado”, apesar de o endereço informado ser de fácil localização, como demonstrado pelo agravante por meio de imagens da fachada da empresa e registros do Google Maps (Id. 283064856). Esta postura de não colaboração com o Poder Judiciário reforça a necessidade de intervenção jurisdicional célere e efetiva, de modo a evitar que o prolongamento da situação de inadimplência agrave ainda mais os prejuízos suportados pelo agravante. Cumpre ressaltar que a tutela de urgência na ação de despejo, quando presentes seus requisitos legais, não configura antecipação do mérito, mas medida necessária à preservação do resultado útil do processo e à efetividade da prestação jurisdicional. É notória a morosidade do trâmite processual regular, sendo certo que, caso o agravante tenha que aguardar o desfecho definitivo da ação para reaver seu imóvel, os prejuízos acumulados serão de difícil ou impossível reparação, mormente considerando a aparente ausência de patrimônio dos agravados para garantir a dívida (extraída da própria inadimplência contumaz). Ademais, é importante destacar que a desocupação liminar não causa prejuízo irreparável aos agravados, uma vez que, caso a ação venha a ser julgada improcedente, poderão ser indenizados pelos danos eventualmente experimentados. Por outro lado, a manutenção dos agravados na posse do imóvel, sem o adimplemento dos aluguéis, caracteriza verdadeiro locupletamento ilícito, à custa do patrimônio alheio, situação repudiada pelo ordenamento jurídico pátrio. Dessa forma, a interpretação teleológica da norma conduz ao entendimento de que, estando o locatário em débito superior ao valor da caução, resta configurada a extinção da garantia contratual, o que atrai a aplicação da hipótese prevista no art. 59, § 1º, inciso IX, da Lei do Inquilinato. Destarte, a reforma da decisão combatida é medida que se impõe. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, DOU-LHE PROVIMENTO para ratificar a antecipação da tutela recursal e reformar a decisão agravada, a fim de autorizar o despejo dos agravados do imóvel objeto da lide, bem como imitir o agravante na posse do referido bem. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025
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