Cleiton Rodrigues Nunes Oliveira e outros x J. V. Silva Oliveira Boi Forte
ID: 276722964
Tribunal: TRT6
Órgão: Vara Única do Trabalho de Salgueiro
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMO
Nº Processo: 0000992-22.2024.5.06.0391
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Passivo:
Advogados:
ALBERTO JORGE BARBOSA DE OLIVEIRA
OAB/CE XXXXXX
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LEONARDO ALVES VIEIRA DE SOUZA
OAB/PE XXXXXX
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HIARLES EUGENIO MACEDO SILVA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO VARA ÚNICA DO TRABALHO DE SALGUEIRO ATSum 0000992-22.2024.5.06.0391 RECLAMANTE: CLEITON RODRIGUES NUNES OLIVEIRA …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO VARA ÚNICA DO TRABALHO DE SALGUEIRO ATSum 0000992-22.2024.5.06.0391 RECLAMANTE: CLEITON RODRIGUES NUNES OLIVEIRA RECLAMADO: J. V. SILVA OLIVEIRA BOI FORTE INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID b1fcf2f proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: ESCLARECIMENTOS INICIAIS A princípio, na análise do presente processo, registro que esta sentença se referirá aos atos e documentos que o compõem pelo respectivo identificador (ID.) ou pela numeração das páginas, em ordem crescente, obtida com a conversão dos autos ao formato PDF. Vistos etc. Relatório dispensado (art. 852-I da CLT), por se tratar de processo submetido ao Rito Sumaríssimo. Passo a decidir. I FUNDAMENTAÇÃO 1. QUESTÃO PRELIMINARES E INCIDENTAIS DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA Informou a parte autora ser pobre na forma da lei e se encontrar em situação econômica que não lhe permite demandar em juízo, pagando as custas do processo e os honorários advocatícios, sem prejuízo próprio ou de sua família. Em vista disso, pede o deferimento da justiça gratuita. O artigo 790, §3º da CLT está assim transcrito: É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social”. No caso em concreto, observa-se que o reclamante recebia salário inferior a 40% do teto dos benefícios do RGPS. Defiro, portanto, o benefício. DAS NOTIFICAÇÕES/INTIMAÇÕES A Súmula nº 427 do Tribunal Superior do Trabalho diz o seguinte: “Havendo pedido expresso de que as intimações e publicações sejam realizadas exclusivamente em nome de determinado advogado, a comunicação em nome de outro profissional constituído nos autos é nula, salvo se constatada a inexistência de prejuízo”. Portanto, determino que as notificações e intimações relativas ao presente processo sejam publicadas em nome dos advogados indicados. DA LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR DA CAUSA Diante da controvérsia, o TST firmou entendimento no sentido de ser possível que a indicação dos valores constantes na petição inicial reflitam uma mera estimativa. A parte reclamante formulou pedidos com valores líquidos na petição inicial, com valores e menção de que seriam meras estimativas, portanto, não há de se falar em limitação da condenação aos valores atribuídos a cada um dos pedidos da inicial. Neste sentido, cito recente e importante decisão do TST: RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO INICIAL PARA CADA UM DOS PEDIDOS. VALORES MERAMENTE DE ALÇADA. (...) A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que a parte, ao atribuir valor individualizado aos pleitos, ainda que em ações sujeitas ao rito ordinário, restringe o alcance da condenação possível, tendo em vista o que dispõem os artigos 141 e 492 da CPC do CPC/73. Todavia, no caso, a Reclamante, em sua petição inicial, atribuiu valores aos pedidos, ressalvando expressamente ao final, que tal estimativa era meramente para efeito de alçada. Logo, na medida em que houve expressa menção na petição inicial de que os valores foram atribuídos aos pedidos para efeito meramente de alçada, a condenação, por essa razão, não fica limitada ao quantum estimado. Recurso de revista não conhecido (Ag- RR-10727-89.2019.5.03.0051, 5a Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 11/03/2022). No mesmo sentido foi a decisão proferida no Processo TST- RR1000904-59.2018.5.02.0432, DEJT 11/03/2022. Ressalto, por fim, que esse entendimento resta pacificado pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST (Processo E-ARR: 104726120155180211). DA ALEGADA INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL (AUSÊNCIA DE PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE VÍNCULO NO PERÍODO CLANDESTINO) A parte Reclamada arguiu a inépcia da petição inicial, ao argumento de que a parte Autora não formulou pedido expresso e específico de reconhecimento de vínculo empregatício referente ao período de 27/12/2023 a 02/02/2024, limitando-se a pleitear a retificação da CTPS (ID 071dd69, fls. 56-57 do PDF). A parte Reclamante, em réplica (ID 19f04cc, fls. 72-73 do PDF), defendeu a aptidão da peça de ingresso, invocando o princípio da informalidade que rege o processo do trabalho e o disposto no art. 840, §1º, da CLT, que exige apenas uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio. Analiso. O art. 840, § 1º, da CLT, estabelece que a reclamação escrita deverá conter "a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante". No caso dos autos, a petição inicial, no tópico 1.1 (ID 29c7418, fls. 3 do PDF), narra que o Reclamante "ingressou aos préstimos da reclamada no dia 27.12.2023", mas que "a reclamada só procedeu com a assinatura da sua CTPS em 03.02.2024". Adiante, no tópico 1.2 (ID 29c7418, fls. 4 do PDF), pugna expressamente "pela retificação da sua CTPS, tendo em vista que a data de ingresso difere da realidade vivida pelo reclamante". No rol de pedidos (ID 29c7418, fls. 18 do PDF), o item "b" postula a condenação da Reclamada para que "retifique a CTPS do obreiro, constando a data de admissão em 27.12.2023". Embora não haja um pedido autônomo e textualmente formulado como "reconhecimento de vínculo empregatício para o período de 27/12/2023 a 02/02/2024", a causa de pedir exposta é suficientemente clara quanto à alegação de prestação de serviços em data anterior ao registro formal. O pedido de retificação da CTPS para fazer constar a data de 27/12/2023 como início do contrato é consequência lógica e direta do reconhecimento do labor nesse interregno. O processo do trabalho orienta-se pelos princípios da simplicidade e da informalidade, não se exigindo o mesmo rigor técnico da petição inicial cível, desde que seja possível extrair a pretensão e os fatos que a fundamentam, de modo a permitir o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa. A Reclamada, inclusive, contestou especificamente a alegação de labor no período anterior ao registro (ID 071dd69, fls. 58 do PDF), demonstrando ter compreendido a controvérsia. Assim, entendo que a petição inicial preenche os requisitos do art. 840, §1º, da CLT, não havendo prejuízo à defesa. Pelo exposto, rejeito a preliminar de inépcia da petição inicial. 2. MÉRITO DO CONTRATO DE TRABALHO Restou incontroversa a relação empregatícia entre a autora e a reclamada, com início em 03.02.2024 a 29.04.2024, quando houve a extinção do contrato de trabalho por prazo determinado, conforme CTPS de Id. 536cc68, o TRCT de Id. 5a328bd e o arrazoado das partes. Todavia, a parte reclamante postula o reconhecimento de período de trabalho clandestino. Em relação à remuneração, deve ser observada, para todos os fins, aquela que emerge dos demonstrativos acostados aos autos, uma vez que não existe controvérsia acerca da conclusão no sentido de que os valores ali indicados correspondem aos efetivamente auferidos no decorrer do pacto. Eventuais diferenças serão objeto de análise no curso da fundamentação do julgado. Feitas essas considerações, passo a apreciar a postulação formulada pelo demandante. DO PERÍODO DE TRABALHO SEM REGISTRO E RETIFICAÇÃO DA CTPS A parte Reclamante alega que, embora formalmente admitida em 03.02.2024, iniciou a prestação de serviços para a Reclamada em 27.12.2023, laborando sem o devido registro em sua CTPS Digital até a data da anotação. Postula, assim, a retificação da data de admissão (ID 29c7418, fls. 3-4 e 18 do PDF). A Reclamada, em contestação (ID 071dd69, fls. 58 do PDF), nega veementemente o labor em período anterior a 03.02.2024, afirmando que o Reclamante jamais trabalhou em tal interregno. Conforme regras do art. 818 da CLT, o encargo de demonstrar o fato constitutivo de seu direito é do reclamante e o ônus de provar os fatos impeditivos, modificativos e/ou extintivos do direito do autor é da reclamada. Porém, quando é admitida a prestação do serviço, mas não como empregado, o ônus é da reclamada, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado, conforme item de Súmula n.º 212 do E. TST. Por fim, quando é negada a prestação de serviço o ônus recai para a parte autora. Ante a defesa direta de mérito, cabe ao Reclamante a demonstração do fato constitutivo de seu direito. Buscando se desvenciilhar de seu envargo probatório, o reclamante produziu prova deponencial a cargo do Sr. José Eudes Bezerra da Silva, declarou em seu depoimento (ID 666637f, fls. 66 do PDF): " que trabalhou junto com o reclamante na Boi Forte; que o depoente começou a trabalhar em dezembro de 2023 (...) que a sua carteira só foi assinada em janeiro de 2024 (...) que começou a trabalhar junto com o reclamante, mas, salvo engano, o reclamante foi demitido antes do depoente(...)". Embora não tenha precisado a data de início do Reclamante, o depoimento corrobora a prática da empresa de admitir empregados antes do registro formal. Ainda para comprovar suas alegações, a parte Reclamante juntou um recibo de pagamento (ID c7b2790, fls. 31 do PDF), datado de 04 de fevereiro de 2024, referente ao "SALÁRIO JANEIRO DE 2024", no valor bruto de RS 1.412,00 (mil, quatrocentos e doze reais), contudo sem assinatura das partes, porém não impugnado especificamente na contestação. Este documento, aliado ao depoimento da testemunha do autor, constituem forte indício de que o Reclamante efetivamente prestou serviços à Reclamada durante o mês de janeiro de 2024, antes, portanto, da data de registro formal em CTPS. Por outro lado, a testemunha da Reclamada, Sr. Janiclebson Gomes da Silva, afirmou (ID 666637f, fls. 67 do PDF): "que o reclamante entrou na empresa em fevereiro, salvo engano, depois do depoente", que iniciou em 08.01.2024. Em outro momento de seu depoimento a testemunha afirma que o Sr. José Eudes, testemunha do autor, trabalhou também com o depoente e entrou na empresa bem antes do depoente. Ao ser novamente questionado, agora pela reclamada, alegou que acha que José Eudes ingressou uma semana antes do depoente na empresa. Analisando os termos do depoimento verifica-se que em outros trechos do depoimento a testemunha sempre complementa as suas respostas com "se não me engano", o que demonstra incerteza quanto aos fatos narrados. Assim, tem-se que o depoimento da testemunha da reclamada padece de fidedignidade. Diante do indício documental representado pelo recibo de pagamento referente ao mês de janeiro de 2024, que não foi eficazmente desconstituído pela Reclamada, do robusto depoimento da testemunha do reclamante e da ausência de fidedignidade na prova testemunhal produzida pela reclamada, e aliado ao princípio da primazia da realidade, entendo que o Reclamante se desincumbiu de seu ônus probatório, restando comprovada o início da relação contratual empregatícia entre as partes em 27.12.2023. DA REMUNERAÇÃO A parte Reclamante sustenta que, além do salário registrado de RS 1.412,00 (um mil, quatrocentos e doze reais), recebia mensalmente a quantia de RS 200,00 (duzentos reais) "por fora" (ID 29c7418, fls. 4 do PDF). A Reclamada nega tal prática (ID 071dd69, fls. 59 do PDF). O ônus de comprovar o pagamento de salário extrafolha recai sobre o Reclamante (art. 818, I, da CLT). A testemunha José Eudes Bezerra da Silva, convidada pelo Reclamante, afirmou em seu depoimento (ID 666637f, fls. 67 do PDF): "que no começo recebia RS 1.700,00 mais RS 200,00/RS 300,00 "por fora"". Embora o depoimento se refira à sua própria remuneração, ao mencionar a prática de pagamento "por fora" na empresa para função similar (balconista/açougueiro), confere verossimilhança à alegação do Reclamante. A testemunha da Reclamada não foi questionada especificamente sobre essa prática em relação ao Reclamante. Considerando o depoimento da testemunha autoral, que se mostrou ciente da rotina da empresa, e a ausência de prova robusta em sentido contrário pela Reclamada, reputo comprovado o pagamento de salário "por fora" no valor de RS 200,00 (duzentos reais) mensais. Defiro o pedido para reconhecer que a remuneração mensal do Reclamante era composta de RS 1.412,00 (mil, quatrocentos e doze reais) registrados e RS 200,00 (duzentos reais) pagos extrafolha, totalizando RS 1.612,00 (um mil, seiscentos e doze reais), determinando a integração desta parcela para todos os fins contratuais e rescisórios. DA MODALIDADE RESCISÓRIA O Reclamante postula a conversão da sua dispensa em rescisão indireta, alegando descumprimento de obrigações contratuais pela Reclamada, notadamente a ausência de depósitos do FGTS e o registro tardio em CTPS, ou dispensa sem justa causa. Já a Reclamada sustenta que o contrato de trabalho, pactuado a termo (experiência), extinguiu-se normalmente ao seu final (ID 071dd69, fls. 58 e 61 do PDF; TRCT ID 5a328bd, fls. 28 do PDF). Pois bem. Assiste razão à reclamante. Conforme reconhecido, a Reclamada incorreu em falta ao não registrar o contrato de trabalho do Reclamante desde o seu início efetivo, procedendo à anotação apenas em 03.02.2024. Tal omissão implica o não recolhimento tempestivo das contribuições previdenciárias e dos depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) referentes a esse período. Já no extrato acostado ao Id. 687bcc2 não restou identificado depósitos, sendo devidos os valores. A ausência de depósitos regulares do FGTS é considerada falta grave patronal, suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato, conforme entendimento consolidado na jurisprudência. A rescisão indireta do contrato de trabalho caracteriza-se pela falta de cumprimento das obrigações trabalhistas por parte do empregador. A ausência de depósitos do FGTS constitui motivo suficiente para o reconhecimento da justa causa do empregador. Nesse sentido as seguintes decisões jurisprudenciais (grifos nossos): RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. ART. 840, §1º, DA CLT. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. NÃO ADSTRIÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PLEITOS INICIAIS. RITO ORDINÁRIO. MERA ESTIMATIVA. Pela redação do §1º do art. 840 da CLT, conferida pela Lei nº 13.467/2017, a indicação do valor do pedido não autoriza concluir pela limitação da condenação ao referido montante, uma vez que se trata de mera estimativa, cuja finalidade é definir o rito processual. Sobre o tema, o TST, por meio da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, firmou posicionamento no sentido de que nas ações ajuizadas após a edição da Lei nº 13.417/2017 não há falar em limitação da condenação aos valores dispostos pela demandante na exordial, ainda que não haja ressalva expressa no petitório. Nesse mesmo sentido, o posicionamento firmado por este 6º Regional, em sua composição plena, no julgamento do IRDR n. 0000792-58.2023.5.06.0000. Desse modo, não deve a liquidação ser limitada às quantias informadas na petição inicial. Recurso patronal a que se nega provimento. RECURSO ADESIVO DA RECLAMANTE. AUSÊNCIA OU IRREGULARIDADE NO RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DE FGTS. CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO EM RESCISÃO INDIRETA. POSSIBILIDADE. O Tribunal Pleno do TST, com o julgamento do processo RRAg-1000063-90.2024.5.02.0032 acolheu o Incidente de Recurso Repetitivo , fixando a tese vinculante de que "a ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS caracteriza descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, "d", da CLT, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessário o requisito da imediatidade". E, no caso, não é demais concluir que a demandada CONTAX, sem cumprir com as suas obrigações do pacto laboral, permitiu à empregada lesada, ora recorrente, considerar rescindido o contrato de trabalho e pleitear judicialmente as verbas correspondentes. O pedido de demissão da empregada- frisa-se - não obsta a configuração da declaração da rescisão indireta.Recurso provido, no ponto. (TRT da 6ª Região; Processo: 0000240-51.2023.5.06.0014; Data de assinatura: 09-05-2025; Órgão Julgador: Desembargador José Luciano Alexo da Silva - Quarta Turma; Relator(a): JOSE LUCIANO ALEXO DA SILVA). Ementa: DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE DEPÓSITOS DE FGTS. CONFIGURAÇÃO DE FALTA GRAVE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.I. CASO EM EXAME1. Recurso ordinário interposto pela reclamada em face de sentença que reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho da reclamante, fundamentada na ausência da quase totalidade dos depósitos de FGTS.2. A sentença entendeu configurada a justa causa patronal com base no art. 483, "d", da CLT, determinando a retificação da CTPS, o fornecimento das guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego, além do pagamento das verbas rescisórias correspondentes.3. A reclamada alegou abandono de emprego e ausência de imediatidade da ação, defendendo a validade da dispensa por justa causa.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a ausência reiterada de depósitos de FGTS configura falta grave suficiente para ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho; e (ii) saber se a ausência de imediatidade na propositura da ação impede o reconhecimento da justa causa patronal.III. RAZÕES DE DECIDIR3. A ausência de depósitos de FGTS ao longo de mais de dois anos de contrato, evidenciada por extrato analítico juntado aos autos, configura falta grave do empregador, conforme entendimento consolidado pelo C. TST (Tema 70).4. O ajuizamento da ação (na qual postulada a rescisão indireta) em momento anterior à suposta ausência ao trabalho afasta a alegação de abandono de emprego, conforme inteligência da Súmula 32 do C. TST.5. A tese da falta de imediatidade foi superada pelo entendimento vinculante do TST, segundo o qual a ausência de recolhimento do FGTS configura, por si só, falta grave, independentemente do tempo decorrido.IV. DISPOSITIVO E TESE6. Recurso ordinário desprovido.Tese de julgamento: "1. A ausência reiterada de depósitos do FGTS configura falta grave do empregador e autoriza a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, 'd', da CLT. 2. A ausência de imediatidade na postulação da rescisão não impede o seu reconhecimento, quando se tratar de conduta reiterada do empregador."Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 29, § 4º, 39, § 2º, 464, 483, "d" e § 3º, 818, II; CPC/2015, art. 300 e art. 536, § 1º; Lei nº 8.036/1990, arts. 20, 26 e 26-A.Jurisprudência relevante citada: TST, RRAg-1000063-90.2024.5.02.0032 (Tema 70); TST, Súmula 32; TST, Súmula 461; TST, OJ 42, II, da SBDI-1; TST, OJ 82 da SBDI-1.(TRT da 6ª Região; Processo: 0000737-76.2023.5.06.0172; Data de assinatura: 30-04-2025; Órgão Julgador: Desembargadora Ana Cláudia Petruccelli de Lima - Quarta Turma; Relator(a): ANA CLAUDIA PETRUCCELLI DE LIMA). III - RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. CONFIGURAÇÃO. IRREGULARIDADE NO RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DO FGTS. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DECORRENTE DO CONTRATO DE TRABALHO. MATÉRIA PACIFICADA. TRANSCENDÊNCIA. 1. No caso presente, constato haver transcendência, tendo em vista haver aparente desrespeito a jurisprudência dominante desta Corte Superior. 2. A jurisprudência deste Tribunal Superior é pacífica no sentido de que o não recolhimento dos depósitos fundiários, ou seu recolhimento irregular, configura ato faltoso do empregador, cuja gravidade é suficiente a ensejar a rescisão indireta do pacto laboral. 3. Assim, constatada a irregularidade no recolhimento dos valores referentes ao FGTS, tem-se caracterizada a falta grave, a dar ensejo à rescisão indireta e à condenação do reclamado aos consectários legais. Inteligência do art. 483, "d", da CLT. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-20409-14.2019.5.04.0351, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 08/04/2022). RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014 E DA IN 40 DO TST. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. ATRASO REGULAR NO PAGAMENTO DE SALÁRIO E DE ALGUNS PERÍODOS DE FÉRIAS. NÃO RECOLHIMENTO DE ALGUMAS PARCELAS DO FGTS. O artigo 483, d, da CLT, faculta ao empregado, no caso de descumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador, a rescisão indireta do contrato de trabalho. Nesse sentido, o fato de não recolher regularmente os depósitos do FGTS e atrasar o pagamento de férias e de salário configura ato faltoso do empregador, cuja gravidade é suficiente para acarretar a rescisão indireta do contrato de trabalho. O artigo 483, caput e § 3º, da CLT, faculta ao empregado considerar resolvido o contrato de trabalho antes de pleitear em juízo as verbas decorrentes da rescisão indireta. Comprovada em juízo a justa causa do empregador, presume-se a relação entre a falta patronal e a iniciativa do empregado de sustentar a resolução do contrato de trabalho. Esse é o entendimento assente na jurisprudência majoritária desta Corte Superior, em julgados da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, bem como das Turmas, no sentido de que a ausência de recolhimento de valores devidos a título de FGTS, por parte do empregador, no curso do contrato de trabalho, configura a rescisão indireta. Esse entendimento ampara-se justamente no artigo 483, d , da CLT, segundo o qual o empregado poderá considerar resolvido o contrato e pleitear a devida indenização quando o empregador não cumprir as obrigações do contrato. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-305-47.2015.5.12.0018, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 14/05/2021) Como já foi constatada nesta decisão a ausência de recolhimento do FGTS, julgo procedente o pedido de reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. Desnecessária a apreciação das outras faltas alegadas na exordial. Assim, presentes as faltas graves do empregador – ausência de registro no período inicial e, consequentemente, não recolhimento do FGTS correspondente –, defiro o pedido formulado no item "c" da petição inicial para declarar a rescisão indireta do contrato de trabalho mantido entre as partes, com data de término em 29.04.2024 (último dia trabalhado), com anotação de baixa no dia 30.05.2024, ante a projeção do aviso prévio de 30 dias (OJ 82 da SDI-I do C. TST). Diante do exposto, e presentes os requisitos constante nos arts. 2º e 3º da CLT, reconheço o vínculo de emprego existente entre as partes. Em seguida, determino que a acionada retifique o registro do contrato de emprego na CTPS, conforme os limites da causa de pedir e pedido (art. 492 do CPC). Obrigação a cumprir em 10 (dez) dias a partir de intimação específica para esse fim, depois do trânsito em julgado e de a parte autora depositar o documento em Secretaria, sob pena de pagar multa astreinte pelo descumprimento (arts. 536 e 537 do CPC), arbitrada em R$ 100,00 (cem reais) por dia de atraso, de logo limitada, por razoável, ao total correspondente a 30 (trinta) dias. Decorrido esse prazo, os registros adequados deverão ser realizados pela Secretaria desta Vara, nos seguintes termos: Data de admissão: 27.12.2023. Salário inicial: R$ 1.612,00 Data de demissão: 30.05.2024. DA REMUNERAÇÃO E DAS PARCELAS DE NATUREZA SALARIAL DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE A parte Reclamante pleiteia o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo (40%), alegando labor em câmara frigorífica sem o fornecimento adequado de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) (ID 29c7418, fls. 6 e 11-12 do PDF). A Reclamada nega a exposição (ID 071dd69, fls. 60 do PDF). Foi realizada perícia técnica, cujo laudo (ID 1823fa5, fls. 89-97 do PDF), a cargo do Expert MARCELO JOSE NOGUEIRA DE CARVALHO, que concluiu: "A análise das condições de trabalho permite concluir que o reclamante, trabalhou em condições insalubres de grau médio (20%), conforme anexo 9 da NR-15, uma vez que não foram verificadas medidas de proteção eficazes o agente frio." (fls. 95 do PDF). O perito constatou que o Reclamante ingressava de forma habitual e intermitente nas câmaras frias (temperaturas de -12,3°C e -3,6°C) para separar e retirar carnes, e que, embora houvesse japona térmica no local, não havia fornecimento registrado nem o conjunto completo de EPIs necessários (calça, luvas, capuz). A Reclamada impugnou o laudo (ID edef437), juntando declaração de um funcionário (ID a52f846) no sentido de que o Reclamante raramente acessava a câmara. O perito, em seus esclarecimentos (ID ac22e9d), refutou a declaração, informando que o funcionário em questão foi admitido após a saída do Reclamante, e manteve sua conclusão sobre a habitualidade do ingresso e a insuficiência da proteção. A prova oral colhida em audiência foi dividida. A testemunha do Reclamante, Sr. José Eudes, afirmou que "as carnes ficavam em câmeras frias" e que "existem roupas de frios mas eram para os açougueiros mais antigos, somente" (ID 666637f, fls. 66 do PDF). Já a testemunha da Reclamada, Sr. Janiclebson, disse que "o reclamante trabalhava apenas no balcão e entrava na câmara fria só quando era preciso" e que "o reclamante raramente entrava na câmara freia para pegar peça de carne" (ID 666637f, fls. 67 do PDF). O juiz não está adstrito ao laudo pericial (art. 479, CPC), podendo formar seu convencimento com base em outros elementos dos autos. Contudo, para afastar a conclusão técnica, é necessária prova robusta em sentido contrário, o que não se verifica. No presente caso, o laudo pericial foi claro ao identificar a exposição habitual ao agente frio sem a proteção integralmente adequada. As alegações da Reclamada e o depoimento de sua testemunha não foram suficientes para infirmar a conclusão técnica, especialmente considerando a natureza da atividade (açougueiro/balconista em frigorífico) que, ordinariamente, demanda acesso às câmaras frias. Ademais, a Súmula 47 do TST estabelece que: "O trabalho executado em condições insalubres, em caráter intermitente, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional." No mais, é certo que o juízo não se vincula absolutamente à prova técnica. Todavia, para rejeitá-la é necessário que ocorra significativa prova em contrário forte o suficiente para desconstituir o laudo, o que, à luz do convencimento do juízo, não ocorreu na hipótese. A reclamada não produziu prova capaz de infirmar as conclusões periciais. Logo, acolho as razões expostas no laudo pericial reconhecendo que o autor laborava exposto a condições insalubres que ensejam a percepção de adicional em grau médio (20%). Determino assim o pagamento do adicional de no percentual de 20% (grau médio) pelo período contratual. No que concerne à base de cálculos, declaro que a liquidação do adicional em referência deve ser o salário mínimo nos termos da recente apreciação pelo STF, quando o Ministro Relator Ricardo Lewandowski julgou procedentes as Rcl 6272, 8436 e 6277 para “cassar a Súmula 228 do TST, apenas e tão somente na parte em que estipulou o salário básico do trabalhador como base de cálculo do adicional de insalubridade devido”, conforme decisões monocráticas publicadas nos DJE 72 e 73, publicados em 13 e 16 de abril de 2018, respectivamente. O adicional de insalubridade integra-se a remuneração, sendo deferidos os reflexos no FGTS, nas férias+1/3, no 13°, horas extras, no RSR e eventuais verbas rescisórias. Honorários periciais à razão de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a serem custeados pela reclamada, na forma do art.790-A da CLT, posto que foi sucumbente na prova produzida. Os adiantamentos devem ser deduzidos do valor acima. DA JORNADA DE TRABALHO E PEDIDOS CORRELATOS A parte Reclamante alega que laborava de segunda-feira a sábado, das 5:30h às 20h, com duas horas de intervalo e aos domingos, das 5:30h às 13h. Aduz que os registros em caderno eram manipulados e que o intervalo intrajornada era suprimido três vezes por semana, além da violação do intervalo interjornadas (ID 29c7418, fls. 5 do PDF). A Reclamada contesta, afirmando possuir menos de 10 funcionários e que a jornada era de segunda-feira a sábado, das 5:30h às 16h, e aos domingos, das 5:30h às 13h, sempre com duas horas de intervalo e um dia de folga semanal (ID 071dd69, fls. 59 do PDF). Pois bem. O ônus da prova da jornada extraordinária, em regra, é do empregado, salvo se o empregador, obrigado a manter controles de ponto (mais de 20 empregados), não os apresenta ou apresenta controles inválidos (Súmula 338, I, TST). A Reclamada alega ter menos de 10 funcionários, e sua testemunha estimou "uns 5 funcionários" (ID 666637f, fls. 67 do PDF). A testemunha do Reclamante, por sua vez, estimou "uns 10 a 12 açougueiro/balconistas" (ID 666637f, fls. 66 do PDF). Assim, resta demonstrado que a reclamada possuía menos de 20 empregados, sendo do reclamante o encargo probatório. Buscando se desvencilhar de seu encargo probatório, o reclamante produziu prova deponencial a cargo do Sr. José Eudes Bezerra da Silva, que assim declinou (ID 666637f, fls. 66 do PDF): " (...) que trabalhava das 5h30 às 11h e das 13h às 17h; que, em média, largava às 20/21h, de segunda segunda, sem folga semanal; que no começo não tinha folga, somente quando já estava completando 90 dias de trabalho é que passou a ter folga semanal; que o mesmo ocorria com os colegas (...) que as horas eram registradas em um caderno, de forma incorreta (...) que só era registrada a jornada das 7h às 11h e das 13h às 17h; que quando tinha muito movimento (...) não tiravam o intervalo de almoço completo." Já a reclamada produziu prova testemunhal a cago do Sr. Janiclebson Gomes da Silva afirmou (ID 666637f, fls. 67 do PDF): "que a jornada era de segunda feira à sábado 5H30 às 16h, com intervalo de 2 horas; que domingo era das 5h30 às 13h; que não fazia horas extras após 16 h... que tiravam 1 folga semanal, mas não era em um dia certo." Diante da prova oral dividida, mas considerando a maior precisão e detalhamento do depoimento da testemunha autoral quanto às irregularidades e à extensão da jornada, e o fato de que este Juízo já entendeu pela ausência de fidedignidade no depoimento da testemunha da reclamada, entendo ter o reclamante se desincumbido de seu encargo probatório, e fixo, a seguinte jornada média, já considerando a dedução de uma folga semanal: De segunda-feira a sábado, das 5:30h às 20h, com duas horas de intervalo. Aos domingos das 5:30h às 13h. As horas extras deverão ser remuneradas com o adicional de 50% (cinquenta por cento), na ausência de norma coletiva juntada aos autos que preveja percentual superior. A base de cálculo será o salário fixado nesta sentença, observando-se o divisor 220 e a Súmula 264 do TST. Dada a habitualidade, são devidos os reflexos das horas extras em Descansos Semanais Remunerados (DSRs), aviso prévio indenizado, 13º salários, férias acrescidas de 1/3 e FGTS mais multa de 40%. DOS INTERVALOS INTRAJORNADA E INTERJORNADA Postula o reclamante o pagamento de horas extras intervalares alegando que, pelo menos três vezes por semana, dispunha de apenas 15 minutos. A testemunha arrolada pelo autor afirma que quando tinha muito movimento no local de trabalho, o que era frequente, não tiravam o intervalo de almoço completo. Contudo não precisou a frequência com que tal fato ocorria e qual o tempo de efetivo descanso era concedido aos empregados, não existindo nos autos elementos objetivos que permitam ao Juízo a fixação do intervalo suprimido. Por outro lado a testemunha da reclamada alega a fruição do intervalo de 2 horas. Entendo assim, não ter o reclamante se desincumbido de seu encargo probatório. Indefiro o pedido. Por fim, quanto ao intervalo interjornada, tendo sido reconhecida por este Juízo o cumprimento da jornada das 5:30h às 20h, se segunda-feira a sábado, observo que a jornada cumprida pelo reclamante resulta em violação ao intervalo interjornadas mínimo de 11 horas (art. 66 da CLT), . Assim, defiro o pedido de intervalo interjornada e suas repercussões devido durante cinco dias da semana por todo o pacto laboral. Ante a natureza indenizatória da parcela, não há que se falar em repercussão nas demais parcelas de natureza salarial. DAS VERBAS DECORRENTES DO CONTRATO E DA RESCISÃO Reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho e a remuneração mensal de RS 1.612,00 (um mil, seiscentos e doze reais), passo à análise das verbas rescisórias devidas, considerando o período contratual, já com a projeção do aviso prévio: 1. Saldo de salário – 29 dias; 2. Aviso prévio indenizado com projeção no contrato de trabalho, para todos os fins - 30 dias. 3. Férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3 - 5/12 avos; 4. Gratificação natalina proporcional - 4/12 avos. 5. FGTS sobre Verbas Rescisórias e Multa de 40% DA MULTA DO ARTIGO 467 DA CLT A parte Reclamante postula o pagamento das multas previstas nos arts. 467 e 477, §8º, da CLT (ID 29c7418, fls. 15 e 18 do PDF). A multa do art. 467 da CLT é devida em caso de não pagamento, na data do comparecimento à Justiça do Trabalho, da parte incontroversa das verbas rescisórias. No presente caso, houve controvérsia substancial sobre a própria existência de vínculo em parte do período, a remuneração e a modalidade rescisória, o que afasta o caráter incontroverso das principais parcelas rescisórias pleiteadas. Assim, indefiro o pedido de pagamento da multa do art. 467 da CLT. DO RECOLHIMENTO DO FGTS O extrato de FGTS juntado demonstra a ausência de recolhimento sobre todas as parcelas do contrato e o pagamento da multa de 40% sobre o montante devido na rescisão. São devidos os depósitos de FGTS sobre o aviso prévio indenizado e o 13º salário proporcional deferidos nesta sentença, bem como as diferenças de FGTS não recolhidas durante o pacto laboral sobre as parcelas salariais (salário base, adicional de insalubridade, horas extras, adicional noturno). Sobre o montante total dos depósitos de FGTS devidos durante todo o contrato (incluindo os já realizados, os ora deferidos como diferença, e os incidentes sobre as verbas rescisórias de natureza salarial) incidirá a multa de 40%. Defere-se, assim, o pedido para condenar a reclamada ao pagamento de FGTS de todo o período contratual imprescrito e do FGTS incidente sobre o aviso prévio indenizado e 13º salário proporcional, acrescidos da multa de 40% sobre o total apurado. Deverá a reclamada, em fase de liquidação, apresentar extrato analítico completo da conta vinculada para apuração de eventuais diferenças. Autoriza-se o saque dos valores depositados, acrescidos das diferenças e da multa. DO DANO MORAL (TRABALHO EXTENUANTE E TRATAMENTO HUMILHANTE) A parte Reclamante postula indenização por danos morais no valor de RS 5.000,00 (cinco mil reais), alegando ter sido submetida a jornada de trabalho extenuante e a tratamento humilhante por parte de superiores (ID 29c7418, fls. 6, 13-14 do PDF). A Reclamada nega os fatos (ID 071dd69, fls. 63 do PDF). Segundo o posicionamento doutrinário dominante, o dano existencial é espécie do gênero dano moral. Para Sônia Mascaro Nascimento o dano existencial é: "Espécie de dano imaterial ou não material, que acarreta à vítima, de modo parcial ou total, a impossibilidade de executar, dar prosseguimento ou reconstruir o seu projeto de vida (na dimensão familiar, afetivo-sexual, intelectual, artística, científica, desportiva, educacional ou profissional, dentre outras) e a dificuldade de retomar sua vida de relação (âmbito público ou privado, sobretudo na seara da convivência familiar, profissional ou social" (NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Dano existencial nas relações de trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 78, n. 8, agosto/2014, p. 967). Diferentemente do dano moral (gênero), que tem como fundamento qualquer violação da dignidade da pessoa humana, a espécie dano existencial pressupõe uma violação aos direitos da personalidade, especificamente à “vida de relações” ou ao “projeto de vida” do indivíduo. A primeira, se refere às relações familiares, sociais ou políticas. Já a segunda, concerne a tudo o que o indivíduo decidiu realizar durante a sua vida. Para configurar o dano existencial, portanto, faz-se necessária prova efetiva da vulneração à vida do empregado fora do ambiente de trabalho, ocasionada por conduta abusiva praticada pelo empregador. De tal encargo a parte promovente não se desvencilhou a contento por não repousar nos autos evidência segura de algum projeto de vida que teria sido obstado pelo serviço prestado à parte ré. Embora reconhecendo horas extras, não se revela, por si só e no curto período do contrato, como tão excessiva a ponto de privar o Reclamante de todo convívio social e familiar, caracterizador do dano existencial. Quanto ao tratamento humilhante, a testemunha José Eudes Bezerra da Silva, convidada pelo Reclamante, relatou (ID 666637f, fls. 66-67 do PDF): "que o depoente presenciou tratamentos humilhantes, brincadeira, o dono do frigorífico deu uma "gravata" no depoente e o jogou no chão; que o ambiente de trabalho era muito chato, por causa disso; que presenciou situações constrangedoras, de pressão, com o reclamante, o qual ficava chorando, às vezes; que uma vez viu o superior do reclamante abrindo a porta do banheiro onde estava o reclamante, quando este estava fazendo suas necessidades; que o superior chamava o reclamante de "Veado". ... que acredita que o reclamante pediu demissão em razão da pressão psicológica." Por outro lado, a testemunha da Reclamada, Sr. Janiclebson Gomes da Silva, afirmou (ID 666637f, fls. 67 do PDF): "que nunca aconteceu de haver piadas no ambiente de trabalho; que o dono da empresa trata todo mundo super bem." A prova oral é, portanto, dividida quanto ao tratamento dispensado ao Reclamante. Contudo, o depoimento da testemunha autoral foi específico e detalhado quanto a situações vexatórias e de pressão que extrapolam o poder diretivo do empregador, configurando ofensa à dignidade do trabalhador. Considerando a gravidade dos fatos narrados pela testemunha autoral referentes ao tratamento humilhante e atentando aos critérios do art. 223-G da CLT (natureza do bem jurídico tutelado, intensidade do sofrimento, possibilidade de superação física ou psicológica, reflexos pessoais e sociais da ação/omissão, extensão e duração dos efeitos da ofensa, condições em que ocorreu, grau de dolo ou culpa, situação econômica do ofensor, grau de publicidade da ofensa), arbitro a indenização por danos morais em RS 5.000,00 ( cinco mil reais). Defiro em parte o pedido formulado no item "l" da petição inicial para condenar a Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de RS 5.000,00 ( cinco mil reais). 3 DA CORREÇÃO MONETÁRIA, DOS JUROS E DA REMUNERAÇÃO Para fins de liquidação, determino que seja considerada a remuneração reconhecida na sentença. Autoriza-se a dedução dos pagamentos efetuados a título idêntico das parcelas ora deferidas, desde que comprovados pelos documentos já constantes dos autos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa do Autor. Inexistem hipóteses de compensação, pois não comprovado que a parte demandada é credora de dívida líquida, vencida e de coisa fungível perante a parte autora desta ação (arts. 368 e 369 do CC). Quanto à correção monetária, deve ser observado o que dispõe a Súmula nº 381, do TST, segundo a qual o pagamento dos salários até o 5º dia útil do mês subsequente ao vencido não está sujeito à correção monetária. Se essa data limite for ultrapassada, incidirá o índice da correção monetária do mês subsequente ao da prestação dos serviços, a partir do dia 1º. Quando o débito trabalhista deixa de ser pago no curso do pacto laboral, já tem sido ultrapassada a data-limite para o pagamento do saldo salarial e, por esta razão, há a incidência do índice de correção monetária do mês subsequente ao da prestação de serviços, tudo de conformidade com a súmula invocada. Quanto aos juros de mora e correção monetária, quando do julgamento da ADC 58, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da TR (Taxa Referencial) para fins de correção dos débitos trabalhistas e determinou a incidência do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) na fase pré-judicial e a Taxa Selic depois da citação, até que houvesse lei específica sobre o tema. Entretanto, em 01/07/2024 foi publicada a Lei 14.905 que estabeleceu a incidência do IPCA como índice de correção monetária e da SELIC como taxa de juros. Diante do novo cenário, o TST, por meio da SDI-1, assim decidiu, quando do julgamento do processo 0000713-03.2010.5.04.0029, verbis: a) o IPCA-E na fase pré-judicial acrescido dos juros de mora (artigo 39, caput, da Lei 8.177, de 1991); b) a partir do ajuizamento da ação até 29/08/2024, a taxa SELIC, ressalvados os valores eventualmente pagos, nos termos da primeira parte do item; da modulação do STF, vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior; c) a partir de 30/08/2024, no cálculo da atualização monetária, será utilizado o IPCA (artigo 389, parágrafo único, do Código Civil); os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração SELIC - IPCA (artigo 406, parágrafo único, do Código Civil), com a possibilidade de não incidência (taxa 0), nos termos do § 3º do artigo 406. Portanto, quando da liquidação dos títulos, determino a observância dos parâmetros acima delineados. 4 DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Tendo em vista a sucumbência parcial da parte autora nos pleitos formulados fixo honorários sucumbenciais de 10% sobre o valor dos pedidos julgados improcedentes em favor do patrono da parte ré. Todavia, por força do julgamento dos ED’s interpostos na ADIN 5766, declaro que, enquanto o autor permanecer beneficiário da Justiça Gratuita, incide sobre o crédito condição suspensiva de exigibilidade, restando afastada a possibilidade de execução. Já a reclamada deverá arcar com 10% do valor da condenação (pedidos procedentes). Para fixação do percentual acima foi observado o grau de zelo do profissional, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo despendido nas suas atribuições, bem como o disposto na Súmula 326 do STJ. No mais, quanto aos honorários contratuais, serão retidos no momento oportuno da liberação de valores, caso exista contrato de honorários particulares com tal previsão. II DISPOSITIVO Ante o exposto, e considerando o mais que dos autos consta, decido: 1) Conceder à parte autora a gratuidade da justiça; 2) Determinar que as notificações e intimações relativas ao presente processo sejam publicadas em nome dos advogados indicados; 3) Rejeitar as preliminares suscitadas; 4) No mérito, julgar PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados por CLEITON RODRIGUES NUNES OLIVEIRA em face de J. V. SILVA OLIVEIRA BOI FORTE (FRIGORÍFICO BOI FORTE), para condenar a reclamada a pagar à parte reclamante, no prazo de 48 horas, após notificada para tal, os títulos descritos na fundamentação. Honorários de sucumbência arbitrados consoante os fundamentos desta sentença. Tudo em fiel observância à Fundamentação acima, a qual passa a integrar o presente dispositivo, como se nele estivesse transcrita. Liquidação por cálculos, nos termos do Art. 879 da CLT. Custas processuais, pelo empregador, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), calculadas sobre o valor da condenação provisoriamente arbitrada em R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Haverá incidência de contribuição previdenciária sobre as horas extras habituais. As demais parcelas deferidas têm natureza indenizatória. A parte reclamada é condenada a efetuar o recolhimento das contribuições previdenciárias devidas sobre as parcelas cuja natureza salarial já foi reconhecida, nos termos do parágrafo único do art. 876 da CLT, com a redação dada pela Lei 11.457/2007. No que concerne ao eventual enquadramento da parte demandada em regra de isenção, desoneração, redução ou qualquer outro benefício de natureza tributária, a situação deverá ser devidamente comprovada, conforme Leis 12.101/09 e 8.212/91, o que deverá ser submetido à apreciação apenas na fase de liquidação do julgado, momento processual adequado para tanto, descabendo a análise de tal circunstância específica neste decisum. A responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias é da empregadora, possuindo direito, no entanto, à retenção quanto à parte que é da responsabilidade do empregado (artigo 43 da Lei 8.212/91). Quanto à execução das contribuições previdenciárias, adote-se a Súmula 40 do TRT. No tocante ao IR, se devido pelo empregado, a empregadora, como fonte pagadora, é responsável pelo respectivo recolhimento, sendo ressarcido posteriormente, após a comprovação nos autos (artigo 27 da Lei 8.218/91 e o art. 46 da Lei 8.541/92). No caso de omissão de comprovação do recolhimento, haverá a retenção diretamente por ordem do Juízo, na forma da Lei 10.833/2003. Juros de mora e correção monetária na forma da fundamentação. Considerando a recuperação judicial da reclamada, após o trânsito em julgado e a liquidação, expeça-se certidão para habilitação do crédito do reclamante e dos honorários periciais no Juízo da Recuperação Judicial. Intimem-se as partes. Intime-se o perito. JOSE AUGUSTO SEGUNDO NETO Juiz do Trabalho Substituto
Intimado(s) / Citado(s)
- CLEITON RODRIGUES NUNES OLIVEIRA
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