Cleide Eunice Guarino Da Silva e outros x Cleide Eunice Guarino Da Silva e outros
ID: 323659784
Tribunal: TRT10
Órgão: 2ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000215-02.2024.5.10.0011
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Advogados:
JOICE JAQUELINE DE ALMEIDA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relatora: IDALIA ROSA DA SILVA ROT 0000215-02.2024.5.10.0011 RECORRENTE: CLEIDE EUNICE GUARINO DA SILVA…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relatora: IDALIA ROSA DA SILVA ROT 0000215-02.2024.5.10.0011 RECORRENTE: CLEIDE EUNICE GUARINO DA SILVA E OUTROS (1) RECORRIDO: CLEIDE EUNICE GUARINO DA SILVA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000215-02.2024.5.10.0011 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATORA: JUÍZA IDÁLIA ROSA DA SILVA RECORRENTE: CLEIDE EUNICE GUARINO DA SILVA ADVOGADO: JOICE JAQUELINE DE ALMEIDA RECORRENTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS RECORRIDOS: OS MESMOS CUSTOS LEGIS: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO ORIGEM: 11ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - DF (JUIZ FERNANDO GONÇALVES FONTES LIMA) EMENTA ADMISSIBILIDADE NEGATIVA. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. Não merece conhecimento o apelo adesivo apresentado, por força do princípio da unirrecorribilidade, já que previamente interposto recurso ordinário principal pela parte. Precedente. PRESCRIÇÃO. SÚMULA 294 DO TST. NÃO CONFIGURAÇÃO. A lesão apontada pela parte, consistente na supressão indevida da gratificação de função percebida por extenso lapso temporal, está situada em fevereiro de 2024, sendo, pois, a hipótese distinta daquela prevista na Súmula 294/TST. Com efeito, o caso diz respeito a lesão de trato sucessivo, renovada mês a mês, não havendo espaço para cogitar a prescrição total arguida. Precedentes. E. B. C. E. T. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCORPORAÇÃO. A reclamante percebeu vantagem correspondente à gratificação de função por mais de dez anos e preencheu o requisito temporal antes da vigência da Lei 13.467/2017. Assim, faz jus à incorporação da gratificação recebida pela média dos últimos 10 anos anteriores à supressão, a teor da Súmula 372 do TST e do Verbete nº 12/TRT10. 2. Incidência, ainda, do item I da Súmula 51 do TST, pois o direito da autora também está abarcado pelo regulamento interno da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (MANPES). 3. Reforma da sentença apenas para autorizar a compensação de valores, na forma do Verbete nº 65 deste Tribunal. JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. Em havendo declaração de hipossuficiência financeira firmada por pessoa natural, que detém presunção de veracidade (art. 99, § 3º, do CPC e Súmula 463, I, do TST), e sem produção de prova capaz de infirmar tal declaração, reputa-se satisfeito o requisito exigido legalmente para a concessão do benefício. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. TUTELA DE URGÊNCIA. Considerando que os valores pagos à reclamante por força da tutela de urgência concedida representam proveito econômico obtido nos autos, eles devem ser incluídos na base de cálculo dos honorários devidos pela reclamada. Recurso ordinário da reclamada conhecido e parcialmente provido. Recurso ordinário da autora conhecido e provido. Recurso adesivo da autora não conhecido. RELATÓRIO O Juiz Fernando Gonçalves Fontes Lima, da 11ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, proferiu a sentença de fls. 455/461, na qual julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando a reclamada a incorporar a gratificação de função à remuneração da autora, bem como a pagar parcelas vencidas e reflexos. De resto, concedeu à obreira os benefícios da justiça gratuita, impondo à empresa a satisfação de honorários advocatícios. Irresignada, a reclamante interpõe recurso ordinário, postulando a alteração da base de cálculo dos honorários (fls. 466/469). A reclamada também recorre (fls. 472/494). Requer a reforma da sentença quanto às seguintes matérias: prescrição total, incorporação da gratificação de função e justiça gratuita concedida à parte contrária. A empregada apresentou contrarrazões (fls. 497/506) e, ato contínuo, interpôs recurso adesivo, renovando sua irresignação quanto aos honorários (fls. 507/510). A empresa, por sua vez, produziu contrarrazões às fls. 511/514. O d. Ministério Público do Trabalho oficiou pelo conhecimento dos recursos e desprovimento do interposto pela reclamada (fls. 529/537). É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE Os recursos ordinários das partes (fls. 466/469 e 472/494) e as respectivas contrarrazões são tempestivos e regulares, inclusive quanto à representação processual (às fls. 13 e 470, pela autora, às fls. 438/440, pela ré). Registra-se que a ré está dispensada do recolhimento de custas e do depósito recursal, na forma do artigo 12 do Decreto-lei nº 509/1969 (fls. 460/461). Não desafia conhecimento, todavia, o apelo adesivo da autora de fls. 507/510, por força do princípio da unirrecorribilidade, já que previamente interposto por ela recurso ordinário principal. Nesse sentido, cito o seguinte aresto do TST: "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELA RECLAMADA NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. RECURSOS DE REVISTA AUTÔNOMO E ADESIVO. INTERPOSIÇÃO PELA MESMA PARTE. INCABÍVEL. UNIRRECORRIBILIDADE E PRECLUSÃO CONSUMATIVA. É inadmissível o recurso de revista adesivo quando a parte já tenha se utilizado do recurso principal para atacar o acórdão do Tribunal Regional. Aplicação do princípio da unirrecorribilidade e do instituto da preclusão consumativa. Julgados do TST." (RRAg-100418-34.2019.5.01.0031, 8ª Turma, Relatora Ministra Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 11/12/2023) Em suma, não conheço do recurso adesivo da autora. Por outro lado, porquanto preenchidos os pressupostos processuais de admissibilidade recursal, conheço dos recursos ordinários interpostos, bem como das respectivas contrarrazões. PRESCRIÇÃO TOTAL Com fundamento na Súmula 294 do TST, o reclamado renova a alegação de prescrição total do direito, ao menos sob a perspectiva da incorporação da gratificação assentada no normativo interno intitulado MANPES-36 - revogado em 05/05/2014 (fls. 308/310 e 487/489). Analiso. No caso em exame, a reclamante foi admitida em 05/01/1998 e o contrato de trabalho está ativo, tendo a presente ação sido ajuizada em 29/02/2024. Já a lesão apontada está situada em fevereiro/2024, época na qual, segundo a inicial, houve a supressão unilateral e sem justo motivo da gratificação recebida por mais de 20 anos. Cabe acrescentar, por oportuno, que a pretensão veio fundada não só no teor da Súmula 372 do TST, como também na aludida norma interna da empresa, sob o argumento de que o direito correlato nela previsto fora incorporado ao contrato de trabalho, na forma da Súmula 51 do TST. Nesse cenário, sob qualquer prisma, o caso não é de aplicação da prescrição total, mas da parcial, considerando tratar-se de violação que se renova mês a mês, a partir de fevereiro de 2024, decorrente do descumprimento de obrigação atrelada ao princípio da irredutibilidade salarial. Em outros termos, o caso não trata de alteração lesiva decorrente de ato único do empregador, sendo, pois, desimportante o momento em que o normativo interno fora revogado, no particular. Com efeito, tal evento teria relevância prática apenas se a parte visasse invalidar a norma, o que não é o caso. No mesmo sentido, cito, a título ilustrativo, precedentes desta Turma em casos análogos: "PRESCRIÇÃO TOTAL. REQUISITOS. AUSÊNCIA. O sistema jurídico nacional adota a teoria da actio nata, consagrando a gênese conjunta do interesse jurídico para o processo com o fluxo da prescrição. O prazo do instituto, em se tratando de pretensão versando sobre a incorporação de gratificação de função, tem início apenas quando praticado o ato supressivo [...]" (RO 0000613-47.2023.5.10.0022, Rel. Desembargador João Amílcar, DEJT 19/12/2024) "[...] 2. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL DA CONTAGEM. A contagem do prazo prescricional em relação à pretensão de recebimento das diferenças decorrentes da incorporação de gratificação percebida inicia-se do momento da supressão. Restando incontroversa a supressão em 3/1/2023 e ajuizada a ação em 30/1/2023, por empregado com contrato de trabalho em curso, não há prescrição a ser declarada (CF, art. 7º, XXIX). [...]" (RO 0000084-85.2023.5.10.0003, Rel. Juiz Convocado Antônio Umberto de Souza Júnior, DEJT 09/12/2024). Nego provimento. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO Segundo consta da inicial, a reclamante, admitida em 05/01/1998 para o cargo de auxiliar administrativo, exercia funções gratificadas desde 15/03/2002 - de forma ininterrupta a partir de 01/03/2004 -, até ser destituída em fevereiro de 2024, ocasião em que houve o decote do acréscimo financeiro correlato. Afirmou que a supressão unilateral e sem justo motivo da gratificação recebida por mais de 20 anos feriu sua estabilidade econômica e requereu a incorporação da gratificação de função percebida nos últimos 10 anos anteriores ao ato patronal, com o pagamento das diferenças vencidas e vincendas e dos reflexos nas demais parcelas salariais (fls. 3/12). Em defesa, a ECT defendeu a inexistência de direito adquirido à incorporação postulada, invocando, no aspecto, a nova redação do art. 468, §2º, da CLT. Contrastou, ainda, o direito sob o prisma do normativo interno intitulado MANPES 36, dada a sua revogação em 05/05/2014. Pugnou, ao final, pela improcedência do pedido ou, subsidiariamente, pela sua limitação, de acordo com as teses e parâmetros enumerados na manifestação (fls. 291/319). O Juízo de origem, por sua vez, julgou parcialmente procedente o pedido e, ratificando a tutela de urgência deferida, condenou a reclamada a proceder à incorporação da média da função gratificada recebida pela autora nos últimos 10 anos, bem como a pagar os reflexos devidos, sob os seguintes fundamentos (fls. 455/460): "INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO No presente caso, extrai-se das fichas cadastral e financeiras (Id d5c47d3 e Id 02d0aaf) que a reclamante recebeu gratificação de função (rubrica "Complemento Remun. Singular") desde o ano de 2002, o que se manteve até fevereiro/2024 (mês em que houve o descomissionamento). Logo, aplica-se a tese amparada na Súmula nº 372 do C. TST e na jurisprudência, segundo a qual quem já tinha 10 anos ou mais no exercício de funções gratificadas, quando do advento da Reforma Trabalhista, terá direito à incorporação. Nesse sentido se manifestou o C. TST: RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A EGIDE DA LEI No 13.467/2017. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS - ECT. INCORPORACAO DA GRATIFICACAO DE FUNCAO PERCEBIDA POR MAIS DE 10 ANOS. APLICACAO DA SUMULA No 372, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. DIREITO ADQUIRIDO. IRRETROATIVIDADE DA LEI No 13.467/2017. 1. Discute-se nos autos acerca da aplicabilidade do artigo 468, § 2o, da CLT, incluido pela Lei no 13.467/2017 - que afasta o direito a incorporacao da gratificacao de funcao exercida pelo empregado por mais de dez anos, quando revertido ao cargo efetivo sem justo motivo -, a hipotese em que o empregado ja havia implementado os requisitos contidos na Sumula no 372, I, do TST, quando da entrada em vigor do referido diploma legal (11/11/2017). 2. A jurisprudencia desta Corte superior tem-se posicionado no sentido da inaplicabilidade do disposto no artigo 468, § 2o, da Consolidacao das Leis do Trabalho em hipoteses como a dos autos, em que os empregados completaram 10 anos de exercicio da funcao gratificada anteriormente a reforma trabalhista promovida pela Lei no 13.467/2017. 3. No caso em tela, resulta incontroverso que a reclamante percebeu gratificacao de funcao no periodo de 31/12/1993 a 2/8/2018, tendo sido preenchido o requisito da percepcao da gratificacao por 10 anos em 2003 - antes, portanto, da entrada em vigor da Lei no 13.467/2017, circunstancia que atrai a incidencia da Sumula no 372, I, do TST. 4. Recurso de Embargos conhecido, por divergencia jurisprudencial, e a que se da provimento para restabelecer o acordao prolatado pelo Tribunal Regional. (E-ED-RR-43-82.2019.5.11.0019, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, julgado em 9/9/2021) RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. ACORDAO PUBLICADO NA VIGENCIA DA LEI No 13.015/2014. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS. GRATIFICACAO DE FUNCAO RECEBIDA POR MAIS DE 10 ANOS. INCORPORACAO. SUMULA 372 DO TST. RECLAMACAO TRABALHISTA DISTRIBUIDA APOS A VIGENCIA DA LEI 13.467/2017. Cinge-se a controversia em se definir se e possivel a incorporacao da gratificacao de funcao exercida pela reclamante por mais de 10 (dez) anos. A problematica envolve a aplicacao de direito intertemporal, em face do advento da Lei no 13.467/2017, que introduziu o § 2o ao artigo 468 da Consolidacao das Leis do Trabalho. No presente caso, a causa se reporta a situacao constituida anteriormente a vigencia da Lei no 13.467/2017, consoante se verifica do quadro fatico registrado no acordao recorrido, no qual restou consignado que "e incontroverso que a reclamante recebeu variadas gratificacoes de funcao, de maneira quase ininterrupta, desde o ano de 1995 e que, em 10/12/2018, foi destituida da ultima funcao exercida.". Desse modo, a supressao da gratificacao na hipotese enseja a aplicacao do entendimento contido na Sumula no 372 do TST, o qual, interpretando a legislacao trabalhista aplicada a epoca dos fatos, observa os principios da estabilidade economico-financeira e da irredutibilidade salarial. Assim, uma vez que, no caso, o exercicio de gratificacao de funcao por mais de 10 anos se constituiu antes da vigencia da Lei no 13.467/2017, nao ha que se falar em aplicacao da disposicao contida no § 2o do artigo 468 da CLT, sob pena de violacao a garantia constitucional da irretroatividade das leis, prevista no artigo 5o, inciso XXXVI, da Constituicao da Republica. Nessa linha de entendimento sao os precedentes da SBDI-I e da SBDI-II deste Tribunal, alem da maioria das Turmas desta Corte Superior. Recurso de embargos conhecido e nao provido. (E-RR-1000214-88.2019.5.02.0078, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 28/1/2022) Sendo assim, não se aplica o § 2º do art. 468 da CLT, uma vez que, conforme evidenciado nos autos, a autora, antes da Reforma Trabalhista, já havia completado mais 10 anos no exercício de função comissionada, recebendo a respectiva gratificação, enquadrando-se, assim, na hipótese prevista no item I da Súmula 372 do TST, vigente à época. Noutro enfoque, o MANPES, Módulo 36, Capítulo 2 (Id cbd78fe), norma interna já revogada, previa a incorporação administrativa por tempo de função (ITF), para aqueles empregados que tivessem exercido no mínimo 10 anos de exercício de função gerencial, técnica, de atividade especial, FAT/FAO, ou dirigente da ECT. Como se vê, por expressa previsão, a incorporação não ocorre apenas na hipótese de função gerencial, estando igualmente contempladas funções técnicas, também exercidas pela reclamante. Embora a norma já tenha sido revogada, a reclamante preencheu os requisitos ali previstos para a incorporação antes de sua revogação. E, nesta situação, o TST tem entendido que o trabalhador tem direito à aplicação da norma revogada: "AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. TEMA 339 DA REPERCUSSÃO GERAL DO STF. OBSERVÂNCIA. TRANSCENDÊNCIA NÃO DEMONOSTRADA. 1. A ocorrência de nulidade por negativa de prestação jurisdicional estará caracterizada na hipótese de ausência de posicionamento judicial a respeito de fatos relevantes para a controvérsia, de tal forma que inviabilize a devolução da matéria à instância Superior. 2. Não é esse o caso dos autos, em que a Corte Regional apresentou fundamentação referente aos fatos que justificaram seu convencimento, tendo fixado de forma expressa e satisfatória todos os pressupostos fático-jurídicos necessários para o deslinde da controvérsia, em completa observância do Tema 339 da Repercussão Geral do STF, não configurando nulidade quando a decisão é contrária aos interesses das partes. Agravo a que se nega provimento . GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCORPORAÇÃO POR MEIO DE ATO ADMINISTRATIVO. REVOGAÇÃO DA NORMA INSTITUIDORA DO BENEFÍCIO. SÚMULA N.º 51, I, DO TST. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. Extrai-se da leitura do acordão proferido pelo Tribunal Regional de origem que, em razão do exercício de função de confiança gratificada por mais de dez anos, o autor teve a gratificação incorporada por meio de ato administrativo em 03/02/2014. Assim, a revogação posterior da norma interna autorizativa não alcança o presente contrato de trabalho, porquanto consolidado o direito adquirido ao tempo de vigência da regra revogada. Incidem, à hipótese, os ditames da Súmula n.º 51, I, do TST. Agravo a que se nega provimento. EMPRESA PÚBLICA. EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE ECONÔMICA. PRERROGATIVAS DA FAZENDA PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. STF - TEMA 253 DE REPERCUSSÃO GERAL. A Companhia Nacional de Abastecimento -Conab é uma empresa pública federal e, por força do artigo 173, § 1º, II, e § 2º, da Constituição Federal, está sujeita ao regime jurídico próprio das empresas privadas, de forma que não pode gozar de privilégios fiscais não extensivos às empresas do setor privado sem a necessária previsão legal. Precedentes da SBDI-II do TST. Agravo a que se nega provimento " (Ag-AIRR-10229-23.2021.5.03.0180, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 26/04/2024). "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - CONAB - GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO - INCORPORAÇÃO - PREVISÃO EM NORMA INTERNA - SUPRESSÃO POSTERIOR - ALTERAÇÃO INDEVIDA. 1. É inviável a supressão de parcela (gratificação de função incorporada) que passou a integrar o contrato de trabalho do reclamante por força de norma regulamentar. 2. A alteração prejudicial do pacto laboral daqueles empregados que já tinham adquirido o direito ao recebimento da gratificação incorporada é vedada expressamente pelo art. 468 da CLT e pela Súmula nº 51, I, do TST. 3. O direito à parcela (gratificação de função incorporada) já havia sido agregado ao patrimônio jurídico da autora, devendo ser preservado o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a estabilidade econômica do empregado. Agravo interno desprovido " (Ag-AIRR-725-67.2019.5.10.0018, 2ª Turma, Relatora Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 26/03/2024). Nesse contexto, não há dúvida de que a reclamante cumpriu os requisitos estabelecidos na norma da parte ré. Assim sendo, por quaisquer ângulos que se vislumbre a questão, impõe-se a incorporação da gratificação. A base de cálculo será a média atualizada das gratificações recebidas nos últimos 10 anos, conforme será apurado em liquidação, em consonância com o entendimento que vem sendo adotado pelo TST, em situações semelhantes. [...] DISPOSITIVO Ante o exposto, decide a 11ª Vara do Trabalho de Brasília condenar a reclamada a incorporar a gratificação de função à remuneração da autora, retroativamente a fevereiro/2024, calculada pela média simples dos valores recebidos a esse título nos últimos dez anos, observados os reajustes concedidos pela reclamada. As parcelas vencidas produzem reflexos em 13º salários, férias + 1/3, abono pecuniários (férias vendidas), FGTS, horas extras pagas e previdência privada. Há também repercussões nos anuênios, adicional de sobreaviso e adicional noturno pagos. Indevidos os reflexos sobre repousos semanais remunerados, porquanto a verba mensal já os remunera. Indefiro os reflexos da incorporação de função sobre o CIP (Complemento de Incentivo à Produtividade), vez que referida parcela já integra a base de cálculo da gratificação de função. Sobre as parcelas vencidas, a reclamada deverá recolher a sua cota-parte para a PostalPrev, bem como reter e recolher a participação do trabalhador." A reclamada insurge-se contra essa decisão. Sustenta que a Lei 13.467/2017 acrescentou o parágrafo 2.º ao art. 468 da CLT, estabelecendo ser incabível a incorporação independentemente do tempo de exercício de função comissionada. Ressalta que os normativos internos da empresa que previam a incorporação foram revogados e requer a exclusão da condenação. Busca, ainda, em caráter subsidiário, a alteração do marco inicial da apuração da média ponderada das gratificações, para que este seja fixado na data da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 (11/11/2017), bem como a autorização de compensação nos termos do Verbete nº 65/TRT10. Examino. Destaco, inicialmente, que a reclamada não impugnou de forma específica os fundamentos da sentença que, expressamente, registrou que o requisito temporal para reconhecimento do direito à incorporação foi preenchido antes da vigência da Lei n.º 13.467/2017. E, corroborando com o entendimento exarado na sentença, cito o precedente abaixo: "ECT. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCORPORAÇÃO. O reclamante percebeu vantagem correspondente à gratificação de função por mais de dez anos e preencheu o requisito temporal antes da vigência da Lei 13.467/2017. Assim, faz jus à incorporação da gratificação recebida pela média dos últimos 10 anos anteriores à supressão, conforme a Súmula 372 do TST. (RO 0000264-44.2022.5.10.0001, Relatora Desembargadora Elke Doris Just, DEJT 06/06/2023)." Superada essa tese, importa pontuar que o parágrafo 1.º do art. 468 da CLT autoriza a reversão do empregado que exerce cargo de confiança ao cargo efetivo. No entanto, a fim de manter um equilíbrio entre a regra insculpida no art. 468 da CLT e a segurança contratual do empregado, a Súmula 372 do TST pacificou a questão visando o empregado inserido nesta situação e com estabilidade financeira após transcorridos mais de dez anos percebendo gratificação de função. Assim dispõe a Súmula 372 do TST: GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO. LIMITES (conversão das Orientações Jurisprudenciais nos 45 e 303 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 I - Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. (ex-OJ nº 45 da SBDI-1 - inserida em 25.11.1996) II - Mantido o empregado no exercício da função comissionada, não pode o empregador reduzir o valor da gratificação. (ex-OJ nº 303 da SBDI-1 - DJ 11.08.2003). Com efeito, a súmula transcrita visa impedir o empregador de reverter o empregado ao cargo efetivo sem garantir-lhe o pagamento da gratificação que recebeu por dez anos ou mais. A essência do entendimento sumulado é a preservação da estabilidade financeira do empregado, de modo a garantir-lhe o mesmo padrão salarial com o qual se habituou durante tanto tempo. Frise-se que a súmula não exige que o empregado exerça por dez anos a mesma função, nem que tal exercício seja contínuo, exigindo apenas que o recebimento de gratificação se dê por pelo menos 10 anos. O que se busca preservar com a incorporação da gratificação recebida pelo exercício de funções comissionadas é a situação financeira do empregado estabelecida ao longo dos anos, ainda que receba funções distintas, conforme esclarece o Verbete n.º 12 deste Tribunal: "GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO EXERCIDAS POR MAIS DE 10 (DEZ) ANOS. APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 45, DA SBDI1, DO COL. TST. FORMA DE CÁLCULO. Ainda que o empregado receba distintas gratificações durante o decênio de que trata a OJ 45, da SBDI-1/TST, essa será aplicável, devendo ser integrado à remuneração do trabalhador o valor médio das gratificações recebidas nos últimos 10 (dez) anos, observado para fins de cálculo o importe relativo a cada uma delas, ou equivalente, na data da supressão." No caso, a ficha cadastral da empregada (fls. 322/323) revela a percepção de gratificação de função entre os anos de 2002 a 2024 (mais de 20 anos), tendo o descomissionamento ocorrido precisamente em 19/02/2024 (fl. 74). Assim, preenchido o lapso temporal exigido pela Súmula 372 do TST, antes da vigência da Lei 13.467/2014 (reforma trabalhista), e não demonstrada a presença de justo motivo, correta a decisão de origem que determinou a incorporação da gratificação de função. Já quanto ao parâmetro de cálculo do adicional de incorporação, igualmente correta a decisão, pois deve ser considerada a média das gratificações recebidas nos dez anos anteriores à destituição da função, sendo esta a previsão, inclusive, do Verbete nº 12 supracitado. Pontuo, ainda, porque expressamente mencionado pela empresa em razões recursais, a revogação dos normativos internos da ECT no ano de 2014 não alcança a reclamante, admitida em 1998. Assim, ainda sob este enfoque, ela teria direito ao adicional de incorporação nos moldes postulados. E o caso em análise é similar à apreciada por esta 2ª Turma nos autos do Processo nº 0000030-62.2023.5.10.0022, cujo julgamento ocorreu em 14/03/2025. O Relator, Desembargador João Amílcar Silva e Souza Pavan, lançou os seguintes fundamentos, os quais adoto como razões de decidir: "GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCORPORAÇÃO. REQUISITOS. APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. ART. 468, § 2º, DA CLT. Na petição inicial a reclamante afirma que foi admitida em 17/02/2002, exercendo ininterruptamente função gratificada desde o dia 01/09/2003. Invocando a fratura ao princípio da estabilidade econômica, consagrado na Súmula 372 do TST e no próprio regulamento da empresa (MANPES, módulo 36), postula a incorporação ao salário do valor correspondente, em decorrência da supressão ocorrida em 12/01/2022, fato que causou redução em sua remuneração. A reclamada contestou o pedido, alegando que o art. 468, §2º, da CLT veda o efeito almejado, contexto que afasta a incidência da Súmula 372 do TST, superada vigência da Lei nº 13.467/2017. A r. sentença, por sua vez, acolhendo a tese subsidiária da obreira, julgou procedente o pedido, daí o presente recurso ordinário. Sobre a aplicação do direito à espécie, à luz da inserção do § 2º do art. 468 da CLT, pela Lei nº 13.467/2017, friso que o elemento básico para a aquisição do direito à estabilidade financeira reside no exercício, por pelo menos 10 (dez) anos, da função gratificada, completados, na hipótese, muito antes da alteração legislativa. E o fenômeno da incorporação, que traduz a concretização de direito já adquirido, está apenas sujeito a condição específica - a dispensa do empregado sem justo motivo. Nesse contexto, entendo que as disposições do art. 6º, § 2º, da LINBD, asseguram ao empregado a continuidade do pagamento da parcela - entenda-se, com as necessárias modulações, inexistindo potencial ofensa ao artigo 912 da CLT. Não ultrapassa a lógica racional negar o direito à incorporação àqueles empregados que já haviam completados dez anos de exercício e recebimento continuado de funções gratificadas, mas que não foram revertidos ao cargo efetivo, pois, a rigor, à luz do novel ordenamento jurídico, eles não possuem diferença substancial alguma em relação aos que, nas mesmas condições, acabaram dispensados sem justa causa da função gratificada antes da vigência da Lei 13.467/2017, e tiveram assegurada a estabilidade econômica. Não há razão de natureza jurídica apta a justificar o pretendido discrímen. Ressalva-se, como já alinhavado, o não implemento da condição - reversão -, a qual não revela o condão de prejudicar o exercício futuro do direito quando de seu implemento. Em outros termos, todos os empregados que completaram o requisito temporal na vigência do regime jurídico anterior - até 11/11/2017 - têm o direito à incorporação tão logo ocorra o descomissionamento, exatamente a hipótese ora verificada, não havendo respaldo jurídico para eventual incidência retroativa do preceito legal. Conforme orienta a jurisprudência do TST, à luz do princípio da irretroatividade da legislação superveniente, "...os empregados que completaram 10 anos de exercício de cargo comissionado ou função de confiança antes da entrada em vigor da reforma trabalhista serão beneficiados pela Súmula 372 deste Tribunal, que interpretou o disposto na redação original do art. 468 da CLT (legislação modificada) e, portanto, terão garantido o direito à incorporação do valor da gratificação percebida, o que se aplica ao caso dos autos" (ED-RO - 21284-38.2017.5.04.0000, Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte, SBDI-2, DEJT 29/06/2018). A propósito, emerge serena a subsistência de tal entendimento, ainda que à luz da tese vinculativa (Tema 23) firmada pelo TST ao julgar incidente de recursos repetitivos - IncJulgRREmbRep-528-80.2018.5.14.0004, e redigida nos seguintes termos, ad litteram: "A Lei nº 13.467/2017 possui aplicação imediata aos contratos de trabalho em curso, passando a regular os direitos decorrentes de lei cujos fatos geradores tenham se efetivado a partir de sua vigência." No caso, o fato gerador consiste no exercício do cargo por dez anos ininterruptos e este foi efetivado antes da alteração legislativa, com a aquisição do direito. Resta suspenso, somente, seu exercício - que depende única e exclusivamente da destituição de função sem justo motivo, ou seja, do mero alvedrio do empregador. E tal ato não pode ser equiparado à condição, stricto sensu, de sorte afastar a inserção do direito ao patrimônio jurídico do trabalhador, pois nos termos do art. 122 do CCB são defesas aquelas sujeitas ao puro arbítrio de uma das partes. Superada tal premissa, pende a análise da matéria à luz da norma interna da empresa, qual seja, o módulo 36 do Manual de Pessoal - MANPES, que em seus capítulos 1 e 2 assim disciplina, in verbis: "2.1 Incorporação por Tempo de Função - ITF É o mecanismo de incorporação administrativa de função concedida aos empregados que forem dispensados do exercício de função após um período igualou superior a 10 anos, de função. (...) 1 CRITÉRIOS PARA INCORPORAÇÃO ADMINISTRATIVA POR TEMPO DE FUNÇÃO ITF 1.1 Terá direito à incorporação administrativa por tempo de função, o empregado que atender os seguintes critérios: a) possuir no mínimo 10 anos de exercício em função gerencial, técnica, de atividade especial, FAT/FAO, ou dirigente da ECT, contados a partir da data da dispensa da função; b) ter sido dispensado ou exonerado da função por iniciativa da Empresa. 1.2 O exercício da função poderá conter um interstício de até 180 dias, ininterruptos ou não, no período de 10 anos" (fls. 121/125). Ora, a norma interna vigente no curso do pacto laboral foi inserida no patrimônio jurídico da empregada, e ainda que sendo ela destituída da função no dia 12/01/2023, quando já vigente o § 2º do art. 468 da CLT, a inovação legislativa não tem o condão de revogar o módulo 36 do Manual de Pessoal (MANPES), elaborado pela reclamada. E mesmo que assim não fosse, as consequências da sua retirada do mundo jurídico apanham, tão-somente, os empregados admitidos após o ato. Nesse sentido, aliás, consagra a Súmula 51, item I, do TST, ad litteram: "NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT. I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento." Na moldura fática apresentada, resta claro que a empresa buscou normatizar internamente a orientação consolidada na Súmula 372 do TST, visando ainda, dentre outros, fomentar a "...retenção do capital intelectual e de talentos, com foco na mitigação de processos judiciais, estabilidade do clima organizacional...". A iniciativa, de claro alcance social e elogiável, produz os seus efeitos específicos, mas não revela o condão de afastar, desde que presentes os requisitos fáticos, a incidência do verbete sumular em comento. Emergindo a compreensão nele encerrada da interpretação do ordenamento jurídico, aplica-se a máxima nemo jus ignorare censetur. Em outros termos, reputo que a norma interna, por ser mais benéfica, incorporou-se ao patrimônio jurídico da empregada, ainda que ela tenha sido destituída do cargo em janeiro de 2023, quando já vigente a nova redação do art. 468, §2º, da CLT. A regra atual, como já antecipado, afasta o direito a incorporação da gratificação e a incidência da Súmula 372, item I, do TST, mas inovação legislativa não tem a feição de revogar tacitamente o módulo 36 do Manual de Pessoal (MANPES). O art. 468 da CLT torna infenso o contrato de emprego às alterações unilaterais e piorativas, promovidas pelo empregador. Ele tem como objeto específico as condições de trabalho ajustadas, nos precisos limites de sua pactuação. O Direito do Trabalho, salvo nas exceções por ele ditadas, está enquadrado no denominado direito imperativo. A magnitude das relações sociais de produção, assentadas no binômio capital trabalho, reclama condição especial, extravasando a mera vontade das partes envolvidas. O liberalismo positivado no Código de Napoleão, onde prevalecia o princípio da autonomia da vontade, foi cedendo de forma nítida à necessidade de se emprestar feição imperativa ao Direito do Trabalho. Isso porque a injustiça e desigualdade geradas pelo princípio desaguaram na intervenção especial do Estado, para fossem aos trabalhadores garantidas condições mínimas de vida (MARIO DE LA CUEVA). Na realidade, o caráter cogente nada mais revela que a plena possibilidade de o Estado intervir em cada relação individual de trabalho, inclusive coercitivamente, para que as garantias sociais sejam respeitadas. Daí a afirmativa no sentido de que o Direito do Trabalho traz em si garantias mínimas, isto é, suas regras devem ser observadas imediatamente, pois este é o conteúdo mínimo permitido no relacionamento entre empregados e empregadores. Despido de tal feição o Direito do Trabalho perderia a capacidade de realizar seus objetivos, porquanto a ideia das garantias, quer individuais ou sociais, traz em si ínsita a existência de normas consideradas como essenciais ao seu objeto próprio. Inclusive atado a tal contexto vem o princípio da irrenunciabilidade (PLÁ RODRIGUEZ), exatamente para proteger o subordinado da atuação indiscriminada do subordinante, e garantindo àquele o mínimo estipulado em lei. E exatamente nesta perspectiva as normas trabalhistas atingem os empregados e empregadores como tais, e não na condição de meros contratantes (DÉLIO MARANHÃO). A essência do Direito do Trabalho - ao contrário do apregoado por muitos - reside na proteção da relação de emprego em si, e nunca a determinado componente. Como visto, dela emana fração substancial, senão a de maior relevância, das atuais relações sociais de produção. Ora, fincado em tais princípios o preceito em exame veio exatamente consagrar a intangibilidade unilateral e prejudicial das condições ajustadas pelas partes. Constitui verdadeiro sistema de freios ao poder diretivo do empregador, determinando que ele observe aquelas situações criadas com a sua participação. Veda as alterações das cláusulas e condições contratuais, como, por exemplo, a alteração de jornada, esvaziando de conteúdo jurídico e, portanto, de validade, aqueles atos contrários ao princípio da inalterabilidade unilateral. Ressalto, por oportuno, que refoge dos limites da razoabilidade entendimento segundo o qual apenas o empregado que permanecer estagnado em uma única função é que faria jus à incorporação da gratificação percebida, enquanto aquele que ocupou funções diversas, também por mais de dez anos, não teria reconhecido o direito em debate. Ilógico erigir tal óbice à incorporação pretendida. Nesse sentido, aliás, também orienta a jurisprudência consolidada deste Tribunal, como espelha o seu Verbete nº 12, in verbis: "GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO EXERCIDA POR MAIS DE 10 (DEZ) ANOS. APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 45, DA SBDI 1, DO COL. TST. FORMA E CÁLCULO. Ainda que o empregado receba gratificações distintas durante o decênio de que trata a OJ 45, da SBDI 1/TST, esta será aplicável, devendo ser integrado à remuneração do trabalhador o valor médio das gratificações recebidas nos últimos 10 (dez) anos, observado para fins de cálculo o importe relativo a cada uma delas, ou equivalente, na data da supressão." Destaco, ademais, que o fato de ser a empresa integrante da administração pública indireta não tem o condão de alterar a conclusão adotada, sobretudo porque, enquanto pessoa jurídica de direito privado, está sujeita às regras próprias das demais empresas quanto às obrigações trabalhistas, como dispõe expressamente o inciso II do § 1º do art. 173 da CF, o que afasta, por igual, potencial afronta ao seu artigo 169, § 1º, I. Sendo assim, tenho pela exação do desfecho dado à causa, devendo a r. sentença ser mantida, inclusive quanto aos reflexos e à tutela concedida. Consigno, ainda, a ausência de fundamento a afastar a obrigatoriedade da empresa quitar as parcelas vencidas e os consectários legais, que apenas consagram o princípio da restitutio in integrum. Ainda, deve ser observado o valor atual das diversas gratificações para recomposição da expressão econômica devida à autora. Quanto à forma de reajustamento da parcela atrelada às tabelas das funções gratificadas e reajustes instituídos, a definição de sua natureza jurídica assim determina, até mesmo para preservar o princípio da estabilidade econômica, devendo ser observada, ainda, sua nítida natureza salarial. Devida a consideração, nos cálculos, da parcela denominada Complemento de Incentivo de Produtividade - "CIP" -, pois esta traduz o reajuste daquela, por ato de liberalidade do empregador, conforme evidencia o acervo documental. A propósito, nesse sentido, vem caminhando majoritariamente a jurisprudência desta Turma (v. g., RO 0000372-08.2020.5.10.0013, ac. 2ª Turma, Rel. Des. MARIO MACEDO FERNANDES CARON, DEJT 24/08/2021; e RO 0000340-12.2020.5.10.0010, ac. 2ª Turma, Rel. Des. JOAO LUIS ROCHA SAMPAIO, DEJT 19/10/2021). Assim sendo, impõe-se reconhecer em favor da obreira o direito de ver incorporado o valor médio das gratificações auferidas nos últimos 10 (dez anos), na forma do referido Verbete 12 deste Tribunal, parcelas vencidas e vincendas, além dos consectários legais enumerados na r. sentença, além dos anuênios, que na forma prevista em sua sede jurídica consideram o valor integral da gratificação de função. Nego provimento ao recurso da empresa e provejo, em parte, o da reclamante, para incluir a parcela denominada CIP na base de cálculo da função gratificada, assim como determinar que ela reflita nos anuênios e sofra os reajustes gerais concedidos à categoria profissional. Pontuo a ausência de potencial ofensa aos arts. 5º, incisos II e XXXVI; 7º, incisos VI e XXVI, bem como 37, caput, da CF; 6º da LIDB, 468, §§ 1º e 2º, e 818 da CLT." No mais, gizo que os reflexos deferidos, por sua vez, são também mantidos por falta de insurgência específica no apelo da empresa. De resto, entendo que a sentença merece reparo em um único aspecto, uma vez que silente a respeito do pedido de compensação de parcelas, ora reiterado (fls. 314/316 e 491/493). Nesse ponto, é devida a autorização para compensação, pela empresa, dos valores eventualmente devidos à reclamante em razão de nova designação para função comissionada ou gratificada, conforme previsto no Verbete nº 65/2017 do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, in verbis: "VANTAGEM PESSOAL INCORPORADA. SÚMULA 372 DO TST. GRATIFICAÇÃO PELO EXERCÍCIO DE NOVA FUNÇÃO. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. A vantagem pessoal incorporada, nos moldes da Súmula 372 do TST, autoriza a compensação do seu valor com aquele devido pelo exercício de nova função comissionada" (DEJT 05/09/2017) Diante de todo o exposto, dou parcial provimento ao recurso da reclamada, apenas para autorizar a compensação de valores, conforme o caso, na forma do Verbete nº 65/2017 deste Tribunal. JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA Na sentença, o magistrado concedeu à reclamante os benefícios da justiça gratuita com fundamento no art. 790, § 3º, da CLT (fl. 459). Insurge-se a reclamada dessa decisão, sustentando que a reclamante não preenche os requisitos legais (fls. 474/475). Examino. É certo que a nova redação do art. 790 da CLT assim estabeleceu em seus §§ 3º e 4º: "[...] § 3º É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) § 4º O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo." Para aqueles que recebem salário superior a 40% do limite máximo do benefício previdenciário, a lei exige comprovação da pobreza. Essa comprovação ocorre mediante simples declaração firmada pelo interessado de que não tem condições de pagar as despesas processuais sem prejuízo próprio ou de sua família (art. 790, §3º, da CLT c/c art. 14, § 1º, da Lei 5.584/1970 e art. 99, § 3º, do CPC). Trata-se de matéria que está consolidada na Súmula 463/TST, item I, que assim dispõe: "I - A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015)." No caso, a reclamante juntou declaração de pobreza, à fl. 14, de modo que está satisfeito o requisito exigido legalmente para a concessão da gratuidade da justiça. A recorrente, a seu turno, não produziu prova capaz de infirmar a declaração, sendo insuficientes para tanto, na compreensão iterativa deste colegiado, os valores líquidos percebidos pela reclamante na vigência da relação. Ademais, ainda que o reclamante percebesse salário em importe superior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, esse parâmetro reflete apenas a presunção legal de pobreza, nada impedindo o enquadramento em tal conceito daqueles empregados que não possam arcar com os custos da demanda. Portanto, não há desacerto na sentença recorrida. Nego provimento ao recurso da reclamada. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. TUTELA DE URGÊNCIA. A reclamada foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios, na razão de 10% (dez por cento) sobre "...o valor bruto da condenação, incidindo sobre as parcelas vencidas e sobre um ano de parcelas vincendas (art. 85, § 9º, do CPC), sendo o marco temporal para qualificação das parcelas como vencidas ou vincendas a data do ajuizamento da demanda." (fl. 459). Em suas razões recursais, pugna a reclamante pela alteração da base de cálculo da parcela. Requer, no essencial, que os honorários de sucumbência sejam apurados de acordo com o efetivo proveito econômico da demanda, incluindo, no particular, os valores recebidos em decorrência da antecipação dos efeitos da tutela. Examino. O caput do art. 791-A da CLT dispõe que os honorários advocatícios sucumbenciais serão fixados entre 5% e 15% sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. Partindo desse marco teórico, gizo que, no presente caso, considerando que a condenação envolve, cumulativamente, obrigações de pagar e de fazer, consistente na manutenção do direito à incorporação da gratificação de função, acompanhada da satisfação de parcelas vencidas, o critério de apuração dos honorários deve ser, de fato, o segundo: o proveito econômico da demanda. Resta definir, assim, o alcance de tal conceito, especialmente sob a ótica dos valores pagos por força da tutela de urgência deferida em 01/03/2024 (fls. 271/273). Nessa trilha, entendo que toda a condenação adiantada pela tutela provisória compõe o objeto da pretensão deduzida pela demandante, a qual, não fosse o deferimento da liminar, integraria, ao final, a sentença de procedência do pedido. Sendo assim, como houve o pagamento de valores à reclamante por força da tutela de urgência concedida, estes representam proveito econômico obtido pela parte, logo devem ser incluídos na base de cálculo dos honorários devidos ao patrono da obreira, por força do citado artigo da CLT. Cito, também, ementa de acórdão do TRT da 10ª Região recente: 1. RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. CORREIOS. ECT. FUNÇÃO GRAVADA DE CONFIANÇA. EXERCÍCIO POR MAIS DE DEZ ANOS. GRATIFICAÇÃO. INCORPORAÇÃO. SÚMULA Nº 372, I, DO TST. As inovações trazidas pela Lei nº 13.467/2017 não se aplicam às situações juridicamente consolidadas antes de sua entrada em vigor por força dos arts. 5º, XXXVI, da CRFB e 6º da LINDB. Sob tal perspectiva, constatado que o reclamante exerceu funções de confiança por mais de dez anos, em período anterior à entrada em vigor da Reforma Trabalhista, e foi descomissionado sem justo motivo, tem direito à incorporação da gratificação de função, nos termos do item I da Súmula nº 372 do col. TST. Por conseguinte, deve-se manter a r. sentença.2. RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. BASE DE CÁLCULO. PROVEITO ECONÔMICO. No caso dos autos, houve deferimento da tutela de urgência. Nesse sentido, os honorários advocatícios sucumbenciais deverão incidir sobre o proveito econômico efetivamente obtido pelo reclamante, o que inclui os valores decorrentes da antecipação dos efeitos da tutela. 3. Recursos ordinários conhecidos. Não provido o apelo patronal. Provido o recurso obreiro. (TRT da 10ª Região; Processo: 0001211-07.2023.5.10.0020; Data de assinatura: 12-12-2024; Órgão Julgador: Desembargador Brasilino Santos Ramos - 3ª Turma; Relator(a): BRASILINO SANTOS RAMOS) Em suma, no tocante às parcelas vencidas, a base de cálculo dos honorários sucumbenciais deve abranger tanto as eventuais parcelas suprimidas, a serem ressarcidas na fase de liquidação, quanto os valores decorrentes da tutela provisória, devendo ser observado no aspecto, como data final, o trânsito em julgado desta decisão. Por conseguinte, quanto às vincendas, o cálculo deve observar o lapso temporal de doze meses, a partir do marco acima referido (trânsito em julgado), de acordo com o disposto no art. 85, §9, do CPC. Dou provimento ao recurso da reclamante, para alterar a base de cálculo dos honorários, a fim de incluir na apuração da parcela os valores decorrentes da tutela de urgência. CONCLUSÃO Pelo exposto, não admito o recurso adesivo da autora, conheço dos recursos ordinários interpostos pelas partes e, no mérito, dou provimento ao da obreira, para alterar a base de cálculo dos honorários advocatícios, a fim de incluir na apuração da parcela os valores decorrentes da tutela de urgência, além de prover, em parte, o da empresa, para autorizar a compensação de valores, conforme o caso, na forma do Verbete nº 65/2017 deste Tribunal, tudo nos termos da fundamentação. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os integrantes da Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, conforme o contido na certidão de julgamento, aprovar o relatório, não admitir o recurso adesivo da autora, conhecer dos recursos ordinários interpostos pelas partes e, no mérito, dar provimento ao da reclamante, além de prover, em parte, o da empresa, nos termos do voto da Juíza Relatora. IDALIA ROSA DA SILVA Juíza Relatora DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 11 de julho de 2025. FRANCISCA DAS CHAGAS SOUTO , Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- CLEIDE EUNICE GUARINO DA SILVA
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