Processo nº 1007718-77.2025.8.11.0000
ID: 261397383
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara Criminal
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 1007718-77.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1007718-77.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Violência Doméstica Contra a Mulher, Prisão Prev…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1007718-77.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Violência Doméstica Contra a Mulher, Prisão Preventiva] Relator: Des(a). GILBERTO GIRALDELLI Turma Julgadora: [DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA] Parte(s): [TIAGO FRANCISCO DOS PASSOS - CPF: 032.908.451-84 (ADVOGADO), MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA - CPF: 066.975.203-70 (PACIENTE), JUÍZO DA VARA ÚNICA DE SAPEZAL (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), TIAGO FRANCISCO DOS PASSOS - CPF: 032.908.451-84 (IMPETRANTE), JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE SAPEZAL (IMPETRADO), MARIANA TAMARA FERREIRA DOS SANTOS BOM - CPF: 046.501.921-88 (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A Direito processual penal. Habeas corpus. Ameaça, lesão corporal por misoginia e descumprimento de medidas protetivas de urgência. Pretendida a concessão de liberdade ao paciente. Impossibilidade. Ordem denegada. I. Caso em exame 1. Impetração de habeas corpus contra decisão que decretou a prisão preventiva do paciente, em razão da suposta prática dos crimes de ameaça, lesão corporal por misoginia e descumprimento de medidas protetivas de urgência. II. Questão em discussão 2. Consiste em determinar (i) se o restabelecimento da convivência amorosa revoga tacitamente as medidas protetivas de urgência; e (ii) se estão presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, bem como se é possível sua substituição por providências acautelatórias mais brandas. III. Razões de decidir 3. A alegada reconciliação entre o paciente e a suposta vítima não possui o condão de revogar automaticamente as medidas protetivas outrora fixadas judicialmente, cujo afastamento depende de expressa decisão judicial. 4. Tem-se por devidamente motivada a custódia cautelar, uma vez que idoneamente fundamentado o édito segregatício e evidenciados os requisitos legais pertinentes ao fumus comissi delicti e ao periculum libertatis, sendo insuficientes para elidi-los as condições pessoais favoráveis eventualmente ostentadas pelo agente, mesmo porque, a teor do que preconiza o art. 282, §6º, do CPP, a necessidade da prisão preventiva já pressupõe, essencialmente, a insuficiência de outras cautelares menos severas. 5. In casu, encontra-se devidamente caracterizada a imprescindibilidade da prisão provisória com vistas à garantia da ordem pública, o que se evidencia pela gravidade concreta das condutas imputadas ao paciente, que teria, em tese, descumprido as medidas protetivas de urgência outrora fixadas em desfavor de sua ex-companheira, oportunidade na qual, além de invadir sua residência durante a madrugada, também a ameaçou de morte e a agrediu fisicamente, tendo sido as medidas protetivas, ademais, deferidas em razão de prévias agressões físicas e verbais contra a ofendida, a denotar a existência de risco concreto de reiteração delitiva; todas circunstâncias aptas a justificar o encarceramento cautelar do beneficiário do writ. 6. O fato de que até o momento não foi noticiado o cumprimento do mandado de prisão preventiva expedido em desfavor do paciente agrava o risco de reiteração delitiva e de frustração da aplicação da lei penal, legitimando, por conseguinte, a manutenção do decreto de segregação provisória. IV. Dispositivo e tese 7. Ordem denegada. Tese de julgamento: “1. Eventual restabelecimento de vínculo afetivo entre as partes não revoga automaticamente as medidas protetivas de urgência, cuja cessação exige decisão judicial expressa. 2. É legítima a decretação da prisão preventiva de paciente investigado pela prática dos crimes de ameaça, lesão corporal contra a mulher por razões da condição do sexo feminino e descumprimento de medidas protetivas de urgência, quando considerada a gravidade concreta das condutas perpetradas e o risco de reiteração delitiva, especialmente dada a necessidade de se salvaguardar a integridade física e psicológica da ofendida.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LXVIII. CPP, arts. 282, 312, 313 e 319. Jurisprudência relevante citada: TJMT, HC 1003354-95.2022.8.11.0023, Rel. Des. Juvenal Pereira da Silva, Quarta Câmara Criminal, j. 25/2/2025; TJMT, HC 1000313-27.2024.8.11.0096, Rel. Des. Gilberto Giraldelli, Terceira Câmara Criminal, j. 29/1/2025; STJ, RHC 120.305/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 17/12/2019. R E L A T Ó R I O HABEAS CORPUS N. 1007718-77.2025.8.11.0000 – CLASSE CNJ 307 – COMARCA DE SAPEZAL IMPETRANTE: Dr. TIAGO FRANCISCO DOS PASSOS PACIENTE: MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA RELATÓRIO EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI Egrégia Câmara: Trata-se de habeas corpus, com pedido de concessão liminar, impetrado em favor do paciente acima identificado, contra suposto ato coator atribuído ao d. Juízo da Vara Única da Comarca de Sapezal/MT, consistente em decretar-lhe a prisão preventiva nos autos do Pedido de Prisão Preventiva n. 1000385-34.2025.8.11.0078 (PJe), à custa da suposta prática dos delitos tipificados pelo art. 24-A da Lei n. 11.340/06, bem como pelos arts. 129, §13 e 147, caput, ambos do Código Penal. A fim de contextualizar a impetração, aduz o d. causídico que os supostos fatos criminosos ocorreram em 03/03/2025, data em que, a despeito do deferimento anterior de medidas protetivas, o paciente já havia retomado o relacionamento amoroso com a suposta vítima Mariana Tamara Ferreira dos Santos Bom. Narra o d. impetrante que, nessa conjuntura, MARCOS FRANCISCO estava sob o efeito de álcool quando retornou ao lar do casal e encontrou a vítima na companhia de outro homem, oportunidade em que se iniciou uma discussão, seguida da troca de socos entre os dois homens, em meio à qual Mariana foi atingida sem que se pudesse saber quem exatamente teria sido o responsável pelos golpes que a acertaram. Nesse cenário, defende a ocorrência de coação ilegal, sustentando, em primeiro lugar, que a retomada do relacionamento conjugal entre o paciente e a suposta vítima teria ocasionado a revogação tácita das medidas protetivas outrora deferidas, de forma a tornar atípica a conduta de MARCOS FRANCISCO e obstar a configuração do delito tipificado pelo art. 24-A da Lei n. 11.340/06, e acrescenta que a suposta prática dos demais delitos [ameaça e lesão corporal] não teria o condão de justificar a segregação preventiva, por constituírem mera “consequência” do suposto descumprimento das medidas protetivas alegadamente revogadas. Adicionalmente, aponta o impetrante a ausência dos requisitos autorizadores da segregação cautelar, com arrimo em tese de inexistência de razões concretas a justificar o encarceramento do paciente, notadamente quanto ao periculum libertatis, ensejo em que pleiteia a consideração cautelosa do depoimento da suposta vítima, porquanto, tendo sido Mariana flagrada, na intelecção do d. causídico, em situação moralmente reprovável, “é plenamente compreensível que a mesma preste declarações a fim de incriminar o paciente, pois estaria com raiva do mesmo, distorcendo toda a verdade com o fito de prejudicá-lo”. Nessa linha, em vista dos predicados pessoais favoráveis ostentados por MARCOS FRANCISCO e dos alardeados esforços da vítima para manter contato com o paciente após a prolação do decreto constritivo, o d. impetrante também sustenta a desproporcionalidade do ergástulo, em contexto de melhor adequação ao caso das providências acautelatórias mais brandas, acaso necessárias. Lastreado em tais assertivas, o d. impetrante veicula pedido de concessão liminar da ordem, a fim de que seja incontinenti revogada a prisão preventiva do paciente, ainda que acompanhada da imposição de providências acautelatórias diversas, se necessárias. No mérito, postula-se a confirmação da liminar porventura deferida, concedendo-se em definitivo o habeas corpus. A petição inicial veio acompanhada de documentos (ID 274437392 e ss.). Distribuídos os autos durante o Plantão Judiciário, o d. Relator Plantonista, Exmo. Des. Orlando de Almeida Perri, indeferiu o pedido liminar (ID 274431389), oportunidade em que foram requisitadas informações à d. autoridade acoimada de coatora, as quais foram prestadas pelo d. juízo a quo por meio do ID 276573365. Instada a se manifestar, a d. Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela denegação da ordem (ID 281206382). É o relatório. Inclua-se o feito em pauta para julgamento. V O T O R E L A T O R VOTO (MÉRITO) EXMO. SR. DES. GILBERTO GIRALDELLI (RELATOR) Egrégia Câmara: Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos para sua constituição válida e regular, e uma vez identificadas as condições da ação, o writ há de ser submetido a julgamento. Verte dos autos processuais eletrônicos e das informações fornecidas pela d. autoridade tida por coatora, analisados em conjunto com os dados disponíveis nos sistemas informatizados deste eg. Sodalício Estadual, que MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA teve sua prisão preventiva decretada em 04/03/2025, à custa da suposta prática dos delitos tipificados pelo art. 24-A da Lei n. 11.340/06, bem como pelos arts. 129, §13 e 147, caput, ambos do Código Penal. Narra a representação, em síntese, que, nos autos do Pedido de Medidas Protetivas de Urgência n. 1002622-75.2024.8.11.0078, haviam sido deferidas providências protetivas em prol de Mariana Tamara Ferreira dos Santos Bom, porquanto, em 04/12/2024, o paciente MARCOS FRANCISCO a teria ameaçado e agredido fisicamente. Dentre as providências fixadas, estavam a proibição de aproximação da ofendida, seus familiares e testemunhas, na distância mínima de 500 (quinhentos) metros; a proibição de contato com estes; a proibição de se frequentar a residência e local de trabalho da ofendida, além do afastamento do lar, domicílio ou local de convivência. Todavia, conforme noticiado pela d. autoridade policial, MARCOS FRANCISCO teria voltado a importunar a vítima ao continuar a se deslocar até sua residência e insistir em fazer contato com ela, tendo, nesse desiderato, na madrugada do dia 03/03/2025, invadido sua casa e a agredido novamente. Em razão desses fatos, o d. juízo a quo decretou a prisão preventiva de MARCOS FRANCISCO, sem que, até o momento, haja notícia do cumprimento do correspondente mandado de prisão; contexto em que se insurge o d. causídico impetrante, nos termos já relatados. Feitos esses apontamentos, passo a analisar o mérito do writ. 1. Da suscitada atipicidade da conduta: Em primeiro lugar, aduz o d. impetrante que a conduta supostamente perpetrada por MARCOS FRANCISCO seria atípica, uma vez que, já tendo o paciente e a suposta vítima reatado o relacionamento amoroso à época dos supostos fatos ilícitos, tal retomada de convivência conjugal teria o condão de revogar tacitamente as providências protetivas anteriormente deferidas, inviabilizando, portanto, a configuração do delito previsto pelo art. 24-A da Lei n. 11.340/06, e tornando impossível a decretação da prisão cautelar com arrimo tão somente na suposta prática dos demais delitos [arts. 129, §13 e 147, caput, ambos do Código Penal]. A argumentação, porém, não merece acolhimento. Embora este Relator tenha se manifestado anos atrás, em consonância com o entendimento jurisprudencial então vigente, no sentido da possibilidade de se acolher a tese defendida pelo impetrante [revogação tácita das medidas protetivas de urgência mediante retomada pacífica do relacionamento amoroso], atualmente, máxime em vista da solidificação do entendimento doutrinário e jurisprudencial em sentido contrário, me rendi ao posicionamento de que não há falar em revogação tácita de providências protetivas com fulcro em suposta retomada do relacionamento conjugal, uma vez que eventual consenso da ofendida para o contato do agente não descaracteriza a figura típica do crime em comento porque se trata de providências fixadas por meio de ordem judicial, a qual deve ser rigorosamente observada, de modo que somente seria possível a aproximação ou contato do paciente com a vítima caso houvesse decisão do d. juízo responsável desconstituindo a decisão anterior, o que não ocorreu na presente hipótese. Nessa linha, consoante já decidido por esta eg. Corte de Justiça: “[...] o consentimento da vítima não descaracteriza o crime de descumprimento de medida protetiva, pois se trata de norma de ordem pública” (TJMT, N.U 1003354-95.2022.8.11.0023, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 25/2/2025, Publicado no DJE 28/2/2025.). “[...] o crime de descumprimento de medida protetiva não é afastado pelo consentimento da vítima ou pela ausência de dolo presumido, cabendo ao réu observar rigorosamente a ordem judicial formalmente imposta” (TJMT, N.U 1000313-27.2024.8.11.0096, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 29/1/2025, Publicado no DJE 31/1/2025). Destarte, e em vista ainda da cognição sumária possibilitada pelo rito do habeas corpus, que não é, como se sabe, o instrumento adequado ao aprofundamento de questões dessa natureza, mormente quando não evidenciada de plano a verossimilhança da alegação do acusado de que havia retomado o relacionamento amoroso com a vítima —, não há falar em manifesta atipicidade da conduta supostamente perpetrada pelo paciente. 2. Da alegada inidoneidade da prisão preventiva: Dessume-se das razões de decidir da autoridade impetrada que a medida segregatícia imposta em face do beneficiário deste writ encontra suporte nas hipóteses de admissibilidade previstas no art. 313, I e III, do CPP, visto que as condutas imputadas ao paciente são dolosas e punidas com reclusão, cujas penas máximas em abstrato, somadas, superam o patamar de 04 (quatro) anos; demais disso, envolvem violência doméstica e/ou familiar contra a mulher, extraindo-se dos autos a necessidade de se garantir a execução de medidas protetivas de urgência. Nesse ponto, tem-se como inequívoca a ciência do paciente acerca das medidas protetivas inicialmente fixadas em seu desfavor, porquanto devidamente certificada sua intimação pessoal em 04/12/2024, ao que se vê do ID 177782915 – autos n. 1002622-75.2024.8.11.0078. De se acrescer, ainda, que o fumus comissi delicti encontra respaldo nos indícios suficientes de autoria e na prova da materialidade delitiva, consubstanciados nos documentos que compõem os autos do caderno processual, os quais, nesse momento, são o bastante para constituir a “fumaça do cometimento do delito” exigida para imposição da ultima ratio. Em especial, destaco o teor do Boletim de Ocorrência n. 2025.65955; das declarações prestadas pela vítima Mariana e pelo laudo do exame de corpo de delito que atestou a presença de diversas lesões corporais [cortes, hematoma, edema e fratura] na região de seu rosto e de suas mãos, ao que se vê do ID 274437390 – Págs. 17-18. Por clareza, transcrevo a narrativa registrada no Boletim de Ocorrência n. 2025.65955, in verbis: “[...] esta guarnição policial recebeu a informação de que um rapaz estava agredindo sua companheira na residência localizada na Rua dos Lírios, n. 1581, no Bairro Cidezal II. De imediato, deslocamos até o endereço repassado e encontramos o senhor Eduardo Henrique da Silva, que nos relatou que estava com Tamara em sua residência quando um rapaz, alegando ser marido dela, chegou e começou a espancá-lo, além de agredir Tamara também. Eduardo disse que saiu correndo e ligou para a polícia, informando que Tamara estava dentro da residência e que o suspeito havia saído do local. A guarnição foi até a residência e encontrou a vítima, Tamara, nua e com o rosto cheio de sangue devido às agressões sofridas pelo seu ex-marido, Marcos Francisco Gomes da Silva. A vítima nos informou que possuía uma medida protetiva contra seu ex, mas mesmo assim ele foi até sua residência, arrombou a porta e a agrediu. Diante do fato, foi acionada a equipe do SAMU para atendimento da vítima, que foi levada ao hospital local para atendimento médico. Em seguida, foram realizadas rondas com o intuito de localizar o suspeito, mas ele não foi encontrado”. (ID 274437390 – Pág. 8). — Destaquei. Cumpre informar que, nos autos do IP n. 1000637-37.2025.8.11.0078, a narrativa constante do Boletim de Ocorrência foi ratificada pelo depoimento dos policiais militares Alessandro Herreiro Macedo e Carlos Antônio da Silva que, na data, diligenciaram na ocorrência (ID 189605222 e 189605221). Por sua vez, ao ser ouvida extrajudicialmente, Mariana relatou que, na data fatídica, por volta da meia-noite, os fatos assim se deram, in verbis: “[...] QUE, após sair de uma festa, retornou para dormir em sua residência; QUE, ao entrar na residência, fora surpreendida por seu ex-companheiro (relacionamento de quase 4 anos), MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA, que já estava dentro do quintal da casa da declarante, o qual pegou o celular da vítima e o quebrou (iPhone 11 - tendo pago R$2.600, estando ainda pagando as parcelas); QUE, após isso, a declarante correu para o quarto e tentou fechar a porta, mas MARCOS conseguiu adentrar no cômodo; QUE, então, MARCOS começou a agredir a declarante com murros no rosto e em todo o corpo, bem como o seu dedo indicador esquerdo foi quebrado em decorrência das agressões de MARCOS; QUE MARCOS a ameaçou de morte por diversas vezes, dizendo não iria a deixar em paz; QUE já pediu a MARCOS para arrumar outra mulher e esquecer a declarante, mas ele disse que não vai [...] QUE MARCOS já tinha pedido anteriormente para a declarante retirar a medida protetiva contra ele; QUE, na data de hoje, após as agressões, teve que ser conduzida pelo SAMU até o hospital em decorrências das lesões corporais que sofreu; QUE passou por exames no hospital e colocou tala no dedo quebrado; QUE MARCOS fugiu do local e até o presente momento não fora localizado e não sabe informar o seu paradeiro” (ID 274437390 – Págs. 13-14). — Destaquei. Lado outro, a testemunha Eduardo Henrique da Silva posteriormente assim narrou o episódio, in verbis: “[...] conheceu a vítima no Terraço, em uma festa em que tinha ido no dia dos fatos; QUE do Terraço foram para o Sinkas Bar; QUE, posteriormente, foram para o Bar da Maga; QUE depois que saíram do bar da Maga foi para a casa da vítima MARIANA; QUE dentro da casa de MARIANA, estava na cama com ela, e o suspeito MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA arrombou a porta e disse para o depoente sair fora que ele iria matar; QUE então o depoente pegou sua calça e sua bota e fugiu do local; QUE, ao sair, ligou para a polícia militar relantando o ocorrido; QUE disse que não presenciou as agressões de MARCOS contra a vítima MARIANA; QUE ficou do lado de fora da casa dentro do casa aguardando a chegada da polícia militar; QUE relatou o ocorrido aos policiais militares e foi embora; QUE disse que não chegou a ver as lesões de MARIANA naquele momento, mas que ela mandou foto para ele posteriormente via Instagram; QUE não conhecia MARIANA até a festa no Terraço, tendo chegado em Sapezal em outubro de 2024; QUE, de igual modo, não conhecia o suspeito”. (ID 189605220 – autos n. 1000637-37.2025.8.11.0078). — Destaquei. Conquanto MARCOS FRANCISCO não tenha sido localizado, portanto, não foi possível a realização de seu interrogatório extrajudicial, observo que coexistem nos autos ao menos duas versões distintas, sendo elas, de um lado, aquela apresentada na inicial do writ, conforme a qual o paciente teria entrado em luta corporal com Eduardo e, ao tentar separá-los, Mariana fora ferida; e, de outro, aquela apresentada por Eduardo e por Mariana, as quais convergem no sentido de que MARCOS FRANCISCO deliberadamente agrediu sua ex-companheira, a qual foi encontrada pelos policiais militares, consoante relatado por esses, nua e ferida, com sangue no rosto em razão das lesões suportadas; sem que Eduardo tenha tido qualquer envolvimento com tais agressões. Nesse cenário, estou convencido de que há elementos suficientes nos autos a enredar o paciente, ao menos em um primeiro momento, no cenário delitivo sob investigação, ensejo em que sublinho que, diante da natureza processual da prisão preventiva, tanto sua decretação quanto sua manutenção exigem tão somente indícios suficientes de autoria, reservando-se a certeza desta à eventual condenação, de modo que a Lei se contenta com elementos probatórios ainda que não concludentes ou unívocos, mesmo porque não é o habeas corpus instrumento processual idôneo para aferir a qualidade da prova ou do indício, porquanto tal exercício exige dilação probatória, de todo incompatível com a via estreita ora eleita (ex vi do Enunciado Orientativo n. 42 da TCCR/TJMT). De outro lado, no que concerne ao periculum libertatis, verifico que, em suas razões de decidir, o d. juízo singular justificou encontrar-se evidenciada a imprescindibilidade da medida segregatícia com vistas a se garantir a ordem pública, bem como por conveniência da instrução criminal, garantia da aplicação da lei penal e, por fim, para resguardar a integridade física e psicológica da vítima. Por apego à clareza, colaciono excerto da decisão segregatícia, in verbis: “[...] 8. Diante dos novos elementos informativos trazidos aos autos pelo Nobre representante do Ministério Público, tenho que o acusado encontra-se na hipótese autorizadora da decretação da prisão preventiva prevista nos arts. 311, 312 e 313, inciso III do CPP, tendo em vista a natureza da infração, e as circunstâncias em que se deu, em tese, o descumprimento das medidas protetivas, bem como a prática de violência doméstica, revelando-se por ora, inadequados e insuficientes às medidas cautelares diversas da prisão. 9. Especificamente quanto às circunstâncias autorizadoras da prisão cautelar prevista no art. 312, do CPP, tenho que está presente, no caso, por conveniência da instrução criminal, bem como para assegurar a aplicação da lei penal e para garantia da ordem pública, haja vista que o acusado praticou supostamente o fato delituoso tipificado pelo artigo 24-A da Lei nº 11.340/2006 e artigos 147 e 129, §13 do Código Penal, tendo descumprindo as medidas protetivas anteriormente decretadas, voltando a perpetrar novas ameaças e violência contra a ofendida, como se observa dos documentos acostados aos autos, notadamente, no Boletim de Ocorrência nº 2025.65955 (Id. 185857802, págs. 02/04), Termo de Declaração da vítima (Id. 185857802, págs. 02/09) e Exame Pericial de Lesão Corporal (Id. 185857802, págs. 10/13). 10. Anote-se que, conforme consta dos autos, o agressor continua a importunar a ofendida, Sra. Mariana Tamara Ferreira dos Santos Bom, tendo invadido a sua residência no dia 03/03/2025, por volta das 01h00min, oportunidade na qual novamente agrediu a vítima, com murros no rosto e quebrando o seu dedo, bem como o seu celular, além de ter a ameaçado de morte por diversas vezes. Além disso, cumpre registrar que em casos de descumprimento de medidas protetivas anteriormente decretadas, o artigo 313, inciso III, do Código de Processo Penal, autoriza a decretação da prisão preventiva para garantir a execução das medidas protetivas de urgência decretadas em desfavor do autuado, assegurando a ordem pública e para evitar a prática de outras infrações penais, bem como resguardando a integridade física e psicológica da vítima. [... 17. Dessa forma, observa-se que no caso em tela, há a presença de dois requisitos para a decretação da prisão preventiva do representado, quais sejam, o fumus comissi delicti, que consiste nos fortes indícios de autoria e prova de materialidade, bem como o periculum libertatis, consistente na garantia da ordem pública, assim como para a conveniência da instrução criminal, garantia da aplicação da lei penal e para resguardar a integridade física e psicológica da vítima. 18. Diante da fundamentação exposta, defiro a representação formulada pela autoridade policial (Id. n° 115129500 - Pág. 1/4), posto que, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA do representado MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA, nos termos dos artigos 311, 312 e 313, III, da lei 12.403/2011 que deu nova redação ao Código de Processo Penal, para assegurar a aplicação da lei penal, a conveniência da instrução criminal, para a garantia da ordem pública, e para resguardar a integridade física e psicológica da vítima”. (Decisão de ID 274437390 – Págs. 28-30). — Destaquei. Com efeito, sabe-se ser pacífico o entendimento dos Tribunais Superiores no sentido de que a especial gravidade do crime e o risco concreto de reiteração delitiva são fundamentos que indicam a necessidade da prisão cautelar para a garantia da ordem pública (ex vi do AgRg no HC n. 765.832/SC, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 11/10/2022, DJe de 19/10/2022). Nesse ponto, a análise dos autos originários revela que se cuida, aparentemente, de paciente que, anteriormente à data dos fatos, já havia, em tese, ameaçado e agredido a vítima, tanto que, no fim do ano passado, Mariana requereu o deferimento de medidas protetivas de urgência; as quais, todavia, não impediram que MARCOS FRANCISCO novamente se aproximasse da ex-convivente, oportunidade em que, além de ameaçá-la, causou-lhe diversas lesões físicas, dentre elas a fratura de um dedo. Para ilustrar, registro que, nos autos do Pedido de Medidas Protetivas de Urgência n. 1002622-75.2024.8.11.0078, as providências foram deferidas com espeque no seguinte relato ofertado pela vítima, in verbis: “[...] QUE mora junto com MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA há cerca de 4 anos e possuem um relacionamento desde então; QUE possuem um filho junto de 3 anos; QUE, na data de hoje, por volta das 7h, quando a declarante voltou do serviço acordou MARCOS e disse que queria ele fora de casa; QUE quem sustenta a casa é a declarante; QUE então MARCOS começou a ameaçar dizendo que "iria a matar ela, o filho dela e depois iria se matar"; QUE lhe chamava também de "puta" e diversos outros nomes de baixo calão; QUE MARCOS disse iria a matar no meio da rua; QUE MARCOS disse ainda que se ele for preso vai mandar alguém a matar de dentro da cadeia; QUE, no meio discussão, a declarante ligou a para a polícia; QUE, ao finalizar a ligação, MARCOS começou a agredir a declarante fisicamente com murros na cabeça, no ouvido, na boca, bem como chutou sua barriga; QUE MARCOS mirava na sua cabeça quando a agredia; QUE correu para a rua e MARCOS correu atrás dela; QUE um vizinho próximo, a qual a declarante não conhece e não sabe informar quem é, presenciou o ocorrido e a ajudou trazendo a declarante até a delegacia; QUE narra ainda que há cerca de 15 dias atrás MARCOS deu um murro na boca da declarante e quebrou o celular dela; QUE MARCOS a agride desde o início do relacionamento mas que nunca teve coragem de denunciar anteriormente; QUE toda vez que tenta separar dele MARCOS disse que é do Comando Vermelho e que vive na base das ameaças [...]”. (ID 177613790 – autos n. 1002622-75.2024.8.11.0078). — Destaquei. Vê-se, portanto, que, anteriormente aos delitos sub judice, MARCOS FRANCISCO já vinha, em tese, agredindo e ameaçando Mariana, com lesões que deixaram vestígios posteriormente constatados pelo correspondente exame pericial (ID 177613842 – autos n. 1002622-75.2024.8.11.0078); sem que se olvide, ainda, o fato de que, na oportunidade, o paciente também desacreditou a capacidade do Poder Público de proteger a ofendida, ao lhe dizer que, se fosse recolhido ao cárcere, iria “[...] mandar alguém a matar de dentro da cadeia”. Em razão desses fatos, aplicadas medidas protetivas em desfavor do paciente no intento de inibir novas ações criminosas, tais providências acautelatórias aparentemente não impediram que MARCOS FRANCISCO mais uma vez investisse contra a integridade física e psicológica de Mariana. Desta feita, ainda que o d. impetrante alegue que, tendo Mariana e MARCOS FRANCISCO alegadamente retomado o relacionamento amoroso posteriormente ao deferimento das medidas protetivas inicialmente deferidas, relembro que, além de tal circunstância não elidir a gravidade dos delitos em comento, sem possuir tampouco o almejado condão de tornar atípica a conduta perpetrada, devem ser sempre sopesados os contornos específicos dos casos de violência doméstica, os quais atingem a esfera emocional e psicológica da ofendida, envolvendo relação íntima de afeto, e, como se sabe, tornam dificultosa a saída de eventuais ciclos de violência, de forma que compete ao Poder Judiciário a análise da imprescindibilidade do claustro cautelar sempre em vista da necessidade de se evitar a concretização de um mal maior. Nesse sentido, esta eg. Corte de Justiça tem decidido reiteradamente que “[...] a reconciliação entre as partes não afasta os riscos inerentes à violência doméstica, caracterizada por seu ciclo contínuo e potencial letalidade” (N.U 1032278-20.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 14/02/2025). — Destaquei. Não bastasse, deve-se observar que, decretada a prisão preventiva de MARCOS FRANCISCO em 04/03/2025, até a presente data não se noticiou o cumprimento do correspondente mandado de prisão, circunstância que atrai o entendimento consolidado no Enunciado Orientativo n. 26 da TCCR/TJMT, conforme o qual “a fuga do agente, assim entendida como evasão do cárcere ou ausência deliberada de seu domicílio, autoriza a decretação da prisão preventiva, para fins de assegurar a aplicação da lei penal”. Nesse cenário, estou convencido da gravidade concreta das condutas perpetradas, em tese, pelo paciente, bem como do risco de reiteração delitiva; revestindo-se o claustro cautelar de indispensabilidade à garantia da ordem pública, a qual inclui, evidentemente, a integridade física e psicológica da ofendida. Em sendo assim, como tais fatores expõem satisfatoriamente a presença do fumus comissi delicti e do periculum libertatis, avulta de todo inviável a revogação da custódia provisória, que, nos termos do art. 282, §6º, do CPP, pressupõe, essencialmente, a insuficiência das restrições menos drásticas, uma vez que, a toda evidência, seriam inócuas para garantir a proteção de toda a coletividade e a escorreita aplicação da lei penal. Sobre o tema, afinal, há muito a Corte Cidadã firmou o posicionamento de que se revela “indevida a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão quando a constrição se encontra justificada e mostra-se necessária, dada a potencialidade lesiva da infração indicando que providências mais brandas não seriam suficientes para garantir a ordem pública” (RHC n. 120.305/MG, Relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019). — Destaquei. Deste modo, tenho por legal e adequadamente imposta a prisão preventiva, porquanto devidamente especada sobre elementos concretos que levam à inarredável conclusão quanto ao risco de reiteração delitiva e à aparente periculosidade social do agente; tudo em observância aos preceitos legais e constitucionais pátrios, inclusive aquele insculpido no art. 93, IX, da Carta Fundamental, não havendo falar, portanto, em carência de fundamentação idônea para a custódia ou na falta dos seus pressupostos e requisitos legais. Com isso, na contramão do que sustenta a prefacial do writ, o simples fato de o segregado ostentar alguns predicativos pessoais favoráveis não é o bastante para lhe garantir a liberdade, visto que tais condições abonatórias não são suficientes para afastar o perigo que representa à sociedade; e, na linha intelectiva desta Corte de Justiça, “não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis” (Enunciado n. 43 da TCCR/TJMT). CONCLUSÃO: Diante do exposto, DENEGO A ORDEM de habeas corpus impetrada em favor de MARCOS FRANCISCO GOMES DA SILVA e, por conseguinte, mantenho seu encarceramento provisório decretado nos autos de origem. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/04/2025
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