Franciele Engelhardt Cardoso x Safra Credito, Financiamento E Investimento S.A.
ID: 300972681
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5007614-14.2024.8.24.0930
Data de Disponibilização:
17/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FABIO OLIVEIRA DUTRA
OAB/SP XXXXXX
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CESAR AUGUSTO VOLTOLINI
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5007614-14.2024.8.24.0930/SC
APELANTE
: FRANCIELE ENGELHARDT CARDOSO (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: Cesar Augusto Voltolini (OAB SC029646)
APELADO
: SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.…
Apelação Nº 5007614-14.2024.8.24.0930/SC
APELANTE
: FRANCIELE ENGELHARDT CARDOSO (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: Cesar Augusto Voltolini (OAB SC029646)
APELADO
: SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: FABIO OLIVEIRA DUTRA (OAB SP292207)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de Apelação Cível interposta por
FRANCIELE ENGELHARDT CARDOSO
, com o desiderato de reformar a sentença proferida pelo Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados nos autos da
Ação Ordinária de Revisão de Cláusulas Contratuais
(
evento 1, INIC1
).
Em atenção ao princípio da economia e, sobretudo, por refletir o contexto estabelecido durante o trâmite processual, reitero o relatório apresentado na decisão objeto do recurso,
in
verbis
(
evento 39, SENT1
):
Cuida-se de ação movida por
FRANCIELE ENGELHARDT CARDOSO
em face de
SAFRA CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.
.
Alegou que firmou contratos de empréstimo bancário com a instituição requerida e que, após assinatura, verificou a incidência de juros abusivos, motivo pelo qual pleiteia a sua revisão.
Requereu a revisão do CET e dos juros remuneratórios para a taxa média de mercado; afastando-se: capitalização de juros, comissão de permanência, multa moratória superior a 2%, tarifa de cadastro, tarifa de avaliação, registro de contrato e seguro.
O pedido de tutela de urgência foi indeferido.
Citada, a parte ré contestou, impugnando a justiça gratuita e sustentando, preliminarmente, inépcia da inicial. Quanto ao mérito, defendeu a legalidade do contrato firmado entre as partes.
Houve réplica.
É o relatório.
E da parte dispositiva:
[...]
ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:
- Afastar a cobrança de seguro;
- Determinar a repetição simples de eventual indébito, corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do pagamento, com juros simples de 1% ao mês a contar da citação, ambos até 30.8.2024. A partir dessa data, o índice de correção monetária e o percentual de juros devem observar o que determina a Lei 14.905/2024.
Os valores apurados deverão ser compensados/descontados de eventual saldo devedor em aberto e, caso quitado o contrato, restituídos em parcela única.
Diante da sucumbência mínima, condeno a parte autora ao pagamento integral das custas e dos honorários, estes fixados em 15% do valor atualizado da condenação (art. 86, par. ún., do CPC).
A condenação em custas e honorários da parte autora ficará suspensa por força da Justiça Gratuita.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.
Inconformada com a decisão proferida, a autora interpôs apelação (
evento 44, APELAÇÃO1
), alegando, em síntese: (i) a abusividade dos juros remuneratórios, defendendo sua limitação à taxa média de mercado vigente à época da contratação; (ii) a ilegalidade da capitalização de juros, sob o argumento de que a prática do anatocismo é vedada pelo ordenamento jurídico, com base na Súmula 121 do STF e no art. 4º da Lei de Usura, afastando-se, ainda, a aplicação da MP n. 2.170-36/2001 por sua inconstitucionalidade; (iii) a nulidade de cláusula contratual que prevê multa moratória superior a 2%, com base no art. 52, §1º, do Código de Defesa do Consumidor; (iv) a ilicitude da cumulação da comissão de permanência com outros encargos moratórios e remuneratórios; (v) a vedação da incidência de multa moratória sobre juros moratórios, evitando-se dupla penalização; e, por fim, (vi) a condenação da instituição financeira à repetição do indébito, nos termos do art. 42 do CDC, com devolução em dobro dos valores pagos indevidamente. Requer, assim, o provimento do recurso para a reforma da sentença e acolhimento dos pedidos revisionais.
A parte ré, por sua vez, apresentou contrarrazões, pugnando pela manutenção integral da sentença e pelo desprovimento do recurso interposto pela demandante (
evento 49, CONTRAZAP1
).
Os autos foram encaminhados à instância superior para apreciação
É o relatório.
1. Admissibilidade
Desde logo, verifico que a apelação é tempestiva, o preparo é dispensado, considerando a concessão do benefício da justiça gratuita (
evento 9, DESPADEC1
) e a parte está regularmente representada.
Todavia, o recurso admite apenas parcial conhecimento, conforme se delineará na fundamentação subsequente.
2. Julgamento Monocrático.
Inicialmente, impõe-se destacar a viabilidade do julgamento monocrático no presente caso, sobretudo em observância ao princípio da celeridade processual e da eficiência na prestação jurisdicional.
Nesse sentido, prevê o art. 932, do Código de Processo Civil:
Art. 932.
Incumbe ao relator:
[...]
III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida;
IV - negar provimento a recurso que for contrário a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; [...]
VIII - exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal
. (Grifos nossos)
No mesmo rumo, é a orientação deste Egrégio Tribunal de Justiça, que estabelece no art. 132 do seu Regimento Interno a seguinte normativa:
Art. 132. São atribuições do relator, além de outras previstas na legislação processual: [...]
XIII – negar seguimento a recurso nos casos previstos em lei;
XIV – não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida;
XV – negar provimento a recurso nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou
jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça
;
XVI – depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento a recurso nos casos previstos no inciso V do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando a decisão recorrida for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça; (grifos nossos)
Nesse mesmo sentido a Súmula 568 do Superior Tribunal de Justiça prevê que "
o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema
".
Embora a referida Súmula seja aplicada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, é plenamente possível utilizá-la como parâmetro para casos em que a jurisprudência local seja dominante.
É que o entendimento expresso na súmula reflete a lógica de aplicação de precedentes consolidados (art. 926 do Código de Processo Civil), o que pode ser adaptado para contextos regionais/locais, desde que haja um posicionamento uniforme sobre a matéria no âmbito do Tribunal Estadual.
Dito isso, mostra-se viável o julgamento monocrático do recurso interposto, nos termos do art. 932 do Diploma Processual Civil e do art. 132 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, uma vez que a matéria em debate encontra-se dominante na jurisprudência desta Corte, especialmente no âmbito desta Câmara julgadora.
Superadas as questões prévias, e inexistindo preliminares ou prejudiciais a serem analisadas, passo, então, ao exame do mérito.
3. Mérito
3.1 Da legalidade dos juros contratados
Requer a parte autora, em linhas gerais, a reforma da sentença. Para tanto, aduz que os juros remuneratórios foram fixados em percentual superior a taxa média de mercado, divulgada pelo BACEN, devendo, portanto, ser reconhecida a abusividade.
Contudo, antecipo, razão não assiste a recorrente.
À frente, repisa-se que, hodiernamente, a circunstância de os juros remuneratórios serem superiores a 12% (doze por cento) ao ano é incapaz de, por si só, caracterizar a abusividade da cláusula contratual respectiva.
Sobre o tema, vale destacar:
A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de Lei Complementar (STF, Súmula Vinculante 7).
A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade (STJ, Súmula 382).
Este Egrégio Tribunal de Justiça, então, buscando se amoldar às normativas supracitadas, editou os seguintes enunciados, homologados pelo Grupo de Câmaras de Direito Comercial,
in verbis
:
Nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12 % (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil (Enunciado I).
Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade (Enunciado IV).
Outrossim, não é demais memorar que a Segunda Seção da Corte da Cidadania, por ocasião do julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, definiu que:
As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF
(Tema Repetitivo 24);
A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade
(Tema Repetitivo 25);
São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02
(Tema Repetitivo 26);
É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1 º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto
(Tema Repetitivo 27);
Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas
(Tema Repetitivo 36).
Após uma intensa onda de debates, prevaleceu o entendimento de que
(a)
a taxa
média
de mercado, apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito,
é referencial útil para o controle da abusividade
, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa
média
de mercado não significa, por si só, abuso
;
(b)
a
média
de mercado não pode ser considerada o limite
, justamente porque é
média
; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco
;
(c)
o caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto
, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos
.
(STJ, REsp n. 1.821.182/RS, rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 23/06/2022).
Ato contínuo, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, dado o julgamento do REsp n. 2.009.614/SC, de relatoria da Mina. Nancy Andrighi, chancelou as seguintes premissas:
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. REVISÃO. CARÁTER ABUSIVO. REQUISITOS. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA.
1- Recurso especial interposto em 19/4/2022 e concluso ao gabinete em 4/7/2022.
2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" não descritas na decisão, acompanhada ou não do simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média praticada no mercado, é suficiente para a revisão das taxas de juros remuneratórios pactuadas em contratos de mútuo bancário; e b) qual o incide a ser aplicado, na espécie, aos juros de mora.
3- A Segunda Seção, no julgamento REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, fixou o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
4-
Deve-se observar
os seguintes requisitos para a revisão das taxas de juros remuneratórios: a)
a caracterização de relação de consumo
; b)
a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada
; e c)
a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada
, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.
5-
São insuficientes
para fundamentar o caráter abusivo dos juros remuneratórios: a)
a menção genérica
às "circunstâncias da causa" - ou outra expressão equivalente; b)
o simples cotejo
entre a taxa de juros prevista no contrato e a
média
de mercado divulgada pelo BACEN e c)
a aplicação de algum limite adotado
, aprioristicamente, pelo próprio Tribunal estadual.
6- Na espécie, não se extrai do acórdão impugnado qualquer consideração acerca das peculiaridades da hipótese concreta, limitando-se a cotejar as taxas de juros pactuadas com as correspondentes taxas médias de mercado divulgadas pelo BACEN e a aplicar parâmetro abstrato para aferição do caráter abusivo dos juros, impondo-se, desse modo, o retorno dos autos às instâncias ordinárias para que aplique o direito à espécie a partir dos parâmetros delineados pela jurisprudência desta Corte Superior.
7- Recurso especial parcialmente provido.
(STJ, REsp n. 2.009.614/SC, rela. Mina. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 27/09/2022)
Dito de outro modo, perquirir-se-á, em suma, as variáveis do caso concreto que,
a priori
, teriam o condão de caracterizar eventual abusividade inerente aos juros remuneratórios, as quais deverão ser interpretadas à luz da taxa média divulgada pelo BACEN, sendo esta, consoante se afirmou,
mera referência útil para o controle da abusividade
,
de toda sorte, tratando-se de contrato bancário cuja taxa fora pactuada em percentual inferior àquele apurado para o período em questão, não se haverá falar, por óbvio, em ilegalidade da cláusula contratual respectiva.
Registre-se, por oportuno, que, em recentíssimo julgado, publicado em 20/02/2025, o Superior Tribunal de Justiça ratificou a tese de que
a taxa
média
de mercado é um referencial útil para o controle da abusividade dos juros, e a revisão das taxas é admitida em situações excepcionais, desde que demonstrada a abusividade e as peculiaridades do caso concreto
(STJ, AgInt no AREsp n. 2.746.125/RS, rel. Min. Carlos Cini Marchionatti - Desembargador Convocado, Terceira Turma, j. 17/02/2025).
Aliás, não destoa a jurisprudência desta Corte Catarinense:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ.
MÉRITO.
JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AO ÍNDICE DIVULGADO PELA TAXA
MÉDIA
DE MERCADO ANUNCIADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL. INOCORRÊNCIA.
TAXA
MÉDIA
COMO REFERENCIAL ÚTIL E NÃO UM LIMITADOR TAXATIVO
.
IMPOSSIBILIDADE DE ESTABELECER UM TETO PARA TAXA DE JUROS
. AVALIAÇÃO SINGULAR AO CASO CONCRETO, OBSERVADO TODOS OS REQUISITOS DO RESP N. 2.009.614/SC. [...] RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5109260-04.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born,
Primeira Câmara de Direito Comercial
, j. 20-02-2025)
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL - PREVISÃO NO ART. 1.021 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - AÇÃO REVISIONAL - DECISÃO UNIPESSOAL DE PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO - INCONFORMISMO DA PARTE AUTORA.
JUROS REMUNERATÓRIOS - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL N.
32-860875
/21 FIRMADO EM OUTUBRO DE 2021 - ENCARGO AVENÇADO NO PATAMAR MENSAL DE 2,79% - TAXA MÉDIA DE MERCADO NO PERCENTUAL DE 1,86% - NOVO ENTENDIMENTO DESTA CORTE DE JUSTIÇA QUE SE ALINHA AO POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA -
TAXA
MÉDIA
DE MERCADO QUE SE APRESENTA COMO MERO REFERENCIAL PARA AFERIÇÃO DE PRETENSAS ABUSIVIDADES
- CRITÉRIO NÃO ESTANQUE - NECESSIDADE DE ANÁLISE DAS PARTICULARIDADES DA CONTRATAÇÃO - INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADES NO CASO CONCRETO - DESPROVIMENTO DO PEDIDO PRINCIPAL QUE IMPLICA NA PREJUDICIALIDADE DA INSURGÊNCIA RELACIONADA À DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA - "DECISUM" CONSERVADO - INSURGÊNCIA DESPROVIDA.
(TJSC, Apelação n. 5040394-07.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Robson Luz Varella,
Segunda Câmara de Direito Comercial
, j. 18-02-2025)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. PEDIDO DE LIMITAÇÃO À TAXA DE 12% (DOZE POR CENTO) AO ANO. NÃO ACOLHIMENTO. MATÉRIA PACIFICADA NO TOCANTE.
UTILIZAÇÃO DA TAXA
MÉDIA
DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN COMO REFERENCIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA ABUSIVIDADE
. SÚMULA 296 E RESP REPETITIVO Nº 1.061.530/RS, AMBOS DO STJ. ENUNCIADOS I E IV DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL DESTE E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO DESPROVIDO NO PONTO. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5009198-50.2023.8.24.0058, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Dinart Francisco Machado,
Terceira Câmara de Direito Comercial
, j. 30-01-2025)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PEDIDO DEFERIDO NA ORIGEM. ANÁLISE PREJUDICADA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL.
JUROS REMUNERATÓRIOS. PLEITO DE LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DO BACEN. NÃO ACOLHIMENTO.
JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS QUE PODEM EXCEDER O ÍNDICE MÉDIO DO BACEN SEM QUE CARACTERIZEM ABUSIVIDADE OU SUBMISSÃO DO CONSUMIDOR A DESVANTAGEM EXAGERADA. TAXA QUE CONSISTE EM UM REFERENCIAL A SER CONSIDERADO, E NÃO EM UM LIMITE QUE DEVA SER NECESSARIAMENTE OBSERVADO PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS
. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. COBRANÇA ABUSIVA NÃO COMPROVADA. SENTENÇA MANTIDA. DEMAIS TESES PREJUDICADAS. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5014488-49.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rela. Janice Goulart Garcia Ubialli,
Quarta Câmara de Direito Comercial
, j. 31-10-2023)
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. IRRESIGNAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. SUSCITADA INEXISTÊNCIA DE PRESSUPOSTOS PARA REVISÃO CONTRATUAL. TESE RECHAÇADA. MITIGAÇÃO DO PACTA SUNT SERVANDA. JUROS REMUNERATÓRIOS.
TAXA
MÉDIA
DIVULGADA PELO BACEN QUE INDICA, TÃO SOMENTE, UM PARÂMETRO DE AFERIÇÃO CONSIDERANDO AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO
. MATÉRIA CONSOLIDADA POR ESTE ÓRGÃO FRACIONÁRIO E EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. HIPÓTESES DO ART. 932, IV E V, DO CPC E ART. 132, XV E XVI, DO RITJSC. POSSIBILIDADE DE INTERPOSIÇÃO DO PRESENTE REGIMENTAL, ADEMAIS, QUE AFASTA QUALQUER ALEGAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE OU NULIDADE DO JULGAMENTO. PRECEDENTES STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5066555-25.2022.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rocha Cardoso,
Quinta Câmara de Direito Comercial
, j. 27-06-2024)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU.
JUROS REMUNERATÓRIOS. PEDIDO DE MANUTENÇÃO DA TAXA CONTRATADA. REJEIÇÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA.
OBSERVÂNCIA DAS TAXAS MÉDIAS DIVULGADAS PELO BACEN APENAS A TÍTULO REFERENCIAL
. JUROS PACTUADOS, AINDA ASSIM, EXORBITANTES. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA PLAUSÍVEL PELO CREDOR. ÔNUS QUE LHE INCUMBIA. ART. 373, INC. II, DO CPC. ILEGALIDADE ASSENTADA. LIMITAÇÃO DEVIDA. DECISÃO PRESERVADA NO PONTO. [...] RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5073743-98.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rubens Schulz,
Sexta Câmara de Direito Comercial
, j. 30-01-2025)
Como se vê,
a taxa média de mercado serve de referência e não necessariamente como algo a ser seguido de forma taxativa
, de modo que pode não haver abusividade no caso de a taxa de juros contratada ser superior à média de mercado, se as peculiaridades do caso concreto evidenciarem tal necessidade.
Infere-se dos autos, que no dia 20.10.2022 a parte autora firmou
"Cédula de Crédito Bancário (CCB) - Financiamento com Garantia de Veículos"
, e que os juros remuneratórios restaram fixados em 2,01% a.m. e 26,95% a.a." (
evento 16, CONTR2
):
Em contrapartida, a taxa média de mercado apurada para a modalidade de crédito contratada, encontrava-se, à época da contratação (20.10.2021), na ordem de
2,03
% a.m
.
e
27,20% a.a
; veja-se (
SGS - Sistema Gerenciador de Séries Temporais
):
Como se observa dos elementos constantes nos autos, os valores efetivamente contratados pela apelante encontram-se em patamar inferior às taxas médias de mercado vigentes à época da celebração do contrato, conforme divulgado oficialmente pelo Banco Central do Brasil. Tal circunstância afasta, de modo categórico, qualquer alegação de abusividade na estipulação dos encargos financeiros ou de violação aos princípios que regem as relações de consumo.
Assim, ausente prova inequívoca de que os encargos financeiros contratados superaram a média de mercado ou violaram limites legais ou regulamentares, não há respaldo jurídico para acolher a pretensão revisional deduzida pela parte apelante.
3.2 Da capitalização de juros
A apelante sustenta a existência de ilegalidade no contrato firmado com a instituição financeira, ao argumento de que a capitalização mensal de juros configuraria prática abusiva e, portanto, vedada.
Todavia, a insurgência não merece prosperar.
O Superior Tribunal de Justiça firmou a tese (Tema 953) de que é permitida a capitalização de juros, desde que esteja expressa no contrato, sob pena de nulidade da cláusula contratual:
A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação.
Ademais, a mesma Corte Superior, por meio da Súmula 541, sedimentou o entendimento de que:
"a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada"
.
No caso concreto, o magistrado sentenciante analisou detidamente a avença e reconheceu a legalidade da capitalização mensal, conforme expressamente consignado na sentença (
evento 39, SENT1
):
A capitalização mensal de juros foi expressamente admitida pela Medida Provisória 2.170-36, em seu art. 5º, alterando a sistemática então instituída pelo Decreto 22.626/33.
Posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a legalidade da capitalização mensal em recurso especial representativo de controvérsia, conquanto contratada, sendo assim entendido quando constar na avença a taxa de juros anual superior ao duodécuplo da taxa mensal:
CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO.
1. A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros.
2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933.
3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada".
4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios.
5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas (STJ, REsp 973827, Rel. Min. Felipe Salomão, j. 8.8.2012).
Sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça editou Súmula:
A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada (Súmula 541).
No caso em apreço, a taxa anual ultrapassa doze vezes a taxa mensal (
evento 16, DOC2
), o que evidencia que foi expressamente pactuada e que deve ser mantida.
Constata-se, pois, que a taxa de juros anual prevista supera o duodécuplo da mensal, o que, conforme orientação sedimentada no STJ, autoriza a capitalização na periodicidade mensal. Não há, portanto, qualquer ilegalidade a ser reconhecida nesse ponto.
Em conclusão, ausentes elementos que infirmem a regularidade da capitalização mensal expressamente convencionada, a sentença não merece reparos neste aspecto, devendo ser integralmente mantida.
3.3 Dos encargos moratórios e comissão de permanência
A parte apelante sustenta a ilegalidade da cobrança da comissão de permanência no contrato
sub judice,
bem como da estipulação de multa contratual, em patamar superior a 2%.
Em que pese a sentença de primeiro grau ter estabelecido que,
"a comissão de permanência não foi cobrada, razão pela qual não há interesse de agir em se adentrar nesse encargo",
vislumbra-se que o contrato
sub judice
estipula a cobrança de valores em decorrência do atraso no pagamento os quais englobam os juros remuneratórios e os encargos moratórios (juros moratórios e multa), o que pressupõe a contratação implícita da referida comissão de permanência.
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. [...] 2 - ENCARGOS MORATÓRIOS. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA IMPLICITAMENTE PACTUADA, MEDIANTE A PREVISÃO DA INCIDÊNCIA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PACTUADOS, DOS JUROS MORATÓRIOS E DA MULTA A 2% (DOIS POR CENTO). NA HIPÓTESE, A INCIDÊNCIA DA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA DEVE SER ADMITIDA, JÁ QUE AVENÇADA DE FORMA IMPLÍCITA. CONTUDO, DEVE SER OBSERVADA A LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...]
RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5098728-68.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 07-11-2024).
No entanto, consoante orientação jurisprudencial pacífica, não há abusividade na cobrança da referida rubrica, desde que não cumulada com juros remuneratórios, juros moratórios e multa.
Neste sentido, dispõe a Súmula 472 da Corte Superior:
A cobrança de comissão de permanência - cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato - exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual.
No âmbito deste Tribunal, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial, por meio do Enunciado III, também reconheceu a admissibilidade da comissão de permanência nos contratos bancários, desde que observadas condições específicas, a saber:
A comissão de permanência é admitida nos contratos bancários, exceto nas cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, desde que contratada e limitada à soma dos encargos remuneratórios e moratórios: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de normalidade da operação; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e c) multa contratual limitada a 2% sobre o valor da prestação.
Em relação a estipulação da multa pelo inadimplemento, o instrumento contratual prevê a aplicação de multa de 2%, em estrita observância ao previsto no § 1º, do art. 52 do Código de Defesa do Consumidor e às orientações precedentes não havendo qualquer ilegalidade nesse sentido.
Contudo, vislumbra-se que a estipulação da referida multa, consoante se lê da cláusula n. 4 do contrato, incide cumulativamente sobre o débito, incluindo-se os juros moratórios, o que demonstra-se abusivo.
Nesse contexto, conquanto seja admissível a cobrança conjunta dos encargos moratórios, é vedada a sua cumulação sobre a mesma base de cálculo, de modo a evitar o indesejável
bis in idem
, que resulta em penalização excessiva ao consumidor inadimplente.
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. [...] ARGUIÇÃO DE CUMULAÇÃO ILEGAL DE MULTA MORATÓRIA E JUROS MORATÓRIOS. PROVIMENTO. BANCO QUE, EM SEDE DE CONTESTAÇÃO, ALEGOU INEXISTIR ILEGALIDADE NA COBRANÇA CUMULADA DOS ENCARGOS DE MORA. IMPOSITIVA A REFORMA DO DECISÓRIO NO PONTO. PRECEDENTE DESTA CÂMARA NO MESMO SENTIDO. [...] a cobrança cumulada de multa contratual e juros moratórios gera dupla penalização ao devedor inadimplente, de forma que é permitido tão somente a incidência conjunta dos encargos. Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência deste Colegiado:[...]Veda-se, sob pena de dupla penalização do devedor inadimplente, a exigência cumulativa da multa contratual com os juros de mora. Dessarte, possível a cobrança conjunta dos encargos moratórios, desde que não haja cumulação, isto é, a cobrança de uma das rubricas não incidida sobre a outra. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 0001703-26.2012.8.24.0058, de São Bento do Sul, rel. Des. Robson Luz Varella, j. 30-05-2017) (Apelação Cível n. 0000324-59.2013.8.24.0076, de Turvo, rel. Des. Newton Varella Júnior, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 12-5-2020). (TJSC, Apelação n. 0305341-07.2019.8.24.0039, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rejane Andersen, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 15-06-2021).
Assim, a estipulação contratual que determina a incidência da multa moratória sobre o total do débito, já acrescido de juros de mora, revela-se manifestamente abusiva, devendo ser afastada para que se obste a cumulação indevida das penalidades contratuais.
Por derradeiro, consigna-se que não houve qualquer insurgência recursal quanto à taxa de juros moratórios fixada, tampouco sobre eventual capitalização de tais encargos, razão pela qual se impõe o reconhecimento da preclusão consumativa quanto a estas matérias, em atenção ao enunciado da Súmula 381 do Superior Tribunal de Justiça,
in verbis
:
“Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.”
Assim, impõe-se, no ponto, o parcial acolhimento do recurso para o fim de reconhecer a abusividade da cláusula que prevê a cumulação da multa moratória sobre o montante do débito acrescido de juros de mora, devendo ser afastada a incidência cumulativa, preservando-se, contudo, a validade da estipulação da multa em 2%, isoladamente considerada.
3.34 Restituição do indébito na forma dobrada
Verificada a cobrança indevida de valores pela instituição bancária, impõe-se a aplicação do disposto no art. 876 do Código Civil, que estabelece:
"Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição."
O parágrafo único do art. 42 do Código de Processo Civil, em complemento, vem orientar que
"O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável"
.
Sob essa ótica, a Segunda Câmara de Direito Comercial adota o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (EAResp n. 600.663/RS) no sentido de que a repetição do indébito em dobro, atualmente, embora não exija a comprovação de má-fé, se estiver presente engano justificável, há de se prevalecer a restituição simples.
Além disso, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina tem se posicionado no sentido de que
"Demonstrada a captação de valores de forma indevida, porém sem má-fé, a repetição de indébito procede-se na forma simples e não em dobro [...]"
(TJSC, AC 2006.032378-6, 16.4.2010).
Na presente lide, a cobrança se deu em razão de erro justificável, especialmente considerando a interpretação das cláusulas contratuais, inicialmente entendidas como legítimas, e dentro da esfera privada de pactuação entre as partes.
A propósito:
APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE VEDOU A COBRANÇA DO SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA E DETERMINOU A REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES.RECURSO DA PARTE AUTORA.[...]POSTULADO RESSARCIMENTO EM DOBRO. DESNECESSIDADE DA PROVA DO ERRO NA HIPÓTESE DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DECORRENTE DE CONTRATO BANCÁRIO (SÚMULA 322 DO STJ).
DEVOLUÇÃO, CONTUDO, NA FORMA SIMPLES QUE MELHOR SE COADUNA À HIPÓTESE, COMO FORMA DE SE OBSTAR O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
. [...]RECURSO CONHECIDO, EM PARTE, E, NESTA PORÇÃO, PROVIDO PARCIALMENTE.(Apelação n. 5003108-60.2019.8.24.0092, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Tulio Pinheiro, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 14-10-2021, grifei).APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.[...]REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA.
A legislação consumerista assegura ao consumidor cobrado em quantia indevida o direito à repetição do indébito, em dobro, ressalvados os casos em que haja erro justificável, este interpretado pela ausência de má-fé, dolo ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do prestador de serviços, a teor do disposto no artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor.
HONORÁRIOS RECURSAIS. FIXAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 85, §§ 2º E 11, DO CPC.RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.(Apelação n. 0301595-82.2018.8.24.0002, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sebastião César Evangelista, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 24-06-2021, grifos nossos).
Dessarte, constatada a existência de crédito em favor do consumidor, na fase de liquidação de sentença, deve-se viabilizar a restituição dos valores eventualmente pagos a maior, de forma simples, conforme determinado na sentença.
4. Ônus de Sucumbência
Com a reforma ínfima da sentença, desnecessária a readequação dos ônus de sucumbência.
5. Honorários Recursais
Para fins de arbitramento dos honorários advocatícios recursais previstos no § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, faz-se necessário o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos:
a)
decisão recorrida publicada a partir de 18/03/2016, quando entrou em vigor o Código de Processo Civil;
b)
recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e
c)
condenação em honorários advocatícios desde a origem (STJ, AgInt nos EREsp 1.539.725/DF, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, j. 09-08-2017).
Na hipótese, o recurso foi parcialmente provido, pelo que não incidem honorários.
6. Dispositivo
Ante o exposto, com fulcro no art. 932, inciso VIII, do Código de Processo Civil, c/c o art. 132, inciso XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, conheço do recurso interposto e dou-lhe parcial provimento, nos termos da fundamentação.
Intimem-se.
Transitada em julgado, devolvam-se os autos à origem.
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