Processo nº 1035771-05.2024.8.11.0000
ID: 275100795
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1035771-05.2024.8.11.0000
Data de Disponibilização:
21/05/2025
Polo Passivo:
Advogados:
ADIRSON DE OLIVEIRA BEBER JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 1035771-05.2024.8.11.0000 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) ASSUNTO: [ICMS/ IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇ…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 1035771-05.2024.8.11.0000 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) ASSUNTO: [ICMS/ IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS, SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA] RELATOR: EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO TURMA JULGADORA: [EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO, EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP] PARTE(S): [ADIRSON DE OLIVEIRA BEBER JUNIOR - CPF: 091.764.638-00 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - SECRETARIA DE FAZENDA DO ESTADO DE MATO GROSSO (AGRAVADO), DISTRIBUIDORA DE COMBUSTIVEIS SAARA S.A. EM RECUPERACAO JUDICIAL - CNPJ: 97.471.676/0001-03 (AGRAVANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (AGRAVADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, PROVEU O RECURSO NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ICMS MONOFÁSICO SOBRE COMBUSTÍVEIS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO DESTINATÁRIO. CONVÊNIO CONFAZ. AUSÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu tutela de urgência em ação declaratória visando afastar a responsabilidade solidária pelo ICMS em operações interestaduais com combustíveis, estabelecida pela Cláusula Vigésima Sétima do Convênio ICMS 199/2022 e incorporada ao RICMS/MT. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste em verificar a legalidade da imposição de responsabilidade solidária ao destinatário de combustíveis pelo recolhimento do ICMS monofásico devido pelo remetente, quando instituída por decreto estadual com base em convênio CONFAZ. III. Razões de decidir A definição dos sujeitos passivos da obrigação tributária e a atribuição de responsabilidade pelo crédito tributário são matérias reservadas à lei formal, em observância ao princípio da legalidade tributária (CF, art. 150, I). Os convênios firmados no âmbito do CONFAZ possuem natureza predominantemente autorizativa, não se prestando a estabelecer obrigações tributárias ou definir responsabilidades sem a necessária edição de lei específica. A responsabilidade solidária prevista no art. 124, I, do CTN pressupõe interesse comum na situação configuradora do fato gerador, circunstância que não se evidencia entre remetente e destinatário em operações de compra e venda. Presentes os requisitos da tutela de urgência, ante a probabilidade do direito e o risco ao resultado útil do processo. IV. Dispositivo e tese Recurso provido. Tese de julgamento: "Presentes os requisitos autorizadores da tutela de urgência, consubstanciados na probabilidade do direito e no perigo de dano, impõe-se a sua concessão para afastar, em sede de cognição sumária, a responsabilidade tributária impugnada". ___________ Dispositivos relevantes citados: CF, art. 150, I, art. 155, § 2º, XII, "a" e "b"; CTN, art. 124, I; Lei Complementar nº 192/2022, arts. 4º e 6º; Convênio ICMS 199/2022, cláusula vigésima sétima; RICMS/MT, art. 586-Z-2. Jurisprudência relevante citada: STF, ADI 5929, Rel. Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 14.02.2020; TJMT, N.U 1014695-22.2024.8.11.0000, Rel. Desa. Maria Aparecida Ribeiro, j. 11.12.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR): Egrégia Câmara, Trata-se de agravo de instrumento interposto por DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS SAARA S.A. EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL contra decisão proferida pelo Juízo da 5ª Vara Especializada de Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá (MT) que, nos autos da ação declaratória n. 1050336-45.2024.8.11.0041 ajuizada contra o ESTADO DE MATO GROSSO, indeferiu a tutela de urgência, consubstanciada na determinação de impossibilidade de lavratura e seguimento de autuações, que versem sobre a cobrança do ICMS, nos termos do artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, bem como da Cláusula Vigésima Sétima do Convênio 199/2022. A parte agravante narra que “a Agravante realiza operações comerciais com diversas outras empresas e por força da cláusula vigésima sétima do Convênio 199/2022, incorporada ao RICMS do Estado do Espírito Santo por meio do Decreto nº 5.380-R, de 27 de abril de 2023 teve contra si estabelecida a responsabilidade de realizar o pagamento integral do ICMS monofásico”. Afirma que “referida imputação de responsabilidade foi bem reproduzida no art. 4º da LC 192/2022 que de forma cristalina aponta quais são os contribuintes do ICMS, deixando claro que o Distribuidor de Combustíveis não é um deles”. Defende que inexiste lei “que possibilite as exigências de responsabilidade tributária amparadas apenas por decreto, já que o conteúdo aprovado no Convênio não foi incorporado ao ordenamento jurídico mediante lei”. Assevera haver iminente risco de autuação e que a cobrança indevida de valores coloca em risco a continuidade de suas atividades comerciais, dada a possibilidade de autuações fiscais e restrições administrativas, que poderiam resultar em prejuízos financeiros graves e irreparáveis. Com base nesses fundamentos, pugna pelo provimento do recurso para reformar “a decisão agravada para conceder a tutela de urgência impedindo-se a lavratura e seguimento de autuações, bem como outros atos que versem sobre a cobrança do ICMS até o julgamento definitivo da lide”. A antecipação da tutela recursal foi deferida no Id. 258946658. Contrarrazões no Id. 269564796, pelo não provimento do recurso. O órgão ministerial manifestou pela desnecessidade de sua intervenção no feito (Id. 269564796). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR): Egrégia Câmara, Conforme relatado, cuida-se de agravo de instrumento interposto por Distribuidora de Combustíveis Saara S.A. – em Recuperação Judicial contra decisão proferida pelo Juízo da 5ª Vara Especializada de Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá (MT) que, nos autos da ação declaratória n. 1050336-45.2024.8.11.0041 ajuizada contra o ESTADO DE MATO GROSSO, indeferiu a tutela de urgência, consubstanciada na determinação de impossibilidade de lavratura e seguimento de autuações, que versem sobre a cobrança do ICMS, nos termos do artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, bem como da Cláusula Vigésima Sétima do Convênio 199/2022. Como cediço, para o deferimento da tutela de urgência pleiteada, faz-se necessária a presença dos pressupostos autorizadores da medida de urgência, quais sejam, a probabilidade do direito e o fundado receio de dano grave ou de difícil reparação, nos termos do artigo 300, caput, do Código de Processo Civil. Vejamos: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.” [sem destaque no original]. Da análise dos autos de origem, verifica-se que a parte ora agravante, Distribuidora de Combustíveis Saara S.A. em recuperação judicial, ajuizou a ação declaratória n. 1050336-45.2024.8.11.0041 em face do Estado de Mato Grosso, visando prevenir e questionar eventual cobrança de recolhimento do ICMS monofásico incidente sobre as operações com combustíveis, com base na cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 199/2022, incorporado ao RICMS/MT pelo Decreto Estadual n. 1.608/2022. O d. Juízo de origem indeferiu o pedido liminar, sob o argumento de que “não restou demonstrado a ilegalidade e prova da exação do Ente Público da forma como indicada pela requerente, bem como verifica-se que o amparo do pleito provisório se dá em referência ao argumento de inconstitucionalidade Artigo 586-Z-2 do RICMS/MT”, somado ao fato que “já se passaram alguns anos desde a prática do ato tido por ilegal até a propositura da presente demanda, assim, entendo que não resta demonstrada a existência de risco ou perecimento de direito que justifique a concessão do provimento antecipatório ora pleiteado.”(Id. 175652753 dos autos de origem). Pois bem. A questão discutida refere-se à aplicação da cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 199/2022, incorporada ao RICMS/MT pelo Decreto n.º 1.608/2022, que impõe responsabilidade solidária pelo recolhimento do ICMS em operações interestaduais. Para a adequada solução da questão, impõe-se a análise sistemática do arcabouço normativo que disciplina a matéria, iniciando-se pelo exame dos preceitos constitucionais aplicáveis. O artigo 155, § 2º, inciso XII, alíneas "a" e "b", da Constituição Federal estabelece reserva de lei complementar para a definição dos contribuintes do ICMS e para a disciplina do regime de substituição tributária, in verbis: "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...] § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: [...] XII - cabe à lei complementar: a) definir seus contribuintes; b) dispor sobre substituição tributária;" Com efeito, a definição dos sujeitos passivos da obrigação tributária e a atribuição da condição de responsável pelo crédito tributário constituem matérias reservadas à lei, em sentido formal, em homenagem ao princípio da legalidade tributária consagrado no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, que veda expressamente aos entes federativos "exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça". Nesse contexto, apesar de a Lei Complementar n. 192/2022 estabelecer a tributação monofásica do ICMS sobre os combustíveis, percebe-se que nos arts. 4º e 6º foram delimitados os sujeitos passivos da obrigação tributária e as hipóteses de atribuição de responsabilidade, para assegurar a uniformidade e a segurança jurídica no regime tributário, in verbis: “Art. 4º São contribuintes do ICMS incidente nos termos desta Lei Complementar o produtor e aqueles que lhe sejam equiparados e o importador dos combustíveis. Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo alcança inclusive as pessoas que produzem combustíveis de forma residual, os formuladores de combustíveis por meio de mistura mecânica, as centrais petroquímicas e as bases das refinarias de petróleo. Art. 6º Os Estados e o Distrito Federal disciplinarão o disposto nesta Lei Complementar mediante deliberação nos termos da alínea g do inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal. § 1º Serão admitidas: I - equiparações a produtores dos combustíveis referidos no art. 2º para fins de incidência do ICMS nos termos desta Lei Complementar; e II - atribuição, a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título, da responsabilidade pela retenção e pelo recolhimento do ICMS incidente nos termos desta Lei Complementar.” [sem destaque no original]. Ocorre que, não obstante a previsão de atribuição de responsabilidade pela retenção e recolhimento do tributo, tal disciplina deve ser veiculada por instrumento normativo adequado, observando-se a hierarquia normativa e o princípio da legalidade tributária. De outro lado, ainda que seja autorizada a legislação estadual, ela deve respeitar os limites traçados pela legislação complementar federal. No caso em apreço, o Estado de Mato Grosso, por meio do Decreto n. 1.608/2022, inseriu no Regulamento do ICMS o artigo 586-Z-2, prevendo a responsabilidade solidária do destinatário dos combustíveis pelo recolhimento do imposto não pago pelo remetente, nos seguintes termos: “Art.586-Z-2 O estabelecimento que realizar operação interestadual subsequente à tributação monofásica com combustíveis derivados de petróleo, com GLGN, com B100 ou com EAC será responsável solidário, nos termos da legislação deste Estado, pelo recolhimento do imposto devido, inclusive seus acréscimos legais, se este, por qualquer motivo, não tiver sido objeto de cobrança ou recolhimento, ou se a operação não tiver sido informada ao responsável pelo repasse, na forma e nos prazos definidos nos Capítulos III a V.(cf. cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 199/2022;cf. cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 15/2023)” [sem destaque no original]. Com efeito, o Estado de Mato Grosso, ao replicar a cláusula estabelecida pelo referido Convênio ICMS em seu regulamento estadual, impôs aos destinatários de combustíveis a responsabilidade solidária pelo recolhimento do ICMS nas operações interestaduais, caso o remetente não comprove o pagamento integral do tributo ou não informe a operação de forma regular. Essa medida estabelece, na prática, uma ampliação do rol de sujeitos passivos da obrigação tributária, transferindo ao destinatário das mercadorias a obrigação de verificar o cumprimento das obrigações fiscais por parte do remetente, sob pena de responder solidariamente pelo débito tributário. Diante disso, constata-se que, em juízo de cognição sumária próprio desta fase processual, a imposição de responsabilidade solidária ao destinatário das mercadorias pelo pagamento do ICMS monofásico devido pelo remetente, instituída mediante decreto estadual, apresenta indícios de incompatibilidade com o princípio da legalidade tributária, sendo possível vislumbrar, neste momento preambular, a probabilidade do direito invocado pela parte agravante. Merece registro que os convênios firmados no âmbito do CONFAZ, a despeito de sua relevância para a harmonização da política fiscal interestadual, possuem natureza predominantemente autorizativa, não se prestando, prima facie, a estabelecer obrigações tributárias ou a definir responsabilidades sem a necessária edição de lei específica. Nesse sentido, é o entendimento do Supremo Tribunal Federal: “CONCESSÃO INCENTIVO FISCAL DE ICMS. NATUREZA AUTORIZATIVA DO CONVÊNIO CONFAZ. 1. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESPECÍFICA EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA. 2. TRANSPARÊNCIA FISCAL E FISCALIZAÇÃO FINANCEIRA-ORÇAMENTÁRIA. 1. O poder de isentar submete-se às idênticas balizar do poder de tributar com destaque para o princípio da legalidade tributária que a partir da EC n.03/1993 adquiriu destaque ao prever lei específica para veiculação de quaisquer desonerações tributárias (art.150 §6º, in fine). 2. Os convênios CONFAZ têm natureza meramente autorizativa ao que imprescindível a submissão do ato normativo que veicule quaisquer benefícios e incentivos fiscais à apreciação da Casa Legislativa. 3. A exigência de submissão do convênio à Câmara Legislativa do Distrito Federal evidencia observância não apenas ao princípio da legalidade tributária, quando é exigida lei específica, mas também à transparência fiscal que, por sua vez, é pressuposto para o exercício de controle fiscal-orçamentário dos incentivos fiscais de ICMS. 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente.” (STF, ADI 5929, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 14-02-2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-047DIVULG 05-03-2020PUBLIC 06-03-2020)" [sem destaque no original]. Ademais, com relação à responsabilidade solidária prevista no artigo 124, inciso I, do Código Tributário Nacional, verifica-se que esta pressupõe a existência de interesse comum na situação configuradora do fato gerador, circunstância que, em análise preliminar, não se mostra evidente entre o remetente e o destinatário de mercadorias em operações de compra e venda, dada a aparente contraposição de interesses econômicos das partes envolvidas. Nesse sentido, é o entendimento deste e. Tribunal de Justiça em caso semelhante: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DECLARATÓRIA – TUTELA DE URGÊNCIA – SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO – ICMS – ATRIBUIÇÃO DE RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA SOLIDÁRIA DO REVENDEDOR DE FORMA INDISCRIMINADA – ILEGALIDADE EVIDENCIADA – ART. 300 DO CPC – REQUISITOS LEGAIS PRESENTES – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A responsabilidade tributária solidária prevista no artigo 124 do CTN não pode ser aplicada de forma indiscriminada, visando exclusivamente o interesse econômico do Estado. 2. Em casos análogos, este Tribunal de Justiça já se pronunciou no sentido de que a responsabilização do revendedor (distribuidora) quando o recolhimento do imposto deveria ser feito pelo vendedor (refinaria – devedor principal). [...]” (TJMT, N.U 1014695-22.2024.8.11.0000, Rel. Desa. Maria Aparecida Ribeiro, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 11/12/2024, Publicado no DJE 17/12/2024) [sem destaque no original]. No que se refere ao perigo da demora, a manutenção dessa exigência pode gerar insegurança jurídica para a parte agravante, porquanto a transferência de uma obrigação tributária que não lhe é inerente, pode comprometer a obtenção de certidões fiscais indispensáveis à regularidade de suas operações comerciais, além de dificultar a continuidade de suas atividades empresariais, em razão dos riscos de autuações fiscais ou restrições administrativas decorrentes dessa imposição. A partir dessas premissas, restam evidenciados os requisitos autorizadores para a concessão da tutela recursal pleiteada, demonstrando-se tanto a probabilidade do direito invocado quanto o perigo de dano, de modo que o provimento do recurso é medida que se impõe. Diante do exposto e em consonância com a fundamentação supra, DOU PROVIMENTO ao recurso de agravo de instrumento para determinar que o Estado de Mato Grosso se abstenha de imputar à parte agravante a responsabilidade solidária pelo ICMS monofásico incidente nas operações com combustíveis, com fundamento no art. 586-Z-2 do RICMS/MT e no Convênio ICMS 199/2022. É como voto. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP (2ª VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. V O T O EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (2º VOGAL): Acompanho o voto do Relator. SESSÃO DE 30 DE ABRIL DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO): V O T O (VISTA) EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP (2ª VOGAL): Egrégia Câmara, Conforme relatado, trata-se de Agravo de Instrumento interposto por DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS SAARA S.A. EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, em face do ESTADO DE MATO GROSSO, nos autos da Ação Declaratória nº 1050336-45.2024.8.11.0041, em trâmite perante a 5ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Cuiabá, que teve o pedido de tutela de urgência indeferido pelo juízo de origem. Na origem, a agravante pleiteou o reconhecimento da inconstitucionalidade e ilegalidade do artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, sob a alegação de que este dispositivo violaria o princípio da legalidade tributária e da tipicidade cerrada, uma vez que a Lei Complementar nº 192/2022 teria limitado a sujeição passiva do ICMS monofásico exclusivamente a refinarias e importadores, afastando a responsabilidade de distribuidores de combustíveis. A decisão agravada indeferiu o pedido de tutela de urgência, sob o fundamento de que não restaram demonstrados os requisitos autorizadores previstos no artigo 300 do CPC/2015, notadamente a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. O magistrado considerou também que o pleito estava baseado em matéria de inconstitucionalidade e que sua apreciação exigiria contraditório e dilação probatória, sendo imprudente o deferimento da medida em sede de cognição sumária. Nas razões recursais, a agravante reiterou os fundamentos da inicial, asseverando a ausência de previsão legal específica que a responsabilize pelo recolhimento do ICMS monofásico e invocando precedente do Superior Tribunal de Justiça (AREsp 1.516.171/SP) para sustentar a impossibilidade de atribuição de responsabilidade tributária mediante convênio ou decreto. Defendeu a presença dos requisitos para a concessão da tutela de urgência e apontou risco de autuações fiscais e danos irreparáveis à continuidade de suas atividades. O douto Relator entendeu presentes os requisitos autorizadores da tutela antecipada recursal para que o Estado de Mato Grosso se abstenha de imputar à empresa agravante a responsabilidade solidária pelo ICMS monofásico incidente nas operações com combustíveis, com fundamento no art. 586-Z-2 do RICMS/MT e no Convênio ICMS 199/2022. (id 258946658) O agravado, Estado de Mato Grosso, apresentou contrarrazões pugnando pela manutenção da decisão. Aduziu que impossibilidade de concessão de tutela de urgência liminar em face da Fazenda Pública, invoca a aplicação das Leis 9.494/97 e Lei 8.437/92, diante do caráter satisfativo da medida. Realçou o caráter de salvo conduto da medida, ante a ausência de demonstração fática, imunidade fiscal na aferição e atribuição de responsabilidade sobre o recolhimento do crédito tributário nos moldes do art. 586-Z-2 do RICMS/MT, de forma genérica, sublinhando que não há prova documental concreta que “permita aferir que esteja havendo ou que houve exação indevida”. (sic id 269564796) Após a Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso, realça que a responsabilidade solidária do distribuidor encontra respaldo na Lei Estadual nº 12.044/2023, que aprovou expressamente o Convênio ICMS 199/2022, e que a atribuição de responsabilidade tributária prevista no artigo 586-Z-2 do RICMS/MT é legítima e constitucional. Defendeu, ainda, que a concessão de tutela provisória satisfativa em face da Fazenda Pública é vedada nos termos da legislação aplicável e da jurisprudência consolidada. (id 274278881) A Douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra do Procurador Dr. Ezequiel Borges de Campos, pontuou a ausência de interesse público que justifique a intervenção do Ministério Público. O douto Relator Des. Rodrigo Roberto Curvo encaminhou voto pelo provimento do recurso, acompanhado pela 2ª vogal, Desa. Helena Maria Bezerra Ramos. Pedi vista dos autos para melhor análise da matéria. De início, apenas a título de conhecimento aos eminentes julgadores, registro que está sob minha relatoria o Agravo de Instrumento nº 1008585-70.2025.811.0000, interposto pelo Estado de Mato Grosso, em face da Distribuidora de Combustíveis Saara S.A. em Recuperação Judicial, do mesmo grupo da ora Agravante. Naqueles autos, agrava-se de decisão que concedeu liminar em ação mandamental para suspender os efeitos da Notificação nº 21688/1944/68/2025 – que impôs regime administrativo cautelar, e restabelecer, de imediato, a emissão e recepção de documentos fiscais da Inscrição Estadual da empresa agravada. Ao analisar o pleito liminar, concedi o efeito suspensivo ao recurso, oportunidade na qual realcei que a conduta reiterada da Agravada em contrariar decisão judicial e a norma tributária vigente revela grave indício de irregularidade fiscal, além do perigo de dano irreversível. Outro fato que me chamou a atenção também é a existência de decisão da Presidência desta Corte, nos autos da Suspensão de Liminar e de Sentença nº 1037830-63.2024.811.0000, concessiva da contracautela para afastar a liminar deferida nos autos de nº 1058894-06.2024.811.0041, restabelecendo o regime tributário previsto na Lei Complementar 192/2022, que instituiu a modalidade de tributação ad rem, isto é, “um valor fixo por unidade de medida do produto, em substituição à sistemática tradicional de cálculo percentual sobre o valor da operação”. (sic Autos RAI 1008585-70.2025.811.0000 – id 275794887) Voltando os olhos a este recurso, a análise do caso, à luz dos fundamentos apresentados, revela que a decisão agravada encontra-se devidamente motivada e em consonância com os princípios da legalidade processual e da segurança jurídica. A concessão de tutela de urgência exige a presença simultânea de dois requisitos essenciais: a existência de indícios suficientes do direito invocado e o risco concreto de ocorrência de dano grave ou de difícil reparação. Tais exigências encontram respaldo no artigo 300, caput, do Código de Processo Civil, que assim dispõe: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.” Com efeito, a pretensão da agravante de suspender toda e qualquer autuação fiscal baseada no artigo 586-Z-2 do RICMS/MT reveste-se de nítido conteúdo satisfativo. A concessão da medida importaria, na prática, em antecipação de tutela definitiva, vedada nos termos do art. 1º, § 3º, da Lei nº 8.437/1992, quando esgotado o objeto da ação. Ademais, não se verificam elementos suficientes que comprovem a probabilidade do direito alegado, especialmente considerando que a norma estadual questionada decorre da incorporação do Convênio ICMS 199/2022 ao ordenamento jurídico estadual por meio da Lei nº 12.044/2023, conferindo-lhe status legal. Vejamos: “Art. 2º. Ficam aprovados os Convênios ICMS adiante arrolados, celebrados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ, em reuniões ordinárias e extraordinárias realizadas no período compreendido entre 1º de janeiro de 2021 e 31 de dezembro de 2022, tendo em vista o disposto na Lei Complementar Federal nº 24, de 7 de janeiro de 1975, que afetam o ordenamento jurídico do Estado de Mato Grosso: (...) LXXVI - Convênio ICMS 199/2022, de 22 de dezembro de 2022, publicado no Diário Oficial da União de 23 de dezembro de 2022 e ratificado pelo Ato Declaratório nº 40/2022, de 23 de dezembro de 2022, publicado no Diário Oficial da União de 26 de dezembro de 2022: "dispõe sobre o regime de tributação monofásica do ICMS a ser aplicado nas operações com combustíveis nos termos da Lei Complementar nº 192, de 11 de março de 2022, e estabelece procedimentos para o controle, apuração, repasse e dedução do imposto".” Destaco, ainda, quanto à legalidade e constitucionalidade da imposição à apelante, tem-se que o art. 155, § 2º, XII, alínea h, inserido pela EC nº 33/2001, por sua vez, prevê a necessidade de lei complementar para definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais incidirá o ICMS-monofásico, e em disposição avulsa na referida emenda, assim declara: Art. 4º Enquanto não entrar em vigor a lei complementar de que trata o art. 155, § 2º, XII, h, da Constituição Federal, os Estados e o Distrito Federal, mediante convênio celebrado nos termos do § 2º, XII, g, do mesmo artigo, fixarão normas para regular provisoriamente a matéria. A Lei Complementar nº 192/2022, ao disciplinar o regime monofásico do ICMS sobre combustíveis, previu expressamente a possibilidade de os Estados atribuírem a responsabilidade pelo recolhimento do tributo a terceiros, nos seguintes termos: “Art. 6º Os Estados e o Distrito Federal disciplinarão o disposto nesta Lei Complementar mediante deliberação nos termos da alínea g do inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal. § 1º Serão admitidas: I - equiparações a produtores dos combustíveis referidos no art. 2º para fins de incidência do ICMS nos termos desta Lei Complementar; e II - atribuição, a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título, da responsabilidade pela retenção e pelo recolhimento do ICMS incidente nos termos desta Lei Complementar.” A par desse quadro, os entes federativos interessados firmaram o Convênio Confaz nº 199/2022, que, em sintonia com os precitados comandos constitucional e infraconstitucional, trata da disciplina do regime de tributação monofásica do ICMS a ser aplicado nas operações com combustíveis nos termos da Lei Complementar nº 192/2022, dentre os quais destaca-se o previsto em sua cláusula vigésima sétima, assim redigida: “Cláusula vigésima sétima O estabelecimento que realizar operação interestadual subsequente à tributação monofásica com combustíveis derivados de petróleo, com GLGN e com B100 será responsável solidário, nos termos da legislação estadual, pelo recolhimento do imposto devido, inclusive seus acréscimos legais, se este, por qualquer motivo, não tiver sido objeto de cobrança ou recolhimento, ou se a operação não tiver sido informada ao responsável pelo repasse, nas formas e prazos definidos nos Capítulos III a V.” Responsabilidade essa reproduzida no art. 586-Z-2 do RICMS/MT: “Art. 586-Z-2 O estabelecimento que realizar operação interestadual subsequente à tributação monofásica com combustíveis derivados de petróleo, com GLGN, com B100 ou com EAC será responsável solidário, nos termos da legislação deste Estado, pelo recolhimento do imposto devido, inclusive seus acréscimos legais, se este, por qualquer motivo, não tiver sido objeto de cobrança ou recolhimento, ou se a operação não tiver sido informada ao responsável pelo repasse, na forma e nos prazos definidos nos Capítulos III a V. (cf. cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 199/2022; cf. cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 15/2023)” [sem destaque no original]. Com efeito, o regime monofásico visa a simplificação da arrecadação e também a redução da sonegação fiscal. Nessa linha de intelecção, tenho que eventual ação fiscal promovida pelo Fisco Estadual, com o objetivo de exigir o recolhimento do ICMS monofásico previsto no artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, encontra respaldo legal na legislação vigente, notadamente na conjugação da Lei Complementar nº 192/2022, do Convênio ICMS 199/2022 e da Lei Estadual nº 12.044/2023. Nesse sentido, julgado em caso semelhante: “APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS-ST. IMPORTAÇÃO DE COMBUSTÍVEIS . CONVÊNIO CONFAZ Nº 110/2007. Pretensão de reconhecimento de nulidade da cobrança de ICMS-ST sobre importação de combustíveis, sob o fundamento de que o recolhimento do tributo seria de responsabilidade da empresa importadora da mercadoria (substituta tributária), não havendo possibilidade de responsabilização solidária da impetrante, mera substituída. Inadmissibilidade. Convênio Confaz nº 110/2007 que, em sintonia com os comandos constitucionais e infraconstitucionais regentes da matéria, tratou da disciplina do regime de substituição tributária nas operações com combustíveis e lubrificantes, estabelecendo, no § 5º da cláusula trigésima quarta, a responsabilidade solidária da impetrante, na situação fática em debate . Art. 9º, inciso XI, da Lei Estadual nº 6.374/89, literalmente reproduzido no art. 11, inciso XI, do RICMS, que dá guarida à responsabilização solidária prevista na aludida cláusula . Lei Complementar nº 192/2022, que não fez cessar os efeitos do referido Convênio. Instrumento convenial que não só "fixou normas para regular provisoriamente a matéria" relativa à definição dos combustíveis e lubrificantes sujeitos ao ICMS-monofásico (art. 4º da EC 33/01), como também disciplinou, nos moldes do comando previsto nos artigos 9º da LC nº 89/96 e 155, § 2º, XII, alínea b da Constituição Federal, o regime de substituição tributária desses mesmos produtos. (...) Publicação superveniente do Convênio Confaz nº 199/2022, alterado pelo Convênio nº 12/2023, que praticamente reproduziu o quanto previsto no Convênio anterior, conferindo continuidade normativa à disciplina da responsabilização por substituição tributária nas operações em tela. Tese fixada na ADI 4845/MT que não se aplica ao presente caso, já porque a tributação, no caso, não diverge da matriz geral prevista no CTN, já porque não há similitude entre a hipótese tratada nos autos e aquela figurada na lei mato-grossense cuja compatibilidade com o Texto Maior fora afastada pela Corte Constitucional. Sentença mantida . Recurso desprovido.” (TJ-SP - Apelação Cível: 10492648420238260576 São José do Rio Preto, Relator.: Bandeira Lins, Data de Julgamento: 27/11/2024, 8ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 02/12/2024) Assim, a atuação da autoridade tributária não configura prática abusiva ou desprovida de suporte normativo, circunstância que enfraquece, ainda mais, a alegada probabilidade do direito necessário à concessão da tutela de urgência. Ademais, como bem anotado pelo julgador singular, “não restou demonstrado a ilegalidade e prova da exação do Ente Público da forma como indicada pela requerente, bem como verifica-se que o amparo do pleito provisório se dá em referência ao argumento de inconstitucionalidade Artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, razão pela qual não se mostra prudente o deferimento do pleito sem o exercício do contraditório, até porque se esgotaria o mérito da demanda.” (id 258598687 – p. 88) No tocante ao perigo de dano, também não restou evidenciado risco iminente de autuação ou perecimento de direito da agravante, que justifique a antecipação dos efeitos da tutela, sobretudo em face da ausência de documentação que comprove a iminência de medidas fiscais contra si, o que enfraquece o alegado periculum in mora. Por fim, é relevante observar que a concessão da medida pleiteada sem o contraditório comprometeria a necessária instrução do feito, sendo prudente aguardar o regular trâmite da demanda principal para a análise exauriente da matéria. Diante de tais fundamentos, peço vênia ao Relator, para NEGAR PROVIMENTO ao recurso, mantendo a decisão agravada que indeferiu o pedido de tutela provisória, pelos seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto. EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR): Peço para revistar os autos pois a Eminente Desembargadora Maria Erotides Kneip trouxe uma série de informações referente ao ICMS Monofásico, a questão da solidariedade, do convênio 199/2022. De forma que antes de eventual pedido de vista da Desa. Helena Maria Bezerra Ramos gostaria de fazer uma revisão do voto para levar em consideração todos os dados trazidos no voto da Desembargadora Maria Erotides Kneip e me comprometo em trazer em sessão oportuna. SESSÃO DE 07 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO): V O T O (ADENDO) EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR): Egrégia Câmara, Conforme relatado, cuida-se de agravo de instrumento interposto por Distribuidora de Combustíveis Saara S.A. – em Recuperação Judicial contra decisão proferida pelo Juízo da 5ª Vara Especializada de Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá (MT) que, nos autos da ação declaratória n. 1050336-45.2024.8.11.0041 ajuizada contra o ESTADO DE MATO GROSSO, indeferiu a tutela de urgência, consubstanciada na determinação de impossibilidade de lavratura e seguimento de autuações, que versem sobre a cobrança do ICMS, nos termos do artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, bem como da Cláusula Vigésima Sétima do Convênio 199/2022. Em sessão presencial anterior, após pedido de vista, a i. 1ª Vogal Desa. Maria Erotides Kneip abriu divergência, sob os seguintes fundamentos: i) “a existência de decisão da Presidência desta Corte, nos autos da Suspensão de Liminar e de Sentença nº 1037830-63.2024.811.0000, concessiva da contracautela para afastar a liminar deferida nos autos de nº 1058894-06.2024.811.0041, restabelecendo o regime tributário previsto na Lei Complementar 192/2022, que instituiu a modalidade de tributação ad rem, isto é, “um valor fixo por unidade de medida do produto, em substituição à sistemática tradicional de cálculo percentual sobre o valor da operação”; ii) “não se verificam elementos suficientes que comprovem a probabilidade do direito alegado, especialmente considerando que a norma estadual questionada decorre da incorporação do Convênio ICMS 199/2022 ao ordenamento jurídico estadual por meio da Lei nº 12.044/2023, conferindo-lhe status legal” iii) “A Lei Complementar nº 192/2022, ao disciplinar o regime monofásico do ICMS sobre combustíveis, previu expressamente a possibilidade de os Estados atribuírem a responsabilidade pelo recolhimento do tributo a terceiros”. Em decorrência da divergência e da citação de fatos novos quanto à existência de suspensão de liminar por este e. Tribunal e de legislação que incorporou o Convênio ICMS 199/2022, pedi vista para melhor análise destas questões. Pois bem. De imediato, importa salientar que a suspensão de liminar mencionada (nº 1037830-63.2024.811.0000) não guarda correlação direta com o caso em análise, porquanto trata de controvérsia distinta, relacionada à forma de incidência do imposto e a imposição de limitação da alíquota do ICMS sobre combustíveis em 17%, enquanto a presente demanda versa sobre a responsabilidade solidária pelo recolhimento do ICMS monofásico. Um ponto relevante citado pelo voto-vista da i. 1ª Vogal, Desa. Maria Erotides Kneip e não abordado pelo Estado de Mato Grosso, é o fato de que houve a elaboração da Lei Estadual n. 12.044/2023, que convalidou o Convênio ICMS 199/2022 e lhe conferiu status legal. Ocorre que a mera aprovação legislativa de convênio não tem o condão de conferir adequação constitucional às suas disposições quando estas excedem os limites da competência normativa autorizadora. Conforme mencionado nas razões de meu voto, o art. 155, § 2º, XII, alíneas "a" e "b", da Constituição Federal estabelece reserva de lei complementar para a definição dos contribuintes do ICMS e para a disciplina do regime de substituição tributária. Ainda que a Lei Complementar nº 192/2022 preveja a possibilidade de atribuição de responsabilidade a terceiros em seu art. 6º, § 1º, II, tal disposição deve ser interpretada sistematicamente com os demais preceitos jurídicos aplicáveis, notadamente o art. 124, I, do Código Tributário Nacional. Em nenhum momento a legislação federal estabeleceu, a meu ver, as distribuidoras (adquirentes) como contribuintes do ICMS monofásico, tendo o art. 4º da Lei Complementar nº 192/2022 delimitado expressamente esse rol aos produtores, seus equiparados e importadores de combustíveis, inclusive detalhando no parágrafo único que o conceito abrange "as pessoas que produzem combustíveis de forma residual, os formuladores de combustíveis por meio de mistura mecânica, as centrais petroquímicas e as bases das refinarias de petróleo”. Como já exposto anteriormente, a autorização para atribuição de responsabilidade pela retenção e recolhimento do imposto, prevista no art. 6º, § 1º, II, da mesma lei, não permite a criação de novas hipóteses de sujeição passiva originária – como a responsabilidade solidária do adquirente –, mas tão somente a equiparação nos limites da própria lei complementar. Sob essa ótica, o posicionamento consolidado do c. STJ é no sentido de que “o ‘interesse comum’ de que trata o art. 124, I, do CTN refere-se às pessoas que se encontram no mesmo polo do contribuinte em relação à situação jurídica ensejadora da exação, no caso, a venda da mercadoria, sendo certo que esse interesse não se confunde com a vontade oposta manifestada pelo adquirente, que não é a de vender, mas sim de comprar a coisa”. (ex vi STJ, AgInt no AREsp n. 1.312.954/GO, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 10/5/2021, DJe de 24/5/2021). Neste juízo de cognição sumária, conforme legislação tributária vigente atualmente, penso que a imposição de responsabilidade solidária ao destinatário das mercadorias pelo pagamento do ICMS monofásico devido pelo remetente apresenta indícios de extrapolação dos limites normativos estabelecidos para a sujeição passiva tributária. Diante do exposto e em consonância com a fundamentação supra, pedindo vênia ao entendimento divergente da 1ª Vogal Desa. Maria Erotides Kneip, MANTENHO meu voto pelo provimento do agravo de instrumento, para determinar que o Estado de Mato Grosso se abstenha de imputar à parte agravante a responsabilidade solidária pelo ICMS monofásico incidente nas operações com combustíveis, com fundamento no art. 586-Z-2 do RICMS/MT e no Convênio ICMS 199/2022. É como voto. V O T O (RETIFICADO): EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (2º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. SESSÃO DE 17 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO): V O T O (VISTA) EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (2ª VOGAL): Egrégia Câmara: Com o intuito de evitar tautologia, reproduzo o relatório do eminente Relator, Des. RODRIGO ROBERTO CURVO: Trata-se de agravo de instrumento interposto por DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS SAARA S.A. EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL contra decisão proferida pelo Juízo da 5ª Vara Especializada de Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá (MT) que, nos autos da ação declaratória n. 1050336-45.2024.8.11.0041 ajuizada contra o ESTADO DE MATO GROSSO, indeferiu a tutela de urgência, consubstanciada na determinação de impossibilidade de lavratura e seguimento de autuações, que versem sobre a cobrança do ICMS, nos termos do artigo 586-Z-2 do RICMS/MT, bem como da Cláusula Vigésima Sétima do Convênio 199/2022. A parte agravante narra que “a Agravante realiza operações comerciais com diversas outras empresas e por força da cláusula vigésima sétima do Convênio 199/2022, incorporada ao RICMS do Estado do Espírito Santo por meio do Decreto nº 5.380-R, de 27 de abril de 2023 teve contra si estabelecida a responsabilidade de realizar o pagamento integral do ICMS monofásico”. Afirma que “referida imputação de responsabilidade foi bem reproduzida no art. 4º da LC 192/2022 que de forma cristalina aponta quais são os contribuintes do ICMS, deixando claro que o Distribuidor de Combustíveis não é um deles”. Defende que inexiste lei “que possibilite as exigências de responsabilidade tributária amparadas apenas por decreto, já que o conteúdo aprovado no Convênio não foi incorporado ao ordenamento jurídico mediante lei”. Assevera haver iminente risco de autuação e que a cobrança indevida de valores coloca em risco a continuidade de suas atividades comerciais, dada a possibilidade de autuações fiscais e restrições administrativas, que poderiam resultar em prejuízos financeiros graves e irreparáveis. Com base nesses fundamentos, pugna pelo provimento do recurso para reformar “a decisão agravada para conceder a tutela de urgência impedindo-se a lavratura e seguimento de autuações, bem como outros atos que versem sobre a cobrança do ICMS até o julgamento definitivo da lide”. A antecipação da tutela recursal foi deferida no Id. 258946658. Contrarrazões no Id. 269564796, pelo não provimento do recurso. O órgão ministerial manifestou pela desnecessidade de sua intervenção no feito (Id. 269564796). É o relatório. O douto Relator deu provimento ao agravo para determinar que o Estado de Mato Grosso se abstenha de imputar à parte agravante a responsabilidade solidária pelo ICMS monofásico incidente nas operações com combustíveis, com fundamento no art. 586-Z-2 do RICMS/MT e no Convênio ICMS 199/2022. Em seu voto, consignou que (...) em juízo de cognição sumária próprio desta fase processual, a imposição de responsabilidade solidária ao destinatário das mercadorias pelo pagamento do ICMS monofásico devido pelo remetente, instituída mediante decreto estadual, apresenta indícios de incompatibilidade com o princípio da legalidade tributária, sendo possível vislumbrar, neste momento preambular, a probabilidade do direito invocado pela parte agravante. (...) No que se refere ao perigo da demora, a manutenção dessa exigência pode gerar insegurança jurídica para a parte agravante, porquanto a transferência de uma obrigação tributária que não lhe é inerente, pode comprometer a obtenção de certidões fiscais indispensáveis à regularidade de suas operações comerciais, além de dificultar a continuidade de suas atividades empresariais, em razão dos riscos de autuações fiscais ou restrições administrativas decorrentes dessa imposição. Após ouvir com atenção o respeitado voto, solicitei vista dos autos. Extrai-se dos autos que a Recorrente ajuizou a ação declaratória n. 1050336-45.2024.8.11.0041 em face do Estado de Mato Grosso, visando prevenir e questionar eventual cobrança de recolhimento do ICMS monofásico incidente sobre as operações com combustíveis, com base na cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 199/2022, incorporado ao RICMS/MT pelo Decreto Estadual n. 1.608/2022. O d. Juízo de origem indeferiu o pedido liminar, sob o argumento de que não restou demonstrado a ilegalidade e prova da exação do Ente Público da forma como indicada pela requerente, bem como verifica-se que o amparo do pleito provisório se dá em referência ao argumento de inconstitucionalidade Artigo 586-Z-2 do RICMS/MT”, somado ao fato que “já se passaram alguns anos desde a prática do ato tido por ilegal até a propositura da presente demanda, assim, entendo que não resta demonstrada a existência de risco ou perecimento de direito que justifique a concessão do provimento antecipatório ora pleiteado (id. 175652753 dos autos de origem). Contra a decisão, interpôs o presente recurso. Pois bem. No caso dos autos, vislumbra-se a existência de previsão na legislação estadual relativa à atribuição de responsabilização solidária da distribuidora nas operações interestaduais, caso o remetente não comprove o pagamento integral do tributo ou não informe a operação de forma regular. Veja-se a disposição do art. 586-Z-2 do Regulamento do ICMS do Estado de Mato Grosso: Art. 586-Z-2 O estabelecimento que realizar operação interestadual subsequente à tributação monofásica com combustíveis derivados de petróleo, com GLGN, com B100 ou com EAC será responsável solidário, nos termos da legislação deste Estado, pelo recolhimento do imposto devido, inclusive seus acréscimos legais, se este, por qualquer motivo, não tiver sido objeto de cobrança ou recolhimento, ou se a operação não tiver sido informada ao responsável pelo repasse, na forma e nos prazos definidos nos Capítulos III a V. (cf. cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 199/2022; cf. cláusula vigésima sétima do Convênio ICMS 15/2023). [Destaquei] Ocorre que, em casos análogos aos dos autos, esta e. Corte tem entendido que a responsabilidade tributária solidária prevista no artigo 124 do CTN não pode se dar de forma indiscriminada, visando exclusivamente o interesse econômico do Estado. Por conseguinte, tem afastado a responsabilização do revendedor (distribuidora) quando o recolhimento do imposto deveria ser feito pelo vendedor (refinaria). Nesse sentido: RECURSO DE APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA – DESCUMPRIMENTO DE DEVERES INSTRUMENTAIS DO CONTRIBUINTE PRINCIPAL – RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA SOLIDÁRIA DO REVENDEDOR – INEXISTÊNCIA – [...] 2. Aplicação analógica da inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI n° 4845-MT da norma impositiva da responsabilidade solidária embasada no artigo 485, §§ 4º e 5º do RICMS/MT, aprovado pelo Decreto n° 2.212/2014 com as alterações introduzidas pelo Decreto n° 1.595/2018. 3. Sentença ratificada. Recurso não provido”. (N.U 1023113-93.2019.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, AGAMENON ALCANTARA MORENO JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 10/05/2022, Publicado no DJE 25/05/2022) APELAÇÃO — MANDADO DE SEGURANÇA — AUTUAÇÃO DO CONTRIBUINTE POR DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INSTRUMENTAIS — RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO ADQUIRENTE DE MERCADORIAS – INEXISTÊNCIA. A responsabilidade solidária prevista no artigo 124, I, do Código Tributário Nacional pressupõe que os responsáveis se encontrem no mesmo polo do contribuinte, o que não se aplica ao adquirente e vendedor, visto que eles não têm interesse comum na operação de compra e venda de mercadorias. Recurso provido. (N.U 1032669-85.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ CARLOS DA COSTA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 08/03/2022, publicado no DJE 18/03/2022) Ainda, esta Relatora proferiu a decisão monocrática em recurso de apelação nº 1023970-23.2023.8.11.0002, oportunidade em que consignei: (...) A imposição de responsabilidade subsidiária à distribuidora por decreto estadual extrapola os limites legais, uma vez que o CTN não prevê hipótese que permita ao legislador infralegal instituir, por sua própria iniciativa, responsabilidade tributária subsidiária em regimes de substituição tributária. Tal prática afronta o comando do art. 128 do CTN, que exige lei formal para atribuir responsabilidade tributária a terceiro. Dessa forma, vislumbra-se que a responsabilidade tributária solidária instituída mediante decreto de forma indiscriminada encontra óbice nos princípios basilares do direito, consoante as jurisprudências acima mencionadas. Com efeito, a aludida atribuição de responsabilidade, não pode se dar de forma indiscriminada; há necessidade de se comprovar que a pessoa responsabilizada tenha vínculo com ato e com a pessoa do contribuinte ou do responsável por substituição, cabendo a demonstração de interesse comum. Por fim, imperioso consignar que a concessão da pretensão e afastamento do dispositivo legal em sede de agravo de instrumento ocorre por força dos entendimentos jurisprudenciais deste Sodalício, demonstrando a probabilidade do direito da Recorrente, conforme pontuado pelo douto Relator. Ante o exposto, ACOMPANHO o ilustre Relator. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 14/05/2025
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