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Marlene Santiago Magalhaes x Banco Bradesco S.A.

ID: 339526722

Tribunal: TJMT Órgão: 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1033009-76.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

MARLENE SANTIAGO MAGALHAES

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S.A.

Sentença

Advogados:

VALERIA APARECIDA SOLDA DE LIMA

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WILSON SALES BELCHIOR

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA PROCESSO: 1033009-76.2025.8.11.0001. REQUERENTE: MARLENE SANTIAGO MAGALHAES. REQUERIDO: BANCO BRADESCO S.A. Vistos,… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA PROCESSO: 1033009-76.2025.8.11.0001. REQUERENTE: MARLENE SANTIAGO MAGALHAES. REQUERIDO: BANCO BRADESCO S.A. Vistos, etc. Trata-se de Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais e Materiais, na qual a parte reclamante afirma que, apesar de não ter contratado nenhum cartão de crédito consignado com a parte reclamada, constatou a ocorrência de descontos mensais em seu benefício previdenciário, sob a rubrica "Reserva de Margem Consignável - RMC", no valor de R$ 161,30 (cento e sessenta e um reais e trinta centavos), iniciados em 04/2022 e encerrados em 02/2025. Ao final, pugnou pela condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e a declaratória de inexistência de débito do questionado. Devidamente citada, a reclamada apresentou contestação, sobrevindo a respectiva impugnação. A tentativa de conciliação restou infrutífera. É o sucinto relatório, até mesmo porque dispensado, nos termos do art. 38, da lei 9.099/95. Decido. Deixo de analisar as preliminares, tendo em vista o princípio da primazia da decisão de mérito previsto no art. 488 do Código de Processo Civil. Assim, passo a análise do mérito da presente destacando que o feito se amolda aos requisitos para julgamento antecipado da lide, conforme o art. 355, I, do CPC. No presente caso, trata-se de relação jurídica na qual deve ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), tendo em vista a adequação das partes ao conceito de consumidor (art. 2º) e fornecedor (art. 3º), sendo possível a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, inciso VIII do mesmo Códex. Sob esse enfoque, cabe a parte reclamante a demonstração do fato constitutivo do seu direito (art. 373, I, CPC), e a parte reclamada, o ônus da contraprova, existência de fato modificativo, impeditivo ou extintivo e as causas de excludente de responsabilidade (art. 373, II, CPC, art. 188, I, CC e art. 14, § 3° CDC). O mérito da presente ação consiste em definir sobre a regularidade dos descontos realizados no benefício previdenciário da reclamante, denominados, Reserva de Margem Consignável (RMC), vinculados ao cartão de crédito emitido pelo banco reclamado. Portanto, considerando que a parte promovente comprovou a ocorrência dos descontos em seu benefício previdenciário, incumbe à parte promovida comprovar a contratação e utilização de seus serviços. Em contestação, a demandada sustenta a regularidade dos descontos, sob o argumento de que houve contratação válida de cartão de crédito consignado com reserva de margem, mediante termo de adesão firmado pela parte reclamante, sendo que os valores descontados corresponderiam ao pagamento mínimo da fatura do referido cartão, razão pela qual pugna pela improcedência da ação. Imperioso destacar que a reclamante não se insurge quanto à contratação do empréstimo consignado junto a instituição financeira reclamada, mas questiona a modalidade da contratação do cartão de crédito. Em análise ao conjunto probatório dos autos, verifica-se que a parte reclamada se desincumbiu do ônus que lhe cabia (art. 373, II, do CPC), ao comprovar a contratação, do contrato de aquisição do Cartão de Crédito Consignado nº. 6504.xxxx.xxxx.0567, devidamente assinado pela parte reclamante (ID. 198158399), bem como sua utilização (ID. 198158396). À vista disso, não se observa a ocorrência de qualquer prática abusiva ou vício de consentimento, uma vez que os descontos mensais ocorreram desde 2022, sem que tenha havido pela parte reclamante qualquer impugnação. A jurisprudência, ainda que em contextos análogos, firmou-se no seguinte sentido: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AGRAVO INTERNO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C DANOS MORAIS. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RMC. CONTRATAÇÃO REGULAR. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO E DANO MORAL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME. Agravo interno contra decisão monocrática que negou provimento ao recurso interposto em ação declaratória de nulidade de contrato cumulada com indenização por dano moral. Alegação de vício de consentimento na contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO. A questão em discussão consiste em saber se houve vício de consentimento na contratação de cartão de crédito consignado com RMC, a justificar sua nulidade e eventual reparação por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR. A contratação foi formalizada com documentos válidos e assinatura eletrônica, inclusive mediante biometria facial e uso efetivo do crédito. Ausente prova de erro essencial, induzimento, fraude ou omissão de informação, inexiste vício de consentimento. A inexistência de ilicitude contratual e de conduta abusiva afasta a caracterização de dano moral. IV. DISPOSITIVO E TESE. Agravo interno desprovido. Tese de julgamento: “1. A contratação de cartão de crédito consignado com RMC é válida quando instruída com documentos comprobatórios da adesão e utilização do crédito. 2. A inexistência de vício de consentimento afasta a nulidade contratual e o dever de indenizar por danos morais.” (N.U 1005110-03.2025.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, EDUARDO CALMON DE ALMEIDA CEZAR, Primeira Turma Recursal, Julgado em 20/07/2025, Publicado no DJE 20/07/2025) DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). AUSÊNCIA DE VÍCIO NA CONTRATAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS. RECURSO DO BANCO PROVIDO. RECURSO DA AUTORA PREJUDICADO. I. CASO EM EXAME. 1. Recurso inominado cível interposto por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais. O banco requer a total improcedência dos pedidos iniciais. A autora, por sua vez, interpôs recurso visando à majoração do valor da indenização. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO. 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se houve vício de informação na contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável, apto a ensejar a nulidade do contrato e indenização por danos morais; (ii) estabelecer se é cabível a majoração do valor arbitrado a título de danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR. 3. A contratação de cartão de crédito consignado e de saque foi comprovada por meio de documentos que demonstram informações claras sobre a operação financeira e a assinatura da consumidora, o que afasta a alegação de vício de consentimento. 4. A ausência de prova de coação, engano ou erro substancial impede o reconhecimento de nulidade contratual. 5. A conduta do banco, ao realizar os descontos pactuados, configura exercício regular de direito e não configura ato ilícito, sendo indevida a condenação por danos morais. 6. A inexistência de impugnação específica pelo consumidor quanto ao contrato firmado reforça a validade da contratação. 7. Diante da improcedência dos pedidos principais, resta prejudicado o recurso da autora que visava à majoração da indenização. IV. DISPOSITIVO E TESE. 8. Recurso do banco provido. Recurso da autora prejudicado. Tese de julgamento: 1. A existência de contrato assinado com informações claras e consentimento livre da consumidora afasta a alegação de vício de informação. 2. A atuação do banco na cobrança de valores contratados não configura ato ilícito nem enseja dano moral indenizável. Dispositivos relevantes citados: Código de Processo Civil, artigos 373, I, 411, III, 487, I; Lei nº 9.099/1995, artigos 46, 55. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1002208-53.2021.8.11.0023, Relatora Marilsen Andrade Addario, julgado em 04.10.2023; TJMT, N.U 1000522-87.2024.8.11.0001, Relator Juiz Walter Pereira de Souza, julgado em 21.10.2024. (N.U 1004644-67.2025.8.11.0015, TURMA RECURSAL CÍVEL, EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Primeira Turma Recursal, Julgado em 17/07/2025, Publicado no DJE 17/07/2025). Diante do exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos formulados na petição inicial. Sem custas e sem honorários, por força do disposto no art. 55 da Lei nº 9.099/95. Transitada em julgado e nada sendo requerido, proceda-se ao arquivamento imediato. Cumpra-se. Submeto o presente projeto de sentença à apreciação do Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito Titular do 4º Juizado Especial Cível de Cuiabá – MT, Dr. Murilo Moura Mesquita, para fins de homologação, de acordo com o artigo 40 da Lei nº 9.099/95. Elaine Brandão Silvério da Silva Juíza Leiga Vistos, etc. HOMOLOGO o projeto de sentença retro, na forma do art. 40 da Lei 9.099/95 e art. 8º, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 270/2007. Preclusa a via recursal e nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá-MT, data registrada pelo sistema. Murilo Moura Mesquita Juiz de Direito

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Processo nº 1001026-62.2025.8.11.0000

ID: 256058341

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara Criminal Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº Processo: 1001026-62.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA ICARO MATHEUS ALMEIDA GOMES FREIRE

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ICARO MATHEUS ALMEIDA GOMES FREIRE

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001026-62.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Prisão Preve… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001026-62.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Prisão Preventiva, Prisão Domiciliar / Especial, Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa] Relator: Des(a). JONES GATTASS DIAS Turma Julgadora: [DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA] Parte(s): [ICARO MATHEUS ALMEIDA GOMES FREIRE - CPF: 870.056.542-34 (ADVOGADO), GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA - CPF: 061.921.991-24 (PACIENTE), JUIZO QUINTA VARA CRIMINAL SINOP (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), ICARO MATHEUS ALMEIDA GOMES FREIRE - CPF: 870.056.542-34 (IMPETRANTE), JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP (IMPETRADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A Ementa: Direito processual penal. Habeas corpus. Organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Prisão domiciliar. Supressão de instância. Não conhecido. Prisão preventiva. Garantia da ordem pública. Ordem parcialmente conhecida e denegada. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado contra a decisão que manteve a prisão preventiva do paciente, pela suposta prática dos crimes de organização criminosa (Lei nº 12.850/2013, art. 2º), tráfico de drogas (Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput) e lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/1998, art. 1º), visando a revogação da prisão preventiva. Subsidiariamente, sua substituição por medidas cautelares diversas da prisão, ou ainda a conversão em prisão domiciliar. II. Questão em discussão 2. As questões discutidas são: (i) verificar se o pleito de prisão domiciliar deve ser conhecido diante da falta de submissão ao Juízo singular; (ii) aferir se a fundamentação é idônea para manutenção da prisão preventiva; (iii) se os predicados pessoais favoráveis são suficientes para revogar a custódia cautelar; e (iv) avaliar a possibilidade de substituição da prisão por medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do CPP. III. Razões de decidir 3. A apreciação do pedido de prisão domiciliar diretamente pelo Tribunal de Justiça configura supressão de instância, uma vez que a matéria não foi previamente submetida ao Juízo de origem. 4. A prisão preventiva encontra-se fundamentada em elementos concretos extraídos dos autos, demonstrando a gravidade concreta das condutas e a periculosidade do paciente, notadamente por sua suposta participação ativa em facção criminosa estruturada e envolvimento direto com o tráfico e a lavagem de capitais. 5. A existência de outras ações penais em andamento contra o paciente por delitos da mesma natureza reforça o risco de reiteração delitiva e legitima a manutenção da prisão preventiva, sem violar o princípio da presunção de inocência. 6. A existência de condições pessoais favoráveis não impede a decretação da prisão preventiva quando presentes os requisitos legais, mostrando insuficientes as medidas cautelares diversas prisão. IV. Dispositivo 7. Ordem parcialmente conhecida e denegada. Tese de Julgamento: “A análise de pedido de prisão domiciliar deve ser precedida de apreciação pelo juízo de origem, sob pena de supressão de instância.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 93, IX; CPP, arts. 282, I e II, 312, 313, 318, VI e 319; Lei nº 12.850/2013, art. 2º; Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput; Lei nº 9.613/1998, art. 1º. Jurisprudência relevante citada: STF, HC 135.105/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, j. 06.09.2016; STJ, AgRg no HC 881.933/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 20.02.2024; STJ, AgRg no RHC 183.857/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, Sexta Turma, DJe 18.04.2024; TJMT, HC 1005110-43.2024.8.11.0000, Rel. Des. Paulo da Cunha, DJe 24.05.2024; TJMT, HC 1002230-78.2024.8.11.0000, Rel. Des. Marcos Machado, j. 06.02.2024; TJMT, Enunciados Orientativos nº 6 e nº 43. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara: Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA, apontando como autoridade coatora o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, que manteve a prisão preventiva pela suposta prática dos crimes de integrar organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013), de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) e lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/1998). O impetrante sustenta a ausência dos requisitos previstos no art. 312 do CPP, sendo que a prisão não foi motivada concretamente, baseando-se apenas na existência de outras ações penais em trâmite contra o paciente. Alega que a manutenção da sua segregação viola o princípio da presunção de inocência. Ressalta os predicados pessoais favoráveis do paciente, como primariedade, residência fixa e trabalho lícito, que seriam suficientes para a revogação da custódia preventiva. Argumenta ainda que o paciente é pai viúvo de uma criança de quase três anos de idade, sendo o único responsável pelos seus cuidados, circunstância que autoriza a substituição da prisão por prisão domiciliar, nos termos do art. 318, VI, do CPP. Diante disso, requer a concessão da ordem para que seja revogada a prisão preventiva do paciente. Subsidiariamente, substituída por medidas cautelares alternativas, ou ainda a conversão em prisão domiciliar (Id 266347777). O pedido de liminar foi indeferido (Id 266787260). O Juízo singular prestou informações (Id 269946865). A i. PGJ manifestou pela denegação da ordem (Id 271298383). É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Consta que, no dia 21/10/2024, foi decretada a prisão temporária do paciente GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA, e de vários investigados, além de outras medidas cautelares, em decorrência da Operação Fantasma. Em 21/12/2024, o Juízo singular converteu a prisão temporária do paciente em preventiva, pela suposta prática dos crimes de integrar organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013), de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) e lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/1998), a fim de garantir da ordem pública e resguardar a instrução criminal (Id 263278262). O Juízo de origem prestou as seguintes informações neste writ a respeito da manutenção da prisão preventiva do paciente e insuficiência de medidas cautelares alternativas, in verbis: “(...) No caso dos autos, consigno que, por ora, a prisão preventiva é medida essencial para resguardar a ordem pública e resguardar a instrução criminal, nos termos dos arts. 312 e 313, ambos do CPP, considerando o modo da prática do delito – o local onde foi praticado – são elementos concretos a concluir pela gravidade concreta da conduta praticada a justificar a sua prisão como forma de garantir a ordem pública (art. 312 do CPP). Ademais a gravidade concreta do delito praticado é elemento suficiente para concluir pela necessidade de se garantir a ordem pública, vez que conforme se extrai dos autos, o paciente foi denunciado pela prática dos crimes de organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Conforme pontuou as investigações, o paciente integrava a organização criminosa denominada “Comando Vermelho”, colaborando com a realização de revenda de entorpecentes para os usuários. Ademais, a autoridade policial aduziu que foram apreendidas uma quantidade expressiva de entorpecentes, armas de fogo e munições, além de outros elementos probatórios que evidenciam que se trata de uma organização criminosa estruturada e complexa, de modo que a principal estratégia adotada para assegurar sua continuidade como um grupo estável consiste na comercialização de entorpecentes e na organização de atividades financeiras ilícitas. Apurou-se que o GEOVANI desempenhava função direta para o tráfico ilícito de drogas, pois foram identificados diálogos entre ele e ALEX JHON acerca da negociação de entorpecentes, repasse de valores oriundos da mercância de drogas, cobrança de valores de entorpecentes e da taxa de “lojista” cobrada pela facção, além de outros assuntos relacionados. Além disso, o representado responde a ação penal n° 1004642-34.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; ação penal n° 1010701- 38.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; e ação penal n° 1020228-14.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, demonstrando que o paciente não se intimida com a prática de ilícitos penais. No mais, nesse contexto fático, cediço ser o Comando Vermelho uma organização criminosa atuante em quase todo o Estado, com uma infinidade de crimes praticados por seus integrantes, a fim de manter o domínio exclusivo no tráfico de drogas, numa espécie de poder paralelo, que afronta diretamente o estado democrático de direito. Todo este quadro impõe a necessidade da cessação da atividade criminosa perpetrada pelos acusados, bem como a retomada do controle estatal nas regiões afetadas pelas práticas delitivas. Nesse sentido, a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva (STF, HC 183187/RO; HC 182944/SP; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 125.716/MG; AgRg no HC 560.018/RN). (...) Vê-se, assim, que os fundamentos para o decreto prisional possuem vinculação com os elementos concretos dos autos, vez que demonstrados os pressupostos e motivos autorizadores da medida, elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, com a devida indicação dos fatos concretos justificadores de sua imposição, bem como para sua manutenção, nos termos do art. 93, inciso IX, da Constituição Federal. Neste diapasão, do que consta reproduzido nos autos, vê-se que o periculum libertatis, previsto na primeira parte do artigo 312 do Código de Processo Penal, in casu, ainda se faz presente, o que afasta da hipótese a possibilidade da aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão. (...)” (Id 269946865). O impetrante sustenta, em síntese, que a prisão preventiva do paciente carece de fundamentação, notadamente a respeito dos requisitos previstos no art. 312 do CPP, e que seria suficiente a aplicação de medidas cautelares diversas, dispostas no art. 319 do CPP, ou mesmo que o paciente faria jus a prisão domiciliar. Sem razão, contudo. Inicialmente, cumpre anotar que o impetrante formulou pedido de conversão da prisão preventiva por domiciliar, haja vista o paciente possuir uma filha de quase 3 anos de idade, sendo o único responsável por seus cuidados (CPP, art. 318, VI). No entanto, verifico que o referido pleito não foi submetido à apreciação do Juízo singular, de modo que a sua análise diretamente pelo Tribunal de Justiça consistiria evidente supressão de instância. Nesse sentido, posiciona-se esta e. Corte de Justiça: “A inexistência de análise, pela autoridade judiciária de primeiro grau, acerca da existência de três filhos menores de doze anos inviabiliza a cognição do pedido de prisão domiciliar nesta instância revisora, sob pena de incidir em supressão de instância.” (TJMT, HC 1028193-88.2024.8.11.0000, Rel. Des. Luiz Ferreira da Silva, Terceira Câmara Criminal, j. 06/11/2024). “Não se conhece de pedido de substituição da prisão preventiva por domiciliar, tendo em vista que a matéria deve, primeiro, ser submetida ao crivo prévio do juízo singular, sob pena de supressão de instância” (TJMT, HC 1005110-43.2024.8.11.0000, Rel. Des. Paulo da Cunha, Primeira Câmara Criminal, DJe 24/05/2024). Ressalte-se que a condição de autoridade coatora é que determina a competência para o julgamento do writ, de modo que, inexistindo apreciação da matéria pelo juiz singular, mostra-se impossível considerá-lo como responsável por eventual constrangimento ilegal. Com efeito, não cabe ao Tribunal de Justiça proferir decisão sobre matéria ainda não apreciada pelo Juízo de primeira instância, sob pena de violar o princípio do duplo grau de jurisdição. Não é demais lembrar que a prisão domiciliar é medida absolutamente excepcional, devendo o requerente comprovar o preenchimento inconteste de uma das hipóteses legais previstas para a sua concessão. Nesse contexto, a apreciação da matéria por este colegiado caracterizaria indevida supressão de instância. Logo, o writ não deve ser conhecido nesse ponto. Superada essa questão, para que se repute atendida a garantia inserta no art. 93, inc. IX, da CF, é indispensável que a ordem constritiva esteja amparada em prova da materialidade do crime e indícios suficientes da sua autoria, ajuste-se a uma das hipóteses legais autorizadoras (art. 312 e 313 do CPP) e indique a imprescindibilidade da medida. Constata-se que a prisão preventiva do paciente está apoiada em motivos adequados e idôneos, pois a natureza das condutas, em tese, perpetradas pelo paciente indica a periculosidade que oferece para o meio social, justificando uma ação mais enérgica do Poder Judiciário. Os fundamentos que lastreiam a constrição atacada se mostram hígidos e demonstram a necessidade da medida constritiva para a garantia da ordem pública, notadamente pela gravidade concreta das condutas, elevada periculosidade do paciente e risco efetivo de reiteração delitiva. Sobre a gravidade, dessume-se do decisum combatido o suposto envolvimento do paciente com a organização criminosa autointitulada de “Comando Vermelho”, que, segundo as investigações, atua de forma organizada e estruturada englobando diversos indivíduos, dentre eles o paciente, que, em tese, atua de modo ativo no tráfico de drogas e na lavagem de capitais, possuindo função operacional relevante, com atribuições no comércio (distribuição e revenda de drogas), cobrança de “taxas de lojistas” relacionados à facção criminosa, repasse de valores ilícitos e logística para fomentar o tráfico. De fato, é inegável que as condutas imputadas ao paciente são de elevada gravidade, uma vez que há indícios da sua participação em organização criminosa de alta periculosidade, cujas particularidades revelam o perigo de sua liberdade e aponta a imprescindibilidade da medida constritiva para resguardar a ordem social. Insta consignar que a jurisprudência pátria orienta sobre a necessidade de interromper as atividades ilícitas e desestruturar o grupo constituído para a prática de crimes, o que constitui fundamentação suficiente para justificar a segregação cautelar (TJMT, HC nº 1002230-78.2024.8.11.0000, Rel. Des. Marcos Machado, Primeira Câmara Criminal, j. 6.2.2024). Outrossim, a prisão cautelar está embasada no risco de renitência criminosa, uma vez que o paciente responde outras ações penais, inclusive pela prática de delitos da mesma natureza (tráfico de drogas) – “ação penal n° 1004642-34.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; ação penal n° 1010701-38.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; e ação penal n° 1020228-14.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006” (Id. 269946865). A existência de ações penais em andamento por crimes dolosos autoriza, sem violar a presunção de inocência, a prisão preventiva para garantir a ordem pública, notadamente diante do risco de reiteração delitiva. Nesse sentido, colhe-se entendimento pacífico deste e. Tribunal: “O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência” (Enunciado Orientativo nº 6 da TCCR/TJMT). Convém salientar que as Cortes Superiores firmaram orientação de que a fundada probabilidade de reiteração delitiva justifica a prisão cautelar para garantia da ordem pública (STF, HC 135105/SP, Rel.Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, j. 6.9.2016; STJ, AgRg no HC 881.933/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 20/2/2024). Delineado esse quadro, portanto, não há como se reconhecer a desnecessidade da custódia, a inexistência de perigo gerado pela liberdade do paciente e muito menos a possibilidade de aplicar medidas cautelares alternativas à prisão, como pretende o impetrante. Destarte, consideradas as circunstâncias fáticas e a gravidade concreta das condutas, descabe cogitar a aplicação de providências cautelares menos gravosas ao caso, posto que insuficientes para atingir os fins pretendidos com o recolhimento cautelar, a teor do que dispõe o art. 282, inc. I e II, do CPP. Colhe-se julgado do c. STJ: “Havendo fundamentação concreta que justifique a medida extrema, cautelares diversas à segregação também se mostram insuficientes para o resguardo da ordem pública” [AgRg no RHC n. 183.857/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, DJe de 18.4.2024]. Desta feita, evidenciada a necessidade da prisão preventiva, tornam-se inadequadas as medidas cautelares diversas da prisão (art. 319, CPP). Ressalte-se que eventuais condições subjetivas favoráveis, ressaltadas pelo impetrante (primariedade, endereço certo e trabalho lícito) não ensejam, em si, a revogação da custódia preventiva, conforme pacífica posição jurisprudencial do c. STJ (RHC 182965/SC, Rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, j. 05/11/2024). A propósito, colhe-se o Enunciado Orientativo nº 43 deste e. Tribunal: “As condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis”. Sendo assim, deve ser mantida a custódia cautelar da paciente. Por todo o exposto, conheço em parte o writ, extinguindo-o sem resolução do mérito quanto à tese de substituição da prisão preventiva por domiciliar, e, em consonância com a i. PGJ, denego a ordem de habeas corpus. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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Processo nº 1001026-62.2025.8.11.0000

ID: 256058346

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara Criminal Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº Processo: 1001026-62.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001026-62.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Prisão Preve… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001026-62.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Prisão Preventiva, Prisão Domiciliar / Especial, Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa] Relator: Des(a). JONES GATTASS DIAS Turma Julgadora: [DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA] Parte(s): [ICARO MATHEUS ALMEIDA GOMES FREIRE - CPF: 870.056.542-34 (ADVOGADO), GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA - CPF: 061.921.991-24 (PACIENTE), JUIZO QUINTA VARA CRIMINAL SINOP (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), ICARO MATHEUS ALMEIDA GOMES FREIRE - CPF: 870.056.542-34 (IMPETRANTE), JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP (IMPETRADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A Ementa: Direito processual penal. Habeas corpus. Organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Prisão domiciliar. Supressão de instância. Não conhecido. Prisão preventiva. Garantia da ordem pública. Ordem parcialmente conhecida e denegada. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado contra a decisão que manteve a prisão preventiva do paciente, pela suposta prática dos crimes de organização criminosa (Lei nº 12.850/2013, art. 2º), tráfico de drogas (Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput) e lavagem de dinheiro (Lei nº 9.613/1998, art. 1º), visando a revogação da prisão preventiva. Subsidiariamente, sua substituição por medidas cautelares diversas da prisão, ou ainda a conversão em prisão domiciliar. II. Questão em discussão 2. As questões discutidas são: (i) verificar se o pleito de prisão domiciliar deve ser conhecido diante da falta de submissão ao Juízo singular; (ii) aferir se a fundamentação é idônea para manutenção da prisão preventiva; (iii) se os predicados pessoais favoráveis são suficientes para revogar a custódia cautelar; e (iv) avaliar a possibilidade de substituição da prisão por medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do CPP. III. Razões de decidir 3. A apreciação do pedido de prisão domiciliar diretamente pelo Tribunal de Justiça configura supressão de instância, uma vez que a matéria não foi previamente submetida ao Juízo de origem. 4. A prisão preventiva encontra-se fundamentada em elementos concretos extraídos dos autos, demonstrando a gravidade concreta das condutas e a periculosidade do paciente, notadamente por sua suposta participação ativa em facção criminosa estruturada e envolvimento direto com o tráfico e a lavagem de capitais. 5. A existência de outras ações penais em andamento contra o paciente por delitos da mesma natureza reforça o risco de reiteração delitiva e legitima a manutenção da prisão preventiva, sem violar o princípio da presunção de inocência. 6. A existência de condições pessoais favoráveis não impede a decretação da prisão preventiva quando presentes os requisitos legais, mostrando insuficientes as medidas cautelares diversas prisão. IV. Dispositivo 7. Ordem parcialmente conhecida e denegada. Tese de Julgamento: “A análise de pedido de prisão domiciliar deve ser precedida de apreciação pelo juízo de origem, sob pena de supressão de instância.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 93, IX; CPP, arts. 282, I e II, 312, 313, 318, VI e 319; Lei nº 12.850/2013, art. 2º; Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput; Lei nº 9.613/1998, art. 1º. Jurisprudência relevante citada: STF, HC 135.105/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, j. 06.09.2016; STJ, AgRg no HC 881.933/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 20.02.2024; STJ, AgRg no RHC 183.857/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, Sexta Turma, DJe 18.04.2024; TJMT, HC 1005110-43.2024.8.11.0000, Rel. Des. Paulo da Cunha, DJe 24.05.2024; TJMT, HC 1002230-78.2024.8.11.0000, Rel. Des. Marcos Machado, j. 06.02.2024; TJMT, Enunciados Orientativos nº 6 e nº 43. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara: Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA, apontando como autoridade coatora o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, que manteve a prisão preventiva pela suposta prática dos crimes de integrar organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013), de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) e lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/1998). O impetrante sustenta a ausência dos requisitos previstos no art. 312 do CPP, sendo que a prisão não foi motivada concretamente, baseando-se apenas na existência de outras ações penais em trâmite contra o paciente. Alega que a manutenção da sua segregação viola o princípio da presunção de inocência. Ressalta os predicados pessoais favoráveis do paciente, como primariedade, residência fixa e trabalho lícito, que seriam suficientes para a revogação da custódia preventiva. Argumenta ainda que o paciente é pai viúvo de uma criança de quase três anos de idade, sendo o único responsável pelos seus cuidados, circunstância que autoriza a substituição da prisão por prisão domiciliar, nos termos do art. 318, VI, do CPP. Diante disso, requer a concessão da ordem para que seja revogada a prisão preventiva do paciente. Subsidiariamente, substituída por medidas cautelares alternativas, ou ainda a conversão em prisão domiciliar (Id 266347777). O pedido de liminar foi indeferido (Id 266787260). O Juízo singular prestou informações (Id 269946865). A i. PGJ manifestou pela denegação da ordem (Id 271298383). É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Consta que, no dia 21/10/2024, foi decretada a prisão temporária do paciente GEOVANI CINTI DE OLIVEIRA, e de vários investigados, além de outras medidas cautelares, em decorrência da Operação Fantasma. Em 21/12/2024, o Juízo singular converteu a prisão temporária do paciente em preventiva, pela suposta prática dos crimes de integrar organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013), de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) e lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/1998), a fim de garantir da ordem pública e resguardar a instrução criminal (Id 263278262). O Juízo de origem prestou as seguintes informações neste writ a respeito da manutenção da prisão preventiva do paciente e insuficiência de medidas cautelares alternativas, in verbis: “(...) No caso dos autos, consigno que, por ora, a prisão preventiva é medida essencial para resguardar a ordem pública e resguardar a instrução criminal, nos termos dos arts. 312 e 313, ambos do CPP, considerando o modo da prática do delito – o local onde foi praticado – são elementos concretos a concluir pela gravidade concreta da conduta praticada a justificar a sua prisão como forma de garantir a ordem pública (art. 312 do CPP). Ademais a gravidade concreta do delito praticado é elemento suficiente para concluir pela necessidade de se garantir a ordem pública, vez que conforme se extrai dos autos, o paciente foi denunciado pela prática dos crimes de organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Conforme pontuou as investigações, o paciente integrava a organização criminosa denominada “Comando Vermelho”, colaborando com a realização de revenda de entorpecentes para os usuários. Ademais, a autoridade policial aduziu que foram apreendidas uma quantidade expressiva de entorpecentes, armas de fogo e munições, além de outros elementos probatórios que evidenciam que se trata de uma organização criminosa estruturada e complexa, de modo que a principal estratégia adotada para assegurar sua continuidade como um grupo estável consiste na comercialização de entorpecentes e na organização de atividades financeiras ilícitas. Apurou-se que o GEOVANI desempenhava função direta para o tráfico ilícito de drogas, pois foram identificados diálogos entre ele e ALEX JHON acerca da negociação de entorpecentes, repasse de valores oriundos da mercância de drogas, cobrança de valores de entorpecentes e da taxa de “lojista” cobrada pela facção, além de outros assuntos relacionados. Além disso, o representado responde a ação penal n° 1004642-34.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; ação penal n° 1010701- 38.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; e ação penal n° 1020228-14.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, demonstrando que o paciente não se intimida com a prática de ilícitos penais. No mais, nesse contexto fático, cediço ser o Comando Vermelho uma organização criminosa atuante em quase todo o Estado, com uma infinidade de crimes praticados por seus integrantes, a fim de manter o domínio exclusivo no tráfico de drogas, numa espécie de poder paralelo, que afronta diretamente o estado democrático de direito. Todo este quadro impõe a necessidade da cessação da atividade criminosa perpetrada pelos acusados, bem como a retomada do controle estatal nas regiões afetadas pelas práticas delitivas. Nesse sentido, a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva (STF, HC 183187/RO; HC 182944/SP; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 125.716/MG; AgRg no HC 560.018/RN). (...) Vê-se, assim, que os fundamentos para o decreto prisional possuem vinculação com os elementos concretos dos autos, vez que demonstrados os pressupostos e motivos autorizadores da medida, elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, com a devida indicação dos fatos concretos justificadores de sua imposição, bem como para sua manutenção, nos termos do art. 93, inciso IX, da Constituição Federal. Neste diapasão, do que consta reproduzido nos autos, vê-se que o periculum libertatis, previsto na primeira parte do artigo 312 do Código de Processo Penal, in casu, ainda se faz presente, o que afasta da hipótese a possibilidade da aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão. (...)” (Id 269946865). O impetrante sustenta, em síntese, que a prisão preventiva do paciente carece de fundamentação, notadamente a respeito dos requisitos previstos no art. 312 do CPP, e que seria suficiente a aplicação de medidas cautelares diversas, dispostas no art. 319 do CPP, ou mesmo que o paciente faria jus a prisão domiciliar. Sem razão, contudo. Inicialmente, cumpre anotar que o impetrante formulou pedido de conversão da prisão preventiva por domiciliar, haja vista o paciente possuir uma filha de quase 3 anos de idade, sendo o único responsável por seus cuidados (CPP, art. 318, VI). No entanto, verifico que o referido pleito não foi submetido à apreciação do Juízo singular, de modo que a sua análise diretamente pelo Tribunal de Justiça consistiria evidente supressão de instância. Nesse sentido, posiciona-se esta e. Corte de Justiça: “A inexistência de análise, pela autoridade judiciária de primeiro grau, acerca da existência de três filhos menores de doze anos inviabiliza a cognição do pedido de prisão domiciliar nesta instância revisora, sob pena de incidir em supressão de instância.” (TJMT, HC 1028193-88.2024.8.11.0000, Rel. Des. Luiz Ferreira da Silva, Terceira Câmara Criminal, j. 06/11/2024). “Não se conhece de pedido de substituição da prisão preventiva por domiciliar, tendo em vista que a matéria deve, primeiro, ser submetida ao crivo prévio do juízo singular, sob pena de supressão de instância” (TJMT, HC 1005110-43.2024.8.11.0000, Rel. Des. Paulo da Cunha, Primeira Câmara Criminal, DJe 24/05/2024). Ressalte-se que a condição de autoridade coatora é que determina a competência para o julgamento do writ, de modo que, inexistindo apreciação da matéria pelo juiz singular, mostra-se impossível considerá-lo como responsável por eventual constrangimento ilegal. Com efeito, não cabe ao Tribunal de Justiça proferir decisão sobre matéria ainda não apreciada pelo Juízo de primeira instância, sob pena de violar o princípio do duplo grau de jurisdição. Não é demais lembrar que a prisão domiciliar é medida absolutamente excepcional, devendo o requerente comprovar o preenchimento inconteste de uma das hipóteses legais previstas para a sua concessão. Nesse contexto, a apreciação da matéria por este colegiado caracterizaria indevida supressão de instância. Logo, o writ não deve ser conhecido nesse ponto. Superada essa questão, para que se repute atendida a garantia inserta no art. 93, inc. IX, da CF, é indispensável que a ordem constritiva esteja amparada em prova da materialidade do crime e indícios suficientes da sua autoria, ajuste-se a uma das hipóteses legais autorizadoras (art. 312 e 313 do CPP) e indique a imprescindibilidade da medida. Constata-se que a prisão preventiva do paciente está apoiada em motivos adequados e idôneos, pois a natureza das condutas, em tese, perpetradas pelo paciente indica a periculosidade que oferece para o meio social, justificando uma ação mais enérgica do Poder Judiciário. Os fundamentos que lastreiam a constrição atacada se mostram hígidos e demonstram a necessidade da medida constritiva para a garantia da ordem pública, notadamente pela gravidade concreta das condutas, elevada periculosidade do paciente e risco efetivo de reiteração delitiva. Sobre a gravidade, dessume-se do decisum combatido o suposto envolvimento do paciente com a organização criminosa autointitulada de “Comando Vermelho”, que, segundo as investigações, atua de forma organizada e estruturada englobando diversos indivíduos, dentre eles o paciente, que, em tese, atua de modo ativo no tráfico de drogas e na lavagem de capitais, possuindo função operacional relevante, com atribuições no comércio (distribuição e revenda de drogas), cobrança de “taxas de lojistas” relacionados à facção criminosa, repasse de valores ilícitos e logística para fomentar o tráfico. De fato, é inegável que as condutas imputadas ao paciente são de elevada gravidade, uma vez que há indícios da sua participação em organização criminosa de alta periculosidade, cujas particularidades revelam o perigo de sua liberdade e aponta a imprescindibilidade da medida constritiva para resguardar a ordem social. Insta consignar que a jurisprudência pátria orienta sobre a necessidade de interromper as atividades ilícitas e desestruturar o grupo constituído para a prática de crimes, o que constitui fundamentação suficiente para justificar a segregação cautelar (TJMT, HC nº 1002230-78.2024.8.11.0000, Rel. Des. Marcos Machado, Primeira Câmara Criminal, j. 6.2.2024). Outrossim, a prisão cautelar está embasada no risco de renitência criminosa, uma vez que o paciente responde outras ações penais, inclusive pela prática de delitos da mesma natureza (tráfico de drogas) – “ação penal n° 1004642-34.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; ação penal n° 1010701-38.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006; e ação penal n° 1020228-14.2024.8.11.0015, em trâmite perante este Juízo, pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006” (Id. 269946865). A existência de ações penais em andamento por crimes dolosos autoriza, sem violar a presunção de inocência, a prisão preventiva para garantir a ordem pública, notadamente diante do risco de reiteração delitiva. Nesse sentido, colhe-se entendimento pacífico deste e. Tribunal: “O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência” (Enunciado Orientativo nº 6 da TCCR/TJMT). Convém salientar que as Cortes Superiores firmaram orientação de que a fundada probabilidade de reiteração delitiva justifica a prisão cautelar para garantia da ordem pública (STF, HC 135105/SP, Rel.Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, j. 6.9.2016; STJ, AgRg no HC 881.933/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 20/2/2024). Delineado esse quadro, portanto, não há como se reconhecer a desnecessidade da custódia, a inexistência de perigo gerado pela liberdade do paciente e muito menos a possibilidade de aplicar medidas cautelares alternativas à prisão, como pretende o impetrante. Destarte, consideradas as circunstâncias fáticas e a gravidade concreta das condutas, descabe cogitar a aplicação de providências cautelares menos gravosas ao caso, posto que insuficientes para atingir os fins pretendidos com o recolhimento cautelar, a teor do que dispõe o art. 282, inc. I e II, do CPP. Colhe-se julgado do c. STJ: “Havendo fundamentação concreta que justifique a medida extrema, cautelares diversas à segregação também se mostram insuficientes para o resguardo da ordem pública” [AgRg no RHC n. 183.857/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, DJe de 18.4.2024]. Desta feita, evidenciada a necessidade da prisão preventiva, tornam-se inadequadas as medidas cautelares diversas da prisão (art. 319, CPP). Ressalte-se que eventuais condições subjetivas favoráveis, ressaltadas pelo impetrante (primariedade, endereço certo e trabalho lícito) não ensejam, em si, a revogação da custódia preventiva, conforme pacífica posição jurisprudencial do c. STJ (RHC 182965/SC, Rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, j. 05/11/2024). A propósito, colhe-se o Enunciado Orientativo nº 43 deste e. Tribunal: “As condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis”. Sendo assim, deve ser mantida a custódia cautelar da paciente. Por todo o exposto, conheço em parte o writ, extinguindo-o sem resolução do mérito quanto à tese de substituição da prisão preventiva por domiciliar, e, em consonância com a i. PGJ, denego a ordem de habeas corpus. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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Daniel Batista Diogo Dos Santos e outros x Daniel Batista Diogo Dos Santos e outros

ID: 311132546

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Taubaté - 5ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1005110-91.2024.8.26.0625

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

DANIEL BATISTA DIOGO DOS SANTOS GRAZIANE RITA DE PAULA DOS SANTOS LOTE CERTO EMPREENDIMENTO IMOBILIáRIO SPE LTDA

Polo Passivo:

DANIEL BATISTA DIOGO DOS SANTOS LOTE CERTO EMPREENDIMENTO IMOBILIáRIO SPE LTDA

Intimação

Advogados:

RAFAEL JOSE SANCHES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

HUMBERTO GORDILHO DOS SANTOS NETO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Processo 1005110-91.2024.8.26.0625 - Procedimento Comum Cível - Rescisão do contrato e devolução do dinheiro - Daniel Batista Diogo dos Santos - - Graziane Rita de Paula dos Santos - Lote Certo Emp… Processo 1005110-91.2024.8.26.0625 - Procedimento Comum Cível - Rescisão do contrato e devolução do dinheiro - Daniel Batista Diogo dos Santos - - Graziane Rita de Paula dos Santos - Lote Certo Empreendimento Imobiliário Spe Ltda - Lote Certo Empreendimento Imobiliário Spe Ltda - Daniel Batista Diogo dos Santos e outro - Vistos. DANIEL BATISTA DIOGO DOS SANTOS e GRAZIANE RITA DE PAULA DOS SANTOS ajuizaram "ação de rescisão contratual e de restituição de valores pagos com pedido de tutela de urgência" em face de LOTE CERTO EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO SPE LTDA. Alegam no dia 30/08/2019 celebraram com a ré um instrumento particular de venda e compra do Lote 06, da Quadra J, do Loteamento Jardim das Figueiras, localizado em Guaratinguetá-SP, no valor de R$71.922,82, para pagamento mediante entrada de R$671,18 e do saldo remanescente de R$71.251,64 em 179 parcelas mensais de R$762,00, mais 14 parcelas anuais de R$999,00. Afirmam que pagaram R$53.603,64, e por não conseguirem mais continuar adimplindo as prestações do imóvel, tentaram rescindir amigavelmente o contrato e reaver os valores pagos, contudo, a requerida se recusou a proceder ao distrato e impôs penalidades abusivas que tornariam inexistente qualquer saldo a lhes restituir. Requerem, em sede de tutela de urgência, a suspensão da exigibilidade das parcelas do contrato, a proibição da negativação de seus nomes nos órgãos de proteção ao crédito e que a demandada seja impedida de consolidar a propriedade do imóvel e, no mérito, a "rescisão" do contrato particular de compra e venda, a declaração da nulidade das cláusulas contratuais que imponham penalidades excessivas e ilegais aos compradores, e a condenação da ré a lhes restituir 90% dos valores pagos, corrigidos a partir de cada desembolso e acrescidos de juros de mora, em parcela única. A partir da decisão de fls.96/99, manifestação dos autores a fls.104/105, com os documentos de fls.106/158. Indeferida a gratuidade de justiça (fls.159/160), os demandantes noticiaram que foi dado parcial provimento ao agravo de instrumento por eles interposto, deferindo a gratuidade de justiça, e requereram a retificação do valor da causa para R$71.922,82 (petição de fls.163 e v.acórdão de fls.164/172). A decisão de fls.184/185 recebeu a emenda à inicial corrigindo o valor atribuído à causa, deferiu parcialmente a liminar para suspender a exigibilidade das parcelas vencidas e vincendas do contrato e impedir a inscrição do nome dos autores nos cadastros restritivos e/ou para imediata exclusão. A ré foi citada e intimada por oficial de justiça (fls.190/191) e apresentou contestação com reconvenção (fls.192/211), arguindo preliminar de incompetência territorial e, no mérito, alegando, em síntese, que o negócio jurídico foi celebrado com expressa previsão de irrevogabilidade e irretratabilidade; que não descumpriu nenhuma de suas obrigações contratuais; que o contrato com alienação fiduciária consubstancia a hipótese prevista no artigo 22 da Lei nº9.514/97 (com redação dada pela Lei nº14.711/2023); inexistência de impedimento para que o credor fiduciário seja o vendedor/credor originário da obrigação garantida pela alienação fiduciária; inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor em detrimento à Lei nº9.514/97; ausência de especificação das supostas cláusulas contratuais abusivas; que, em caso de procedência da demanda, deverá haver a retenção de 90% do valor atualizado do contrato e a restituição do remanescente em até doze meses após a rescisão contratual. Em reconvenção, postula a fixação de taxa de ocupação mensal do imóvel desde 22/01/2022 (data da transmissão da posse aos autores/reconvindos), equivalente a 0,75% do valor atualizado do contrato. Em réplica (fls.262/272), os demandantes refutaram a preliminar arguida e reiteraram as pretensões e, na contestação à reconvenção (fls.272/273), sustentaram a impossibilidade de cobrança de taxa de fruição do imóvel. A partir do despacho de fls.291, a requerida juntou petição, procuração e substabelecimento (fls.294/311). A decisão de fls.319/320 afastou a cláusula de eleição de foro, admitiu a competência desta Vara para processar e julgar a ação, determinou que a ré/reconvinte comprovasse o recolhimento da taxa de distribuição da reconvenção, sob cominação de não conhecimento do pedido reconvencional. Petição da demandada/reconvinte a fls.323/324, com as guias de fls.325/326. A partir do despacho de fls.328, a requerida/reconvinte apresentou réplica à contestação ao pedido reconvencional (fls.336/353). Facultada a especificação de provas (fls.354), as partes alegaram não terem outras provas a produzir (fls.347/358 e 359/364). A decisão de fls.365 deu por encerrada a fase de instrução processual, sem insurgência dos litigantes (certidão de fls.368). É o relatório (CPC, art.489, inciso I). Fundamento e decido. A prova documental produzida nos autos é suficiente para formação do convencimento do Juízo, tornando possível o julgamento antecipado do mérito (art.355, inciso I, do CPC). Trata-se de demanda tendente à resolução de contrato de compra e venda do Lote 06, da Quadra J, do Loteamento Jardim das Figueiras (matrícula 49.294 do CRI de Guaratinguetá), com restituição de 90% dos valores pagos, ao fundamento de que os autores não conseguem continuar adimplindo as parcelas do preço para aquisição de imóvel. A resposta sustenta, no tema principal, que não é cabível a resolução do contrato, porque se trata de pacto com garantia fiduciária; e que, em caso de procedência da demanda, deve haver a retenção de 90% do valor atualizado do contrato. Em reconvenção, a ré/reconvinte postula a fixação de taxa de ocupação do imóvel desde a data da transmissão da posse aos compradores, em valor mensal equivalente a 0,75% do preço atualizado do contrato. Os autores/reconvindos alegam descabimento da taxa de ocupação. Na espécie, a pretensão formulada pelos autores é de resolução do contrato, consistente no desfazimento da relação contratual, por decorrência de evento superveniente, isto é, do inadimplemento imputável e busca a volta ao estado anterior. "É um direito formativo extintivo e, porque dissolve o contrato constitui exceção notória ao princípio da estabilidade do vínculo, em virtude de fato adventício ao seu aperfeiçoamento". Decorre de fato culposo imputável a um dos contratantes. Em linha de princípio, adere o Juízo adere à compreensão de que é possível o desfazimento do contrato de compromisso de compra e venda por incapacidade de pagamento dos compradores, independentemente da aferição de "culpa" ou causa dessa incapacidade. Entrementes, a hipótese dos autos trata de circunstância fática diversa. A pretensão, como antes destacado, é de resolução de contrato de compra e venda (concluído, portanto), com financiamento do preço e com pacto anexo de alienação fiduciária em garantia (fls.33/39 e 40/59). Nessa situação jurídica é incabível o desfazimento da compra e venda, até porque deixaria sem solução o trato de alienação fiduciária. Tratando-se de negócio de ajuste de compra e venda com garantia fiduciária, optaram os demandantes por espécie que não admite essa via. Como registra v.precedente relatado pelo eminente Des.Francisco Loureiro, nessa espécie de negócio, operando-se o inadimplemento "Não se resolve contrato, mas sim se executa garantia, o que é estruturalmente distinto". Acertada a compra e venda com financiamento do preço, por óbvia iniciativa da ré/reconvinte, ajustou-se também pacto anexo de alienação fiduciária em garantia, estabelecendo a propriedade resolúvel. Bem por isso, o contrato não pode ser objeto de singelo desfazimento. O pacto de compra e venda está cumprido, não havendo campo para desfazê-lo. O que subsiste é tão-somente o mútuo (o financiamento do preço) garantido por alienação fiduciária. Bem por isso, "Resta apenas ao credor, se o caso, executar a garantia real e levar o imóvel gravado a leilão extrajudicial, nos exatos termos da L.9.514/97, com o propósito único e exclusivo de recuperar o seu crédito". Note-se que essa orientação é amplamente aceita na jurisprudência do Eg. Tribunal de Justiça de São Paulo: "Com efeito, o contrato objeto da ação não é um compromisso de compra e venda e sim uma escritura pública de compra e venda de imóvel com alienação fiduciária em garantia, regida pela Lei nº9.514/97. Dada a natureza da avença, o inadimplemento do comprador, como é o caso dos autos, não acarreta a resolução do contrato de compra e venda, perfeito e acabado, mas a resolução da propriedade fiduciária na forma prevista nos artigos 26 e 27 da lei de regência, inaplicável na espécie o Código de Defesa do Consumidor, especialmente a norma do art.53, ressaltando-se que os autores terão direito à restituição do valor que sobejar após a venda do imóvel em leilão (§4º do art.27 da Lei nº9.514/97)". No mesmo sentido: "... a partir da celebração do contrato definitivo com pacto adjeto de alienação fiduciária, a relação das partes passa a ser regida pela Lei nº9.514/97, norma posterior e mais específica à regra geral prevista no art.53 do Código de Defesa do Consumidor, cuja aplicação fica afastada do caso concreto. (...) Com efeito, no caso em tela, a celebração do contrato definitivo de compra e venda implica no esgotamento do compromisso de compra e venda inicial, que se torna ato jurídico perfeito, impassível de rescisão ou revisão judicial". Essa também é a jurisprudência prevalecente no âmbito do Col. Superior Tribunal de Justiça: "Com efeito, firmou-se a orientação jurisprudencial desta Corte Superior no sentido de que a regra do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor não se aplica às hipóteses de alienação fiduciária de bem imóvel, pois, nestes casos, há procedimento próprio para devolução regulado por lei especial art.27, §4.º, da Lei 9.514/97". Em idêntico senso: "... é assente perante este Superior Tribunal de Justiça que, em contrato de alienação fiduciária em garantia de bens imóveis, a quitação da dívida deverá observar a forma prevista nos artigos 26 e 27 da Lei nº9.514/97, a qual, por se tratar de legislação específica, afasta a aplicação do artigo 53 do CDC. Ademais, a lei em comento, por ser especial, sobrepõe-se à regra constante no artigo 53 do CDC inclusive nos casos em que descaracterizada a mora em decorrência do ajuizamento de ação de rescisão do contrato". Em arremate: "... ainda que ausente o inadimplemento, a disciplina do art.53 do Código de Defesa do Consumidor não é aplicável a contrato de compra e venda de imóvel vinculado a garantia de alienação fiduciária, considerando-se ser obrigatória a aplicação do disposto no art. 27 da Lei nº9.514/1997, o qual disciplina o critério de devolução, de maneira específica, para tal hipótese". Esses entendimentos foram consolidados no Tema Repetitivo 1095 do Superior Tribunal de Justiça: "Em contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária devidamente registrado em cartório, a resolução do pacto, na hipótese de inadimplemento do devedor, devidamente constituído em mora, deverá observar a forma prevista na Lei nº9.514/97, por se tratar de legislação específica, afastando-se, por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor". Sendo assim, independentemente de exame das alegações das partes, vê-se que é juridicamente inviável o acolhimento da pretensão de resolução do contrato coligado de compra e venda e alienação fiduciária. Nesse sentido decidiu recentemente o E.Tribunal de Justiça de São Paulo: "APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM DEVOLUÇÃO DE VALORES. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. REFORMA. PREVALÊNCIA DA LEI Nº9.514/97. TEMA 1.095/STJ. INVIABILIDADE DA RESOLUÇÃO UNILATERAL POR DESISTÊNCIA DO COMPRADOR ADIMPLENTE. APLICAÇÃO CONJUNTA DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. 1.A Lei nº9.514/97, ao regulamentar a alienação fiduciária de bens imóveis, constitui legislação especial e posterior ao Código de Defesa do Consumidor, sendo plenamente possível sua interpretação conjunta com este, sem prejuízo da proteção ao adquirente. 2.Conforme tese definida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema Repetitivo nº1.095 (Resp1.891.498/SP), a resolução unilateral do contrato por parte do comprador adimplente, sob alegação de desinteresse, configura "antecipatory breach" e não se amolda ao regime da alienação fiduciária, que exige a observância do procedimento previsto nos arts.26 e 27 da Lei nº9.514/97. 3.A ausência de inadimplemento do comprador à época do ajuizamento da demanda impede a resolução contratual pleiteada, devendo a restituição de valores ser realizada em conformidade com a sistemática da alienação fiduciária. 4.Recurso da requerida provido para julgar improcedente o pedido inicial. Recursos restantes prejudicados." (Apelação Cível nº1005581-71.2024.8.26.0637. 7ªCâmara de Direito Privado do TJSP. Relator Ademir Modesto de Souza. Julgada em 13/06/2025). Passo a apreciar o pedido reconvencional. A requerida não impugnou expressamente a alegação dos requerentes de que o imóvel objeto do contrato celebrado entre as partes se trata de lote de terreno sem edificações, em consonância com o item "G" do quadro-resumo de fls.33/39. Tratando-se de lote não edificado, descabe a condenação dos compradores ao pagamento de indenização pela fruição do imóvel, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça: "CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL.(...) COBRANÇA DATAXA DE FRUIÇÃO DE LOTE NÃO EDIFICADO. IMPOSSIBILIDADE.(...) DECISÃO MANTIDA. (...) 6.Conforme a orientação sedimentada no âmbito desta Corte, "na hipótese de desfazimento de contrato de promessa de compra e venda de terreno não edificado por interesse exclusivo dos adquirentes, é indevida a condenação dos consumidores ao pagamento de taxa de ocupação/fruição" (AgInt no REsp n.1.941.068/SP, Relator Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/9/2021, DJe 29/9/2021). (...) 11. Agravo interno a que se nega provimento". (AgInt nos EDcl no REsp2110844/SP. 4ªTurma do STJ. Relator Min.Antônio Carlos. Julgado em 19/08/2024) Nessa mesma direção há pouco decidiu o E.Tribunal de Justiça de São Paulo: "COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA Lote de terreno Pretensões de rescisão do contrato e restituição de valores julgadas parcialmente procedentes Rescisão do contrato por iniciativa da compradora (...) Taxa de fruição que não é devida, por se tratar de lote de terreno não edificado Apelação da ré não provida, provida em parte a da autora". (Apelação Cível nº 1008268- 90.2024.8.26.0032. 33ªCâmara de Direito Privado do TJSP. Relator Sá Duarte. Julgada em 16/06/2025). Posto isso, JULGO IMPROCEDENTES as pretensões dos autores e JULGO IMPROCEDENTE a reconvenção. Pela sucumbência recíproca (CPC, art.86), arcarão as partes com as custas processuais rateadas pela metade, suportando cada uma com o pagamento dos honorários do advogado da parte adversária vedada compensação arbitrados nos termos do art.85, §2º, do CPC, em 10% do valor atualizado da causa em desfavor dos autores/reconvindos (observando-se o art.98, §§2º e 3º, do CPC, diante da gratuidade de justiça deferida a fls.174/183) e em 10% do valor atualizado da reconvenção em desfavor da ré/reconvinte. Após o trânsito em julgado, aguarde-se por 30 (trinta) dias a instauração do incidente de cumprimento de sentença, devendo a parte observar o regramento próprio (arts.917, §3º, 1.286, §§2º e 3º, e 1.289 das NSCGJ, e Comunicado nº1789/2017 (Protocolo CPA nº2015/55553 SPI), com requerimento de desencadeamento em apartado e apensado, com o cálculo discriminado do valor devido (CPC/15, art.524). Nada sendo postulado, se em termos, arquivem-se os autos. P.R.I. Taubaté, 27 de junho de 2025. BERNARDO MAIA DIAS DE SOUZA Juiz de Direito - - ADV: HUMBERTO GORDILHO DOS SANTOS NETO (OAB 156392/SP), RAFAEL JOSE SANCHES (OAB 289595/SP), RAFAEL JOSE SANCHES (OAB 289595/SP), RAFAEL JOSE SANCHES (OAB 289595/SP), HUMBERTO GORDILHO DOS SANTOS NETO (OAB 156392/SP), RAFAEL JOSE SANCHES (OAB 289595/SP)

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Processo nº 1042354-75.2025.4.01.3300

ID: 333037661

Tribunal: TRF1 Órgão: 10ª Vara Federal Cível da SJBA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1042354-75.2025.4.01.3300

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

JUCILENE DA SILVA SANTOS

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

MILER REIS DANTAS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1042354-75.2025.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: JUCILE… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1042354-75.2025.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: JUCILENE DA SILVA SANTOS REPRESENTANTES POLO ATIVO: MILER REIS DANTAS - BA50055 POLO PASSIVO: MRV ENGENHARIA E PARTICIPACOES SA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: IVAN ISAAC FERREIRA FILHO - BA14534 SENTENÇA I Trata-se de ação ajuizada por Jucilene da Silva Santos em face de MRV Engenharia e Participações S/A e Caixa Econômica Federal (CEF), visando à rescisão contratual de imóvel adquirido no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), com pedido de indenização por danos morais e materiais, lucros cessantes, repetição de indébito e nulidade de cláusulas contratuais. A autora afirma que firmou contrato para aquisição de imóvel com entrega prevista para 30/09/2020, a qual só teria sido disponibilizada em 13/04/2021, alegando prejuízos decorrentes do atraso e da ausência de entrega das chaves. A MRV contestou, alegando que a entrega ocorreu dentro do prazo contratual estendido pela cláusula de tolerância de 180 dias (29/03/2021) e que a autora não compareceu para a vistoria e retirada das chaves, atribuindo-lhe a culpa pela não formalização da entrega. Devidamente citada, a CEF não apresentou contestação. Sentença da Justiça Estadual, proferida em 19/03/2024, afastou a legitimidade da CEF, julgou improcedentes os pedidos e reconheceu a validade da cláusula de tolerância, entendendo que não houve inadimplemento por parte da MRV. A autora foi condenada em custas e honorários, com exigibilidade suspensa pela justiça gratuita. Posteriormente, decisão da 4ª Câmara Cível do TJBA de 19/02/2025, nos autos da Apelação Cível n.º 8082691-82.2021.8.05.0001, reconheceu a legitimidade da CEF e a competência da Justiça Federal, considerando a atuação ativa da Caixa no contrato e na execução do PMCMV. Após o recebimento dos autos neste juízo, foi deferida a gratuidade à autora, com aproveitamento de todos os atos sem conteúdo decisório, os autos vieram conclusos para julgamento. É o relatório. DECIDO. II Inicialmente, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela construtora e confirmo a legitimidade da CEF, pois além de serem elas responsáveis pela restituição de valores recebidos da parte autora e que aqui se objetiva devolução, firmaram conjuntamente o contrato de mútuo e, na hipótese de rescisão dessa avença, inegavelmente terão sua esfera jurídica atingida pelo decisum. Por sua vez, não há óbice para o deferimento da assistência judiciária gratuita, pois não se comprovou que a parte autora aufere rendimentos superiores o limite estabelecido pela Primeira Seção do TRF1, que assentou o entendimento de que a gratuidade judiciária deverá ser concedida ao requerente que perceba mensalmente valores de até dez salários-mínimos, em face da presunção de pobreza que milita em seu favor[1]. Avançando no exame da questão de fundo, verifico que há direito subjetivo da parte autora de rescindir a avença firmada com a parte ré, por não ser mais de seu interesse a manutenção do negócio jurídico, o qual está submetido às regras do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor. Os fundamentos da MRV não são capazes de elidir a presente conclusão, porquanto o simples fato do contrato de mútuo revestido de alienação fiduciária consistir ato jurídico perfeito, isso não representa óbice para sua resolução, consoante, inclusive, compreensão firmada pelo STJ em sede de recurso repetitivo, verbis: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE COMPRA DE IMÓVEL. DESFAZIMENTO. DEVOLUÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. MOMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: em contratos submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Em tais avenças, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. 2. Recurso especial não provido.” (REsp n. 1.300.418/SC, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 13/11/2013, DJe de 10/12/2013) Por outro lado, a autora afirma na inicial que a rescisão decorre do atraso no prazo entrega do imóvel pela construtora, pugnando seja declarada a nulidade da denominada “cláusula de tolerância”, prevista em contrato caso houvesse atraso na entrega do empreendimento no prazo inicialmente fixado. De início, é importante salientar que, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a denominada “cláusula de tolerância” em contratos dessa espécie, que prevê a possibilidade de atraso na entrega do imóvel, não é abusiva, desde que o prazo máximo de prorrogação não ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias. Confira-se: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO DA OBRA. ENTREGA APÓS O PRAZO ESTIMADO. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. VALIDADE. PREVISÃO LEGAL. PECULIARIDADES DA CONSTRUÇÃO CIVIL. ATENUAÇÃO DE RISCOS. BENEFÍCIO AOS CONTRATANTES. CDC. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. OBSERVÂNCIA DO DEVER DE INFORMAR. PRAZO DE PRORROGAÇÃO. RAZOABILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção, a qual permite a prorrogação do prazo inicial para a entrega da obra. 2. A compra de um imóvel "na planta" com prazo e preço certos possibilita ao adquirente planejar sua vida econômica e social, pois é sabido de antemão quando haverá a entrega das chaves, devendo ser observado, portanto, pelo incorporador e pelo construtor, com a maior fidelidade possível, o cronograma de execução da obra, sob pena de indenizarem os prejuízos causados ao adquirente ou ao compromissário pela não conclusão da edificação ou pelo retardo injustificado na conclusão da obra (arts. 43, II, da Lei nº 4.591/1964 e 927 do Código Civil). 3. No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção, além do período previsto para o término do empreendimento, há, comumente, cláusula de prorrogação excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra, que varia entre 90 (noventa) e 180 (cento e oitenta) dias: a cláusula de tolerância. 4. Aos contratos de incorporação imobiliária, embora regidos pelos princípios e normas que lhes são próprios (Lei nº 4.591/1964), também se aplica subsidiariamente a legislação consumerista sempre que a unidade imobiliária for destinada a uso próprio do adquirente ou de sua família. 5. Não pode ser reputada abusiva a cláusula de tolerância no compromisso de compra e venda de imóvel em construção desde que contratada com prazo determinado e razoável, já que possui amparo não só nos usos e costumes do setor, mas também em lei especial (art. 48, § 2º, da Lei nº 4.591/1964), constituindo previsão que atenua os fatores de imprevisibilidade que afetam negativamente a construção civil, a onerar excessivamente seus atores, tais como intempéries, chuvas, escassez de insumos, greves, falta de mão de obra, crise no setor, entre outros contratempos. 6. A cláusula de tolerância, para fins de mora contratual, não constitui desvantagem exagerada em desfavor do consumidor, o que comprometeria o princípio da equivalência das prestações estabelecidas. Tal disposição contratual concorre para a diminuição do preço final da unidade habitacional a ser suportada pelo adquirente, pois ameniza o risco da atividade advindo da dificuldade de se fixar data certa para o término de obra de grande magnitude sujeita a diversos obstáculos e situações imprevisíveis. 7. Deve ser reputada razoável a cláusula que prevê no máximo o lapso de 180 (cento e oitenta) dias de prorrogação, visto que, por analogia, é o prazo de validade do registro da incorporação e da carência para desistir do empreendimento (arts. 33 e 34, § 2º, da Lei nº 4.591/1964 e 12 da Lei nº 4.864/1965) e é o prazo máximo para que o fornecedor sane vício do produto (art. 18, § 2º, do CDC). 8. Mesmo sendo válida a cláusula de tolerância para o atraso na entrega da unidade habitacional em construção com prazo determinado de até 180 (cento e oitenta) dias, o incorporador deve observar o dever de informar e os demais princípios da legislação consumerista, cientificando claramente o adquirente, inclusive em ofertas, informes e peças publicitárias, do prazo de prorrogação, cujo descumprimento implicará responsabilidade civil. Igualmente, durante a execução do contrato, deverá notificar o consumidor acerca do uso de tal cláusula juntamente com a sua justificação, primando pelo direito à informação. 9. Recurso especial não provido.” (Terceira Turma, REsp 1.582.318/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 12/09/2017, DJe de 21/09/2017) No mesmo sentido: Terceira Turma, REsp 1.727.939/DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/09/2018, DJe de 17/09/2018; Quarta Turma, AgInt no REsp 1.698.519/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 20/09/2018, DJe de 26/9/2018 e Terceira Turma, REsp 1.454.139/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/06/2014, DJe de 17/6/2014. Além disso, a autora alega que não houve justificativa válida para prorrogação do prazo estabelecido, porém, como se sabe, desde o início de 2020 houve grande impacto da pandemia de COVID19, que paralisou a prestação de serviços de forma adequada por meses, requerendo a mais completa reclusão das pessoas em suas residências não pode ser ignorada também no que se refere à construção dessa unidade, interferindo consideravelmente na etapa de conclusão do imóvel. No particular, o contrato firmado pelas partes estabeleceu na cláusula 5 que o imóvel seria entregue em 30/09/2020 e, na cláusula 5.2 haveria ainda um prazo de tolerância de 180 dias, prorrogando-o para 29/03/2021. Por outro lado, os documentos juntados aos autos demonstram que a autora foi notificada da conclusão das obras em março de 2021, portanto, dentro do prazo estabelecido contratualmente e, no mesmo documento estava agendada a vistoria e entrega das chaves para 13/04/2021, pois, por questões operacionais, não se poderia agendar a vistoria e entrega no mesmo dia para todos os adquirentes de unidades no empreendimento. Neste contexto, verifica-se que realmente houve o cumprimento do prazo de obra estabelecido em contrato, tendo em vista que a unidade adquirida estava à disposição da autora desde o dia 11/03/2021, com diversos avisos remetidos ao endereço da adquirente informando as datas disponíveis para o recebimento das chaves, de modo que a recusa em receber as chaves não tem amparo legal. Assim, fica fragilizado o argumento de que a rescisão decorre de culpa exclusiva do vendedor. Neste aspecto, deve ser feita retenção de percentual do montante pago em decorrência do desfazimento da avença por responsabilidade da autora. Nisso, a Corte de Justiça, da mesma forma, já dirimiu a controvérsia neste sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO. PARCELAS PAGAS. RETENÇÃO PARCIAL. CABIMENTO. PERCENTUAL RETIDO. ALTERAÇÃO. SÚMULA N. 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. "A jurisprudência desta Corte tem considerado razoável, em resolução de contrato de compra e venda de imóvel por culpa do comprador, que o percentual de retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas, seja arbitrado entre 10% e 25%, conforme as circunstâncias de cada caso, avaliando-se os prejuízos suportados" (AgInt no AREsp n. 725.986/RJ, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/6/2017, DJe 29/6/2017). (...) 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.388.755/SC, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 9/4/2019, DJe de 7/5/2019) Assim, a rescisão do contrato de compra e venda é um legítimo direito da parte autora, de modo que deve ser acolhida parcialmente a sua pretensão, inclusive com a repetição dos valores adimplidos, mas com a retenção de percentual suficiente para custear os gastos administrativos efetivamente comprovados. Tal percentual fica agora fixado em 10%. Deve ser considerado que o distrato é de instrumento de financiamento habitacional pelo Programa Minha Casa Minha Vida - PMCMV, voltado a pessoas de baixa renda, que além do arguido desinteresse na sua continuidade pelos fatos narrados na exordial, há confessada impossibilidade de manter regular o pagamento do mútuo. Dessa forma, mostra-se pertinente a retenção de quantia para suprir as despesas administrativas decorrentes da formalização do contrato e da sua baixa (por exemplo, registro cartorário), as quais devem ser comprovadas pela parte ré, mas limitada (retenção) a 10% (dez por cento). Ademais, importa consignar, inaplicável aqui a solução adotada pelo STJ no recente julgamento do Tema 1.095 (“Em contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária devidamente registrado em cartório, a resolução do pacto, na hipótese de inadimplemento do devedor, devidamente constituído em mora, deverá observar a forma prevista na Lei nº 9.514/97, por se tratar de legislação específica, afastando-se, por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor”), por se tratar de situação distinta. Por fim, considerando que não foi comprovada qualquer irregularidade na execução do contrato pelas rés em especial a alegada extrapolação do prazo estabelecido para entrega do empreendimento, devem ser afastados os pedidos de condenação delas ao pagamento de danos materiais e morais. III ISTO POSTO, JULGO PROCEDENTES, em parte, OS PEDIDOS da parte autora para: a) Declarar rescindidos os Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda nº 42300575 e de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional Alienação Fiduciária em Garantia, Fianças e outras Obrigações – PMCMV com Recursos do FGTS nº 8.7877.0759725-4, firmados com as rés em 05.12.2019 e 14.01.2020, respectivamente, cuja baixa do registro no respectivo Cartório de Imóveis deverá ser providenciada pela parte ré; b) Cancelar as cobranças mediante débito dos valores devido pela autora em decorrência dos contratos, bem como determinar a parte ré se abster de incluir o nome da autora em cadastros restritivos de crédito, alusivo à eventual dívida oriunda dos ajustes em questão, ou proceder ao imediato cancelamento acaso realizado; c) Condenar a parte ré a restituir à autora, na proporção do que foi pago à cada uma, em parcela única e integralmente, os valores por ela desembolsados para a compra da unidade habitacional, autorizada a retenção do percentual de 10%, para cobrir gastos administrativos realizados e comprovados, nos exatos termos da fundamentação supra, acrescidos de correção monetária, a partir de data de cada pagamento, e juros de mora, estes devidos a partir da citação, nos termos do Manual de Cálculo da Justiça Federal. Diante da certeza do direito subjetivo da parte autora e do risco de lesão à sua esfera jurídica, defiro a tutela de urgência para dar imediata eficácia à obrigação de fazer constante das alíneas “a” e “b” supra, devendo o seu cumprimento ser comprovado em até 30 dias, sob pena de multa. Honorários fixados em 10% sobre o valor da condenação, no caso, o valor a ser restituído à autora (alínea “c” supra), que será quantificado em fase de cumprimento desta sentença, nos termos dos §§3, c/c, o 5º e 4º, II, parte final, todos do art. 85 do CPC. Diante da sucumbência da parte ré em maior proporção, caberá a ela pagar, 70%, do valor dos honorários ao advogado do autor, pro rata e este pagará, os 30% restante aos advogados das rés. Ressalto que a exigibilidade da verba devida pela parte suplicante ficará sujeita às condições do §3º do art. 98 do CPC. Custas na mesma proporção, não incidindo tal obrigação em relação ao demandante, beneficiário da assistência judiciária gratuita. Opostos embargos de declaração, concluir o feito ao gabinete. Interposta apelação, antes do encaminhamento dos autos para o TRF1, intime-se a parte recorrida para responder ao recurso no prazo legal. Transitando em julgado, intime-se a parte credora para promover o cumprimento de sentença devendo o processo aguardar em arquivo a sua iniciativa. Registrada automaticamente. Intimem-se. Salvador/BA, data constante da assinatura eletrônica. CRISTIANO MIRANDA DE SANTANA Juiz Federal [1] AG 1005110-65.2018.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 05/02/2020 PAG

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Processo nº 1042354-75.2025.4.01.3300

ID: 333037664

Tribunal: TRF1 Órgão: 10ª Vara Federal Cível da SJBA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1042354-75.2025.4.01.3300

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MRV ENGENHARIA E PARTICIPACOES SA

Sentença Tipo A

Advogados:

IVAN ISAAC FERREIRA FILHO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1042354-75.2025.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: JUCILE… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1042354-75.2025.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: JUCILENE DA SILVA SANTOS REPRESENTANTES POLO ATIVO: MILER REIS DANTAS - BA50055 POLO PASSIVO: MRV ENGENHARIA E PARTICIPACOES SA e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: IVAN ISAAC FERREIRA FILHO - BA14534 SENTENÇA I Trata-se de ação ajuizada por Jucilene da Silva Santos em face de MRV Engenharia e Participações S/A e Caixa Econômica Federal (CEF), visando à rescisão contratual de imóvel adquirido no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), com pedido de indenização por danos morais e materiais, lucros cessantes, repetição de indébito e nulidade de cláusulas contratuais. A autora afirma que firmou contrato para aquisição de imóvel com entrega prevista para 30/09/2020, a qual só teria sido disponibilizada em 13/04/2021, alegando prejuízos decorrentes do atraso e da ausência de entrega das chaves. A MRV contestou, alegando que a entrega ocorreu dentro do prazo contratual estendido pela cláusula de tolerância de 180 dias (29/03/2021) e que a autora não compareceu para a vistoria e retirada das chaves, atribuindo-lhe a culpa pela não formalização da entrega. Devidamente citada, a CEF não apresentou contestação. Sentença da Justiça Estadual, proferida em 19/03/2024, afastou a legitimidade da CEF, julgou improcedentes os pedidos e reconheceu a validade da cláusula de tolerância, entendendo que não houve inadimplemento por parte da MRV. A autora foi condenada em custas e honorários, com exigibilidade suspensa pela justiça gratuita. Posteriormente, decisão da 4ª Câmara Cível do TJBA de 19/02/2025, nos autos da Apelação Cível n.º 8082691-82.2021.8.05.0001, reconheceu a legitimidade da CEF e a competência da Justiça Federal, considerando a atuação ativa da Caixa no contrato e na execução do PMCMV. Após o recebimento dos autos neste juízo, foi deferida a gratuidade à autora, com aproveitamento de todos os atos sem conteúdo decisório, os autos vieram conclusos para julgamento. É o relatório. DECIDO. II Inicialmente, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela construtora e confirmo a legitimidade da CEF, pois além de serem elas responsáveis pela restituição de valores recebidos da parte autora e que aqui se objetiva devolução, firmaram conjuntamente o contrato de mútuo e, na hipótese de rescisão dessa avença, inegavelmente terão sua esfera jurídica atingida pelo decisum. Por sua vez, não há óbice para o deferimento da assistência judiciária gratuita, pois não se comprovou que a parte autora aufere rendimentos superiores o limite estabelecido pela Primeira Seção do TRF1, que assentou o entendimento de que a gratuidade judiciária deverá ser concedida ao requerente que perceba mensalmente valores de até dez salários-mínimos, em face da presunção de pobreza que milita em seu favor[1]. Avançando no exame da questão de fundo, verifico que há direito subjetivo da parte autora de rescindir a avença firmada com a parte ré, por não ser mais de seu interesse a manutenção do negócio jurídico, o qual está submetido às regras do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor. Os fundamentos da MRV não são capazes de elidir a presente conclusão, porquanto o simples fato do contrato de mútuo revestido de alienação fiduciária consistir ato jurídico perfeito, isso não representa óbice para sua resolução, consoante, inclusive, compreensão firmada pelo STJ em sede de recurso repetitivo, verbis: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE COMPRA DE IMÓVEL. DESFAZIMENTO. DEVOLUÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. MOMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: em contratos submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Em tais avenças, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. 2. Recurso especial não provido.” (REsp n. 1.300.418/SC, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 13/11/2013, DJe de 10/12/2013) Por outro lado, a autora afirma na inicial que a rescisão decorre do atraso no prazo entrega do imóvel pela construtora, pugnando seja declarada a nulidade da denominada “cláusula de tolerância”, prevista em contrato caso houvesse atraso na entrega do empreendimento no prazo inicialmente fixado. De início, é importante salientar que, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a denominada “cláusula de tolerância” em contratos dessa espécie, que prevê a possibilidade de atraso na entrega do imóvel, não é abusiva, desde que o prazo máximo de prorrogação não ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias. Confira-se: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO DA OBRA. ENTREGA APÓS O PRAZO ESTIMADO. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. VALIDADE. PREVISÃO LEGAL. PECULIARIDADES DA CONSTRUÇÃO CIVIL. ATENUAÇÃO DE RISCOS. BENEFÍCIO AOS CONTRATANTES. CDC. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. OBSERVÂNCIA DO DEVER DE INFORMAR. PRAZO DE PRORROGAÇÃO. RAZOABILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção, a qual permite a prorrogação do prazo inicial para a entrega da obra. 2. A compra de um imóvel "na planta" com prazo e preço certos possibilita ao adquirente planejar sua vida econômica e social, pois é sabido de antemão quando haverá a entrega das chaves, devendo ser observado, portanto, pelo incorporador e pelo construtor, com a maior fidelidade possível, o cronograma de execução da obra, sob pena de indenizarem os prejuízos causados ao adquirente ou ao compromissário pela não conclusão da edificação ou pelo retardo injustificado na conclusão da obra (arts. 43, II, da Lei nº 4.591/1964 e 927 do Código Civil). 3. No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção, além do período previsto para o término do empreendimento, há, comumente, cláusula de prorrogação excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra, que varia entre 90 (noventa) e 180 (cento e oitenta) dias: a cláusula de tolerância. 4. Aos contratos de incorporação imobiliária, embora regidos pelos princípios e normas que lhes são próprios (Lei nº 4.591/1964), também se aplica subsidiariamente a legislação consumerista sempre que a unidade imobiliária for destinada a uso próprio do adquirente ou de sua família. 5. Não pode ser reputada abusiva a cláusula de tolerância no compromisso de compra e venda de imóvel em construção desde que contratada com prazo determinado e razoável, já que possui amparo não só nos usos e costumes do setor, mas também em lei especial (art. 48, § 2º, da Lei nº 4.591/1964), constituindo previsão que atenua os fatores de imprevisibilidade que afetam negativamente a construção civil, a onerar excessivamente seus atores, tais como intempéries, chuvas, escassez de insumos, greves, falta de mão de obra, crise no setor, entre outros contratempos. 6. A cláusula de tolerância, para fins de mora contratual, não constitui desvantagem exagerada em desfavor do consumidor, o que comprometeria o princípio da equivalência das prestações estabelecidas. Tal disposição contratual concorre para a diminuição do preço final da unidade habitacional a ser suportada pelo adquirente, pois ameniza o risco da atividade advindo da dificuldade de se fixar data certa para o término de obra de grande magnitude sujeita a diversos obstáculos e situações imprevisíveis. 7. Deve ser reputada razoável a cláusula que prevê no máximo o lapso de 180 (cento e oitenta) dias de prorrogação, visto que, por analogia, é o prazo de validade do registro da incorporação e da carência para desistir do empreendimento (arts. 33 e 34, § 2º, da Lei nº 4.591/1964 e 12 da Lei nº 4.864/1965) e é o prazo máximo para que o fornecedor sane vício do produto (art. 18, § 2º, do CDC). 8. Mesmo sendo válida a cláusula de tolerância para o atraso na entrega da unidade habitacional em construção com prazo determinado de até 180 (cento e oitenta) dias, o incorporador deve observar o dever de informar e os demais princípios da legislação consumerista, cientificando claramente o adquirente, inclusive em ofertas, informes e peças publicitárias, do prazo de prorrogação, cujo descumprimento implicará responsabilidade civil. Igualmente, durante a execução do contrato, deverá notificar o consumidor acerca do uso de tal cláusula juntamente com a sua justificação, primando pelo direito à informação. 9. Recurso especial não provido.” (Terceira Turma, REsp 1.582.318/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 12/09/2017, DJe de 21/09/2017) No mesmo sentido: Terceira Turma, REsp 1.727.939/DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/09/2018, DJe de 17/09/2018; Quarta Turma, AgInt no REsp 1.698.519/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 20/09/2018, DJe de 26/9/2018 e Terceira Turma, REsp 1.454.139/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/06/2014, DJe de 17/6/2014. Além disso, a autora alega que não houve justificativa válida para prorrogação do prazo estabelecido, porém, como se sabe, desde o início de 2020 houve grande impacto da pandemia de COVID19, que paralisou a prestação de serviços de forma adequada por meses, requerendo a mais completa reclusão das pessoas em suas residências não pode ser ignorada também no que se refere à construção dessa unidade, interferindo consideravelmente na etapa de conclusão do imóvel. No particular, o contrato firmado pelas partes estabeleceu na cláusula 5 que o imóvel seria entregue em 30/09/2020 e, na cláusula 5.2 haveria ainda um prazo de tolerância de 180 dias, prorrogando-o para 29/03/2021. Por outro lado, os documentos juntados aos autos demonstram que a autora foi notificada da conclusão das obras em março de 2021, portanto, dentro do prazo estabelecido contratualmente e, no mesmo documento estava agendada a vistoria e entrega das chaves para 13/04/2021, pois, por questões operacionais, não se poderia agendar a vistoria e entrega no mesmo dia para todos os adquirentes de unidades no empreendimento. Neste contexto, verifica-se que realmente houve o cumprimento do prazo de obra estabelecido em contrato, tendo em vista que a unidade adquirida estava à disposição da autora desde o dia 11/03/2021, com diversos avisos remetidos ao endereço da adquirente informando as datas disponíveis para o recebimento das chaves, de modo que a recusa em receber as chaves não tem amparo legal. Assim, fica fragilizado o argumento de que a rescisão decorre de culpa exclusiva do vendedor. Neste aspecto, deve ser feita retenção de percentual do montante pago em decorrência do desfazimento da avença por responsabilidade da autora. Nisso, a Corte de Justiça, da mesma forma, já dirimiu a controvérsia neste sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO. PARCELAS PAGAS. RETENÇÃO PARCIAL. CABIMENTO. PERCENTUAL RETIDO. ALTERAÇÃO. SÚMULA N. 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. "A jurisprudência desta Corte tem considerado razoável, em resolução de contrato de compra e venda de imóvel por culpa do comprador, que o percentual de retenção, pelo vendedor, de parte das prestações pagas, seja arbitrado entre 10% e 25%, conforme as circunstâncias de cada caso, avaliando-se os prejuízos suportados" (AgInt no AREsp n. 725.986/RJ, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/6/2017, DJe 29/6/2017). (...) 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.388.755/SC, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 9/4/2019, DJe de 7/5/2019) Assim, a rescisão do contrato de compra e venda é um legítimo direito da parte autora, de modo que deve ser acolhida parcialmente a sua pretensão, inclusive com a repetição dos valores adimplidos, mas com a retenção de percentual suficiente para custear os gastos administrativos efetivamente comprovados. Tal percentual fica agora fixado em 10%. Deve ser considerado que o distrato é de instrumento de financiamento habitacional pelo Programa Minha Casa Minha Vida - PMCMV, voltado a pessoas de baixa renda, que além do arguido desinteresse na sua continuidade pelos fatos narrados na exordial, há confessada impossibilidade de manter regular o pagamento do mútuo. Dessa forma, mostra-se pertinente a retenção de quantia para suprir as despesas administrativas decorrentes da formalização do contrato e da sua baixa (por exemplo, registro cartorário), as quais devem ser comprovadas pela parte ré, mas limitada (retenção) a 10% (dez por cento). Ademais, importa consignar, inaplicável aqui a solução adotada pelo STJ no recente julgamento do Tema 1.095 (“Em contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária devidamente registrado em cartório, a resolução do pacto, na hipótese de inadimplemento do devedor, devidamente constituído em mora, deverá observar a forma prevista na Lei nº 9.514/97, por se tratar de legislação específica, afastando-se, por conseguinte, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor”), por se tratar de situação distinta. Por fim, considerando que não foi comprovada qualquer irregularidade na execução do contrato pelas rés em especial a alegada extrapolação do prazo estabelecido para entrega do empreendimento, devem ser afastados os pedidos de condenação delas ao pagamento de danos materiais e morais. III ISTO POSTO, JULGO PROCEDENTES, em parte, OS PEDIDOS da parte autora para: a) Declarar rescindidos os Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda nº 42300575 e de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional Alienação Fiduciária em Garantia, Fianças e outras Obrigações – PMCMV com Recursos do FGTS nº 8.7877.0759725-4, firmados com as rés em 05.12.2019 e 14.01.2020, respectivamente, cuja baixa do registro no respectivo Cartório de Imóveis deverá ser providenciada pela parte ré; b) Cancelar as cobranças mediante débito dos valores devido pela autora em decorrência dos contratos, bem como determinar a parte ré se abster de incluir o nome da autora em cadastros restritivos de crédito, alusivo à eventual dívida oriunda dos ajustes em questão, ou proceder ao imediato cancelamento acaso realizado; c) Condenar a parte ré a restituir à autora, na proporção do que foi pago à cada uma, em parcela única e integralmente, os valores por ela desembolsados para a compra da unidade habitacional, autorizada a retenção do percentual de 10%, para cobrir gastos administrativos realizados e comprovados, nos exatos termos da fundamentação supra, acrescidos de correção monetária, a partir de data de cada pagamento, e juros de mora, estes devidos a partir da citação, nos termos do Manual de Cálculo da Justiça Federal. Diante da certeza do direito subjetivo da parte autora e do risco de lesão à sua esfera jurídica, defiro a tutela de urgência para dar imediata eficácia à obrigação de fazer constante das alíneas “a” e “b” supra, devendo o seu cumprimento ser comprovado em até 30 dias, sob pena de multa. Honorários fixados em 10% sobre o valor da condenação, no caso, o valor a ser restituído à autora (alínea “c” supra), que será quantificado em fase de cumprimento desta sentença, nos termos dos §§3, c/c, o 5º e 4º, II, parte final, todos do art. 85 do CPC. Diante da sucumbência da parte ré em maior proporção, caberá a ela pagar, 70%, do valor dos honorários ao advogado do autor, pro rata e este pagará, os 30% restante aos advogados das rés. Ressalto que a exigibilidade da verba devida pela parte suplicante ficará sujeita às condições do §3º do art. 98 do CPC. Custas na mesma proporção, não incidindo tal obrigação em relação ao demandante, beneficiário da assistência judiciária gratuita. Opostos embargos de declaração, concluir o feito ao gabinete. Interposta apelação, antes do encaminhamento dos autos para o TRF1, intime-se a parte recorrida para responder ao recurso no prazo legal. Transitando em julgado, intime-se a parte credora para promover o cumprimento de sentença devendo o processo aguardar em arquivo a sua iniciativa. Registrada automaticamente. Intimem-se. Salvador/BA, data constante da assinatura eletrônica. CRISTIANO MIRANDA DE SANTANA Juiz Federal [1] AG 1005110-65.2018.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 05/02/2020 PAG

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Processo nº 1017843-13.2025.4.01.3300

ID: 297580039

Tribunal: TRF1 Órgão: 10ª Vara Federal Cível da SJBA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1017843-13.2025.4.01.3300

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

MARIA ANGELICA PINHEIRO SANTOS SANTANA

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

CARLOS ZENANDRO RIBEIRO SANT ANA

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EDDIE PARISH SILVA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1017843-13.2025.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: MARIA … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1017843-13.2025.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: MARIA ANGELICA PINHEIRO SANTOS SANTANA REPRESENTANTES POLO ATIVO: EDDIE PARISH SILVA - BA23186 e CARLOS ZENANDRO RIBEIRO SANT ANA - BA27022 POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: RICARDO LUIZ SANTOS MENDONCA - BA13430 SENTENÇA I Trata-se de ação de cobrança cumulada com indenização por danos morais proposta por Maria Angélica Pinheiro Santos Santana em face da União e do Banco do Brasil S.A., em que a autora pleiteia o reconhecimento de diferença decorrente de ausência ou falha na atualização monetária dos saldos de sua conta PASEP, notadamente dos expurgos inflacionários, e em razão de saques indevidos, bem como a indenização por danos morais decorrentes da frustração gerada pela suposta falha dos réus. Afirma a parte autora que, ao efetuar o saque de sua conta do PASEP em 2025, recebeu apenas o montante de R$ 2.874,49, valor que reputa irrisório diante do tempo de contribuição e das expectativas formadas. Após requerer e obter extrato detalhado da conta em fevereiro de 2025, identificou uma diferença de R$ 73.781,75. Pleiteia, além da condenação dos réus ao pagamento dessa diferença, indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00, fixando o valor total da causa em R$ 93.781,75. Requereu ainda a concessão dos benefícios da justiça gratuita, a prioridade de tramitação em razão da idade, a adoção do juízo 100% digital, a inversão do ônus da prova e a produção pericial contábil. Em despacho proferido em 20/03/2025, o Juízo deferiu os pedidos de gratuidade da justiça e prioridade de tramitação, além de determinar a citação das rés. Em sua contestação, o Banco do Brasil S.A. alegou, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, a prescrição quinquenal e, ainda, impugnou o deferimento dos benefícios da gratuidade da justiça. No mérito, sustentou, em apertada síntese, que atua como mero gestor do PASEP, seguindo estritamente as determinações legais e regulamentares, sem ingerência sobre os critérios de atualização monetária. Rechaçou qualquer irregularidade no lançamento dos valores e a existência de dano moral. A União, por sua vez, também apresentou contestação requerendo inicialmente a suspensão do feito por força do IRDR 71-TO (2020/0276752-2). Suscitou, ainda, preliminar de ilegitimidade passiva e de prescrição e, no mérito em sentido estrito, alegou a inexistência de qualquer ilicitude em sua conduta. Requereu a extinção do feito sem resolução de mérito e, subsidiariamente, a improcedência total dos pedidos. Em replica, a parte autora pugnou pela rejeição das preliminares, reiterou os argumentos da inicial e requereu a realização de perícia contábil. É o relatório. II Inicialmente, diante do julgamento em definitivo do IRDR 71-TO (2020/0276752-2), vinculado ao Tema 1.150 do STJ, indefiro o pedido de suspensão postulado pela União. Quanto ao benefício da assistência judiciária gratuita, não há óbice em sua concessão, pois não se comprovou que a parte autora aufere rendimentos superiores o limite estabelecido pela Primeira Seção do TRF11, que assentou o entendimento de que a gratuidade judiciária deverá ser concedida ao requerente que perceba mensalmente valores de até dez salários-mínimos, em face da presunção de pobreza que milita em seu favor. Recorde-se, ainda, que a legitimidade consiste no atributo jurídico conferido a alguém para atuar no contraditório e discutir determinada situação jurídica litigiosa. Note-se que, para verificar se há legitimidade é preciso antes ver o que será discutido em juízo. Dessa forma, se não for estabelecida uma relação entre o legitimado e o que será discutido, não haverá legitimidade para a discussão na causa. Não é por outra razão que Fredie Didier defende que "a legitimidade é verificada a partir daquilo que é concretamente discutido" (Curso de direito processual civil. v.1. JusPodivm, 2011). E, na situação concreta, a pertinência subjetiva da União se verifica, na medida em que o art. 1º do Decreto-Lei 2.052/1983 atribuiu-lhe competência para a cobrança dos valores das contribuições para o Fundo de Participação PIS/PASEP, sendo responsável pelos depósitos nas contas individuais, enquanto compete ao Banco do Brasil, depositário dos valores, a aplicação dos índices de correção enquanto as cifras se encontravam em seu poder. Quanto ao Banco do Brasil, o STJ, ao julgar o Tema 1.150, firmou compreensão que “o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa”. Desse modo, tanto a União, quanto o Banco do Brasil, devem compor o polo passivo, sendo patente, por conseguinte, a competência deste Juízo para dirimir a lide. Quanto ao lapso prescricional, a Corte Especial decidiu que o prazo aplicável à revisão do PIS/PASEP é de 10 anos, nos termos do artigo 205 do Código Civil. Ademais, estabeleceu-se que o termo inicial do prazo prescricional se dá a partir da ciência, comprovada, das alegadas incorreções ou desvios nos valores das contas vinculadas, o que ocorreu quando do saque. Na presente situação, a ciência das supostas incorreções se deu quando do saque integral da conta PASEP, em 22.11.2017, portanto, em prazo inferior ao decêndio que antecede a propositura da ação (Id 2177483949, fl. 3). Com tais considerações, rejeito a preliminar de mérito. Suplantadas tais questões prévias, no mérito em sentido estrito, verifico que a controvérsia cinge-se ao índice de correção dos valores depositados na conta do PIS/PASEP e a saques realizados na aludida conta, que autor reputa irregulares. Sobre o tema em discussão, importa registrar que os servidores públicos civis e militares, de 1970 até 1988, tão logo passassem a integrar os quadros da Administração Pública, possuíam o direito de serem incluídos no Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP), criado pela Lei Complementar nº 8, de 03.12.1970, programa esse que tinha o objetivo de propiciar aos servidores públicos participação na receita dos órgãos e entidades integrantes da Administração Pública Direta e Indireta, nos mesmos moldes do que existia com relação ao PIS, instituído meses antes pela Lei Complementar nº 7/1970, sendo este último em benefício dos trabalhadores do setor privado. Em cumprimento ao referido programa, anualmente eram depositadas nas respectivas contas individuais de cada servidor público civil ou militar um determinado valor denominado cota, a título de participação no programa, calculada proporcionalmente ao tempo de serviço registrado na conta e ao salário anual do servidor público, sendo, todavia, que o saque total dos valores depositados ficava condicionado à ocorrência de um dos eventos referenciados na Lei Complementar nº 8/1970 (aposentadoria/reserva, invalidez e casamento do servidor). Posteriormente, o PASEP foi unificado com o PIS pela Lei Complementar nº 26/1975, garantindo que a unificação não afetaria os saldos das contas individuais existentes até então em ambos os programas, como também manteve aquelas hipóteses para levantamento do saldo. Ocorre que, com o advento da Constituição de 1988, a arrecadação decorrente das contribuições para o PIS/PASEP deixou de se destinar à formação do patrimônio do servidor público civil/militar e passou a ter como finalidade única o financiamento do programa do seguro desemprego e do abono salarial (CF, art. 239). Todavia, a Constituição Federal de 1988 preservou, em favor dos servidores públicos participantes, o patrimônio acumulado até então em suas respectivas contas individuais, inclusive mantendo os critérios de saque nas situações previstas em lei, com exceção da retirada por motivo de casamento, que deixou de ser fato gerador para o levantamento das cotas (CF, art. 239, § 2º). Assim, conclui-se que apenas os servidores civis e militares que ingressaram nos quadros da Administração Pública até 05 de outubro de 1988 (promulgação da Constituição Federal) remanesceram inscritos no PASEP, sendo, portanto, titulares das cotas que em seu favor foram depositadas até aquela data, as quais vêm sendo levantadas conforme a ocorrência dos respectivos fatos geradores, principalmente a aposentadoria do servidor público civil e a transferência para reserva remunerada do servidor público militar. Por seu turno, quanto à remuneração desses saldos existentes, têm-se que, anualmente, o PASEP promove a atualização monetária, paga juros e distribui os resultados das aplicações dos recursos administrados aos participantes do programa, sendo que as quantias pagas sob forma de juros e distribuição de resultados podem ser sacadas ao final de cada exercício financeiro. Nesse sentido, confiram-se os seguintes dispositivos: Lei Complementar nº 26, de 11 de setembro de 1975: Art. 3º - Após a unificação determinada no art. 1º, as contas individuais dos participantes passarão a ser creditadas: a) pela correção monetária anual do saldo credor, obedecidos os índices aplicáveis às Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN); b) pelos juros mínimos de 3% (três por cento) calculados anualmente sobre o saldo credor corrigido; c) pelo resultado líquido adicional das operações realizadas com recursos do PISPASEP, deduzidas as despesas administrativas e as provisões de reserva cuja constituição seja indispensável. Art. 4º - As importâncias creditadas nas contas individuais dos participantes do PIS-PASEP são inalienáveis, impenhoráveis e, ressalvado o disposto nos parágrafos deste artigo, indisponíveis por seus titulares. §1º Fica disponível a qualquer titular da conta individual dos participantes do PIS/Pasep o saque do saldo até 29 de junho de 2018 e, após essa data, aos titulares enquadrados nos seguintes casos: I - atingida a idade de 60 (sessenta) anos; II - aposentadoria; III - transferência para a reserva remunerada ou reforma; IV - invalidez do titular ou de seu dependente; V - titular do benefício de prestação continuada, de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; ou VI - titular ou seu dependente com tuberculose ativa, hanseníase, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante), Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids) ou portador do vírus HIV, hepatopatia grave, contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada, ou outra doença grave indicada em ato do Poder Executivo. §2º - Será facultada, no final de cada exercício financeiro posterior da abertura da conta individual, a retirada das parcelas correspondentes aos créditos de que tratam as alíneas b e c do art. 3º. Decreto nº 4.751, de 17 de junho de 2003: Art. 4º No final de cada exercício financeiro, as contas individuais dos participantes do PIS-PASEP serão creditadas das quantias correspondentes: I - à aplicação da atualização monetária sobre os respectivos saldos credores verificados ao término do exercício financeiro anterior; II - à incidência de juros sobre os respectivos saldos credores atualizados, verificados ao término do exercício financeiro anterior; e III - ao resultado líquido adicional das operações financeiras realizadas, verificado ao término do exercício financeiro anterior. Art. 5º É facultada, no final de cada exercício financeiro posterior ao da abertura da conta individual, a retirada pelos participantes dos créditos correspondentes às parcelas a que se referem os incisos II e III do art. 4º, que tenham sido feitos nas respectivas contas individuais. Lei nº 9.365, de 16 de dezembro de 1996 Art. 4º Os recursos do Fundo de Participação PIS-PASEP, do Fundo de Amparo ao Trabalhador e do Fundo da Marinha Mercante, repassados ao BNDES ou por este administrados e destinados a financiamentos contratados a partir de 1º de dezembro de 1994, terão como remuneração nominal, a partir daquela data, a TJLP do respectivo período, ressalvado o disposto no § 1º do art. 5º e nos arts. 6º e 7º desta Lei. Parágrafo único. O BNDES transferirá, nos prazos legais, ao Fundo de Participação PIS-PASEP e ao Fundo de Amparo ao Trabalhador o valor correspondente à TJLP aludida no caput deste artigo, limitada a seis por cento ao ano, capitalizada a diferença, podendo o Conselho Monetário Nacional, após manifestação favorável do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador - CODEFAT e do Conselho Diretor do Fundo de Participação PISPASEP, alterar esse limite. Destaque-se que a forma de remuneração do PASEP se encontra expressamente discriminada no sítio eletrônico do Tesouro Nacional, onde há listagem especificando quais índices são aplicáveis a casos como o presente. São esses, pois, diante de expressa determinação legal, os parâmetros a serem adotados para fins de remuneração dessas contas. Ademais, insta registrar que o PIS/PASEP tem natureza estatutária, e não contratual, razão pela qual é indevida qualquer forma de atualização das contas não preconizada em lei. Desse modo, incabível o acolhimento de pretensão para ver, contra legem, modificada a forma de correção dos saldos pela TJLP para o IPCA ou qualquer outro índice não estabelecido na legislação, inclusive de aplicação dos denominados expurgos inflacionários (IPC). Não cabe ao Poder Judiciário substituir índice de correção monetária, quando a lei já o preconiza. Essa foi a compreensão do STJ ao dirimir a controvérsia sobre a correção monetária do FGTS nos Recursos Especiais 1614874/SC e 1381683/PE, cujas razões aplicam-se in totum a este caso. Daqueles julgamentos emanou a tese 731, que possui a seguinte redação: “A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice”. Conforme antiga regra de hermenêutica, “onde há o mesmo fundamento haverá o mesmo direito” ou “onde há a mesma razão de ser, deve prevalecer a mesma razão de decidir”, até porque ao dispor sobre a produção jurisprudencial a ser observada pelos juízes e pelos tribunais, o CPC/2015 arrolou, no artigo 927, caput, figuras que englobam, na visão do processualista Alexandre Câmara, os fundamentos determinantes da decisão[1]. Esse tem sido o entendimento adotado pelo TRF4 no julgado abaixo: “ADMINISTRATIVO. CONTA DO PIS/PASEP. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. Os índices de correção monetária e percentual de juros aplicáveis às contas do PASEP são os previstos na Lei n° 9.365/1996, que estabelecem a correção pela Taxa de Juros de Longo Prazo, em substituição à Taxa Referencial, a partir de 1994. Possuindo o PIS/PASEP natureza estatutária, e não contratual, é indevida qualquer forma de atualização das contas não prevista em lei [...]”. (TRF4, AC 5017814-64.2019.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 03/10/2019) No mesmo sentido: AC nº 5014091-57.2019.4.03.6100, DJEN de 01/04/2024 (TRF3). Logo, não cabe ao Poder Judiciário determinar a aplicação de índices de juros e de correção monetária a saldo individualizado do PASEP em descompasso àqueles estritamente previstos pela norma de regência, eis que decorrem de escolhas inerentes à política econômica veiculada por lei ou regulamento. Isso já não fosse bastante, a parte autora não apresentou qualquer indício de inconsistência do creditamento do PASEP, nem da ausência de correção do saldo pela TJLP e, tampouco, dos supostos saques indevidos, inexistindo verossimilhança em suas alegações que justifique a inversão do ônus probatório. Por outro lado, o extrato acostado à inicial revela quatro aspectos relevantes, a saber: (a) a distribuição dos créditos do PASEP foram realizados anualmente; b) regular incidência de correção monetária e de rendimentos (c) os rendimentos anuais previstos no art. 3º, da Lei Complementar nº 26/1975 foram regularmente creditados em favor da servidora, durante vários e sucessivos anos, diretamente em sua folha de pagamento, conforme extratos de movimentação contábil do PASEP (“PGTO RENDIMENTO FOPAG” e “PGTO RENDIMENTO C/C”); d) regular “DISTRIBUIÇÃO DE RESERVAS”; (Id 2170772704). No mesmo sentido, merecem destaque os pertinentes esclarecimentos extraídos da contestação do Banco do Brasil: 28. Evidente o equívoco da parte autora ao interpretar seus extratos da conta PASEP, ao alegar que não ocorrera a atualização do saldo de forma devida e que teriam ocorrido saques ou desfalques de responsabilidade do Banco do Brasil. 29. Cumpre esclarecer que os participantes do PASEP, correntistas do Banco do Brasil e os vinculados às entidades empregadoras conveniados com o Banco do Brasil para realizar o PASEP-FOPAG têm seus rendimentos pagos em sua conta corrente/poupança ou na folha de pagamento na época determinada pelo Conselho Diretor do PIS-PASEP, conforme previsão do art. 4º A, da Lei Complementar nº 26/75, com redação alterada pela Lei 13.677/18. 30. Dessa feita, como demonstra o extrato anexo, a parte autora, ao longo dos anos, recebeu todos os rendimentos e atualizações anuais do saldo principal via FOPAG (folha de pagamento), ou crédito em conta corrente, conforme documentos em anexo, razão pela qual tais rendimentos e atualizações não acresceram, significativamente, ao saldo principal. 31. Assim, na data de 22/11/2017, houve o pagamento do saldo principal do PIS/PASEP no valor de R$2.874,44 (dois mil, oitocentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos) . (...) 70. De acordo com a legislação do Fundo PIS-PASEP (Lei Complementar nº 26/1975), é facultado retirar anualmente as parcelas correspondentes aos juros de 3% e ao resultado líquido adicional (RLA – rendimentos). Tal questão é facilmente verificável nos lançamentos dos extratos bancários do Banco Réu se o participante recebeu, uma vez por ano, via folha de pagamento e /ou crédito em conta corrente, o valor correspondente aos rendimentos (juros e RLA), conforme demonstrado abaixo a título de exemplo. 71. Outra questão que também deveria ter sido considerada pela parte Autora antes do ajuizamento da demanda em questão é a correta conversão do Plano Real, que passou a vigorar em 01 de julho de 1994, uma vez que nos extratos carreados aos autos consta como débito, mas na verdade é apenas a conversão da moeda para o valor nominal. 72. Como se pode constatar, na maioria dos débitos há informação de que os valores debitados foram creditados na folha de pagamento do autor." Acrescente-se que, a despeito de a parte autora alegar não ter se beneficiado dos supracitados pagamentos realizados a título de rendimentos anuais do PASEP, não se desincumbiu do ônus de apresentar extratos de suas contas bancárias referentes aos períodos apontados ou qualquer resistência em seu fornecimento, a fim de demonstrar a inexistência dos referidos créditos. Tal omissão é relevante, pois os lançamentos indicados nos extratos do PASEP consignam expressamente que os valores foram pagos mediante crédito em folha de pagamento ou diretamente em conta bancária vinculada à autora. A ausência de documentação bancária própria que pudesse infirmar tal assertiva fragiliza, ainda mais, as alegações postas na inicial. Nessa perspectiva, não se pode presumir a ocorrência de desfalques ou omissões a partir de alegações genéricas e desprovidas de documentação idônea, sobretudo quando a comprovação negativa de tais eventos se encontra sob a esfera de disponibilidade probatória da parte autora. Em conclusão, a demandante não se desincumbiu do ônus processual de comprovar quaisquer fatos ou circunstâncias que constituam direito subjetivo seu, a teor do artigo 373, I, do CPC. E como de conhecimento geral, o fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente, conforme o velho brocardo jurídico: allegatio et non probatio, quasi non allegatio. Ademais, conforme amplamente exposto, suas alegações não são verossímeis, não havendo se cogitar em inversão do ônus da prova. Ademais, enquanto pessoa jurídica de direito público, à União cabe o dever de observância ao princípio da legalidade, não tendo a parte autora demonstrado qualquer irregularidade na sua conduta. Por fim, não tendo sido demonstrada conduta irregular dos réus na condução dos ajustes e gerenciamento das contas, impertinente a indenização pretendida a título de reparação moral. III ISTO POSTO, nos termos do art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. Sem despesas processuais em reembolso, ante o deferimento da assistência judiciária gratuita à parte autora. Honorários de sucumbência a cargo da parte requerente, fixados no percentual mínimo sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 4º, III, do CPC, com exigibilidade suspensa conforme o art. 98, § 3º, do CPC. Deixo registrado que o art. 1.025 do CPC/2015 adotou a tese do prequestionamento ficto, de modo que a simples menção do tema nas postulações das partes atende à referida finalidade. Opostos embargos de declaração, voltem-me. Interposta apelação, antes da remessa ao Tribunal, intime-se a parte recorrida para respondê-la no prazo legal. Transitando em julgado sem que tenha havido alteração nesta sentença, arquivem-se. Intimem-se. Salvador/BA, data constante da assinatura eletrônica. CRISTIANO MIRANDA DE SANTANA Juiz Federal [1] AG 1005110-65.2018.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 05/02/2020 [2] CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 442 e 444.

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