Processo nº 5015222-94.2025.4.04.0000
ID: 315353569
Tribunal: TRF4
Órgão: SECRETARIA DA 4a. SEÇÃO
Classe: REVISãO CRIMINAL
Nº Processo: 5015222-94.2025.4.04.0000
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
IAN ANDERSON STAFFA MALUF DE SOUZA
OAB/PR XXXXXX
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Revisão Criminal (Seção) Nº 5015222-94.2025.4.04.0000/PR
REQUERENTE
: JOSE RODRIGO GARCETE CANO
ADVOGADO(A)
: IAN ANDERSON STAFFA MALUF DE SOUZA (OAB PR046769)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de revisão c…
Revisão Criminal (Seção) Nº 5015222-94.2025.4.04.0000/PR
REQUERENTE
: JOSE RODRIGO GARCETE CANO
ADVOGADO(A)
: IAN ANDERSON STAFFA MALUF DE SOUZA (OAB PR046769)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de revisão criminal ajuizada pela defesa técnica de José Rodrigo Garcete Cano, contra condenação a si imposta, nos autos da Apelação Criminal nº 5011652-80.2024.4.04.7002, (transitado em julgado em 24/03/2025) (
processo 5011652-80.2024.4.04.7002/TRF4, evento 33, CERT1
), sendo fixada a pena no montante de 6 anos, 3 meses e 25 dias de reclusão, em regime fechado, por incurso nos delitos do artigo 33,
caput
, c/c o artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº. 11.343/2006.
A defesa técnica embasa a pretensão no art. 621, I do Código de Processo Penal, aduzindo, em síntese:
A elevação da pena-base pela quantidade do entorpecente, em contrariedade ao artigo 42 da Lei nº 11.343 de 2006. Aduz que a maconha, embora apreendida em alta quantidade, é a substância que menos prejudica a saúde dos usuários, dentro do rol da ANVISA, sendo que o artigo 42 da Lei 11.343 de 2006 prevê a referida circunstância de forma conjunta, e não separada;
A aplicação da minorante do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343 de 2006, no patamar máximo de 2/3 (dois terços), porque não comprovado o liame subjetivo, com estabilidade e permanência voltada ao cometimento de crimes graves, entre o acusado e as pessoas que o contrataram, tendo-se tão somente, quando muito, concurso eventual de agentes ou crime esporádico cometido de forma organizada. Assevera não existir nenhuma prova de que o acusado integre organização criminosa, sendo certo que se trata de réu primário;
A fixação do regime fechado, sem a devida fundamentação idônea.
Com base em tais argumentos, ao final, requer a aplicação da causa de diminuição de pena referida, no seu patamar máximo; bem como a alteração do regime prisional.
É o breve relatório.
Decido.
É sabido que a revisão criminal é ação autônoma e exclusiva da defesa em oponibilidade à sentença transitada em julgado. Guilherme de Souza Nucci, na obra Manual de Processo Penal e Execução Penal, 3ed. São Paulo:RT, 2007, p. 871/872, ensina que a revisão
criminal "é uma ação penal de natureza constitutiva e sui generis, de competência originária dos tribunais, destinada a rever decisão condenatória, com trânsito em julgado, quando ocorreu erro judiciário.
"
No que tange às hipóteses autorizadoras para a propositura da revisional, o art. 621 do Código de Processo Penal estabelece:
Art. 621 - A revisão dos processos findos será admitida:
I -
quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos
;
II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;
III - quando após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que autorize diminuição especial da pena.
A pretendida hipótese do inc. I do art. 621 do CPP (condenação contrária a evidência dos autos) exige demonstração direta e clara, como divórcio entre os elementos probatórios existentes nos autos e as conclusões adotadas pelo decreto condenatório.
Quanto à hipótese do inciso II do art. 621 do CP, que dá azo à revisão criminal para eventual absolvição ou diminuição de pena, tem por base o fato de o Juiz ou Tribunal fundamentar a decisão condenatória em uma prova que, após o trânsito em julgado, verificou-se ser evidentemente falsa.
Sabe-se, ainda, que a finalidade da revisão é corrigir erros de fato ou de direito ocorridos em processos findos, quando se encontrem provas da inocência ou de circunstância que devesse ter influído no andamento da reprimenda. Nada mais é que a desconstituição da coisa julgada ante a prevalência do princípio da verdade real sobre a verdade formal. Para que seja acolhida, há verdadeira inversão do ônus
probandi
, cabendo ao requerente demonstrar a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no art. 621 e 626, ambos do Código de Processo Penal.
Sobre a matéria, extrai-se também da doutrina de Julio Fabbrini Mirabete, in Processo Penal, 5ª ed., Atlas, SP, p. 667:
A revisão não é uma segunda apelação, não se prestando à mera reapreciação da prova já examinada pelo Juízo de primeiro grau e, eventualmente, de segundo, exigindo que o requerente apresente com o pedido, elementos probatórios que desfaçam o fundamento da condenação
, como, por exemplo, a retratação da vítima. Devem elas ser positivas. Demonstrar a evidência do que por elas se pretende provar. Há na revisão, em verdade, uma inversão do ônus da prova, e
os elementos probatórios devem ter poder conclusivo e demonstrar cabalmente a inocência do condenado ou a circunstância que o favoreça, não bastando aquelas que apenas debilitam a prova dos autos ou causam dúvidas no espírito dos julgadores.
Logo, a revisão do processo criminal revela-se inadequada quando a matéria arguida depende de análise minudente acerca da interpretação conferida pelo julgador ao diploma normativo ou às provas coligidas.
No que tange à revisão da dosimetria estabelecida em condenações transitadas em julgado, o redimensionamento da pena deve ser admitido com máxima cautela, somente tendo cabimento na hipótese de flagrante e injusta ilegalidade.
Efetivamente, qualquer modificação na dosimetria apenas resta autorizada se houver constatação, de plano, de erro no sistema trifásico ou equívoco na quantificação ou valoração do
quantum,
não sendo admitida a incursão na seara dos elementos fáticos e jurídicos levados em consideração pelo julgador para o estabelecimento da reprimenda, até porque há certa discricionariedade para a aplicação da pena pelo magistrado.
De toda sorte, há de ser ressaltado que se reconhece ao juiz certo grau de discricionariedade na dosimetria da pena, devendo-se ter em conta que tal discricionariedade não deve, em momento algum, confundir-se com arbitrariedade e com estabelecimento de quantidades de sanções de forma desmotivada ou imoderada.
Nesse âmbito, só haverá redução da pena quando
ocorrer flagrante erro
na análise das vetoriais do art. 59 do CP, em eventual aplicação de
causa de diminuição ou de aumento
e/ou se porventura alguma hipótese não foi apreciada na sentença ou o foi em decisão contrária ao conjunto probatório coligido e a texto de lei.
Na hipótese, colhe-se do voto condutor do acórdão ora impugnado (com destaque nos pontos questionados pelo revisionando):
5. Dosimetria
5.1. Considerações iniciais
Em relação à carga a ser atribuída a cada vetorial, quando da primeira fase dosimetria, a Quarta Seção desta Corte vem entendendo que inexiste um critério matemático rígido, de modo que tal
quantum
é submetido à discricionariedade do julgador, que examinará o valor que cada vetorial apresenta no caso concreto. Nessa direção:
"DIREITO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ART. 33, C/C, ART. 40, INCISO I, DA LEI 11.343/06. DIFICULDADES ECONÔMICAS. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE. DOSIMETRIA. CRITÉRIOS. REFORMA. 1. A conduta de introduzir entorpecentes arrolados na lista de substâncias sujeitas a controle especial veiculada na Portaria Nº 344 da ANVISA em território nacional tipifica a conduta do art. 33 c/c art. 40, inciso I, da Lei 11.343/06. 2. A alegação de dificuldade econômica, geradora de possível excludente de culpabilidade (inexigibilidade de conduta diversa), para além de implicar ônus probatório exclusivo da defesa, há de estar amparada em robusto conjunto probatório, principalmente documental, uma vez que deve ser analisada a partir de circunstâncias objetivas. 3. Ao magistrado, valendo-se das balizas normativas estabelecidas de forma bastante detalhada pelo Código Penal, cabe a tarefa de individualizar a pena de forma proporcional à conduta praticada pelo réu. Não há critérios matemáticos a serem adotados. 4. Ao Tribunal cabe realizar intervenção apenas quando houver nítido descompasso entre os critérios utilizados na dosimetria e os fatos em julgamento. (TRF4, ACR 5000168-72.2018.4.04.7004, OITAVA TURMA, Relator para Acórdão LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 12/04/2019)
DIREITO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, C/C 40, I, DA LEI 11.343/06. DOSIMETRIA DA PENA. RÉU MULTIRREINCIDENTE. PREPONDERÂNCIA DA AGRAVANTE. PRISÃO DOMICILIAR. 1. Aquele que transporta droga oriunda de país estrangeiro sem autorização legal incide nas penas do artigo 33, caput, c/c 40, I, da Lei 11.343/06. 2. O julgador estabelece o quantum de aumento na pena, observados os critérios legais, cabendo ao tribunal intervir apenas em casos de excesso manifesto. 3. A agravante da multirreincidência prepondera sobre as atenuantes previstas no art. 65, I e III, "b", do CP. 4. Não configurada qualquer hipótese autorizadora para concessão da prisão domiciliar. (TRF4, ACR 5003680-76.2017.4.04.7108, OITAVA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 31/10/2018)
'PENAL. PROCESSUAL PENAL. MATÉRIA PROCESSUAL JÁ ENFRENTADA QUANDO DO JULGAMENTO DO HABEAS CORPUS. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. ARTIGOS 33, CAPUT, E 40, I, DA LEI Nº 11.343/2006. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. NATUREZA DA DROGA. DOSIMETRIA. 1. A matéria relacionada à comunicação dos agentes consulares do país de origem do réu sobre a prisão em flagrante já foi analisada quando do julgamento de habeas corpus por esta Turma. 2. Autoria e materialidade do delito de tráfico internacional de drogas comprovadas. 3. "A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena." (HC 107.409/PE, 1.ª Turma do STF, Rel. Min. Rosa Weber, un., j. 10.4.2012, DJe-091, 09.5.2012). 4. Apelação criminal improvida. (TRF4, ACR 5007057-14.2019.4.04.7002, OITAVA TURMA, Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 19/12/2019)
A propósito, este entendimento visa justamente efetivar o princípio constitucional da individualização da pena.
A dosimetria da pena, portanto, "
(...) se reveste de certa discricionariedade, porquanto o Código Penal não imprime regras absolutamente objetivas para sua fixação
" (STJ, AgRg no AREsp 499.333/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, julgado em 07/08/2014).
Todavia, seu exame não é tarefa estanque ao Magistrado, podendo a Corte de Apelação, diante de particularidades, rever os critérios utilizados e, ponderando-os, retificar as discrepâncias porventura existentes.
Saliento que a natureza e a quantidade da droga foram erigidas à condição de circunstâncias autônomas e preponderantes pelo artigo 42 da Lei de Tóxicos.
Destaco, também, que a intenção do legislador, ao determinar como preponderantes (artigo 42 da Lei de Drogas), sobre as circunstâncias previstas no artigo 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga, foi justamente no sentido de autorizar o aumento da pena-base em
quantum
superior ao dos outros vetores.
Anoto, neste ponto, como mencionado alhures, que a majoração decorrente da qualidade e quantidade da droga é idôneo.
No concurso entre circunstâncias judiciais favoráveis e desfavoráveis, revela-se incabível a compensação entre elas, por ausência de previsão legal. Na avaliação da primeira fase, o que se leva em conta na alteração da sanção é tão somente a existência de circunstância desfavorável, na proporção em que se apresenta, sendo que a análise de forma favorável não tem o condão de reduzir a pena basilar, pois, caso contrário, verificando-se quatro circunstâncias judiciais favoráveis, a pena-base sempre será fixada no mínimo legal.
Cumpre destacar que é vedada a compensação entre as vetoriais favoráveis e desfavoráveis em razão de a pena base já se iniciar no patamar legal mínimo e diante do princípio
in dubio pro reo
, pois, a princípio, todas as vetoriais do artigo 59 do Código Penal são consideradas em favor do acusado.
Desse modo, é perfeitamente possível que o juiz, a partir da pena mínima prevista para o tipo, no momento de iniciar o processo de fixação da pena base, eleve, motivadamente, a reprimenda se constatadas vetoriais desfavoráveis ao condenado, distanciando-a do mínimo abstratamente previsto.
Repito que não há possibilidade de adequação da pena base próxima ao mínimo legal, sob a alegação de ser o réu primário, de bons antecedentes, possuir residência fixa e personalidade não voltada para o crime, quando tais circunstâncias não foram consideradas desfavoráveis, sendo que as demais circunstâncias judiciais, corretamente avaliadas, ensejaram a elevação da sanção basilar.
Em síntese, não há falar em compensação das circunstâncias judiciais favoráveis e desfavoráveis previstas na primeira fase da fixação da pena. A vetorial favorável apenas não conduz à elevação da pena.
A respeito da questão, assim já decidiu esta Oitava Turma:
"PENAL. PROCESSUAL PENAL.
OPERAÇÃO PITÁGORAS
. APELAÇÕES CRIMINAIS. OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO MEDIANTE FRAUDE. ESTELIONATO. DESCLASSIFICAÇÃO. DESCABIMENTO. CRIME IMPOSSÍVEL. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. INSIGNIFICÂNCIA PENAL. INAPLICABILIDADE. CONSEQUÊNCIAS E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. CONCURSO FORMAL. INAPLICABILIDADE. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO. ENUNCIADO SUMULAR 171 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRESCRIÇÃO. RECONHECIDA DE OFÍCIO. EXECUÇÃO IMEDIATA. RECURSO MINISTERIAL. PARCIALMENTE PROVIDO. APELAÇÕES DEFENSIVAS. PROVIMENTO PARA RECONHECER PRESCRIÇÃO. DEMAIS PARCIALMENTE PROVIDAS. 1 a 5. Omissis.
6. Não há falar em compensação na primeira fase da fixação da pena. A pena-base é fixada a partir do patamar mínimo, de acordo com o número de vetoriais negativadas, não sendo lógico proceder-se à compensação com as demais consideradas favoráveis ao réu.
7. A circunstância atenuante não permite reduzir a pena-provisória abaixo do mínimo legal, em razão do enunciado sumular 231 do Superior Tribunal de Justiça.15. Apelação ministerial desprovida. Apelação criminal defensiva de Délcio Tafarel provida. Demais apelações defensivas parcialmente providas.16. Reconhecida prescrição punitiva de ofício." (5043065-94.2013.4.04.7100, Oitava Turma, Rel. Juiz Federal Nivaldo Brunoni, disponibilizado em 26-3-2018 - grifei.)
No que toca à derradeira etapa do cálculo da pena, há de ser aplicada, como bem anotado no
decisum
recorrido, a causa de aumento de pena prevista no artigo 40, inciso I, da Lei de Entorpecentes (transnacionalidade).
Entendo que o incremento a ser aplicado, em razão da incidência da majorante, deve ser delimitado sob a perspectiva da amplitude da conduta, é dizer, o grau de recrudescimento da pena está consubstanciado na quantidade de países percorridos pela substância entorpecente traficada - que, no caso concreto, envolveu dois países distintos (Brasil e Paraguai).
Tal critério de proporcionalidade é o que vem sendo adotado por este Regional:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. ARTIGO 33, CAPUT, C/C ARTIGO 40, INCISO I, AMBOS DA LEI 11.343/2006. TRANSNACIONALIDADE COMPROVADA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. COMPROVAÇÃO. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA. MAJORAÇÃO. MAJORANTE. ARTIGO 40, INCISO I, DA LEI DE DROGAS. QUANTUM. MINORANTE DO ARTIGO 33, §4º. REGIME DE CUMPRIMENTO. FECHADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. PRISÃO PREVENTIVA. MANUTENÇÃO. EXECUÇÃO IMEDIATA. CABIMENTO. RECURSOS IMPROVIDOS. 1. [...] 4. Comprovada a transnacionalidade do delito, incide a majorante do artigo 40, inciso I, da Lei de drogas, no
patamar de 1/6 (um sexto), tendo em vista a amplitude da internacionalidade da conduta, que envolveu pelo menos dois países
(Brasil e Uruguai). Ordem de habeas corpus concedida, de ofício, para reduzir a pena privativa de liberdade. 5. [...]. (TRF4, ACR 5006915-38.2018.4.04.7101, OITAVA TURMA, Relator CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, juntado aos autos em 01/08/2019)
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ART. 33 DA LEI Nº 11.343/06. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ART. 35 DA LEI Nº 11.343/06. AUTORIA. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. ATENUANTE DO ARTIGO 65, III, "D", DO CP. MINORANTE DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006. AGRAVANTE DO ARTIGO 40, I, DA LEI Nº 11.343/2006. 1.[...] 6. A exasperação da pena com fundamento na transnacionalidade justifica-se em razão do número de países envolvidos na atividade ilícita. Logo,
envolvidos somente dois países, Paraguai e Brasil, fixo o aumento no patamar mínimo de 1/6 (um sexto).
(TRF4, ACR 5006894-23.2018.4.04.7114, OITAVA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 22/05/2020)
'DIREITO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, C/C 40, I, DA LEI 11.343/06. AUTORIA DELITIVA COMPROVADA. DOSIMETRIA. QUANTIDADE DE DROGA. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL PREPONDERANTE. DIFICULDADES FINANCEIRAS. ATENUANTE NÃO CONFIGURADA. TRANSNACIONALIDADE. CAUSA DE AUMENTO. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. 1. [...] 5.
O fato de o crime de tráfico envolver três países justifica o patamar de 1/4 aplicado em razão da configuração da transnacionalidade
. [...]' (5006871-64.2014.4.04.7002, 8ª Turma, Rel. Des. Federal Leandro Paulsen, disponibilizado em 03-3-2016 - grifei.)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. ARTIGOS 33 E 40, I, DA LEI 11.343/2006. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. CONFISSÃO. ATENUANTE. FRAÇÃO DE REDUÇÃO. TRANSNACIONALIDADE DO DELITO. PATAMAR DE AUMENTO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO. ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/06. PARCIALMENTE PROVIDA. [...]. 3. Comprovada a transnacionalidade do delito, é de se fazer incidir a majorante do artigo 40, inciso I, da Lei de drogas, no
patamar de 1/4 (um quarto), tendo em vista a amplitude da internacionalidade da conduta, que envolveu, pelo menos, três países
. [...]. (TRF4, ACR 5012288-87.2017.4.04.7100, OITAVA TURMA, Relator para Acórdão VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 28/05/2018)
Nesses termos, com tais fundamentos, e, considerando o duplo desdobramento internacional da conduta, tenho como adequado o patamar de aumento em 1/6 (um sexto) na terceira etapa do cálculo, como aplicado na sentença.
Quanto à pena de multa, o artigo 49 do Código Penal assim estabelece para a sua fixação: (a) variação de 10 a 360 dias-multa; (b) o valor do dia-multa não será inferior 1/30 do salário mínimo ao tempo do fato, nem superior a 5 vezes esse salário. Segue-se os mesmos critérios da sanção corporal previstos no art. 68 do Código Penal. Havendo cumulação com pena corporal, a multa será a ela proporcional. Não havendo, adota-se critério semelhante à primeira fase da dosimetria da pena corporal (EINACR 2002.71.13.003146-0/RS, D.E. 05-06-2007). São relevantes as condições pessoais e econômicas do condenado, devendo o juiz decidir o valor necessário e suficiente para que reprovação do crime e sua prevenção, podendo ser majorado até o triplo (art. 60, § 1º, do CP). A sanção pecuniária deve observar a proporcionalidade em face da menor pena corporal prevista (quinze dias de detenção - art. 330) e a maior sanção corporal possível (trinta anos de reclusão - art. 157, § 3º). Tratando-se, assim, de pena corporal próxima a 15 dias de detenção, a multa ficará próxima do seu mínimo legal; se próxima a 30 anos a corporal, a multa aproximar-se-á de 360 dias-multa.
Ocorre que,
em relação ao delito de tráfico de drogas, a fixação da pena de multa possui sistemática própria, prevista no art. 33 da Lei nº 11.343/2006
,
in verbis
:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos
e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
(Grifei)
Conforme se pode ver, a pena de multa nos casos de tráfico de drogas é uma consequência da condenação, tratando-se do preceito secundário do tipo penal, não havendo falar em aplicação dos limites genéricos do artigo 49,
caput
, do Código Penal.
Assim, em casos tais, a multa, em cumulação com pena privativa de liberdade, deve observar a proporcionalidade em face da menor e da maior sanções corporais previstas
no art. 33 da Lei nº 11.343/2006
- é dizer, tratando-se de pena corporal próxima a 5 anos de reclusão, a multa ficará próxima do seu mínimo legal de 500 dias-multa; se próxima a 15 anos a corporal, a multa se aproximará de 1.500 dias-multa.
5.2. Examinada essa questão introdutória, passo à análise individualizada do cálculo da pena.
Eis o que restou consignado pelo julgador sentenciante:
"(...)
4.1.
Penas privativa de liberdade e de multa
(
arts. 49 e 59 a 76 do Código Penal
):
A pena privativa de liberdade cominada no
art. 33 da Lei nº 11.343/06
está compreendida entre 05 (cinco) e 15 (quinze) anos de reclusão, acrescidos de 500 (quinhentos) a 1500 (mil e quinhentos) dias-multa.
Analisando as circunstâncias estabelecidas nos
art. 59 do Código Penal
e
art. 42 da Lei nº 11.343/06
, verifico que o grau de
culpabilidade
é normal à espécie. Não há elementos nos autos que permitam avaliar a
conduta social
e a
personalidade
do acusado
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
. Não há nos autos notícia acerca da existência de maus
antecedentes
. Os
motivos
do crime são normais à espécie. As
consequências
são próprias do crime em questão e não se revelaram de maior gravidade. A
vítima
não favoreceu a ocorrência dos fatos delitivos.
O Analista da Receita Federal do Brasil
Osmar Carlos do Prado
informou em sede policial que, quando do fato, havia informação de que uma organização criminosa estava engendrando a passagem de droga pela
Aduana da Ponte Internacional da Amizade
(
“a gente já estava mais ou menos aguardando isso, porque já aconteceu em duas, três vezes esse mês, né? A gente já tinha mais ou menos, estava meio alerta, porque poderiam passar a qualquer momento. Eles são assim, tipo kamikazes”
). Como esperado, foi constatado que vários veículos chegaram juntos na
Aduana da Ponte Internacional da Amizade
, ocupando todas as baias, a fim de viabilizar a passagem daquele que estava transportando a droga (
“Eles dão aquela... foi o que fizeram. Eles vieram e começou, um gritou com o outro e tal, estão chegando, estão chegando, e foi todo mundo para a pista. Eles já vieram o carro dos batedores deles, já ocuparam todas as baias, né? Para poder ficar livre o caminho para ele passar”
). Em que pese a ação articulada do grupo, conseguiram os servidores presentes no local bloquear a passagem do veículo que estava carregando a droga, no que seu condutor, o acusado
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
foi detido após tentar empreender fuga (
“Fechou a pista, como eu já disse, né? A gente fechou a pista, passamos, jogamos a pista para a esquerda, aquela pista não passou mais ninguém. E aí o camarada viu que em fração de segundo não tinha o que fazer, ele largou e correu. Jogou a chave no chão e saiu correndo”
). O Agente de Polícia Federal
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
corroborou as declarações de
Osmar Carlos do Prado
, no sentido de que foram utilizados aproximadamente 04 (quatro) veículos na ação voltada ao tráfico da droga transportada por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
e que ele tentou fugir do local do fato (
“E tinham exatamente ali cinco carros, né? Então a gente tendo provavelmente um ia escapar, né? Só que ele viu que possivelmente ia ser parado em uma das baias e fugiu”
) (evento nº 01 do inquérito policial).
Em juízo,
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
afirmou: “
Ah, perfeitamente. Nesse dia, né, foi por volta ali que se iniciou os trabalhos ali, né, 21 horas, 21 horas e 30 ali, que os colegas da Receita Federal, eles têm um centro, né, de operacional de inteligência ali, né, inclusive acho que foi até mostrado ali no Fantástico, matéria de domingo retrasado, e eles
estavam com informes ali, informações acerca de uma possível orcrim ali, que passaria ali naquele horário ali
, né,
ele tinha a placa ali de algum suspeito, algum batedor, aí ato contínuo ali, ele chamou a nossa equipe da Polícia Federal ali, da Força Nacional, né, para ajudar na abordagem ali
, porque
possivelmente eles falaram que eles vinham em comboio
, né, aí nesse dado momento os carros, acho que eram uns quatro assim, passaram ali na ponte, aí a gente parou os quatro ou cinco carros para abordar um por um, né, para verificar se de fato a informação era verídica, né. Aí em dado momento estava eu, um colega da Polícia Federal, o Tiago da Receita e o Rafael da Polícia Federal. Aí o paraguaio, né,
o cidadão que foi preso, ele correu, correu para a Ponte da Amizade, né, em direção ao Paraguai, e aí a gente correu atrás dele e conseguimos, conseguimos detê-lo
, né, e basicamente ele informou que ganharia ali uns 2 mil reais para a travessia, não informou de quem que era a mercadoria, se de fato aqueles carros que estavam com ele eram batedores
”.
Osmar Carlos do Prado
, por sua vez, informou que
“Resumidamente, foi uma época de franca tentativa de passagem, e a gente já se preparava mais ou menos para esses casos diversos. Esse foi um deles. E em algum momento da noite, desse dia,
começaram a chegar carros e carros a invadir o nosso ambiente de trabalho e coisa, e a gente já sabia que alguma coisa, já esperávamos que alguma coisa fosse acontecer
, né? (...) Os
olheiros, os protetores desse carro encostaram
, e aí eles vêm conversar com a gente e tal, para tentar ver se o carro passa. Como a gente já sabia, já sabe descer, isso aí é normal acontecer ali, a gente fechou todas as saídas e entradas possíveis ali naquele momento, no nosso trabalho, nas pontes, nas baias. E esse carro ficou no meio. Ele ficou no meio perdido, ele não sabia o que fazer, ele abriu a porta e saiu, jogou a chave no chão e saiu correndo de volta para o Paraguai. E nesse meio tempo, grita aqui, grita ali, um policial federal e mais um colega nosso correu atrás dele, a Força Nacional, enfim, todas as forças ali envolvidas, e conseguiram abordá-lo no meio da ponte e o trouxeram de volta (...)”
(evento nº 31).
Conforme relatado pelos servidores
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
e
Osmar Carlos do Prado
, não foi o transporte da droga realizado por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
uma ação isolada, praticada por pessoa contratada de forma eventual, mas sim fruto de um esquema engendrado de forma articulada, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de aumentar as chances de sucesso da empreitada. Nesse contexto, devem as
circunstâncias
do crime serem sopesadas de forma negativa.
Segundo entendimento esposado pelo
Tribunal Regional Federal da 4ª Região
, a natureza e a quantidade da droga foram erigidas à condição de circunstâncias autônomas e preponderantes pelo
art. 42 da Lei nº 11.343/06
. Nesse sentido:
“A previsão do art. 42 da Lei de Drogas coloca a natureza e a quantidade de droga apreendida em posição preponderante, autorizando o aumento da pena-base em quantum superior ao dos outros vetores previstos pelo art. 59 do Código Penal”
(TRF4, ACR 5000726-34.2020.4.04.7017, SÉTIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 30/09/2020)
“O aumento de 03 anos e 03 meses, operado na sentença, mostra-se proporcional e razoável, considerando a valoração negativa dos antecedentes, das circunstâncias e da quantidade de droga, sendo esta circunstância preponderante, nos termos do art. 42 da Lei 11.343/06”.
(TRF4, ACR 5004798-40.2019.4.04.7004, OITAVA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 08/07/2020)
A propósito, observo que a intenção do legislador, ao determinar como preponderantes (
art. 42 da Lei nº 11.343/06
), sobre as circunstâncias previstas no
art. 59 do Código Penal
, a natureza e a quantidade da droga, foi justamente no sentido de autorizar o aumento da pena-base em
quantum
superior ao dos outros vetores.
Assim, com fundamento no
art. 42 da Lei nº 11.343/06
, deve a pena base ser agravada em razão da
quantidade
da droga transportada por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
(
mais de 500 kg de maconha
), “
considerando o elevado risco de lesão ao bem jurídico tutelado, qual seja, a saúde pública
” (TRF4, ENUL 5001950-76.2012.404.7117, Quarta Seção, Relator p/ Acórdão João Pedro Gebran Neto, juntado aos autos em 07/08/2014).
Com efeito, considerando a existência de duas circunstâncias judiciais desfavoráveis (
circunstâncias do crime
e
quantidade de droga
),
fixo a pena-base em 06 (seis) anos e 06 (seis) meses de reclusão, acrescidos de 660 (seiscentos e sessenta) dias-multa
.
Não há incidência de agravantes. Por outro lado, incide no caso dos autos a atenuante do
art. 65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal
, haja vista que
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
confessou a prática do fato que lhe foi imputado. Com efeito,
reduzo a pena intermediária para 06 (seis) anos de reclusão, acrescidos de 600 (seiscentos) dias-multa
.
Como salientado no tópico relativo à tipicidade, há incidência da causa de aumento de pena do
inciso I do art. 40 da Lei nº 11.343/06
, cuja aplicação na hipótese dos autos não configura
bis in idem
, conforme
Enunciado nº 126 da Súmula do Tribunal Regional Federal da 4ª Região
. Desta feita, considerando que a droga foi apreendida ainda na
Aduana da Ponte Internacional da Amizade
, aumento a pena provisória em 1/6 (um sexto),
perfazendo 07 (sete) anos de reclusão, acrescidos de 700 (setecentos) dias-multa
.
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
, em sede policial, relatou que esta era
a terceira vez que realizava o transporte de droga do Paraguai para o Brasil
, sempre
com o mesmo veículo
, e
sob contratação da mesma pessoa
(
“Era a terceira vez (...) era o mesmo carro... o mesmo carro (...) e era para a mesma pessoa (...) Me deram e eu tinha que passar (...)”
(evento nº 01 do inquérito policial). Conforme relatado pelos servidores
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
e
Osmar Carlos do Prado
,
não foi o transporte da droga realizado por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
uma ação isolada
, praticada por pessoa contratada de forma eventual, mas sim fruto de um
esquema engendrado de forma articulada, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de aumentar as chances de sucesso da empreitada
.
É evidente, portanto, que a ação de
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
não é equiparada à daquela pessoa usualmente chamada de “mula”, vez que sua contratação para transportar drogas, além de não ter sido por uma única vez, se deu em um contexto que evidencia que, no mínimo, possui envolvimento com grupo criminoso, cujo poderio econômico é evidenciado pela grande quantidade de
maconha
apreendida. Com efeito,
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
não faz
jus
à aplicação da causa de diminuição de pena do §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06.
Perfaz a PENA DEFINITIVA, portanto,
07 (sete) anos de reclusão, acrescidos de 700 (setecentos) dias-multa
.
Arbitro
, diante da ausência de informações precisas acerca das condições financeiras do acusado, cada dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à data do fato (
art. 49, §2º, do Código Pena
l).
4.2.
Regime inicial do cumprimento da pena privativa de liberdade
(
art. 33 do Código Penal
):
Examinando conjugadamente o disposto nos
arts. 33 e 59 do Código Penal
, inexiste possibilidade de fixação de regime diverso do
fechado
, dada existência de suas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao acusado e o
quantum
da pena privativa de liberdade fixada.
4.3.
Detração da pena
(
art. 387, §2º do Código de Processo Penal
):
Dispõe o
art. 387, §2º, do Código de Processo Penal
que “
o tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade
”.
Estando o acusado preso provisoriamente por cerca de 03 (três) meses, não há que se falar na aplicação do
art. 387, §2º, do Código de Processo Penal
no caso dos autos.
4.4.
Substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e suspensão condicional da pena
(
arts. 44 e 77 do Código Penal
):
Diante da pena aplicada,
não há que se falar na substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito e tampouco na concessão da suspensão condicional da pena
.
(...)"
Na primeira fase,
o magistrado de origem aumentou a pena-base acima do mínimo, considerando a
quantidade
da droga apreendida e as
circunstâncias
do crime.
Ressalto que, a
natureza
e a
quantidade
da droga foram erigidas à condição de circunstâncias autônomas e preponderantes pelo artigo 42 da Lei nº 11.343/1006, a serem aplicadas como vetoriais distintas, autorizando o aumento da pena-base em
quantum
superior ao dos outros vetores previstos pelo art. 59 do Código Penal.
A
quantidade
(401,7 kg de maconha) é, de fato, grande o suficiente a ponto de merecer ser considerada na fixação da pena-base, com a exasperação da pena mínima, destoando a conduta da normalidade.
As
circunstâncias
também reclamam o incremento da pena, visto que a prática delituosa foi
"fruto de um esquema engendrado de forma articulada, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de aumentar as chances de sucesso da empreitada"
, o que difere das circunstâncias comuns e denota maior reprovabilidade, como bem fundamentou o magistrado sentenciante (
processo 5011652-80.2024.4.04.7002/PR, evento 40, SENT1
).
Assim, mantenho
a pena-base em 06 (seis) anos e 06 (seis) meses de reclusão.
Na segunda etapa
do cálculo, o juízo
a quo
considerou corretamente a atenuante da
confissão espontânea
(art. 65, III, d, CP), atenuando a pena em
6 meses
de reclusão. Todavia, a aplicação da atenuante da confissão em patamar diferente de 1/6, jurisprudencialmente consolidado, exige fundamentação idônea, o que não ocorreu. Nesse sentido:
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRABANDO. CIGARROS ELETRÔNICOS E ACESSÓRIOS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DESTINAÇÃO COMERCIAL. NÃO INCIDÊNCIA. ARTIGO 334-A, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. COMPROVAÇÃO. RÉU CONFESSO. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. CONFISSÃO. PATAMAR DE REDUÇÃO. SUBSTITUIÇÃO POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU A ENTIDADES PÚBLICAS. PENA PECUNIÁRIA. VALOR MANTIDO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. JUÍZO DA EXECUÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. 1. (...). 3.
É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que a redução da pena, decorrente da atenuante de confissão, deve ficar no patamar de 1/6 (um sexto), se não houver outro motivo, devidamente justificado, para que seja fixada outra redução.
Redução operada de ofício. 4. (...). (TRF4, ACR 5001458-55.2023.4.04.7002, OITAVA TURMA, Relator LORACI FLORES DE LIMA, juntado aos autos em 31/07/2024)
Destarte, deve ser
aplicada a redução da pena na fração de 1/6 (um sexto) em razão desta atenuante, pelo o que
fixo a pena provisória em 05 (cinco) anos e 05 (cinco) meses de reclusão.
No que tange à
derradeira
etapa do cálculo da pena, há de ser aplicada, como bem anotado no
decisum
recorrido e conforme fundamentado no tópico "3", a majorante prevista no artigo 40, inciso I, da Lei de Entorpecentes (transnacionalidade). Envolvidos, no mínimo,
dois países
, razoável o aumento no patamar de 1/6 (um sexto), conforme exposto no tópico anterior.
A pena, até aqui, perfaz
06 (seis) anos, 03 (três) meses e 25 (vinte e cinco) dias de reclusão.
Da minorante do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06
A Defesa sustenta que o réu é primário, de bons antecedentes e não se dedica às atividades criminosas, tampouco integra organização criminosa, fazendo jus, portanto, à aplicação do que prevê o art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, em seu patamar máximo de redução (
processo 5011652-80.2024.4.04.7002/PR, evento 55, APELAÇÃO1
).
Sem razão, contudo.
No tocante à minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, cabe destacar que tem por objetivo beneficiar os pequenos traficantes e "
tem suas raízes em questões de política criminal, surgindo com um favor legislativo ao pequeno traficante, ainda não envolvido em maior profundidade com o mundo criminoso, de forma propiciar-lhe uma oportunidade mais rápida de ressocialização
" (STJ, REsp representativo de controvérsia nº 1.329.088/RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, julg. 13/07/2013).
Ressalte-se que, a Terceira Seção do STJ, no julgamento do REsp n. 1.887.511/SP, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, realizado em 9/6/2021, DJe 1º/7/2021, decidiu que a aplicação do benefício do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 não pode ser afastada somente com fundamento na natureza, na diversidade e na quantidade da droga apreendida, sendo necessário que esse vetor seja conjugado com outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a dedicação do agente à atividade criminosa ou à integração a organização criminosa. Eis a ementa do referido julgado:
PENAL, PROCESSO PENAL E CONSTITUCIONAL. DOSIMETRIA DE PENA. PECULIARIDADES DO TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ART. 42 DA LEI N. 11.343/2006.
NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA. CIRCUNSTÂNCIA PREPONDERANTE A SER OBSERVADA NA PRIMEIRA FASE DA DOSIMETRIA. UTILIZAÇÃO PARA AFASTAMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO OU MODULAÇÃO DA FRAÇÃO DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. IMPOSSIBILIDADE. CARACTERIZAÇÃO DE BIS IN IDEM
. NÃO TOLERÂNCIA NA ORDEM CONSTITUCIONAL. RECURSO PROVIDO PARA RESTAURAÇÃO DA SENTENÇA DE PRIMEIRA INSTÂNCIA.
1. A dosimetria da reprimenda penal, atividade jurisdicional caracterizada pelo exercício de discricionariedade vinculada, realiza-se dentro das balizas fixadas pelo legislador.
2. Em regra, abre-se espaço, em sua primeira fase, à atuação da discricionariedade ampla do julgador para identificação dos mais variados aspectos que cercam a prática delituosa; os elementos negativos devem ser identificados e calibrados, provocando a elevação da pena mínima dentro do intervalo legal, com motivação a ser necessariamente guiada pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
3. Na estrutura delineada pelo legislador, somente são utilizados para a fixação da pena-base elementos pertencentes a seus vetores genéricos que não tenham sido previstos, de maneira específica, para utilização nas etapas posteriores. Trata-se da aplicação do princípio da especialidade, que impede a ocorrência de bis in idem, intolerável na ordem constitucional brasileira.
4. O tratamento legal conferido ao tráfico de drogas traz, no entanto, peculiaridades a serem observadas nas condenações respectivas; a natureza desse crime de perigo abstrato, que tutela o bem jurídico saúde pública, fez com que o legislador elegesse dois elementos específicos necessariamente presentes no quadro jurídico-probatório que cerca aquela prática delituosa, a saber, a natureza e a quantidade das drogas para utilização obrigatória na primeira fase da dosimetria.
5. Não há margem, na redação do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, para utilização de suposta discricionariedade judicial que redunde na transferência da análise desses elementos para etapas posteriores, já que erigidos ao status de circunstâncias judiciais preponderantes, sem natureza residual.
6. O tráfico privilegiado é instituto criado par a beneficiar aquele que ainda não se encontra mergulhado nessa atividade ilícita, independentemente do tipo ou do volume de drogas apreendidas, para implementação de política criminal que favoreça o traficante eventual.
7. A
utilização concomitante
da natureza e da quantidade da droga apreendida na primeira e na terceira fases da dosimetria, nesta última para descaracterizar o tráfico privilegiado ou modular a fração de diminuição de pena,
configura bis in idem
, expressamente rechaçado no julgamento do Recurso Extraordinário n. 666.334/AM, submetido ao regime de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal (Tese de Repercussão Geral n. 712).
8.
A utilização supletiva desses elementos para afastamento do tráfico privilegiado somente pode ocorrer quando esse vetor seja conjugado com outras circunstâncias do caso concreto que, unidas, caracterizem a dedicação do agente à atividade criminosa ou à integração a organização criminosa.
9. Na modulação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, podem ser utilizadas circunstâncias judiciais não preponderantes, previstas no art. 59 do Código Penal, desde que não utilizadas de maneira expressa na fixação da pena-base.
10. Recurso provido para restabelecimento da sentença.
(STJ, REsp n. 1.887.511/SP, Terceira Seção, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Seção, julgado em 9/6/2021, DJe de 1/7/2021.)
A controvérsia, aliás, foi submetida à sistemática dos recursos repetitivos, sendo objeto do Tema 1154 (STJ):
"Isoladamente consideradas, a natureza e a quantidade do entorpecente apreendido, por si sós, não são suficientes para embasar conclusão acerca da presença das referidas condições obstativas e, assim, afastar o reconhecimento da minorante do tráfico privilegiado."
Agrego recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça, quando ambas as Turmas criminais consideraram idônea idêntica fundamentação:
PROCESSO PENAL E PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE REFORMATIO IN PEJUS QUALITATIVA E VIOLAÇÃO À SÚMULA 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. INOCORRÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS QUE CONSTARAM DO ACÓRDÃO RECORRIDO. FORMA DE ACONDICIONAMENTO DAS DROGAS. TENTATIVA DE LUDIBRIAR A FISCALIZAÇÃO. QUANTIDADE VULTUOSA DE ENTORPECENTES. INFORMAÇÕES DE ENVOLVIMENTO PRÉVIO COM A ATIVIDADE CRIMINOSA. PRIVILÉGIO AFASTADO. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Considerando-se que não foram feitas, no decisum atacado, quaisquer referências a fatos ou provas que não tenham sido considerados pelo Tribunal de Justiça, tampouco foram valoradas circunstâncias que não tenham constado do acórdão em apelação, não há falar-se, pois, em reformatio in pejus qualitativa, tampouco na incidência da Súmula n. 7 deste STJ.
2.
Na hipótese dos autos, o Tribunal de Justiça local reconheceu o ardil empregado pelo agravante para esconder as drogas, o que, aliado à expressiva quantidade (uma barra com 1.026g de crack, além 51 pedras de crack com 20g) e à existência de informações acerca do envolvimento anterior do recorrente com o transporte de substâncias ilícitas, autorizam o afastamento do redutor do tráfico privilegiado
. Precedentes.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AgRg no REsp n. 2.095.535/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 1/7/2024, DJe de 3/7/2024.)
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. PLEITO DE RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. RAZÕES QUE NÃO INFIRMARAM TODOS OS FUNDAMENTOS DO DECISUM ATACADO. INCIDÊNCIA DO ENTENDIMENTO DA SÚMULA 182/STJ. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE. DECISÃO MANTIDA.
1. Não infirmados especificamente todos fundamentos da decisão recorrida, é de ser negada a simples pretensão de reforma (Súmula 182 desta Corte). Precedente.
2. No caso, não foi rebatido pela agravante o óbice referente à impossibilidade de conhecimento do writ por se tratar de substitutivo de revisional.
3.
No mais, reitero que o Tribunal de origem apontou a
existência de outros elementos para afastar o tráfico privilegiado
que
não somente a quantidade de droga
s, entendendo não se tratar de traficante ocasional.
4. Mantido o óbice apontado na decisão monocrática, inexiste ilegalidade flagrante que justifique a concessão de habeas corpus de ofício e a superação do impedimento apontado.
5. Na ausência de argumento apto a afastar as razões consideradas no julgado agravado, que está em sintonia com a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, deve ser mantida a decisão monocrática por seus próprios termos.
6. Agravo regimental não conhecido.
(AgRg no HC n. 747.786/SE, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 27/6/2024.)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO § 4.º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. INDEFERIMENTO COM BASE NAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. IMPOSSIBILIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1.
Hipótese em que a causa de diminuição prevista no § 4.º do art. 33 da Lei de Drogas foi afastada com o entendimento de que o agravante se dedicava a atividades criminosas
com base nas circunstâncias da prática delitiva
, destacando-se, além da quantidade de entorpecentes, as condições em que foram apreendidos, além de diversos petrechos relacionados à prática da traficância, incluindo 2.500 flaconetes vazios.
2. Nesse contexto, não é possível desconstituir a conclusão da Jurisdição ordinária sobre a dedicação do agravante à atividade criminosa e, por conseguinte, reconhecer a incidência da minorante em comento, notadamente por ser vedado, na presente via, revolver o contexto fático-probatório dos autos.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no HC n. 895.966/SP, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do TJSP), Sexta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 27/6/2024.)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. REVOLVIMENTO DE CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. BIS IN IDEM NA UTILIZAÇÃO DA QUANTIDADE E VARIEDADE DAS DROGAS PARA EXASPERAR A PENA-BASE E AFASTAR O REDUTOR DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO.
1.
A apreensão de materiais relativos ao tráfico de entorpecentes - balança de precisão e produtos químicos destinados ao preparo das drogas, tais como éter etílico e cafeína -, bem como de anotações referentes à prática ilícita, evidencia a dedicação do agravante a atividades criminosas e fundamenta o afastamento da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006.
2. Não há que se falar em bis in idem na utilização da quantidade e variedade das drogas para exasperar a pena-base e afastar o redutor do tráfico privilegiado, porquanto esses elementos não foram utilizados para, de per si, afastar a incidência do privilégio.
3. Para superar as conclusões alcançadas na origem e chegar às pretensões apresentadas pela parte, é imprescindível a reanálise do acervo fático-probatório dos autos, o que impede a atuação excepcional desta Corte.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no HC n. 780.529/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 26/6/2024.)
PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO. INCIDÊNCIA DO BENEFÍCIO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1.
Para aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, o condenado deve preencher, cumulativamente, todos os requisitos legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas, nem integrar organização criminosa, podendo a reprimenda ser reduzida de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços),
a depender das circunstâncias do caso concreto.
2. No presente caso, verifica-se que os fundamentos utilizados pela Corte de origem para não aplicar o referido redutor ao caso concreto estão em consonância com a jurisprudência deste Superior Tribunal, na medida em que dizem respeito à dedicação do agravante à atividade criminosa (tráfico de drogas), consubstanciada
não somente em razão da quantidade e da natureza das drogas apreendidas, mas também pelas circunstâncias concretas do crime, não se tratando de traficante ocasional, situação que corrobora a conclusão de que se dedicava às atividades ilícitas, o que justifica o afastamento da redutora do art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/2006
.
Assim, para se acolher a tese de que ela não se dedica a atividade criminosa, para fazer incidir o art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, como requer a parte recorrente, imprescindível o reexame das provas, procedimento sabidamente inviável na instância especial. Inafastável a incidência da Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AgRg no AREsp n. 2.358.942/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 19/9/2023, DJe de 26/9/2023.)
Ademais, o Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário n. 666.334/AM, submetido ao regime de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal (Tese de Repercussão Geral n. 712) assentou entendimento no sentido de que as circunstâncias da natureza e da quantidade de droga apreendida com o acusado de tráfico devem ser levadas em consideração apenas em uma das fases da dosimetria da pena, sobretudo, esclareça-se, na primeira, sob pena de configurar
bis in idem
. Isso, contudo, não exclui a avaliação meticulosa do magistrado em aplicar a redução no patamar que julgue necessário e suficiente para reprovação do crime (HC 99.440/SP, Relator Ministro Joaquim Barbosa).
Vale referir que, como na primeira fase da dosimetria da pena, aqui também a lei permite ao julgador uma certa margem de discricionariedade, não ficando, pois, adstrito a critério matemáticos fechados. Tanto é que o próprio legislador não limitou a atuação do magistrado, fixando o a redução entre os patamares mínimos, de 1/6 e máximo, de 2/3 ("
Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa
"). Sobre o tema, decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
(...) II - Nos termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, na graduação da pena-base, a natureza e a quantidade da droga apreendida na posse do Acusado, são preponderantes às circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal, não configurando ilegalidade seu arbitramento acima do mínimo legal, ainda que primário e com bons antecedentes. Precedentes. III - Não tendo a Lei de Drogas estabelecido parâmetros objetivos para que seja aplicada a fração do redutor previsto na causa especial de diminuição de pena (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006), entre 1/6 (um sexto) e 2/3 (dois terços), deve o julgador defini-la, observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (AgRg no REsp 1206455/AC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, QUINTA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 29/08/2014).
Diante desse quadro, é imperativo que o
quantum
de diminuição leve em consideração as circunstâncias do delito como um todo, fazendo a ponderação pela medida da culpabilidade do agente. Tal proceder representa a real integração da norma ao fato concreto, momento em que o julgador analisará não somente a quantidade e a qualidade das drogas apreendidas, mas, fundamentalmente, analisará toda a cadeia delitiva.
Desse modo, ainda que o agente preencha os requisitos objetivos insertos no art. art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 ("
seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa
"), a causa especial de diminuição da pena deve ser aplicada com cautela, dentro dos parâmetros legais mínimo e máximo. Significa, portanto, que, mesmo quando atendidos os critérios objetivos, a redução não se fará necessariamente no máximo previsto, porque isso representaria esvaziar a própria norma. Sobre isso, precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL.TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO
ART. 33, § 4º
, DA LEI 11.343/06. NATUREZA, QUANTIDADE E DIVERSIDADE. DEDICAÇÃO A ATIVIDADE CRIMINOSA. INAPLICABILIDADE. PLEITO DE FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL FECHADO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. I - Esta Corte
vem decidindo que
a expressiva quantidade de droga apreendida, aliada a outras circunstâncias próprias do caso concreto
, ora pode impedir a incidência do art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, - caso em que estará evidenciada a dedicação à atividade criminosa -, ora como fator que,
embora não impeça a aplicação da causa de diminuição, será tomada como parâmetro para definir o quantum da redução da pena
. In casu, em que pesem os argumentos da defesa, além da quantidade e da natureza da droga apreendida a evidenciar a dedicação à atividade criminosa, o ora agravante e outras quatro pessoas foram vistos por policiais militares, que efetivam o flagrante, "picando e embalando drogas" atrás do Colégio São Miguel (fl. 670) e os mesmos "são conhecido no meio policial pelo envolvimento com tráfico de drogas" (fl. 670). Ademais, consignou o Colegiado a quo que "foram arrecadados 171,54g de maconha, 9,24g de crack e 248,51g de cocaína, além de diversos saquinhos plásticos, o que demonstra que a considerável quantidade de entorpecentes séria destinada ao comércio ilícito" (fl. 673). II - (...) Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 1304736/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 25/09/2018, DJe 28/09/2018).
No caso em tela, o Juízo sentenciante, ao afastar o benefício do art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/2006, anotou:
"(...)
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
, em sede policial, relatou que esta era
a terceira vez que realizava o transporte de droga do Paraguai para o Brasil
, sempre
com o mesmo veículo
, e
sob contratação da mesma pessoa
(
“Era a terceira vez (...) era o mesmo carro... o mesmo carro (...) e era para a mesma pessoa (...) Me deram e eu tinha que passar (...)”
(evento nº 01 do inquérito policial). Conforme relatado pelos servidores
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
e
Osmar Carlos do Prado
,
não foi o transporte da droga realizado por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
uma ação isolada
, praticada por pessoa contratada de forma eventual, mas sim fruto de um
esquema engendrado de forma articulada, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de aumentar as chances de sucesso da empreitada
.
É evidente, portanto, que a ação de
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
não é equiparada à daquela pessoa usualmente chamada de “mula”, vez que sua contratação para transportar drogas, além de não ter sido por uma única vez, se deu em um contexto que evidencia que, no mínimo, possui envolvimento com grupo criminoso, cujo poderio econômico é evidenciado pela grande quantidade de
maconha
apreendida. Com efeito,
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
não faz
jus
à aplicação da causa de diminuição de pena do §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06.
(...)"
Com se vê, pela leitura do trecho acima, verifica-se que os fundamentos utilizados pelo Juízo
a quo
para não aplicar o referido redutor ao caso concreto estão em consonância com a jurisprudência desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça, na medida em que dizem respeito à dedicação do apelante à atividade criminosa (tráfico de drogas), consubstanciada não somente em razão da quantidade de droga apreendida (401,7 Kg de maconha), mas pelas circunstâncias concretas do crime, que indicam a vinculação do réu com organização criminosa, o que justifica o afastamento da redutora do art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/2006.
Como muito bem relatou o magistrado sentenciante, os depoimentos dos policiais que atuaram no flagrante revelaram que a prática delitiva se deu em contexto de esquema articulado, planejado por organização criminosa, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de dificultar a fiscalização pela Receita Federal na Ponte Internacional da Amizade e assim garantir o sucesso da empreitada criminosa, ou seja, que o réu levasse as drogas para o Brasil (
processo 5011652-80.2024.4.04.7002/PR, evento 40, SENT1
):
"(...)
Analista da Receita Federal do Brasil
Osmar Carlos do Prado
informou em sede policial que, quando do fato, havia informação de que uma organização criminosa estava engendrando a passagem de droga pela
Aduana da Ponte Internacional da Amizade
(
“a gente já estava mais ou menos aguardando isso, porque já aconteceu em duas, três vezes esse mês, né? A gente já tinha mais ou menos, estava meio alerta, porque poderiam passar a qualquer momento. Eles são assim, tipo kamikazes”
). Como esperado, foi constatado que vários veículos chegaram juntos na
Aduana da Ponte Internacional da Amizade
, ocupando todas as baias, a fim de viabilizar a passagem daquele que estava transportando a droga (
“Eles dão aquela... foi o que fizeram. Eles vieram e começou, um gritou com o outro e tal, estão chegando, estão chegando, e foi todo mundo para a pista. Eles já vieram o carro dos batedores deles, já ocuparam todas as baias, né? Para poder ficar livre o caminho para ele passar”
). Em que pese a ação articulada do grupo, conseguiram os servidores presentes no local bloquear a passagem do veículo que estava carregando a droga, no que seu condutor, o acusado
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
foi detido após tentar empreender fuga (
“Fechou a pista, como eu já disse, né? A gente fechou a pista, passamos, jogamos a pista para a esquerda, aquela pista não passou mais ninguém. E aí o camarada viu que em fração de segundo não tinha o que fazer, ele largou e correu. Jogou a chave no chão e saiu correndo”
). O Agente de Polícia Federal
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
corroborou as declarações de
Osmar Carlos do Prado
, no sentido de que foram utilizados aproximadamente 04 (quatro) veículos na ação voltada ao tráfico da droga transportada por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
e que ele tentou fugir do local do fato (
“E tinham exatamente ali cinco carros, né? Então a gente tendo provavelmente um ia escapar, né? Só que ele viu que possivelmente ia ser parado em uma das baias e fugiu”
) (evento nº 01 do inquérito policial).
Em juízo,
Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante
afirmou: “
Ah, perfeitamente. Nesse dia, né, foi por volta ali que se iniciou os trabalhos ali, né, 21 horas, 21 horas e 30 ali, que os colegas da Receita Federal, eles têm um centro, né, de operacional de inteligência ali, né, inclusive acho que foi até mostrado ali no Fantástico, matéria de domingo retrasado, e eles
estavam com informes ali, informações acerca de uma possível orcrim ali, que passaria ali naquele horário ali
, né,
ele tinha a placa ali de algum suspeito, algum batedor, aí ato contínuo ali, ele chamou a nossa equipe da Polícia Federal ali, da Força Nacional, né, para ajudar na abordagem ali
, porque
possivelmente eles falaram que eles vinham em comboio
, né, aí nesse dado momento os carros, acho que eram uns quatro assim, passaram ali na ponte, aí a gente parou os quatro ou cinco carros para abordar um por um, né, para verificar se de fato a informação era verídica, né. Aí em dado momento estava eu, um colega da Polícia Federal, o Tiago da Receita e o Rafael da Polícia Federal. Aí o paraguaio, né,
o cidadão que foi preso, ele correu, correu para a Ponte da Amizade, né, em direção ao Paraguai, e aí a gente correu atrás dele e conseguimos, conseguimos detê-lo
, né, e basicamente ele informou que ganharia ali uns 2 mil reais para a travessia, não informou de quem que era a mercadoria, se de fato aqueles carros que estavam com ele eram batedores
”.
Osmar Carlos do Prado
, por sua vez, informou que
“Resumidamente, foi uma época de franca tentativa de passagem, e a gente já se preparava mais ou menos para esses casos diversos. Esse foi um deles. E em algum momento da noite, desse dia,
começaram a chegar carros e carros a invadir o nosso ambiente de trabalho e coisa, e a gente já sabia que alguma coisa, já esperávamos que alguma coisa fosse acontecer
, né? (...) Os
olheiros, os protetores desse carro encostaram
, e aí eles vêm conversar com a gente e tal, para tentar ver se o carro passa. Como a gente já sabia, já sabe descer, isso aí é normal acontecer ali, a gente fechou todas as saídas e entradas possíveis ali naquele momento, no nosso trabalho, nas pontes, nas baias. E esse carro ficou no meio. Ele ficou no meio perdido, ele não sabia o que fazer, ele abriu a porta e saiu, jogou a chave no chão e saiu correndo de volta para o Paraguai. E nesse meio tempo, grita aqui, grita ali, um policial federal e mais um colega nosso correu atrás dele, a Força Nacional, enfim, todas as forças ali envolvidas, e conseguiram abordá-lo no meio da ponte e o trouxeram de volta (...)”
(evento nº 31).
(...)"
Ademais, o próprio apelante relatou em sede policial que já havia realizado o transporte de drogas do Paraguai para o Brasil outras duas vezes, com o mesmo veículo e sob contratação da mesma pessoa (
processo 5009329-05.2024.4.04.7002/PR, evento 1, INQ1
).
Diante do exposto, é nítido que o réu não foi apenas uma "mula" ocasional, uma vez que já havia realizado o transporte de entorpecentes em outras oportunidades, e porque o contexto da prática criminosa evidencia que possui estreitos laços com grupo criminoso.
Desse modo, havendo evidências do envolvimento do réu com organização criminosa voltada para o narcotráfico, não incide a causa de diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006.
Assim, a pena privativa de liberdade resta definitivamente fixada em
06 (seis) anos, 03 (três) meses e 25 (vinte e cinco) dias de reclusão.
Quanto à pena de multa, o número de dias-multa deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade estabelecida, enquanto que o valor do dia-multa deve ser fixado de acordo com as condições do condenado, conforme exposto no tópico "5.1".
No caso dos autos, a pena foi redimensionada, de modo que a multa deve ser readequada em patamar proporcional ao estabelecido em Lei específica para o delito de tráfico de drogas, pelo que, fixo a referida pena em
626 (seiscentos e vinte e seis) dias-multa
, uma vez que esse é o
quantum
que guarda relação de proporcionalidade com a sanção corporal, mantido o
valor unitário do dia-multa
, porquanto
já
estabelecido no mínimo legal
, em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato, atualizável o valor pelo IPCA-e.
Eventual pedido de redução ou afastamento da pena de multa, em decorrência da situação econômica do réu, deve ser submetido ao juízo da execução, a quem cabe fixar as condições de adimplemento e autorizar, inclusive, eventual parcelamento do valor devido.
6. Regime inicial de cumprimento da pena e substituição
Para a imposição do regime inicial de cumprimento da reprimenda, deve-se levar em conta a combinação entre a quantidade de pena imposta na sentença (art. 33, §2º, do CP) e as circunstâncias judiciais, se favoráveis ou eventualmente desfavoráveis (art. 33, §3º, do CP), sem descuidar da orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal,
verbis
:
'Súmula 718: A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada.'
'Súmula 719: A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.'
Vale lembrar, ainda, a redação do artigo 42 da Lei de Tóxicos que deve ser levado em consideração também da fixação do regime inicial de cumprimento da pena:
'Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.'
No caso em análise, em que pese a pena privativa de liberdade redimensionada, considerando a valoração de duas circunstâncias judiciais, uma delas preponderante,
deve ser mantido o regime inicial
fechado
para o cumprimento da pena.
O réu não preenche os requisitos legais do art. 44 do CP, já que a pena privativa de liberdade extrapola os quatro anos.
Passo ao exame das questões invocadas pela parte autora.
Elevação da pena-base pela quantidade do entorpecente, em contrariedade ao artigo 42 da Lei nº 11.343 de 2006.
Cabe pontuar que, há algum tempo, a 4ª Seção desta Corte sedimentou o entendimento de que a dosagem da pena-base deve atender às peculiaridades do caso, e não a um critério puramente matemático:
PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. FATO ASSIMILADO A CONTRABANDO. ART. 334, § 1º, 'B', DO CP, C/C O ART. 3º DO DECRETO-LEI N. 399/1968. DOSIMETRIA. ART. 59 DO CP. CULPABILIDADE, ANTECEDENTES E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. CRITÉRIOS DE ACRÉSCIMO DA PENA-BASE. 1. Art. 59 do CP. A vetorial 'culpabilidade' deve ser considerada neutra, pois a reprovabilidade da conduta em nada excede o disposto no tipo penal, haja vista que o dolo, a quantidade de mercadoria apreendida e o valor dos tributos iludidos apontado na origem não são capazes de embasar exasperação da pena-base nesse sentido. 2. Manutenção da valoração negativa das balizadoras 'antecedentes' e 'circunstâncias do crime' (art. 59 do CP). 3.
O critério adotado para o acréscimo da pena-base deve resultar de análise das particularidades do caso concreto, prestigiando o princípio da individualização da pena.
4. Exclusão do critério do termo médio na primeira fase da dosimetria. (TRF4, ENUL 5001071-30.2011.4.04.7206, QUARTA SEÇÃO, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 09/09/2014)
Na mesma linha advoga o STJ, esclarecendo que
"não se admite a adoção de um critério puramente matemático, baseado apenas na quantidade de circunstâncias judiciais desfavoráveis, até porque de acordo com as especificidades de cada delito e também com as condições pessoais do agente, uma dada circunstância judicial desfavorável poderá e deverá possuir maior relevância (valor) do que outra no momento da fixação da pena-base, em obediência aos princípios da individualização da pena e da própria proporcionalidade"
(STJ, AgRg no HC 512.046/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Leopoldo de Arruda Raposo, julgado em 22/10/2019, DJe 29/10/2019).
Nos exatos termos do art. 42 da Lei 11.343/06, a natureza e a quantidade da droga têm preponderância sobre as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, devendo, de rigor, ter incremento diferenciado dessas.
Também, oportuno destacar que qualidade e quantidade não são um binômio e, sim, duas vetoriais autônomas, ambas autorizando por si aumento da pena-base.
In casu
, a elevação aplicada foi justificada em razão da quantidade de entorpecente encontrada (401,7 Kg da substância maconha), justificando maior incremento da pena-base, a ponderar no exame individualizado. A imposição da pena mostra-se em consonância com o entendimento dos Tribunais Superiores, como se vê do seguinte julgado:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. OFENSA AOS ARTS. 59 DO CP E 42 DA LEI Nº 11.343/2006. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. POSSIBILIDADE. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA. CIRCUNSTÂNCIAS PREPONDERANTES. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ACÓRDÃO DE ACORDO COM O ENTENDIMENTO DO STJ. SÚMULA 568/STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 33, § 4º DA LEI Nº 11.343/2006. APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO. INVIABILIDADE. I) RÉUS INTEGRANTES DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA E IDÔNEA. DECISÃO RECORRIDA EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 568/STJ. II) REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. NEGATIVA DE VIGÊNCIA DO ART. 33, § 2º E § 3º, DO CP. FIXAÇÃO DE REGIME MAIS BRANDO. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA. PRETENSÃO EM DESACORDO COM O ENTENDIMENTO DO STJ. SÚMULA 568/STJ. OFENSA AO ART. 617 DO CPP. I) INOVAÇÃO RECURSAL. II) REFORMATIO IN PEJUS. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte Superior de Justiça tem entendido que
"No termos do art. 42 da Lei n. 11.343/2006, a quantidade e a natureza da droga apreendida são preponderantes sobre as demais circunstâncias do art. 59 do Código Penal e podem justificar a fixação da pena-base acima do mínimo legal, cabendo a atuação desta Corte apenas quando demonstrada flagrante ilegalidade no quantum aplicado"
(HC 301.872/ES, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, DJe 15/03/2017). Súmula 568/STJ.
In casu, não se verifica desproporcionalidade em razão do incremento da pena-base em apenas 02 anos e 06 meses acima do mínimo legal, com fundamento na natureza e grande quantidade da droga (15.913g de cocaína - fl. 834) , mas tão somente um exercício de discricionariedade vinculada, o que é autorizado ao magistrado sentenciante, no momento da confecção da dosimetria da pena, não havendo nada de ilegal quanto a tal proceder
. 2. Nos termos do entendimento deste Superior Tribunal de Justiça "Revela-se inviável a aplicação da causa especial de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, porquanto as circunstâncias do caso - existência de diversas viagens de curta duração registradas no passaporte do sentenciado e por ele não justificadas devidamente - levaram a conclusão de que não se tratava de traficante ocasional, mas sim que fazia do tráfico internacional de entorpecentes seu meio de vida, ou seja, que se dedicaria a atividades delituosas" (HC 203.231/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 14/12/2012). Súmula 568/STJ. 3. É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um cotejo fático e probatório a fim de analisar a existência de provas suficientes a embasar a aplicação da pena-base e das causas de aumento ou de diminuição da sanção, porquanto é vedado na via eleita o reexame de fatos e provas. Súmula 7/STJ. 4. Este Superior Tribunal de Justiça tem entendido que "a quantidade e a natureza da droga são motivos idôneos para o indeferimento do regime prisional mais brando e da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos"(STJ, gRg no AREsp 390.914/DF, Quinta Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Julgado em 17/10/2013, DJe 23/10/2013). Súmula 568/STJ.
Portanto, em razão da vultosa quantidade de droga apreendida, é devido o aumento operado na pena-base do requerente, não se verificando qualquer contrariedade ao artigo 42 da Lei nº 11.343 de 2006.
Aplicação da minorante do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343 de 2006
Os requisitos para a incidência da causa de diminuição da pena encontram-se previstos expressamente no art. 33, § 4º, correspondendo à primariedade, aos bons antecedentes, bem como ao fato de o réu não se dedicar a atividades criminosas, tampouco integrar organização criminosa.
Por outro lado, ainda que o agente preencha os requisitos objetivos insertos no art. art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, a causa especial de diminuição da pena deve ser aplicada com cautela, dentro dos parâmetros legais mínimo e máximo. Significa, portanto, que, mesmo quando atendidos os critérios objetivos, a redução não se fará necessariamente no máximo previsto, porque isso representaria esvaziar a própria norma. Sobre isso, o precedente do Superior Tribunal de Justiça que segue:
PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06.
NATUREZA
,
QUANTIDADE
E DIVERSIDADE. DEDICAÇÃO A ATIVIDADE CRIMINOSA. INAPLICABILIDADE. PLEITO DE FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL FECHADO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. I - Esta Corte vem decidindo que a expressiva
quantidade
de droga apreendida, aliada a outras circunstâncias próprias do caso concreto, ora pode impedir a incidência do art. 33, §4º, da Lei 11.343/06, - caso em que estará evidenciada a dedicação à atividade criminosa -, ora como fator que, embora não impeça a aplicação da causa de diminuição, será tomada como parâmetro para definir o quantum da redução da pena. In casu, em que pesem os argumentos da defesa, além da
quantidade
e da
natureza
da droga apreendida a evidenciar a dedicação à atividade criminosa, o ora agravante e outras quatro pessoas foram vistos por policiais militares, que efetivam o flagrante, "picando e embalando drogas" atrás do Colégio São Miguel (fl. 670) e os mesmos "são conhecido no meio policial pelo envolvimento com tráfico de drogas" (fl. 670). Ademais, consignou o Colegiado a quo que "foram arrecadados 171,54g de maconha, 9,24g de crack e 248,51g de cocaína, além de diversos saquinhos plásticos, o que demonstra que a considerável
quantidade
de entorpecentes séria destinada ao comércio ilícito" (fl. 673). II - (...) Precedentes. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no AREsp 1304736/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro FELIX FISCHER, julgado em 25/09/2018, DJe 28/09/2018).
Nessa perspectiva, o modo de execução do delito, com maior profissionalismo, é circunstância que minimiza a possibilidade de aplicação da redutora em seu grau máximo, uma vez que demonstra o envolvimento de organização criminosa na prática delitiva.
No caso, restou afastada a incidência da causa de diminuição prevista, pois a
ação de
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
não é equiparada à daquela pessoa usualmente chamada de “mula”, vez que sua contratação para transportar drogas, além de não ter sido por uma única vez, se deu em um contexto que evidencia que, no mínimo, possui envolvimento com grupo criminoso, cujo poderio econômico é evidenciado pela grande quantidade de maconha apreendida.
(
evento 40, SENT1
- processo 5011652-80.2024.4.04.7002).
Efetivamente, como destacado pelo juízo,
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
, em sede policial, relatou que esta era a terceira vez que realizava o transporte de droga do Paraguai para o Brasil, sempre com o mesmo veículo, e sob contratação da mesma pessoa (“Era a terceira vez (...) era o mesmo carro... o mesmo carro (...) e era para a mesma pessoa (...) Me deram e eu tinha que passar (...)
(evento nº 01 do inquérito policial).
Conforme relatado pelos servidores Leandro Pimentel Nascimento Cavalcante e Osmar Carlos do Prado,
não foi o transporte da droga realizado por
JOSE RODRIGO GARCETE CANO
uma ação isolada, praticada por pessoa contratada de forma eventual, mas sim fruto de um esquema engendrado de forma articulada, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de aumentar as chances de sucesso da empreitada.”
A presença de indícios de envolvimento em organização criminosa, abrangendo apreensão de 401,700 Kg (quatrocentos e um quilos e setecentos gramas) de maconha afasta a aplicação da causa de diminuição de pena. Neste sentido os seguintes precedentes:
DIREITO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL. NÃO CONHECIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA. AGRAVO DESPROVIDO.
I. Caso em exame1. Agravo regimental interposto contra decisão monocrática que não conheceu do habeas corpus impetrado em substituição à revisão criminal, visando à revisão da dosimetria da pena aplicada ao agravante, condenado por tráfico de drogas.
2. O agravante foi condenado à pena de 21 anos, 2 meses e 24 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 2.449 dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos artigos 33 e 35 da Lei n. 11.343/2006, em concurso material de crimes, conforme sentença do Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Corumbá.
3. O Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul deu provimento parcial ao recurso de apelação para absolver o agravante do crime previsto no art. 35 da Lei n. 11.343/2006, mantendo a condenação pelo crime de tráfico de drogas.
II. Questão em discussão4. A questão em discussão consiste em saber se a quantidade de drogas apreendidas justifica o afastamento da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, e se o habeas corpus pode ser utilizado como sucedâneo de revisão criminal.
5. O agravante alega que não é reincidente em crime do mesmo tipo penal, possui bons antecedentes e não há provas de dedicação a atividades criminosas ou participação em organizações criminosas, argumentando que a quantidade de entorpecentes apreendida não é fundamento suficiente para afastar a minorante.
III. Razões de decidir6. O Superior Tribunal de Justiça não conhece habeas corpus impetrado em substituição à revisão criminal, em conformidade com a jurisprudência da Corte, que limita a revisão apenas aos seus próprios julgados.
7. O afastamento da causa de diminuição de pena do tráfico privilegiado está justificado no acórdão impugnado, com menção expressa à reincidência do agravante, não havendo ilegalidade flagrante que autorize a concessão da ordem de ofício.
IV. Dispositivo e tese8. Agravo regimental desprovido.
Tese de julgamento: "1. O habeas corpus não pode ser utilizado como sucedâneo de revisão criminal para impugnar decisão transitada em julgado. 2. A quantidade de drogas apreendidas pode justificar o afastamento da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, quando acompanhada de outros elementos, como a reincidência do réu".
Dispositivos relevantes citados: Lei n. 11.343/2006, art. 33, § 4º;
CF/1988, art. 105, I, "e".Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 861.867/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 02.09.2024. (STJ, AgRg no HC 990355 / MS, Quinta Turma, Relator Ministro Messod Azulay, julgado em 17/06/2025).
APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, C/C O ARTIGO 40, INCISO I, DA LEI 11.343/2006. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ARTIGO 12 DA LEI 10.826/2003. RECEPTAÇÃO DOLOSA. ARTIGO 180, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. ABSOLVIÇÃO. MANUTENÇÃO. CONDENAÇÃO. CORRÉU. DOSIMETRIA. PENA-BASE.
NATUREZA
DA DROGA. MACONHA. VETORIAL NEUTRA. MINORANTE. ARTIGO 33, §4º, DA LEI 11.343/2006. APLICABILIDADE. 1. (...). 5.
Embora a condição de mula não autorize, por si só, o afastamento do tráfico privilegiado, trata-se de circunstância que justifica a aplicação da minorante em patamar diverso da fração máxima. Precedentes do STJ.
(TRF4, ACR 5011315-96.2021.4.04.7002, 8ª Turma, Relator MARCELO MALUCELLI, julgado em 06/09/2023)
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. INADMISSIBILIDADE. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. NÃO INCIDÊNCIA. INTEGRANTE DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ANÁLISE POR ESTA CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICOPROBATÓRIO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. QUANTUM DA PENA APLICADA. REQUISITO DO ART. 44, I, DO CP NÃO PREENCHIDO. REGIME INICIAL FECHADO. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA COM O PACIENTE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA. 1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça não têm mais admitido a utilização do habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, seja o recurso, seja a revisão criminal, salvo em situações excepcionais. 2.
A mens legis da causa especial de diminuição prevista no art. § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 é justamente punir, com menor rigor, o pequeno traficante, que não faz do tráfico de drogas o seu meio de vida, mas que, cometendo um fato isolado na sua vida, acaba por incidir na conduta típica prevista no art. 33 da mencionada lei federal. Tanto é assim que exige, além da primariedade e dos bons antecedentes, a não integração em organização criminosa e a não dedicação a atividades delituosas.
3. Na espécie dos autos, contudo, não obstante o paciente seja primário e possuidor de bons antecedentes, infere-se que as instâncias originárias deixaram de aplicar o § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 por entenderem que, em razão da quantidade e natureza da droga apreendida (28 porções de cocaína e 47 pedras de crack - fl. 16) e das circunstâncias que rodearam essa apreensão, o paciente integrava organização criminosa. 4. Esta Corte tem reiteradamente decidido, em observância ao disposto no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, que, havendo demonstração de que o paciente integra organização criminosa, mostra-se inaplicável a minorante em questão e alcançar conclusão inversa demandaria o exame do conjunto probatório dos autos, providência inviável na via estreita do habeas corpus, carente de dilação probatória. 5. Ante o quantum da pena aplicada, incabível o pleito de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. 6. Areprimenda definitiva imposta (superior a 4 anos de reclusão), aliada à quantidade de droga apreendida com o paciente, justifica a aplicação do regime inicial mais rigoroso. 7. Habeas corpus não conhecido. (STJ, HC 347.600/SP, Sexta Turma, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, julgado em 05/04/2016, DJe 18/04/2016)
Mantida a não-incidência da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.
Alteração do regime prisional
Para a aplicação do regime de cumprimento de pena devem ser observadas as disposições constantes nos arts. 33 e 59 do Código Penal.
No caso, o voto condutor do acórdão que se pretende revisar, manteve o regime inicial fechado, para o cumprimento da pena, ao argumento de valoração de circunstâncias judiciais preponderantes (art. 42 da Lei de Tóxicos) consistentes na quantidade de droga apreendida (401,7 kg de maconha), bem como nas circunstâncias do delito (
esquema engendrado de forma articulada, envolvendo vários veículos e pessoas, com o objetivo de aumentar as chances de sucesso da empreitada
).
As circunstâncias demonstradas revelam não ser suficiente, para reprimenda do delito, regime menos gravoso do que o fechado (art. 33, § 3º, CP). No ponto destaco, os seguintes precedentes:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. EXISTÊNCIA. INOVAÇÃO. MATÉRIA NÃO ANALISADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. REGIME LEGAL MANTIDO. FUNDAMENTADO. CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS. NATUREZA DA DROGA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. AGRAVO DESPROVIDO.
1. O exame pelo Superior Tribunal de Justiça de matéria que não foi apreciada pelas instâncias ordinárias enseja indevida supressão de instância, com explícita violação da competência originária para o julgamento de habeas corpus (art. 105, I, c, da Constituição Federal).
2. O juiz pode fixar regime inicial mais gravoso do que aquele relacionado unicamente com o quantum da pena ao considerar a eventual existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis, especialmente a natureza ou a quantidade da droga, até mesmo sua forma de acondicionamento, desde que fundamente a decisão.
3. Agravo regimental desprovido.
(STJ, AgRg no HC 698888 / MG, Quinta Turma, Relator Ministro João Otávio Noronha, julgado em 16/11/2021).
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DECISÃO MONOCRÁTICA. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DO § 4º DO ART. 33 DA LEI DE DROGAS. IMPOSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE DENOTA A DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES ILÍCITAS. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE DROGAS ALIADA A OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO (MAIS DE 1KG MACONHA, 720 COMPROMIDOS DE MDMA, PESO 203,7G). REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIÁVEL NA ESTREITA VIA DO MANDAMUS. REGIME DIVERSO DO FECHADO. IMPOSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL QUE ELEVOU A PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS APTOS A DESCONSTITUIR A DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - É assente nesta Corte Superior de Justiça que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. II - O v. acórdão impugnado fundamentou o afastamento do tráfico privilegiado, consubstanciada na conclusão de que o paciente se dedicava a atividades criminosas (traficância), em razão não somente pela quantidade de drogas apreendidas (mais de um quilo de maconha e seus derivados com comprovada presença do THC, além de 720 comprimidos de metilenodioximetanfetamina (MDMA) com peso líquido de 203, 7 gramas), mas também pelas circunstâncias em que se deu a prisão, bem como constatarem que não se tratava de traficante ocasional. Tudo isso, são elementos aptos a justificar o afastamento da redutora do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Rever o entendimento da Corte de origem para fazer incidir a causa especial de diminuição, como reclama a impetrante, demandaria, necessariamente, amplo revolvimento da matéria fáticoprobatória, procedimento que, a toda evidência, é incompatível com a estreita via do mandamus. III - Nos termos do art. 33, §§ 1º, 2º e 3º, do Código Penal, para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, o Julgador deverá observar a quantidade da reprimenda aplicada, a eventual existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis e, em se tratando dos crimes previstos na Lei n. 11.343/2006, como no caso, deverá levar em conta a quantidade e a natureza da substância entorpecente apreendida (art. 42 da Lei n. 11.343/2006). Segundo jurisprudência do excelso Supremo Tribunal Federal, "a opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada" (Súmula n. 718/STF), e "a imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea" (Súmula n. 719/STF). IV - Na hipótese, entendo que deve ser mantido o regime inicial fechado, ante a existência de circunstância judicial desfavorável, que foi utilizada para majorar a pena- base do paciente. Segundo pacífica jurisprudência desta Corte Superior, a existência de circunstância judicial desfavorável, com a consequente fixação da pena-base acima do mínimo legal, autoriza a determinação de regime inicial mais gravoso do que o cabível em razão do quantum de pena cominado. Agravo regimental desprovido.(STJ, AgRg no HC 609.897/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 06/10/2020, DJe 19/10/2020)”
Neste cenário, não havendo erro técnico ou injustiça, não se deve, em sede de revisão criminal, reduzir a reprimenda imposta ao condenado, ou alterar o regime prisional, quando estes foram fixados em obediência aos princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade. Nesse sentido, confira-se:
PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. CONTRARIEDADE A TEXTO EXPRESSO DA LEI PENAL OU À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. DOSIMETRIA DAS PENAS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. DESCABIMENTO DA REVISIONAL. Não se admite a revisão criminal para reanálise de provas e da configuração do tipo penal, quando já foram amplamente avaliadas e decididas no processo. Ausentes novos elementos capazes de modificar as conclusões da sentença condenatória, descabe a ação revisional.
Inviável o reexame da dosimetria das penas, quando não configurada flagrante injustiça e/ou ilegalidade. Revisão criminal não conhecida.
(TRF4 5039869-03.2018.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, juntado aos autos em 19/12/2018).
PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. ARTS. 33 E 35, CAPUT, C/C ART. 40, I, DA LEI 11.343/06. ÃRT. 621, I, DO CPP. HIPÓTESES NÃO CONFIGURADAS. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE A SER CORRIGIDA DE OFÍCIO. DOSIMETRIA DA PENA. FUNDAMENTAÇÃO E ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS. 1. Conquanto a revisional seja fundada no art. 621, I, do CPP, o requerente não apontou descumprimento de qualquer dispositivo legal ou mesmo expôs contrariedade à alguma evidência dos autos, evidenciando da sua narrativa de que não se trata de contrariedade com a prova produzida e, sim, de inconformidade quanto à dosimetria não apresentada em momento oportuno, qual seja, a apelação. 2. Do exame da dosimetria feita na sentença, também, não se verifica erro evidente que reclame correção nesta via, já que foram, fundamentadamente, apontadas as circunstâncias que levaram à exasperação das penas-bases (qualidade e quantidade da droga), que restaram impostas dentre dos limites legais, assim como a multa correspondente.
3. A revisão criminal não é via para reapreciação dos critérios adotados pelo juiz, dentro do exercício do livre convencimento, somente sendo possível a redução da pena quando ocorrer flagrante erro na análise das vetoriais do art. 59 do CP, eventual causa de diminuição não apreciada na sentença ou decisão contrária ao conjunto probatório.
(TRF4 5017428-28.2018.4.04.0000, QUARTA SEÇÃO, Relator LUIZ CARLOS CANALLI, juntado aos autos em 14/12/2018).
Em conclusão, quanto a todos os pontos trazidos pela defesa, cabe consignar que a revisão criminal, como já sufragado, não pode e nem deve ser utilizada como sucedâneo recursal em caso de inconformidade da parte com acórdão que decidiu de forma contrária à sua pretensão. O uso da revisão criminal (em sendo uma exceção à regra geral da imutabilidade da coisa julgada) é reservado para hipóteses restritas, nos casos taxativamente enumerados nos incisos do art. 621, incisos I a III, do CPP.
Vale frisar que a inobservância das hipóteses previstas de forma rígida no CPP viola o princípio do livre convencimento judicial, bem como transforma a revisão criminal em recurso destinado a reexaminar matéria já julgada, indiretamente, atingindo os efeitos da coisa julgada material.
Nessa direção, confira-se:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ALEGAÇÃO DE SENTENÇA CONTRÁRIA A TEXTO EXPRESSO DE LEI E EVIDÊNCIA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. 1. São taxativas as hipóteses de cabimento da revisão criminal, previstas nos incisos I, II e III do art. 621 do Código de Processo Penal.
Não é cabível a sua utilização para mera rediscussão das questões já julgadas ou revaloração das provas que foram expressa e adequadamente apreciadas no julgamento da ação penal.
(TRF4 5059474-66.2017.4.04.0000,
QUARTA SEÇÃO
, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em
16/02/2018
)
PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ARTIGO 621, INCISO II, CPP. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA VIA COMO SEGUNDA APELAÇÃO.
A revisão criminal não faz às vezes de uma segunda apelação, não se prestando à reapreciação da prova já anteriormente analisada e devidamente sopesada
. (TRF4 5019290-68.2017.4.04.0000,
QUARTA SEÇÃO
, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em
05/12/2017
)
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 621, CAPUT, I E II, DO CPP. REVISÃO CRIMINAL. NÃO CONHECIMENTO. REANÁLISE DE QUESTÕES JÁ AVALIADAS E DECIDIDAS EM DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O Tribunal local assentou que a revisão criminal não se enquadrou em nenhuma das hipóteses do artigo 621 do Código de Processo Penal, não sendo cabível, portanto, para reanálise de matéria submetida a julgamento em duplo grau de jurisdição, como sucedâneo recursal, entendimento, este, de acordo com a jurisprudência deste STJ. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 997.912/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 15/12/2016)(grifei)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. PRELIMINAR. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. TERMO INICIAL. CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ACTIO NATA. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE CONDENAÇÃO EM CONTRARIEDADE AO TEXTO EXPRESSO DE LEI OU A EVIDÊNCIA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. De acordo com a Súmula Vinculante 24, "não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo". Assim, enquanto não constituído definitivamente o tributo, não há falar em pretensão punitiva e, por conseguinte, em início da contagem do respectivo prazo prescricional. 2.
A hipótese de cabimento da revisão criminal prevista no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal exige que haja contradição cristalina entre a condenação e o texto expresso de lei ou a prova carreada aos autos, o que não ocorre no presente caso, no qual a decisão foi fruto do livre convencimento motivado do julgador monocrático, que embasou sua convicção no substrato probatório processual. 3. Incabível o reexame do julgado quando demonstrada mera intenção do postulante em obter nova apreciação do conjunto probatório, eis que a revisão criminal não se presta como espécie de apelação.
4. Estando o processo originário instruído com cópia do processo administrativo-fiscal, no bojo do qual restou definitivamente constituído o respectivo crédito tributário, considera-se comprovada a sonegação fiscal. (TRF4, RVCR 0006732-57.2014.404.0000, QUARTA SEÇÃO, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, D.E. 28/07/2015)(grifei)
Assim, as pretensões deduzidas neste feito mostram-se manifestamente incabíveis, uma vez que não se enquadram em nenhuma das hipóteses taxativas elencadas no art. 621 e no art. 626 do Código de Processo Penal.
Pelo exposto, indefiro a petição inicial, por manifestamente incabível.
Intimem-se.
Desentranhe-se o documento acostado no evento 5, RELT1
Após, dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos eletrônicos.
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