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Processo nº 1003946-52.2024.8.26.0541

ID: 294232620

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Santa Fé do Sul - 2ª Vara Classe: CUMPRIMENTO DE SENTENçA CONTRA A FAZENDA PúBLICA Nº Processo: 1003946-52.2024.8.26.0541

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

ANDERSON CLAITON ALMEIDA RUBINHO

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

ESTEVAN GIANINI SGANZELLA

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Processo 1003946-52.2024.8.26.0541 - Cumprimento de Sentença contra a Fazenda Pública - Fazenda Pública - Anderson Claiton Almeida Rubinho - Vistos. Trata-se de cumprimento de sentença individual ori… Processo 1003946-52.2024.8.26.0541 - Cumprimento de Sentença contra a Fazenda Pública - Fazenda Pública - Anderson Claiton Almeida Rubinho - Vistos. Trata-se de cumprimento de sentença individual originada de mandado de segurança coletivo (Processo originário nº 0600593-40.2008.8.26.0053, impetrado pela Associação dos Cabos e Soldados da Polícia Militar do Estado de São Paulo (ACSPMESP), no qual foi reconhecido o direito de policiais militares ao recebimento de quinquênios e da sexta-parte com incidência sobre o valor integral dos vencimentos. Alega o requerente, em síntese, que é beneficiário do referido julgamento. A sentença transitou em julgado em 26 de abril de 2022, constituindo título executivo judicial líquido, certo e exigível. Possui legitimidade para executar individualmente o título coletivo, com base em jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça de São Paulo, que reconhece a coexistência entre ação coletiva e individual. O exequente comprova sua condição de policial militar através de holerite, demonstrando o recebimento dos adicionais sem a devida incidência na base de cálculo dos quinquênios e sexta-parte. Apresenta cálculos das diferenças devidas no período de setembro de 2008 a junho de 2018, totalizando o valor de R$26.437,68 (Vinte e Seis Mil, Quatrocentos e Trinta e Sete Reais e Sessenta e Oito Centavos). Requer a procedência da ação para condenar a requerida ao pagamento das diferenças calculadas, com expedição de ofício ao Tribunal para processamento via sistema de precatórios. Com a inicial vieram documentos (fls.23/324). O processo foi recebido e determinou-se a comprovação da condição de beneficiário da justiça gratuita. A decisão foi agravada, sendo concedida a benesse processual. O requerente emendou o feito para juntar as custas inicias. Regularmente citada, a Fazenda Pública do Estado de São Paulo apresentou impugnação ao cumprimento de sentença às fls.489/507. Alega que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em decisão proferida em 07/08/2024, determinou a suspensão de todos os processos coletivos e individuais relacionados ao Tema 47, que versa sobre a incidência do adicional de insalubridade recebido pelos policiais militares na base de cálculo dos quinquênios, com fundamento no art. 982, inciso I do CPC, tendo em vista a necessidade de uniformização da questão em primeiro e segundo graus. Preliminarmente, defende que o exequente não era filiado à Associação dos Cabos e Soldados do Estado de São Paulo quando do ajuizamento do mandado de segurança coletivo nº 0600593-40.2008.8.26.0053, de modo que a legitimidade para execução individual está limitada aos associados da entidade impetrante, não se estendendo a toda a categoria. Impugna os cálculos apresentados pelo exequente pois o adicional de insalubridade não deve integrar a base de cálculo dos quinquênios, conforme determinação ainda em análise pelo Tribunal (tema 47). Narra que o juízo da 12ª Vara da Fazenda Pública da Capital, prevento para as execuções que tramitam na Capital, limitou a abrangência da decisão aos associados à impetrante. Manifestação sobre a impugnação às fls. 514/524. DECIDO. Inicialmente, afasto a suspensão do feito até o julgamento do IRDR nº0026477-31.2021.8.26.0000 (Tema 47), uma vez que este não se aplica ao presente caso por tratar-se de cumprimento de sentença das diferenças salariais decorrentes do recálculo dos adicionais temporais à luz da coisa julgada formada a partir da impetração do mandado de segurança coletivo nº 0600593-40.2008.8.26.0053. Em outras palavras, conclui-se que não é caso de suspender o presente feito, pois, a determinação de suspensão das ações pendentes que discutam o tema da base de cálculo do adicional por tempo de serviço de policiais militares e sua eventual integração pelo adicional de insalubridade, nos autos do IRDR, é datada de 25 de maio de 2023, enquanto o trânsito em julgado no mandado de segurança coletivo ocorreu antes, mais precisamente em 26 de abril de 2022. Nesse sentido: Recurso Inominado - Servidor Público Estadual - Policial Militar - Ação de Cobrança (Súmulas 269 e 271 do STF) - Pretensão de inclusão do Adicional de Insalubridade na base de cálculo dos adicionais por tempo de serviço (quinquênios e sexta-parte) - Inexistência de suspensão deste processo, já que a decisão liminar que determinou a suspensão dos processos pendentes envolvendo a base de cálculo do adicional por tempo de serviço de policiais militares e sua eventual integração pelo adicional de insalubridade na ação nº 0026477-31.2021.8.26.0000 (Tema 47, IRDR do TJSP) é posterior ao trânsito em julgado do Mandado de Segurança Coletivo nº 0600593-40.2008.8.26.0053 (ocorrido em 26/04/2022) - (...) (TJSP; Recurso Inominado Cível 1005639-09.2022.8.26.0358; Relator (a): CESAR AUGUSTO FERNANDES; Órgão Julgador: 6ª Turma Recursal de Fazenda Pública; Foro de Mirassol - Juizado Especial Cível e Criminal; Data do Julgamento: 05/04/2024; Data de Registro: 05/04/2024). G.N AGRAVO DE INSTRUMENTO. Mandado de segurança coletivo. Cumprimento de sentença. Diferenças de quinquênios e sexta-parte. Suspensão determinada na reclamação 2004642-11.2025.8.26.0000. Suspensão pelo IRDR, Tema 47, e inclusão do adicional de insalubridade na base de cálculo dos quinquênios. Questões já decididas, a cujo respeito operou-se a preclusão, Código de Processo Civil, artigos 505 e 507, por isso fora do alcance da questionada suspensão, que cumpre afastar. Recurso provido.(TJSP; Agravo de Instrumento 2143898-66.2025.8.26.0000; Relator (a):Edson Ferreira; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes -8ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 27/05/2025; Data de Registro: 27/05/2025) G.N. A preliminar de ilegitimidade ativa também deve ser rejeitada. Os efeitos favoráveis da sentença alcançam a categoria representada. Isso porque, versando sobre matéria de direito transindividual/individual homogêneo, a extensão dos efeitos da decisão proferida na ação coletiva à toda categoria atingida é decorrência lógica e natural. No mais, no caso específico, a Associação de Cabos e Soldados da Polícia Militar do Estado de São Paulo representava os integrantes da Polícia Militar (Lei n. 12.016/2009, art. 22). Outrossim, desnecessária autorização específica do exequente para o ajuizamento da ação coletiva, nos termos do art. 21, caput da Lei nº 12.016/2009. Ademais, a filiação esteve comprovada pelos holerites, em especial os de fls.130/248 que evidenciamos descontos a título de "ACSPM-Associação de Cabos e Soldados PM" desde novembro de 2012 até dezembro de 2019. Não obstante o exequente ter se filiado após a data de impetração do writ, as cortes pátrias já assentaram a desnecessidade de autorização dos associados ou lista nominal para impetração do remédio constitucional, uma vez que a associação atua em nome próprio, defendendo direito alheio, independente deconstaremos associados na lista apresentada no momento do ajuizamento do mandamus, ou de serem filiados à associação impetrante (Tema 1119 do STF e Tema 1056 do STJ). Confira-se arestos proferidos em casos análogos pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: RECURSO INOMINADO Ação de Cobrança Servidor Público Estadual PolicialMilitarRecebimento das diferenças atinentes aoquinquênioanterior à impetração doMandadode SegurançaColetivonº0600593-40.2008.8.26.0053 Sentença de procedência Recurso do réu Preliminares rejeitadas. Parte autora não associada ao impetrante do mandamus. Irrelevância. Exclusão do Adicional de Insalubridade dos quinquênios já realizado pela sentença. Recurso não provido. (TJ-SP 1000760-44.2023.8.26.0383 Nhandeara, Relator: Flávio Pinella Helaehil - Colégio Recursal, Data de Julgamento: 08/03/2024, 5ª Turma Recursal de Fazenda Pública, Data de Publicação: 08/03/2024) . RECURSO INOMINADO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL INATIVO. POLICIALMILITAR. ADICIONAIS TEMPORAIS.MandadodeSegurançaColetivonº0600593-40.2008.8.26.0053 que assegurou aos policiais militares o direito ao recálculo dos quinquênios e da sexta- parte sobre os vencimentos integrais, excluídas as vantagens eventuais. Sentença de parcial procedência. Recurso da ré. Observância ao princípio da devolutividade recursal. Alegação de falta de interesse de agir Parte autora não associada ao impetrante do mandamus Prevenção da 12ª Câmara de Direito Público por ter sido o Órgão Julgador do MSColetivoPrescrição. Desacolhimento. Recurso da ré a que se NEGA PROVIMENTO. (TJ-SP - Recurso Inominado Cível: 10046983220238260291 Jaboticabal, Relator: Fátima Cristina Ruppert Mazzo - Colégio Recursal, Data de Julgamento: 10/07/2024, 7ª Turma Recursal de Fazenda Pública, Data de Publicação: 10/07/2024). Pois bem. No Mandado de Segurança Coletivo nº 600593-40.2008.8.26.0053 restou decidido no dispositivo da sentença o seguinte: Isto posto, JULGO PROCEDENTE a presente ação mandamental que A ASSOCIAÇÃO DOS CABOS E SOLDADOS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO - ACSPMESP movem em face de ato do DIRETOR DO DE PARTAMENTO DE DESPESA DE PESSOAL DO ESTADO DE SÃO PAULO e do SUPERINTENDENTE DA CAIXA BENEFICENTE DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO -CBPM, para condenar as impetradas a proceder, no limite de suas atribuições, tal como definidas no corpo da presente sentença, ao pagamento do quinquênio, bem como da sexta-parte, na conformidade da regra do artigo 129 da Constituição do Estado, de forma que passem a incidir aquelas vantagens sobre o valor integral dos vencimentos, dos proventos e dos benefícios da pensão de todos os associados da impetrante que já possuíam incorporados o quinquênio e a sexta-parte, incidência esta que inclui vantagens provisórias ou permanentes, ressalvando-se as eventuais e outras vantagens percebidas em razão da mesma circunstância temporal, a exemplo do décimo constitucional, à vista da restrição estabelecida no artigo 115, XVI, da Constituição do Estado... Portanto, concedida a segurança, foi determinado o pagamento dos quinquênios e da sexta-parte com incidência sobre o valor integral dos vencimentos, dos proventos e dos benefícios da pensão, incluindo vantagens provisórias ou permanentes, ressalvando-se as eventuais e outras vantagens percebidas em razão da mesma circunstância temporal. Observo, contudo, que o exequente não especificou as verbas que pretende incluir na sua base de cálculo nos pedidos, mas apenas as tratou no corpo da petição, formulando pedido genérico, sendo este o recálculo dos adicionais temporais nos termos de sentença proferida no mandado de segurança coletivo 0600593-40.2008.8.26.0053. Resta, portanto, a discussão quanto às verbas sobre as quais deverão incidir os adicionais temporais, isso porque o writ supracitado não especificou quais seriam as verbas de caráter permanente que deveriam incidir na base de cálculo dos adicionais temporais. Como é cediço e reiteradamente decidido pelo TJSP, as verbas: Gratificação por Atividade de Polícia - GAP, Adicional de Local de Exercício ALE, Adicional Operacional Local AOL e Regime Especial de Trabalho Policial (RETP) são permanentes/não eventuais e não foram extintas, mas sim absorvidas pelos vencimentos dos integrantes das carreiras policiais militares. Assim, devem compor a base de cálculo do quinquênio e da sexta-parte. Todavia, com razão o executado quanto à impossibilidade de aplicação das verbas sobre o adicional de insalubridade. Vale observar que, ao contrário do que argumentado pela parte autora, o título no Mandado de Segurança Coletivo nº 600593-40.2008.8.26.0053, não prevê a inclusão do adicional de insalubridade na base de cálculo do adicional temporal. Isto porque o mandado de segurança coletivo, conforme acima exposto, exclui do pagamento as verbas de natureza eventual. A não incidência do Adicional de Insalubridade na base de cálculo do adicional por tempo de serviço está em harmonia com os limites do quanto decidido no mandado de segurança coletivo e a jurisprudência recente sobre o tema. É o que se extrai, em analogia, da aplicação da tese firmada no Tema 47, principalmente em face do caráter genérico da condenação na ação coletiva e do pedido do exequente no presente cumprimento de sentença. A questão foi pacificada no julgamento do IRDR 47, que firmou a seguinte tese: O adicional por tempo de serviço do policial militar é calculado nos termos o art. 3º inciso II da LCE nº 731/93 e a ele não se aplica, à falta de previsão em lei, as regras próprias do servidor civil, prevalecendo a regra especial na forma do art. 138 da Constituição do Estado. Não se inclui o adicional de insalubridade, verba de natureza 'propter laborem', na base de cálculo do adicional por tempo de serviço, uma vez que não previsto nos termos do art. 3º, II da LCE nº 731/1993. Nesse sentido, também a jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de São Paulo: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PROCEDÊNCIA COM OBSERVAÇÃO. I.Caso em Exame1. Reclamação proposta pelo Estado de São Paulo alegando desconformidade de acórdão da 1ª Turma Recursal de Fazenda Pública com a tese fixada no Tema nº 47 (IRDR nº 0026477-31.2021.8.26.0000), referente à inclusão do adicional de insalubridade na base de cálculo do adicional por tempo de serviço para policiais militares inativos. II.Questão em Discussão2. A questão em discussão consiste em determinar se a decisão reclamada exorbitou os limites do Tema nº 47 ao incluir o adicional de insalubridade na base de cálculo do adicional por tempo de serviço, contrariando a tese vinculante. III.Razões de Decidir3. O artigo 926 do CPC exige a uniformização da jurisprudência, enquanto o artigo 927, inciso III, obriga a observância de acórdãos em incidentes de resolução de demandas repetitivas. 4. A decisão reclamada não observou a tese do Tema nº 47, que exclui o adicional de insalubridade da base de cálculo do adicional por tempo de serviço, aplicável tanto a policiais militares ativos quanto inativos. IV.Dispositivo e Tese5. Reclamação procedente.Tese de julgamento:1. A tese do Tema nº 47 aplica-se a policiais militares ativos e inativos, excluindo o adicional de insalubridade da base de cálculo do adicional por tempo de serviço.Legislação Citada:- CPC, arts. 926, 927, 985, 989.Jurisprudência Citada:- TJSP, Reclamação 2272832-76.2024.8.26.0000, Rel. Teresa Ramos Marques, Turma Especial - Público, j. 29/11/2024; - TJSP, Reclamação 2086950-75.2023.8.26.0000, Rel. Sidney Romano dos Reis, Turma Especial - Público, j. 15/02/2024; - TJSP, Reclamação 2262385-63.2023.8.26.0000, Rel. Torres de Carvalho, Turma Especial - Público, j. 04/12/2023.(TJSP; Reclamação 2075027-81.2025.8.26.0000; Relator (a):Paulo Galizia; Órgão Julgador: Turma Especial - Publico; Foro de Guaratinguetá -Vara do Juizado Especial Cível e Criminal; Data do Julgamento: 21/05/2025; Data de Registro: 22/05/2025). Assim, a incidência do quinquênio e da sexta-parte não se aplica ao adicional de insalubridade. Ressalto, por fim, que não houve impugnação à planilha de cálculos apresentada pelo exequente, Ante o exposto, acolho parcialmente a impugnação do executado, devendo o exequente elaborar nova planilha para promover o recálculo dos quinquênios e sexta-parte incidentes sobre as verbas salariais, afastado a incidência sobre o adicional de insalubridade, e incluindo apenas a verbas relativas a gratificação por atividade de polícia - GAP, adicional de local de exercício - ALE, adicional operacional local -AOL e regime especial de trabalho policial - RETP, referentes ao período de setembro de 2008 a junho de 2018. Haja vista a sucumbência recíproca, condeno o exequente ao pagamento de metade das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o excesso reconhecido. Observo, contudo, ser ele beneficiário da gratuidade de justiça. Já o executado fica condenado ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor a ser executado, respeitados os limites mínimos dos percentuais contidos no art. 85, §3º e seus incisos, do CPC. Com o trânsito em julgado, determino ao exequente que refaça os seus cálculos, nos moldes aqui fixados. - ADV: ESTEVAN GIANINI SGANZELLA (OAB 277998/SP)

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Processo nº 1010799-42.2024.8.11.0041

ID: 315998619

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1010799-42.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010799-42.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Ener… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010799-42.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS - CPF: 016.097.301-51 (APELADO), CARLOS AUGUSTO SERRA NETO - CPF: 022.061.841-09 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A APELADO: BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS EMENTA: DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. VALORES EXORBITANTES. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL CONFIGURADO. “QUANTUM” INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO SIMPLES. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA; RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta por concessionária de energia contra sentença que declarou inexigível fatura com consumo elevado, determinou o refaturamento com base na média de consumo anterior, condenou à restituição em dobro dos valores pagos indevidamente e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há diversas questões em discussão: (i) saber se houve falha na prestação do serviço pela concessionária diante da elevação de consumo sem justificativa plausível; (ii) saber se a situação enfrentada pela consumidora caracteriza dano moral indenizável; (iii) se o “quantum” indenizatório arbitrado está em consonância com os parâmetros legais; (iv) saber se é cabível a repetição do indébito em dobro, diante da ausência de má-fé; III. RAZÕES DE DECIDIR A elevação abrupta e temporária do consumo, dissociada de justificativas técnicas ou fáticas, sem comprovação pela concessionária da regularidade da medição, caracteriza falha na prestação do serviço, nos termos do CDC. Configurado o dano moral pela frustração de legítima expectativa da consumidora e pelos transtornos experimentados, é devida a indenização, devendo-se, contudo, reduzir o montante para R$ 7.000,00, em observância à proporcionalidade e à razoabilidade. 4. Ausente demonstração de má-fé, é indevida a restituição em dobro dos valores pagos indevidamente, nos termos do p.u. do art. 42 do CDC, devendo a devolução ocorrer de forma simples. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso parcialmente provido, para: (i) afastar a condenação à devolução em dobro, determinando que a restituição ocorra de forma simples no valor de R$ 518,82; e (ii) reduzir a indenização por danos morais para R$ 7.000,00. Teses de julgamento: "1. A cobrança de fatura com consumo excessivo, sem demonstração de regularidade, configura falha na prestação do serviço, ensejando revisão e reparação. 2. É devida a indenização por dano moral nos casos de falha na prestação de serviço essencial, quando configurada situação de angústia e frustração relevante. 3. A restituição em dobro pressupõe má-fé do fornecedor, sendo incabível quando ausente essa demonstração." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, V e X; CC/2002, arts. 186 e 927; CDC, arts. 6º, VIII; 14; 42, p.u.; CPC/2015, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.195.642/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 24/5/2011; TJMT, ApCiv 1003672-45.2021.8.11.0013, Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, j. 24/1/2023. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de apelação interposta por Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S/A contra sentença proferida pelo juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que, nos autos da Ação Declaratória de Inexigibilidade de Débito, Revisão de Faturamento de Consumo c/c Danos Materiais e Morais, movida por Beatriz Brito Cavalcante de Jesus, julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: “(...) a) DECLARAR inexigível a fatura de energia elétrica referente ao mês de fevereiro de 2024, no valor de R$ 1.035,06 (mil e trinta e cinco reais e seis centavos); b) DETERMINAR que a Requerida proceda com o refaturamento de todas as faturas emitidas a partir de outubro de 2023 com base na média de consumo apurada entre abril e setembro de 2023, deduzindo-se os valores eventualmente pagos pela autora; c)CONDENARa ré a restituir em dobro os valores pagos a maior nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2023, no total de R$ 1.037,64 (mil e trinta e cinco reais e seis centavos), corrigidos monetariamente (IPCA) desde os respectivos desembolsos e com juros de mora (SELIC), contados da citação; d) CONDENAR a Requerida, ao pagamento no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), pelos danos morais sofridos, acrescido de juros (SELIC) ao mês a partir da citação e correção monetária (IPCA) a partir do arbitramento. CONDENO a Requerida ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º do Código de Processo Civil. (...)” – grifo nosso. Em suas razões recursais, a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Da ausência de conduta ilícita. Do exercício regular do direito da concessionária de serviços energéticos. Da inocorrência de danos morais indenizáveis. Alternativamente, pugna pela redução do “quantum” indenizatório. Devolução dos danos materiais na forma simples. Da alteração dos consectários legais. Recurso tempestivo e custas recolhidas. (ID 293604389). A parte recorrida apresenta suas contrarrazões, pleiteando, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso por ferir o princípio da dialeticidade e, no mérito, rebate as alegações da recorrente, e defendendo o desprovimento recursal. (ID. 292099402) É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A APELADO: BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Da preliminar arguida pela parte recorrida Beatriz Brito Cavalcante De Jesus. Daviolação ao princípio da dialeticidade. O Recorrido, em suas contrarrazões, sustenta a ausência de dialeticidade recursal, ao argumento de que a parte Recorrente não teria formulado impugnação específica aos fundamentos da decisão, limitando-se a postular genericamente sua reforma. Todavia, ao compulsar os autos, verifica-se que a Recorrente expôs de forma clara os fundamentos jurídicos que embasam sua irresignação, direcionando suas razões contrapontos específicos do decisum hostilizado, de modo a demonstrar a presença dos requisitos formais exigidos para o conhecimento do apelo. Dessa forma, não se constata violação ao princípio da dialeticidade, uma vez que a motivação recursal evidencia a intenção da Recorrente de infirmar os fundamentos da decisão recorrida, mediante argumentação jurídica minimamente desenvolvida. Nesse mesmo sentido, é a jurisprudência consolidada deste Egrégio Tribunal de Justiça, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO – PRELIMINAR DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – REJEITADA - TRANSFERÊNCIA REALIZADA EM SUA CONTA – PACTUAÇÃO EM AMBIENTE VIRTUAL MEDIANTE BIOMETRIA FACIAL (CAPTAÇÃO DE SELFIE) – CONTRATAÇÃO IMPUGNADA QUANTO A NATUREZA (EMPRÉSTIMO) – INEXISTÊNCIA DE ÁUDIO DA CONTRATAÇÃO – CONVERSÃO DA CONTRATAÇÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO TRADICIONAL – DANO MORAL CONFIGURADO – REDUÇÃO - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Inexiste ofensa ao princípio da dialeticidade, se o apelante ataca o pronunciamento judicial e fica evidente que os argumentos apresentados nas razões do recurso estão intrinsecamente ligados com o que ficou decidido na sentença. (N.U 1017497-16.2022.8.11.0015, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Nilza Maria Possas de Carvalho, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/12/2023, publicado no DJE 18/12/2023). Ante o exposto, rejeito a preliminar. É como voto. 2. Das razões recursais meritórias de BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS 2.1. Da ausência de conduta ilícita. Do exercício regular do direito da concessionária de serviços energéticos. Conforme relatado anteriormente, a consumidora, ora apelada, ajuizou ação de obrigação de fazer, cumulada com declaração de inexistência de débito, indenização por danos morais e repetição de indébito, em face da concessionária de energia elétrica, visando obter: (i) a readequação dos valores das faturas emitidas no mês de fevereiro de 2024, no montante de R$ 1.035,06; (ii) a declaração de inexistência dos débitos referentes ao mesmo período (R$ 1.035,06), bem como das faturas relativas aos meses de outubro, novembro e dezembro de 2023, nos valores de R$ 338,14, R$ 320,36 e R$ 379,14, respectivamente; e (iii) a condenação da ré à repetição do indébito, no tocante à Unidade Consumidora nº 6/2168281-0. Concluída a instrução processual, o juízo a quo julgou procedentes os pedidos formulados na exordial. Inconformada, a concessionária de energia elétrica interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, que não houve erro de faturamento, tal como reconhecido na sentença, tendo sido cobrados apenas os valores correspondentes ao consumo efetivamente registrado na Unidade Consumidora. Argumenta que a elevação no consumo pode ter decorrido de fatores externos, como variações climáticas, alheios à sua responsabilidade. Alega, ainda, que os débitos questionados já foram objeto de refaturamento, não subsistindo, assim, qualquer motivo que justificasse a condenação por danos morais, porquanto inexistente prova de abalo à honra da parte autora, requisito indispensável à indenização por dano extrapatrimonial. Subsidiariamente, pleiteia a redução do valor fixado a título de danos morais, bem como requer que a restituição dos valores pagos indevidamente ocorra de forma simples, e não em dobro. Por fim, aponta erro material na sentença quanto à fixação dos consectários legais, por suposta inobservância ao disposto no art. 406 do Código Civil. Pois bem. Inicialmente, não há qualquer dúvida de que são aplicáveis à relação jurídica em questão as regras do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que as partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor, conforme definidos nos artigos 2º e 3º do referido diploma legal. Vejamos: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Destaca-se, ainda, que a relação existente entre as partes, no presente litígio, é de consumo, devendo, portanto, ser aplicadas as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor, inclusive a inversão do ônus da prova, prevista no inciso VIII do artigo 6.º do referido diploma legal, in verbis: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;” Passando à análise meritória do apelo, no que se refere à alegada elevação injustificada de consumo na Unidade Consumidora nº 6/2168281-0, verifica-se, a partir do exame minucioso das faturas de energia elétrica acostadas aos autos pela autora/recorrida, bem como do histórico de consumo constante no documento de ID nº 215605786. Ademais, no período anterior ao discutido, correspondente aos meses de junho - setembro de 2023, os consumos registrados foram de 178 kWh, 141 kWh, 205 kWh e 153 kWh, respectivamente. Por sua vez, nas leituras posteriores, compreendidas entre os meses de outubro de 2023 - janeiro de 2024, período impugnado, constata-se aumento abrupto nos valores de consumo, com registros de 353 kWh, 211 kWh e 357 kWh. Observa-se, ainda, que, imediatamente após o período impugnado, nos meses de fevereiro - maio de 2024, houve expressiva redução no consumo registrado, cujos valores retornaram a patamares compatíveis com o histórico anterior da unidade consumidora, oscilando entre 175, 220, 200 e 135 kWh, respectivamente. Nesta senda, de acordo com as normas consumeristas, cabia à empresa Apelante, o ônus de provar a existência do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil. Senão, vejamos: Artigo373. - O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Dessa forma, considerando, como já exposto, que a apelante não se desincumbiu do ônus que lhe competia quanto à comprovação da regularidade das faturas impugnadas, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, no ponto em que reconheceu a inconsistência da cobrança questionada. A propósito, tal entendimento encontra respaldo na jurisprudência atual, conforme se depreende do seguinte julgado, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - VALOR DE FATURA DESTOANTE DA MÉDIA DE CONSUMO - FATURA CONTESTADA - NÃO COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - REFATURAMENTO - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - DANO MORAL CONFIGURADO - MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Se a fatura impugnada pela consumidora possui valor exorbitante e destoante da média de consumo, e não havendo nos autos elementos hábeis a justificar a cobrança, deve o valor da fatura ser adequado à média apurada. 2. A elevação do consumo de energia elétrica, sem fator que a justifique e em valor exorbitante, enseja a revisão do valor constante da fatura discutida. 3. Apesar de a concessionária ré alegar que a cobrança é devida, não apresenta qualquer documento apto a comprovar suas alegações, se limitando a trazer documentos unilaterais. (...) (N.U 1003672-45.2021.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/01/2023, publicado no DJE 30/01/2023) Da inocorrência de danos morais indenizáveis. Nesse ponto, a parte recorrente sustenta que os supostos dissabores experimentados pela apelada, em decorrência da cobrança de consumo energético, não configurariam, por si sós, dano moral indenizável, argumentando que a caracterização do dano exige a demonstração inequívoca da conduta ilícita e da extensão do prejuízo suportado. Ocorre que, uma vez comprovada a falha na prestação do serviço, nasce para o fornecedor — no caso, a concessionária de energia elétrica — o dever de reparar os danos causados ao consumidor, nos termos da legislação consumerista, independentemente de culpa, in verbis: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Outrossim, verifica-se que a autora/apelada envidou reiterados esforços para a solução administrativa da controvérsia, inclusive por meio de reclamação formal junto ao Procon Estadual, conforme processo administrativo nº F.A. 24.03.0207.001.00227-300 (ID nº 292093940), na qual manifestou expressamente sua inconformidade com a elevação abrupta do consumo registrado. Diante da ineficácia das medidas adotadas e considerando tratar-se de serviço essencial, é inegável que a situação gerou angústia, incômodo e transtornos à consumidora, com extensão suficiente para ensejar a configuração do dano moral. Alternativamente, pugna pela redução do quantum indenizatório. Conforme é sabido, é dever do Julgador, quando entender pela ocorrência de danos morais indenizáveis, observar critérios para estabelecer o quantum indenizatório, devendo ser observado à situação econômica da parte condenada e, também, da pessoa a ser indenizada, bem como às circunstâncias do caso concreto e aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Neste ponto recursal, entendo que deve ser dado parcial guarida à pretensão da empresa recorrente. Isto porque a fixação dos danos morais deve se pautar por critérios que não impliquem enriquecimento do lesado, nem sejam tão ínfimos que se tornem irrisórios para o ofensor, devendo observar a proporcionalidade e a razoabilidade na apuração do valor, garantindo, assim, o disposto no art. 5º, V, da Constituição Federal. No caso em apreço, entendo que o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), destinado a recompor os prejuízos morais da parte recorrida, no caso em testilha, se afigura em desconformidade com a extensão dos danos efetivamente sofridos, sua reparabilidade, além da finalidade pedagógica em relação à recorrente. Por tais motivos, entendo razoável a estipulação da quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais), a título de indenização por danos morais sofridos pela parte recorrida, atendendo-se ao binômio da reparabilidade do dano experimentado e ao efeito pedagógico a ser imposto à parte recorrente, sem descurar das condições pessoais das partes litigantes. Ademais, tais são os valores comumente arbitrados por esta Egrégia Câmara, em julgados similares de minha relatoria, que foram assim ementados, in verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA DE FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA – RECUPERAÇÃO DE CONSUMO – SUPOSTA RECUSA AO ASSINAR O TOI – RECUSA DA ASSINATURA IMPUGNADA PELA DEMANDANTE – REGULARIDADE DAS FATURAS NÃO COMPROVADAS – AUSÊNCIA DE CONSUMO POSTERIOR À LAVRATURA DO TOI – INOBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS ESTABELECIDOS PELA RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANEEL – ABUSIVIDADE CONFIGURADA – DÉBITO DECLARADO INEXISTENTE –POSSIBILIDADE – REITERADAS TENTATIVAS INFRUTÍFERAS PARA SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA (PROCON) – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – “QUANTUM” INDENIZATÓRIO – DE ACORDO COM PARÂMETROS LEGAIS – PREQUESTIONAMENTO – REJEIÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O quantum arbitrado deve atentar-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes, devendo ser mantido o valor arbitrado na sentença, quando se apresenta consentâneo com a realidade do caso concreto. (...) ” (N.U 1005639-87.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 22/06/2024, publicado no DJE 22/06/2024) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA DE FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA COM VALOR ACIMA DA MÉDIA MENSAL DE CONSUMO – REGULARIDADE DAS FATURAS NÃO COMPROVADAS – ABUSIVIDADE CONFIGURADA – DETERMINAÇÃO DE REVISÃO DAS FATURAS – POSSIBILIDADE – REITERADAS TENTATIVAS INFRUTÍFERAS PARA SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA (PROCON) – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – VALOR INDENIZATÓRIO – ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS – REDUÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO – PREQUESTIONAMENTO – REJEIÇÃO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 3. As reiteradas tentativas infrutíferas do consumidor para solucionar a questão administrativamente, sem dúvida, gera desconforto, aflição e transtornos e, têm a extensão suficiente para configurar a reparação por danos morais. 4. Percebendo-se o descompasso entre o valor indenizatório e a extensão do prejuízo moral experimentado, deve ser feita a adequação jurídica da indenização estabelecida a tal título. (...) (N.U 1021854-58.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/06/2024, publicado no DJE 25/06/2024) Da ilegalidade na devolução dos valores em sua forma dobrada. No que tange à alegada ilegalidade da devolução em dobro, sustentada pela parte recorrente, cumpre observar que o parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor dispõe expressamente: “Art. 42. (...)Parágrafo único - O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” Com efeito, para a aplicação da penalidade prevista no parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor, exige-se a demonstração de má-fé por parte do fornecedor na cobrança indevida. Nesse contexto, embora se reconheça a falha na prestação do serviço por parte da concessionária, não há nos autos elementos suficientes que evidenciem a ocorrência de má-fé em sua conduta, o que afasta a possibilidade de devolução em dobro dos valores pagos. Assim, entendo que merece acolhimento a tese recursal quanto a este ponto, devendo a restituição ocorrer de forma simples, limitada ao valor de R$ 518,82 (quinhentos e dezoito e oitenta e dois centavos), devidamente corrigido. Da alteração dos consectários legais. Quanto à pretensão de afastamento da taxa SELIC para fins de correção monetária e juros de mora, como consta do decisum fustigado, impõe-se a aplicação da Lei n. 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil, estabelecendo a correção monetária pelo IPCA e os juros de mora pela taxa SELIC, deduzida a atualização monetária. Dessa forma, rejeito a pretensão recursal de alteração dos consectários legais. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para: afastar a condenação à devolução em dobro dos valores cobrados, que deverá ocorrer de forma simples, no montante de R$ 518,82 (quinhentos e dezoito reais e oitenta e dois centavos), devidamente acrescido dos consectários legais; e (ii) reduzir o valor da indenização por danos morais para R$ 7.000,00 (sete mil reais), mantendo-se quanto ao mais, na integralidade, a sentença fustigada. Por fim, ante o resultado do julgamento, deixo de majorar os honorários sucumbenciais (art. 85, §11, do CPC), em observância à tese firmada no Tema 1059 do STJ: “A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação.” (STJ, Tema n. 1.059, REsp n. 1.864.633/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, j. 09/11/2023, DJe 21/12/2023) É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1010799-42.2024.8.11.0041

ID: 315998621

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1010799-42.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS

Acórdão

Advogados:

CARLOS AUGUSTO SERRA NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010799-42.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Ener… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010799-42.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS - CPF: 016.097.301-51 (APELADO), CARLOS AUGUSTO SERRA NETO - CPF: 022.061.841-09 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A APELADO: BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS EMENTA: DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. VALORES EXORBITANTES. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL CONFIGURADO. “QUANTUM” INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO SIMPLES. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA; RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta por concessionária de energia contra sentença que declarou inexigível fatura com consumo elevado, determinou o refaturamento com base na média de consumo anterior, condenou à restituição em dobro dos valores pagos indevidamente e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há diversas questões em discussão: (i) saber se houve falha na prestação do serviço pela concessionária diante da elevação de consumo sem justificativa plausível; (ii) saber se a situação enfrentada pela consumidora caracteriza dano moral indenizável; (iii) se o “quantum” indenizatório arbitrado está em consonância com os parâmetros legais; (iv) saber se é cabível a repetição do indébito em dobro, diante da ausência de má-fé; III. RAZÕES DE DECIDIR A elevação abrupta e temporária do consumo, dissociada de justificativas técnicas ou fáticas, sem comprovação pela concessionária da regularidade da medição, caracteriza falha na prestação do serviço, nos termos do CDC. Configurado o dano moral pela frustração de legítima expectativa da consumidora e pelos transtornos experimentados, é devida a indenização, devendo-se, contudo, reduzir o montante para R$ 7.000,00, em observância à proporcionalidade e à razoabilidade. 4. Ausente demonstração de má-fé, é indevida a restituição em dobro dos valores pagos indevidamente, nos termos do p.u. do art. 42 do CDC, devendo a devolução ocorrer de forma simples. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso parcialmente provido, para: (i) afastar a condenação à devolução em dobro, determinando que a restituição ocorra de forma simples no valor de R$ 518,82; e (ii) reduzir a indenização por danos morais para R$ 7.000,00. Teses de julgamento: "1. A cobrança de fatura com consumo excessivo, sem demonstração de regularidade, configura falha na prestação do serviço, ensejando revisão e reparação. 2. É devida a indenização por dano moral nos casos de falha na prestação de serviço essencial, quando configurada situação de angústia e frustração relevante. 3. A restituição em dobro pressupõe má-fé do fornecedor, sendo incabível quando ausente essa demonstração." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, V e X; CC/2002, arts. 186 e 927; CDC, arts. 6º, VIII; 14; 42, p.u.; CPC/2015, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.195.642/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 24/5/2011; TJMT, ApCiv 1003672-45.2021.8.11.0013, Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, j. 24/1/2023. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de apelação interposta por Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S/A contra sentença proferida pelo juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que, nos autos da Ação Declaratória de Inexigibilidade de Débito, Revisão de Faturamento de Consumo c/c Danos Materiais e Morais, movida por Beatriz Brito Cavalcante de Jesus, julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: “(...) a) DECLARAR inexigível a fatura de energia elétrica referente ao mês de fevereiro de 2024, no valor de R$ 1.035,06 (mil e trinta e cinco reais e seis centavos); b) DETERMINAR que a Requerida proceda com o refaturamento de todas as faturas emitidas a partir de outubro de 2023 com base na média de consumo apurada entre abril e setembro de 2023, deduzindo-se os valores eventualmente pagos pela autora; c)CONDENARa ré a restituir em dobro os valores pagos a maior nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2023, no total de R$ 1.037,64 (mil e trinta e cinco reais e seis centavos), corrigidos monetariamente (IPCA) desde os respectivos desembolsos e com juros de mora (SELIC), contados da citação; d) CONDENAR a Requerida, ao pagamento no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), pelos danos morais sofridos, acrescido de juros (SELIC) ao mês a partir da citação e correção monetária (IPCA) a partir do arbitramento. CONDENO a Requerida ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º do Código de Processo Civil. (...)” – grifo nosso. Em suas razões recursais, a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Da ausência de conduta ilícita. Do exercício regular do direito da concessionária de serviços energéticos. Da inocorrência de danos morais indenizáveis. Alternativamente, pugna pela redução do “quantum” indenizatório. Devolução dos danos materiais na forma simples. Da alteração dos consectários legais. Recurso tempestivo e custas recolhidas. (ID 293604389). A parte recorrida apresenta suas contrarrazões, pleiteando, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso por ferir o princípio da dialeticidade e, no mérito, rebate as alegações da recorrente, e defendendo o desprovimento recursal. (ID. 292099402) É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A APELADO: BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Da preliminar arguida pela parte recorrida Beatriz Brito Cavalcante De Jesus. Daviolação ao princípio da dialeticidade. O Recorrido, em suas contrarrazões, sustenta a ausência de dialeticidade recursal, ao argumento de que a parte Recorrente não teria formulado impugnação específica aos fundamentos da decisão, limitando-se a postular genericamente sua reforma. Todavia, ao compulsar os autos, verifica-se que a Recorrente expôs de forma clara os fundamentos jurídicos que embasam sua irresignação, direcionando suas razões contrapontos específicos do decisum hostilizado, de modo a demonstrar a presença dos requisitos formais exigidos para o conhecimento do apelo. Dessa forma, não se constata violação ao princípio da dialeticidade, uma vez que a motivação recursal evidencia a intenção da Recorrente de infirmar os fundamentos da decisão recorrida, mediante argumentação jurídica minimamente desenvolvida. Nesse mesmo sentido, é a jurisprudência consolidada deste Egrégio Tribunal de Justiça, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO – PRELIMINAR DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – REJEITADA - TRANSFERÊNCIA REALIZADA EM SUA CONTA – PACTUAÇÃO EM AMBIENTE VIRTUAL MEDIANTE BIOMETRIA FACIAL (CAPTAÇÃO DE SELFIE) – CONTRATAÇÃO IMPUGNADA QUANTO A NATUREZA (EMPRÉSTIMO) – INEXISTÊNCIA DE ÁUDIO DA CONTRATAÇÃO – CONVERSÃO DA CONTRATAÇÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO TRADICIONAL – DANO MORAL CONFIGURADO – REDUÇÃO - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Inexiste ofensa ao princípio da dialeticidade, se o apelante ataca o pronunciamento judicial e fica evidente que os argumentos apresentados nas razões do recurso estão intrinsecamente ligados com o que ficou decidido na sentença. (N.U 1017497-16.2022.8.11.0015, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Nilza Maria Possas de Carvalho, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/12/2023, publicado no DJE 18/12/2023). Ante o exposto, rejeito a preliminar. É como voto. 2. Das razões recursais meritórias de BEATRIZ BRITO CAVALCANTE DE JESUS 2.1. Da ausência de conduta ilícita. Do exercício regular do direito da concessionária de serviços energéticos. Conforme relatado anteriormente, a consumidora, ora apelada, ajuizou ação de obrigação de fazer, cumulada com declaração de inexistência de débito, indenização por danos morais e repetição de indébito, em face da concessionária de energia elétrica, visando obter: (i) a readequação dos valores das faturas emitidas no mês de fevereiro de 2024, no montante de R$ 1.035,06; (ii) a declaração de inexistência dos débitos referentes ao mesmo período (R$ 1.035,06), bem como das faturas relativas aos meses de outubro, novembro e dezembro de 2023, nos valores de R$ 338,14, R$ 320,36 e R$ 379,14, respectivamente; e (iii) a condenação da ré à repetição do indébito, no tocante à Unidade Consumidora nº 6/2168281-0. Concluída a instrução processual, o juízo a quo julgou procedentes os pedidos formulados na exordial. Inconformada, a concessionária de energia elétrica interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, que não houve erro de faturamento, tal como reconhecido na sentença, tendo sido cobrados apenas os valores correspondentes ao consumo efetivamente registrado na Unidade Consumidora. Argumenta que a elevação no consumo pode ter decorrido de fatores externos, como variações climáticas, alheios à sua responsabilidade. Alega, ainda, que os débitos questionados já foram objeto de refaturamento, não subsistindo, assim, qualquer motivo que justificasse a condenação por danos morais, porquanto inexistente prova de abalo à honra da parte autora, requisito indispensável à indenização por dano extrapatrimonial. Subsidiariamente, pleiteia a redução do valor fixado a título de danos morais, bem como requer que a restituição dos valores pagos indevidamente ocorra de forma simples, e não em dobro. Por fim, aponta erro material na sentença quanto à fixação dos consectários legais, por suposta inobservância ao disposto no art. 406 do Código Civil. Pois bem. Inicialmente, não há qualquer dúvida de que são aplicáveis à relação jurídica em questão as regras do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que as partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor, conforme definidos nos artigos 2º e 3º do referido diploma legal. Vejamos: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Destaca-se, ainda, que a relação existente entre as partes, no presente litígio, é de consumo, devendo, portanto, ser aplicadas as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor, inclusive a inversão do ônus da prova, prevista no inciso VIII do artigo 6.º do referido diploma legal, in verbis: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;” Passando à análise meritória do apelo, no que se refere à alegada elevação injustificada de consumo na Unidade Consumidora nº 6/2168281-0, verifica-se, a partir do exame minucioso das faturas de energia elétrica acostadas aos autos pela autora/recorrida, bem como do histórico de consumo constante no documento de ID nº 215605786. Ademais, no período anterior ao discutido, correspondente aos meses de junho - setembro de 2023, os consumos registrados foram de 178 kWh, 141 kWh, 205 kWh e 153 kWh, respectivamente. Por sua vez, nas leituras posteriores, compreendidas entre os meses de outubro de 2023 - janeiro de 2024, período impugnado, constata-se aumento abrupto nos valores de consumo, com registros de 353 kWh, 211 kWh e 357 kWh. Observa-se, ainda, que, imediatamente após o período impugnado, nos meses de fevereiro - maio de 2024, houve expressiva redução no consumo registrado, cujos valores retornaram a patamares compatíveis com o histórico anterior da unidade consumidora, oscilando entre 175, 220, 200 e 135 kWh, respectivamente. Nesta senda, de acordo com as normas consumeristas, cabia à empresa Apelante, o ônus de provar a existência do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil. Senão, vejamos: Artigo373. - O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Dessa forma, considerando, como já exposto, que a apelante não se desincumbiu do ônus que lhe competia quanto à comprovação da regularidade das faturas impugnadas, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, no ponto em que reconheceu a inconsistência da cobrança questionada. A propósito, tal entendimento encontra respaldo na jurisprudência atual, conforme se depreende do seguinte julgado, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - VALOR DE FATURA DESTOANTE DA MÉDIA DE CONSUMO - FATURA CONTESTADA - NÃO COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - REFATURAMENTO - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - DANO MORAL CONFIGURADO - MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Se a fatura impugnada pela consumidora possui valor exorbitante e destoante da média de consumo, e não havendo nos autos elementos hábeis a justificar a cobrança, deve o valor da fatura ser adequado à média apurada. 2. A elevação do consumo de energia elétrica, sem fator que a justifique e em valor exorbitante, enseja a revisão do valor constante da fatura discutida. 3. Apesar de a concessionária ré alegar que a cobrança é devida, não apresenta qualquer documento apto a comprovar suas alegações, se limitando a trazer documentos unilaterais. (...) (N.U 1003672-45.2021.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/01/2023, publicado no DJE 30/01/2023) Da inocorrência de danos morais indenizáveis. Nesse ponto, a parte recorrente sustenta que os supostos dissabores experimentados pela apelada, em decorrência da cobrança de consumo energético, não configurariam, por si sós, dano moral indenizável, argumentando que a caracterização do dano exige a demonstração inequívoca da conduta ilícita e da extensão do prejuízo suportado. Ocorre que, uma vez comprovada a falha na prestação do serviço, nasce para o fornecedor — no caso, a concessionária de energia elétrica — o dever de reparar os danos causados ao consumidor, nos termos da legislação consumerista, independentemente de culpa, in verbis: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Outrossim, verifica-se que a autora/apelada envidou reiterados esforços para a solução administrativa da controvérsia, inclusive por meio de reclamação formal junto ao Procon Estadual, conforme processo administrativo nº F.A. 24.03.0207.001.00227-300 (ID nº 292093940), na qual manifestou expressamente sua inconformidade com a elevação abrupta do consumo registrado. Diante da ineficácia das medidas adotadas e considerando tratar-se de serviço essencial, é inegável que a situação gerou angústia, incômodo e transtornos à consumidora, com extensão suficiente para ensejar a configuração do dano moral. Alternativamente, pugna pela redução do quantum indenizatório. Conforme é sabido, é dever do Julgador, quando entender pela ocorrência de danos morais indenizáveis, observar critérios para estabelecer o quantum indenizatório, devendo ser observado à situação econômica da parte condenada e, também, da pessoa a ser indenizada, bem como às circunstâncias do caso concreto e aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Neste ponto recursal, entendo que deve ser dado parcial guarida à pretensão da empresa recorrente. Isto porque a fixação dos danos morais deve se pautar por critérios que não impliquem enriquecimento do lesado, nem sejam tão ínfimos que se tornem irrisórios para o ofensor, devendo observar a proporcionalidade e a razoabilidade na apuração do valor, garantindo, assim, o disposto no art. 5º, V, da Constituição Federal. No caso em apreço, entendo que o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), destinado a recompor os prejuízos morais da parte recorrida, no caso em testilha, se afigura em desconformidade com a extensão dos danos efetivamente sofridos, sua reparabilidade, além da finalidade pedagógica em relação à recorrente. Por tais motivos, entendo razoável a estipulação da quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais), a título de indenização por danos morais sofridos pela parte recorrida, atendendo-se ao binômio da reparabilidade do dano experimentado e ao efeito pedagógico a ser imposto à parte recorrente, sem descurar das condições pessoais das partes litigantes. Ademais, tais são os valores comumente arbitrados por esta Egrégia Câmara, em julgados similares de minha relatoria, que foram assim ementados, in verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA DE FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA – RECUPERAÇÃO DE CONSUMO – SUPOSTA RECUSA AO ASSINAR O TOI – RECUSA DA ASSINATURA IMPUGNADA PELA DEMANDANTE – REGULARIDADE DAS FATURAS NÃO COMPROVADAS – AUSÊNCIA DE CONSUMO POSTERIOR À LAVRATURA DO TOI – INOBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS ESTABELECIDOS PELA RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANEEL – ABUSIVIDADE CONFIGURADA – DÉBITO DECLARADO INEXISTENTE –POSSIBILIDADE – REITERADAS TENTATIVAS INFRUTÍFERAS PARA SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA (PROCON) – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – “QUANTUM” INDENIZATÓRIO – DE ACORDO COM PARÂMETROS LEGAIS – PREQUESTIONAMENTO – REJEIÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O quantum arbitrado deve atentar-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes, devendo ser mantido o valor arbitrado na sentença, quando se apresenta consentâneo com a realidade do caso concreto. (...) ” (N.U 1005639-87.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 22/06/2024, publicado no DJE 22/06/2024) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – COBRANÇA DE FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA COM VALOR ACIMA DA MÉDIA MENSAL DE CONSUMO – REGULARIDADE DAS FATURAS NÃO COMPROVADAS – ABUSIVIDADE CONFIGURADA – DETERMINAÇÃO DE REVISÃO DAS FATURAS – POSSIBILIDADE – REITERADAS TENTATIVAS INFRUTÍFERAS PARA SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA (PROCON) – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – VALOR INDENIZATÓRIO – ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS – REDUÇÃO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO – PREQUESTIONAMENTO – REJEIÇÃO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 3. As reiteradas tentativas infrutíferas do consumidor para solucionar a questão administrativamente, sem dúvida, gera desconforto, aflição e transtornos e, têm a extensão suficiente para configurar a reparação por danos morais. 4. Percebendo-se o descompasso entre o valor indenizatório e a extensão do prejuízo moral experimentado, deve ser feita a adequação jurídica da indenização estabelecida a tal título. (...) (N.U 1021854-58.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/06/2024, publicado no DJE 25/06/2024) Da ilegalidade na devolução dos valores em sua forma dobrada. No que tange à alegada ilegalidade da devolução em dobro, sustentada pela parte recorrente, cumpre observar que o parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor dispõe expressamente: “Art. 42. (...)Parágrafo único - O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” Com efeito, para a aplicação da penalidade prevista no parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor, exige-se a demonstração de má-fé por parte do fornecedor na cobrança indevida. Nesse contexto, embora se reconheça a falha na prestação do serviço por parte da concessionária, não há nos autos elementos suficientes que evidenciem a ocorrência de má-fé em sua conduta, o que afasta a possibilidade de devolução em dobro dos valores pagos. Assim, entendo que merece acolhimento a tese recursal quanto a este ponto, devendo a restituição ocorrer de forma simples, limitada ao valor de R$ 518,82 (quinhentos e dezoito e oitenta e dois centavos), devidamente corrigido. Da alteração dos consectários legais. Quanto à pretensão de afastamento da taxa SELIC para fins de correção monetária e juros de mora, como consta do decisum fustigado, impõe-se a aplicação da Lei n. 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil, estabelecendo a correção monetária pelo IPCA e os juros de mora pela taxa SELIC, deduzida a atualização monetária. Dessa forma, rejeito a pretensão recursal de alteração dos consectários legais. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para: afastar a condenação à devolução em dobro dos valores cobrados, que deverá ocorrer de forma simples, no montante de R$ 518,82 (quinhentos e dezoito reais e oitenta e dois centavos), devidamente acrescido dos consectários legais; e (ii) reduzir o valor da indenização por danos morais para R$ 7.000,00 (sete mil reais), mantendo-se quanto ao mais, na integralidade, a sentença fustigada. Por fim, ante o resultado do julgamento, deixo de majorar os honorários sucumbenciais (art. 85, §11, do CPC), em observância à tese firmada no Tema 1059 do STJ: “A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação.” (STJ, Tema n. 1.059, REsp n. 1.864.633/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, j. 09/11/2023, DJe 21/12/2023) É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Associacao Urbana Do Distrito Da Nova Caceres x Secretaria De Estado De Educacao

ID: 331332964

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE CÁCERES - FAZENDA PÚBLICA Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL Nº Processo: 1005639-10.2025.8.11.0006

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

ASSOCIACAO URBANA DO DISTRITO DA NOVA CACERES

Polo Passivo:

SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCACAO

Intimação

Advogados:

BRUNA RAGI GONCALVES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE CÁCERES - FAZENDA PÚBLICA DECISÃO Processo: 1005639-10.2025.8.11.0006. AUTOR(A): ASSOCIACAO URBANA DO DISTRITO DA NOVA CACERES REQUERIDO: ESTAD… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE CÁCERES - FAZENDA PÚBLICA DECISÃO Processo: 1005639-10.2025.8.11.0006. AUTOR(A): ASSOCIACAO URBANA DO DISTRITO DA NOVA CACERES REQUERIDO: ESTADO DE MATO GROSSO, SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCACAO Vistos. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO LIMINAR ajuizada pela Associação Urbana do Distrito da Nova Cáceres em face do Estado de Mato Grosso, com a finalidade de compelir o ente público à adoção de medidas estruturais emergenciais em unidade escolar anexa da comunidade Vila Aparecida (denominada BURITI), bem como a construção de escola pública definitiva para atendimento da demanda local. Alega a parte autora que a estrutura atual encontra-se em situação absolutamente precária e insalubre, sem sanitários, sala de professores, local adequado para alunos com deficiência e segurança mínima, inclusive com alunos sendo atendidos em ambiente que compartilha cozinha e sala de aula. Relata também o descumprimento dos critérios da Resolução CEE/MT nº 157/2002 quanto ao limite de alunos (148 atualmente) e à temporariedade do modelo de sala anexa. Assim, requer, em sede liminar: · a) Medidas emergenciais para adequação estrutural mínima da unidade anexa; · b) Apresentação de cronograma para construção de escola na comunidade; · c) Proibição de remanejamento dos alunos para a sede urbana do município. De início, este Juízo determinou a notificação da parte requerida para manifestar-se acerca do pedido liminar (Id. 196884887). Instado, o Estado de Mato Grosso apresentou manifestação alegando ilegitimidade passiva da Secretaria de Educação, vedação legal à concessão de liminar que esgote o mérito (art. 1º, §3º, da Lei 8.437/92), ausência de omissão estatal e necessidade de respeito à reserva do possível e à separação dos poderes, com base no Tema 698 do STF (Id. 197974558). Em seguida, o Ministério Público, na qualidade de custos legis, apresentou parecer favorável à concessão da medida liminar, consoante razões apontadas no Id. 199196833. Após, os autos vieram conclusos. É o relatório. DECIDO. De início, entendo por bem deferir a gratuidade da justiça para a parte autora, uma vez que os documentos juntados nos Id. 196823162 e seguintes demonstram um contexto de hipossuficiência financeira, apto a ensejar o reconhecimento da gratuidade da justiça. Em seguida, reconheço a ilegitimidade passiva da Secretaria Estadual de Educação (SEDUC/MT) para figurar no polo passivo da presente ação. Isto porque a referida secretaria possui natureza jurídica de órgão público, não tendo, portanto, personalidade jurídica necessária para figurar em demandas judiciais. Assim, reconheço a ilegitimidade passiva da Secretaria Estadual de Educação, devendo o feito ser extinto em relação a ela sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil. Como consequência, DETERMINO a exclusão da mencionada secretaria do polo passivo da presente ação. CONDENO a parte autora ao pagamento de custas e honorários, os quais serão fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §3º, I, do CPC. Contudo, em razão da gratuidade deferida, SUSPENDO a referida exigibilidade. A seguir, passo a analisar o requerimento afeto ao pedido liminar. Pois bem. Para a concessão da almejada tutela de urgência, faz-se necessária a presença simultânea de seus requisitos previstos no art. 300 do CPC/2015, quais sejam, fumus boni iuris e periculum in mora. Vejamos: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”. Ainda, tratando-se de medida liminar consistente em obrigação de fazer ou não fazer, há de se observar os ditames estabelecidos no art. 497 do mesmo códex, vejamos: Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. Mais especificamente, em se tratando de demandas que envolvem a intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas, como a do presente processo, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do Tema 698, com repercussão geral reconhecida, fixou o entendimento de que: A intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos Poderes. A decisão judicial, como regra, em lugar de determinar medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem alcançadas e determinar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para alcançar o resultado. STF. Plenário. RE 684.612/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, redator do acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 01/7/2023 (Repercussão Geral – Tema 698) (Info 1101). Por essas orientações, temos que a análise necessária para concessão da medida liminar se voltará não só ao preenchimento dos requisitos legais e processuais em vigência, mas também à orientação jurisprudencial acima mencionada, que explicitou balizas para diminuir possíveis situações de impactos financeiros à administração pública e intervenções indevidas no Poder Executivo, garantindo, assim, a autonomia entre os poderes da República, conforme preconiza o art. 2º da Constituição Federal. No caso, partindo da análise dos contextos já expostos, tenho que o caso comporta o deferimento da liminar, e explico. Conforme relatado na petição inicial, a parte autora é uma entidade associativa que atualmente atende 148 (cento e quarenta e oito) alunos, dos quais quatro são estudantes com necessidades especiais, em ambiente precário, insalubre e improvisado, dividido com uma cozinha, sem banheiros próprios, sem espaço para planejamento pedagógico, com ausência de materiais e merenda escolar em quantidade e qualidade adequadas. Alega que tal cenário compromete gravemente o direito à educação e à dignidade dos estudantes, violando preceitos constitucionais e infraconstitucionais. Além disso, menciona que a unidade anexa “BURITI” ultrapassou os critérios legais para funcionamento provisório, nos termos da Resolução n.º 157/2002 do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso, que estabelece como limite máximo 120 alunos para salas anexas e exige a criação de unidade própria em caso de demanda superior. Essas alegações, além de remeterem a um cenário trágico de violações aos direitos constitucionais da educação, são devidamente comprovadas por todo o arcabouço probatório carreado na petição inicial. Essa demonstração, ao menos neste momento processual, remete a um cenário de intensas violações de direitos e garantias fundamentais, o qual reclama uma atuação mais enérgica deste Poder Judiciário. No caso, basta verificar o contexto aqui apresentado, onde há falta de estrutura condizente para que os alunos da unidade local tenham acesso a uma das mais poderosas armas para mudar um cenário global, que é a educação. Essa falta de estrutura, tal como demonstrada na petição inicial, não se verifica por meras irregularidades decorrentes, muitas vezes, de situações cotidianas de falta de recurso orçamentário. Ao contrário, remete a um contexto onde todos os alunos dali estão em condições totalmente desumanas, para não dizer outra coisa, já que mal estão conseguindo ter o básico que muitas unidades educacionais, inclusive desta comarca, estão tendo, que é o acesso a uma sala de aula. Aqui, ficou demonstrado que os alunos, dentre várias situações, estariam dividindo uma sala de aula em um mesmo espaço onde são preparadas as merendas escolares, e tal situação, além de outras demonstradas na petição e somada aos argumentos ora expostos, impõe a concessão da tutela de urgência. Sobre os requisitos da tutela em si, tenho que estão presentes, já que a probabilidade do direito se consubstancia pela farta prova documental carreada aos autos, que demonstra circunstâncias de vilipêndio ao fornecimento do direito educacional, em dissonância daquilo que preceitua a lei e a Constituição da República ao estipular como princípio a eficiência de seus serviços. Já o periculum in mora se reveste pelo fato de que a falta de intervenção, ainda que neste momento, permitiria que intensas violações legais e constitucionais viessem a se perpetrar ao longo dos próximos meses, razão pela qual entendo ser o caso de concessão da medida. Como já mencionado, ao analisar o presente caso é possível verificar, ao menos nesta fase processual, violações a preceitos legais e constitucionais, dentre os quais podemos citar alguns: · Art. 205 da Constituição Federal: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. · Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: o III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino o § 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. · Art. 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente: É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: o I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; o II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; o III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; o IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade; (Redação dada pela Lei nº 13.306, de 2016) o V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; o VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador; o VII - atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. o § 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. o § 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente. o § 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela frequência à escola. · Art. 4º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação: O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: o I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, organizada da seguinte forma: (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013) § a) pré-escola; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013) § b) ensino fundamental; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013) § c) ensino médio; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013) · Estatuto da Pessoa com Deficiência o Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem. o Parágrafo único. É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação. o Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar: § I - sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida; Contudo, além de ficarem constatadas, neste momento processual, as violações aos preceitos acima, o que corrobora com os requisitos mínimos para concessão da medida liminar, verificam-se, também, possíveis violações a direitos humanos invioláveis, que, somadas aos argumentos já tecidos, ratificam ainda mais a necessidade de concessão da medida. Sobre a temática, o Decreto 591/1992, denominado Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), do qual o Brasil é signatário e que é incorporado em nosso ordenamento jurídico como norma supralegal, por não ter sido aprovado sob o rito das emendas constitucionais (Art. 5º, §3º, da Constituição Federal), regulamenta que: Artigo 13 – Direito à Educação: “1. Os Estados Partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à educação. Concordam em que a educação deve visar ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido de sua dignidade, e deve fortalecer o respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. [...] 2. Os Estados Partes no presente Pacto reconhecem que, com vistas ao pleno exercício deste direito: a) o ensino primário deve ser obrigatório e acessível gratuitamente a todos; b) o ensino secundário, em suas diferentes formas, inclusive o ensino técnico e profissional, deve ser generalizado e tornado acessível a todos, por todos os meios apropriados, e, em particular, pela introdução progressiva da gratuidade; [...]” Ou seja, além dos requisitos para concessão da liminar se revestirem pela demonstração momentânea de violação a preceitos legais e constitucionais, há também violações de cunho humanitário, que, somando-se a tudo que já foi exposto, também acrescentam à necessidade de uma intervenção do sistema de justiça. Por fim, ante o deferimento da medida, convém fazer uma breve análise sobre os argumentos trazidos pelo Estado de Mato Grosso ao apresentar manifestação contrária sobre o pedido liminar. Na oportunidade, o ilustre procurador do Estado assentou que o deferimento da medida poderia acarretar impactos de índole financeira/orçamentária, sendo tal medida vedada em nosso ordenamento. Esses argumentos demonstram a tese de que a concessão da medida não seria cabível por se demonstrar nítido caso de acolhimento da tese da reserva do possível, que, em curtas palavras, significa que a efetivação dos direitos sociais está vinculada às possibilidades financeiras do Estado. Contudo, apesar do esforço argumentativo, convém destacar que esta tese defensiva não merece prosperar, já que o entendimento é sedimentado pela jurisprudência dominante de que a reserva do possível não se opõe ao contexto de evidência do mínimo existencial. Em outras palavras, o ente federativo não poderia alegar descumprimento do fornecimento de direitos e garantias fundamentais sob o argumento de que haveria violações a normas oriundas do direito financeiro. Esse tema foi debatido por longa data, sendo pacificado pelo saudoso Ministro Celso de Mello, que até os dias de hoje, em casos parecidos que envolvem direitos e garantias fundamentais, é invocado tal entendimento, senão vejamos: RECURSO DE APELAÇÃO RECEBIDO COMO RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DIREITO À SAÚDE. MUNICÍPIO DE ESTÂNCIA. FORNECIMENTO DE FRALDAS GERIÁTRICAS. DIAGNÓSTICO CLÍNICO DE INCONTINÊNCIA URINÁRIA (CID 10 G109, R32). INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES (ARTIGO 2º DA CF/88). PLEITO DE FORNECIMENTO DO INSUMO POR MEIO DO PROGRAMA FARMÁCIA POPULAR DO GOVERNO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE PROVAS DE QUE O PROGRAMA PODE ATENDER AS NECESSIDADES DO RECORRIDO. SUBSÍDIOS DO PROGRAMA FARMACÊUTICO QUE PODEM SER BUSCADOS ADMINISTRATIVAMENTE PELO MUNICÍPIO APELANTE JUNTO ÀS ESFERAS COMPETENTES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) 3. Analisando o feito de origem, reputa-se que restou comprovado que o recorrido/reclamante é portador de incontinência urinária (CID 10 G109, R32), pelo que necessita utilizar de fraldas geriátricas (tamanho GG, 04 (quatro) unidades ao dia o equivalente a 120 (cento e vinte) unidades ao mês), conforme relatório médico de p. 20. Acerca de tal pretensão, o NATJUD apresentou parecer favorável (Nota técnica de n.º 620/2023 – pp. 30/34), no seguinte sentido: FAVORÁVEL à liberação do pleito, por meio da gestão da SMS de Estância, mediante cadastro pelo Serviço Social, com acompanhamento e seguimento da autora, por meio das equipes de saúde da família - UBS, a fim de avaliação da sua evolução clínica terapêutica, além das doenças pré-existentes, porém não condicionada a marca de fraldas específicas. 4. Nesse contexto, o juízo a quo acolheu a pretensão autoral, tendo condenado o recorrente ao fornecimento das fraldas requestadas. Na sequência, inconformado, o ente municipal interpôs o recurso de pp. 111/121, por meio do qual alegou: (i) a impossibilidade financeira de cumprimento da tutela jurisdicional, suscitando a aplicação da teoria da reserva do possível; (ii) a violação do princípio da separação dos poderes (artigo 2º da CF/88), destacando a impossibilidade de ingerência do Poder Judiciário na esfera administrativa; e (iii) a existência do programa farmácia popular, por meio do qual o requerente poderá adquirir fraldas com descontos de até 90% do valor original, argumentos esses que passo a analisar. 5. A valer, a tutela constitucional do direito à saúde estende-se a todos os indivíduos, já que a garantia de acesso às ações e aos serviços é de caráter universal e igualitário, de forma que a saúde passou a ser um direito público subjetivo, bem jurídico constitucionalmente tutelado, incumbindo ao poder público formular e implementar políticas sociais e econômicas que visem a garantir aos cidadãos o acesso universal e igualitário à assistência médico hospitalar. Diante desse direito fundamental, não há o que se falar em reserva do possível e na impossibilidade de fornecimento do tratamento pela parte recorrente frente ao direito à saúde que compõe o mínimo existencial da pessoa, qual seja o conjunto mínimo de direitos necessários para que a pessoa sobreviva com dignidade, sendo inquestionável a inclusão da integridade física e mental naquele núcleo básico. 6. Frise-se, ainda, que é de notório conhecimento a precariedade do sistema da saúde nacional, sendo que a única prejudicada pela situação é a população desprotegida, que possui, quando muito, condições mínimas de sobrevivência, não podendo, de tal maneira, gozar de serviços de saúde prestados em caráter satisfatório pela iniciativa privada. Contudo, este quadro caótico, em que a espera por um tratamento adequado pode durar meses, não pode ser um óbice ao Poder Judiciário no exercício de sua função constitucional. A ele não se permite furtar de sua função primordial que é a de velar pelos direitos dos cidadãos brasileiros, na tentativa de preservar um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, que é a dignidade da pessoa humana. 7. De mais a mais, a real insuficiência de recursos deve ser demonstrada pelo Poder Público, não sendo admitido que a referida tese da reserva do possível seja utilizada como uma desculpa genérica para a omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais. No caso, não houve essa demonstração, sendo oportuno ressaltar o entendimento externado pelo Ministro Celso de Mello, no julgamento da Arguição de Descumprimento Fundamental n.º 45:"Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da"reserva do possível"- ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade." (...) (STF - ARE: 1533221 SE, Relator.: PRESIDENTE, Data de Julgamento: 23/01/2025, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 23/01/2025 PUBLIC 24/01/2025). (g.n). Assim, por toda a evidência aqui delineada e levando em conta, ao menos por ora, as violações de preceitos legais e constitucionais, a concessão da medida liminar é a medida a ser adotada. Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, DEFIRO a liminar pretendida para DETERMINAR que o ESTADO DE MATO GROSSO: a) Adote medidas emergenciais de adequação estrutural, disponibilizando espaço adequado que comporte os alunos da unidade anexa BURITI, respeitando a quantidade máxima de alunos por sala, especialmente nas turmas com alunos especiais, onde essa estrutura conte com espaço de cozinha separado da sala de aula a fim de resguardar a integridade física dos alunos e a qualidade pedagógica; Disponha de espaço adequado para planejamento pedagógico e descanso dos professores; E, ainda, que providencie o fornecimento de insumos educacionais e merenda adequados e suficientes aos alunos da sala anexa; b) Providencie o início imediato, ou em prazo plenamente justificado, da criação e construção de uma Unidade Escolar Estadual na comunidade de Vila Aparecida, estabelecendo prazo razoável para sua conclusão. Por fim, como mencionado no início da fundamentação desta decisão, quando o Poder Judiciário intervém em políticas públicas que visam garantir direitos fundamentais, ao invés de estipular medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem alcançadas e determinar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para alcançar o resultado (STF. Plenário. RE 684.612/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, redator do acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 01/7/2023 (Repercussão Geral – Tema 698) (Info 1101). No presente caso, entendo como pertinente, ao invés de fixar um prazo dilatório para o Estado cumprir as determinações acima, fixar um prazo para que o mesmo apresente um cronograma específico para cumprir as referidas imposições, desde que o referido plano seja apresentado nestes autos e não ostente caráter protelatório. Assim, em cumprimento à decisão proferida no Tema de Repercussão Geral 698, ASSINALO o prazo de até 10 (dez) dias para que o Estado de Mato Grosso apresente cronograma pormenorizado das medidas a serem adotadas para fiel cumprimento das referidas imposições. Nesse viés, informo que, caso as medidas não sejam informadas ou, se informadas, tiverem caráter protelatório, além da medida ser flexibilizada por este Juízo, será desde já aplicada multa de R$1.000,00 (mil reais) por dia de descumprimento, até o limite de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Expeça-se o necessário. Às providências. Cáceres-MT, datado e assinado digitalmente. HENRIQUETA FERNANDA C.A.F LIMA Juíza de Direito

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Processo nº 0005242-18.2011.8.10.0060

ID: 259142861

Tribunal: TJMA Órgão: Vara da Fazenda Pública de Timon Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0005242-18.2011.8.10.0060

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

YARA SHIRLEY BATISTA DE MACEDO AMADOR

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

YARA SHIRLEY BATISTA DE MACEDO AMADOR

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

PROCESSO: 0005242-18.2011.8.10.0060 AÇÃO: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: ROSANGELA NOGUEIRA COSTA PEREIRA Advogado do(a) AUTOR: YARA SHIRLEY BATISTA DE MACEDO AMADOR - MA8064-A REU: MUNICIPIO DE… PROCESSO: 0005242-18.2011.8.10.0060 AÇÃO: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: ROSANGELA NOGUEIRA COSTA PEREIRA Advogado do(a) AUTOR: YARA SHIRLEY BATISTA DE MACEDO AMADOR - MA8064-A REU: MUNICIPIO DE TIMON Publicação submetida com a finalidade de INTIMAÇÃO da parte autora para tomar conhecimento da SENTENÇA proferida nos autos com o seguinte teor: I - RELATÓRIO Rosângela Nogueira Costa Pereira, por intermédio de advogado, ajuizou ação de indenização por dano moral, material e estético em face do Município de Timon, id 23040255. Alegou que, “é portadora de polipose uterina, iniciou tratamento para cura da patologia que era portadora, através do SUS — Sistema Único de Saúde, em convênio com a Prefeitura Municipal de Timon/MA, e médicos que atendem pela secretaria de saúde municipal.” Assevera ainda que “após o diagnóstico da CID N 84.0, em 12 de novembro de 2008, a requerente foi submetida a uma cirurgia no Hospital de Pronto Socorro Municipal de Timon, tendo como diagnóstico pré-operatório “polipose uterina”, para a retirada dos mesmos e que teria ocorrido um erro médico nesta cirurgia, causando uma perfuração na bexiga da autora. Segundo a petição inicial, o fato gerador dos danos foi o erro médico na realização de cirurgia a que foi submetida, consubstanciado na perfuração de sua bexiga. Requereu, ao final, a procedência do pedido, com a condenação do requerido em danos materiais, morais e estéticos, bem como uma pensão vitalícia. Veio a inicial instruída com os documentos. Citado, o Município ofereceu contestação, no id 23040263/23040264, argumentando que não existem provas do dano sofrido pela autora que tenha advindo da cirurgia não restando o dever de indenizar da municipalidade. Réplica. Sobreveio sentença de mérito pela improcedência da ação, id 23040678. Interposto recurso de Apelação pela autora, a Primeira Câmara Cível deu provimento ao recurso para anular a sentença e determinar o retorno dos autos a este Juízo, a fim de que fosse realizada a competente instrução probatória, com a oitiva de testemunhas e realização de prova pericial. Com o retorno dos autos, por meio da decisão de id 23040682, fls. 16, determinou a nomeação de médico perito para realização da perícia médica na autora. Termo de juntada de Laudo Pericial, no id 24467965, cuja perícia foi realizada em 11/10/2019. Decisão de saneamento e organização do processo, id 24536979. Despacho, id 25304917, redesignando a audiência de instrução e julgamento, com suspensão do feito, tendo em vista a expedição de carta precatória. Despacho, id 48447410. Ata de audiência, id 64277492. Petição da autora, id 65078828, apresentação de quesitos e indicação de assistente de perito. Decisão, id 95976403, de chamamento do o feito a ordem determinando a produção de nova prova pericial, com a nomeação de novo médico perito para atuar no feito, observando a quesitação já mencionada (Ids.: 23040268 - Pág. 17 / 19 e 23040268 - Pág. 31 / 33). Certidão, id 116863139. Termo de juntada do Laudo pericial, id 120685010. Intimadas as partes para apresentarem manifestação acerca do laudo médico juntado aos autos. O Município de Timon, no id 124060283, se manifestou pelo acatamento do laudo pericial apresentado nos autos. A parte autora deixou transcorrer o prazo sem apresentar manifestação. Vieram os autos conclusos para julgamento. É o sintético relatório. Passo a fundamentar em obediência ao art. 93, inciso IX, da Carta Política. II - FUNDAMENTAÇÃO O caderno processual se apresenta “maduro” para pronto julgamento. Coleciona-se: “Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz, e não mera faculdade assim proceder” (STJ. 4ª Turma. REsp 2.832-RJ. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo. j. 14.8.90). Assim, declara-se encerrada a instrução e passa-se ao julgamento do feito. Ausentes preliminares. Adentrando no mérito, verifica-se a improcedência da pretensão inicial. Cuida-se de ação de indenização por dano moral, material e estético ajuizada por Rosângela Nogueira Costa Pereira em face do Município de Timon. Narra que, é portadora de polipose uterina, iniciou tratamento para cura da patologia que era portadora, através do SUS – Sistema Único de Saúde, em convênio com a Prefeitura Municipal de Timon. Que após o diagnóstico da CID N84.0, em 12 de novembro de 2008, foi submetida a uma cirurgia no Hospital de Pronto Socorro Municipal de Timon, tendo como diagnóstico pré-operatório “polipose uterino”, para a retirada dos mesmos. Que na data de 14/11/2008, 02 dias depois da cirurgia (12/11/2008), teve alta hospitalar. Que após a alta começou a sentir fortes dores, imaginando ser consequências da cirurgia a que foi submetida recentemente, bem como os sintomas de febre, mal estar, incontinência urinária, e falta de cicatrização dos cortes cirúrgicos. Que, diante desse quadro, ajudada por amigos, foi levada para a cidade de São Luís/MA, para realização de novos exames, onde foi constatado que houve erro médico na cirurgia realizada em 12 de novembro de 2008, consistindo em perfuração da sua bexiga, causa que explicava a incontinência urinária. Que, abalada emocionalmente, em 24 de março de 2009, ou seja, 5 (cinco) meses da primeira cirurgia, foi submetida a uma cirurgia para corrigir o erro anterior. Concluiu que, o médico contratado pelo Município Requerido, uma vez exercendo, mediante autorização do município, serviço público de saúde, tem como norte a satisfação concreta das necessidades da coletividade, devendo zelar pela vida daqueles a que atendem. Diante de todo o exposto, pede a condenação do Município de Timon, ao pagamento, a título de indenização por danos materiais, de quantia a ser arbitrada pelo Juízo, segundo seus critérios analíticos e jurídicos; ao pagamento, a título de indenização por danos morais, da quantia de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) ou então, em valor que o Juízo fixar, pelos seus próprios critérios analíticos e jurídicos; ao pagamento de título de indenização por danos estéticos, da quantia de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta a mil reais); Condenação do ente municipal Requerido ao pagamento de pensão vitalícia a autora, em quantia a ser fixada. In caso, as provas produzidas mostram que as alegações da autora não refletem, exatamente, a verdade dos fatos, pois o laudo pericial informa que “não há provas de perfuração da bexiga, tendo em vista que a fístula pode se formar sem que haja necessariamente uma perfuração, como, por exemplo, em decorrência de processo inflamatório. Com relação à fístula que evoluiu, a mesma foi corrigida em 24/03/2009.” Ainda, é imperioso esclarecer que não há comprovação de que houve a perfuração da bexiga da autora na histerectomia realizada, mas sim o surgimento de fístula vesico-vaginal, que é uma comunicação anormal entre a bexiga e a vagina, sendo o tipo mais comum de fístula do trato urinário, tendo como umas das principais causas a própria histerectomia. Classicamente, as mulheres nessa condição, apresentam perda urinária contínua pela vagina e ausência de micção, com forte impacto negativo na qualidade de vida. Contudo, apesar de haver clara ligação entre a cirurgia realizada e o trauma suportado, a leitura atenta do laudo pericial, somada a documentação apresentada, permitem concluir que a fístula vesicovaginal foi uma complicação comum e inerente ao procedimento cirúrgico de retirada do útero. Embora lamente-se a situação sofrida pela parte autora, que teve comprometida a função mictória, com um longo período para recuperação, restou cabalmente demonstrado pelo conjunto probatório dos autos que não se verificou a ocorrência de nenhuma falha na prestação de serviços pelos prepostos médicos do hospital municipal requerido, sendo frisado no laudo pericial anexado no id 120685010. Em se tratando de Responsabilidade da Administração, em razão de alegada falha do serviço público, não é possível o reconhecimento automático da responsabilidade objetiva e aplicação indiscriminada do disposto no art. 37, §6º da CF/88. Afinal, nos casos de falha do serviço, imprescindível a comprovação de que o serviço foi prestado defeituosamente, ensejando os danos descritos pela autora. Ora, verifica-se que a falta ou falha do serviço não se revela como modalidade de responsabilidade objetiva, sendo indubitavelmente subjetiva, porque baseada na culpa ou dolo. É o que preleciona Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 663: “Responsabilidade subjetiva é a obrigação de indenizar que incumbe a alguém em razão de um procedimento contrário ao direito não é necessária a identificação de uma culpa individual para deflagar-se a responsabilidade do Estado. Esta noção civilista é ultrapassada pela ideia denominada de 'faute du service' entre os franceses. Ocorre a 'culpa do serviço' ou 'falta do serviço' quando este não funciona, devendo funcionar, funciona mal ou funciona atrasado. Esta é a tríplice modalidade pela qual se apresenta e nela se traduz um elo entre a responsabilidade tradicional do Direito civil e responsabilidade objetiva. É mister acentuar que a responsabilidade pela 'falta de serviço', falha do serviço ou culpa do serviço ('faute du service' seja qual for a tradução que se lhe dê) não é, de modo algum, modalidade de responsabilidade objetiva, ao contrário do que entre nós e alhures, às vezes, tem-se inadvertidamente suposto. É responsabilidade subjetiva porque baseada na culpa (ou dolo), como sempre advertiu o Prof. Oswaldo Aranha Bandeira de Mello. Com efeito, para sua deflagração não basta a mera objetividade de um dano relacionado com um serviço estatal. Cumpre que exista algo mais, ou seja, culpa (ou dolo), elemento tipificador da responsabilidade subjetiva. Há responsabilidade objetiva quando basta para caracterizá-la a simples relação causal entre um acontecimento e o efeito que produz. Há responsabilidade subjetiva quando para caracterizá-la é necessário que a conduta geradora de dano revele deliberação na prática do comportamento proibido ou desatendimento indesejado dos padrões de desempenho, atenção ou habilidade normais (culpa) legalmente exigíveis, de tal sorte que o direito em uma ou outra hipótese resulta transgredido. Por isso é sempre responsabilidade por comportamento ilícito quando o Estado, devendo atuar, e de acordo em certos padrões, não atua ou atua insuficientemente para deter o evento lesivo” A conduta configuradora da “faute du service” caracteriza a culpa administrativa e exige demonstração, ainda que presumida, de comportamento proibido ou desatendimento indesejado dos padrões de empenho, atenção ou habilidades normais (culpa) legalmente exigíveis. O Estado poderá eximir-se demonstrando a inocorrência de culpa, por ter agido com cuidado e zelo, ou pela inexistência de falha no serviço. Na culpa administrativa se enquadra a responsabilidade por omissão, quando caracterizada. É também conduta ilícita que enseja reparação. As respostas dos quesitos formulados pelas partes, indicam que, de fato, a fístula apresentada pela autora é uma complicação comum de cirurgia ginecológica, e que a segunda cirurgia, foi para correção de fístula vesicovaginal e a terceira foi hernioplastia para corrigir uma hérnia no local da incisão cirúrgica. Nesta perspectiva, de rigor analisar as alegações da autora à luz das provas documentais constantes nos autos e o laudo pericial, nos termos dos ensinamentos doutrinários vertentes à Responsabilidade da Administração por falha do serviço, analisando eventuais danos morais e materiais experimentados em razão de suposta prestação defeituosa de serviço público. Nesse contexto, para que a autora faça jus à reparação no caso em tela, necessária a demonstração dos fatos narrados, do nexo causal e do dano experimentado. Foi realizada audiência de instrução e julgamento, id 64277492, sendo colhido o depoimento de duas testemunhas apresentadas pela autora, Maria de Fátima Soares e Antonia Regina Brito Alves. Desta feita, de rigor reconhecer que é incumbência da autora comprovar os fatos constitutivos do seu direito, demonstrando a conduta culposa dos profissionais médicos que realizaram o procedimento cirúrgico. Para mais, as respostas dos quesitos formulados pela parte autora também demonstram que não houve a perfuração da bexiga da paciente, como esta alegou na exordial, e sim a correção da fístula. O médico perito afirmou que, não há provas de perfuração da bexiga, tendo em vista que a fístula pode se formar sem que haja necessariamente uma perfuração, em decorrência de processo inflamatório. A perícia médica realizada, conforme laudo no id 120685010, relata que: “Pericianda, 52 anos, cpf 449.483.363-00, data de nascimento em 10/03/1972, com profissão de serviços gerais. Pericianda refere cirurgia histerectomia em 2008 e que evoluiu com perda de líquido vaginal iniciando 15 dias após a cirurgia. Refere que 30 dias após a cirurgia, procurou serviço de urgência médica em que o médico que operou trabalhava para reavaliação, chamado Dr. Adenor R. Lira (crm-ma 728). Refere que o mesmo reavaliou e disse que a pericianda tinha uma fístula. refere que o tratamento instituído foi diclofenaco e ducha. Pericianda nega qualquer solicitação de exame e nem orientações de seguimento ambulatorial. Refere que no momento ele afirmou ser uma fístula, mas que a medicação resolveria. Pericianda refere evoluir com febre e persistência dos sintomas por 04 meses, tendo que usar fraldas nesse período. após todo esse tempo foi reavaliada em São Luís-Ma e refere ser descoberto que tinha havido trauma do ureter. Realizou cirurgia para correção de fístula em 24/03/2009 baseado em resumo de alta assinado por Dr. Antônio Sérgio (cirurgião) Crm-Ma 5051 em 28/04/2009. Foi para casa, evoluiu com infecção da ferida operatória. Voltou ao hospital e fez tratamento com antibioticoterapia por mais 14 dias. Realizou cirurgia de hernia em 01/07/2016 pelo dr Antomar Almeida Fernandes (crm-ma 4598). Atualmente refere dor no local da cirurgia por provável herniação. Atualmente sem queixas urinárias. Nega infecções urinárias recorrentes. Pericianda não tem exames posteriores mostrando sua situação. Vale frisar que a fístula vesicovaginal pode ocorrer por outros motivos como processo inflamatório pós-cirúrgico. é importante ressaltar que a fistula vesicovaginal é uma intercorrência que pode ocorrer na cirurgia de histerectomia, independente se via vaginal, abdominal ou laparoscópica. Não é um erro médico. Quando se aceita o tratamento de histerectomia, aceita-se os riscos cirúrgicos, inerentes ao procedimento, inclusive o de fistula. O que não é possível afirmar é se houve explanação prévia ou consentimento livre e esclarecido. No caso em questão, pela história clínica de que os sintomas inciaram cerca de 15 dias após o ato cirúrgico, a possibilidade de fístula por processo inflamatório é ainda maior que por qualquer complicação no ato cirúrgico. Outro fato relevante é que as evoluções de enfermagem pós-cirúrgica evidenciam diurese presente e sem alterações dignas de nota.” O perito respondeu sobre o fato de perfuração da bexiga: 7. A bexiga da Autora já foi perfurada? Quando? Como foi corrigido? Não há provas de perfuração da bexiga, tendo em vista que a fístula pode se formar sem que haja necessariamente uma perfuração, como, por exemplo, em decorrência de processo inflamatório. Com relação à fístula que evoluiu, a mesma foi corrigida em 24/03/2009. A propósito, consta na conclusão do laudo pericial, nesses termos: “Com base nos documentos apresentados e na perícia médica realizada, não há elementos que evidencie erro de conduta médica.” Assim, o laudo pericial é fator preponderante para a solução da lide, pela leitura dos documentos trazidos aos autos e a conclusão do laudo, o nexo causal é inexistente. Assim, analisando-se o caso com atenção, nota-se que a fístula que surgiu após a histerectomia total da autora, decorre-se de vários fatores alheios à atuação da equipe médica que a assistiu. Em verdade, esclareço que o dano é entendido, pela Organização Mundial de Saúde, como qualquer perda ou anormalidade fisiológica, de estrutura anatômica, de função ou psíquica, frisando que o dano não está relacionado exclusivamente ao procedimento cirúrgico em si, mas também à própria doença ou a outras situações que determinem anormalidade fisiológica, de estrutura anatômica, de função ou psíquica, independente de culpa. Em que pese ao esforço argumentativo da autora em suas razões expostas na inicial, no caso concreto, não vislumbro que mereçam prosperar. Assim, pode-se concluir pela inexistência de imprudência, imperícia ou negligência na conduta médica dos prepostos do nosocômio requerido, e em verdade, os tratamentos recomendados e realizados pelo preposto da requerida estavam em conformidade com a literatura médica. Logo, a hipótese de falha na prestação de serviços, ou seja, atuação com imperícia, negligência ou imprudência, foi afastada pelo próprio teor do laudo pericial, sendo que a parte autora não apresentou impugnações técnicas ao laudo pericial. Sem embargo, o diagnóstico correto e a adoção do procedimento adequado para o caso, conforme recomendação da literatura médica, afasta por completo a pretensão indenizatória. E esse é o entendimento dos E. Tribunais em casos similares: RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. FÍSTULA VESICOVAGINAL APÓS HISTERECTOMIA. LAUDO PERICIAL. COMPLICAÇÃO PREVISTA NA LITERATURA. AUSÊNCIA DE DEFEITOS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA RECURSO NÃO PROVIDO. Responsabilidade civil. Alegação de erro médico. Autora desenvolveu fístula vesico-vaginal pós histerectomia. Perícia que não indicou falhas na prestação dos serviços médicos. Complicação prevista na literatura médica. Improcedência do pedido mantida. Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1035525-80.2019.8.26.0577; Relator (a): J.B. Paula Lima; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José dos Campos - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/06/2022; Data de Registro: 29/06/2022). RESPONSABILIDADE CIVIL. Indenização por erro médico. Autora diagnosticada com "Adenomiose", submetida a cirurgia de histerectomia. Alegação de erro médico, devido à ocorrência de fístula da bexiga, por negligência da médica que realizou a cirurgia e acompanhou o pósoperatório. Pedido de indenização por danos morais. Sentença de improcedência. Manutenção. Cirurgia indicada como tratamento adequado para a patologia apresentada pela autora. Prova pericial não constatou violação a protocolos médicos. Manifestação de fístula na bexiga corresponde a intercorrência comum do necessário tratamento exigido pelo quadro clínico da autora (iatrogenia), e não de erro na intervenção médica. Laudo pericial concluiu que os resultados verificados são inerentes a esse próprio tipo de intervenção, realizada em conformidade com a boa técnica e protocolos médicos. Ausência de descumprimento do dever de informação. Autora autorizou a realização do procedimento e de outros que se fizessem necessários em situações excepcionais, indicativo de que estava plenamente de acordo com os riscos da cirurgia. No mais, prova nos autos a indicar que a autora se submeteria ao procedimento independentemente da ciência dos riscos supostamente omitidos. Tratamento prescrito em caráter de urgência. Iniciativa da própria autora em buscar tratamento mais eficaz para a adenomiose. Requerente admite a solução dos inconvenientes causados pela primeira doença e a melhora da qualidade de vida. Ação improcedente. Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1005639-80.2018.8.26.0024; Relator (a): Francisco Loureiro; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro de Andradina - 3ª Vara; Data do Julgamento: 11/05/2021; Data de Registro: 12/05/2021) grifei AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. CIRURGIA PARA RETIRADA DE ÚTERO (HISTERECTOMIA). PERFURAÇÃO DA BEXIGA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. NEXO CAUSAL. Pretensão de reparação por danos morais e materiais, em virtude de perfuração da bexiga, durante histerectomia. Alegação de negligência, imprudência e imperícia médica, o que acarretou danos à saúde da autora. Inadmissibilidade. Esclarecimentos da perícia descaracterizam a ocorrência de erro médico. Ausente falha ou falta do serviço. Ausente nexo causal entre o dano e conduta comissiva ou omissiva do Estado. Ausente dever de indenizar. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1000608- 95.2017.8.26.0515; Relator (a): Alves Braga Júnior; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Público; Foro de Rosana - Vara Única; Data do Julgamento: 17/02/2021; Data de Registro: 17/02/2021). Apelação. Ação de indenização por danos morais e materiais. Alegação de erro médico. Sentença de improcedência. Inconformismo da autora. Descabimento. Decisão embasada no laudo pericial. Indicação médica para a realização da histerectomia total abdominal. Fístula ureterovaginal é uma das complicações descritas na literatura médica como decorrentes dessa cirurgia. Duas cirurgias realizadas para correção da complicação. Ausência de sequelas. Inexistência de falha médica. Ausência de nexo causal entre a conduta do médico e os danos descritos pela autora. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 0000141-81.2013.8.26.0222; Relator (a): Pedro de Alcântara da Silva Leme Filho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro de Guariba - 2° Vara Judicial; Data do Julgamento: 24/09/2020; Data de Registro: 24/09/2020). INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS FÍSTULA VESICO-VAGINAL LESÃO UROLÓGICA IATROGÊNICA PROVOCADA EM CIRURGIA DE HISTERECTOMIA INFORMAÇÃO PERICIAL DE QUE FÍSTULAS VESICAIS PODEM ACONTECER EM MAIS DE 70% DOS PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS GINECOLÓGICOS MÉDICO QUE DEIXOU DE PRESTAR INFORMAÇÕES SOBRE OS RISCOS DO ATO CIRÚRGICO INFORMAÇÃO É DIREITO BÁSICO DO CONSUMIDOR (CDC, ART. 6º, III E ART. 8º) DESRESPEITO À BOA-FÉ OBJETIVA "QUANTUM" INDENIZATÓRIO REDUZIDO PARA R$ 20.000,00 SENTENÇA REFORMADA RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (TJSP; Apelação Cível 1015399-52.2014.8.26.0005; Relator (a): Theodureto Camargo; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional V - São Miguel Paulista - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/08/2020; Data de Registro: 25/08/2020). Apelação cível. Ação indenizatória. Responsabilidade do Hospital Particular. Erro médico . Não configurado. Dano, conduta e nexo de causalidade. Reforma da sentença. A responsabilidade do estabelecimento hospitalar é objetiva, prescindindo da comprovação da culpa, sendo certo que uma vez demonstrado nos autos a existência de falha na prestação dos serviços médicos, por meio do seu corpo clínico, o dano suportado pelo paciente e o nexo de causalidade, evidencia-se sua obrigação de reparação civil . A responsabilidade do médico, salvo nos casos de cirurgia meramente estética, é de meio e se apura subjetivamente. O erro médico ocorre quando o dano provocado advém da imprudência, da negligência ou imperícia do profissional. Se não há evidências de erro no diagnóstico nem tampouco na conduta médica, ainda que exista dano, esse não pode ser caracterizado como erro médico. Não comprovado o nexo de causalidade entre a ação e a lesão, deve ser afastada a obrigação de indenizar as vítimas. APELAÇÃO CÍVEL, Processo nº 7050665-45.2019.822.0001, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, 1ª Câmara Cível, Relator (a) do Acórdão: Des . Rowilson Teixeira, Data de julgamento: 18/04/2023.(TJ-RO - AC: 70506654520198220001, Relator.: Des. Rowilson Teixeira, Data de Julgamento: 18/04/2023) Registro que, embora intimada, a autora não impugnou a perícia judicial realizada nos autos, conforme certidão de id 101390975. Logo, não trouxe quaisquer elementos capazes de infirmar as conclusões alcançadas pelo médico perito judicial de confiança do Juízo, que analisou tecnicamente os documentos existentes na demanda, e que apresentou laudo técnico sob o crivo do contraditório. Da prova técnica realizada nos autos consta a devida apreciação e ponderação acerca dos pontos relevantes e o perito judicial é equidistantes aos interesses das partes, motivos pelos quais seus achados e conclusões possuem importância significativa. Para que se pudesse falar em responsabilidade dos médicos requeridos, no caso concreto, seria necessária a comprovação inequívoca de falha na prestação do atendimento médico pelas unidades de saúde em que trabalham, de tal forma a delinear o nexo causal entre o evento danoso e os atendimentos médicos prestados, o que não ocorre na espécie. Embora lamentável e muito triste o episódio vivenciado pela autora, que, evidentemente, causou-lhe e sempre lhe causará tristeza, não se verifica, no caso, responsabilidade dos requeridos, reputando-se adequado o atendimento prestado pela equipe médica que a atendeu e pelos profissionais de saúde que atuaram em seu caso. Desta feita, a improcedência dos pedidos é medida que se impõe. Diante do plexo fático e jurídico apresentados, encontra-se esse magistrado autorizado a redigir o seguinte dispositivo: III - DISPOSITIVO Por todo o exposto, julgo improcedente a ação, resolvo o mérito nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, dando por extinto o processo com resolução do mérito, determinando o seu arquivamento, com baixa, uma vez certificado o trânsito em julgado. Por fim, condeno a autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da causa, conforme preconiza o artigo 85º, §2º do CPC, e suspendo sua exigibilidade nos termos do artigo 98, § 3º do mesmo diploma legal. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe, nos termos da Portaria Conjunta nº 20/2022-TJMA. Benefício da gratuidade da justiça deferido nos termos requeridos pela parte autora. Id 46194480. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. Cumpra-se. Timon (Ma), data e hora do sistema. Dr. Weliton Sousa Carvalho Juiz de Direito Titular da Vara da Fazenda Pública de Timon. Aos 22/04/2025, eu LILIANE DA SILVA LIMA, servidor da Secretaria Judicial Única Digital (SEJUD) do Polo de Timon, encaminhei o presente ato para o Diário de Justiça Eletrônico Nacional.

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