Processo nº 5005355-49.2025.4.03.6000
ID: 313733151
Tribunal: TRF3
Órgão: 4ª Vara Federal de Campo Grande
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 5005355-49.2025.4.03.6000
Data de Disponibilização:
02/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CRISTIANE PEREIRA DA SILVA
OAB/MS XXXXXX
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4ª Vara Federal de Campo Grande MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5005355-49.2025.4.03.6000 IMPETRANTE: CRISTIANE PEREIRA DA SILVA Advogado do(a) IMPETRANTE: CRISTIANE PEREIRA DA SILVA - MS28694 IM…
4ª Vara Federal de Campo Grande MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5005355-49.2025.4.03.6000 IMPETRANTE: CRISTIANE PEREIRA DA SILVA Advogado do(a) IMPETRANTE: CRISTIANE PEREIRA DA SILVA - MS28694 IMPETRADO: PRESIDENTE DA COMISSÃO DO CONCURSO PÚBLICO UNIFICADO DA JUSTIÇA ELEITORAL, CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISA EM AVALIACAO E SELECAO E DE PROMOCAO DE EVENTOS - CEBRASPE Valor: R$ 1.000,00 oms DECISÃO Cristiane Pereira da Silva impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do Presidente da Comissão do Concurso Público Unificado da Justiça Eleitoral, executado pelo Cebraspe, que, após procedimento de heteroidentificação, indeferiu sua participação nas vagas destinadas a candidatos negros (pretos e pardos), sob o fundamento de ausência de características fenotípicas compatíveis com a autodeclaração apresentada. Narra o impetrante, em suma, que: O Presidente do Tribunal Superior Eleitoral determinou a realização de Concurso Público Nacional Unificado da Justiça Eleitoral para provimento de vagas e a formação de cadastro de reserva em cargos de analista judiciário e de técnico judiciário, através do Edital nº 01 – CPNUJE, de 27/05/2024 (em anexo). Conforme disposições preliminares do Edital (item 1), o concurso público seria regido pelo edital e executado pelo Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe). Os itens 5.2 e 5.2.1 do Edital dispõe que das vagas destinadas aos candidatos negros, a cada cargo/área/especialidade/Tribunal Eleitoral e das que vierem a ser criadas durante o prazo de validade do concurso 20% serão providas na forma da Resolução TSE nº 23.724/2023, e da Lei nº 12.990, de 09/06/2014. A Impetrante, candidata devidamente inscrita no Concurso Público para provimento de vagas no cargo nº 18 Analista Judiciário – Área Judiciária, sob inscrição nº 10559905, para vagas destinadas aos candidatos negros, participou da 1ª (primeira) etapa, prova objetiva, e da 2ª (segunda) etapa, prova discursiva, sendo aprovada em ambos. Após aprovação em ambas as fases do certame, a Impetrante fora convocada por intermédio do EDITAL Nº 11 – CPNUJE, DE 11 DE FEVEREIRO DE 2025, para participar do procedimento de heteroidentificação dos candidatos negros, cuja análise e parecer final concluiu que aquela não possuía caracteres que a credenciavam a concorrer às vagas reservadas às pessoas negras. Conforme será demonstrado a seguir, a decisão (subjetiva) dos integrantes da banca examinadora da Comissão de Heteroidentificação contraria as determinações legais e jurisprudenciais que norteiam os critérios de aferição da origem étnica.. Relata que participou regularmente das etapas do concurso, tendo sido aprovada nas provas objetiva e discursiva. Contudo, ao ser submetida à comissão de heteroidentificação, teve sua autodeclaração como parda desconsiderada. Alega que a decisão foi arbitrária, subjetiva e desprovida de fundamentação adequada. Sustenta, ainda, que possui traços fenotípicos compatíveis com sua autodeclaração, o que estaria corroborado por laudos médicos e antropológicos Pede em resumo: a) os benefícios da gratuidade da justiça, por ser hipossuficiente, nos termos do art. 98, do Código de Processo Civil; b) A aplicação imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, consagradas e salvaguardadas no Art. 5º, especialmente o seu § 1º, XIII, XXXV, LV e Art. 93, IX, todos da Carta Magna; c) A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR EM TUTELA DE URGÊNCIA neste mandamus, initio litis e inaudita altera pars, a rigor do Art. 7º, III da Lei nº 12.016/09 c/c Art. 300, § 2º, CPC e Art. 9º, parágrafo único, I, CPC, ante a robusta prova documental, para determinar ao Impetrado a permanência da Impetrante na lista de aprovados do Concurso Público Nacional Unificado da Justiça Eleitoral para o provimento de vagas para o cargo de Analista Judiciário – Área Judiciária, do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul – TRE/MS, na condição de cotista parda, nos exatos termos da autodeclaração e de toda prova contida nos autos, que comprovam o direito líquido e certo da Impetrante, de modo a prosseguir concorrendo no certame, inclusive com reabertura de prazo da convocação para apresentação/avaliação de títulos pela Impetrante (etapa ulterior após a aprovação pela Comissão de Heteroidentificação); d) Após o deferimento da liminar, eis que presentes os pressupostos legais, seja ordenada a intimação/notificação da autoridade coatora Presidente da Comissão do Concurso Público Unificado da Justiça Eleitoral executado pelo CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISA EM AVALIAÇÃO E SELEÇÃO E DE PROMOÇÃO DE EVENTOS – CEBRASPE, para cumprimento da ordem; e) A solicitação do parecer do Ministério Público da União, nos termos do que dispõe o Art. 12, da Lei nº 12.016/09; f) No MÉRITO, seja julgada totalmente procedente a presente ação mandamental, consolidando definitivamente a medida liminar, CONCEDENDO A SEGURANÇA DEFINITIVA para preservação do direito líquido e certo da parte Impetrante, a fim de permanecer na lista de aprovados, participando do concurso público unificado, através do sistema de cotas, concorrendo às vagas reservadas aos candidatos negros (pretos e pardos). Juntou documentos. É o breve relatório. Decido. A concessão da liminar em mandado de segurança exige a presença concomitante dos requisitos legais da relevância do fundamento e do risco de ineficácia da medida, caso deferida somente ao final, nos termos do artigo 7º, inciso III, da Lei 12.016/2009. A autora concorria ao cargo de ANALISTA JUDICIÁRIO – ÁREA JUDICIÁRIA. De acordo com o EDITAL DE ABERTURA DE INSCRIÇÕES N .º 01/2024, o qual regia o concurso supracitado (id 365387527): 5.2 DAS VAGAS DESTINADAS AOS CANDIDATOS NEGROS 5.2.1 Das vagas destinadas a cada cargo/área/especialidade/Tribunal Eleitoral e das que vierem a ser criadas durante o prazo de validade do concurso, 20% serão providas na forma da Resolução TSE nº 23.724/2023, e da Lei nº 12.990, de 9 de junho de 2014. 5.2.1.1 Caso a aplicação do percentual de que trata o subitem 5.2.1 deste edital resulte em número fracionado, este será elevado até o primeiro número inteiro subsequente, em caso de fração igual ou maior que 0,5, ou diminuído para o número inteiro imediatamente inferior, em caso de fração menor que 0,5, nos termos do § 2º do art. 14 da Resolução TSE nº 23.724/2023. 5.2.1.2 A reserva de vagas de que trata o subitem 5.2.1 deste edital será aplicada somente nos cargos/áreas/especialidades/Tribunais Eleitorais em que haja três ou mais vagas. 5.2.1.3 Para concorrer às vagas reservadas, o candidato deverá, no ato da solicitação de inscrição, optar por concorrer às vagas reservadas aos negros e autodeclarar-se preto ou pardo, conforme quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 5.2.1.4 A autodeclaração do candidato goza da presunção relativa de veracidade e terá validade somente para este concurso público. 5.2.1.4.1 A autodeclaração do candidato será confirmada mediante procedimento de heteroidentificação dos candidatos negros, sem prejuízos da apuração das responsabilidades administrativa, civil e penal. 5.2.1.5 As informações prestadas no momento de inscrição são de inteira responsabilidade do candidato. 5.2.1.6 A primeira pessoa negra classificada no concurso será nomeada para ocupar a terceira vaga aberta, enquanto as demais serão nomeadas a cada acréscimo de cinco cargos providos, observando-se a sequência da oitava vaga, décima terceira, décima oitava, vigésima terceira e assim em diante. 5.2.2 DO PROCEDIMENTO DE HETEROIDENTIFICAÇÃO DOS CANDIDATOS NEGROS 5.2.2.1 O procedimento de heteroidentificação será realizado após a conclusão de todas as fases eliminatórias do certame e anteriormente à divulgação do resultado final no concurso. Serão convocados para o referido procedimento os candidatos que se autodeclararam negros não eliminados nas fases anteriores. 5.2.2.1.1 Para os cargos de Analista Judiciário e para o cargo de Técnico Judiciário – Área: Administrativa – Especialidade: Agente da Polícia Judicial, o procedimento de heteroidentificação será realizado em momento distinto das demais especialidades do cargo de Técnico Judiciário. 5.2.2.2 No procedimento de heteroidentificação é verificada, por terceiros, a condição autodeclarada. 5.2.2.3 Para o procedimento de heteroidentificação, o candidato que se autodeclarou negro deverá se apresentar, pessoalmente, à comissão de heteroidentificação. 5.2.2.3.1 A comissão de heteroidentificação será composta por três integrantes, de diferente gênero, cor e, preferencialmente, naturalidade. 5.2.2.4 O procedimento de heteroidentificação será filmado pelo Cebraspe para fins de registro de avaliação. A filmagem será de uso exclusivo da banca examinadora e sua gravação será utilizada na análise de eventuais recursos interpostos contra a decisão da comissão. 5.2.2.5 A avaliação da comissão de heteroidentificação considerará o fenótipo do candidato. 5.2.2.5.1 Serão consideradas as características fenotípicas da pessoa ao tempo da realização da comissão de heteroidentificação. 5.2.2.5.2 Não serão considerados, para os fins do disposto no subitem 5.2.2.5 deste edital, quaisquer registros ou documentos pretéritos eventualmente apresentados, inclusive imagem e certidões referentes a confirmação em procedimentos de heteroidentificação realizados em certames federais, estaduais, distritais e municipais ou em processos seletivos de qualquer natureza. 5.2.2.5.3 Não será admitida, em nenhuma hipótese, a prova baseada em ancestralidade. 5.2.2.6 Será considerado negro o candidato que assim for reconhecido pela maioria dos membros da comissão de heteroidentificação. 5.2.2.7 Será eliminado do concurso o candidato que se recusar a ser filmado, prestar declaração falsa ou não comparecer ao procedimento de heteroidentificação. 5.2.2.7.1 O candidato cuja autodeclaração não seja confirmada no procedimento de heteroidentificação concorrerá somente às vagas destinadas à ampla concorrência, caso tenha nota suficiente para tanto. 5.2.2.7.2 Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua nomeação, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis. 5.2.2.8 O enquadramento ou não do candidato na condição de pessoa negra não se configura em ato discriminatório de qualquer natureza. 5.2.2.9 A avaliação da comissão de heteroidentificação quanto ao enquadramento, ou não, do candidato na condição de pessoa negra, terá validade apenas para este concurso. 5.2.2.10 A comissão de heteroidentificação poderá ter acesso a informações, fornecidas ou não pelo próprio candidato, que auxiliem a análise acerca da condição do candidato como pessoa negra. 5.2.2.11 Os candidatos negros concorrerão concomitantemente às vagas a eles reservadas e às vagas destinadas à ampla concorrência, de acordo com a sua classificação no concurso. 5.2.2.11.1 Em cada uma das fases do concurso, não serão computados, para efeito de preenchimento do percentual de vagas reservadas a candidatos negros, nos termos da Lei nº 12.990/2014, os candidatos autodeclarados negros classificados ou aprovados dentro do número de vagas oferecido a ampla concorrência, sendo que esses candidatos constarão tanto da lista dos aprovados dentro do número de vagas da ampla concorrência como também da lista dos aprovados para as vagas reservadas aos candidatos negros, em todas as fases do concurso. 5.2.2.12 Os candidatos negros aprovados dentro do número de vagas oferecido para ampla concorrência não serão computados para efeito do preenchimento das vagas reservadas a candidatos negros. 5.2.2.13 Os candidatos negros aprovados para as vagas a eles destinadas e às reservadas às pessoas com deficiência, convocados concomitantemente para o provimento dos cargos, deverão manifestar opção por uma delas. 5.2.2.13.1 Na hipótese de que trata o subitem 5.2.2.13 deste edital, caso os candidatos não se manifestem previamente, serão nomeados dentro das vagas destinadas aos negros. 5.2.2.13.2 Na hipótese de o candidato aprovado tanto na condição de negro quanto na de deficiente ser convocado primeiramente para o provimento de vaga destinada a candidato negro, ou optar por esta na hipótese do subitem 5.2.2.13 deste edital, fará jus aos mesmos direitos e benefícios assegurados ao servidor com deficiência. 5.2.2.14 Em caso de desistência de candidato negro aprovado em vaga reservada, a vaga será preenchida pelo candidato negro posteriormente classificado. 5.2.2.15 Na hipótese de não haver candidatos negros aprovados em número suficiente para que sejam ocupadas as vagas reservadas, as vagas remanescentes serão revertidas para ampla concorrência e serão preenchidas pelos demais candidatos aprovados, observada a ordem de classificação geral por cargo/área/especialidade/Tribunal Eleitoral. 5.2.2.16 A nomeação dos candidatos aprovados respeitará os critérios de alternância e de proporcionalidade, que consideram a relação entre o número total de vagas e o número de vagas reservadas a candidatos com deficiência e a candidatos negros. 5.2.2.17 Somente haverá reserva imediata de vagas para os candidatos negros nos cargos/áreas/especialidades com número de vagas igual ou superior a três. 5.2.2.18 Demais informações a respeito do procedimento de heteroidentificação constarão de edital específico de convocação para essa fase A autora tinha conhecimento, no momento de sua inscrição no certame, que a confirmação da veracidade da autodeclaração pela banca do concurso, seria condição obrigatória para prosseguimento, mas não impugnou o edital em tempo hábil. Com efeito, a Lei n. 12.990/2014, que estabelece as cotas, tem como objetivo compensar ou reparar a discriminação racial sofrida por quem ostente o fenótipo de negro ou pardo. Assim, a confirmação dessa condição pela Banca de Avaliação da Veracidade da Declaração é um instrumento para evitar fraudes e o uso indevido das cotas por quem não possui esse direito. No caso concreto, a impetrante foi regularmente submetida ao procedimento de heteroidentificação, conforme previsto no edital do certame e em consonância com a legislação aplicável. A decisão da comissão, composta de forma diversa quanto a gênero, cor e, preferencialmente, naturalidade, concluiu, por maioria, pela ausência de traços fenotípicos que justificassem sua inclusão nas cotas destinadas a candidatos negros. Ainda que a impetrante apresente elementos adicionais, como laudos médicos e relatos de ancestralidade, tais documentos, por si sós, não afastam a análise fenotípica prevista no edital, que expressamente determina que não serão considerados documentos pretéritos ou prova de ascendência para fins de enquadramento na política de cotas raciais. A jurisprudência pátria tem reconhecido a legalidade do procedimento de heteroidentificação baseado em critérios visuais e imediatos, desde que respeitados os princípios do contraditório, da ampla defesa e da razoabilidade. Sobre o tema, destaca-se o seguinte julgado: AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SISU . UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS. AÇÕES AFIRMATIVAS. VAGAS RESERVADAS A PESSOAS NEGRAS. COMISSÃO DE HETEROINDENTIFICAÇÃO . IMPOSSIBILIDADE DE SE PROCEDER AO EXAME DE MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. OBSERVÂNCIA DAS REGRAS DO EDITAL. ATO DEVIDAMENTE MOTIVADO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE . SENTENÇA MANTIDA. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Trata-se de agravo interno interposto por LAURA HEVELISE TEODORO DE SOUZA em face da decisão que negou provimento a seu recurso de apelação, nos termos do art . 932, IV, do CPC. 2. Sustenta a agravante, em síntese, que houve discordância entre os próprios membros das comissões de heteroidentificação no que diz respeito à sua classificação como pessoa negra e, nesses casos, conforme decidido pelo C. Supremo Tribunal Federal na ADC nº 41, deve prevalecer a autodeclaração do candidato . 3. No âmbito de exames e concursos públicos, não cabe ao Poder Judiciário proceder à análise de mérito do ato administrativo, devendo a sua atuação se restringir ao controle da legalidade e da observância das regras contidas no edital. Ademais, a Lei nº 9.784/1999 dispõe, em seu artigo 50, sobre a necessidade de motivação dos atos administrativos, devendo esta ser "explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato" (§ 1º) . 4. No mais, no tocante às ações afirmativas, o Plenário do C. STF, no julgamento da ADPF nº 186/DF, assentou que a possibilidade do Estado lançar mão "de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares”, não contraria, ao contrário, prestigia o princípio da igualdade material, previsto no caput do art. 5º da Carta da Republica (STF - Tribunal Pleno - ADPF nº 186/DF, Rel . Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 26/04/2012, DATA DE PUBLICAÇÃO DJE 20/10/2014). 5. Por sua vez, a Lei nº 12 .990/2014 estabeleceu a reserva de 20% das vagas oferecidas em concursos públicos da Administração Pública Federal a candidatos negros, nos seguintes termos:"Art. 2º Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Parágrafo único. Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis" . 6. Da leitura do artigo 2º supra, extrai-se que a autodeclaração do candidato, como preto ou pardo, no ato de inscrição é passível de verificação por procedimento administrativo, com observância do contraditório e da ampla defesa. Ressalte-se, ainda, que, no julgamento da ADC nº 41/DF, o Plenário do C. STF declarou a integral constitucionalidade da Lei nº 12 .990/2014 e da instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos, reconhecendo como legítima a utilização de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa (STF - Tribunal Pleno - ADC nº 41/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 08/06/2017, DATA DE PUBLICAÇÃO DJE 17/08/2017). 7 . No caso, a autora se inscreveu para concorrer a uma das vagas destinadas às Pessoas Negras e Pardas (PNP) do curso de Agronomia da Universidade Federal da Grande Dourados – UFGD, pelo Sistema de Seleção Unificada (SISU). Seguindo a determinação editalícia, apresentou a sua autodeclaração como parda, que, todavia, não foi confirmada no procedimento de heteroidentificação. Alega que, ao reprová-la, a Comissão de Heteroidentificação apresentou parecer genérico e idêntico ao de todos os demais candidatos reprovados. Diante disso, interpôs recurso administrativo, que foi indeferido sem qualquer justificativa . 8. Nesse contexto, observa-se que, de acordo com o edital, os procedimentos da Comissão de Heteroidentificação Geral para autodeclarados negros constam na Resolução COUNI nº 283/2022. Esta, por sua vez, estipula que a Comissão Específica de Heteroidentificação Telepresencial deliberará pela maioria simples de seus membros e levará em conta somente as características fenotípicas existentes ao tempo de realização do procedimento. 9 . Ainda, segundo o edital, da decisão da Comissão de Heteroidentificação Telepresencial caberá recurso à Comissão Recursal que, além de considerar o registro audiovisual da sessão telepresencial, realizará sessão presencial de heteroidentificação. A decisão será publicada em edital e dela não caberá interposição de novo recurso. 10. Da análise dos autos, verifica-se que a Comissão Específica de Heteroidentificação decidiu, por maioria, pela não confirmação da autodeclaração da apelante, sob o fundamento de que não foi observado um conjunto de características fenotípicas suficientes de pessoa negra, notadamente a cor da pele, o aspecto do cabelo, do nariz e dos lábios . De forma semelhante, o parecer da Comissão Recursal entendeu que a candidata não apresentava características fenotípicas suficientes de pessoas negra, em relação ao aspecto do cabelo, nariz e lábios. 11. Ressalte-se, ainda, que, conforme informado pela Pró-Reitoria da Universidade, a apelante concorreu pelo Sisu e pelo Processo Seletivo Vestibular (PSV), sendo que, em ambos, a sua autodeclaração não foi confirmada pela Comissão Geral de Heteroidentificação. No total foram três comissões diferentes que fizeram a análise da candidata: do PSV, do Sisu e Comissão Recursal do Sisu . 12. No tocante à ausência do currículo dos integrantes das comissões, tal exigência não consta na referida Resolução COUNI nº 283/2022. Ademais, foi esclarecido pela Pró-Reitoria que"a CGH é designada por Portaria da Reitoria da UFGD, sendo a Comissão composta por membros profissionais técnicos, docentes, pesquisadores e pessoas da sociedade civil que possuem formação para atuar nas comissões. Nesse sentido, deve-se ressaltar que a atuação pelos membros da Comissão Geral de Heteroidentificação é precedida pela participação em cursos de capacitação sobre a temática . Por esta razão, há envolvimento constante das pessoas que compõe a Comissão em ações ofertadas pela UFGD ou outras instituições, dentre elas: debates, cursos, oficinas, seminários, ciclos de formação, procedimentos práticos de heteroidentificação e outras ações que envolvem temáticas como Racismo, Ações Afirmativas no Ensino Superior, Igualdade racial, dentre outras". 13. Assim, por todos os ângulos analisados, não se vislumbra ilegalidade do ato administrativo, tampouco inobservância das regras do edital, razão pela qual a sentença de improcedência deve ser mantida, com a majoração em 1% dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 85, § 11, do CPC, observada a concessão da justiça gratuita. 14 . A matéria em síntese mereceu nova apreciação deste MM. Órgão Judiciário, em face da permissão contida no artigo 371 do Código de Processo Civil, que consagra o princípio do livre convencimento ou da persuasão racional, e que impõe ao julgador o poder-dever. O poder no que concerne à liberdade de que dispõe para valorar a prova e o dever de fundamentar a sua decisão, ou seja, a razão de seu conhecimento. Sob outro aspecto, o juiz não está adstrito a examinar todas as normas legais trazidas pelas partes, bastando que, in casu, decline os fundamentos suficientes para lastrear sua decisão . 15. Agravo interno não provido. (TRF-3 - ApCiv: 50013443920234036002, Relator.: Desembargador Federal NOEMI MARTINS DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 27/02/2024, 6ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 29/02/2024) No presente momento processual, a alegação de ausência de fundamentação da decisão administrativa não se mostra suficiente para caracterizar, de plano, a ilegalidade ou arbitrariedade do ato, sobretudo diante da ausência de demonstração inequívoca da probabilidade do direito invocado e da urgência da medida. Cabe salientar que não se deve olvidar da legitimidade dos atos administrativos. Aliás, o Supremo Tribunal Federal já manifestou sobre o tema: Direito Constitucional. Ação Direta de Constitucionalidade. Reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da Lei n° 12.990/2014. Procedência do pedido. 1. É constitucional a Lei n° 12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, por três fundamentos. 1.1. Em primeiro lugar, a desequiparação promovida pela política de ação afirmativa em questão está em consonância com o princípio da isonomia. Ela se funda na necessidade de superar o racismo estrutural e institucional ainda existente na sociedade brasileira, e garantir a igualdade material entre os cidadãos, por meio da distribuição mais equitativa de bens sociais e da promoção do reconhecimento da população afrodescendente. 1.2. Em segundo lugar, não há violação aos princípios do concurso público e da eficiência. A reserva de vagas para negros não os isenta da aprovação no concurso público. Como qualquer outro candidato, o beneficiário da política deve alcançar a nota necessária para que seja considerado apto a exercer, de forma adequada e eficiente, o cargo em questão. Além disso, a incorporação do fator “raça” como critério de seleção, ao invés de afetar o princípio da eficiência, contribui para sua realização em maior extensão, criando uma “burocracia representativa”, capaz de garantir que os pontos de vista e interesses de toda a população sejam considerados na tomada de decisões estatais. 1.3. Em terceiro lugar, a medida observa o princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão. A existência de uma política de cotas para o acesso de negros à educação superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária ou desproporcional em sentido estrito. Isso porque: (i) nem todos os cargos e empregos públicos exigem curso superior; (ii) ainda quando haja essa exigência, os beneficiários da ação afirmativa no serviço público podem não ter sido beneficiários das cotas nas universidades públicas; e (iii) mesmo que o concorrente tenha ingressado em curso de ensino superior por meio de cotas, há outros fatores que impedem os negros de competir em pé de igualdade nos concursos públicos, justificando a política de ação afirmativa instituída pela Lei n° 12.990/2014. 2. Ademais, a fim de garantir a efetividade da política em questão, também é constitucional a instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação (e.g., a exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do concurso), desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa. 3. Por fim, a administração pública deve atentar para os seguintes parâmetros: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii) os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira funcional do beneficiário da reserva de vagas. 4. Procedência do pedido, para fins de declarar a integral constitucionalidade da Lei n° 12.990/2014. Tese de julgamento: “É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa”. STF - ADC 41 – Min. Roberto Barroso – 8.6.2017. destaquei. E o Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATA AUTODECLARADA PARDA. CONDIÇÃO NECESSÁRIA, MAS NÃO SUFICIENTE, PARA CONCORRER ÀS VAGAS RESERVADAS AOS COTISTAS DE COR NEGRA/PARDA. PREVISÃO NO EDITAL QUE A AUTODECLARAÇÃO SERIA CONFIRMADA POR UMA BANCA EXAMINADORA QUE, EM DECISÃO UNÂNIME, CONCLUIU QUE A CANDIDATA NÃO APRESENTAVA TRAÇO FENÓTIPO DE NEGRO/PARDO. RECURSO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento contra decisão que deferiu pedido de antecipação de tutela para o fim de determinar que a inscrição da autora seja mantida como cotista (parda) e, nesta condição, seja ela convocada para as demais fases do concurso, caso a sua classificação assim lhe assegure. 2. A decisão da Comissão Avaliadora, composta segundo a agravante por três estudiosos das relações raciais no Brasil, com Doutorado em Ciências Sociais e ativistas de movimentos negros organizados, à unanimidade concluiu que a candidata não apresentava traço fenótipo de negro/pardo e os elementos constantes dos autos não são suficientes para infirmar tal conclusão. 3. É certo que a conclusão da Comissão Avaliadora não pode ser arbitrária, mas obviamente tem um traço ponderável de subjetividade que é próprio do critério do fenótipo (conjunto de caracteres visíveis de um indivíduo ou de um organismo, em relação à sua constituição e às condições do seu meio ambiente, ou seja, aparência) adotado pelo edital e não contrariado pela agravada até sofrer a desclassificação; sendo assim, é invocável recente aresto do STF que ressalvou o não cabimento de revisão judicial de critério subjetivo de resultado de prova, que originariamente cabe à banca (AI 80.5328 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-199 DIVULG 09-10-2012 PUBLIC 10-10-2012). 4. As alegações de ancestralidade e consanguinidade não são definidoras de direitos para que os candidatos possam figurar nas vagas reservadas, até porque o edital já definiu previamente os critérios orientadores para tanto. 5. Impossibilidade de o Judiciário se sobrepor ao critério que se reserva à banca examinadora, ressaltando-se que a candidata só se recordou de investir contra o critério do edital depois de não ser favorecida por ele; até então, para ela nada havia de errado nas providências elencadas para apuração de cota racial no certame a que se candidatou. 6. Recurso provido. (AI 564798 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO - SEXTA TURMA - -DJF3 Judicial 1 DATA:11/03/2016) destaquei Desta feita acrescento, invocando outro precedente do TRF da 3a. Região: a conclusão da Comissão Avaliadora não pode ser arbitrária, mas obviamente tem um traço ponderável de subjetividade que é próprio do critério do fenótipo (conjunto de caracteres visíveis de um indivíduo ou de um organismo, em relação à sua constituição e às condições do seu meio ambiente, ou seja, aparência) adotado pelo edital e não contrariado pela agravada até sofrer a desclassificação; sendo assim, é invocável recente aresto do STF que ressalvou o não cabimento de revisão judicial de critério subjetivo de resultado de prova, que originariamente cabe à banca (AI 80.5328 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-199 DIVULG 09-10-2012 PUBLIC 10-10-2012). Impossibilidade de o Judiciário se sobrepor ao critério que se reserva à banca examinadora (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5009757-10.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, julgado em 17/12/2021, Intimação via sistema DATA: 11/01/2022). Logo, inexistindo ilegalidade a ser reparada, por ter a banca atuado e esgotado seu trabalho dentro do raio de competência, não procede a pretensão da autora em ver a decisão administrativa substituída pela Judicial. É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: (....) O Superior Tribunal de Justiça não pode substituir o julgamento administrativo, incidindo, por identidade de razões, a orientação segundo a qual não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade (RMS 62.040/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 27/02/2020). Dessa forma, ausente a demonstração inequívoca de direito líquido e certo, indefiro o pedido de liminar. Defiro o pedido de gratuidade de justiça, forte no art. 99, 3º, do CPC (Id 365435960). Notifique-se a autoridade coatora para que preste informações no prazo legal. Dê-se ciência do feito ao representante judicial do INSS, conforme requerido, nos termos do art. 7º, II, da Lei n. 12.016/2009. Ciência ao MPF. Intime-se. Campo Grande/MS, data e assinatura, conforme certificação eletrônica. A presente decisão servirá de expediente (mandado, carta precatória, ofício) para que a Secretaria da Vara viabilize seu cumprimento. 1. Carta Precatória de Notificação e Intimação para o Nome: Presidente da Comissão do Concurso Público Unificado da Justiça Eleitoral Endereço: Quadra SAAN Quadra 1, S/N, Avenida Costa e Silva, s/n, Zona Industrial, BRASíLIA - DF - CEP: 70632-100 2. Carta Precatória de Intimação do CENTRO BRASILEIRO DE PESQUISA EM AVALIACAO E SELECAO E DE PROMOCAO DE EVENTOS - CEBRASPE Endereço: AC EQN 204/404, CAMPUS UNIVERSITÁRIO DARCY RIBEIRO, Asa Norte, BRASíLIA - DF - CEP: 70842-970 OBSERVAÇÕES: O acesso aos documentos do processo poderá ser efetivado por meio do sistema PJe ou link: https://pje1g.trf3.jus.br/pje/ConsultaPublica/consultaPublicaDocumento.seam No campo CÓDIGO PARA CONSULTA DE DOCUMENTOS, utilizar o seguinte código: 84a55bac-2f9e-4129-bfe0-2914d6d6ad5e SEDE DO JUÍZO: Rua Delegado Carlos Roberto Bastos de Oliveira, 128, Jardim Veraneio, CAMPO GRANDE - MS - CEP: 79037-102. Telefone para contato 3320-1144/1145. E-mail: cgrande-se04-vara04@trf3.jus.br.
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