Processo nº 1027829-27.2023.8.11.0041
ID: 306377790
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1027829-27.2023.8.11.0041
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
IGOR GIRALDI FARIA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1027829-27.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Compra e Venda, Rescisão do contrato e devolução…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1027829-27.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Compra e Venda, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [WELLINTON DE LIMA MONGE - CPF: 734.284.931-68 (APELANTE), IGOR GIRALDI FARIA - CPF: 841.693.111-91 (ADVOGADO), BRDU SPE CUIABA 01 LTDA - CNPJ: 13.512.865/0001-89 (APELADO), CARLOS EDUARDO CAMPOS RESENDE - CPF: 033.093.581-00 (ADVOGADO), JULIANA MACHADO RIBEIRO - CPF: 018.771.571-80 (ADVOGADO), RICARDO DE MORAIS FURTADO - CPF: 688.545.101-06 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.514/97. RESCISÃO CONTRATUAL POR INICIATIVA DO COMPRADOR. RESTITUIÇÃO PARCIAL DOS VALORES PAGOS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Ação de Rescisão Contratual c/c Devolução de Quantias Pagas, visando à rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel com cláusula de alienação fiduciária, firmado em 01/09/2015, diante da perda de interesse na continuidade do negócio, com devolução dos valores pagos, descontada retenção proporcional. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A controvérsia envolve: (i) a natureza jurídica do contrato firmado entre as partes e a aplicabilidade da Lei 9.514/1997 diante da ausência de registro da garantia fiduciária; (ii) a possibilidade de rescisão contratual unilateral por iniciativa do comprador; (iii) o percentual razoável de retenção e a forma de devolução das quantias pagas. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência de registro do contrato no cartório de imóveis impede a constituição da propriedade fiduciária e, por consequência, afasta a incidência da Lei 9.514/1997. Aplicam-se, nesse caso, as regras do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor. 4. É admitida a rescisão contratual por iniciativa do promitente-comprador, ainda que não haja inadimplemento por parte da vendedora, com a devolução parcial dos valores pagos, observada a vedação ao enriquecimento sem causa. 5. Considerando que se trata de lote não edificado, sem posse comprovada pelo comprador, é indevida a cobrança de taxa de fruição ou retenção por IPTU. 6. Razoável a fixação da retenção em 15% sobre os valores pagos, com restituição da diferença de forma simples, corrigida monetariamente pelo INPC até 30/08/2024 e, após, pela taxa SELIC, com juros moratórios a partir do trânsito em julgado, nos termos do Tema 1002 do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso provido. Sentença reformada. Tese de julgamento: “1. A ausência de registro do contrato de compra e venda com cláusula de alienação fiduciária no cartório de imóveis impede a constituição da garantia real e afasta a aplicação da Lei 9.514/97. 2. É admitida a rescisão contratual por iniciativa do comprador, com devolução dos valores pagos, admitida a retenção entre 10% e 25% conforme as circunstâncias do caso. 3. Para lotes não edificados e sem posse do comprador, é indevida a cobrança de taxa de fruição e IPTU.” Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 421 e 422; CPC/2015, art. 373, II; Lei 9.514/1997, art. 23. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 2014411/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 14.08.2023; TJMT, Ap. Cív. 1022011-48.2022.8.11.0003, Rel. Des. Nilza Maria Possas de Carvalho, j. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por WELLINTON DE LIMA MONGE em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Pierro de Faria Mendes da 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que julgou improcedente o pedido contido nos autos da Ação de Rescisão Contratual c/c Devolução de Quantias Pagas e Pedido de Tutela Antecipada de Urgência movida em face de BRDU SPE CUIABA 01 LTDA. Inconformado, o apelante sustenta, em síntese, que o contrato não se aperfeiçoou como alienação fiduciária pela ausência de registro na matrícula do imóvel, motivo pelo qual não se aplicaria a Lei n.º 9.514/1997, mas sim a legislação civil comum e o CDC. Reforça que a jurisprudência do STJ reconhece a possibilidade de rescisão contratual com devolução proporcional dos valores pagos quando ausente o registro da alienação fiduciária. Ao final, requer a reforma da sentença para que seja reconhecida a possibilidade de rescisão contratual com restituição proporcional das quantias pagas, admitida a retenção de até 15%. (ID. 290347430) Em contrarrazões, a parte apelada pugna pela manutenção integral da sentença, argumentando que o contrato é válido e eficaz mesmo sem registro, conforme entendimento pacificado no Tema 1095 do STJ, e que o desinteresse do adquirente configura quebra antecipada do contrato, devendo prevalecer o rito específico da Lei n.º 9.514/1997. Sustenta a inaplicabilidade do CDC e a inexistência de vício que autorize a resolução judicial da avença. (ID. 290347437). Custas devidamente recolhida, conforme certidão de ID. 291014413. É o relato do necessário. Em Pauta. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Trata-se, na origem de Ação de Rescisão Contratual c/c Devolução de Quantias Pagas e Pedido de Tutela Antecipada de Urgência, movida por WELLINTON DE LIMA MONGE, em face de BRDU SPE CUIABA 01 LTDA, alegando ter firmado em 01/09/2015, contrato intitulado Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda de Imóvel com Financiamento Imobiliário e Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária, tendo por objeto o lote n.º 12 da quadra 12, localizado na Rua 04 do Loteamento Residencial Mirante do Parque, em Cuiabá/MT, com valor total de R$ 46.292,93. Relatou que, por motivos pessoais, perdeu o interesse na continuidade do contrato, pleiteando a sua rescisão com a devolução dos valores pagos, admitindo retenção de 15%. Aduziu ainda que foram impostas condições abusivas para o desfazimento contratual. Após a instrução processual, o juízo singular assim sentenciou o processo: (...) De proêmio, sabe-se que, em caso de conflito de normas, a Lei que deverá prevalecer é aquela que esteja vigente e especialmente prevista, ou seja, uma norma de caráter geral (Lei 8.078/1990 - CDC) não pode prevalecer à uma norma de caráter específico (Lei 9.514/1997). No caso em tela, a parte autora pretende, em síntese, a resolução do contrato de promessa de compra e venda de imóvel com financiamento imobiliário e alienação fiduciária, aduzindo perda de interesse na continuidade da avença. Relata a parte autora, em síntese, que firmou com a parte requerida um Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda de Imóvel com Financiamento Imobiliário e Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária. Iniciou o pagamento das prestações acordadas, contudo, por razões de ordem pessoal, não tem mais interesse em permanecer no contrato, pretendendo a sua rescisão. Requer, ainda, que o distrato enseja na restituição parcial dos valores pagos. Em sede de contestação, a parte demandada refuta a pretensão autoral sob os seguintes argumentos: trata-se de contrato de financiamento imobiliário regido pela Lei nº 9.514/97, com cláusula de alienação fiduciária em garantia, o contrato não se confunde com uma mera promessa de compra e venda, mas sim com instrumento jurídico que opera efeitos reais e é regulado por legislação especial, a requerente não apontou qualquer inadimplemento contratual por parte da instituição financeira, não havendo vício de consentimento, cláusula abusiva ou descumprimento que justifique a resolução contratual pretendida e que o mero desinteresse da parte devedora não pode ensejar a rescisão do contrato sem previsão legal ou contratual nesse sentido. Nesse preâmbulo0 o pedido de rescisão contratual deve ser exaustivamente analisado à luz da natureza jurídica do instrumento firmado entre as partes, o qual, como destacado nos autos, não se trata de mera promessa de compra e venda, mas sim de contrato de financiamento imobiliário com garantia de alienação fiduciária, regido pela Lei nº 9.514/1997. II – DA NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO E A APLICAÇÃO DA LEI 9.514/1997: O instrumento entabulado entre as partes possui natureza bilateral, onerosa e comutativa, tendo sido celebrado com respaldo na Lei nº 9.514/1997, que disciplina a alienação fiduciária de bens imóveis, nos termos do art. 22 da referida norma: “Art. 22. (...) Nesse contexto, ao contrário do que defende a parte autora, o contrato não possui natureza meramente obrigacional. A alienação fiduciária opera a transferência da propriedade resolúvel do imóvel ao credor fiduciário, com reaquisição pelo devedor fiduciante somente mediante o cumprimento integral das obrigações contratuais. Trata-se, portanto, de instrumento regido por legislação especial, o qual não admite rescisão por mera liberalidade do contratante, especialmente quando ausente inadimplemento contratual ou qualquer fato imputável à parte requerida que justifique a resolução do contrato por iniciativa do fiduciante. III – DA AUSÊNCIA DE FATO GERADOR DA RESCISÃO CONTRATUAL: É incontroverso que não há qualquer inadimplemento contratual por parte da instituição financeira requerida, tampouco vício de consentimento, onerosidade excessiva ou qualquer fato impeditivo ou modificativo do pacto firmado. A única motivação trazida pela parte autora é a perda de interesse subjetiva na continuidade do negócio jurídico. Entretanto, o ordenamento jurídico não ampara a extinção unilateral de contratos bilaterais sem fundamento legal ou contratual, mormente aqueles regidos por normas especiais, como é o caso da Lei nº 9.514/97. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é clara ao distinguir os contratos de compra e venda de imóvel à vista ou a prazo com promissoras construtoras, dos contratos de financiamento com alienação fiduciária garantidos por instituição financeira. Nesses, não se aplica a teoria do distrato por desistência imotivada do comprador, sendo imprescindível o inadimplemento ou justa causa para resolução, o que não ocorreu na hipótese. Não se pode perder de vista que a parte autora assumiu livremente as obrigações contratuais e não demonstrou qualquer vício de vontade, tampouco fato superveniente que comprometa de forma relevante o equilíbrio do contrato. IV – DA FUNÇÃO SOCIAL E DA BOA-FÉ OBJETIVA: O princípio da função social do contrato, previsto no art. 421 do Código Civil, não pode ser utilizado para justificar a resolução contratual por mero arrependimento da parte contratante, sob pena de gerar grave instabilidade nas relações contratuais. A função social do contrato deve ser interpretada à luz da preservação dos vínculos validamente constituídos, e não como fundamento para sua extinção arbitrária, mormente quando inexiste inadimplemento ou desequilíbrio contratual, conforme preceitua o diploma civil: “Art. 421. (...) “Art. 421-A. (...) A boa-fé objetiva exige lealdade, confiança e respeito ao pactuado, não autorizando, em hipótese alguma, a rescisão por conveniência pessoal, sem que a parte adversa tenha contribuído com qualquer comportamento irregular ou lesivo. V- DISPOSITIVO: Ante todo o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por WELLINTON DE LIMA MONGE em face de BRDU SPE CUIABA 01 LTDA, extinguindo o processo com resolução de mérito, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC. (...) (ID. 290347428) Pois bem. A controvérsia posta em julgamento reside na possibilidade de rescisão de contrato intitulado “Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda de Imóvel com Financiamento Imobiliário e Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária”, firmado entre as partes, diante da alegada perda de interesse do comprador, ora apelante, na continuidade da avença. O ponto central reside na aplicabilidade – ou não – da Lei n.º 9.514/1997, que disciplina a alienação fiduciária de bens imóveis, em face da ausência de registro do contrato perante o Cartório de Registro de Imóveis. Para a incidência do regime especial previsto na Lei nº 9.514/97, necessário verificar se o contrato preenche todos os requisitos legais para a constituição efetiva da garantia real. No ponto, o art. 23 da referida lei dispões que: “Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.”. Assim, a ausência do referido registro impede a constituição da garantia real e, portanto, afasta a incidência do regime especial da alienação fiduciária. Trata-se, neste cenário, de negócio jurídico de natureza meramente obrigacional, que se submete às regras gerais do Código Civil e, dada a natureza da relação estabelecida entre as partes – pessoa física consumidora e pessoa jurídica fornecedora de imóveis – também à disciplina do Código de Defesa do Consumidor. Diversamente do que sustentado na sentença e reafirmado nas contrarrazões, a tese firmada pelo Tema 1095 do STJ — que reconhece a eficácia entre as partes do contrato de alienação fiduciária independentemente de registro – não afasta a necessidade de registro para a constituição da propriedade fiduciária, tampouco impede o ajuizamento de ação de rescisão contratual quando ausente a consolidação da propriedade ou a execução extrajudicial prevista nos arts. 26 e 27 da Lei n.º 9.514/97. Destaque-se, ainda, que o próprio STJ, mesmo após o julgamento do Tema 1095, admite a possibilidade de rescisão contratual com devolução proporcional dos valores pagos quando o contrato não foi registrado e, portanto, não se aperfeiçoou como garantia fiduciária real. Vejamos excerto da Corte Cidadã: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO . FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. CLÁUSULA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. LEI Nº 9 .514/1997. REGISTRO DO CONTRATO. IMPRESCINDIBILIDADE. 1. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça tem firme jurisprudência no sentido de que necessário o registro do contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária no competente Registro de Imóveis para a constituição da propriedade e garantia fiduciárias e aplicação das regras previstas na Lei nº 9.514/1997 em caso de inadimplência do devedor. 2. Na espécie, não foi realizado o registro do contrato, motivo pelo qual a garantia fiduciária não tinha se constituído e o adquirente/agravado tinha o direito de rescindir o ajuste sem a necessidade de se submeter ao procedimento previsto no artigo 27 da Lei nº 9 .514/1997.3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt nos EDcl no REsp: 2014411 SP 2022/0219594-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 14/08/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/08/2023) Destaquei O entendimento de necessidade de registro em Cartório competente é endossado por este e. Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS – INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA – CONTRATO DEVIDAMENTE REGISTRADO – INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PRECEDENTES DO STJ – APLICAÇÃO DA LEI 9.514/97 – IMPOSSIBILIDADE DE RESCISÃO DO CONTRATO E DEVOLUÇÃO DAS QUANTIAS PAGAS – PROCEDIMENTO ADOTADO PELA LEI 9.514/97 – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO DESPROVIDO. O Instrumento Particular de Compra e Venda de Imóvel com Alienação Fiduciária em Garantia atrai a incidência da Lei 9 .514/97, afastando-se a regra do art. 53 do Código de Defesa do Consumidor. Celebrado o instrumento particular de compra e venda de imóvel com cláusula de alienação fiduciária, registrado na matrícula do imóvel, não há possibilidade de rescisão do negócio por parte do adquirente ao fundamento de dificuldades financeiras devendo ser aplicado o procedimento previsto na Lei 9.514/97 . (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10063224020178110002, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 05/02/2025, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/02/2025) Destaquei APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO . COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE REGISTRO. DEVEDOR NÃO CONSTITUIDO EM MORA . INAPLICABILIDADE (LEI N. 9.514/97). RESCISÃO DE CONTRATO . POSSIBILIDADE. RETENÇÃO DE VALORES PREVISTOS CONTRATO. ARRAS RETENÇÃO. INDEVIDA . DEVOLUÇÃO DE VALORES. PARCELA ÚNICA. POSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE (LEI N . 13.786/18). HONORÁRIOS. ADEQUAÇÃO . RECURSO PROVIDO EM PARTE. Constatado erro material na sentença quanto aos dados do contrato objeto da ação, deve ser corrigido. Contrato de Compra e Venda de Imóvel com Alienação Fiduciária, sem registro no Cartório Imobiliário e sem constituição em mora, inaplicabilidade do procedimento de venda extrajudicial (Lei. n . 9.514/97). É possível a rescisão do contrato por vontade da parte contratante, com a restituição de valores pagos, abatidas as deduções contratuais. Não se aplica a Lei n . 13.786/2018 aos contratos firmados antes de sua vigência. Indevida a retenção do valor das arras por não se enquadrar na hipótese do art. 418 do CC . Os honorários advocatícios devem ser firmados sobre o proveito econômico, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.(TJ-MT 10228807920208110003 MT, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 14/06/2022, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/06/2022) Destaquei Necessário esclarecer que, embora o Apelante tenha juntado, nas razões recursais, certidão cartorária informando a ausência de registro da garantia fiduciária, observa-se que tal documento não integrava os autos no momento da prolação da sentença, tendo sido apresentado apenas por ocasião da interposição do recurso de apelação. Esse fato enseja duas consequências jurídicas relevantes: primeiro, trata-se de prova documental nova, cuja juntada em sede de apelação é, em regra, inadmissível, salvo nas hipóteses do art. 435 do CPC; segundo, o magistrado sentenciante não teve acesso a esse documento, não podendo sua decisão ser considerada equivocada com base em elemento probatório que não lhe foi apresentado oportunamente. Nesse contexto, não é possível considerar a certidão ora apresentada para fins de reforma da sentença, pois sua juntada tardia viola o devido processo legal e o princípio do contraditório. Ademais, durante toda a instrução processual, nenhuma das partes questionou a eficácia da alienação fiduciária por ausência de registro, limitando-se o debate à possibilidade de rescisão unilateral por desinteresse do comprador. A jurisprudência é firme no sentido de que não se admite a juntada de documentos em fase recursal quando a parte já os detinha e poderia tê-los apresentado em primeira instância: AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - PRELIMINARES AFASTADAS - JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS NA FASE RECURSAL – PRECLUSÃO – NÃO COMPROVAÇÃO DA IMPOSSIBILIDADE DE JUNTADA NO MOMENTO OPORTUNO – ÔNUS DA PROVA – DÉBITO INEXISTENTE – REPETIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL AFASTADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Se os documentos juntados com a apelação referem-se a fato ocorrido anteriormente ao ajuizamento da ação, logo, eram de conhecimento da parte, e, ausente demonstração de impossibilidade de juntada em momento oportuno, não constituem documentos novos, de modo que não devem ser conhecidos. Segundo entendimento consolidado no STJ, o dano moral deve ser demonstrado quando houver a falha na prestação ou cobrança do serviço, mas inexiste ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1005078-56 .2020.8.11.0007, Relator.: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 13/03/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/03/2024) Destaquei Não obstante a impossibilidade de consideração da certidão cartorária, fato é que durante a instrução processual não foram produzidas provas de que a alienação fiduciária tenha sido efetivamente registrada na matrícula do imóvel, o que impede a plena constituição da garantia real e, consequentemente, afasta a aplicabilidade do regime especial previsto na Lei n.º 9.514/97. Ora, o Apelante sustentou que o contrato entabulado entre as partes não se enquadrava nos parâmetros da Lei nº 9.514/1997, ônus esse que foi rebatido pelo Apelado, a quem incumbia comprovar o preenchimento de todos os requisitos legais para a configuração da alienação fiduciária em garantia, conforme dispõe o art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil. Contudo, não tendo o Apelado demonstrado a existência de registro da garantia fiduciária na matrícula do imóvel, elemento essencial para a constituição válida da alienação fiduciária, impõe-se reconhecer que o ajuste firmado deve ser interpretado como promessa de compra e venda comum, regida pelas normas gerais do direito civil e, por se tratar de relação de consumo, submetida também às disposições do Código de Defesa do Consumidor. Sob essa perspectiva, a jurisprudência tem sido pacífica no sentido de admitir a possibilidade de rescisão contratual por iniciativa do comprador, ainda que não haja inadimplemento por parte da construtora/vendedora, com a devolução parcial dos valores pagos, de modo a evitar o enriquecimento sem causa de qualquer das partes, sendo estipulado um percentual de retenção em favor do vendedor/construtor, fixando-o entre 10% e 25% dos valores pagos pelo promitente-comprador, conforme as circunstâncias de cada caso. Nesse sentido, este e. Tribunal de Justiça: (...)III. RAZÕES DE DECIDIR A sentença está devidamente fundamentada, enfrentando todos os pontos relevantes da controvérsia, ainda que de forma contrária ao entendimento da parte apelante, razão pela qual não se verifica nulidade. O contrato celebrado entre as partes data de 2016, anterior à vigência da Lei n. 13 .786/2018, de modo que não se aplica ao caso concreto o art. 32-A da Lei n. 6.766/79, introduzido por essa norma . A jurisprudência do STJ, consolidada na Súmula 543, estabelece que, em casos de rescisão contratual por iniciativa do comprador, é legítima a retenção de parte dos valores pagos, entre 10% e 25%, conforme as circunstâncias do caso. No caso, a culpa pela rescisão contratual é exclusivamente da compradora, e a sentença fixou a retenção em 10%, percentual razoável diante da ausência de pedido para majoração. Em observância ao REsp 1.300 .418/SC (Tema 938 do STJ), é devida a restituição imediata das parcelas pagas, mesmo em caso de culpa do comprador, sendo vedada a restituição parcelada ou ao final da obra. A cobrança de IPTU somente pode ser atribuída ao comprador se comprovada a posse do imóvel, o que não ocorreu nos autos, devendo o encargo permanecer com a vendedora. A taxa de fruição não é devida, pois não há prova de que a adquirente tenha usufruído do imóvel. IV . DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A Lei n. 13.786/2018 não se aplica a contratos firmados antes de sua vigência . Na rescisão contratual por iniciativa do comprador, é legítima a retenção entre 10% e 25% das parcelas pagas, conforme a jurisprudência do STJ. É abusiva a cláusula que determina a restituição parcelada ou ao fim da obra, sendo devida a devolução imediata das quantias pagas. A responsabilidade pelo pagamento de IPTU e taxa de fruição depende da comprovação da posse e do uso do imóvel pelo comprador. Dispositivos relevantes citados: Lei n . 6.766/1979, art. 32-A; Lei n. 13 .786/2018; Código de Defesa do Consumidor, arts. 6º, IV, e 51, IV. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 1 .300.418/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j . 13.11.2013, DJe 10.12 .2013; STJ, AgRg no AREsp 803.290/DF, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j . 27.06.2017, DJe 01.08 .2017; Súmula 543/STJ. (TJ-MT - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL: 10102360220238110003, Relator.: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 16/04/2025, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/04/2025) Destaquei (...) 2 . É sedimentado entendimento que considera razoável, em rescisão de contrato de compra e venda de imóvel a pedido do comprador, que o percentual de retenção pelo vendedor de parte das prestações pagas seja arbitrado entre 10% e 25%, conforme as circunstâncias de cada caso, avaliando-se os prejuízos suportados. 3. Em se tratando de lote não edificado e inexistindo proveito econômico proporcionado pelo terreno, não há se falar em taxa de fruição. 4 . Ocorrida a rescisão contratual e o retorno ao status quo ante, o imóvel volta ao patrimônio da vendedora, não é cabível a retenção de valores a título de IPTU, que constitui tributo de natureza propter rem. 5. O termo inicial dos juros moratórios, conforme o julgamento do REsp 1740911/DF, pelo rito de repetitivo – Tema 1002, na rescisão do contrato de compra e venda imotivada pelo comprador, incide a partir do trânsito em julgado da decisão, e não da citação. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10220114820228110003, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 25/06/2024, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/06/2024) Destaquei No presente caso, considerando que se trata de lote não edificado, sem comprovação de que o Apelante tenha exercido qualquer fruição sobre o bem e levando em conta os princípios da proporcionalidade e da vedação do enriquecimento sem causa, entendo razoável fixar o percentual de retenção em 15% sobre o montante pago pelo promitente-comprador, devendo a diferença ser-lhe restituída de forma simples, com correção monetária pelo INPC até 30/08/2024 e, após, pela taxa SELIC de forma isolada, com juros de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado, conforme definido no TEMA 1002. Destaco que o direito à rescisão contratual com restituição parcial dos valores pagos encontra amparo não apenas na legislação consumerista, mas também nos princípios fundamentais que regem as relações contratuais, notadamente a função sociais do contrato (art. 421, do Código Civil), o equilíbrio contratual e a boa-fé objetiva (art. 422, do Código Civil). Esclareço, por fim, que a cobrança de IPTU somente pode ser atribuída ao promitente-comprador se comprovada a posse do imóvel, o que não ocorreu nos autos, devendo o encargo permanecer com a promitente-vendedora. Por tais motivos, necessária a reforma da sentença, principalmente diante da vontade expressa do adquirente, não havendo impedimento legal para tanto. Posto isso, DOU PROVIMENTO ao recurso interposto por WELLINTON DE LIMA MONGE, para: a) Reformar a sentença e julgar procedente o pedido de rescisão contratual, rescindido o contrato celebrado entre as partes, com fundamento na ausência de registro da alienação fiduciária e na inaplicabilidade da Lei nº 9514/97; b) Determinar a restituição ao Apelante de 85% dos valores por ele pagos à Apelada, devidamente corrigidos pelo INPC até 30/08/2024 e, após, pela taxa SELIC de forma isolada, com juros de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado; c) Inverte-se o ônus da sucumbência, condenando-se a parte apelada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que ora fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025
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