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Processo nº 1002770-68.2022.8.11.0042

ID: 260116440

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1002770-68.2022.8.11.0042

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

ADRIANO GONCALVES ARAUJO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO MARLON GIMENEZ BARBOSA

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WAGNER ROGERIO NEVES DE SOUZA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002770-68.2022.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Roubo Majorado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002770-68.2022.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Roubo Majorado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), ADRIANO GONCALVES ARAUJO - CPF: 010.681.421-46 (APELANTE), JOAO MARLON GIMENEZ BARBOSA - CPF: 025.671.792-32 (ADVOGADO), WAGNER ROGERIO NEVES DE SOUZA - CPF: 630.396.051-00 (ADVOGADO), ADELSON MARTINS DE SOUZA - CPF: 243.186.711-00 (VÍTIMA), CLEBER RAVAZZI CALIXTO DA SILVA - CPF: 256.385.558-62 (ADVOGADO), LINDEBERGUE JOAQUIM - CPF: 050.557.578-76 (ADVOGADO), EDNA MACIEL PROVENZANO SOUZA - CPF: 345.294.111-68 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ANTONIEL DE ARAUJO - CPF: 002.003.571-31 (TERCEIRO INTERESSADO), ODINEY DE SOUZA FERRARETTO - CPF: 843.651.371-15 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. CONCURSO DE PESSOAS, EMPREGO DE ARMA DE FOGO E RESTRIÇÃO DA LIBERDADE DAS VÍTIMAS. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA QUANTO À AUTORIA. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. ABSOLVIÇÃO. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. O Apelante foi condenado pela prática do crime de roubo majorado (art. 157, § 2º, II e V, e § 2º-A, I, do Código Penal), à pena de 08 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 17 dias-multa. A condenação se fundamentou em provas indiretas que, segundo a defesa, não seriam suficientes para comprovar sua participação na ação criminosa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão controvertida consiste em verificar se há provas suficientes para sustentar a condenação do Apelante ou se, diante da ausência de elementos concretos que o vinculem ao crime, deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. As provas produzidas, incluindo depoimentos das vítimas, declarações dos investigadores e relatórios de quebra de sigilo de dados, não foram capazes de colocar o Apelante no local do crime de forma inequívoca, tampouco de demonstrar sua participação direta na ação delitiva. 4. As vítimas não realizaram reconhecimento pessoal dos autores, pois os criminosos estavam encapuzados. O monitoramento eletrônico do Apelante esteve inativo no dia dos fatos, mas essa circunstância, isoladamente, não comprova sua presença no local do crime. 5. A conversa interceptada entre os corréus, mencionando o Apelante e o veículo utilizado no crime, ocorreu mais de um mês após os fatos, sem indicar sua participação direta no roubo em questão. 6. Diante da inexistência de provas cabais de autoria, impõe-se a absolvição do Apelante, evitando-se condenação baseada em meras conjecturas e em atenção ao princípio do in dubio pro reo. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso provido. Tese de julgamento: “1. A condenação criminal exige provas seguras e inequívocas da autoria, não sendo admissível a mera suposição ou presunção. 2. Diante da insuficiência probatória, impõe-se a absolvição com base no princípio do in dubio pro reo.” Dispositivos relevantes citados: Código Penal, art. 157, § 2º, II e V, e § 2º-A, I; Código de Processo Penal, art. 386, VII. Jurisprudência relevante citada: STF, RHC 127258/PE, Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, j. 19/05/2015; TJ-MT, Apelação Criminal 0022836-04.2013.8.11.0042, j. 27/02/2024; TJ-MT, Apelação Criminal 10200354320218110002, Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho, j. 27/09/2023. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Criminal interposto, a tempo e modo, por Adriano Gonçalves de Araújo, contra sentença anexada em ID. 211270158, em que foi condenado como autor do crime de Roubo Majorado pelo Concurso de Pessoas, Restrição da Liberdade da Vítima e Uso de Arma de Fogo (art. 157, § 2º, incisos II e V e §2°-A, I, do Código Penal), à pena de 08 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 17 dias-multa. Em suas razões recursais (ID. 222042181), o apelante postulou a absolvição, argumentando, para tanto, a ausência de prova cabal de autoria e participação delitiva, vez que não foi reconhecido pelas vítimas. Argumentou, ainda, a inexistência de res furtiva em sua posse, afastando qualquer vinculação com o fato, bem como a ausência de prova pericial objetiva que o coloque no local do crime, além da alegação de que seu nome teria sido citado apenas em conversas entre os corréus, sem qualquer confirmação da autoria delitiva. Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (Id. 226366691). Por seu turno, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer, opinou pelo desprovimento do apelo (Id. 229579681), conforme respectivo sumário que segue transcrito: “Sumário: Acusado condenado nas penas do artigo 157, § 2º, incisos II e V e §2°-A, I, do Código Penal, a pena de 08 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão e 17 dias-multa, em regime fechado - A defesa requer a absolvição, por insuficiência de provas - Alegações improcedentes - Absolvição – Prova bastante a sustentar o édito condenatório – Autoria comprovada exaustivamente nos autos – Depoimentos coerentes e seguros - Pelo desprovimento do recurso.” É o Relatório. À d. revisão. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara; De acordo com os autos, que no dia 20.08.2021, por volta das 05h30min, na residência particular localizada aos fundos da loja Poesy Kids, na Av. 15 de Novembro, Bairro do Porto, Cuiabá/MT, Antoniel de Araújo, vulgo “Pezão”, Adriano Gonçalves Araújo e Odiney de Souza Ferraretto, vulgo “Nick”, previamente ajustados, com divisão de tarefas e unidade de desígnios, com uso de arma de fogo e restrição da liberdade das vítimas, subtraíram para si, coisa alheia móvel consistente em diversas joias, (anéis, correntes, relógios, etc.) avaliadas em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) em dinheiro, além de dois celulares da marca Samsung, modelo S 10 e uma televisão LED, de 32 polegadas, pertencentes as vítimas Adelson Martins de Souza e Edna Maciel Provenzano. Por essa razão, eles foram denunciados como incursos na sanção do art. 157, § 2º, incisos II e V, § 2º-A, inciso I, em concurso formal por serem duas vítimas, observando o artigo 91, inciso I, todos do Código Penal. Na decisão de ID. 211268285, foi determinado o desmembramento do processo em relação ao corréu Odiney S. Ferraretto, em razão de sua revelia. Da mesma forma, determinou-se o desmembramento do feito em relação a Adriano Gonçalves Araújo, uma vez que este se encontra em liberdade, enquanto há, nos autos, réu preso, medida adotada para garantir a celeridade processual e a observância ao princípio da razoável duração do processo. Após a instrução processual, o juízo de primeiro grau entendeu por condená-lo como autor dos crimes previstos no art. 157, § 2º, incisos II e V e §2°-A, I, do Código Penal, à pena de 08 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 17 dias-multa, sentença contra a qual apresenta recurso visando à sua reforma. Assim passo a análise recursal. Inicialmente, antes de adentrar à análise do mérito recursal, consigno que, após reexame da matéria, revi meu posicionamento e, por essa razão, retrato-me da decisão proferida em ID. 255805683, na qual indeferi o pedido de retirada do primeiro advogado (Dr. Wagner Rogério Neves de Souza) dos autos. Isso porque, em estudo mais aprofundado sobre o tema, constatei que o Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento no sentido de que a constituição de novo mandatário implica a revogação tácita do mandato anterior. Senão vejamos: “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CONSTITUIÇÃO DE NOVO PROCURADOR, SEM RESSALVA DO MANDATO ANTERIOR. REVOGAÇÃO TÁCITA. INTIMAÇÃO DE ADVOGADA QUE NÃO MAIS PATROCINAVA A DEFESA DA RÉ PARA A SESSÃO DE JULGAMENTO DA APELAÇÃO . NULIDADE DO JULGAMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. A constituição de novo advogado para atuar na causa, sem ressalva ou reserva de poderes, representa revogação tácita do mandato anteriormente concedido . Desse modo, é de se reconhecer a nulidade da intimação da sessão de julgamento da apelação, sobretudo se considerada a existência de pedido expresso para que as intimações fossem feitas em nome do novo causídico. Precedentes. 2. Recurso ordinário provido, em parte.” (STF - RHC: 127258 PE - PERNAMBUCO 8622024-20.2015.1.00 .0000, Relator.: Min. TEORI ZAVASCKI, Data de Julgamento: 19/05/2015, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-102 01-06-2015) Conforme se verifica nos autos, a apelação foi interposta tempestivamente pelo primeiro advogado, com pedido de apresentação das razões perante esta Corte Superior. No entanto, na petição de habilitação registrada sob ID. 211270185, datada de 17/04/2024, antes mesmo da remessa dos autos a esta Segunda Instância, o Dr. João Marlon Gimenez Barbosa apresentou procuração nos autos, sem qualquer ressalva ou reserva de poderes, assumindo, assim, a defesa exclusiva do Apelante. Dessa forma, apenas as razões recursais constantes do ID. 222042181 podem ser consideradas válidas, motivo pelo qual delas tomo conhecimento. Busca-se a absolvição do Apelante, sob o argumento da ausência de provas quanto à autoria e participação delitiva. Ao examinar detidamente os autos, verifico que, apesar da notória dedicação e zelo do juízo de primeiro grau, a decisão proferida não se revela a mais adequada, impondo-se a sua revisão por esta Corte de Segundo Grau, vez que em observância ao princípio do in dubio pro reo, ante a ausência de provas concretas que vinculem o Apelante à ação delitiva, necessária a declaração de sua absolvição, conforme bem fundamentado pela defesa. Explico. Embora o juízo singular tenha considerado que o conjunto probatório – composto pelos depoimentos das vítimas, declarações dos investigadores da Polícia Civil e relatório de quebra de sigilo de dados – evidenciaria a participação do Apelante, constata-se que nenhum desses elementos, de fato, o coloca no local do crime ou o aponta de maneira inequívoca como autor do delito. As vítimas, Adelson Martins de Souza e Edna Maciel Provenzano, foram claras ao descrever toda a ação criminosa, relatando que dois indivíduos invadiram a residência, fizeram-nos reféns e mantiveram comunicação com um terceiro que estaria do lado de fora da casa. Também descreveram detalhadamente os objetos subtraídos pelos invasores. Entretanto, foram enfáticas ao afirmar que não poderiam realizar o reconhecimento dos autores, pois os dois indivíduos que ingressaram na residência estavam com os rostos cobertos por máscaras e usavam bonés. Os investigadores da Polícia Civil, Luiz Cláudio Torquato da Silva e Marcelo Grossi Meira, informaram que empreenderam diligências para desvendar o crime e que câmeras de segurança captaram os dois invasores fugindo da residência em um veículo Ford Fiesta, de cor prata, seguido por um Renault Logan. Apurou-se que o veículo Renault Logan pertencia à esposa do corréu Antoniel e, ao chegarem à residência deste, o Ford Fiesta foi encontrado estacionado em frente ao imóvel. Durante as investigações, os agentes consultaram o sistema de monitoramento eletrônico e constataram que o apelante Adriano esteve no local um dia antes dos fatos. No entanto, verificaram que o sinal de monitoramento permaneceu inativo por 24 horas, impossibilitando a localização exata do recorrente no dia do crime. Na busca e apreensão realizada na residência de Antoniel, foram localizadas diversas joias, sendo algumas reconhecidas pelas vítimas. O investigador Maxell José Pereira auxiliou na quebra de sigilo telemático e identificou mensagens trocadas entre os corréus Antoniel e Odiney, nas quais mencionavam que o Ford Fiesta estava “cheio de B.O.” e que Adriano estava “ferrado” por ter usado o veículo. Todavia, ao analisar o Relatório Técnico nº 061/NI-DERF-CBA (Pág. 140/152), verifica-se que a referida conversa ocorreu em 27/09/2021, mais de um mês após os fatos em análise, não sendo possível extrair qualquer elemento que vincule diretamente o Apelante à prática delitiva investigada nestes autos. É fato que, ao longo das investigações, o veículo Ford Fiesta foi vinculado a outros crimes, inclusive com indícios de participação do Apelante, conforme consignado no Relatório de Pág. 28/33 – PDF e na quebra de sigilo de dados telemáticos. Contudo, o que se analisa nos presentes autos são os fatos ocorridos no dia 20/08/2021, em prejuízo das vítimas Adelson Martins de Souza e Edna Maciel Provenzano, sendo que não há elementos concretos que vinculem o Apelante à prática específica desse crime. As vítimas não realizaram o reconhecimento dos autores do crime, e o relatório de quebra de sigilo telemático apenas identificou uma conversa travada mais de um mês após os fatos, vinculando o Apelante ao veículo utilizado no delito, mas sem confirmar sua autoria ou participação direta na ação criminosa. Além disso, as declarações dos agentes policiais não trouxeram elementos objetivos que pudessem indicar, de forma inequívoca, o envolvimento do Apelante na prática delitiva. O simples fato de o Apelante ter estado na residência do corréu no dia anterior ao crime e de seu monitoramento eletrônico ter ficado sem sinal não são elementos suficientes para atribuir-lhe a autoria delitiva. Ademais, no interrogatório judicial, o Apelante negou peremptoriamente qualquer participação no crime, afirmando que conhecia o corréu Antoniel e que costumava passar pela rua onde ele reside. Alegou, ainda, que no dia dos fatos estava em uma festa, o que teria causado a interrupção do sinal da tornozeleira eletrônica, e que estava acompanhado de sua então namorada. Embora o Apelante não tenha produzido prova concreta de seu álibi, na forma do art. 156 do Código de Processo Penal, que dispõe que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer", também se observa que a acusação não conseguiu apresentar provas robustas e inequívocas que o vinculem diretamente à prática criminosa em questão. Cumpre ressaltar que, para uma condenação na esfera penal, não se admite mera conjectura ou simples presunção de culpa. É imprescindível que a autoria e a materialidade sejam comprovadas de maneira cabal e incontestável, sob pena de violação ao princípio do in dubio pro reo. Diante da ausência de certeza quanto à autoria do crime, a absolvição do Apelante se impõe, evitando-se uma condenação indevida e potencialmente injusta. Nesse sentido, este e. Tribunal de Justiça: “APELAÇÃO CRIMINAL – HOMICÍDIO CULPOSO PRATICADO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR – PRETENDIDA CONDENAÇÃO – REJEIÇÃO – AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL E TESTEMUNHAS OCULARES – CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA CONDENAÇÃO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O processo penal não autoriza conclusões condenatórias baseadas somente em suposições ou indícios. A prova deve estar clara, escorreita e sem qualquer dúvida a respeito da materialidade e autoria do delito para ensejar sentença condenatória.” (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 0022836-04 .2013.8.11.0042, Relator.: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 27/02/2024, Segunda Câmara Criminal, Data de Publicação: 06/03/2024) “APELAÇÃO CRIMINAL – PORTE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO – CONDENAÇÃO – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – ALMEJADA ABSOLVIÇÃO ANTE A CARÊNCIA DE PROVA JUDICIALIZADA – PROCEDÊNCIA – FULCRO NO ART. 155 DO CPP – ANEMIA PROBATÓRIA – INCIDÊNCIA DO BROCARDO IN DUBIO PRO REO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO, EM DISSONÂNCIA COM O PARECER. Com fulcro no art. 155 do Código de Processo Penal, é inadmissível a condenação criminal baseada, tão somente, em provas inquisitoriais, haja vista a necessidade de confirmação da prova em juízo, sob o crivo do contraditório e ampla defesa, a fim de obter força suficiente para fundamentar uma condenação . Destarte, diante da ausência de prova submetida ao contraditório em juízo, impõe-se a reforma da sentença para absolvê-lo, sob o fundamento do princípio "in dubio pro reo".” (TJ-MT - APR: 10200354320218110002, Relator.: RONDON BASSIL DOWER FILHO, Data de Julgamento: 27/09/2023, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: 06/10/2023) DISPOSITIVO Por todo o exposto, em dissonância com o parecer, DOU PROVIMENTO ao recurso interposto por Adriano Gonçalves de Araújo, para reformar a sentença e, consequentemente, ABSOLVÊ-LO da imputação do crime do art. 157, § 2º, incisos II e V e §2°-A, I, do Código Penal, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 14/04/2025

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Processo nº 1017119-03.2025.8.11.0000

ID: 329766014

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1017119-03.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

THEMYSTOCLES NEY DE AZEVEDO DE FIGUEIREDO REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO THEMYSTOCLES NEY DE AZEVEDO DE FIGUEIREDO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017119-03.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Perdas e Danos, Liminar, Requerimento de … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017119-03.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Perdas e Danos, Liminar, Requerimento de Reintegração de Posse] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [THEMYSTOCLES NEY DE AZEVEDO DE FIGUEIREDO registrado(a) civilmente como THEMYSTOCLES NEY DE AZEVEDO DE FIGUEIREDO - CPF: 004.981.261-02 (ADVOGADO), LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES - CPF: 049.598.201-60 (AGRAVANTE), ATHOS VALADAO DOS SANTOS - CPF: 435.017.698-57 (AGRAVADO), ROSINEI PROCOPE VIEIRA DE SOUZA - CPF: 041.355.721-97 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. TUTELA DE URGÊNCIA. REINTEGRAÇÃO DE POSSE LIMINAR. POSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: Agravo de Instrumento interposto contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Sapezal/MT, nos autos da Ação de Resolução Contratual c/c Pedido de Reintegração de Posse e Perdas e Danos, que deferiu a tutela de urgência para reintegrar o autor na posse de imóvel urbano situado no condomínio Royal Boulevard, Município de Sapezal, diante do inadimplemento do contrato de compra e venda celebrado entre as partes. O Agravante alegou violação ao contraditório, ausência de prova inequívoca do inadimplemento e impossibilidade de desocupação liminar de imóvel residencial sem decisão judicial prévia. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: Há duas questões em discussão: (i) definir se é admissível a reintegração de posse liminar com base em cláusula resolutiva expressa por inadimplemento contratual, sem prévia ação de resolução judicial; (ii) verificar se a decisão agravada violou o contraditório e o devido processo legal. III. RAZÕES DE DECIDIR: A cláusula resolutiva expressa, nos termos do art. 474 do Código Civil, opera de pleno direito, dispensando pronunciamento judicial prévio para sua eficácia em caso de inadimplemento, desde que comprovada a mora. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.789.863/MS) reconhece a possibilidade de reintegração de posse fundada em cláusula resolutiva expressa, desde que haja notificação do devedor e ausência de purgação da mora. Os documentos acostados aos autos — contrato, notificações extrajudiciais e comunicação da instituição financeira sobre inadimplência — demonstram, em sede de cognição sumária, o inadimplemento e o descumprimento contratual pelo Agravante. O perigo de dano decorre da impossibilidade de fruição do bem pelo autor e dos prejuízos suportados pelo proprietário registral, terceiro afetado pelo inadimplemento. Não restou comprovada, pelo Agravante, a adimplência contratual ou a natureza residencial da ocupação do imóvel, tampouco a alegada violação ao contraditório, haja vista a possibilidade de discussão plena no curso da ação principal. A pactuação da cláusula resolutiva expressa é legítima e vincula as partes, nos termos da autonomia da vontade e do princípio do pacta sunt servanda, previstos nos arts. 421 e 422 do Código Civil. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso desprovido. Tese de julgamento: A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito, permitindo a reintegração de posse liminar quando comprovado o inadimplemento e a mora do comprador, ainda que sem ação judicial específica de resolução contratual. A tutela de urgência pode ser concedida para reintegração de posse em caso de inadimplemento contratual, desde que presentes os requisitos do art. 300 do CPC e demonstrado o esbulho possessório. A ausência de contraditório prévio na concessão da tutela de urgência não configura ilegalidade quando presentes os requisitos legais e garantida a possibilidade de contradita no curso do processo. Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 421, 422, 474 e 397; CPC, art. 300. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.789.863/MS, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 10.08.2021, DJe 04.10.2021; TJ/MT, RAI 10157065720228110000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 07.12.2022, DJe 13.12.2022; TJ/MT, AgInt 10274224720238110000, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 06.03.2024, DJe 11.03.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Agravo de Instrumento interposto por LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES, contra a decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Sapezal/MT, que, nos autos da Ação de Resolução Contratual c/c Pedido de Reintegração de Posse e Perdas e Danos n.º 1002770-86.2024.8.11.0078, ajuizada por ATHOS VALADÃO DOS SANTOS, deferiu o pedido de tutela de urgência para reintegrar o Agravado na posse do bem imóvel correspondente ao Lote urbano sob o n. 23 da quadra n. 02, com a área privativa de 300,13m², localizado no condomínio Royal Boulevard no Município de Sapezal, objeto da matrícula n. 6.199, do CRI de Sapezal. Assevera o Agravante, em síntese, que a decisão agravada foi proferida em afronta ao contraditório e ao devido processo legal, visto que não teve oportunidade de juntar aos autos os comprovantes e a contranotificação que possui. Sustenta que não há nos autos prova inequívoca da inadimplência, pois o contrato é complexo, com cláusulas envolvendo veículos, financiamento e pagamentos indiretos, bem como sustenta que o despejo do imóvel em que reside com sua família é medida irreversível. Salienta que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça veda a desocupação liminar de imóvel residencial sem oitiva prévia e fundamentação excepcional. Ademais, realça que embora o contrato contenha cláusula resolutiva, sua eficácia exige declaração judicial de resolução, o que ainda não ocorreu. Afirma que a reintegração de posse com base em inadimplemento contratual exige prévia resolução judicial do contrato, sob pena de ofensa ao devido processo legal. Com essas considerações, requer a concessão de efeito suspensivo ao presente Agravo para que seja suspensa a r. decisão que deferiu a reintegração do Agravado na posse do bem imóvel. No mérito, pleiteia o integral provimento do recurso com a revogação da tutela de urgência concedida em primeira instância e consequente manutenção do Agravante no imóvel objeto da ação. Preparo devidamente recolhido (ID 289351354). O efeito suspensivo vindicado foi indeferido (ID 290217879). Devidamente intimado, o Agravado apresentou contraminuta ao Agravo, requerendo o desprovimento recursal (ID 295898440). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se, na origem, de Ação de Resolução Contratual c/c Pedido de Reintegração de Posse e Perdas e Danos, ajuizada por ATHOS VALADÃO DOS SANTOS, em face de LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES, sustentando o autor que celebrou com o requerido, ora Agravante, contrato particular de compra e venda de dois imóveis urbanos, quais sejam, o lote n. 23, quadra n. 02 e a unidade habitacional n. 22, quadra n. 02, ambos com área privativa de 300,13m², pelo valor inicia de R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais), o qual foi reduzido para R$ 900.000,00 (novecentos mil reais) tendo em vista a resolução contratual sobre um dos imóveis. Sustentou que do montante total foram pagos pelo requerido apenas o valor de R$ 82.500,00 (oitenta e dois mil e quinhentos reais), ficando o restante em situação de inadimplência, abrangendo, inclusive, parcelas de financiamento que o devedor se obrigou a efetuar o pagamento, conforme cláusulas contratuais firmadas, contudo, não realizou. A inicial do processo de origem foi instruída com cópia do contrato firmado entre as partes, comprovantes de pagamento, notificações extrajudiciais e documentos pessoais. Ao deferir o pedido de tutela de urgência postulado na exordial para reintegrar o Agravado na posse do bem imóvel n. 23 da quadra n. 02, com a área privativa de 300,13m², o Magistrado de origem assim fundamentou: “(...) Em análise aos documentos colacionados, verifico que o pleito a título de tutela de urgência merece acolhimento. Na situação em apreço, a parte autora pugna pela reintegração na posse do imóvel em virtude do descumprimento das cláusulas contratuais firmadas e em indícios de que o devedor é contumaz na prática de estelionatos, visando coibir a prática de atos fraudulentos no imóvel objeto da venda até o julgamento final da ação. Pois bem. A parte requerente demonstrou que pactuou com o requerido a venda do imóvel descrito, alicerçando a inicial com contrato de compra e venda devidamente assinado, com a expressa disposição de cláusula resolutiva, na qual prevê a resolução do contrato e restituição do imóvel em caso de inadimplência do devedor, conforme id. 179624206. Ademais, há indícios de que o requerido deixou de adimplir as parcelas e demais condições previstas no pacto firmado, conforme evidenciam os comunicados emitidos pela instituição financeira responsável, noticiando o inadimplemento das prestações vinculadas ao financiamento incidente sobre o bem, conforme IDs 179624225 e 179624226. Tal circunstância motivou o envio de notificação extrajudicial ao devedor, consoante se observa do documento constante no ID 179624207. Outrossim, no que tange ao requisito do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, entendo que restou demonstrado, haja vista que o financiamento fora celebrado junto à Caixa Econômica Federal, estando em nome de terceiro — proprietário registral do imóvel — o qual, ao que tudo indica, vem suportando os prejuízos decorrentes da inadimplência atribuída ao requerido. Além disso, em sede de cognição sumária, verifica-se que o autor vem experimentando prejuízos de ordem material, tanto pela ausência de recebimento do valor integralmente ajustado quanto pela impossibilidade de fruição do bem cuja posse busca reaver, nos moldes estabelecidos no contrato celebrado entre as partes. De igual forma, vislumbra-se existente tal requisito, posto que consoante teor dos documentos, o requerido é réu em ações penais que investigam a prática de estelionato, de modo que a tutela almejada visa obstar eventual alienação do bem a terceiros. (...) Por todo o exposto, ante o preenchimento dos requisitos, DEFIRO o pedido de tutela de urgência postulado na exordial, para reintegrar o autor na posse do bem imóvel correspondente ao Lote urbano sob o n. 23 (vinte e três) da quadra n. 02 (dois), com a área privativa de 300,13m² (trezentos metros quadrados), localizado no condomínio Royal Boulevard no Município de Sapezal, objeto da matrícula n. 6.199, do CRI de Sapezal.” Pois bem. Cediço que em sede de Agravo de Instrumento cumpre tão somente analisar se houve acerto ou desacerto da decisão atacada. In casu, a decisão impugnada foi devidamente baseada na inadimplência das parcelas e demais condições previstas no contrato de compra e venda, bem como nos prejuízos de ordem material enfrentados pelo Agravado, tanto pela ausência de recebimento do valor integralmente ajustado quanto pela impossibilidade de fruição do bem cuja posse busca reaver. Ademais, a partir da detida análise dos autos, constata-se que o contrato entabulado entre as partes contém cláusula resolutiva expressa (Cláusula Terceira), estipulando o seguinte: “Em consequência do acima pactuado, se o COMPRADOR não efetuar o pagamento TOTAL dos valores devidos e transferência dos veículos, o presente instrumento considerar-se-á rescindido de pleno direito, ficando o COMPRADOR constituído em mora e obrigado a restituir imediatamente os imóveis adquiridos, ficando o vendedor isento de devolver quaisquer valores já pagos pelo comprador”. Em relação à cláusula resolutiva, prescreve o art. 474 do CPC que a cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito, enquanto a tácita depende de interpelação judicial. Além disso, o c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.789.863/MS, decidiu pela inexistência de óbice para a aplicação de eventual cláusula resolutiva expressa em instrumento particular de compra e venda, para fins de reintegração de posse do bem mesmo antes da rescisão do pacto, nas hipóteses em que, mesmo após notificado/interpelado o compromissário comprador inadimplente, não ocorra a purgação da mora, veja-se: “RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RURAL COM CLÁUSULA DE RESOLUÇÃO EXPRESSA - INADIMPLEMENTO DO COMPROMISSÁRIO COMPRADOR QUE NÃO EFETUOU O PAGAMENTO DAS PRESTAÇÕES AJUSTADAS - MORA COMPROVADA POR NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL E DECURSO DO PRAZO PARA A PURGAÇÃO - INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE JULGARAM PROCEDENTE O PEDIDO REINTEGRATÓRIO REPUTANDO DESNECESSÁRIO O PRÉVIO AJUIZAMENTO DE DEMANDA JUDICIAL PARA A RESOLUÇÃO CONTRATUAL - INSURGÊNCIA DO DEVEDOR - RECLAMO DESPROVIDO. Controvérsia: possibilidade de manejo de ação possessória fundada em cláusula resolutiva expressa decorrente de inadimplemento de contrato de compromisso de compra e venda imobiliária, sem que tenha sido ajuizada, de modo prévio ou concomitante, demanda judicial objetivando rescindir o ajuste firmado. (...) Inexiste óbice para a aplicação de cláusula resolutiva expressa em contratos de compromisso de compra e venda, porquanto, após notificado/interpelado o compromissário comprador inadimplente (devedor) e decorrido o prazo sem a purgação da mora, abre-se ao compromissário vendedor a faculdade de exercer o direito potestativo concedido pela cláusula resolutiva expressa para a resolução da relação jurídica extrajudicialmente. Impor à parte prejudicada o ajuizamento de demanda judicial para obter a resolução do contrato quando esse estabelece em seu favor a garantia de cláusula resolutória expressa, é impingir-lhe ônus demasiado e obrigação contrária ao texto expresso da lei, desprestigiando o princípio da autonomia da vontade, da não intervenção do Estado nas relações negociais, criando obrigação que refoge o texto da lei e a verdadeira intenção legislativa. (...)” (REsp n. 1.789.863/MS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. em 10/8/2021, DJe de 4/10/2021) Esse entendimento tem sido reafirmado de forma consistente por este Sodalício, como se observa nos seguintes julgados: “TUTELA CAUTELAR EM CARÁTER ANTECEDENTE – DESCABIMENTO DO AGRAVO E PRECLUSÃO CONSUMATIVA – PRELIMINARES AFASTADAS – RESCISÃO DE CONTRATO DE CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE SUPERFÍCIE C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – DESCUMPRIMENTO DA LIMINAR ANTERIOR – REINTEGRAÇÃO NA POSSE DIRETA DO IMÓVEL – INADIMPLEMENTO CONTRATUAL – CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA – PRESENÇA DOS REQUISITOS ENSEJADORES – ART. 300, CPC – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO – AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. In casu, a decisão ora recorrida deferiu o pedido de reintegração direta da posse, ante o descumprimento da decisão liminar anteriormente deferida, não havendo o que se falar em descabimento do recurso, tampouco em preclusão consumativa. A presença da probabilidade do direito, do perigo de dano e risco de resultado útil do processo (art. 300, CPC), são pressupostos que devem estar presentes para a concessão de tutela de urgência. In casu, o requerente demonstrou o inadimplemento contratual por parte dos superficiários, ante a exploração da área da superfície por terceiros, sem autorização do proprietário. Além disso, restou evidenciado o descumprimento contratual também no tocante à falta de contratação do seguro garantia, e na ausência de pagamento da parcela devida a título de remuneração da superfície. Diante do inadimplemento da remuneração da superfície, o próprio contrato autoriza ao proprietário reaver o bem objeto de concessão de direito real de superfície, sobretudo considerando a mora ex re. Não há óbice para a aplicação da cláusula resolutiva expressa em caso de inadimplemento contratual, possibilitando ao proprietário exercer o direito potestativo de resolução da relação jurídica.” (TJ/MT. RAI 10157065720228110000. Relator Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado. Julgamento: 07/12/2022, DJe: 13/12/2022) (g.n.) “AGRAVO INTERNO – DECISÃO MONOCRÁTICA EM SEDE LIMINAR EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS – TUTELA DE URGÊNCIA DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA NA ORIGEM – REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC PRESENTES – CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – CLÁUSULA RESOLUTÓRIA EXPRESSA – INADIMPLEMENTO DO CONTRATO – MORA EX RE – EXPRESSA POSSIBILIDADE DE RETOMADA DO IMÓVEL – CONSEQUENTE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Presentes os requisitos do art. 300 do CPC, eis que demonstrado o inadimplemento contratual da parte requerida agravada, a existência de cláusula contratual resolutória expressa baseada em mora ex re, a possibilidade de reaver o imóvel e o periculum in mora. (...) As provas coligidas aos autos de origem demonstram que o requerido agravado não adimpliu com nenhum valor, restando evidenciado o descumprimento contratual. Diante da comprovação, prima facie, do inadimplemento, o próprio contrato traz expressa cláusula resolutiva, autorizando o vendedor a reaver o imóvel. Não há óbice para a aplicação da cláusula resolutiva expressa em caso de inadimplemento contratual, a qual viabiliza o proprietário a exercer o direito potestativo de resolução da relação jurídica, mormente porque, nos termos do art. 474 do Código Civil, a cláusula resolutiva expressa se opera de pleno direito. Despicienda a notificação pessoal da parte requerida agravada para fins de constituição em mora e conseguinte rescisão contratual, isso porque a mora no caso vertente é ex re, na forma do art. 397 do Código Civil, consoante se infere da redação do § 2º da cláusula 10ª do contrato. (...). A posse do agravado e de terceiros está maculada de vício bastante a autorizar o deferimento da liminar de reintegração de posse, sobretudo porque presentes a posse anterior do agravante, comprovada por meio do instrumento contratual e o esbulho praticado, sendo indiferente se tratar de posse nova ou velha, posto que os prejuízos suportados pelo autor denotam a patente existência do periculum in mora. (...).” (TJ/MT. AgInt 10274224720238110000. Relator Des. DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado. Julgamento: 06/03/2024, DJe: 11/03/2024) (g.n.) No caso em análise, restou incontroverso que o Agravante se tornou inadimplente e, embora sustente possuir diversos comprovantes de pagamento que não foram colacionados na inicial, não foram juntados neste recurso elementos que indiquem a suposta adimplência, tampouco documentos que possam comprovar que o imóvel se trata, de fato, da residência do Agravante. Ademais, ressalta-se que a pactuação da cláusula resolutiva decorre do livre exercício da autonomia privada das partes, sendo ambas maiores, capazes e plenamente conscientes das condições contratuais ajustadas. O princípio do pacta sunt servanda, consagrado nos artigos 421 e 422 do Código Civil,impõe que os contratos sejam cumpridos na exata medida em que foram ajustados, ressalvadas hipóteses excepcionais que legitimem a intervenção judicial para restabelecer o equilíbrio contratual, o que não é o caso. Assim, a partir de todas essas considerações, entendo que não há nenhum desacerto ou ilegalidade a permitir a reforma da decisão combatida. Ante o exposto, conheço do recurso interposto e LHE NEGO PROVIMENTO, mantendo incólume a r. decisão combatida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1017119-03.2025.8.11.0000

ID: 329766026

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1017119-03.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ATHOS VALADAO DOS SANTOS

Acórdão

Advogados:

ROSINEI PROCOPE VIEIRA DE SOUZA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017119-03.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Perdas e Danos, Liminar, Requerimento de … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017119-03.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Perdas e Danos, Liminar, Requerimento de Reintegração de Posse] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [THEMYSTOCLES NEY DE AZEVEDO DE FIGUEIREDO registrado(a) civilmente como THEMYSTOCLES NEY DE AZEVEDO DE FIGUEIREDO - CPF: 004.981.261-02 (ADVOGADO), LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES - CPF: 049.598.201-60 (AGRAVANTE), ATHOS VALADAO DOS SANTOS - CPF: 435.017.698-57 (AGRAVADO), ROSINEI PROCOPE VIEIRA DE SOUZA - CPF: 041.355.721-97 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. TUTELA DE URGÊNCIA. REINTEGRAÇÃO DE POSSE LIMINAR. POSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: Agravo de Instrumento interposto contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Sapezal/MT, nos autos da Ação de Resolução Contratual c/c Pedido de Reintegração de Posse e Perdas e Danos, que deferiu a tutela de urgência para reintegrar o autor na posse de imóvel urbano situado no condomínio Royal Boulevard, Município de Sapezal, diante do inadimplemento do contrato de compra e venda celebrado entre as partes. O Agravante alegou violação ao contraditório, ausência de prova inequívoca do inadimplemento e impossibilidade de desocupação liminar de imóvel residencial sem decisão judicial prévia. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: Há duas questões em discussão: (i) definir se é admissível a reintegração de posse liminar com base em cláusula resolutiva expressa por inadimplemento contratual, sem prévia ação de resolução judicial; (ii) verificar se a decisão agravada violou o contraditório e o devido processo legal. III. RAZÕES DE DECIDIR: A cláusula resolutiva expressa, nos termos do art. 474 do Código Civil, opera de pleno direito, dispensando pronunciamento judicial prévio para sua eficácia em caso de inadimplemento, desde que comprovada a mora. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.789.863/MS) reconhece a possibilidade de reintegração de posse fundada em cláusula resolutiva expressa, desde que haja notificação do devedor e ausência de purgação da mora. Os documentos acostados aos autos — contrato, notificações extrajudiciais e comunicação da instituição financeira sobre inadimplência — demonstram, em sede de cognição sumária, o inadimplemento e o descumprimento contratual pelo Agravante. O perigo de dano decorre da impossibilidade de fruição do bem pelo autor e dos prejuízos suportados pelo proprietário registral, terceiro afetado pelo inadimplemento. Não restou comprovada, pelo Agravante, a adimplência contratual ou a natureza residencial da ocupação do imóvel, tampouco a alegada violação ao contraditório, haja vista a possibilidade de discussão plena no curso da ação principal. A pactuação da cláusula resolutiva expressa é legítima e vincula as partes, nos termos da autonomia da vontade e do princípio do pacta sunt servanda, previstos nos arts. 421 e 422 do Código Civil. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso desprovido. Tese de julgamento: A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito, permitindo a reintegração de posse liminar quando comprovado o inadimplemento e a mora do comprador, ainda que sem ação judicial específica de resolução contratual. A tutela de urgência pode ser concedida para reintegração de posse em caso de inadimplemento contratual, desde que presentes os requisitos do art. 300 do CPC e demonstrado o esbulho possessório. A ausência de contraditório prévio na concessão da tutela de urgência não configura ilegalidade quando presentes os requisitos legais e garantida a possibilidade de contradita no curso do processo. Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 421, 422, 474 e 397; CPC, art. 300. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.789.863/MS, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 10.08.2021, DJe 04.10.2021; TJ/MT, RAI 10157065720228110000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 07.12.2022, DJe 13.12.2022; TJ/MT, AgInt 10274224720238110000, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 06.03.2024, DJe 11.03.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Agravo de Instrumento interposto por LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES, contra a decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Sapezal/MT, que, nos autos da Ação de Resolução Contratual c/c Pedido de Reintegração de Posse e Perdas e Danos n.º 1002770-86.2024.8.11.0078, ajuizada por ATHOS VALADÃO DOS SANTOS, deferiu o pedido de tutela de urgência para reintegrar o Agravado na posse do bem imóvel correspondente ao Lote urbano sob o n. 23 da quadra n. 02, com a área privativa de 300,13m², localizado no condomínio Royal Boulevard no Município de Sapezal, objeto da matrícula n. 6.199, do CRI de Sapezal. Assevera o Agravante, em síntese, que a decisão agravada foi proferida em afronta ao contraditório e ao devido processo legal, visto que não teve oportunidade de juntar aos autos os comprovantes e a contranotificação que possui. Sustenta que não há nos autos prova inequívoca da inadimplência, pois o contrato é complexo, com cláusulas envolvendo veículos, financiamento e pagamentos indiretos, bem como sustenta que o despejo do imóvel em que reside com sua família é medida irreversível. Salienta que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça veda a desocupação liminar de imóvel residencial sem oitiva prévia e fundamentação excepcional. Ademais, realça que embora o contrato contenha cláusula resolutiva, sua eficácia exige declaração judicial de resolução, o que ainda não ocorreu. Afirma que a reintegração de posse com base em inadimplemento contratual exige prévia resolução judicial do contrato, sob pena de ofensa ao devido processo legal. Com essas considerações, requer a concessão de efeito suspensivo ao presente Agravo para que seja suspensa a r. decisão que deferiu a reintegração do Agravado na posse do bem imóvel. No mérito, pleiteia o integral provimento do recurso com a revogação da tutela de urgência concedida em primeira instância e consequente manutenção do Agravante no imóvel objeto da ação. Preparo devidamente recolhido (ID 289351354). O efeito suspensivo vindicado foi indeferido (ID 290217879). Devidamente intimado, o Agravado apresentou contraminuta ao Agravo, requerendo o desprovimento recursal (ID 295898440). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se, na origem, de Ação de Resolução Contratual c/c Pedido de Reintegração de Posse e Perdas e Danos, ajuizada por ATHOS VALADÃO DOS SANTOS, em face de LUIZ RODOLFO BARROS MARQUES, sustentando o autor que celebrou com o requerido, ora Agravante, contrato particular de compra e venda de dois imóveis urbanos, quais sejam, o lote n. 23, quadra n. 02 e a unidade habitacional n. 22, quadra n. 02, ambos com área privativa de 300,13m², pelo valor inicia de R$ 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil reais), o qual foi reduzido para R$ 900.000,00 (novecentos mil reais) tendo em vista a resolução contratual sobre um dos imóveis. Sustentou que do montante total foram pagos pelo requerido apenas o valor de R$ 82.500,00 (oitenta e dois mil e quinhentos reais), ficando o restante em situação de inadimplência, abrangendo, inclusive, parcelas de financiamento que o devedor se obrigou a efetuar o pagamento, conforme cláusulas contratuais firmadas, contudo, não realizou. A inicial do processo de origem foi instruída com cópia do contrato firmado entre as partes, comprovantes de pagamento, notificações extrajudiciais e documentos pessoais. Ao deferir o pedido de tutela de urgência postulado na exordial para reintegrar o Agravado na posse do bem imóvel n. 23 da quadra n. 02, com a área privativa de 300,13m², o Magistrado de origem assim fundamentou: “(...) Em análise aos documentos colacionados, verifico que o pleito a título de tutela de urgência merece acolhimento. Na situação em apreço, a parte autora pugna pela reintegração na posse do imóvel em virtude do descumprimento das cláusulas contratuais firmadas e em indícios de que o devedor é contumaz na prática de estelionatos, visando coibir a prática de atos fraudulentos no imóvel objeto da venda até o julgamento final da ação. Pois bem. A parte requerente demonstrou que pactuou com o requerido a venda do imóvel descrito, alicerçando a inicial com contrato de compra e venda devidamente assinado, com a expressa disposição de cláusula resolutiva, na qual prevê a resolução do contrato e restituição do imóvel em caso de inadimplência do devedor, conforme id. 179624206. Ademais, há indícios de que o requerido deixou de adimplir as parcelas e demais condições previstas no pacto firmado, conforme evidenciam os comunicados emitidos pela instituição financeira responsável, noticiando o inadimplemento das prestações vinculadas ao financiamento incidente sobre o bem, conforme IDs 179624225 e 179624226. Tal circunstância motivou o envio de notificação extrajudicial ao devedor, consoante se observa do documento constante no ID 179624207. Outrossim, no que tange ao requisito do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, entendo que restou demonstrado, haja vista que o financiamento fora celebrado junto à Caixa Econômica Federal, estando em nome de terceiro — proprietário registral do imóvel — o qual, ao que tudo indica, vem suportando os prejuízos decorrentes da inadimplência atribuída ao requerido. Além disso, em sede de cognição sumária, verifica-se que o autor vem experimentando prejuízos de ordem material, tanto pela ausência de recebimento do valor integralmente ajustado quanto pela impossibilidade de fruição do bem cuja posse busca reaver, nos moldes estabelecidos no contrato celebrado entre as partes. De igual forma, vislumbra-se existente tal requisito, posto que consoante teor dos documentos, o requerido é réu em ações penais que investigam a prática de estelionato, de modo que a tutela almejada visa obstar eventual alienação do bem a terceiros. (...) Por todo o exposto, ante o preenchimento dos requisitos, DEFIRO o pedido de tutela de urgência postulado na exordial, para reintegrar o autor na posse do bem imóvel correspondente ao Lote urbano sob o n. 23 (vinte e três) da quadra n. 02 (dois), com a área privativa de 300,13m² (trezentos metros quadrados), localizado no condomínio Royal Boulevard no Município de Sapezal, objeto da matrícula n. 6.199, do CRI de Sapezal.” Pois bem. Cediço que em sede de Agravo de Instrumento cumpre tão somente analisar se houve acerto ou desacerto da decisão atacada. In casu, a decisão impugnada foi devidamente baseada na inadimplência das parcelas e demais condições previstas no contrato de compra e venda, bem como nos prejuízos de ordem material enfrentados pelo Agravado, tanto pela ausência de recebimento do valor integralmente ajustado quanto pela impossibilidade de fruição do bem cuja posse busca reaver. Ademais, a partir da detida análise dos autos, constata-se que o contrato entabulado entre as partes contém cláusula resolutiva expressa (Cláusula Terceira), estipulando o seguinte: “Em consequência do acima pactuado, se o COMPRADOR não efetuar o pagamento TOTAL dos valores devidos e transferência dos veículos, o presente instrumento considerar-se-á rescindido de pleno direito, ficando o COMPRADOR constituído em mora e obrigado a restituir imediatamente os imóveis adquiridos, ficando o vendedor isento de devolver quaisquer valores já pagos pelo comprador”. Em relação à cláusula resolutiva, prescreve o art. 474 do CPC que a cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito, enquanto a tácita depende de interpelação judicial. Além disso, o c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.789.863/MS, decidiu pela inexistência de óbice para a aplicação de eventual cláusula resolutiva expressa em instrumento particular de compra e venda, para fins de reintegração de posse do bem mesmo antes da rescisão do pacto, nas hipóteses em que, mesmo após notificado/interpelado o compromissário comprador inadimplente, não ocorra a purgação da mora, veja-se: “RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RURAL COM CLÁUSULA DE RESOLUÇÃO EXPRESSA - INADIMPLEMENTO DO COMPROMISSÁRIO COMPRADOR QUE NÃO EFETUOU O PAGAMENTO DAS PRESTAÇÕES AJUSTADAS - MORA COMPROVADA POR NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL E DECURSO DO PRAZO PARA A PURGAÇÃO - INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE JULGARAM PROCEDENTE O PEDIDO REINTEGRATÓRIO REPUTANDO DESNECESSÁRIO O PRÉVIO AJUIZAMENTO DE DEMANDA JUDICIAL PARA A RESOLUÇÃO CONTRATUAL - INSURGÊNCIA DO DEVEDOR - RECLAMO DESPROVIDO. Controvérsia: possibilidade de manejo de ação possessória fundada em cláusula resolutiva expressa decorrente de inadimplemento de contrato de compromisso de compra e venda imobiliária, sem que tenha sido ajuizada, de modo prévio ou concomitante, demanda judicial objetivando rescindir o ajuste firmado. (...) Inexiste óbice para a aplicação de cláusula resolutiva expressa em contratos de compromisso de compra e venda, porquanto, após notificado/interpelado o compromissário comprador inadimplente (devedor) e decorrido o prazo sem a purgação da mora, abre-se ao compromissário vendedor a faculdade de exercer o direito potestativo concedido pela cláusula resolutiva expressa para a resolução da relação jurídica extrajudicialmente. Impor à parte prejudicada o ajuizamento de demanda judicial para obter a resolução do contrato quando esse estabelece em seu favor a garantia de cláusula resolutória expressa, é impingir-lhe ônus demasiado e obrigação contrária ao texto expresso da lei, desprestigiando o princípio da autonomia da vontade, da não intervenção do Estado nas relações negociais, criando obrigação que refoge o texto da lei e a verdadeira intenção legislativa. (...)” (REsp n. 1.789.863/MS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. em 10/8/2021, DJe de 4/10/2021) Esse entendimento tem sido reafirmado de forma consistente por este Sodalício, como se observa nos seguintes julgados: “TUTELA CAUTELAR EM CARÁTER ANTECEDENTE – DESCABIMENTO DO AGRAVO E PRECLUSÃO CONSUMATIVA – PRELIMINARES AFASTADAS – RESCISÃO DE CONTRATO DE CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE SUPERFÍCIE C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – DESCUMPRIMENTO DA LIMINAR ANTERIOR – REINTEGRAÇÃO NA POSSE DIRETA DO IMÓVEL – INADIMPLEMENTO CONTRATUAL – CLÁUSULA RESOLUTIVA EXPRESSA – PRESENÇA DOS REQUISITOS ENSEJADORES – ART. 300, CPC – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO – AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. In casu, a decisão ora recorrida deferiu o pedido de reintegração direta da posse, ante o descumprimento da decisão liminar anteriormente deferida, não havendo o que se falar em descabimento do recurso, tampouco em preclusão consumativa. A presença da probabilidade do direito, do perigo de dano e risco de resultado útil do processo (art. 300, CPC), são pressupostos que devem estar presentes para a concessão de tutela de urgência. In casu, o requerente demonstrou o inadimplemento contratual por parte dos superficiários, ante a exploração da área da superfície por terceiros, sem autorização do proprietário. Além disso, restou evidenciado o descumprimento contratual também no tocante à falta de contratação do seguro garantia, e na ausência de pagamento da parcela devida a título de remuneração da superfície. Diante do inadimplemento da remuneração da superfície, o próprio contrato autoriza ao proprietário reaver o bem objeto de concessão de direito real de superfície, sobretudo considerando a mora ex re. Não há óbice para a aplicação da cláusula resolutiva expressa em caso de inadimplemento contratual, possibilitando ao proprietário exercer o direito potestativo de resolução da relação jurídica.” (TJ/MT. RAI 10157065720228110000. Relator Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado. Julgamento: 07/12/2022, DJe: 13/12/2022) (g.n.) “AGRAVO INTERNO – DECISÃO MONOCRÁTICA EM SEDE LIMINAR EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS – TUTELA DE URGÊNCIA DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA NA ORIGEM – REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC PRESENTES – CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – CLÁUSULA RESOLUTÓRIA EXPRESSA – INADIMPLEMENTO DO CONTRATO – MORA EX RE – EXPRESSA POSSIBILIDADE DE RETOMADA DO IMÓVEL – CONSEQUENTE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Presentes os requisitos do art. 300 do CPC, eis que demonstrado o inadimplemento contratual da parte requerida agravada, a existência de cláusula contratual resolutória expressa baseada em mora ex re, a possibilidade de reaver o imóvel e o periculum in mora. (...) As provas coligidas aos autos de origem demonstram que o requerido agravado não adimpliu com nenhum valor, restando evidenciado o descumprimento contratual. Diante da comprovação, prima facie, do inadimplemento, o próprio contrato traz expressa cláusula resolutiva, autorizando o vendedor a reaver o imóvel. Não há óbice para a aplicação da cláusula resolutiva expressa em caso de inadimplemento contratual, a qual viabiliza o proprietário a exercer o direito potestativo de resolução da relação jurídica, mormente porque, nos termos do art. 474 do Código Civil, a cláusula resolutiva expressa se opera de pleno direito. Despicienda a notificação pessoal da parte requerida agravada para fins de constituição em mora e conseguinte rescisão contratual, isso porque a mora no caso vertente é ex re, na forma do art. 397 do Código Civil, consoante se infere da redação do § 2º da cláusula 10ª do contrato. (...). A posse do agravado e de terceiros está maculada de vício bastante a autorizar o deferimento da liminar de reintegração de posse, sobretudo porque presentes a posse anterior do agravante, comprovada por meio do instrumento contratual e o esbulho praticado, sendo indiferente se tratar de posse nova ou velha, posto que os prejuízos suportados pelo autor denotam a patente existência do periculum in mora. (...).” (TJ/MT. AgInt 10274224720238110000. Relator Des. DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado. Julgamento: 06/03/2024, DJe: 11/03/2024) (g.n.) No caso em análise, restou incontroverso que o Agravante se tornou inadimplente e, embora sustente possuir diversos comprovantes de pagamento que não foram colacionados na inicial, não foram juntados neste recurso elementos que indiquem a suposta adimplência, tampouco documentos que possam comprovar que o imóvel se trata, de fato, da residência do Agravante. Ademais, ressalta-se que a pactuação da cláusula resolutiva decorre do livre exercício da autonomia privada das partes, sendo ambas maiores, capazes e plenamente conscientes das condições contratuais ajustadas. O princípio do pacta sunt servanda, consagrado nos artigos 421 e 422 do Código Civil,impõe que os contratos sejam cumpridos na exata medida em que foram ajustados, ressalvadas hipóteses excepcionais que legitimem a intervenção judicial para restabelecer o equilíbrio contratual, o que não é o caso. Assim, a partir de todas essas considerações, entendo que não há nenhum desacerto ou ilegalidade a permitir a reforma da decisão combatida. Ante o exposto, conheço do recurso interposto e LHE NEGO PROVIMENTO, mantendo incólume a r. decisão combatida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1013158-54.2025.8.11.0000

ID: 299843081

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013158-54.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

TANIELLY PASTICK ALVES

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CLEITON TUBINO SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013158-54.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Compra e Venda, Correção Monetária] Rel… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013158-54.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Compra e Venda, Correção Monetária] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [CLEITON TUBINO SILVA - CPF: 396.434.921-68 (ADVOGADO), MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR - CPF: 931.574.878-68 (AGRAVANTE), USIMAT DESTILARIA DE ALCOOL LTDA - CNPJ: 07.670.089/0001-42 (AGRAVADO), TANIELLY PASTICK ALVES - CPF: 041.643.911-03 (ADVOGADO), WILLIAN SCHOLL - CPF: 050.060.609-99 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – REJEIÇÃO MANTIDA – DOCUMENTO PARTICULAR SEM ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS – MITIGAÇÃO – POSSIBILIDADE – LIQUIDEZ E EXIGIBILIDADE DEMONSTRADAS – CLÁUSULA PENAL DE 40% VÁLIDA – RECURSO DESPROVIDO. A ausência de duas testemunhas não impede a executividade de título extrajudicial quando há prova idônea da obrigação. A liquidez e exigibilidade do título podem ser reconhecidas com base em documentos e planilhas que evidenciem o valor cobrado. A cláusula penal de 40% foi livremente pactuada entre partes empresárias, revelando-se proporcional diante da natureza do contrato e da função compensatória e coercitiva do instituto. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1013158-54.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR AGRAVADA: USIMAT DESTILARIA DE ALCOOL LTDA R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR, contra decisão proferida pelo MMº Juiz de Direito Ricardo Garcia Maziero, da 2ª Vara da Comarca de Comodoro/MT, lançada nos autos da Execução de Título Extrajudicial nº. 1000086-90.2024.8.11.0046, movida por USIMAT DESTILARIA DE ÁLCOOL LTDA, que rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada pelo agravante. O agravante alega que a decisão agravada merece reforma, uma vez que foram apontadas diversas irregularidades no título executivo extrajudicial. Entre os fundamentos expostos estão a ausência de assinaturas de duas testemunhas no contrato, a falta de liquidez e exigibilidade do título, bem como a inaplicabilidade da multa contratual por ausência de rescisão formal do contrato. Explana que a decisão agravada, por sua vez, entendeu pela rejeição do incidente, fundamentando que o título executivo possuía todos os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, conforme o art. 783 do CPC, e que a ausência de assinatura de testemunhas não impede a execução, uma vez que o documento foi reconhecido em cartório e ratificado por documentos anexos que comprovam a relação jurídica entre as partes. Argumenta que a decisão judicial não observou os requisitos estabelecidos no art. 784 do Código de Processo Civil, que exige a assinatura de duas testemunhas para conferir força executiva ao documento particular. Ainda, sustenta que o título executivo carece de liquidez, uma vez que a Cláusula 6ª, item 'A', do contrato firmado entre as partes estabelece que o valor da lenha para apuração do quantum debeatur deveria observar três cotações de mercado realizadas por empresas do ramo, conforme previsto expressamente no instrumento contratual. Informa que não foram juntadas tais cotações nos autos, impossibilitando a comprovação do valor de mercado da lenha, o que comprometeria a certeza e liquidez do título. Além disso, destaca que o único documento apresentado para demonstrar o valor do produto é uma proposta de venda produzida unilateralmente pela agravada, sem assinatura e sem a identificação formal do responsável pela emissão, o que fragiliza ainda mais a exigibilidade do título. Expõe que o saldo devedor objeto da multa aplicada é inferior ao que foi descrito na inicial, pois a exequente alegou que restariam pendentes 1.917 metros estéreos de lenha, entretanto, consta nos autos um extrato que comprova a entrega de 466 metros estéreos, sendo este montante desconsiderado no cálculo apresentado pela agravada. No mais, o agravante defende que o saldo remanescente seria de 1.534 metros estéreos, e não o valor executado, o que comprometeria a certeza e a liquidez do título, impossibilitando a manutenção da execução nos moldes determinados pela decisão agravada. Por fim, aponta a abusividade da multa compensatória estabelecida no contrato, que foi fixada em 40% sobre o valor inadimplido. Argumenta que esse percentual é desproporcional e fere os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo ser reduzido para 2%, em consonância com o disposto no Código de Defesa do Consumidor. Defende que, ainda que não se aplique a legislação consumerista, a multa deve ser recalculada para um patamar mais razoável, considerando que a incidência de 40% sobre o valor inadimplido configura enriquecimento sem causa da exequente. Diante do exposto, pugna pela concessão de efeito suspensivo ao recurso, ao argumento de que o prosseguimento da execução poderá acarretar prejuízos irreparáveis, considerando que os valores bloqueados se destinam à saúde do agravante. Ao final, requer o provimento deste instrumental para acolher a exceção de pré-executividade oposta, a fim de se reconhecer a nulidade do título executivo por ausência de requisitos legais, ou, subsidiariamente, a redução da multa compensatória aplicada, que, segundo ele, deveria limitar-se a 2% (Id. 282584372). O almejado efeito suspensivo foi por mim indeferido em 09/05/2025, conforme decisão Id. 285424383. A agravada apresentou contraminuta, argumentando que as alegações do agravante exigem dilação probatória, o que inviabiliza a via da exceção, à luz da Súmula 393 do STJ e vasta jurisprudência do TJMT, pois a alegação de divergência de valores carece de documentação comprobatória. Defende a validade do contrato evidenciada pela assinatura do agravante, reconhecida em cartório, sendo também que o próprio agravante reconhece a existência do contrato, ao admitir entrega parcial da lenha. Explica que o título atende aos requisitos do art. 783 do CPC, pois, embora não haja duas testemunhas, há reconhecimento do débito; assinatura autenticada do devedor; e planilha de débito e documentos que demonstram a relação obrigacional. Destaca precedentes do STJ que admitem a mitigação da exigência das duas testemunhas, sobretudo quando o contrato é reconhecido e cumprido parcialmente, como no caso dos autos. Rebate a tese de que a multa compensatória seria indevida por ausência de rescisão formal, esclarecendo que a cláusula 6ª do contrato prevê a incidência da multa em caso de inadimplemento, o que ocorreu; a rescisão se operou de pleno direito, diante do inadimplemento substancial; a tentativa de composição extrajudicial (notificação extrajudicial) não constitui novação, tampouco descaracteriza o inadimplemento. Cita precedentes do TJMT para afirmar a possibilidade de rescisão implícita por inadimplemento contratual. Sobre a abusividade da multa compensatória, ressalta que inexiste relação de consumo entre as partes, na medida em que ambos são empresários no setor agroindustrial; o percentual de 40% foi livremente pactuado e encontra respaldo jurisprudencial; a multa visa desestimular o comportamento oportunista e compensar prejuízos da compradora. Cita julgados que reconhecem a validade de cláusula penal compensatória de 40% do valor do produto não entregue, em contratos de fornecimento de commodities, afastando a incidência do art. 413 do CC e do CDC. Pede, assim, a manutenção da decisão (Id. 289322395). Preparo devidamente recolhido no Id. 282843858. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Cinge-se dos autos que USIMAT DESTILARIA DE ÁLCOOL LTDA ajuizou a ação de execução de título extrajudicial em desfavor de MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR, ora agravante, relatando que celebrou com o executado, em 27 de outubro de 2021, contrato de compra e venda de 2.000 metros estéreos de lenha teca, proveniente da Fazenda Baía da Pedra, de propriedade do executado, pelo preço de R$130,00 (cento e trinta reais) por metro estéreo, estipulando-se entrega escalonada mínima de 120 metros por semana, com prazo final até 01 de abril de 2022. Contudo, conforme alegado, o executado teria entregue apenas 83 metros estéreos da madeira, descumprindo o volume total avençado. Diante do inadimplemento, a exequente notificou o executado da rescisão contratual e da incidência da multa contratual prevista na cláusula sexta do contrato, correspondente a 40% sobre o volume inadimplido, calculada com base no preço de mercado atualizado da lenha (R$160,00 por metro), resultando no montante de R$122.688,00 (cento e vinte e dois mil, seiscentos e oitenta e oito reais). Com a atualização monetária e incidência de juros moratórios de 1% ao mês, o valor total da dívida foi estimado em R$157.114,99 (cento e cinquenta e sete mil, cento e quatorze reais e noventa e nove centavos), razão pela qual a exequente propôs a presente execução, com base nos artigos 778, 779, 783 e 784, inciso III, do Código de Processo Civil. Devidamente citado, o executado opôs a exceção de pré-executividade, que foi rejeitada nos seguintes termos: “Vistos. Trata-se de Exceção de Pré-Executividade apresentada por MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR em face de USIMAT DESTILARIA DE ÁLCOOL LTDA., no âmbito de uma execução de título extrajudicial, arguindo, principalmente, a ausência de condições de executividade do título, a falta de assinaturas de testemunhas no contrato, a ausência de liquidez e exigibilidade, bem como a inaplicabilidade da multa contratual por não ter ocorrido rescisão do contrato. DA IMPUGNAÇÃO À EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE Primeiramente, cumpre observar que a Exceção de Pré-Executividade é cabível para a discussão de matérias que possam ser reconhecidas de ofício pelo juiz, sem a necessidade de dilação probatória. Assim, a Exceção de Pré-Executividade é inaplicável para questões que exigem a produção de provas ou perícias, como ocorre no caso em questão, onde se pretende discutir a liquidez do título e a adequação do valor da multa contratual. DA AUSÊNCIA DE ASSINATURAS DE TESTEMUNHAS Quanto à alegação de que o título executivo não possui validade devido à falta de assinatura de testemunhas no contrato, esclareço que tal alegação não se sustenta. Embora o contrato apresentado não contenha a assinatura de testemunhas, a validade do título é garantida pela assinatura do Excipiente, que foi devidamente reconhecida em cartório, e pelos demais documentos que comprovam a existência da obrigação e sua exigibilidade. Além disso, conforme entendimento jurisprudencial, a falta de assinatura de testemunhas em contratos de empréstimo consignado não impede a executividade do título, desde que o contrato, como no caso em apreço, demonstre de forma suficiente a relação jurídica entre as partes e a obrigação do Excipiente. DA LIQUIDEZ E EXIGIBILIDADE DO TÍTULO A alegação de que o título executivo seria ilíquido e inexigível por falta de citação de três cotações de mercado é igualmente improcedente. O título apresentado possui todos os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, conforme preceitua o art. 783 do Código de Processo Civil, com a devida planilha de débitos e os cálculos atualizados, demonstrando de forma clara o valor da dívida. O Excipiente, por sua vez, não apresentou qualquer cálculo ou comprovação que demonstre a alegada incorreção dos valores, limitando-se a questionar a ausência de cotações de mercado, o que não é imprescindível para a formação do título executivo, especialmente quando este já demonstra, de forma inequívoca, a relação de dívida. DA RESCISÃO CONTRATUAL E APLICABILIDADE DA MULTA A alegação de que a multa contratual só seria devida em caso de rescisão formal do contrato não merece acolhimento. A cláusula 6 do contrato em questão estabelece que o inadimplemento das obrigações contratuais é causa de rescisão e, consequentemente, de aplicação de multa. O inadimplemento do Excipiente, ao não cumprir com suas obrigações, ensejou, conforme pactuado, a rescisão do contrato, e a multa foi devidamente aplicada, conforme o estipulado contratualmente. Não houve, portanto, novação ou qualquer outro acordo que modificasse os termos originais do contrato. A notificação enviada ao Excipiente também é válida, uma vez que se buscava resolver a pendência de forma amigável antes do ajuizamento da presente ação de execução. DA MULTA COMPENSATÓRIA No que se refere ao valor da multa compensatória, a mesma foi livremente pactuada entre as partes no contrato, não havendo que se falar em abusividade, especialmente quando o Código de Defesa do Consumidor não se aplica a este tipo de relação contratual. A multa de 40%, prevista na cláusula 6 do contrato, é válida, considerando que as partes acordaram livremente os termos e condições da relação jurídica. Além disso, conforme a jurisprudência, a fixação de cláusulas penais e a estipulação de multas são legítimas desde que respeitada a liberdade de contratação entre as partes, o que ocorreu no caso em questão. Assim, não há razão para readequação do percentual da multa. Diante do exposto, rejeito a Exceção de Pré-Executividade apresentada, por ser inadequada para o exame das questões levantadas, e reconheço a plena validade do título executivo apresentado, bem como a regularidade da aplicação da multa contratual. Intime-se a parte Exequente para prosseguimento da execução nos termos da petição inicial.” Pois bem. Inicialmente, convém destacar que a exceção de pré-executividade é cabível, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, para discussão de matérias de ordem pública, cognoscíveis de ofício, e que prescindam de dilação probatória. Essa limitação visa preservar a celeridade e a eficácia da execução, razão pela qual impõe-se o exame cauteloso da pertinência das alegações trazidas sob essa via de defesa. No tocante à ausência de assinatura de duas testemunhas no contrato executado, importa salientar que o documento constante dos autos (Id. 138270810, na origem) foi firmado pelo próprio devedor, com firma reconhecida em Cartório, sendo acompanhado de notificação extrajudicial (Id. 138270813, na origem) e demonstrativos de entrega da lenha pactuada. Tal conjunto probatório é suficiente para conferir validade executiva ao título, na linha do entendimento já consolidado pelo STJ, inclusive em hipóteses análogas que envolvem contrato de compra e venda mercantil, senão vejamos: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDUCUAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. DOCUMENTO PARTICULAR SEM ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. MITIGAÇÃO. POSSIBILIDADE. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. NECESSIDADE. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. "A assinatura das testemunhas é um requisito extrínseco à substância do ato, cujo escopo é o de aferir a existência e a validade do negócio jurídico; sendo certo que, em caráter absolutamente excepcional, os pressupostos de existência e os de validade do contrato podem ser revelados por outros meios idôneos e pelo próprio contexto dos autos, hipótese em que tal condição de eficácia executiva poderá ser suprida" (AgInt no REsp n. 1.945 .956/MA, relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/4/2022, DJe de 27/4/2022). 2. Na hipótese dos autos, ao julgar os embargos infringentes, o Tribunal de origem não se manifestou acerca da comprovação, pelo exequente, por outros meios idôneos, da existência de circunstâncias aptas a comprovar a validade e eficácia do contrato, dependendo o adequado deslinde da demanda, portanto, da análise do acervo fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7/STJ, razão pela qual devem os autos retornar à origem para novo exame da questão. 3 . Agravo interno provido, com a determinação de retorno dos autos às instâncias ordinárias, a fim de que se examine a questão à luz do entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria.” (STJ - AgInt no REsp: 1528479 MT 2015/0082404-9, Relator.: RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 08/05/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/05/2023) Ainda que a literalidade do art. 784, III, do CPC disponha que o título deve ser assinado por duas testemunhas, é entendimento prevalente que a ausência desse requisito formal pode ser mitigada diante da inequívoca demonstração do negócio jurídico, de sua força obrigacional e da autenticidade das assinaturas. A propósito: “RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA EXECUÇÃO - AUSÊNCIA DE ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS – IMPOSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO – CONTEXTO FÁTICO QUE COMPROVA A EXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO ENTABULADO - DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO I – A exceção de pré-executividade constitui via excepcional, que deve ser admitida apenas quando a matéria nela suscitada possa ser conhecida de ofício pelo juiz e não dependa de dilação probatória. II – A ausência da assinatura de 2 (duas) testemunhas no contrato, por si só, não é suficiente para descaracterizá-lo, quando restar incontroverso que as partes firmaram o referido negócio jurídico, como no caso concreto.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1002770-63.2023.8.11.0000, Relator.: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 29/03/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/04/2023) “APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO– TÍTULO EXTRAJUDICIAL – INSTRUMENTO PARTICULAR – FALTA DE ASSINATURA DE 02 TESTEMUNHAS – IRRELEVÂNCIA – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO DAS PARTES NA CONTRATAÇÃO – PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA – TÍTULO QUE SE MOSTRA APTO A EMBASAR A EXECUÇÃO – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Conquanto o art. 784, III, do CPC estabeleça ser título executivo extrajudicial, o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas, a orientação do c. STJ é no sentido de que, excepcionalmente, pode ser mitigada a exigência da assinatura de duas testemunhas no documento. A ausência da assinatura de testemunhas não tem o condão de afastar a exequibilidade do título, porque subsiste a assinatura do devedor que, em momento algum, negou a existência do contrato e os termos do negócio jurídico celebrado, tampouco alegou vício de consentimento na sua formalização.” (TJ-MT 00078092520188110003 MT, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 24/08/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/08/2022) Com efeito, dispõe o art. 783 do CPC que “a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível”. No caso, o contrato de compra e venda estabelece cláusulas claras quanto ao objeto (2.000 metros estéreos de lenha teca), ao preço fixo (R$130,00 o metro estéreo), ao prazo e à forma de entrega, de modo que a obrigação ali contida é dotada de certeza e exigibilidade. O inadimplemento também é expressamente regulado no pacto, prevendo-se a aplicação de multa compensatória de 40% sobre o volume inadimplido (Cláusula 6ª). No ponto referente à alegação de ausência de liquidez pela falta de três cotações de mercado, verifica-se que tal exigência decorre de cláusula contratual (Cláusula 6ª, item "a"), que estipula que o preço de referência para o cálculo da multa seria a média das cotações de mercado na data da entrega. Contudo, a exequente recorrida apresentou planilha de cálculo (Id. 138270823, na origem), considerando o valor de R$160,00 (cento e sessenta reais) como parâmetro, bem como orçamento (Id. 138270819, na origem), indicando valor de mercado. O executado agravante, por sua vez, limita-se a impugnar a ausência de três cotações, sem, contudo, demonstrar efetiva divergência no valor ou apresentar contraprova. Logo, a mera ausência das três cotações não desnatura a liquidez do título, pois o quantum devido restou suficientemente delimitado pela planilha acompanhada do demonstrativo de débito e dos elementos probatórios constantes dos autos. Ainda, quanto à alegação de continuidade das entregas após a notificação de rescisão do contrato, com suposta novação tácita do ajuste, os autos não contêm elementos probatórios robustos que evidenciem alteração contratual posterior à notificação enviada pela exequente (Id. 138270813, na origem). O extrato apresentado pelo agravante não elide, por si só, a eficácia da notificação, tampouco comprova a existência de novo pacto. Ademais, a Cláusula 6ª do contrato estabelece que o inadimplemento constitui causa de rescisão automática, legitimando a cobrança da multa. Ademais, a discussão quanto à continuidade da entrega da lenha após a notificação de rescisão e a alegada novação também exige prova da dinâmica fática contratual posterior, que extrapola a cognição sumária da exceção. Logo, ainda que o agravante invoque vícios formais do título, a argumentação se entrelaça com discussões de fato e prova, sendo inviável, portanto, sua análise na via estreita da exceção de pré-executividade, como corretamente reconhecido pelo juízo de origem. Nessa mesma linha já decidi: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – ARGUIÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE REQUISITOS – QUESTÕES QUE DEMANDAM DILAÇÃO PROBATÓRIA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A Exceção de Pré-executividade tem cabimento nos casos em que possam ser apreciadas matérias de ofício pelo Julgador, ou seja, sem a necessidade de produção de provas, contudo, as circunstâncias do caso concreto demonstram a necessidade de instrução, logo, mostra-se acertada a decisão que rejeitou o incidente.” (TJ-MT - AI: 10027662620238110000, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 24/05/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/05/2023) Também não se sustenta o argumento de que a multa de 40% seria abusiva. Trata-se de cláusula penal livremente pactuada entre partes empresárias, em relação jurídica paritária, não se aplicando, por isso, o Código de Defesa do Consumidor. O STJ tem reiteradamente reconhecido a validade de cláusulas penais estipuladas com base no art. 412 do Código Civil, desde que não se revelem manifestamente desproporcionais, o que não se verifica na hipótese em apreço. Por fim, ainda que se discuta a quantidade efetivamente entregue (se 83 ou 466 metros estéreos), a alegação do agravante não encontra respaldo nos documentos acostados aos autos de forma inequívoca. A planilha apresentada pela exequente recorrida, com base no saldo devedor de 1.917 metros, encontra amparo nas cláusulas contratuais e na dinâmica da execução, e eventual divergência quanto à entrega da mercadoria exigiria, de fato, instrução probatória incompatível com a via estreita da exceção de pré-executividade, de modo que não há qualquer reparo a fazer na decisão impugnada. A propósito: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL (MULTA COMPENSATÓRIA DE 40% AJUSTADA EM CONTRATO COMPRA E VENDA DE MILHO) - IMPROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA EXECUÇÃO FACE À INEXIGIBILIDADE DO CRÉDITO - INOCORRÊNCIA – CERTEZA E EXIGIBILIDADE DECORRENTE DA LIVRE PACTUAÇÃO – QUANTUM LIQUIDÁVEL (ART. 786, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15)– ALEGADO EXCESSO DE EXECUÇÃO – CLÁUSULA ADMITINDO A COBRANÇA DA MULTA PELO EQUIVALENTE EM DINHEIRO – CONTRATO QUE DEFINE O PREÇO DA SACA AINDA QUE OCORRA A VARIAÇÃO DO PREÇO NO MERCADO – NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DO PREÇO PREESTABELECIDO – PRETENDIDA REDUÇÃO DO PERCENTUAL DA MULTA (40%) - ALEGADA EXCESSIVIDADE– INOCORRÊNCIA – NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DA NATUREZA E FINALIDADE DO NEGÓCIO – PERCENTUAL QUE VISA DESESTIMULAR O COMPORTAMENTO OPORTUNISTA DO PRODUTOR VENDEDOR E MITIGAR OS PREJUÍZOS QUE A COMPRADORA EXPERIMENTARÁ COM A AQUISIÇÃO DO PRODUTO NO MERCADO - EMBARGOS À EXECUÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTES - RECURSO PROVIDO EM PARTE. No caso de descumprimento integral do contrato de compra e venda de milho, de modo a não pairar dúvidas pontuais a serem sanadas através de ação judicial de conhecimento, plenamente exequível a multa compensatória quando o montante (correspondente em dinheiro da fração do produto não entregue) é facilmente liquidável na forma do parágrafo único do art. 786 do CPC/15. Apesar admitir a cobrança da multa compensatória pelo correspondente em pecúnia do percentual estipulado sobre o volume do produto (milho) não entregue, se o contrato de compra e venda exequendo prevê expressamente um preço fixo para o valor da saca da referida commodity (preço da saca de milho), definindo-o como inalterável, ainda que ocorra a variação do preço no mercado, não poderá o comprador, no momento da apuração do valor da multa, valer-se da cotação do produto na data do ajuizamento da execução, sob pena de excesso de execução. Embora a norma do art. 413 do CC/2002, admita, em tese, a redução equitativa da multa compensatória pelo juiz, certo é que o mesmo dispositivo estabelece que a conveniência dessa redução haverá de ser aferida à luz da natureza e a finalidade do negócio. Assim, com a finalidade e de desestimular o comportamento oportunista do produtor alienante – que, diante do aumento da cotação da commodity prometida em contrato de compra e venda antecipada a preço prefixado, opta por não entregar o produto – bem como para indenizar os prejuízos que o adquirente experimentará com a necessária aquisição do produto faltante, de última hora, a fim de honrar seus compromissos com terceiros, deve ser mantida a multa compensatória convencionada na ordem de 40% do correspondente em pecúnia do produto não entregue, sob pena de se chancelar uma indevida frustração da confiança depositada pela adquirente no negócio.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 00075419520198110015, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 13/12/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/12/2023) “APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE MILHO. INCIDÊNCIA DA TEORIA DA IMPREVISÃO. INAPLICABILIDADE - ALEGAÇÃO DE FRUSTRAÇÃO DE SAFRA EM DECORRÊNCIA DA PRODUÇÃO DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. VARIAÇÕES CLIMÁTICAS. INVIABILIDADE. CLÁUSULA EXPRESSA DE ASSUNÇÃO DE TODOS OS RISCOS DECORRENTES DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR . ONEROSIDADE EXCESSIVA DO CONTRATO NÃO DEMONSTRADA. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 413 DO CÓDIGO CIVIL. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO . As intempéries climáticas para afastar ou reduzir a aplicação da multa contratual estabelecida, não se sustenta, dada a natureza do contrato firmado. Isso porque, ao agricultor que trabalha com safra futura não cabe alegar como motivo de desobrigação de cumprimento do pacto, a frustração da colheita com base em eventos climáticos, já que é da natureza da sua atividade, e os riscos assumidos por ambas as partes são inerentes à forma convencionada para a entrega e pagamento pelo produto. A previsão contratual é de que a multa incidiria, havendo o descumprimento não se aplicando a isenção de responsabilidade por caso fortuito e força maior. Não se aplica a teoria da imprevisão aos contratos de venda antecipada de safra agrícola, porquanto ao contratar as partes assumem riscos conhecidos e inerentes ao negócio jurídico, tais como a oscilação do preço de mercado do produto e a queda da produtividade, tendo sido tais elementos considerados no momento da fixação do preço da avença. Ademais, os contratos aleatórios são incompatíveis com a teoria da imprevisão, porquanto sua principal característica é a incerteza com relação aos acontecimentos futuros, até mesmo quanto ao objeto da avença. Assim, a ocorrência de fato imprevisível não elide a parte vendedora no cumprimento do contrato, principalmente quando há cláusula expressa de assunção de todos os riscos decorrentes de caso fortuito ou força maior. No tocante a pretensão de redução da multa de 40% para 10%, tem-se que a onerosidade não se encontra efetivada, bem como não ultrapassa o valor do principal, a considerar que foi estipulada livremente pelas partes. Portanto, não se aplica o artigo 413 do Código Civil. No caso, houve adequação do valor da saca, consoante o previsto em contrato, o que enseja a sucumbência mínima da parte apelada, e não recíproca, como defendido.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 0001453-45.2017.8 .11.0101, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 31/01/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/02/2023) Portanto, sob o prisma da lógica subsuntiva, a tese do agravante quanto à nulidade do título (tese) confronta-se com o conjunto probatório robusto e com a adequação formal e material do contrato à hipótese do art. 784, III, do CPC (antítese), culminando na síntese pela higidez da decisão agravada, que corretamente rejeitou a exceção de pré-executividade, autorizando o prosseguimento da execução. Diante de todo o exposto, em consonância com os princípios da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda), da instrumentalidade das formas e da boa-fé objetiva (art. 113 e 422 do Código Civil), a decisão agravada deve ser mantida. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Processo nº 1013158-54.2025.8.11.0000

ID: 299843082

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013158-54.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

USIMAT DESTILARIA DE ALCOOL LTDA

Acórdão

Advogados:

WILLIAN SCHOLL

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013158-54.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Compra e Venda, Correção Monetária] Rel… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013158-54.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Compra e Venda, Correção Monetária] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [CLEITON TUBINO SILVA - CPF: 396.434.921-68 (ADVOGADO), MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR - CPF: 931.574.878-68 (AGRAVANTE), USIMAT DESTILARIA DE ALCOOL LTDA - CNPJ: 07.670.089/0001-42 (AGRAVADO), TANIELLY PASTICK ALVES - CPF: 041.643.911-03 (ADVOGADO), WILLIAN SCHOLL - CPF: 050.060.609-99 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – REJEIÇÃO MANTIDA – DOCUMENTO PARTICULAR SEM ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS – MITIGAÇÃO – POSSIBILIDADE – LIQUIDEZ E EXIGIBILIDADE DEMONSTRADAS – CLÁUSULA PENAL DE 40% VÁLIDA – RECURSO DESPROVIDO. A ausência de duas testemunhas não impede a executividade de título extrajudicial quando há prova idônea da obrigação. A liquidez e exigibilidade do título podem ser reconhecidas com base em documentos e planilhas que evidenciem o valor cobrado. A cláusula penal de 40% foi livremente pactuada entre partes empresárias, revelando-se proporcional diante da natureza do contrato e da função compensatória e coercitiva do instituto. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1013158-54.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR AGRAVADA: USIMAT DESTILARIA DE ALCOOL LTDA R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR, contra decisão proferida pelo MMº Juiz de Direito Ricardo Garcia Maziero, da 2ª Vara da Comarca de Comodoro/MT, lançada nos autos da Execução de Título Extrajudicial nº. 1000086-90.2024.8.11.0046, movida por USIMAT DESTILARIA DE ÁLCOOL LTDA, que rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada pelo agravante. O agravante alega que a decisão agravada merece reforma, uma vez que foram apontadas diversas irregularidades no título executivo extrajudicial. Entre os fundamentos expostos estão a ausência de assinaturas de duas testemunhas no contrato, a falta de liquidez e exigibilidade do título, bem como a inaplicabilidade da multa contratual por ausência de rescisão formal do contrato. Explana que a decisão agravada, por sua vez, entendeu pela rejeição do incidente, fundamentando que o título executivo possuía todos os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, conforme o art. 783 do CPC, e que a ausência de assinatura de testemunhas não impede a execução, uma vez que o documento foi reconhecido em cartório e ratificado por documentos anexos que comprovam a relação jurídica entre as partes. Argumenta que a decisão judicial não observou os requisitos estabelecidos no art. 784 do Código de Processo Civil, que exige a assinatura de duas testemunhas para conferir força executiva ao documento particular. Ainda, sustenta que o título executivo carece de liquidez, uma vez que a Cláusula 6ª, item 'A', do contrato firmado entre as partes estabelece que o valor da lenha para apuração do quantum debeatur deveria observar três cotações de mercado realizadas por empresas do ramo, conforme previsto expressamente no instrumento contratual. Informa que não foram juntadas tais cotações nos autos, impossibilitando a comprovação do valor de mercado da lenha, o que comprometeria a certeza e liquidez do título. Além disso, destaca que o único documento apresentado para demonstrar o valor do produto é uma proposta de venda produzida unilateralmente pela agravada, sem assinatura e sem a identificação formal do responsável pela emissão, o que fragiliza ainda mais a exigibilidade do título. Expõe que o saldo devedor objeto da multa aplicada é inferior ao que foi descrito na inicial, pois a exequente alegou que restariam pendentes 1.917 metros estéreos de lenha, entretanto, consta nos autos um extrato que comprova a entrega de 466 metros estéreos, sendo este montante desconsiderado no cálculo apresentado pela agravada. No mais, o agravante defende que o saldo remanescente seria de 1.534 metros estéreos, e não o valor executado, o que comprometeria a certeza e a liquidez do título, impossibilitando a manutenção da execução nos moldes determinados pela decisão agravada. Por fim, aponta a abusividade da multa compensatória estabelecida no contrato, que foi fixada em 40% sobre o valor inadimplido. Argumenta que esse percentual é desproporcional e fere os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo ser reduzido para 2%, em consonância com o disposto no Código de Defesa do Consumidor. Defende que, ainda que não se aplique a legislação consumerista, a multa deve ser recalculada para um patamar mais razoável, considerando que a incidência de 40% sobre o valor inadimplido configura enriquecimento sem causa da exequente. Diante do exposto, pugna pela concessão de efeito suspensivo ao recurso, ao argumento de que o prosseguimento da execução poderá acarretar prejuízos irreparáveis, considerando que os valores bloqueados se destinam à saúde do agravante. Ao final, requer o provimento deste instrumental para acolher a exceção de pré-executividade oposta, a fim de se reconhecer a nulidade do título executivo por ausência de requisitos legais, ou, subsidiariamente, a redução da multa compensatória aplicada, que, segundo ele, deveria limitar-se a 2% (Id. 282584372). O almejado efeito suspensivo foi por mim indeferido em 09/05/2025, conforme decisão Id. 285424383. A agravada apresentou contraminuta, argumentando que as alegações do agravante exigem dilação probatória, o que inviabiliza a via da exceção, à luz da Súmula 393 do STJ e vasta jurisprudência do TJMT, pois a alegação de divergência de valores carece de documentação comprobatória. Defende a validade do contrato evidenciada pela assinatura do agravante, reconhecida em cartório, sendo também que o próprio agravante reconhece a existência do contrato, ao admitir entrega parcial da lenha. Explica que o título atende aos requisitos do art. 783 do CPC, pois, embora não haja duas testemunhas, há reconhecimento do débito; assinatura autenticada do devedor; e planilha de débito e documentos que demonstram a relação obrigacional. Destaca precedentes do STJ que admitem a mitigação da exigência das duas testemunhas, sobretudo quando o contrato é reconhecido e cumprido parcialmente, como no caso dos autos. Rebate a tese de que a multa compensatória seria indevida por ausência de rescisão formal, esclarecendo que a cláusula 6ª do contrato prevê a incidência da multa em caso de inadimplemento, o que ocorreu; a rescisão se operou de pleno direito, diante do inadimplemento substancial; a tentativa de composição extrajudicial (notificação extrajudicial) não constitui novação, tampouco descaracteriza o inadimplemento. Cita precedentes do TJMT para afirmar a possibilidade de rescisão implícita por inadimplemento contratual. Sobre a abusividade da multa compensatória, ressalta que inexiste relação de consumo entre as partes, na medida em que ambos são empresários no setor agroindustrial; o percentual de 40% foi livremente pactuado e encontra respaldo jurisprudencial; a multa visa desestimular o comportamento oportunista e compensar prejuízos da compradora. Cita julgados que reconhecem a validade de cláusula penal compensatória de 40% do valor do produto não entregue, em contratos de fornecimento de commodities, afastando a incidência do art. 413 do CC e do CDC. Pede, assim, a manutenção da decisão (Id. 289322395). Preparo devidamente recolhido no Id. 282843858. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Cinge-se dos autos que USIMAT DESTILARIA DE ÁLCOOL LTDA ajuizou a ação de execução de título extrajudicial em desfavor de MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR, ora agravante, relatando que celebrou com o executado, em 27 de outubro de 2021, contrato de compra e venda de 2.000 metros estéreos de lenha teca, proveniente da Fazenda Baía da Pedra, de propriedade do executado, pelo preço de R$130,00 (cento e trinta reais) por metro estéreo, estipulando-se entrega escalonada mínima de 120 metros por semana, com prazo final até 01 de abril de 2022. Contudo, conforme alegado, o executado teria entregue apenas 83 metros estéreos da madeira, descumprindo o volume total avençado. Diante do inadimplemento, a exequente notificou o executado da rescisão contratual e da incidência da multa contratual prevista na cláusula sexta do contrato, correspondente a 40% sobre o volume inadimplido, calculada com base no preço de mercado atualizado da lenha (R$160,00 por metro), resultando no montante de R$122.688,00 (cento e vinte e dois mil, seiscentos e oitenta e oito reais). Com a atualização monetária e incidência de juros moratórios de 1% ao mês, o valor total da dívida foi estimado em R$157.114,99 (cento e cinquenta e sete mil, cento e quatorze reais e noventa e nove centavos), razão pela qual a exequente propôs a presente execução, com base nos artigos 778, 779, 783 e 784, inciso III, do Código de Processo Civil. Devidamente citado, o executado opôs a exceção de pré-executividade, que foi rejeitada nos seguintes termos: “Vistos. Trata-se de Exceção de Pré-Executividade apresentada por MILTON DE PAULA FERREIRA JUNIOR em face de USIMAT DESTILARIA DE ÁLCOOL LTDA., no âmbito de uma execução de título extrajudicial, arguindo, principalmente, a ausência de condições de executividade do título, a falta de assinaturas de testemunhas no contrato, a ausência de liquidez e exigibilidade, bem como a inaplicabilidade da multa contratual por não ter ocorrido rescisão do contrato. DA IMPUGNAÇÃO À EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE Primeiramente, cumpre observar que a Exceção de Pré-Executividade é cabível para a discussão de matérias que possam ser reconhecidas de ofício pelo juiz, sem a necessidade de dilação probatória. Assim, a Exceção de Pré-Executividade é inaplicável para questões que exigem a produção de provas ou perícias, como ocorre no caso em questão, onde se pretende discutir a liquidez do título e a adequação do valor da multa contratual. DA AUSÊNCIA DE ASSINATURAS DE TESTEMUNHAS Quanto à alegação de que o título executivo não possui validade devido à falta de assinatura de testemunhas no contrato, esclareço que tal alegação não se sustenta. Embora o contrato apresentado não contenha a assinatura de testemunhas, a validade do título é garantida pela assinatura do Excipiente, que foi devidamente reconhecida em cartório, e pelos demais documentos que comprovam a existência da obrigação e sua exigibilidade. Além disso, conforme entendimento jurisprudencial, a falta de assinatura de testemunhas em contratos de empréstimo consignado não impede a executividade do título, desde que o contrato, como no caso em apreço, demonstre de forma suficiente a relação jurídica entre as partes e a obrigação do Excipiente. DA LIQUIDEZ E EXIGIBILIDADE DO TÍTULO A alegação de que o título executivo seria ilíquido e inexigível por falta de citação de três cotações de mercado é igualmente improcedente. O título apresentado possui todos os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, conforme preceitua o art. 783 do Código de Processo Civil, com a devida planilha de débitos e os cálculos atualizados, demonstrando de forma clara o valor da dívida. O Excipiente, por sua vez, não apresentou qualquer cálculo ou comprovação que demonstre a alegada incorreção dos valores, limitando-se a questionar a ausência de cotações de mercado, o que não é imprescindível para a formação do título executivo, especialmente quando este já demonstra, de forma inequívoca, a relação de dívida. DA RESCISÃO CONTRATUAL E APLICABILIDADE DA MULTA A alegação de que a multa contratual só seria devida em caso de rescisão formal do contrato não merece acolhimento. A cláusula 6 do contrato em questão estabelece que o inadimplemento das obrigações contratuais é causa de rescisão e, consequentemente, de aplicação de multa. O inadimplemento do Excipiente, ao não cumprir com suas obrigações, ensejou, conforme pactuado, a rescisão do contrato, e a multa foi devidamente aplicada, conforme o estipulado contratualmente. Não houve, portanto, novação ou qualquer outro acordo que modificasse os termos originais do contrato. A notificação enviada ao Excipiente também é válida, uma vez que se buscava resolver a pendência de forma amigável antes do ajuizamento da presente ação de execução. DA MULTA COMPENSATÓRIA No que se refere ao valor da multa compensatória, a mesma foi livremente pactuada entre as partes no contrato, não havendo que se falar em abusividade, especialmente quando o Código de Defesa do Consumidor não se aplica a este tipo de relação contratual. A multa de 40%, prevista na cláusula 6 do contrato, é válida, considerando que as partes acordaram livremente os termos e condições da relação jurídica. Além disso, conforme a jurisprudência, a fixação de cláusulas penais e a estipulação de multas são legítimas desde que respeitada a liberdade de contratação entre as partes, o que ocorreu no caso em questão. Assim, não há razão para readequação do percentual da multa. Diante do exposto, rejeito a Exceção de Pré-Executividade apresentada, por ser inadequada para o exame das questões levantadas, e reconheço a plena validade do título executivo apresentado, bem como a regularidade da aplicação da multa contratual. Intime-se a parte Exequente para prosseguimento da execução nos termos da petição inicial.” Pois bem. Inicialmente, convém destacar que a exceção de pré-executividade é cabível, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, para discussão de matérias de ordem pública, cognoscíveis de ofício, e que prescindam de dilação probatória. Essa limitação visa preservar a celeridade e a eficácia da execução, razão pela qual impõe-se o exame cauteloso da pertinência das alegações trazidas sob essa via de defesa. No tocante à ausência de assinatura de duas testemunhas no contrato executado, importa salientar que o documento constante dos autos (Id. 138270810, na origem) foi firmado pelo próprio devedor, com firma reconhecida em Cartório, sendo acompanhado de notificação extrajudicial (Id. 138270813, na origem) e demonstrativos de entrega da lenha pactuada. Tal conjunto probatório é suficiente para conferir validade executiva ao título, na linha do entendimento já consolidado pelo STJ, inclusive em hipóteses análogas que envolvem contrato de compra e venda mercantil, senão vejamos: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDUCUAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. DOCUMENTO PARTICULAR SEM ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. MITIGAÇÃO. POSSIBILIDADE. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. NECESSIDADE. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. "A assinatura das testemunhas é um requisito extrínseco à substância do ato, cujo escopo é o de aferir a existência e a validade do negócio jurídico; sendo certo que, em caráter absolutamente excepcional, os pressupostos de existência e os de validade do contrato podem ser revelados por outros meios idôneos e pelo próprio contexto dos autos, hipótese em que tal condição de eficácia executiva poderá ser suprida" (AgInt no REsp n. 1.945 .956/MA, relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/4/2022, DJe de 27/4/2022). 2. Na hipótese dos autos, ao julgar os embargos infringentes, o Tribunal de origem não se manifestou acerca da comprovação, pelo exequente, por outros meios idôneos, da existência de circunstâncias aptas a comprovar a validade e eficácia do contrato, dependendo o adequado deslinde da demanda, portanto, da análise do acervo fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7/STJ, razão pela qual devem os autos retornar à origem para novo exame da questão. 3 . Agravo interno provido, com a determinação de retorno dos autos às instâncias ordinárias, a fim de que se examine a questão à luz do entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria.” (STJ - AgInt no REsp: 1528479 MT 2015/0082404-9, Relator.: RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 08/05/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/05/2023) Ainda que a literalidade do art. 784, III, do CPC disponha que o título deve ser assinado por duas testemunhas, é entendimento prevalente que a ausência desse requisito formal pode ser mitigada diante da inequívoca demonstração do negócio jurídico, de sua força obrigacional e da autenticidade das assinaturas. A propósito: “RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA EXECUÇÃO - AUSÊNCIA DE ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS – IMPOSSIBILIDADE - MITIGAÇÃO – CONTEXTO FÁTICO QUE COMPROVA A EXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO ENTABULADO - DECISÃO MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO I – A exceção de pré-executividade constitui via excepcional, que deve ser admitida apenas quando a matéria nela suscitada possa ser conhecida de ofício pelo juiz e não dependa de dilação probatória. II – A ausência da assinatura de 2 (duas) testemunhas no contrato, por si só, não é suficiente para descaracterizá-lo, quando restar incontroverso que as partes firmaram o referido negócio jurídico, como no caso concreto.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1002770-63.2023.8.11.0000, Relator.: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 29/03/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/04/2023) “APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO– TÍTULO EXTRAJUDICIAL – INSTRUMENTO PARTICULAR – FALTA DE ASSINATURA DE 02 TESTEMUNHAS – IRRELEVÂNCIA – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO DAS PARTES NA CONTRATAÇÃO – PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA – TÍTULO QUE SE MOSTRA APTO A EMBASAR A EXECUÇÃO – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Conquanto o art. 784, III, do CPC estabeleça ser título executivo extrajudicial, o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas, a orientação do c. STJ é no sentido de que, excepcionalmente, pode ser mitigada a exigência da assinatura de duas testemunhas no documento. A ausência da assinatura de testemunhas não tem o condão de afastar a exequibilidade do título, porque subsiste a assinatura do devedor que, em momento algum, negou a existência do contrato e os termos do negócio jurídico celebrado, tampouco alegou vício de consentimento na sua formalização.” (TJ-MT 00078092520188110003 MT, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 24/08/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/08/2022) Com efeito, dispõe o art. 783 do CPC que “a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível”. No caso, o contrato de compra e venda estabelece cláusulas claras quanto ao objeto (2.000 metros estéreos de lenha teca), ao preço fixo (R$130,00 o metro estéreo), ao prazo e à forma de entrega, de modo que a obrigação ali contida é dotada de certeza e exigibilidade. O inadimplemento também é expressamente regulado no pacto, prevendo-se a aplicação de multa compensatória de 40% sobre o volume inadimplido (Cláusula 6ª). No ponto referente à alegação de ausência de liquidez pela falta de três cotações de mercado, verifica-se que tal exigência decorre de cláusula contratual (Cláusula 6ª, item "a"), que estipula que o preço de referência para o cálculo da multa seria a média das cotações de mercado na data da entrega. Contudo, a exequente recorrida apresentou planilha de cálculo (Id. 138270823, na origem), considerando o valor de R$160,00 (cento e sessenta reais) como parâmetro, bem como orçamento (Id. 138270819, na origem), indicando valor de mercado. O executado agravante, por sua vez, limita-se a impugnar a ausência de três cotações, sem, contudo, demonstrar efetiva divergência no valor ou apresentar contraprova. Logo, a mera ausência das três cotações não desnatura a liquidez do título, pois o quantum devido restou suficientemente delimitado pela planilha acompanhada do demonstrativo de débito e dos elementos probatórios constantes dos autos. Ainda, quanto à alegação de continuidade das entregas após a notificação de rescisão do contrato, com suposta novação tácita do ajuste, os autos não contêm elementos probatórios robustos que evidenciem alteração contratual posterior à notificação enviada pela exequente (Id. 138270813, na origem). O extrato apresentado pelo agravante não elide, por si só, a eficácia da notificação, tampouco comprova a existência de novo pacto. Ademais, a Cláusula 6ª do contrato estabelece que o inadimplemento constitui causa de rescisão automática, legitimando a cobrança da multa. Ademais, a discussão quanto à continuidade da entrega da lenha após a notificação de rescisão e a alegada novação também exige prova da dinâmica fática contratual posterior, que extrapola a cognição sumária da exceção. Logo, ainda que o agravante invoque vícios formais do título, a argumentação se entrelaça com discussões de fato e prova, sendo inviável, portanto, sua análise na via estreita da exceção de pré-executividade, como corretamente reconhecido pelo juízo de origem. Nessa mesma linha já decidi: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – ARGUIÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE REQUISITOS – QUESTÕES QUE DEMANDAM DILAÇÃO PROBATÓRIA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A Exceção de Pré-executividade tem cabimento nos casos em que possam ser apreciadas matérias de ofício pelo Julgador, ou seja, sem a necessidade de produção de provas, contudo, as circunstâncias do caso concreto demonstram a necessidade de instrução, logo, mostra-se acertada a decisão que rejeitou o incidente.” (TJ-MT - AI: 10027662620238110000, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 24/05/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/05/2023) Também não se sustenta o argumento de que a multa de 40% seria abusiva. Trata-se de cláusula penal livremente pactuada entre partes empresárias, em relação jurídica paritária, não se aplicando, por isso, o Código de Defesa do Consumidor. O STJ tem reiteradamente reconhecido a validade de cláusulas penais estipuladas com base no art. 412 do Código Civil, desde que não se revelem manifestamente desproporcionais, o que não se verifica na hipótese em apreço. Por fim, ainda que se discuta a quantidade efetivamente entregue (se 83 ou 466 metros estéreos), a alegação do agravante não encontra respaldo nos documentos acostados aos autos de forma inequívoca. A planilha apresentada pela exequente recorrida, com base no saldo devedor de 1.917 metros, encontra amparo nas cláusulas contratuais e na dinâmica da execução, e eventual divergência quanto à entrega da mercadoria exigiria, de fato, instrução probatória incompatível com a via estreita da exceção de pré-executividade, de modo que não há qualquer reparo a fazer na decisão impugnada. A propósito: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL (MULTA COMPENSATÓRIA DE 40% AJUSTADA EM CONTRATO COMPRA E VENDA DE MILHO) - IMPROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA EXECUÇÃO FACE À INEXIGIBILIDADE DO CRÉDITO - INOCORRÊNCIA – CERTEZA E EXIGIBILIDADE DECORRENTE DA LIVRE PACTUAÇÃO – QUANTUM LIQUIDÁVEL (ART. 786, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15)– ALEGADO EXCESSO DE EXECUÇÃO – CLÁUSULA ADMITINDO A COBRANÇA DA MULTA PELO EQUIVALENTE EM DINHEIRO – CONTRATO QUE DEFINE O PREÇO DA SACA AINDA QUE OCORRA A VARIAÇÃO DO PREÇO NO MERCADO – NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DO PREÇO PREESTABELECIDO – PRETENDIDA REDUÇÃO DO PERCENTUAL DA MULTA (40%) - ALEGADA EXCESSIVIDADE– INOCORRÊNCIA – NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DA NATUREZA E FINALIDADE DO NEGÓCIO – PERCENTUAL QUE VISA DESESTIMULAR O COMPORTAMENTO OPORTUNISTA DO PRODUTOR VENDEDOR E MITIGAR OS PREJUÍZOS QUE A COMPRADORA EXPERIMENTARÁ COM A AQUISIÇÃO DO PRODUTO NO MERCADO - EMBARGOS À EXECUÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTES - RECURSO PROVIDO EM PARTE. No caso de descumprimento integral do contrato de compra e venda de milho, de modo a não pairar dúvidas pontuais a serem sanadas através de ação judicial de conhecimento, plenamente exequível a multa compensatória quando o montante (correspondente em dinheiro da fração do produto não entregue) é facilmente liquidável na forma do parágrafo único do art. 786 do CPC/15. Apesar admitir a cobrança da multa compensatória pelo correspondente em pecúnia do percentual estipulado sobre o volume do produto (milho) não entregue, se o contrato de compra e venda exequendo prevê expressamente um preço fixo para o valor da saca da referida commodity (preço da saca de milho), definindo-o como inalterável, ainda que ocorra a variação do preço no mercado, não poderá o comprador, no momento da apuração do valor da multa, valer-se da cotação do produto na data do ajuizamento da execução, sob pena de excesso de execução. Embora a norma do art. 413 do CC/2002, admita, em tese, a redução equitativa da multa compensatória pelo juiz, certo é que o mesmo dispositivo estabelece que a conveniência dessa redução haverá de ser aferida à luz da natureza e a finalidade do negócio. Assim, com a finalidade e de desestimular o comportamento oportunista do produtor alienante – que, diante do aumento da cotação da commodity prometida em contrato de compra e venda antecipada a preço prefixado, opta por não entregar o produto – bem como para indenizar os prejuízos que o adquirente experimentará com a necessária aquisição do produto faltante, de última hora, a fim de honrar seus compromissos com terceiros, deve ser mantida a multa compensatória convencionada na ordem de 40% do correspondente em pecúnia do produto não entregue, sob pena de se chancelar uma indevida frustração da confiança depositada pela adquirente no negócio.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 00075419520198110015, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 13/12/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/12/2023) “APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE MILHO. INCIDÊNCIA DA TEORIA DA IMPREVISÃO. INAPLICABILIDADE - ALEGAÇÃO DE FRUSTRAÇÃO DE SAFRA EM DECORRÊNCIA DA PRODUÇÃO DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. VARIAÇÕES CLIMÁTICAS. INVIABILIDADE. CLÁUSULA EXPRESSA DE ASSUNÇÃO DE TODOS OS RISCOS DECORRENTES DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR . ONEROSIDADE EXCESSIVA DO CONTRATO NÃO DEMONSTRADA. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 413 DO CÓDIGO CIVIL. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO . As intempéries climáticas para afastar ou reduzir a aplicação da multa contratual estabelecida, não se sustenta, dada a natureza do contrato firmado. Isso porque, ao agricultor que trabalha com safra futura não cabe alegar como motivo de desobrigação de cumprimento do pacto, a frustração da colheita com base em eventos climáticos, já que é da natureza da sua atividade, e os riscos assumidos por ambas as partes são inerentes à forma convencionada para a entrega e pagamento pelo produto. A previsão contratual é de que a multa incidiria, havendo o descumprimento não se aplicando a isenção de responsabilidade por caso fortuito e força maior. Não se aplica a teoria da imprevisão aos contratos de venda antecipada de safra agrícola, porquanto ao contratar as partes assumem riscos conhecidos e inerentes ao negócio jurídico, tais como a oscilação do preço de mercado do produto e a queda da produtividade, tendo sido tais elementos considerados no momento da fixação do preço da avença. Ademais, os contratos aleatórios são incompatíveis com a teoria da imprevisão, porquanto sua principal característica é a incerteza com relação aos acontecimentos futuros, até mesmo quanto ao objeto da avença. Assim, a ocorrência de fato imprevisível não elide a parte vendedora no cumprimento do contrato, principalmente quando há cláusula expressa de assunção de todos os riscos decorrentes de caso fortuito ou força maior. No tocante a pretensão de redução da multa de 40% para 10%, tem-se que a onerosidade não se encontra efetivada, bem como não ultrapassa o valor do principal, a considerar que foi estipulada livremente pelas partes. Portanto, não se aplica o artigo 413 do Código Civil. No caso, houve adequação do valor da saca, consoante o previsto em contrato, o que enseja a sucumbência mínima da parte apelada, e não recíproca, como defendido.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 0001453-45.2017.8 .11.0101, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 31/01/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/02/2023) Portanto, sob o prisma da lógica subsuntiva, a tese do agravante quanto à nulidade do título (tese) confronta-se com o conjunto probatório robusto e com a adequação formal e material do contrato à hipótese do art. 784, III, do CPC (antítese), culminando na síntese pela higidez da decisão agravada, que corretamente rejeitou a exceção de pré-executividade, autorizando o prosseguimento da execução. Diante de todo o exposto, em consonância com os princípios da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda), da instrumentalidade das formas e da boa-fé objetiva (art. 113 e 422 do Código Civil), a decisão agravada deve ser mantida. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Processo nº 1024207-08.2021.8.11.0041

ID: 260812419

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1024207-08.2021.8.11.0041

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

PAULO MAGALHAES

Acórdão

Advogados:

NAGELA MARIA FERREIRA DE CASTRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1024207-08.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indeniz… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1024207-08.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE Turma Julgadora: [DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO] Parte(s): [PAULO MAGALHAES - CPF: 022.390.001-04 (APELADO), NAGELA MARIA FERREIRA DE CASTRO - CPF: 054.441.861-10 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE CUIABÁ - CNPJ: 03.533.064/0001-46 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO INDEVIDA EM DÍVIDA ATIVA – BLOQUEIO DE VALORES – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – MANUTENÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Recurso de Apelação interposto pelo Município de Cuiabá contra sentença que, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por Paulo Magalhães, declarou a inexistência de relação jurídico-tributária entre as partes, determinou a anulação de débitos de IPTU indevidamente lançados e condenou o ente municipal ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (I) saber se há fundamento para a condenação do Município ao pagamento de indenização por danos morais em razão da indevida inscrição do autor na dívida ativa e dos bloqueios judiciais realizados; e (II) verificar se o valor fixado para a indenização deve ser reduzido por suposta desproporcionalidade. III. Razões de decidir 3. A indevida inscrição do apelado em dívida ativa, seguida de bloqueios judiciais, caracteriza falha na administração pública, resultando em grave constrangimento ao autor, configurando dano moral in re ipsa, independentemente de prova de prejuízo concreto. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal de Justiça reconhece que a inscrição indevida em dívida ativa enseja indenização por danos morais, especialmente quando há negligência do ente público na correção do erro cadastral. 5. O valor fixado na sentença (R$ 10.000,00) observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, estando em consonância com precedentes desta Corte e do STJ em casos análogos. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A inscrição indevida em dívida ativa e o consequente bloqueio judicial de valores bancários configuram dano moral in re ipsa, passível de indenização. 2. O arbitramento da indenização deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, podendo ser mantido quando adequado às circunstâncias do caso concreto.” _____________________________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, §6º; CC, art. 186; CPC, art. 373, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 460591/MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 24/03/2014; STJ, AgInt no AREsp 2291017/MA, Rel. Min. Marco Buzzi, DJe 14/06/2023; TJMT, N.U 0050719-55.2015.8.11.0041, Rel. Des. Mário Roberto Kono de Oliveira, DJE 14/08/2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Município de Cuiabá contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Especializada de Execução Fiscal Municipal de Cuiabá, que nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por Paulo Magalhães, julgou parcialmente procedente o pedido exordial, nos seguintes termos: “(...) Diante do exposto, e em consonância com a fundamentação supra, ACOLHO PARCIALMENTE o pedido, para o fim de: (i) DECLARAR a inexistência de relação jurídico-tributária entre o demandante e o demandado, em relação às dívidas de IPTU objeto dos autos; (ii) DETERMINAR a anulação dos débitos de IPTU lançados nas inscrições imobiliárias objetadas, em nome do requerente; (iii) CONDENAR o Município de Cuiabá ao pagamento de indenização por danos morais ao autor no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária pelo IPCA-E a partir desta decisão e juros de mora, a contar do evento danoso (primeira inscrição em dívida ativa), na forma do artigo 1-F da Lei nº 9494/97 (Súmulas 54 e 362 do STJ c/c com o julgamento do Tema 905). Por conseguinte, com a procedência, JULGO EXTINTA a presente ação, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Deixo de condenar a Fazenda Pública ao pagamento das custas e despesas processuais, em razão do que dispõe o art. 3º, I, da Lei Estadual nº 7.603/01 e o art. 236 da CNGC. Condeno o ente público ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, na forma do artigo 85, caput, §2º e §3º, do CPC. Esta sentença não está sujeita a reexame necessário porque não se amolda a nenhuma das hipóteses versadas no art. 496 do CPC. Preclusas a vias recursais, certifique-se o trânsito em julgado, arquive-se estes autos, com as baixas e demais formalidades de estilo.”. Inconformado, aduz o Apelante que, o apelado não comunicou previamente qualquer erro cadastral ao Município, fato que teria viabilizado a correção célere da inconsistência. Ressalta que, tão logo tomou ciência da alegada indevida inclusão do CPF do recorrido nas execuções fiscais, prontamente providenciou a regularização cadastral e requereu a extinção dos feitos e a liberação de valores bloqueados. Destaca, ainda, que o apelado possui outras dívidas legítimas perante o Município, reconhecendo ser proprietário de um dos imóveis executados, razão pela qual parte das penhoras ocorreria de qualquer maneira. Defende a inexistência de dano moral indenizável, sustentando que não houve violação à honra ou constrangimento exacerbado, mas mero aborrecimento decorrente de falha administrativa prontamente corrigida. Invoca a Súmula 385 do STJ, que afasta a indenização por danos morais em casos de anotações indevidas quando há prévia inscrição legítima do devedor. Argumenta que o recorrido não comprovou qualquer prejuízo concreto, cabendo-lhe o ônus probatório, nos termos do artigo 373, I, do CPC. Subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório, argumentando que o valor de R$ 10.000,00 é desproporcional e incompatível com casos semelhantes. Cita precedentes nos quais foram fixadas indenizações inferiores, variando entre R$ 1.000,00 e R$ 5.000,00, em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a fim de evitar o enriquecimento sem causa. Diante do exposto, pleiteia a reforma da sentença para afastar a condenação por danos morais ou, subsidiariamente, a redução do valor arbitrado. O apelado, apesar de devidamente intimado, deixou de apresentar contrarrazões. O parecer da Procuradoria-Geral de Justiça é pelo desinteresse de intervenção ministerial (Id. 242832176). Isento de preparo, conforme previsto no art. 1007, §1º, do Código de Processo Civil e art. 73, §1º, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça (Id. 241466159). É o relatório. Desembargador JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Relator V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade. Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Município de Cuiabá contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Especializada de Execução Fiscal Municipal de Cuiabá, que, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por Paulo Magalhães, acolheu parcialmente o pedido inicial, declarando a inexistência de relação jurídico-tributária, anulando débitos de IPTU e condenando o Município de Cuiabá ao pagamento de danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária pelo IPCA-E, além de honorários sucumbenciais fixados em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, nos termos do artigo 85, caput, §§ 2º e 3º, do CPC. Em síntese, a presente demanda decorre da indevida inscrição do nome do autor, ora apelado, na dívida ativa do Município de Cuiabá, em razão de débitos de IPTU relativos a imóveis que jamais lhe pertenceram. Tal equívoco resultou no ajuizamento de três execuções fiscais e na imposição de bloqueios judiciais sobre seus valores bancários. O apelado alegou na petição inicial que foi surpreendido pelas medidas restritivas e precisou ingressar com ações judiciais para demonstrar que nunca fora proprietário dos imóveis vinculados à cobrança, sendo vítima de um erro cadastral cometido pela Administração Pública. Em decorrência desse equívoco, enfrentou transtornos financeiros e emocionais, além de arcar com despesas advocatícias para reverter a situação. O Município de Cuiabá apresentou contestação arguindo a incompetência absoluta do Juizado, a ausência de comprovação dos danos alegados e a inexistência de responsabilidade estatal, requerendo a improcedência da ação. Diante dos fatos, o Juízo a quo reconheceu a responsabilidade do Município, condenando-o ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, além das custas e despesas processuais, bem como honorários sucumbenciais fixados em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, nos termos do artigo 85, caput, §2º e §3º do Código de Processo Civil. Inconformado, o Município de Cuiabá interpôs o presente recurso de apelação, pleiteando a reforma da sentença, alegando, em síntese, que não houve dano moral indenizável, pois o bloqueio bancário decorreu de um procedimento regular e sem qualquer abuso, e que, caso se entenda de forma diversa, os valores fixados na condenação devem ser reduzidos. Com essas considerações passo a análise do mérito. O âmago do presente recurso concentra-se, primordialmente, no pleito de afastamento da condenação por danos morais ou, alternativamente, na mitigação do quantum indenizatório fixado. Compulsando os autos, verifica-se que a parte apelada teve contra si ajuizada a execução fiscal n.º 0046672-09.2013.8.11.0041, fundada nas Certidões de Dívida Ativa n.º 332393/2009, 391407/2009, 463173/2010, 609835/2011, 788446/2012 e 885244/2013, referentes a débitos de IPTU incidentes sobre o imóvel com a inscrição imobiliária n.º 01.3.44.007.0015.001. Além da inclusão em dívida ativa, nos autos da execução fiscal n.º 0046672-09.2013.8.11.0041, houve o bloqueio efetivo de existente nas contas bancárias da parte apelada, executada naquele feito, no montante de R$ 852,66 (oitocentos e cinquenta e dois reais e sessenta e seis centavos) (Pje 1º grau - autos da ação de execução fiscal n.º 0002039-76.2016.8.11.0082, em Id. 28015993, pág. 04). Nos autos supracitados, verifica-se que o apelado opôs exceção de pré-executividade, registrada sob Id. 51524012. Em consequência, o Município de Cuiabá manifestou-se nos autos, desistindo da execução, com fundamento no Parecer n.º 065/2021/PGM-PFM/RASJ, que reconheceu a ilegitimidade passiva do executado e comprovou a inexistência de relação jurídico-tributária. Tal reconhecimento reforça a ausência de fundamento jurídico para a cobrança, evidenciando a irregularidade da medida executória anteriormente imposta. Além deste caso, destaco também o ajuizamento da ação de execução fiscal n.º 0002039-76.2016.8.11.0082, pelo Município de Cuiabá em face do apelado, fundada na Certidão de Dívida Ativa n.º 142113, referente a auto de infração decorrente do processo administrativo n.º 104838/2015, sobre o imóvel com a inscrição imobiliária n.º 01.3.44.007.0015.001. Nestes autos o Município de Cuiabá novamente requereu a extinção da ação, com a seguinte justificativa: “Conforme se depreende do Parecer nº. 07/2020/PGM/PFM-NAGEF, com espeque na Súmula Administrativa PGM/CUIABÁ/Nº(s) 05, este Ente Municipal reconheceu a ilegitimidade da parte executada Paulo Magalhães, haja vista que este, nunca fora proprietário do imóvel de inscrição nº 01.3.44.007.0015.001, que deu origem aos créditos não tributários cobrados. [...] Assim, diante do exposto, desnecessário o prosseguimento da demanda, razão pela qual se requer a EXTINÇÃO da presente execução, na forma do artigo 26, da Lei nº 6.830/80, [...]. (Pje 1º grau - autos da ação de execução fiscal n.º 0002039-76.2016.8.11.0082, em Id. 39268890, pág. 96.) Diante dos fatos narrados, resta evidente a desorganização e negligência do Município de Cuiabá na condução das execuções fiscais. Ainda que tenha reconhecido a ilegitimidade passiva do apelado na ação de execução fiscal n.º 0002039-76.2016.8.11.0082, em 2020, o ente municipal permitiu que outra ação idêntica, n.º 0046672-09.2013.8.11.0041, seguisse seu curso, apenas vindo a admitir o equívoco no ano seguinte, em 2021. Tal circunstância evidencia não apenas a falha na gestão dos processos executórios, mas também a omissão deliberada ou, no mínimo, o grave descaso do Município na administração do cadastro tributário. Mesmo ciente do erro, o ente municipal deixou de adotar as providências necessárias para evitar a continuidade da cobrança indevida, expondo o apelado a constrangimentos sucessivos decorrentes de medidas executórias ilegítimas. Ademais, a emissão de pareceres administrativos em anos distintos reforça a conclusão de que não houve qualquer diligência para sanar o erro de forma célere e eficaz. A insistência na manutenção de execuções manifestamente infundadas revela não apenas a ineficiência do controle interno da municipalidade, mas também o total desrespeito aos princípios da razoabilidade e da segurança jurídica. Diferentemente do que sustenta a Municipalidade, não se trata de mero dissabor, mas de um dano efetivo à esfera moral do apelado, decorrente das constrições ilegítimas a que foi submetido. O abalo extrapatrimonial causado vai além de um simples incômodo, configurando violação à dignidade do executado, que se viu compelido a enfrentar medidas restritivas severas por uma dívida que jamais lhe pertenceu. Dessa forma, é inegável que o Município de Cuiabá, ao ignorar a possibilidade de que suas ações causassem prejuízos indevidos ao apelado, agiu com flagrante negligência administrativa. A parte executada jamais deveria ter figurado no polo passivo das execuções fiscais, e o reconhecimento tardio desse erro não exime o ente público de sua responsabilidade pelo evidente abuso cometido. Por essa vertente, o Superior Tribunal de Justiça: “[...] É cabível indenização por dano moral no caso de indevida inscrição em dívida ativa na hipótese em que o nome do autor da ação de indenização é homônimo ao do sujeito passivo da exação, o que provocou o equívoco na inscrição de seu nome. Isso porque a municipalidade negligenciou nos devidos cuidados na aferição da identidade real do contribuinte, provocando a inscrição indevida por débitos pelos quais não tinha responsabilidade. [...] (STJ, Segunda Turma, AgRg no AREsp 460591/MG, relator Ministro Humberto Martins, Dje 24/3/2014). “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA NÃO CONHECER DO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE DEMANDADA. 1. Está pacificado nesta Corte Superior que a inscrição indevida em cadastro negativo de crédito, por si só, configura dano in re ipsa.Precedentes.1.1. É inviável o acolhimento da tese da ausência de responsabilidade civil da agravante, pois, para tanto, seria imprescindível o revolvimento do acervo fático-probatório, providência vedada a esta Corte Superior ante o óbice da Súmula 7/STJ. 2. A ausência de enfrentamento da questão objeto da controvérsia pelo Tribunal de origem impede o acesso à instância especial, porquanto não preenchido o requisito constitucional do prequestionamento, nos termos da Súmula 282 e 356 do STF, aplicável por analogia. 3. A falta de indicação, pela parte recorrente, de quais dispositivos legais teriam sido objeto de interpretação divergente pelo acórdão recorrido implica em deficiência da fundamentação do recurso especial, incidindo o teor da Súmula 284 do STF, por analogia. 4. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 2291017 MA 2023/0035447-3, Relator: MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/06/2023) [destaquei]”. Da mesma forma, tanto o Tribunal de Justiça quanto a Turma Recursal deste Estado têm consolidado entendimento nesse sentido. “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA – ATO ILÍCITO – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER DE INDENIZAR –CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA MODIFICADA – RECURSO PROVIDO. Na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. A fixação do quantum indenizatório a título de danos morais deve sopesar os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, atentando-se ao grau de culpa do ofensor, extensão dos danos e capacidade econômica das partes. Considerando as particularidades do caso e os fatores acima expostos, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), atende ao caráter reparatório e punitivo da condenação, sem provocar o enriquecimento imerecido. Sentença modificada. Recurso provido. (TJ-MT, N.U 0050719-55.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 25/07/2023, Publicado no DJE 14/08/2023)” “RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE OBRIGAÇAO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - VENDA DE VEÍCULO – COMUNICADO DE VENDA REALIZADO – AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO CADASTRAL POR PARTE DO RECLAMADO – INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA – DANO MORAL CONFIGURADO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. In casu, a parte Autora comprovou que realizou o comunicado de venda do seu veículo na época da venda. Todavia, por equívoco do reclamado, a propriedade do veículo não foi alterada. 2. A jurisprudência é assente no sentido de que a inscrição indevida na dívida ativa é apta a ensejar a responsabilização por danos morais, pois tal conduta viola os direitos da personalidade dos inscritos, notadamente seu nome, sua imagem e sua honra. 3. Recurso conhecido e provido. (TR-MT, N.U 1042276-54.2022.8.11.0041, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 20/05/2024, Publicado no DJE 24/05/2024) RECURSO INOMINADO CÍVEL. FAZENDA PÚBLICA. EXECUÇÃO FISCAL. COBRANÇA DE IPTU. DÉBITO QUITADO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. NEGLIGÊNCIA NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO E REGISTRO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. VALOR DO DANO. REDUÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TR-MT, N.U 1007950-89.2023.8.11.0055, TURMA RECURSAL CÍVEL, WALTER PEREIRA DE SOUZA, Primeira Turma Recursal, Julgado em 27/11/2023, Publicado no DJE 01/12/2023)” A inscrição indevida em dívida ativa e suas consequências possuem gravidade suficiente para justificar a reparação por danos morais. No arbitramento do valor, não há critérios rígidos pré-estabelecidos, cabendo ao julgador ponderar as circunstâncias do caso concreto, considerando a condição das partes, o grau de culpa e o caráter compensatório da indenização, sem que isso resulte em enriquecimento sem causa. Diante desse contexto e das provas constantes nos autos, a quantia fixada na origem revela-se adequada, sem configurar excesso ou destoar do entendimento predominante nesta instância recursal. Assim, mantenho a condenação do Município de Cuiabá ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A propósito, destaca-se o seguinte julgado: "APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROTESTO INDEVIDO DE CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA (CDA) – FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A fixação do valor do dano moral em R$ 10.000,00 (dez mil reais), em razão de protesto indevido de certidão de dívida ativa, atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 2. Recurso não provido”. (N.U 1026919-34.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 28/08/2024, Publicado no DJE 31/08/2024)” Quanto aos consectários legais, a Emenda Constitucional n.º 113/2021 determina que, nas condenações envolvendo a Fazenda Pública, os valores deverão ser atualizados pela taxa Selic, aplicada de forma única e acumulada mensalmente, desde 9/12/2021. Para períodos anteriores, devem ser observados os critérios fixados nos Temas 810 do STF e 905 do STJ. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONDENAÇÕES JUDICIAIS CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. RELAÇÃO JURÍDICA NÃO TRIBUTÁRIA. JUROS DE MORA. PARÂMETROS. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009. OBSERVÂNCIA IMEDIATA. SUPERVENIÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 113/2021. APLICABILIDADE DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, após a interposição do presente agravo, afetou o RE 1.317.982 com a finalidade de uniformizar a controvérsia acerca da "validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso." No referido julgamento, foi fixada a tese correspondente ao Tema 1.170 no sentido de ser "aplicável às condenações da Fazenda Pública envolvendo relações jurídicas não tributárias o índice de juros moratórios estabelecido no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009, a partir da vigência da referida legislação, mesmo havendo previsão diversa em título executivo judicial transitado em julgado." 2. Por outro lado, o acórdão recorrido determinou a incidência de juros de mora e de correção monetária nos termos da legislação vigente à época dos fatos. Assim, em face do julgado acima referenciado, cumpre adequar a decisão atacada aos precedentes vinculantes das Cortes de vértice, aplicando o regime de juros moratórios da atual redação do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, mas somente no período imediatamente seguinte à entrada em vigor da Lei n. 11.960/2009, até a data da promulgação da Emenda Constitucional n. 113/2021. 3. Em suma, os juros de mora, no caso concreto, incidem nos seguintes termos: (i) relativamente ao período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (ii) quanto ao período posterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, incidem juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (com a ressalva destacada no parágrafo anterior); e (iii) para as parcelas vencidas a partir de 9/12/2021, é de se fixar a Selic, nos termos do art. 3º da EC n. 113/2021. 4. A propósito da correção monetária, conforme estabelecido no julgamento repetitivo do Tema 905 deste Superior Tribunal de Justiça, inaplicável a redação do art. 1º-F da Lei 9.494/2007, por ter sido declarada inconstitucional neste ponto. Portanto, deve ser observada a aplicação de índices capazes de captar o fenômeno inflacionário, até o advento da citada Emenda, ocasião em que prevalecerá "a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente." 5. Agravo interno provido. (AgInt no REsp n. 1.902.479/SP, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 14/5/2024, DJe de 20/5/2024)”. Esta Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso consolidou o seguinte entendimento: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO -AÇÃO INDENIZATÓRIA – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO –– ALEGAÇÃO DE OMISSÃO – OCORRÊNCIA – JUROS E CORREÇÃO – CONSECTÁRIOS LEGAIS QUE DEVEM SER FIXADOS CONFORME OS TEMAS 810 DO STF E 905 DO STJ ATÉ O ADVENTO DA EC 113/2021, APÓS, APLICAÇÃO DA TAXA SELIC - OMISSÃO RECONHECIDA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1 - Os embargos de declaração são cabíveis somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado ou, ainda, para sanar erro material. 2 – Deve incidir sobre o valor, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, consoante art. 3º da EC 113/2021, abrangendo tanto a atualização monetária, quanto a compensação de mora. (TJ-MT, N.U 1002770-46.2019.8.11.0051, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 30/10/2023, Publicado no DJE 10/11/2023)” “DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto pela Fazenda Pública contra sentença que condenou o ente público ao pagamento de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), a título de danos morais, decorrentes de acidente de trânsito ocasionado por ação de policial militar. II. Questão em discussão: 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é possível afastar a responsabilidade civil do Estado pelo acidente de trânsito; e (ii) determinar se o quantum indenizatório deve ser reduzido em observância aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. III. Razões de decidir: 3. A responsabilidade civil do Estado pelo evento danoso foi reconhecida em outros autos, sendo incabível a rediscussão de questão já decidida. 4. Quanto ao valor arbitrado, a aplicação do método bifásico indica que o montante de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) ultrapassa os patamares jurisprudenciais estabelecidos em casos similares. Assim, o quantum foi reduzido para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 5. A atualização do débito deve seguir a taxa SELIC a partir de 9.12.2021, vedada a cumulação com outros índices de correção monetária ou juros de mora, conforme a EC n. 113/2021. IV. Dispositivo e tese: 6. Recurso provido em parte. Tese de julgamento: “O valor da indenização por danos morais deve ser fixado de forma proporcional e razoável, considerando as circunstâncias do caso e os precedentes, admitida a redução do quantum quando excessivo.” Dispositivos relevantes citados: EC n. 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1152541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 13.9.2011; TJMT, N.U 0029263-49.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Gilberto Lopes Bussiki, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 27.2.2024; TJMT, N.U 0026376-92.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Antônio Veloso Peleja Júnior, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 29.11.2022. (N.U 0026374-25.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 11/12/2024, Publicado no DJE 17/12/2024) Dessa forma, por versar sobre matéria de ordem pública, a superveniência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 autoriza sua revisão de ofício, independentemente do teor dos pedidos, sem que tal medida configure afronta ao princípio da non reformatio in pejus. Ante o exposto, e em plena consonância com a fundamentação expendida, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Município de Cuiabá/MT, mantendo incólume a condenação por danos morais. Quanto aos consectários legais, determino, ex officio, a aplicação dos critérios estabelecidos nos Temas 810/STF e 905/STJ para juros e correção monetária até a vigência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 (9/12/2021), a partir de quando deverá incidir exclusivamente a taxa SELIC para ambos os encargos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Processo nº 1007155-31.2023.8.11.0040

ID: 260834654

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007155-31.2023.8.11.0040

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

EMERSON OBERDAN DE SOUZA

Acórdão

Advogados:

RICARDO FERREIRA GARCIA

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CARLOS EDUARDO BLANK

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1007155-31.2023.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [IPVA - Imposto Sobre Propriedade de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1007155-31.2023.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [IPVA - Imposto Sobre Propriedade de Veículos Automotores, Obrigação de Fazer / Não Fazer] Relator: Des(a). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE Turma Julgadora: [DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO] Parte(s): [EMERSON OBERDAN DE SOUZA - CPF: 802.534.239-53 (APELADO), RICARDO FERREIRA GARCIA - CPF: 110.797.078-40 (ADVOGADO), CARLOS EDUARDO BLANK - CPF: 041.777.241-65 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (APELANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO TRIBUTÁRIO – RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO TRIBUTÁRIO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – MANUTENÇÃO INDEVIDA DO NOME DO AUTOR EM CADASTROS RESTRITIVOS APÓS QUITAÇÃO DO DÉBITO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO – DANO MORAL CONFIGURADO – RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Recurso de apelação interposto pelo Estado de Mato Grosso contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação declaratória de inexistência de débito tributário, condenando o ente público ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em razão da manutenção indevida do nome do autor em cadastro restritivo de crédito mesmo após a quitação integral do IPVA. II. Questão em discussão 2. A controvérsia recursal cinge-se em definir: (i) se há responsabilidade do Estado pela permanência indevida do nome do autor nos cadastros de inadimplentes; e (ii) se o valor da indenização fixado na sentença é razoável e proporcional. III. Razões de decidir 3. Restou demonstrado nos autos que o débito foi quitado em 25/01/2021, mas a exclusão da restrição ocorreu somente em 26/09/2023, configurando ato ilícito. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal reconhece a caracterização do dano moral in re ipsa em casos de manutenção indevida do nome do devedor em cadastros restritivos, independentemente de prova concreta do abalo sofrido. 5. O valor da indenização arbitrado pelo juízo a quo está em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, não se mostrando excessivo nem ínfimo para reparar o dano e desestimular a reiteração da conduta. 6. Correção monetária e juros devem observar os critérios fixados nos Temas 810/STF e 905/STJ até a vigência da EC n.º 113/2021, a partir de quando incide exclusivamente a taxa SELIC. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A manutenção indevida do nome do contribuinte em cadastros restritivos de crédito, após a quitação integral do débito, caracteriza ato ilícito e enseja indenização por danos morais in re ipsa. 2. O valor da indenização deve observar os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, garantindo seu caráter reparatório e punitivo sem configurar enriquecimento sem causa.” __________________________________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, V e X; CC, art. 186; CPC, art. 487, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1540833/SC; TJMT, Apelação Cível 0002944-27.2018.8.11.0045. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto pelo Estado de Mato Grosso contra a sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Sorriso, que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito tributário com pedido de tutela de urgência n° 1007155-31.2023.8.11.0040, julgou parcialmente procedente a ação, nos seguintes termos: “(...) Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I do CPC, para DECLARAR A QUITAÇÃO DO DÉBITO (aqui perdeu o objeto na prática a ação porque já reconhecido tal fato), bem como, CONDENAR a parte demandada ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$5.000,00. Isento o ESTADO de custas, em razão da sucumbência mínima do autor, o condeno ao pagamento de honorários de sucumbência, estes fixados na razão de 10% sobre o valor da condenação. Transitada em julgado e nada sendo pleiteado em 15 dias, ao arquivo, com as baixas de praxe.”. Nas suas razões o apelante sustenta a inexistência de conduta ilícita, pois o débito questionado efetivamente existiu, tendo sido inscrito em dívida ativa e posteriormente protestado em razão da inadimplência. Argumenta que o pagamento ocorreu apenas em 2021, após anos do vencimento do IPVA de 2019, e que a baixa da restrição em órgãos de proteção ao crédito deveria ter sido solicitada pela própria parte autora, conforme entendimento jurisprudencial. Defende que a ausência de comunicação automática entre os sistemas de arrecadação e os órgãos restritivos impõe ao devedor o dever de requerer a exclusão do da negativação, assim como nos casos de protesto, e que tal entendimento deve ser aplicado no caso de negativação em órgãos de proteção de crédito, caracterizando culpa exclusiva da vítima, o que não foi feito. Alega que o Estado não se recusou a proceder à baixa e que, tão logo foi notificado, adotou as providências cabíveis. Assim, sustenta a ausência de dano moral, pois não houve ato ilícito nem nexo causal entre a conduta estatal e o suposto prejuízo sofrido. Subsidiariamente, caso mantida a condenação, pleiteia a redução do quantum indenizatório, argumentando que o valor fixado não observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, podendo configurar enriquecimento sem causa. Invoca precedentes jurisprudenciais que arbitram indenizações inferiores em casos semelhantes. Diante do exposto, requer a reforma da sentença para afastar a condenação ao pagamento de danos morais ou, alternativamente, reduzir o montante arbitrado. A Apelada, em Id. 187132169, apresentou contrarrazões requerendo preliminarmente, sustenta a necessidade de apreciação dos embargos de declaração opostos em 29/06/2024, os quais não foram analisados. Requer a correção da omissão para determinar a aplicação do INPC/IBGE como índice de correção monetária a partir do arbitramento da indenização e juros de mora de 1% ao mês desde 27/09/2021. No mérito, alega que, embora a Recorrente sustente o exercício regular de seu direito ao negativar o nome do Recorrido, o pagamento integral do débito, incluindo encargos legais e honorários advocatícios, ocorreu em 17/09/2021, não havendo justificativa para a manutenção de seu nome nos cadastros restritivos até 15/06/2023. Argumenta que a responsabilidade pela exclusão da negativação é do credor, que deve providenciá-la em até cinco dias úteis após a quitação, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. A manutenção indevida da restrição por quase dois anos configura ato ilícito e dano moral presumido (in re ipsa), sendo irrelevante a comprovação de sofrimento concreto. Defende que a indenização arbitrada na sentença é razoável e condizente com precedentes jurisprudenciais que, inclusive, fixam valores superiores. Por fim, requer o desprovimento da apelação, a manutenção integral da sentença e a majoração dos honorários sucumbenciais em grau recursal. O parecer da Procuradoria-Geral de Justiça é pelo desinteresse de intervenção ministerial (Id. 241309664). Isento de preparo, conforme previsto no art. 1007, §1º, do Código de Processo Civil e art. 73, §1º, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça (Id. 239472681). É o relatório. Desembargador JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Relator V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Antes de adentrar ao mérito da questão, cumpre analisar a preliminar relativa à necessidade de apreciação dos embargos de declaração por ele opostos, levantada pelo apelado em sede de contrarrazões, visto que a oposição ocorreu em 29/06/2024 e, até a data da interposição do recurso de apelação, em 12/07/2024, e da apresentação de contrarrazões, em 06/08/2024, ainda não haviam sido analisados. A preliminar, contudo, não merece acolhimento. Registra-se que o juízo a quo procedeu à análise dos embargos de declaração opostos pelo apelado em 07/08/2024, os quais foram rejeitados, mantendo inalterada a sentença. Superada a preliminar, passa-se à análise dos pressupostos de admissibilidade recursal. No caso, verifica-se que o recurso preenche os requisitos necessários ao seu processamento. Assim, conheço do recurso. Em relação ao pedido de atribuição de efeito suspensivo formulado pelo apelante, imperativo destacar que, nos termos da sistemática processual civil estabelecida no artigo 1.012, §3º, incisos I e II, do Código de Processo Civil, tal pleito deve ser formulado por petição autônoma dirigida ao tribunal, no período compreendido entre a interposição do recurso e sua distribuição. Após a distribuição, o pedido deve ser dirigido ao relator, sob pena de não ser apreciado. No presente caso, a apelante formulou o pedido de efeito suspensivo no bojo da própria apelação (Id. 238991173), evidenciando a inadequação da via eleita, o que inviabiliza o conhecimento do recurso quanto a esse ponto. Diante disso, deixo de conhecer o pedido de efeito suspensivo. Delimitadas essas premissas, passo ao exame das insurgências recursais. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Estado de Mato Grosso contra a sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Sorriso, que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito tributário, com pedido de tutela de urgência n.º 1007155-31.2023.8.11.0040, julgou parcialmente procedente a ação, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar a quitação do débito, bem como condenar a parte demandada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), além de honorários sucumbenciais fixados em 10% sobre o valor da condenação. Em síntese, a presente demanda decorre da inclusão indevida do nome do requerente, ora apelado no órgão de proteção de crédito SPC no ano de 2023, por suposto débito de R$ 3.163,41 (três mil cento e sessenta e três reais e quarenta e um centavos), referente a inadimplência de IPVA vencido em 19/08/2019, a qual estaria quitada desde o ano de 2021. A tutela de urgência foi deferida pelo juízo em Id. 238991160, para determinar que o Estado de Mato Grosso promovesse a imediata retirada do nome do reclamante, ora apelado do órgão de proteção de crédito, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais) limitada a R$ 10.000,00 (dez mil reais). O Estado de Mato Grosso apresentou contestação, ocasião em que informou que a referida Certidão de Dívida Ativa foi baixada e a negativação foi excluída, requerendo a extinção do feito diante da perda superveniente do objeto, nos termos do artigo 485, inciso VI, além do não cabimento do dano moral tendo em vista tratar-se de culpa exclusiva da vítima, e subsidiariamente que a fixação do dano moral seja em patamar razoável. Em impugnação o requerente, ora apelado reiterou os pedidos da exordial pugnando pela procedência, com a condenação do requerido, ora apelante ao ressarcimento das custas processuais e ao pagamento dos honorários de sucumbência, por ser medida de justiça. Diante dos fatos, o Juízo a quo julgou parcialmente procedente a ação com resolução do mérito, nos termos de artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, para declarar a quitação do débito, bem como, condenar a parte demandada ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), bem como em honorários de sucumbência fixados sobre o valor da condenação. Irresignado, o Estado de Mato Grosso interpôs o presente recurso de apelação, pleiteando a reforma da sentença, sustentando em síntese, a inexistência de conduta ilícita, exercício regular de direito do credor e culpa exclusiva da vítima. Pois bem. A controvérsia recursal cinge-se em analisar a responsabilidade civil do Estado de Mato Grosso pela manutenção indevida do nome do autor, Emerson Oberdan de Souza, nos cadastros de inadimplentes, mesmo após a quitação integral do débito de IPVA. O Juízo de primeira instância reconheceu a inexistência da dívida, determinou a exclusão da restrição e condenou o ente público ao pagamento de indenização por danos morais, em razão da negativação indevida e prolongada do nome do autor. Com efeito, restou demonstrado nos autos que o nome da parte autora constou nos cadastros de proteção ao crédito, mesmo após ter efetuado o pagamento do débito em 25/01/2021 no valor de R$ 3.387,01 (três mil, trezentos e oitenta e sete reais e um centavo). Em que pese o autor tenha efetuado o pagamento da guia fora do prazo, em 15/06/2023 seu nome ainda constava no cadastro de inadimplentes SPC, mesmo tendo realizado a quitação. Assim, verifica-se de forma inequívoca, que houve o integral pagamento integral do IPVA referente ao ano de 2019 em 25/01/2021, conforme comprovante de pagamento anexado aos autos. Além disso, o autor comprova a liquidação do licenciamento anual e do FUNJUS em 17/09/2021. Ademais, a Certidão Negativa de Débitos, emitida pela própria Secretaria de Estado da Fazenda de Mato Grosso em 14/06/2023, confirma que não há pendências tributárias em nome do autor, reforçando a inexistência de qualquer débito legítimo. Posteriormente o próprio apelante reconhece a inclusão indevida e junta aos autos espelho do sistema em que consta a informação de que a inclusão ocorreu em17/09/2020 e a exclusão somente em 26/09/2023. Deste modo, é inconteste o erro cometido pelo ente público, que poderia facilmente ser evitado mediante maior cuidado e diligência na verificação do pagamento do crédito tributário. Os danos causados à autora demonstram total falta de cautela na conduta do Recorrente, o qual detém responsabilidade sobre os dados cadastrais, em especial aos cadastros restritivos de crédito. O Superior Tribunal de Justiça possui o seguinte entendimento: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MANUTENÇÃO INDEVIDA DO NOME DA AUTORA EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO MORAL CARACTERIZADO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. RAZOABILIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico de que o dano moral, oriundo de inscrição ou manutenção indevida em cadastro de inadimplentes, prescinde de prova, configurando-se in re ipsa, visto que é presumido e decorre da própria ilicitude do fato. 2. O valor arbitrado pelas instâncias ordinárias a título de danos morais somente pode ser revisado em sede de recurso especial quando irrisório ou exorbitante. No caso, o montante fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais) não se mostra exorbitante nem desproporcional aos danos causados à vítima, que teve seu nome mantido em órgãos de proteção ao crédito após o pagamento da dívida. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 1540833 SC 2019/0201796-2, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/11/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/11/2019). [g.n.]”. No presente caso, o dano moral resulta do próprio ato ilícito cometido pelo réu, prescindindo de comprovação específica, pois a indevida inclusão do nome da parte autora nos órgãos de proteção ao crédito configura, por si só, a ofensa passível de reparação. Nesse sentido é a jurisprudência: “RECURSO INOMINADO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÕES DE REPARAÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C PEDIDO DE LIMINAR. MANUTENÇÃO INDEVIDA DA NEGATIVAÇÃO DO NOME DO AUTOR. IMPOSTO SOBRE VEÍCULO AUTOMOTOR – IPVA. INOBSERVÂNCIA DO PRAZO ESTIPULADO NA SÚMULA 548 DO STJ. NÃO RETIRADA DOS CADASTROS RESTRITIVOS APÓS O PAGAMENTO DA DÍVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM REPARATÓRIO REDUZIDO, POIS EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Recurso Inominado Nº 201801009183 Nº único: 0034984-44.2017.8.25.0001 - 1ª TURMA RECURSAL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator (a): Geilton Costa Cardoso da Silva - Julgado em 05/06/2020).(TJ-SE - RI: 00349844420178250001, Relator: Geilton Costa Cardoso da Silva, Data de Julgamento: 05/06/2020, 1ª TURMA RECURSAL)”. “RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. Fazenda do Estado. Cobrança de IPVA de veículo objeto de alienação e posterior leilão. Inclusão do nome da autora no CADIN e no cadastro do DETRAN. Administração que efetuou a cobrança de IPVA não devido pela autora, inscrevendo o nome dela no CADIN. Posterior cancelamento. Equívoco incontroverso por ato comissivo do ente público. Ato ilício caracterizado. Dano moral in re ipsa, ante a irregularidade da cobrança. Aborrecimentos que superam os do mero cotidiano. Responsabilidade civil do réu caracterizada. Dano moral configurado. DANOS MORAIS. Quantum reparatório. Valor pleiteado que comporta redução. Razoabilidade e proporcionalidade. Sentença reformada em parte. Recurso parcialmente provido. (TJSP; Apelação Cível 1002224-33.2019.8.26.0581; Relator (a): Claudio Augusto Pedrassi; Órgão Julgador: 2a Câmara de Direito Público; Foro de São Manuel - 1a Vara; Data do Julgamento: 23/09/2022; Data de Registro: 23/09/2022)” Além disso este Egrégio Tribunal de Justiça já assentou: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – RESPONSABILIDADE CIVIL – AÇÃO DE DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO – FRAUDE NO REGISTRO DO VEÍCULO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO – NEGLIGÊNCIA NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO E REGISTRO – DÉBITOS DO IPVA – INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA E PROTESTO INDEVIDO – ATO ILÍCITO – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – CABIMENTO – VALOR QUE ATENDE AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – HONORARIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS DEVIDO A FASE RECURSAL – RECURSO NÃO PROVIDO. Na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. Os entes públicos são responsáveis pela ocorrência fraudulenta de licenciamento de veículo, de modo que diante da ausência de prova da propriedade ou da aquisição do veículo registrado em nome do particular, mostra-se legítimo o pedido de nulidade dos atos registrais, baixa dos débitos e indenização por danos morais, por conta das cobranças indevidas e débitos lançados indevidamente. A fixação do quantum indenizatório a título de danos morais deve sopesar os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, atentando-se ao grau de culpa do ofensor, extensão dos danos e capacidade econômica das partes. (...) (TJ-MT 10019196020198110001 MT, Relator: MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 02/08/2022, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 12/08/2022)” “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA – ATO ILÍCITO – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER DE INDENIZAR –CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA MODIFICADA – RECURSO PROVIDO. Na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. A fixação do quantum indenizatório a título de danos morais deve sopesar os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, atentando-se ao grau de culpa do ofensor, extensão dos danos e capacidade econômica das partes. Considerando as particularidades do caso e os fatores acima expostos, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), atende ao caráter reparatório e punitivo da condenação, sem provocar o enriquecimento imerecido. Sentença modificada. Recurso provido. (TJ-MT, N.U 0050719-55.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 25/07/2023, Publicado no DJE 14/08/2023)” Estabelecida a responsabilidade da Fazenda Estadual pela negativação indevida, é inquestionável o direito do autor à reparação do dano moral, nos termos do artigo 186 do Código Civil de 2002 e do artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal. No que tange ao valor da indenização por danos morais, considerando que o ordenamento jurídico pátrio não dispõe de critérios normativos específicos para a quantificação objetiva do valor indenizatório, consolidou-se, na jurisprudência nacional, o entendimento de que a indenização deve cumprir uma dupla finalidade: punitiva, a fim de desestimular a reiteração de condutas lesivas, e compensatória, proporcionando reparação adequada ao abalo moral experimentado pela parte ofendida. Assim, o valor a ser fixado deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, garantindo que não seja abusivo a ponto de fomentar o enriquecimento sem causa da vítima, tampouco ínfimo a ponto de frustrar o caráter reparatório e punitivo da condenação. No caso em tela, observa-se que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) fixado pelo juízo a quo a título de danos morais pela manutenção indevida do nome do autor nos cadastros de inadimplentes, por mais de um ano após a quitação integral do débito, mostra-se adequado e proporcional. A propósito, destaca-se o seguinte julgado: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO INDEVIDA – DEVER DE INDENIZAR – ATO ILÍCITO – DANO MORAL IN RE IPSA – QUANTUM INDENIZATÓRIO – QUANTUM ARBITRADO DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – VALOR MANTIDO – VERBA HONORÁRIA – REDUÇÃO PELA METADE – ARTIGO 90, § 4.º, DO CPC – NÃO INCIDÊNCIA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Como cediço, na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. 2. O quantum indenizatório deve levar em consideração os critérios da razoabilidade, proporcionalidade e equidade, sem olvidar o grau de culpa dos envolvidos, a gravidade do dano, suas repercussões, bem como a função pedagógica do dever de reparar. 3. O disposto no artigo 90, § 4º, do Código de Processo Civil, incide tão somente na hipótese em que a parte demandada reconhece a procedência do pedido. 4. Recurso conhecido e não provido, sentença mantida. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 00029442720188110045, Relator: MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, Data de Julgamento: 25/06/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 30/06/2024) [g.n.].” Diante desse contexto e das provas constantes nos autos, a quantia fixada na origem revela-se adequada, sem configurar excesso ou destoar do entendimento predominante, motivo pelo qual impõe-se a manutenção da sentença. Quanto aos consectários legais, a Emenda Constitucional n.º 113/2021 determina que, nas condenações envolvendo a Fazenda Pública, os valores deverão ser atualizados pela taxa Selic, aplicada de forma única e acumulada mensalmente, desde 9/12/2021. Para períodos anteriores, devem ser observados os critérios fixados nos Temas 810 do STF e 905 do STJ. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONDENAÇÕES JUDICIAIS CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. RELAÇÃO JURÍDICA NÃO TRIBUTÁRIA. JUROS DE MORA. PARÂMETROS. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009. OBSERVÂNCIA IMEDIATA. SUPERVENIÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 113/2021. APLICABILIDADE DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, após a interposição do presente agravo, afetou o RE 1.317.982 com a finalidade de uniformizar a controvérsia acerca da "validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso." No referido julgamento, foi fixada a tese correspondente ao Tema 1.170 no sentido de ser "aplicável às condenações da Fazenda Pública envolvendo relações jurídicas não tributárias o índice de juros moratórios estabelecido no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009, a partir da vigência da referida legislação, mesmo havendo previsão diversa em título executivo judicial transitado em julgado." 2. Por outro lado, o acórdão recorrido determinou a incidência de juros de mora e de correção monetária nos termos da legislação vigente à época dos fatos. Assim, em face do julgado acima referenciado, cumpre adequar a decisão atacada aos precedentes vinculantes das Cortes de vértice, aplicando o regime de juros moratórios da atual redação do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, mas somente no período imediatamente seguinte à entrada em vigor da Lei n. 11.960/2009, até a data da promulgação da Emenda Constitucional n. 113/2021. 3. Em suma, os juros de mora, no caso concreto, incidem nos seguintes termos: (i) relativamente ao período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (ii) quanto ao período posterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, incidem juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (com a ressalva destacada no parágrafo anterior); e (iii) para as parcelas vencidas a partir de 9/12/2021, é de se fixar a Selic, nos termos do art. 3º da EC n. 113/2021. 4. A propósito da correção monetária, conforme estabelecido no julgamento repetitivo do Tema 905 deste Superior Tribunal de Justiça, inaplicável a redação do art. 1º-F da Lei 9.494/2007, por ter sido declarada inconstitucional neste ponto. Portanto, deve ser observada a aplicação de índices capazes de captar o fenômeno inflacionário, até o advento da citada Emenda, ocasião em que prevalecerá "a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente." 5. Agravo interno provido. (AgInt no REsp n. 1.902.479/SP, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 14/5/2024, DJe de 20/5/2024)”. Esta Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso consolidou o seguinte entendimento: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO -AÇÃO INDENIZATÓRIA – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO –– ALEGAÇÃO DE OMISSÃO – OCORRÊNCIA – JUROS E CORREÇÃO – CONSECTÁRIOS LEGAIS QUE DEVEM SER FIXADOS CONFORME OS TEMAS 810 DO STF E 905 DO STJ ATÉ O ADVENTO DA EC 113/2021, APÓS, APLICAÇÃO DA TAXA SELIC - OMISSÃO RECONHECIDA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1 - Os embargos de declaração são cabíveis somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado ou, ainda, para sanar erro material. 2 – Deve incidir sobre o valor, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, consoante art. 3º da EC 113/2021, abrangendo tanto a atualização monetária, quanto a compensação de mora. (TJ-MT, N.U 1002770-46.2019.8.11.0051, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 30/10/2023, Publicado no DJE 10/11/2023)” “DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto pela Fazenda Pública contra sentença que condenou o ente público ao pagamento de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), a título de danos morais, decorrentes de acidente de trânsito ocasionado por ação de policial militar. II. Questão em discussão: 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é possível afastar a responsabilidade civil do Estado pelo acidente de trânsito; e (ii) determinar se o quantum indenizatório deve ser reduzido em observância aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. III. Razões de decidir: 3. A responsabilidade civil do Estado pelo evento danoso foi reconhecida em outros autos, sendo incabível a rediscussão de questão já decidida. 4. Quanto ao valor arbitrado, a aplicação do método bifásico indica que o montante de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) ultrapassa os patamares jurisprudenciais estabelecidos em casos similares. Assim, o quantum foi reduzido para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 5. A atualização do débito deve seguir a taxa SELIC a partir de 9.12.2021, vedada a cumulação com outros índices de correção monetária ou juros de mora, conforme a EC n. 113/2021. IV. Dispositivo e tese: 6. Recurso provido em parte. Tese de julgamento: “O valor da indenização por danos morais deve ser fixado de forma proporcional e razoável, considerando as circunstâncias do caso e os precedentes, admitida a redução do quantum quando excessivo.” Dispositivos relevantes citados: EC n. 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1152541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 13.9.2011; TJMT, N.U 0029263-49.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Gilberto Lopes Bussiki, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 27.2.2024; TJMT, N.U 0026376-92.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Antônio Veloso Peleja Júnior, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 29.11.2022. (N.U 0026374-25.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 11/12/2024, Publicado no DJE 17/12/2024) Dessa forma, por versar sobre matéria de ordem pública, a superveniência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 autoriza sua revisão de ofício, independentemente do teor dos pedidos, sem que tal medida configure afronta ao princípio da non reformatio in pejus. Ante o exposto, e em plena consonância com a fundamentação expendida, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Estado de Mato Grosso, mantendo incólume a condenação por danos morais. Quanto aos consectários legais, determino, ex officio, a aplicação dos critérios estabelecidos nos Temas 810/STF e 905/STJ para juros e correção monetária até a vigência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 (9/12/2021), a partir de quando deverá incidir exclusivamente a taxa SELIC para ambos os encargos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Gilberto Carneloci x Gilberto Carneloci

ID: 260816991

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002596-96.2021.8.11.0041

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

GILBERTO CARNELOCI

Polo Passivo:

GILBERTO CARNELOCI

Acórdão

Advogados:

LEILA MARIA DE ALMEIDA

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LINEIDE VIEIRA DE ALMEIDA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1002596-96.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indeniz… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1002596-96.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE Turma Julgadora: [DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO] Parte(s): [ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0003-06 (APELANTE), GILBERTO CARNELOCI - CPF: 335.812.409-63 (APELADO), LINEIDE VIEIRA DE ALMEIDA - CPF: 523.277.101-97 (ADVOGADO), JULIANA CARNELOCCI TAKATA - CPF: 833.288.231-15 (APELADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), JULIANA CARNELOCCI TAKATA - CPF: 833.288.231-15 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), LEILA MARIA DE ALMEIDA - CPF: 328.164.131-87 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELADO), GILBERTO CARNELOCI - CPF: 335.812.409-63 (APELANTE), LEILA MARIA DE ALMEIDA - CPF: 328.164.131-87 (ADVOGADO), LINEIDE VIEIRA DE ALMEIDA - CPF: 523.277.101-97 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM DÍVIDA ATIVA. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. HONORÁRIOS CONTRATUAIS NÃO INDENIZÁVEIS. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Recurso de apelação interposto pelo Município de Guarantã do Norte contra sentença que julgou procedente o pedido de indenização por danos morais, condenando o ente público ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além de honorários sucumbenciais. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (II) a existência de dano moral indenizável em razão da inscrição indevida do nome do autor na Certidão de Dívida Ativa; e (II) a possibilidade de majoração da indenização e do ressarcimento de honorários contratuais. III. Razões de decidir 3. O dano moral, no caso de inscrição irregular em dívida ativa, configura-se in re ipsa, sendo presumido, independentemente de comprovação específica do abalo sofrido, conforme jurisprudência do STJ e deste Tribunal. 4. O valor fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais) atende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, considerando a gravidade do erro administrativo e os precedentes sobre a matéria. 5. Os honorários advocatícios contratuais não são indenizáveis, pois decorrem de pacto privado e não configuram dano material passível de ressarcimento. 6. A correção monetária e os juros devem observar os critérios estabelecidos nos Temas 810/STF e 905/STJ até 9/12/2021, incidindo, a partir de então, exclusivamente a taxa SELIC, nos termos da EC n.º 113/2021. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Sentença mantida. Tese de julgamento: "1. A inscrição indevida em dívida ativa configura dano moral presumido, ensejando indenização independentemente da comprovação de prejuízo concreto. 2. O valor da indenização por dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando enriquecimento sem causa. 3. Honorários advocatícios contratuais não são passíveis de indenização." __________________________________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, §6º; CC, arts. 186 e 927; CPC, art. 85. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2291017/MA, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 05/06/2023; STJ, AgInt no AREsp 2634490/CE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, j. 23/09/2024; TJ-MT, Apelação Cível 10234145220228110003, Rel. Des. Anglizey Solivan de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 29/10/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Estado de Mato Grosso e por Gilberto Carnelocci contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, nos autos da ação cível com pedido de indenização por danos morais e materiais, além de tutela provisória de urgência, julgou parcialmente procedentes as demandas da exordial, nos seguintes termos: “[...] Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor para condenar o requerido ao pagamento de danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária pelo IPCA-E a partir desta decisão e juros de mora, a contar do evento danoso (primeira inscrição em dívida ativa), na forma do artigo 1-F da Lei nº 9494/97 (Súmulas 54 e 362 do STJ c/c com o julgamento do Tema 905). Deixo de condenar a Fazenda Pública ao pagamento das custas e despesas processuais, em razão do que dispõe o art. 3º, I, da Lei Estadual nº 7.603/01 e o art. 236 da CNGC. Condeno o ente público ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, na forma do artigo 85, caput, §2º e §3º, do CPC. Preclusas a vias recursais, certifique-se o trânsito em julgado, arquive-se estes autos, com as baixas e demais formalidades de estilo. [...]”. Inconformado, recorre o Estado de Mato Grosso, na qualidade de 1º apelante, sustentando a inexistência de dano indenizável, sob o argumento de ausência de provas nos autos de prejuízo extrapatrimonial sofrido pelo apelado, tampouco de negativação de seu nome em órgãos de restrição ao crédito. Ressalta que o erro foi corrigido administrativamente e que a ação executiva foi extinta, não havendo elementos que justifiquem a reparação por dano moral. Subsidiariamente, caso mantida a condenação, o apelante requer a redução do valor fixado, alegando que o montante arbitrado é desproporcional à extensão do suposto dano e pode gerar enriquecimento sem causa. Defende que a indenização deve ser estabelecida em patamar razoável, considerando a situação econômica das partes e o caráter público da administração estadual. Diante disso, requer o provimento do recurso para reformar a sentença, julgando improcedente o pedido indenizatório ou, alternativamente, reduzindo o valor da indenização. Em seguida, foi interposto recurso de apelação por Gilberto Carnelocci, na qualidade de 2º apelante, sustentando que o valor arbitrado não condiz com a gravidade da situação, pois foi cobrado indevidamente em mais de sete milhões de reais, teve seu nome inscrito como devedor sem notificação prévia, sofreu constrangimentos e impactos severos à sua saúde, necessitando de tratamento para insônia e ansiedade. Alega que a inserção na Certidão de Dívida Ativa equivale à negativação em órgãos de crédito e que a sentença ignorou a extensão dos atos ilícitos cometidos pelo Estado. Requer a majoração da indenização para, no mínimo, R$ 20.000,00, além do ressarcimento dos valores pagos a título de honorários advocatícios contratuais, uma vez que precisou contrair empréstimos para se defender diante da omissão da Defensoria Pública. Assim, pede o provimento do recurso para reformar a sentença e ajustar a condenação à gravidade dos danos sofridos. Em sede de contrarrazões à apelação de Gilberto Carnelocci, o Estado de Mato Grosso sustenta que a sentença fixou adequadamente os danos morais em R$ 10.000,00, observando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de estar em conformidade com a jurisprudência, especialmente por se tratar de dano moral in re ipsa. Quanto aos danos materiais, argumenta que não há comprovação do prejuízo e que honorários contratuais não são indenizáveis, salvo exceções não aplicáveis ao caso. Requer o desprovimento do recurso e a manutenção da sentença. O Apelado, Gilberto Carnelocci, apresenta contrarrazões ao recurso interposto pelo Estado de Mato Grosso, sustentando que foi indevidamente incluído como executado em ação fiscal referente a débito superior a R$ 7 milhões de empresa com a qual jamais teve vínculo. O erro, reconhecido pelo próprio Estado, lhe causou graves prejuízos, incluindo abalo psicológico e necessidade de defesa judicial. Refuta a alegação do Apelante de inexistência de dano moral, destacando que, em casos de indevida cobrança judicial, o dano é in re ipsa, prescindindo de prova específica. Aponta jurisprudência que reconhece a responsabilidade objetiva do Estado e a necessidade de reparação condizente. Por fim, argumenta que o valor fixado em R$ 10 mil é irrisório diante da gravidade da situação e requer sua majoração. Alternativamente, pleiteia a manutenção da sentença e a condenação do Estado em honorários sucumbenciais no percentual máximo. O parecer da Procuradoria-Geral de Justiça é pelo desinteresse de intervenção ministerial (Id. 249015182). O apelante Estado de Mato Grosso é isento de preparo, nos termos do art. 1.007, §1º, do Código de Processo Civil e do art. 73, §1º, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça (Id. 242235159). Já o apelante Gilberto Carnelocci é beneficiário da justiça gratuita, conforme certidão constante no Id. 242262679. É o relatório. Desembargador JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Relator V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade. Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Estado de Mato Grosso e por Gilberto Carnelocci contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, nos autos da ação cível com pedido de indenização por danos morais e materiais, além de tutela provisória de urgência, julgou parcialmente procedentes os pedidos da exordial, condenando o Estado de Mato Grosso ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos pelo IPCA-E a partir da prolação da sentença, com juros de mora desde o evento danoso, nos termos do artigo 1-F da Lei nº 9.494/97 (Súmulas 54 e 362 do STJ, em conjunto com o julgamento do Tema 905), além do pagamento de honorários de sucumbência fixados em 10% sobre o proveito econômico obtido, conforme o artigo 85, caput, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil. Em síntese, a presente demanda decorre da indevida inclusão do nome do autor, ora apelado, na Certidão de Dívida Ativa do Estado de Mato Grosso, sob o número 201415378, resultando no ajuizamento da ação de execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003, em seu desfavor no valor de R$ 7.040.432,60 (sete milhões quarenta mil quatrocentos e trinta e dois reais e sessenta centavos). O autor foi surpreendido ao receber citação judicial para pagamento de um débito ao qual jamais esteve vinculado, uma vez que nunca integrou o quadro societário da empresa devedora indicada pelo ente público. O apelado alegou na petição inicial que, em razão do erro cadastral cometido pela Administração Pública, enfrentou severos transtornos financeiros e emocionais, tendo que arcar com despesas advocatícias e suportar a restrição indevida de seus dados em cadastros restritivos de crédito. Além disso, sustentou que houve violação ao devido processo legal, pois jamais fora notificado administrativamente sobre a existência do suposto débito. O Estado de Mato Grosso apresentou contestação, argumentando a ausência de comprovação dos danos alegados, bem como a inexistência de responsabilidade estatal, sustentando que a exclusão do nome do autor da Certidão de Dívida Ativa foi prontamente realizada após a identificação do erro, não havendo que se falar em dano moral indenizável. Diante dos fatos, o Juízo a quo reconheceu a responsabilidade do Estado, condenando-o ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, além das custas e despesas processuais, bem como honorários sucumbenciais fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, nos termos do artigo 85, §2º e §3º do Código de Processo Civil. Inconformado, o Estado de Mato Grosso, 1º apelante, interpôs o presente recurso de apelação, pleiteando a reforma da sentença, alegando, em síntese, que não houve dano moral indenizável, pois a inclusão indevida decorreu de erro administrativo já corrigido, e que, caso se entenda de forma diversa, o valor da condenação deve ser reduzido. Além disso, o 2º apelante, Gilberto Carnelocci, insurgiu-se contra a sentença no que tange ao valor arbitrado a título de danos morais, sustentando que a quantia fixada não é proporcional à gravidade da lesão sofrida, considerando o longo período em que permaneceu vinculado indevidamente à dívida fiscal e as dificuldades enfrentadas para reverter a situação. Assim, pugna pelo aumento da indenização para um montante que melhor reflita o abalo emocional e os prejuízos suportados. Com essas considerações passo a análise do mérito. O âmago do presente recurso reside, essencialmente, na pretensão de reconhecimento da ilegitimidade da inclusão do nome do recorrente na Certidão da Dívida Ativa e, consequentemente, no afastamento da condenação imposta ao ente público em indenização por danos morais e materiais. Alternativamente, requer-se a modulação do quantum indenizatório fixado, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista as peculiaridades do caso concreto e a ausência de dolo ou culpa grave por parte da Administração Pública. Compulsando os autos (Id. 242178172), verifica-se que foi ajuizada a execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003, fundada na Certidão de Dívida Ativa n.º 201415378, referente à "Falta de recolhimento de ICMS garantido integral" e à "Falta de recolhimento de ICMS garantido integral – formação de estoque", em nome de DCP Máquinas, Implementos e Peças Agrícolas LTDA, no importe de R$ 7.040.432,60 (sete milhões, quarenta mil, quatrocentos e trinta e dois reais e sessenta centavos), na qual o autor, ora 2º apelante, figura como corresponsável. Além disso, verifica-se que o autor, ora 2º apelante, opôs embargos à execução n.º 0001523-65.2017.8.11.0003, objetivando o reconhecimento da ilegitimidade passiva do embargante, bem como subsidiariamente, que fosse reconhecida a nulidade dos lançamentos tributários, e declarada a prescrição, além de indenização por danos morais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), e honorários advocatícios de sucumbência fixados em 20% do valor da causa (Id. 242178180). Os embargos foram apensados aos autos da execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003 em 20/03/2017 (Id. 242178672), em 22/09/2017, foram rejeitados ante a ausência de garantia à execução. Em sede de contestação (Id. 242178680), o Estado de Mato Grosso informou que os embargos à execução interpostos pelo apelante perderam o objeto, uma vez que não havia interesse processual. Isso se deve à alteração e substituição da certidão de dívida ativa executada nos autos, resultando na exclusão do apelante do rol de devedores executados. Dessa forma, ele não mais integra o polo passivo do processo executivo fiscal. Além disso, na data do protocolo dos embargos à execução, em 24/02/2017, o apelante já havia sido excluído da execução fiscal desde 09/05/2016. A sentença reconheceu que o Estado de Mato Grosso incluiu indevidamente o nome do autor na Certidão de Dívida Ativa (CDA) nº 201415378, o que resultou no seu envolvimento em ação de execução fiscal no valor de R$ 7.040.432,60 (sete milhões quarenta mil quatrocentos e trinta e dois reais e sessenta centavos). Portanto, no caso sob análise, estando evidenciada a ilicitude tanto da inclusão no rol de corresponsáveis pela dívida ativa quanto da inserção no polo passivo da execução fiscal, uma vez que jamais existiu relação jurídico-tributária entre a empresa e o demandado, conforme comprova a documentação acostada — já que o autor nunca foi sócio da empresa nem possuía qualquer vínculo com ela —, impõe-se o reconhecimento do dano presumido, bem como do nexo de causalidade entre a conduta da Fazenda Pública e o prejuízo experimentado pela parte autora. Assim, revela-se plenamente cabível a compensação por danos extrapatrimoniais, especialmente porque, no presente caso, a responsabilidade do ente público é objetiva, prescindindo da aferição de culpa. Dessa forma, resta configurado o dano moral, uma vez demonstradas a falha e o erro na prestação do serviço público, os quais resultaram em prejuízos e transtornos ao autor, ultrapassando o mero dissabor. Com efeito, embora não tenha dado causa à inclusão de seu nome no rol de corresponsáveis pela dívida ativa, tampouco à sua inserção no polo passivo da execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003, foi submetido a tais adversidades exclusivamente em razão da conduta indevida do Estado. É certo que o protesto indevido de certidão de dívida ativa dispensa a prova do dano moral, por se cuidar de dano in re ipsa: “A jurisprudência desta Corte entende que em se tratando de protesto indevido de título, o dano moral configura-se in re ipsa, ou seja, não depende de prova” (STJ – AgInt no AREsp 1867219/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 3.10.2022, DJe 5.10.2022). Por essa vertente, o Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA NÃO CONHECER DO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE DEMANDADA. 1. Está pacificado nesta Corte Superior que a inscrição indevida em cadastro negativo de crédito, por si só, configura dano in re ipsa. Precedentes.1.1. É inviável o acolhimento da tese da ausência de responsabilidade civil da agravante, pois, para tanto, seria imprescindível o revolvimento do acervo fático-probatório, providência vedada a esta Corte Superior ante o óbice da Súmula 7/STJ. 2. A ausência de enfrentamento da questão objeto da controvérsia pelo Tribunal de origem impede o acesso à instância especial, porquanto não preenchido o requisito constitucional do prequestionamento, nos termos da Súmula 282 e 356 do STF, aplicável por analogia. 3. A falta de indicação, pela parte recorrente, de quais dispositivos legais teriam sido objeto de interpretação divergente pelo acórdão recorrido implica em deficiência da fundamentação do recurso especial, incidindo o teor da Súmula 284 do STF, por analogia. 4. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 2291017 MA 2023/0035447-3, Relator: MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/06/2023) [destaquei]”. “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECONSIDERAÇÃO DE DECISÃO. AFASTAMENTO DA SÚMULA N. 182 DO STJ. NOVA ANÁLISE. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. PROTESTO INDEVIDO. SÚMULA N. 475 DO STJ. DANO MORAL IN RE IPSA. PESSOA JURÍDICA. CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83 DO STJ. INCIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. "Responde pelos danos decorrentes de protesto indevido o endossatário que recebe por endosso translativo título de crédito contendo vício formal extrínseco ou intrínseco, ficando ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas" (Súmula n. 475 do STJ). 2. Nos casos de protesto indevido de título e de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, o dano moral é considerado in re ipsa, ainda que a parte prejudicada seja pessoa jurídica. 3. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 2634490 CE 2024/0164197-4, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 23/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/09/2024)[destaquei]”. Da mesma forma, tanto o Tribunal de Justiça quanto a Turma Recursal deste Estado têm consolidado entendimento nesse sentido. “[...]RECURSO INOMINADO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO COM PEDIDO DE DANO MORAL - IPTU - SENTENÇA SEPERVENINETE NO PROCESSO PRINCIPAL – EXECUÇÃO FISCAL - RECONHECENDO A PRESCRIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO- DANO MORAL CONFIGURADO - SENTENÇA REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. O ajuizamento de execução fiscal para a cobrança indevida cuja inexistência deveria ser de conhecimento da Fazenda Pública por si só faz presumir a ocorrência de dano moral (dano moral in re ipsa). A caracterização do dano moral pelo simples fato de ter protestado indevidamente o nome da parte autora é suficiente para a configuração do dano moral, caso que prescinde da prova da ocorrência de abalo psicológico relevante. (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 0011628-12.2010.8.11.0015, Relator: EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Data de Julgamento: 15/04/2024, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 22/04/2024) [destaquei]”. “RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE OBRIGAÇAO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - VENDA DE VEÍCULO – COMUNICADO DE VENDA REALIZADO – AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO CADASTRAL POR PARTE DO RECLAMADO – INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA – DANO MORAL CONFIGURADO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. In casu, a parte Autora comprovou que realizou o comunicado de venda do seu veículo na época da venda. Todavia, por equívoco do reclamado, a propriedade do veículo não foi alterada. 2. A jurisprudência é assente no sentido de que a inscrição indevida na dívida ativa é apta a ensejar a responsabilização por danos morais, pois tal conduta viola os direitos da personalidade dos inscritos, notadamente seu nome, sua imagem e sua honra. 3. Recurso conhecido e provido. (TR-MT, N.U 1042276-54.2022.8.11.0041, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 20/05/2024, Publicado no DJE 24/05/2024) RECURSO INOMINADO CÍVEL. FAZENDA PÚBLICA. EXECUÇÃO FISCAL. COBRANÇA DE IPTU. DÉBITO QUITADO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. NEGLIGÊNCIA NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO E REGISTRO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. VALOR DO DANO. REDUÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TR-MT, N.U 1007950-89.2023.8.11.0055, TURMA RECURSAL CÍVEL, WALTER PEREIRA DE SOUZA, Primeira Turma Recursal, Julgado em 27/11/2023, Publicado no DJE 01/12/2023) [destaquei]”. “DIREITO ADMINISTRATIVO E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM DÍVIDA ATIVA. RECONHECIMENTO DE DANO MORAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO ESTADO E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO AUTOR. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta por Osvaldo Camilo do Prado e pelo Estado de Mato Grosso contra sentença da 3ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que julgou parcialmente procedente ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais e materiais, determinando o cancelamento de CDA inscrita indevidamente e reconhecendo o direito a danos morais no valor de R$ 10.000,00, mas negando a reparação por danos materiais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em: (i) saber se o valor dos danos morais fixados deve ser majorado e se o pedido de danos materiais deve ser reconhecido; (ii) saber se o Estado de Mato Grosso deve ser desobrigado de indenizar o autor pelos danos morais decorrentes da inscrição indevida em dívida ativa. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A jurisprudência do STJ estabelece que o dano moral por inscrição indevida em dívida ativa se configura in re ipsa, sendo presumido e dispensando a prova específica de abalo psíquico ou financeiro. 4. O valor de R$ 10.000,00 foi considerado proporcional à gravidade dos fatos e aos danos sofridos, não havendo motivo para majoração. 5. Não há fundamento jurídico para a reparação dos honorários contratuais pagos pelo autor, pois tais despesas decorrem de pacto privado com o advogado constituído. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Apelação do Estado de Mato Grosso desprovida. Apelação de Osvaldo Camilo do Prado parcialmente provida para fixar o prazo de 30 dias para o cancelamento da CDA, sob pena de multa diária de R$ 500,00. Tese de julgamento: "A inscrição indevida de débito em dívida ativa configura dano moral presumido, sendo cabível a indenização mesmo sem a comprovação de abalo concreto." Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 186 e 404; CPC, arts. 85, § 8º e 86. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1838091/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 29.11.2021. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10234145220228110003, Relator: ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 29/10/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 07/11/2024) [destaquei]”. A indevida inclusão do nome do autor em dívida ativa e ajuizamento de execução fiscal possuem gravidade suficiente para justificar a reparação por danos morais. No arbitramento do valor, não há critérios rígidos pré-estabelecidos, cabendo ao julgador ponderar as circunstâncias do caso concreto, considerando a condição das partes, o grau de culpa e o caráter compensatório da indenização, sem que isso resulte em enriquecimento sem causa. In casu, embora o 2º apelante alegue que a majoração do quantum indenizatório se impõe em razão do valor expressivo da Certidão de Dívida Ativa na qual foi indevidamente inserido, tal pretensão não merece prosperar. Isso porque não houve prejuízo efetivo ao patrimônio do autor, não se justificando, portanto, a majoração da condenação. Por outro lado, a obrigação de indenizar revela-se incontestável, pois não se pode reduzir a mera contrariedade o fato de o requerente ter sido compelido, por anos, a suportar os ônus de uma execução de valor expressivo, fruto de um equívoco estatal. O dano, nesse contexto, é inegável e transcende qualquer alegação de mero dissabor, configurando violação evidente aos direitos do requerente. Diante desse contexto e das provas constantes nos autos, a quantia fixada na origem revela-se adequada, sem configurar excesso ou destoar do entendimento predominante nesta instância recursal. Assim, mantenho a condenação do Estado de Mato Grosso ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A propósito, destaca-se o seguinte julgado: "APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROTESTO INDEVIDO DE CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA (CDA) – FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A fixação do valor do dano moral em R$ 10.000,00 (dez mil reais), em razão de protesto indevido de certidão de dívida ativa, atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 2. Recurso não provido”. (N.U 1026919-34.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 28/08/2024, Publicado no DJE 31/08/2024)”. No que concerne aos danos materiais, verifica-se, não há comprovação do dano alegado pela parte autora, uma vez que a contratação de advogado particular constitui uma liberalidade, e não uma obrigação. Isso porque o autor poderia ter sido assistido por um Defensor Público, considerando sua hipossuficiência. Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça possui o seguinte entendimento consolidado: “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. RESTITUIÇÃO A TÍTULO DE DANOS MATERIAIS. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. ACÓRDÃO DE 2º GRAU EM DISSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. I. Agravo interno aviado contra decisão que julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/2015. II. Trata-se, na origem, de Ação de Indenização ajuizada pela parte ora agravante em desfavor da Prefeitura Municipal de São Paulo, com o objetivo de obter o ressarcimento dos danos materiais advindos da contratação de advogados, técnicos e juristas renomados para a defesa de seus interesses em processo em que fora autuada pela demolição de imóvel em que desenvolvia empreendimento imobiliário. O Tribunal de origem reformou a sentença, que julgara improcedente a demanda. III. O acórdão recorrido encontra-se em dissonância com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual "a contratação de advogados para defesa judicial de interesses da parte não enseja, por si só, dano material passível de indenização, porque inerente ao exercício regular dos direitos constitucionais de contraditório, ampla defesa e acesso à Justiça" (STJ, AgRg no AREsp 516.277/SP, QUARTA TURMA, Rel. Ministro MARCO BUZZI, DJe de 04/09/2014). Nesse sentido: STJ, AgInt na PET no AREsp 834.691/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 13/02/2019; REsp 1.696.910/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2017; AgRg no AgRg no REsp 1.478.820/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe de 19/04/2016; AgRg no AREsp 810.591/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, DJe de 15/02/2016. IV. Na hipótese, estando o acórdão recorrido em dissonância com a jurisprudência sedimentada nesta Corte, merece ser mantida a decisão ora agravada, que conheceu do Agravo, para dar parcial provimento ao Recurso Especial interposto pelo Município de São Paulo, a fim de reconhecer a impossibilidade de a Municipalidade arcar com os honorários contratuais do profissional contratado pela parte autora. V. Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp n. 2.135.717/SP, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 6/11/2023.) [destaquei]”. No tocante aos honorários sucumbenciais, fixados em 10% sobre o proveito econômico obtido, constata-se que sua fixação se encontra em estrita conformidade com o artigo 85 do Código de Processo Civil, não se vislumbrando fundamento para eventual majoração, conforme se depreende: “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. § 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais: I - mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;”. Dessarte, ambos os recursos mostram-se desprovidos de amparo, porquanto a sentença recorrida não comporta qualquer reforma no tocante às matérias impugnadas, impondo-se, assim, sua integral manutenção. Quanto aos consectários legais, a Emenda Constitucional n.º 113/2021 determina que, nas condenações envolvendo a Fazenda Pública, os valores deverão ser atualizados pela taxa Selic, aplicada de forma única e acumulada mensalmente, desde 9/12/2021. Para períodos anteriores, devem ser observados os critérios fixados nos Temas 810 do STF e 905 do STJ. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONDENAÇÕES JUDICIAIS CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. RELAÇÃO JURÍDICA NÃO TRIBUTÁRIA. JUROS DE MORA. PARÂMETROS. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009. OBSERVÂNCIA IMEDIATA. SUPERVENIÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 113/2021. APLICABILIDADE DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, após a interposição do presente agravo, afetou o RE 1.317.982 com a finalidade de uniformizar a controvérsia acerca da "validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso." No referido julgamento, foi fixada a tese correspondente ao Tema 1.170 no sentido de ser "aplicável às condenações da Fazenda Pública envolvendo relações jurídicas não tributárias o índice de juros moratórios estabelecido no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009, a partir da vigência da referida legislação, mesmo havendo previsão diversa em título executivo judicial transitado em julgado." 2. Por outro lado, o acórdão recorrido determinou a incidência de juros de mora e de correção monetária nos termos da legislação vigente à época dos fatos. Assim, em face do julgado acima referenciado, cumpre adequar a decisão atacada aos precedentes vinculantes das Cortes de vértice, aplicando o regime de juros moratórios da atual redação do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, mas somente no período imediatamente seguinte à entrada em vigor da Lei n. 11.960/2009, até a data da promulgação da Emenda Constitucional n. 113/2021. 3. Em suma, os juros de mora, no caso concreto, incidem nos seguintes termos: (i) relativamente ao período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (ii) quanto ao período posterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, incidem juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (com a ressalva destacada no parágrafo anterior); e (iii) para as parcelas vencidas a partir de 9/12/2021, é de se fixar a Selic, nos termos do art. 3º da EC n. 113/2021. 4. A propósito da correção monetária, conforme estabelecido no julgamento repetitivo do Tema 905 deste Superior Tribunal de Justiça, inaplicável a redação do art. 1º-F da Lei 9.494/2007, por ter sido declarada inconstitucional neste ponto. Portanto, deve ser observada a aplicação de índices capazes de captar o fenômeno inflacionário, até o advento da citada Emenda, ocasião em que prevalecerá "a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente." 5. Agravo interno provido. (AgInt no REsp n. 1.902.479/SP, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 14/5/2024, DJe de 20/5/2024)”. Esta Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso consolidou o seguinte entendimento: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO -AÇÃO INDENIZATÓRIA – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO –– ALEGAÇÃO DE OMISSÃO – OCORRÊNCIA – JUROS E CORREÇÃO – CONSECTÁRIOS LEGAIS QUE DEVEM SER FIXADOS CONFORME OS TEMAS 810 DO STF E 905 DO STJ ATÉ O ADVENTO DA EC 113/2021, APÓS, APLICAÇÃO DA TAXA SELIC - OMISSÃO RECONHECIDA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1 - Os embargos de declaração são cabíveis somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado ou, ainda, para sanar erro material. 2 – Deve incidir sobre o valor, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, consoante art. 3º da EC 113/2021, abrangendo tanto a atualização monetária, quanto a compensação de mora. (TJ-MT, N.U 1002770-46.2019.8.11.0051, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 30/10/2023, Publicado no DJE 10/11/2023)”. “DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto pela Fazenda Pública contra sentença que condenou o ente público ao pagamento de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), a título de danos morais, decorrentes de acidente de trânsito ocasionado por ação de policial militar. II. Questão em discussão: 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é possível afastar a responsabilidade civil do Estado pelo acidente de trânsito; e (ii) determinar se o quantum indenizatório deve ser reduzido em observância aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. III. Razões de decidir: 3. A responsabilidade civil do Estado pelo evento danoso foi reconhecida em outros autos, sendo incabível a rediscussão de questão já decidida. 4. Quanto ao valor arbitrado, a aplicação do método bifásico indica que o montante de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) ultrapassa os patamares jurisprudenciais estabelecidos em casos similares. Assim, o quantum foi reduzido para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 5. A atualização do débito deve seguir a taxa SELIC a partir de 9.12.2021, vedada a cumulação com outros índices de correção monetária ou juros de mora, conforme a EC n. 113/2021. IV. Dispositivo e tese: 6. Recurso provido em parte. Tese de julgamento: “O valor da indenização por danos morais deve ser fixado de forma proporcional e razoável, considerando as circunstâncias do caso e os precedentes, admitida a redução do quantum quando excessivo.” Dispositivos relevantes citados: EC n. 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1152541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 13.9.2011; TJMT, N.U 0029263-49.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Gilberto Lopes Bussiki, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 27.2.2024; TJMT, N.U 0026376-92.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Antônio Veloso Peleja Júnior, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 29.11.2022. (N.U 0026374-25.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 11/12/2024, Publicado no DJE 17/12/2024)”. Dessa forma, por versar sobre matéria de ordem pública, a superveniência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 autoriza sua revisão de ofício, independentemente do teor dos pedidos, sem que tal medida configure afronta ao princípio da non reformatio in pejus. Ante o exposto, e em plena consonância com a fundamentação expendida, NEGO PROVIMENTO aos recursos interpostos pelo Estado de Mato Grosso e Gilberto Carnelocci, mantendo incólume a sentença proferida pelo juízo a quo. Quanto aos consectários legais, determino, ex officio, a aplicação dos critérios estabelecidos nos Temas 810/STF e 905/STJ para juros e correção monetária até a vigência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 (9/12/2021), a partir de quando deverá incidir exclusivamente a taxa SELIC para ambos os encargos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Gilberto Carneloci x Gilberto Carneloci

ID: 260817000

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002596-96.2021.8.11.0041

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

GILBERTO CARNELOCI

Polo Passivo:

GILBERTO CARNELOCI

Acórdão

Advogados:

LEILA MARIA DE ALMEIDA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LINEIDE VIEIRA DE ALMEIDA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1002596-96.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indeniz… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1002596-96.2021.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE Turma Julgadora: [DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO] Parte(s): [ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0003-06 (APELANTE), GILBERTO CARNELOCI - CPF: 335.812.409-63 (APELADO), LINEIDE VIEIRA DE ALMEIDA - CPF: 523.277.101-97 (ADVOGADO), JULIANA CARNELOCCI TAKATA - CPF: 833.288.231-15 (APELADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), JULIANA CARNELOCCI TAKATA - CPF: 833.288.231-15 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), LEILA MARIA DE ALMEIDA - CPF: 328.164.131-87 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELADO), GILBERTO CARNELOCI - CPF: 335.812.409-63 (APELANTE), LEILA MARIA DE ALMEIDA - CPF: 328.164.131-87 (ADVOGADO), LINEIDE VIEIRA DE ALMEIDA - CPF: 523.277.101-97 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM DÍVIDA ATIVA. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. HONORÁRIOS CONTRATUAIS NÃO INDENIZÁVEIS. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Recurso de apelação interposto pelo Município de Guarantã do Norte contra sentença que julgou procedente o pedido de indenização por danos morais, condenando o ente público ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além de honorários sucumbenciais. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (II) a existência de dano moral indenizável em razão da inscrição indevida do nome do autor na Certidão de Dívida Ativa; e (II) a possibilidade de majoração da indenização e do ressarcimento de honorários contratuais. III. Razões de decidir 3. O dano moral, no caso de inscrição irregular em dívida ativa, configura-se in re ipsa, sendo presumido, independentemente de comprovação específica do abalo sofrido, conforme jurisprudência do STJ e deste Tribunal. 4. O valor fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais) atende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, considerando a gravidade do erro administrativo e os precedentes sobre a matéria. 5. Os honorários advocatícios contratuais não são indenizáveis, pois decorrem de pacto privado e não configuram dano material passível de ressarcimento. 6. A correção monetária e os juros devem observar os critérios estabelecidos nos Temas 810/STF e 905/STJ até 9/12/2021, incidindo, a partir de então, exclusivamente a taxa SELIC, nos termos da EC n.º 113/2021. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Sentença mantida. Tese de julgamento: "1. A inscrição indevida em dívida ativa configura dano moral presumido, ensejando indenização independentemente da comprovação de prejuízo concreto. 2. O valor da indenização por dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando enriquecimento sem causa. 3. Honorários advocatícios contratuais não são passíveis de indenização." __________________________________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, §6º; CC, arts. 186 e 927; CPC, art. 85. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2291017/MA, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 05/06/2023; STJ, AgInt no AREsp 2634490/CE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, j. 23/09/2024; TJ-MT, Apelação Cível 10234145220228110003, Rel. Des. Anglizey Solivan de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 29/10/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Estado de Mato Grosso e por Gilberto Carnelocci contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, nos autos da ação cível com pedido de indenização por danos morais e materiais, além de tutela provisória de urgência, julgou parcialmente procedentes as demandas da exordial, nos seguintes termos: “[...] Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor para condenar o requerido ao pagamento de danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária pelo IPCA-E a partir desta decisão e juros de mora, a contar do evento danoso (primeira inscrição em dívida ativa), na forma do artigo 1-F da Lei nº 9494/97 (Súmulas 54 e 362 do STJ c/c com o julgamento do Tema 905). Deixo de condenar a Fazenda Pública ao pagamento das custas e despesas processuais, em razão do que dispõe o art. 3º, I, da Lei Estadual nº 7.603/01 e o art. 236 da CNGC. Condeno o ente público ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, na forma do artigo 85, caput, §2º e §3º, do CPC. Preclusas a vias recursais, certifique-se o trânsito em julgado, arquive-se estes autos, com as baixas e demais formalidades de estilo. [...]”. Inconformado, recorre o Estado de Mato Grosso, na qualidade de 1º apelante, sustentando a inexistência de dano indenizável, sob o argumento de ausência de provas nos autos de prejuízo extrapatrimonial sofrido pelo apelado, tampouco de negativação de seu nome em órgãos de restrição ao crédito. Ressalta que o erro foi corrigido administrativamente e que a ação executiva foi extinta, não havendo elementos que justifiquem a reparação por dano moral. Subsidiariamente, caso mantida a condenação, o apelante requer a redução do valor fixado, alegando que o montante arbitrado é desproporcional à extensão do suposto dano e pode gerar enriquecimento sem causa. Defende que a indenização deve ser estabelecida em patamar razoável, considerando a situação econômica das partes e o caráter público da administração estadual. Diante disso, requer o provimento do recurso para reformar a sentença, julgando improcedente o pedido indenizatório ou, alternativamente, reduzindo o valor da indenização. Em seguida, foi interposto recurso de apelação por Gilberto Carnelocci, na qualidade de 2º apelante, sustentando que o valor arbitrado não condiz com a gravidade da situação, pois foi cobrado indevidamente em mais de sete milhões de reais, teve seu nome inscrito como devedor sem notificação prévia, sofreu constrangimentos e impactos severos à sua saúde, necessitando de tratamento para insônia e ansiedade. Alega que a inserção na Certidão de Dívida Ativa equivale à negativação em órgãos de crédito e que a sentença ignorou a extensão dos atos ilícitos cometidos pelo Estado. Requer a majoração da indenização para, no mínimo, R$ 20.000,00, além do ressarcimento dos valores pagos a título de honorários advocatícios contratuais, uma vez que precisou contrair empréstimos para se defender diante da omissão da Defensoria Pública. Assim, pede o provimento do recurso para reformar a sentença e ajustar a condenação à gravidade dos danos sofridos. Em sede de contrarrazões à apelação de Gilberto Carnelocci, o Estado de Mato Grosso sustenta que a sentença fixou adequadamente os danos morais em R$ 10.000,00, observando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de estar em conformidade com a jurisprudência, especialmente por se tratar de dano moral in re ipsa. Quanto aos danos materiais, argumenta que não há comprovação do prejuízo e que honorários contratuais não são indenizáveis, salvo exceções não aplicáveis ao caso. Requer o desprovimento do recurso e a manutenção da sentença. O Apelado, Gilberto Carnelocci, apresenta contrarrazões ao recurso interposto pelo Estado de Mato Grosso, sustentando que foi indevidamente incluído como executado em ação fiscal referente a débito superior a R$ 7 milhões de empresa com a qual jamais teve vínculo. O erro, reconhecido pelo próprio Estado, lhe causou graves prejuízos, incluindo abalo psicológico e necessidade de defesa judicial. Refuta a alegação do Apelante de inexistência de dano moral, destacando que, em casos de indevida cobrança judicial, o dano é in re ipsa, prescindindo de prova específica. Aponta jurisprudência que reconhece a responsabilidade objetiva do Estado e a necessidade de reparação condizente. Por fim, argumenta que o valor fixado em R$ 10 mil é irrisório diante da gravidade da situação e requer sua majoração. Alternativamente, pleiteia a manutenção da sentença e a condenação do Estado em honorários sucumbenciais no percentual máximo. O parecer da Procuradoria-Geral de Justiça é pelo desinteresse de intervenção ministerial (Id. 249015182). O apelante Estado de Mato Grosso é isento de preparo, nos termos do art. 1.007, §1º, do Código de Processo Civil e do art. 73, §1º, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça (Id. 242235159). Já o apelante Gilberto Carnelocci é beneficiário da justiça gratuita, conforme certidão constante no Id. 242262679. É o relatório. Desembargador JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Relator V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade. Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Estado de Mato Grosso e por Gilberto Carnelocci contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, nos autos da ação cível com pedido de indenização por danos morais e materiais, além de tutela provisória de urgência, julgou parcialmente procedentes os pedidos da exordial, condenando o Estado de Mato Grosso ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos pelo IPCA-E a partir da prolação da sentença, com juros de mora desde o evento danoso, nos termos do artigo 1-F da Lei nº 9.494/97 (Súmulas 54 e 362 do STJ, em conjunto com o julgamento do Tema 905), além do pagamento de honorários de sucumbência fixados em 10% sobre o proveito econômico obtido, conforme o artigo 85, caput, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil. Em síntese, a presente demanda decorre da indevida inclusão do nome do autor, ora apelado, na Certidão de Dívida Ativa do Estado de Mato Grosso, sob o número 201415378, resultando no ajuizamento da ação de execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003, em seu desfavor no valor de R$ 7.040.432,60 (sete milhões quarenta mil quatrocentos e trinta e dois reais e sessenta centavos). O autor foi surpreendido ao receber citação judicial para pagamento de um débito ao qual jamais esteve vinculado, uma vez que nunca integrou o quadro societário da empresa devedora indicada pelo ente público. O apelado alegou na petição inicial que, em razão do erro cadastral cometido pela Administração Pública, enfrentou severos transtornos financeiros e emocionais, tendo que arcar com despesas advocatícias e suportar a restrição indevida de seus dados em cadastros restritivos de crédito. Além disso, sustentou que houve violação ao devido processo legal, pois jamais fora notificado administrativamente sobre a existência do suposto débito. O Estado de Mato Grosso apresentou contestação, argumentando a ausência de comprovação dos danos alegados, bem como a inexistência de responsabilidade estatal, sustentando que a exclusão do nome do autor da Certidão de Dívida Ativa foi prontamente realizada após a identificação do erro, não havendo que se falar em dano moral indenizável. Diante dos fatos, o Juízo a quo reconheceu a responsabilidade do Estado, condenando-o ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, além das custas e despesas processuais, bem como honorários sucumbenciais fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, nos termos do artigo 85, §2º e §3º do Código de Processo Civil. Inconformado, o Estado de Mato Grosso, 1º apelante, interpôs o presente recurso de apelação, pleiteando a reforma da sentença, alegando, em síntese, que não houve dano moral indenizável, pois a inclusão indevida decorreu de erro administrativo já corrigido, e que, caso se entenda de forma diversa, o valor da condenação deve ser reduzido. Além disso, o 2º apelante, Gilberto Carnelocci, insurgiu-se contra a sentença no que tange ao valor arbitrado a título de danos morais, sustentando que a quantia fixada não é proporcional à gravidade da lesão sofrida, considerando o longo período em que permaneceu vinculado indevidamente à dívida fiscal e as dificuldades enfrentadas para reverter a situação. Assim, pugna pelo aumento da indenização para um montante que melhor reflita o abalo emocional e os prejuízos suportados. Com essas considerações passo a análise do mérito. O âmago do presente recurso reside, essencialmente, na pretensão de reconhecimento da ilegitimidade da inclusão do nome do recorrente na Certidão da Dívida Ativa e, consequentemente, no afastamento da condenação imposta ao ente público em indenização por danos morais e materiais. Alternativamente, requer-se a modulação do quantum indenizatório fixado, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista as peculiaridades do caso concreto e a ausência de dolo ou culpa grave por parte da Administração Pública. Compulsando os autos (Id. 242178172), verifica-se que foi ajuizada a execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003, fundada na Certidão de Dívida Ativa n.º 201415378, referente à "Falta de recolhimento de ICMS garantido integral" e à "Falta de recolhimento de ICMS garantido integral – formação de estoque", em nome de DCP Máquinas, Implementos e Peças Agrícolas LTDA, no importe de R$ 7.040.432,60 (sete milhões, quarenta mil, quatrocentos e trinta e dois reais e sessenta centavos), na qual o autor, ora 2º apelante, figura como corresponsável. Além disso, verifica-se que o autor, ora 2º apelante, opôs embargos à execução n.º 0001523-65.2017.8.11.0003, objetivando o reconhecimento da ilegitimidade passiva do embargante, bem como subsidiariamente, que fosse reconhecida a nulidade dos lançamentos tributários, e declarada a prescrição, além de indenização por danos morais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), e honorários advocatícios de sucumbência fixados em 20% do valor da causa (Id. 242178180). Os embargos foram apensados aos autos da execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003 em 20/03/2017 (Id. 242178672), em 22/09/2017, foram rejeitados ante a ausência de garantia à execução. Em sede de contestação (Id. 242178680), o Estado de Mato Grosso informou que os embargos à execução interpostos pelo apelante perderam o objeto, uma vez que não havia interesse processual. Isso se deve à alteração e substituição da certidão de dívida ativa executada nos autos, resultando na exclusão do apelante do rol de devedores executados. Dessa forma, ele não mais integra o polo passivo do processo executivo fiscal. Além disso, na data do protocolo dos embargos à execução, em 24/02/2017, o apelante já havia sido excluído da execução fiscal desde 09/05/2016. A sentença reconheceu que o Estado de Mato Grosso incluiu indevidamente o nome do autor na Certidão de Dívida Ativa (CDA) nº 201415378, o que resultou no seu envolvimento em ação de execução fiscal no valor de R$ 7.040.432,60 (sete milhões quarenta mil quatrocentos e trinta e dois reais e sessenta centavos). Portanto, no caso sob análise, estando evidenciada a ilicitude tanto da inclusão no rol de corresponsáveis pela dívida ativa quanto da inserção no polo passivo da execução fiscal, uma vez que jamais existiu relação jurídico-tributária entre a empresa e o demandado, conforme comprova a documentação acostada — já que o autor nunca foi sócio da empresa nem possuía qualquer vínculo com ela —, impõe-se o reconhecimento do dano presumido, bem como do nexo de causalidade entre a conduta da Fazenda Pública e o prejuízo experimentado pela parte autora. Assim, revela-se plenamente cabível a compensação por danos extrapatrimoniais, especialmente porque, no presente caso, a responsabilidade do ente público é objetiva, prescindindo da aferição de culpa. Dessa forma, resta configurado o dano moral, uma vez demonstradas a falha e o erro na prestação do serviço público, os quais resultaram em prejuízos e transtornos ao autor, ultrapassando o mero dissabor. Com efeito, embora não tenha dado causa à inclusão de seu nome no rol de corresponsáveis pela dívida ativa, tampouco à sua inserção no polo passivo da execução fiscal n.º 0013824-15.2015.8.11.0003, foi submetido a tais adversidades exclusivamente em razão da conduta indevida do Estado. É certo que o protesto indevido de certidão de dívida ativa dispensa a prova do dano moral, por se cuidar de dano in re ipsa: “A jurisprudência desta Corte entende que em se tratando de protesto indevido de título, o dano moral configura-se in re ipsa, ou seja, não depende de prova” (STJ – AgInt no AREsp 1867219/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 3.10.2022, DJe 5.10.2022). Por essa vertente, o Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA NÃO CONHECER DO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE DEMANDADA. 1. Está pacificado nesta Corte Superior que a inscrição indevida em cadastro negativo de crédito, por si só, configura dano in re ipsa. Precedentes.1.1. É inviável o acolhimento da tese da ausência de responsabilidade civil da agravante, pois, para tanto, seria imprescindível o revolvimento do acervo fático-probatório, providência vedada a esta Corte Superior ante o óbice da Súmula 7/STJ. 2. A ausência de enfrentamento da questão objeto da controvérsia pelo Tribunal de origem impede o acesso à instância especial, porquanto não preenchido o requisito constitucional do prequestionamento, nos termos da Súmula 282 e 356 do STF, aplicável por analogia. 3. A falta de indicação, pela parte recorrente, de quais dispositivos legais teriam sido objeto de interpretação divergente pelo acórdão recorrido implica em deficiência da fundamentação do recurso especial, incidindo o teor da Súmula 284 do STF, por analogia. 4. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 2291017 MA 2023/0035447-3, Relator: MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/06/2023) [destaquei]”. “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECONSIDERAÇÃO DE DECISÃO. AFASTAMENTO DA SÚMULA N. 182 DO STJ. NOVA ANÁLISE. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. PROTESTO INDEVIDO. SÚMULA N. 475 DO STJ. DANO MORAL IN RE IPSA. PESSOA JURÍDICA. CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83 DO STJ. INCIDÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. "Responde pelos danos decorrentes de protesto indevido o endossatário que recebe por endosso translativo título de crédito contendo vício formal extrínseco ou intrínseco, ficando ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas" (Súmula n. 475 do STJ). 2. Nos casos de protesto indevido de título e de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, o dano moral é considerado in re ipsa, ainda que a parte prejudicada seja pessoa jurídica. 3. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 2634490 CE 2024/0164197-4, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 23/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/09/2024)[destaquei]”. Da mesma forma, tanto o Tribunal de Justiça quanto a Turma Recursal deste Estado têm consolidado entendimento nesse sentido. “[...]RECURSO INOMINADO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO COM PEDIDO DE DANO MORAL - IPTU - SENTENÇA SEPERVENINETE NO PROCESSO PRINCIPAL – EXECUÇÃO FISCAL - RECONHECENDO A PRESCRIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO- DANO MORAL CONFIGURADO - SENTENÇA REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. O ajuizamento de execução fiscal para a cobrança indevida cuja inexistência deveria ser de conhecimento da Fazenda Pública por si só faz presumir a ocorrência de dano moral (dano moral in re ipsa). A caracterização do dano moral pelo simples fato de ter protestado indevidamente o nome da parte autora é suficiente para a configuração do dano moral, caso que prescinde da prova da ocorrência de abalo psicológico relevante. (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 0011628-12.2010.8.11.0015, Relator: EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Data de Julgamento: 15/04/2024, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 22/04/2024) [destaquei]”. “RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE OBRIGAÇAO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - VENDA DE VEÍCULO – COMUNICADO DE VENDA REALIZADO – AUSÊNCIA DE ATUALIZAÇÃO CADASTRAL POR PARTE DO RECLAMADO – INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA – DANO MORAL CONFIGURADO – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. In casu, a parte Autora comprovou que realizou o comunicado de venda do seu veículo na época da venda. Todavia, por equívoco do reclamado, a propriedade do veículo não foi alterada. 2. A jurisprudência é assente no sentido de que a inscrição indevida na dívida ativa é apta a ensejar a responsabilização por danos morais, pois tal conduta viola os direitos da personalidade dos inscritos, notadamente seu nome, sua imagem e sua honra. 3. Recurso conhecido e provido. (TR-MT, N.U 1042276-54.2022.8.11.0041, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 20/05/2024, Publicado no DJE 24/05/2024) RECURSO INOMINADO CÍVEL. FAZENDA PÚBLICA. EXECUÇÃO FISCAL. COBRANÇA DE IPTU. DÉBITO QUITADO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. NEGLIGÊNCIA NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO E REGISTRO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA. VALOR DO DANO. REDUÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TR-MT, N.U 1007950-89.2023.8.11.0055, TURMA RECURSAL CÍVEL, WALTER PEREIRA DE SOUZA, Primeira Turma Recursal, Julgado em 27/11/2023, Publicado no DJE 01/12/2023) [destaquei]”. “DIREITO ADMINISTRATIVO E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM DÍVIDA ATIVA. RECONHECIMENTO DE DANO MORAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO ESTADO E PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO AUTOR. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta por Osvaldo Camilo do Prado e pelo Estado de Mato Grosso contra sentença da 3ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que julgou parcialmente procedente ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais e materiais, determinando o cancelamento de CDA inscrita indevidamente e reconhecendo o direito a danos morais no valor de R$ 10.000,00, mas negando a reparação por danos materiais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em: (i) saber se o valor dos danos morais fixados deve ser majorado e se o pedido de danos materiais deve ser reconhecido; (ii) saber se o Estado de Mato Grosso deve ser desobrigado de indenizar o autor pelos danos morais decorrentes da inscrição indevida em dívida ativa. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A jurisprudência do STJ estabelece que o dano moral por inscrição indevida em dívida ativa se configura in re ipsa, sendo presumido e dispensando a prova específica de abalo psíquico ou financeiro. 4. O valor de R$ 10.000,00 foi considerado proporcional à gravidade dos fatos e aos danos sofridos, não havendo motivo para majoração. 5. Não há fundamento jurídico para a reparação dos honorários contratuais pagos pelo autor, pois tais despesas decorrem de pacto privado com o advogado constituído. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Apelação do Estado de Mato Grosso desprovida. Apelação de Osvaldo Camilo do Prado parcialmente provida para fixar o prazo de 30 dias para o cancelamento da CDA, sob pena de multa diária de R$ 500,00. Tese de julgamento: "A inscrição indevida de débito em dívida ativa configura dano moral presumido, sendo cabível a indenização mesmo sem a comprovação de abalo concreto." Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 186 e 404; CPC, arts. 85, § 8º e 86. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1838091/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 29.11.2021. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10234145220228110003, Relator: ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 29/10/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 07/11/2024) [destaquei]”. A indevida inclusão do nome do autor em dívida ativa e ajuizamento de execução fiscal possuem gravidade suficiente para justificar a reparação por danos morais. No arbitramento do valor, não há critérios rígidos pré-estabelecidos, cabendo ao julgador ponderar as circunstâncias do caso concreto, considerando a condição das partes, o grau de culpa e o caráter compensatório da indenização, sem que isso resulte em enriquecimento sem causa. In casu, embora o 2º apelante alegue que a majoração do quantum indenizatório se impõe em razão do valor expressivo da Certidão de Dívida Ativa na qual foi indevidamente inserido, tal pretensão não merece prosperar. Isso porque não houve prejuízo efetivo ao patrimônio do autor, não se justificando, portanto, a majoração da condenação. Por outro lado, a obrigação de indenizar revela-se incontestável, pois não se pode reduzir a mera contrariedade o fato de o requerente ter sido compelido, por anos, a suportar os ônus de uma execução de valor expressivo, fruto de um equívoco estatal. O dano, nesse contexto, é inegável e transcende qualquer alegação de mero dissabor, configurando violação evidente aos direitos do requerente. Diante desse contexto e das provas constantes nos autos, a quantia fixada na origem revela-se adequada, sem configurar excesso ou destoar do entendimento predominante nesta instância recursal. Assim, mantenho a condenação do Estado de Mato Grosso ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A propósito, destaca-se o seguinte julgado: "APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROTESTO INDEVIDO DE CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA (CDA) – FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A fixação do valor do dano moral em R$ 10.000,00 (dez mil reais), em razão de protesto indevido de certidão de dívida ativa, atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 2. Recurso não provido”. (N.U 1026919-34.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 28/08/2024, Publicado no DJE 31/08/2024)”. No que concerne aos danos materiais, verifica-se, não há comprovação do dano alegado pela parte autora, uma vez que a contratação de advogado particular constitui uma liberalidade, e não uma obrigação. Isso porque o autor poderia ter sido assistido por um Defensor Público, considerando sua hipossuficiência. Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça possui o seguinte entendimento consolidado: “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. RESTITUIÇÃO A TÍTULO DE DANOS MATERIAIS. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. ACÓRDÃO DE 2º GRAU EM DISSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. I. Agravo interno aviado contra decisão que julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/2015. II. Trata-se, na origem, de Ação de Indenização ajuizada pela parte ora agravante em desfavor da Prefeitura Municipal de São Paulo, com o objetivo de obter o ressarcimento dos danos materiais advindos da contratação de advogados, técnicos e juristas renomados para a defesa de seus interesses em processo em que fora autuada pela demolição de imóvel em que desenvolvia empreendimento imobiliário. O Tribunal de origem reformou a sentença, que julgara improcedente a demanda. III. O acórdão recorrido encontra-se em dissonância com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual "a contratação de advogados para defesa judicial de interesses da parte não enseja, por si só, dano material passível de indenização, porque inerente ao exercício regular dos direitos constitucionais de contraditório, ampla defesa e acesso à Justiça" (STJ, AgRg no AREsp 516.277/SP, QUARTA TURMA, Rel. Ministro MARCO BUZZI, DJe de 04/09/2014). Nesse sentido: STJ, AgInt na PET no AREsp 834.691/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 13/02/2019; REsp 1.696.910/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2017; AgRg no AgRg no REsp 1.478.820/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe de 19/04/2016; AgRg no AREsp 810.591/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, DJe de 15/02/2016. IV. Na hipótese, estando o acórdão recorrido em dissonância com a jurisprudência sedimentada nesta Corte, merece ser mantida a decisão ora agravada, que conheceu do Agravo, para dar parcial provimento ao Recurso Especial interposto pelo Município de São Paulo, a fim de reconhecer a impossibilidade de a Municipalidade arcar com os honorários contratuais do profissional contratado pela parte autora. V. Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp n. 2.135.717/SP, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 30/10/2023, DJe de 6/11/2023.) [destaquei]”. No tocante aos honorários sucumbenciais, fixados em 10% sobre o proveito econômico obtido, constata-se que sua fixação se encontra em estrita conformidade com o artigo 85 do Código de Processo Civil, não se vislumbrando fundamento para eventual majoração, conforme se depreende: “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. § 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais: I - mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;”. Dessarte, ambos os recursos mostram-se desprovidos de amparo, porquanto a sentença recorrida não comporta qualquer reforma no tocante às matérias impugnadas, impondo-se, assim, sua integral manutenção. Quanto aos consectários legais, a Emenda Constitucional n.º 113/2021 determina que, nas condenações envolvendo a Fazenda Pública, os valores deverão ser atualizados pela taxa Selic, aplicada de forma única e acumulada mensalmente, desde 9/12/2021. Para períodos anteriores, devem ser observados os critérios fixados nos Temas 810 do STF e 905 do STJ. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONDENAÇÕES JUDICIAIS CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. RELAÇÃO JURÍDICA NÃO TRIBUTÁRIA. JUROS DE MORA. PARÂMETROS. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009. OBSERVÂNCIA IMEDIATA. SUPERVENIÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 113/2021. APLICABILIDADE DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. AGRAVO INTERNO PROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, após a interposição do presente agravo, afetou o RE 1.317.982 com a finalidade de uniformizar a controvérsia acerca da "validade dos juros moratórios aplicáveis nas condenações da Fazenda Pública, em virtude da tese firmada no RE 870.947 (Tema 810), na execução de título judicial que tenha fixado expressamente índice diverso." No referido julgamento, foi fixada a tese correspondente ao Tema 1.170 no sentido de ser "aplicável às condenações da Fazenda Pública envolvendo relações jurídicas não tributárias o índice de juros moratórios estabelecido no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009, a partir da vigência da referida legislação, mesmo havendo previsão diversa em título executivo judicial transitado em julgado." 2. Por outro lado, o acórdão recorrido determinou a incidência de juros de mora e de correção monetária nos termos da legislação vigente à época dos fatos. Assim, em face do julgado acima referenciado, cumpre adequar a decisão atacada aos precedentes vinculantes das Cortes de vértice, aplicando o regime de juros moratórios da atual redação do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, mas somente no período imediatamente seguinte à entrada em vigor da Lei n. 11.960/2009, até a data da promulgação da Emenda Constitucional n. 113/2021. 3. Em suma, os juros de mora, no caso concreto, incidem nos seguintes termos: (i) relativamente ao período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (ii) quanto ao período posterior à vigência da Lei n. 11.960/2009, incidem juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (com a ressalva destacada no parágrafo anterior); e (iii) para as parcelas vencidas a partir de 9/12/2021, é de se fixar a Selic, nos termos do art. 3º da EC n. 113/2021. 4. A propósito da correção monetária, conforme estabelecido no julgamento repetitivo do Tema 905 deste Superior Tribunal de Justiça, inaplicável a redação do art. 1º-F da Lei 9.494/2007, por ter sido declarada inconstitucional neste ponto. Portanto, deve ser observada a aplicação de índices capazes de captar o fenômeno inflacionário, até o advento da citada Emenda, ocasião em que prevalecerá "a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente." 5. Agravo interno provido. (AgInt no REsp n. 1.902.479/SP, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 14/5/2024, DJe de 20/5/2024)”. Esta Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso consolidou o seguinte entendimento: “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO -AÇÃO INDENIZATÓRIA – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO –– ALEGAÇÃO DE OMISSÃO – OCORRÊNCIA – JUROS E CORREÇÃO – CONSECTÁRIOS LEGAIS QUE DEVEM SER FIXADOS CONFORME OS TEMAS 810 DO STF E 905 DO STJ ATÉ O ADVENTO DA EC 113/2021, APÓS, APLICAÇÃO DA TAXA SELIC - OMISSÃO RECONHECIDA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1 - Os embargos de declaração são cabíveis somente para sanar omissão, obscuridade ou contradição contida no julgado ou, ainda, para sanar erro material. 2 – Deve incidir sobre o valor, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, consoante art. 3º da EC 113/2021, abrangendo tanto a atualização monetária, quanto a compensação de mora. (TJ-MT, N.U 1002770-46.2019.8.11.0051, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 30/10/2023, Publicado no DJE 10/11/2023)”. “DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto pela Fazenda Pública contra sentença que condenou o ente público ao pagamento de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), a título de danos morais, decorrentes de acidente de trânsito ocasionado por ação de policial militar. II. Questão em discussão: 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é possível afastar a responsabilidade civil do Estado pelo acidente de trânsito; e (ii) determinar se o quantum indenizatório deve ser reduzido em observância aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. III. Razões de decidir: 3. A responsabilidade civil do Estado pelo evento danoso foi reconhecida em outros autos, sendo incabível a rediscussão de questão já decidida. 4. Quanto ao valor arbitrado, a aplicação do método bifásico indica que o montante de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) ultrapassa os patamares jurisprudenciais estabelecidos em casos similares. Assim, o quantum foi reduzido para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 5. A atualização do débito deve seguir a taxa SELIC a partir de 9.12.2021, vedada a cumulação com outros índices de correção monetária ou juros de mora, conforme a EC n. 113/2021. IV. Dispositivo e tese: 6. Recurso provido em parte. Tese de julgamento: “O valor da indenização por danos morais deve ser fixado de forma proporcional e razoável, considerando as circunstâncias do caso e os precedentes, admitida a redução do quantum quando excessivo.” Dispositivos relevantes citados: EC n. 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1152541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 13.9.2011; TJMT, N.U 0029263-49.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Gilberto Lopes Bussiki, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 27.2.2024; TJMT, N.U 0026376-92.2015.8.11.0041, Rel. Dr. Antônio Veloso Peleja Júnior, Câmara Temporária de Direito Público e Coletivo, j. 29.11.2022. (N.U 0026374-25.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 11/12/2024, Publicado no DJE 17/12/2024)”. Dessa forma, por versar sobre matéria de ordem pública, a superveniência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 autoriza sua revisão de ofício, independentemente do teor dos pedidos, sem que tal medida configure afronta ao princípio da non reformatio in pejus. Ante o exposto, e em plena consonância com a fundamentação expendida, NEGO PROVIMENTO aos recursos interpostos pelo Estado de Mato Grosso e Gilberto Carnelocci, mantendo incólume a sentença proferida pelo juízo a quo. Quanto aos consectários legais, determino, ex officio, a aplicação dos critérios estabelecidos nos Temas 810/STF e 905/STJ para juros e correção monetária até a vigência da Emenda Constitucional n.º 113/2021 (9/12/2021), a partir de quando deverá incidir exclusivamente a taxa SELIC para ambos os encargos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025

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Processo nº 1000499-93.2020.4.01.4302

ID: 330714603

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1000499-93.2020.4.01.4302

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

ADILSON ALVES PIMENTA ZELIO CARRIJO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

GRACIANO SILVA

OAB/TO XXXXXX Desbloquear

CLEVER FERREIRA COIMBRA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000499-93.2020.4.01.4302 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000499-93.2020.4.01.4302 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: Ministério Públic… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1000499-93.2020.4.01.4302 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000499-93.2020.4.01.4302 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: CLEVER FERREIRA COIMBRA - GO11587-A e GRACIANO SILVA - TO7990-A POLO PASSIVO:RAUL DIAS NAVES e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: CLEVER FERREIRA COIMBRA - GO11587-A e GRACIANO SILVA - TO7990-A RELATOR(A):SOLANGE SALGADO DA SILVA PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA APELAÇÃO CRIMINAL (417) 1000499-93.2020.4.01.4302 RELATÓRIO A Exma Sra Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva (Relatora): Trata-se de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF), e pelos réus ZÉLIO CARRIJO e ADILSON ALVES PIMENTA contra sentença (ID 304185346) proferida pelo Juízo da Vara Federal Cível e Criminal da Subseção Judiciária de Gurupi/TO, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal deduzida em desfavor dos recorrentes ZÉLIO CARRIJO e ADILSON ALVES PIMENTA e dos corréus RAUL DIAS NAVES e RICARDO GOMES MARCHINI, absolvendo, na mesma oportunidade, o acusado CLÉVER FERREIRA COIMBRA. A sentença recorrida condenou os réus ADILSON ALVES PIMENTA, ZÉLIO CARRIJO, RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES pela prática do crime tipificado no artigo 19 da Lei 7.492/86, em concurso de pessoas (art. 29 do CP) e em continuidade delitiva (art. 71 do CP), com a incidência da circunstância agravante do art. 61, II, ‘g’, do Código Penal para o réu RAUL DIAS NAVES. Segunda a denúncia (ID 304183045): “(…) No ano de 2011, RAUL DIAS NAVES, ZÉLIO CARRIJO, CLEVER FERREIRA COIMBRA, ADILSON ALVES PIMENTA e RICARDO GOMES MACHINI, de forma livre e consciente, obtiveram, mediante fraude, financiamento com recursos oriundos do PRONAF – Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar – perante a agência do Banco do Brasil de Palmeirópolis/TO, mediante a utilização de documentos ideologicamente falsos em nome de ADÍLIO RAFAEL GONÇALVES GOMES, UILSON PEREIRA GOMES, MÁRCIO RODRIGUES DOS SANTOS, MARTHA BORGES DE MELO, IVANY DA SILVA, DANIEL RODRIGUES DA SILVA e DANILO VIEIRA DA SILVA. No mesmo contexto fático, os denunciados aplicaram os recursos provenientes do aludido programa em finalidade diversa daquela prevista nos contratos de financiamento. (…) O inquérito policial que dar suporte à presente ação penal foi deflagrado com base em representação formulada pelo Banco do Brasil (fls. 04/13) da qual se extrai a realização de contratação de Cédulas Pignoratícias (fls. 14/67, 68/118, 120/176, 177/250, 255/308 e 310/371), supostamente firmadas por ADÍLIO RAFAEL GONÇALVES GOMES, MÁRCIO RODRIGUES DOS SANTOS, MARTHA BORGES DE MELO, IVANY DA SILVA, DANIEL RODRIGUES DA SILVA, DANILO VIEIRA DA SILVA e UILSON PEREIRA GOMES, em face da referida instituição bancária. Tais operações financeiras, efetuadas no ano de 2011, tinham como objeto a exploração agropecuária, consistente na aquisição de bovinos, matrizes e reprodutores, para serem criados na FAZENDA RENASCER, supostamente de propriedade de MARIA HELENA ALVES FLEURY. O valor do financiamento efetivado pelos denunciados em nome das referidas pessoas soma-se a importância de R$ 779.448,00 (setecentos e setenta e nove mil e quatrocentos e quarenta e quatro reais) (fls. 21/29, 71/81, 123/130, 180/188, 258/265 e 313/321). Verificou-se que, para lograrem êxito nas contratações fraudulentas, os denunciados apresentaram ao Banco do Brasil, de relevante, os seguintes documentos: i) declaração, supostamente expedida por MARIA HELENA ALVES FREURY, representada por ZÉLIO CARRIJO, cujo teor refere-se à autorização para exploração de seu imóvel sob regime de comodato – fl. 17; ii) declaração de Aptidão ao Pronaf, subscrita por ADILSON ALVES PIMENTA – fl. 31; iii) Projeto de Investimento Agropecuário, confeccionado em nome da Empresa CENTRO OESTE CONSULTORIA (CNPJ 03.375.346/0001-62) – fls. 32/53; iv) procuração pública firmada entre MARIA HELENA ALVES FLEURY (outorgante) e ZÉLIO CARRIJO (outorgado) – fl. 61; e v) contrato de comodato – fls. 63/64. Estes documentos foram utilizados em nome de todos os contratantes do financiamento (fls. 14/67, 68/119, 120/176, 177/250, 255/308 e 310/371). (…) Os denunciados RAUL DIAS NAVES, ZÉLIO CARRIJO, CLEVER FERREIRA COIMBRA, ADILSON ALVES PIMENTA e RICARDO GOMES MACHINI, no ano de 2011, obtiveram financiamento, com recursos do PRONAF, perante o Banco do Brasil de Palmeirópolis/TO, utilizando-se de documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato e Declaração de Aptidão ao Pronaf) em nome de ADÍLIO RAFAEL GONÇALVES GOMES, UILSON PEREIRA GOMES, MÁRCIO RODRIGUES DOS SANTOS, MARTHA BORGES DE MELO, IVANY DA SILVA, DANIEL RODRIGUES DA SILVA e DANILO VIEIRA DA SILVA. (…)” Sobreveio aditamento à denúncia (ID 304185318), assim sintetizado: “(…) I – Aditamento à denúncia 2. Em proêmio, Exa., nos termos dos art. 384 e art. 569 do CPP, cumpre ao Ministério Público Federal propor o presente aditamento à denúncia em desfavor dos acusados, haja vista as eivas detectadas na narrativa fática por ocasião do oferecimento da inicial incoativa, as quais somente foram percebidas pelo órgão ministerial já com a instrução processual avançada. 3. Registre-se que o aditamento à denúncia é medida necessária para sanar os vícios da imputação contida na denúncia formalizada pelo Ministério Público Federal, sendo lícita a correção da narrativa fática até a prolação da sentença. Tem-se medida impositiva para resguardar o devido processo legal e os direitos dos acusados, ao passo em que a inicial, nos termos em que formulada, consubstancia nítida criptoimputação. Aos acusados em processo penal deve ser assegurado conhecer exatamente os termos da acusação a fim de que possam exercer o contraditório e a ampla defesa em sua plenitude. Neste contexto, o presente aditamento se impõe, ao passo em que a inicial é confusa e não pormenorizou as fraudes. Passa a constar da inicial incoativa o seguinte teor da narrativa fática devidamente individualizada com relação a cada um dos golpes aplicados pelos denunciados: Primeira série de fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00527-5 Em data de 28 de outubro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Adílio Rafael Gonçalves Gomes, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00527-5 expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço acima indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência a uma miríade de delitos visando a obter fraudulentamente em favor do grupo financiamentos com recursos oriundos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), o qual é uma política pública que utiliza juros subsidiados em favor de pequenos produtores rurais. Para viabilizar a consecução dessas fraudes, os denunciados agiram concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. Para a obtenção dos diversos financiamentos fraudulentos pelos denunciados, o esquema criminoso engendrado era articulado e dividido em núcleos com a segmentação de tarefas a cargo de cada um deles. Inicialmente, a fim de permitir a obtenção do financiamento, o grupo atribuiu ao denunciado Zélio a obtenção e falsificação de documentos envolvendo a propriedade rural que serviria para comprovar a existência de uma atividade rural por parte do proponente. Para tanto, o denunciado Zélio obteve documentos relativos a um imóvel rural denominado “Fazenda Renascer”, o qual era sediado no município de Palmeirópolis/TO, e seria de propriedade de Maria Helena Alves Fleury. Consta que Maria Helena teria negociado o imóvel com o denunciado Zélio ainda no ano de 2009, porém não teria procedido à adequada transferência de propriedade do bem mediante escritura pública de compra e venda e posterior transcrição no registro de imóveis. (…) Segunda série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00530-5 Em data de 8 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Martha Borges de Melo, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00530-5 expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço ora indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência às fraudes que vinham praticado em desfavor do Banco do Brasil e do PRONAF, ocasião em que obtiveram fraudulentamente novo financiamento com recursos daquele programa. Para viabilizar a consecução dessa fraude, os denunciados agiram com o mesmo modus operandi e concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. (…) Terceira série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/0053 3 – X Em data de 11 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Daniel Rodrigues da Silva, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00533-X expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço ora indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência às fraudes que vinham praticado em desfavor do Banco do Brasil e do PRONAF, ocasião em que obtiveram fraudulentamente novo financiamento com recursos daquele programa. Para viabilizar a consecução dessa fraude, os denunciados agiram com o mesmo modus operandi e concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. (…) Quarta série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 484-8 Em data de 20 de setembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Márcio Rodrigues dos Santos, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.948,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00484-8 expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço ora indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência às fraudes que vinham praticado em desfavor do Banco do Brasil e do PRONAF, ocasião em que obtiveram fraudulentamente novo financiamento com recursos daquele programa. Para viabilizar a consecução dessa fraude, os denunciados agiram com o mesmo modus operandi das demais fraudes e concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. (…) Quinta série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 563-1 Em data de 23 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Ivany da Silva, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00563-1 expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço ora indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência às fraudes que vinham praticado em desfavor do Banco do Brasil e do PRONAF, ocasião em que obtiveram fraudulentamente novo financiamento com recursos daquele programa. Para viabilizar a consecução dessa fraude, os denunciados agiram com o mesmo modus operandi e concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. (…) Sexta série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 539-9 Em data de 18 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Danilo Vieira da Silva, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00539-9 expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço ora indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência às fraudes que vinham praticado em desfavor do Banco do Brasil e do PRONAF, ocasião em que obtiveram fraudulentamente novo financiamento com recursos daquele programa. Para viabilizar a consecução dessa fraude, os denunciados agiram com o mesmo modus operandi e concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. (…) Sétima série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 519-4 Em data de 17 de outubro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Uílson Pereira Gomes, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00519-4 expedida por aquela instituição financeira. Nas condições de tempo e espaço ora indicadas, os denunciados, agindo em conluio entre si, deram sequência às fraudes que vinham praticado em desfavor do Banco do Brasil e do PRONAF, ocasião em que obtiveram fraudulentamente novo financiamento com recursos daquele programa. Para viabilizar a consecução dessa fraude, os denunciados agiram com o mesmo modus operandi e concertados entre si, obtendo e utilizando documentos falsos e produzindo propostas inidôneas para apresentação perante o Banco do Brasil. (…) Assim agindo, os denunciados Zélio Carrijo, Cléver Ferreira Coimbra, Adílson Alves Pimenta e Ricardo Gomes Marchini praticaram as condutas delitivas previstas no art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, c/c art. 29, caput, c/c art. 71, ambos do CP por, pelo menos, sete vezes. Já o denunciado Raul Dias Naves praticou as condutas delitivas previstas no art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, c/c art. 29, caput, art. 61, II, alínea “g” e art. 71, caput, todos do CP, por, pelo menos, sete vezes. Em face do acima exposto, o Ministério Público Federal requer: a) o recebimento da presente denúncia para que surta seus jurídicos e legais efeitos; b) a citação dos denunciados para apresentar resposta à acusação por defensor constituído sob pena de, em não o fazendo, ser-lhes nomeado defensor dativo; c) seja designada audiência de instrução e julgamento, procedendo-se à inquirição das testemunhas arroladas pelo Parquet Federal; d) ao final, sejam os denunciados condenados nas penas previstas em lei; e) seja fixado o valor mínimo de reparação a ser pago solidariamente pelos denunciados, nos termos do art. 387, IV, do CPP, em favor do PRONAF e do Banco do Brasil, no importe mínimo de R$ 909.348,00 (novecentos e nove mil trezentos e quarenta e oito reais), correspondente ao valor dos financiamentos fraudados, o qual deverá ser acrescido de correção monetária e juros de mora desde a data do fato (súmula 54 do STJ). 4. Ficam mantidos os demais termos da inicial incoativa ofertada, mormente a qualificação dos acusados, ao passo em que os demais aspectos foram amplamente modificados para aclarar os termos da acusação deduzida. Igualmente, deixa o Ministério Público Federal de apresentar novo rol de testemunhas quanto aos novos fatos articulados, porquanto os testigos já foram inquiridos e apresentaram suas declarações de modo incontroverso na audiência de instrução e julgamento levada a efeito na assentada de 20 e 21 de outubro de 2021. O objeto do presente aditamento diz respeito, em verdade, explicitar os fatos e sua capitulação jurídica, em homenagem à ampla defesa e ao contraditório. (…) V – Formação de quadrilha 16. É certo que também não foi objeto de denúncia o crime do art. 288 do CP, o qual ficou claramente configurado. Em verdade, os réus montaram verdadeira organização criminosa para fraudar o PRONAF e o Banco do Brasil, com a participação de um empregado público. Ocorre que o delito de organização criminosa somente foi criado com a edição da Lei n. 12.850/2013, posterior aos fatos. Não obstante, incidiria a figura da formação de quadrilha vigente à época (atual associação criminosa – art. 288 do CP). Aquele delito tinha pena máxima de 3 anos, sendo o prazo prescricional dele de 8 anos. 17. Com o oferecimento de denúncia apenas quanto aos crimes cometidos em 2011, já havia transcorrido lapso superior a 8 anos quando do oferecimento da denúncia, razão pela qual seria inviável a persecução do crime de formação de quadrilha. Não obstante, não houve requerimento para reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva em cota anexa à inicial por parte do Ministério Público Federal. 18. De outra banda, é certo que a associação criminosa permaneceu em atividade até 2012, ocasião em que novos financiamentos fraudulentos foram obtidos pelo grupo. Contudo, considerando que não houve, até o presente momento, a dedução de acusação quanto a estes fatos, nada resta salvo postular a V. Exa. o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva quanto ao crime de bando ou quadrilha, na forma do art. 107, IV, c/c art. 109, IV, do CP. (…)” A denúncia foi recebida em 06/3/2020. A sentença condenatória/absolutória foi proferida em 23/08/2022 (ID 304185346) e considerada publicada em cartório (art. 389, CPP), para fins interruptivos da prescrição (art. 117, IV, CP), nesta mesma data em que proferida no PJe. O fundamento principal para a condenação foi a comprovação da materialidade, autoria e dolo em um esquema de obtenção de sete financiamentos fraudulentos com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Foram opostos embargos de declaração por RICARDO GOMES MARCHINI, aos quais se negou provimento (ID 304185376). Em suas razões recursais (ID 304185355), o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL postula a reforma parcial da sentença para: a) impor aos réus a condenação solidária na obrigação de reparar o dano provocado; b) reconhecer o error in judicando na dosimetria, a fim de que a majorante do crime continuado incida após as demais causas de aumento de pena e não pelo chamado “método fracionário (ou isolado)”; e c) como consequência, majorar as penas privativas de liberdade e de multa, essa tanto em seu aspecto global quantitativo quanto em seu aspecto unitário, além de aplicar o regime semiaberto. Requer: i) seja conhecido o presente recurso de apelação, uma vez que próprio e tempestivo; ii) no mérito, seja o recurso provido para: a) impor aos réus a condenação solidária na obrigação de reparar o dano provocado no importe mínimo de R$ 909.348,00, devidamente acrescidos de juros de mora e atualização monetária desde a data dos desvios, na forma do art. 387, IV, do CPP, uma vez que houve pedido na denúncia, no aditamento e nas alegações finais e o quantum debeatur nem sequer foi questionado pelos apelados; b) seja reconhecido o error in judicando contido na sentença condenatória quando tratou da figura do crime continuado (art. 71 do CP) como se fosse uma simples causa de aumento de pena da terceira etapa da dosimetria penal, em franca violação ao art. 68 e seu parágrafo único, uma vez que ela não integra o critério trifásico, incidindo após a fixação de pena para cada delito, nos termos da fundamentação doutrinária; c) por conseguinte, seja a pena dos apelados Zélio, Ricardo e Adílson majorada para o patamar mínimo de 4 anos, 5 meses e 10 dias de reclusão, modificando-se o regime inicial de resgate para o semiaberto, nos termos do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal; d) seja a pena do recorrido Raul recrudescida para o patamar mínimo de 5 anos, 2 meses e 6 dias de reclusão, mantido o regime inicial semiaberto, na forma do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal; e) seja a pena de multa dos apelados Zélio, Ricardo e Adílson aumentada para 35 dias-multa, à razão unitária de ½ do salário mínimo vigente ao tempo dos crimes; f) no que toca ao recorrido Raul, seja a pena de multa majorada para o patamar de 45 dias-multa, também à razão unitária de ½ do salário mínimo vigente ao tempo dos crimes. O apelante ZÉLIO CARRIJO: 1) Formulou pedido de gratuidade da justiça na peça de interposição do apelo (ID 304185357). 2) Interpôs recurso de carta testemunhável com o seguinte teor (ID 307819530, p. 03): O Testemunhante, por meio do pertinente Recurso em Sentido Estrito, se insurgiu contra a decisão que negou o recurso de apelação. Recurso em comento fora interposto dentro do prazo legal, contudo, sob a ótica do juiz, em ação de abuso de autoridade e pratica de crime, negou o processamento do recurso de apelação, sob o argumento de que o advogado está impedido de exercer o seu mister, porque ao tempo do andamento processual, foi incluído no processo. Mesmo, após sua absolvição continua impedido. O Magistrado a quo, todavia, entendeu, que o advogado esta impedido de exercer seu mister, por sua faculdade em total afronta a legislação. 2.1) Além dessa questão preliminar de nulidade / cerceamento de defesa pela violação ao direito de escolha de advogado, nessa peça interpôs RESE e arguiu preliminares de nulidade relativa ao aditamento da denúncia; argui a prescrição da pretensão punitiva e a incompetência da Justiça Federal. 2.2) No mérito, sustenta a ausência de provas de autoria e dolo, pugnando pela anulação do processo, “desde o recebimento da denúncia, e possibilitar ao recorrente a proposta de não persecução penal”, e, no mérito, a sua absolvição (ID 307819530, p. 46). A defesa de ADILSON ALVES PIMENTA formulou pedido de gratuidade da justiça na peça de interposição do apelo (ID 304185357) e, nas razões recursais (ID 311323040), alega, em síntese, a inexistência de prova suficiente para a condenação, notadamente quanto à autoria e ao elemento subjetivo do tipo (dolo). Requer, por isso, sua absolvição com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal e, subsidiariamente, a redução da pena-base ao mínimo legal. Contrarrazões apresentadas pelas defesas de ADILSON ALVES PIMENTA (ID 304185390), ZÉLIO CARRIJO (ID 307819529) e conjuntamente por RAUL DIAS NAVES e RICARDO GOMES MARCHINI (ID 331255625), refutando o recurso ministerial e pugnando pela manutenção da sentença. Instada a se manifestar, a Procuradoria Regional da República, em parecer (ID 344642637), opinou pelo conhecimento e provimento do apelo do MPF e pelo conhecimento e desprovimento dos recursos interpostos pelas defesas de ADILSON ALVES PIMENTA e ZÉLIO CARRIJO. Em recente petição (02/06/2025), a defesa de ZELIO CARRIJO vem (ID 437283798): “(...) informar o reconhecimento de nulidade pela instância singela Foi dado andamento a cobrança da multa imposta ao advogado pelo exercício regular do direito, via processo 1002770-41.2021.4.01.4302, acolhendo por final a exceção de pre-executividade no ID - 2189578265, que extinguiu a execução. Nesse compasso, reconheceu a nulidade dos atos praticados desde o momento do impedimento. Diante do exposto requer conhecer da PRELIMINAR e declarar nulo todos os atos processuais, desde a citação.” É o relatório. Ao Revisor (CPP, art. 613, I; RI-TRF1, artigos 30, III, c/c 301, caput). PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA APELAÇÃO CRIMINAL (417) 1000499-93.2020.4.01.4302 V O T O A Exma Sra Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva (Relatora): A análise será dividida em três partes: inicialmente, serão enfrentadas as questões preliminares e prejudicial suscitadas pela defesa do réu Zélio Carrijo e o pedido de gratuidade formulado por este e pelo corréu Adilson; (ii) em seguida, o mérito dos recursos das defesas; e, por fim, (ii) o mérito do recurso interposto pelo Ministério Público Federal. A defesa do apelante Zélio Carrijo levanta uma série de questões processuais que, segundo sustenta, maculariam o processo de nulidade. Contudo, nenhuma delas merece acolhida. Antes disso, contudo, analisa-se a arguida incompetência da Justiça Federal e, firmada sua competência, os pressupostos de admissibilidade. 1. Da incompetência da Justiça Federal, arguida pela defesa de ZÉLIO CARRIJO (ID 307819530, p. 28 e ss.) Alega-se que a elementar normativa financiamento, constante do art. 19 da Lei 7.492/86, não está presente no caso concreto e, caso haja tipificação penal da conduta, esta se amoldaria ao crime de estelionato (art. 171 do CP), e não a crime contra o sistema financeiro, o que tornaria a Justiça Federal incompetente. Não prospera essa questão preliminar. Consoante será melhor explorado abaixo quando da análise da materialidade, a conduta se amolda ao disposto no artigo 19 (financiamento fraudulento), da Lei 7.492/86, o qual é forma especial de estelionato, devendo prevalecer sobre este em caso de concurso aparente de normas penais, por aplicação do princípio da especialidade. Ademais, na análise do mérito será visto que estão presentes todas as elementares do tipo previsto no art. 19 da Lei 7.492/1996 (“Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira”), devendo-se prestigiar o princípio da especialidade e da tipicidade. Ademais, o tipo penal do artigo 19 da Lei 7.492/86 pune a conduta de "obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira". A distinção elementar entre o mútuo comum (empréstimo) e o financiamento reside na destinação específica dos recursos. No caso dos autos, é incontroverso que os recursos que foram concedidos para financiamento eram oriundos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), uma política pública federal, e se destinavam a uma finalidade vinculada: a exploração agropecuária, com aquisição de bovinos. Tratando-se, portanto, de verbas federais com destinação específica, obtidas fraudulentamente em financiamento junto à instituição financeira executora (in casu, o Banco do Brasil S.A.), a conduta se amolda perfeitamente ao tipo de financiamento fraudulento tipificado no sobredito artigo 19 da Lei 7.492/86. Consequentemente, a competência para o processo e julgamento é da Justiça Federal, por força do disposto no artigo 26 da Lei 7.492/86[1] e no artigo 109, IV e VI, segunda figura, da Constituição Federal[2]. Firmada a competência desta Justiça Federal, prossigo iniciando pela análise da admissibilidade das apelações. 2. Da admissibilidade recursal As apelações são tempestivas e a sentença atacada é recorrível via apelação (art. 593, I, CPP), bem como estão presentes os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual conheço do recurso. 3. Outras questões preliminares 3.1 Do pedido de gratuidade da justiça formulado pelos apelantes ZÉLIO CARRIJO (ID 304185357) e ADILSON ALVES PIMENTA (ID 304185357). Em relação ao apelante ZÉLIO CARRIJO não se encontrou (i) declaração de hipossuficiência econômica ou (ii) comprovantes indicadores de insuficiência de recursos para tal mister ou, ainda, (iii) procuração com a cláusula específica para “assinar declaração de hipossuficiência econômica” (cf. exige o art. 105, caput, CPC), razão pela qual fica indeferido o pleito de gratuidade da justiça. De outra parte, defiro o pedido de gratuidade da justiça ao apelante ADILSON ALVES PIMENTA, uma vez que restaram preenchidos os requisitos legais exigidos para tanto, pois presente a declaração de insuficiência econômica (ID 304185106), nos termos da Lei 1.060/50[3] c/c art. 98, caput, c/c art. 99, caput e §§ 3º e 4º, ambos do CPC[4], c/c Lei 7.115/83[5]. 3.2 Do pedido da defesa de ZELIO CARRIJO no ID. 437283798 e do recurso de carta testemunhável (ID 307819530) / Da alegada nulidade do feito Em recente petição (02/06/2025), a defesa de ZELIO CARRIJO vem (ID 437283798) “(...) informar o reconhecimento de nulidade pela instância singela Foi dado andamento a cobrança da multa imposta ao advogado pelo exercício regular do direito, via processo 1002770-41.2021.4.01.4302, acolhendo por final a exceção de pre-executividade no ID - 2189578265, que extinguiu a execução. Nesse compasso, reconheceu a nulidade dos atos praticados desde o momento do impedimento. Diante do exposto requer conhecer da PRELIMINAR e declarar nulo todos os atos processuais, desde a citação.” Nada a prover porque no RESE 1000704-20.2023.4.01.4302/TO (PROCESSO REFERÊNCIA: 1000704-20.2023.4.01.4302), interposto pelo advogado Clever Ferreira Coimbra, ataca-se decisão que, segundo alega, indeferiu o reconhecimento de matéria de ordem pública, nos autos de processo em que se executa multa a ele imposta por litigância de má-fé. Nada a prover também em relação ao recurso de carta testemunhável (ID 307819530) e ao pedido de nulidade do feito que, no ponto, sustenta o apelante a ocorrência de nulidade por cerceamento de defesa, ao argumento de que o juízo de origem violou seu direito à livre escolha de advogado ao afastar seu patrono constituído e nomear defensor dativo. No ponto, o juízo a quo assim decidiu (ID 304185376): (...) Quanto ao recurso interposto pela defesa do réu ZÉLIO CARRIJO (ID 1288652262), entendo ser a representatividade formal, ponto fundamental para a validade da peça processual apresentada, no caso, a apelação. Nos presentes autos, este juízo já decidiu que o advogado CLÉVER FERREIRA COIMBRA – OAB/GO 11.587, não possuía legitimidade para representar os interesses do acusado ZÉLIO CARRIJO. Por ora, mantenho a decisão de de desconstituição do advogado CLÉVER FERREIRA COIMBRA, outrora constituído pela parte ZÉLIO CARRIJO (ID 275026975), tendo em vista que o aludido advogado também é réu no presente processo criminal. Deixo de receber o recurso de apelação de ID 1288652262, por ausência de legitimidade para a representação processual. Interpostos recursos conjuntos de carta testemunhável e RESE, o juízo a quo, após não conhecer do RESE interposto pelo advogado CLEVER FERREIRA COIMBRA na defesa do apelante Zelio Carrijo (ID 304185391), posteriormente assim reviu seu posicionamento para permitir que a defesa de Zélio Carrijo fosse efetuada pelo advogado/réu absolvido CLEVER FERREIRA COIMBRA (ID 304185397): Verifica-se dos autos que o acusado CLEVER FERREIRA COIMBRA foi absolvido da imputação formulada na denúncia, tendo sido registrado o trânsito em julgado da Sentença absolutória em 22/02/2023 (ID 1536672851). Diante da absolvição do ora acusado CLEVER FERREIRA COIMBRA entendo que fica afastado eventual prejuízo ao córreu ZÉLIO CARRIJO por colidências de defesas e/ou interesses antagônicos que poderiam advir da representação de um acusado por outro córreu, notadamente em casos onde ambos atuaram com estreita relação fático-jurídica na dinâmica dos fatos objeto da presente ação penal. Cumpre lembrar que CLEVER FERREIRA COIMBRA foi absolvido por insuficiência de provas para a condenação. Nesse sentido, a fim de preservar a coerência lógico-processual de minhas decisões, sempre pautado na salvaguarda dos direitos e garantias fundamentais dos acusados no presente processo, bem como visando dar concretude ao postulado constitucional da plenitude de defesa ao acusado ZÉLIO CARRIJO, entendo que o advogado CLEVER FERREIRA COIMBRA – OAB/GO n° 11.587 poderá, de agora em diante, representar os interesses daquele acusado (ID 1288652265). Assim, determino a retificação da autuação para a inclusão do advogado CLEVER FERREIRA COIMBRA –OAB/GO sob o n° 11.587 nos presentes autos, bem como a intimação de ZÉLIO CARRIJO, via sistema, para manifestar se ratifica a apelação apresentada no ID 1288652262, cujas razões recursais serão apresentadas em superior instância, no prazo de 08 (oito) dias. Determino a desconstituição do advogado dativo Dr. FERNANDO PISONI - OAB/TO 8.588 (ID 1420550779) em relação ao réu ZÉLIO CARRIJO. Oportunamente, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com nossas homenagens. Em face dessa decisão, ratificou-se a petição de interposição do apelo de Zelio Carrijo (ID 304185400) e, nesta segunda instância, apresentou-se as razões de apelação pela defesa desse réu. Como se vê destes fragmentos e demais atos judiciais de 1º Grau, a alegação de nulidade não procede. O advogado constituído pelo réu Zélio Carrijo era, à época, o corréu Cléver Ferreira Coimbra. A existência de um manifesto e intransponível conflito de interesses impedia que um réu atuasse como advogado de outro na mesma ação penal, em que ambos eram acusados da prática de crimes em concurso de agentes. A decisão do magistrado de primeiro grau em afastar o patrono e nomear defensor dativo foi, portanto, medida de cautela processual que visou, paradoxalmente, a garantir a efetividade da ampla defesa do próprio apelante, evitando uma defesa técnica colidente ou deficiente. O processo penal não admite a defesa patrocinada por corréu em situação de clara colidência de interesses. Ademais, tão logo cessado o impedimento, com a absolvição do advogado Cléver Ferreira Coimbra, o magistrado prontamente o reabilitou para exercer o patrocínio da causa, conforme expressa vontade do réu (ID 304185397 c/c ID 304185400), o que demonstra o respeito do juízo ao direito de escolha do acusado. Não se vislumbra, assim, qualquer prejuízo ou nulidade, lembrando-se que também não se demonstrou prejuízo à defesa do apelante Zélio. Rejeito a preliminar. 3.3 Da nulidade do aditamento da denúncia, arguida pelo apelante ZÉLIO CARRIJO O apelante argumenta pela nulidade do aditamento à denúncia, por ter sido oferecido após o interrogatório dos réus, o que violaria o disposto no artigo 400 do Código de Processo Penal (ID 307819530, p. 14). Sem razão, novamente. O aditamento, conforme justificou o Ministério Público Federal e acatou o juízo (ID 304185327), foi proposto para "sanar os vícios da imputação contida na denúncia" e "explicitar os fatos e sua capitulação jurídica, em homenagem à ampla defesa e ao contraditório" (ID 304185318, p. 28). Tratou-se de emendatio libelli, com detalhamento das sete condutas em continuidade delitiva, e não de mutatio libelli com a inserção de fatos novos e desconhecidos. Após o aditamento, foi devidamente oportunizado às defesas o direito ao contraditório e ampla defesa, nos termos do art. 384, §2º, do CPP (cf. decisão – ID 304185323, p. 02), não havendo demonstração de qualquer prejuízo efetivo. A jurisprudência dos Tribunais Superiores consolidou-se no sentido de que a eventual inobservância da ordem processual constitui nulidade relativa, que depende da demonstração de prejuízo concreto para a parte que a alega, o que não ocorreu no caso. Por fim, consoante bem registrado no Parecer da PRR1, não se verifica qualquer irregularidade no aditamento à denúncia, que foi recebido de forma legítima, uma vez que atendeu aos requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, na mesma linha já afirmada acima, bem pontuou o MPF que, após o aditamento, as defesas tiveram oportunidade de se manifestar e requerer a produção de provas, ficando assegurados o contraditório e a ampla defesa. Rejeito a preliminar. 3.4 Do ANPP Verifica-se que a defesa de Zélio Carrijo pugna pela anulação do processo, “desde o recebimento da denúncia, e possibilitar ao recorrente a proposta de não persecução penal” (ID 307819530, p. 46). No ponto, o MPF atuante em 1º Grau, intimado (IDs 304185275 e 304185317), já se manifestou concretamente pela inviabilidade de oferecimento de acordo de não persecução penal no caso concreto, cf. ID. 304185318, pp. 28/29. Nesse prisma, e tendo em vista que alguns dos motivos – vide itens 7 e 8 da manifestação de ID 304185318, p. 28 – pelas quais não se ofertou ANPP não guardam relação com a tese firmada pelo Plenário do STF no julgamento do HC 185.913 em set/2024 e, de forma autônoma, são suficientes para a negativa de oferta de ANPP, deixa-se de converter o julgamento em diligência para tal mister. 3.5 Da prejudicial de prescrição da pretensão punitiva, arguida pelo apelante ZÉLIO CARRIJO (ID 307819530, p. 15/16) A defesa alega a ocorrência da prescrição, contudo, o argumento carece de fundamento. De partida, é inaplicável à hipótese o invocado art. 117, § 1º, do CP, pois este regular situação diversa ao determinar que a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime e que, nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles. No mais, trata-se de alegação genérica em que não se demonstra, no caso concreto, o transcurso do prazo prescricional pela pena (máxima) em abstrato, já que há recurso também do MPF visando, dentre outros, a majoração da pena corporal de ambos os apelantes/réus. E para que não se alegue, indevidamente, a negativa de prestação jurisdicional, cumpre oportunamente registrar que o crime do artigo 19 da Lei 7.492/86 tem pena máxima em abstrato de 06 (seis) anos de reclusão em seu preceito secundário que, somado à causa de aumento de pena fixa de 1/3 de seu parágrafo único, resulta em pena máxima de 8 anos. Nos termos do artigo 109, inciso III, do Código Penal, o prazo prescricional para tal pena é de 12 (doze) anos. Os fatos ocorreram entre 20 de setembro de 2011 (cédula pignoratícia 40/00484-8) e 23 de novembro de 2011 (cédula pignoratícia 40/00563-1), e o recebimento da denúncia, primeiro marco interruptivo da prescrição (art. 117, I, CP), ocorreu em 06 de março de 2020 (ID 304185047), antes do transcurso do lapso de doze anos. A sentença condenatória, por sua vez, foi publicada em 23 de agosto de 2022 (ID 304185346), constituindo novo marco interruptivo (art. 117, IV, CP) pela sua publicação em cartório/secretaria nesta data (art. 389, CPP). Portanto, não há que se falar em prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato, única possível de verificação neste capítulo preliminar do mérito da condenação e diante de recurso do MPF visando majorar a pena, o que evita, já neste momento, o cálculo da prescrição pela pena em concreto fixada na sentença. Sem prejuízo, obviamente, de seu recálculo abaixo, se necessário e após estabilizada a pena nesta sede recursal. Rejeito a prejudicial. 4. Do mérito da condenação Dos apelos das defesas de ZÉLIO CARRIJO e ADILSON ALVES PIMENTA Superadas as questões preliminares e prejudicial, passo ao exame do mérito dos apelos defensivos de ZÉLIO CARRIJO e ADILSON ALVES PIMENTA, que se concentram na alegação de insuficiência de provas para a condenação e, se mantida a condenação, analisar o apelo do MPF. Esses réus, ora apelantes, foram condenados pela prática do delito do art. 19 da Lei 7.492/86, que tem a seguinte redação: Art. 19. Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é cometido em detrimento de instituição financeira oficial ou por ela credenciada para o repasse de financiamento. Sobre a materialidade, autoria delitiva e o elemento subjetivo (dolo) dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, assim consignou-se na sentença recorrida (ID 304185346): Aqui, o agente efetiva um financiamento em instituição financeira, por meio de fraude, induzindo-a em erro. Frise-se, sem o meio fraudulento, o agente não conseguiria obter o financiamento. O bem jurídico aqui protegido é a salubridade do Sistema Financeiro Nacional. É crime comum, podendo ter como autor, qualquer pessoa; material; comissivo; de dano; instantâneo; e admite-se a forma tentada. A causa de aumento de pena prevista no parágrafo único, diz respeito a instituição financeira de natureza pública, que trabalha com recursos públicos. Consuma-se com a obtenção do financiamento (crime material). (...) Feita essa exposição inicial, cumpre analisar, nesse passo, todo o lastro probatório contido nos autos. Esta análise servirá para verificação do cometimento, por parte dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, CLÉVER FERREIRA COIMBRA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, da conduta que se amolda ao disposto no artigo 19, da Lei nº 7.492/86, c/c os artigos 29, caput e 71, ambos do Código Penal; e do réu RAUL DIAS NAVES, da conduta que se amolda ao disposto no artigo 19, da Lei nº 7.492/86, c/c os artigos 29, caput, 61, II, “g” e 71, todos do Código Penal. À vista disso. Vejamos parte da representação formulada pelo Banco do Brasil, em síntese (ID 184783931 – pág. 04/13): “(…) Trata-se de suposta fraude na contratação de Cédulas Rurais Pignoratícias com Recursos do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) Nrs 40/00563-1, 40/00530-5, 40/00527-5, 40/00539-9, 40/00484-8 e 40/00533-x, realizadas no Banco do Brasil S/A, no valor individual de R$ 129.900,00 (cento e vinte nove mil e novecentos reais) por parte de (seis) dos Noticiados acima descritos e R$ 129.948,00 (cento e vinte e nove mil novecentos e quarenta e oito reais) pelo Noticiado Marcio Rodrigues, todas destinadas ao financiamento da aquisição de bovinos, matrizes e reprodutores localizados em imóvel rural chamado “Fazenda Renascer”, situado no município de Palmeirópolis – Tocantins, com vencimento em 2021. Este imóvel – Fazenda Renascer – tem área de 361,55.20 hectares conforme escritura de compra e venda registrada no cartório de imoveis de Palmeirópolis – TO, e pertence a Sra. Maria Helena Alves Fleury (proprietário anterior João Baptista Carrijo e esposa), a qual legalmente representada por seu procurador Zelio Carrijo. celebrou Contrato de Comodato com cada Noticiado tendo por objeto da avença a disponibilização de parte da área no imóvel, que para cada um exercesse suposta atividade laborativa agropecuária. Ocorre que, em procedimento de rotina de acompanhamento de operações, foi realizada vistoria pelo Fiscal de Operações, João Luiz da Silva Zinn, tendo sido esse informado pessoas da região que não tinham qualquer conhecimento da existência de tal fazenda, da proprietária e dos noticiados, o que sugere irregularidade na contratação da operação em tela, realizada também com base nas Declarações de Aptidão do PRONAF (DAP), emitidas por Adilson Alves Pimenta, CPF 758.289.361-15. Em seguida., o aludido Fiscal em pesquisa junto a ADAPEC (Agência de Defesa Agropecuária) verificou por parte dos funcionários o desconhecimento dos Noticiados, e que esses não apresentaram documentação de comprovação de vacinas o que indica que tais bovinos financiados possivelmente não existem. (…) Por fim, verificou-se, ainda, diversas falhas na contratação das operações tais como: a) operações contratadas sem a realização de vistora prévia; b) operações contratadas mediante apresentação de Contratos de Comodato inválidos, com a assinatura do Sr Zélio Carrjo, em que esse só lhe foi concedido o poder de vender e transferir o imóvel e não fazer Contratos de Comodatos com o nome da então proprietária, Maria Helena; c) operações contratadas mediante apresentação de DAP's (Declaração de Aptidão ao PRONAF) emitidas por entidade de outro estado, atestando que Os mutuários não residiam no imóvel; d) liberação dos recursos diretamente as contas correntes dos mutuários tendo sido os recursos destinados a pessoas diferentes daquelas emitentes das Notas Fiscais; e) que vários cheques emitidos pelos mutuários beneficiaram pessoas de um determinado círculo, inclusive a empresa de ATNI (Assistência Técnica em Nível de Imóvel), que depositou parte do valor na conta corrente da esposa do funcionário do Banco, Raul Dias Naves, em que esse realizou todas as análises das operações, sendo o próprio funcionário a pessoa que indicou a empresa para firmar convênio com a agência. Os fatos alusivos a participação do Sr. Raul Dias Naves, aliás, foram materializados em processo administrativo nº 120.909 – Audit/Goiânia 8375-5/20120002037-10, que culminou na demissão do funcionário. Com base em todos os fatos e fundamentos jurídicos supra, bem como da documentação encaminhada, observa-se que os noticiados, em tese cometeram diversos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, previstos na Lei n 7492/86 especificamente àqueles previstos nos artigos 7 99 que podem incidir no caso em tela especialmente o disposto no Artigo 19 e 20: (…)” Relatório de Fiscalização, elaborado por João Luiz da Silva Zinn, fiscal de operações do Banco do Brasil, em síntese (ID 184783931 – pág. 15/16, ID 184783937 – pág. 08/09, ID 184854888 – pág. 08/09 e ID 185449935 – pág. 30/31): “(…) Mutuário não localizado. Faz parte de grupo de 07 pessoas que dividiram a fazenda RENASCER em lotes de 51,60ha, através de contrato de comodato, cujos 02 roteiros fornecidos não proporcionam chegada ao imóvel. Grupo de 07 pessoas que receberam contrato de comodato: Danilo Vieira da Silva; Márcio Rodrigues dos Santos: Uilson Pereira Gomes; Daniel Rodrigues da Silva: vany da Siva; Adlio Rafael Gonçalves Gomes e Martha Borges de Melo. Após seguir os roteiros indicados, além da busca de informações com pessoas dessas regiões, constatei que, além da fazenda e de sua proprietária, todos os nomeados acima eram desconhecidos. Em pesquisa na ADAPEC verifiquei que, além do mesmo desconhecimento acima, todos os 07 mutuários não apresentaram comprovantes das vacinas de maio/2012, o que indica que os bovinos financiados no existem. Em buscas no CRI local comprovei que o imóvel existe e continua em nome da Sra. Maria Helena Alves Fleury embora não saibam o acesso correto, afirmaram que os roteiros fornecidos não dão chegada ao imóvel, quando me indicaram o agrimensor Haroldo Soares Guimarães para esclarecer a localização da fazenda RENASCER. Em visita ao Sr. Haroldo este confirmou conhecer a propriedade, onde esteve recentemente em decorrência do Georreferenciamento da fazenda do Sr. Fernando Sagrillo, um dos lindeiros da fazenda RENASCER, dizendo, inclusive que estava a procura da Sra. M Helena para assinatura de documentos. O Sr. Haroldo afirmou que a fazenda é totalmente bruta, toda de serras e o acesso é via Minaçu - GO, havendo necessidade de transpor o córrego Mucambão a pé, que desconhece o mutuário e as demais pessoas que compõem o grupo, aproveitando para fornecer as reais confrontações do imóvel, cfe abaixo: Sul e Leste – Fernando Sagrillo; Norte – Edimar de "tal"; e Oeste – Córrego Mucambão. Na oportunidade contatamos o Sr. Edimar, um dos lindeiros e encarregado de "cuidar do imóvel. O Sr. Edimar, encarregado pela proprietária de olhar" a fazenda, embora já se passaram vários anos do último contato, confirmou as características do imóvel descritas acima, servindo apenas como reserva florestal, atribuindo-lhe, inclusive, o valor de + RS 400,00/ha. Acrescentou que um dos acessos, pela Serra das Antas, só após alegar desconhecer todas as 07 pessoas envolvidas, que nenhuma atividade agropecuária é desenvolvida na propriedade e, mesmo que pudesse ser, não seria a pecuária leiteira em hipótese alguma, além de desconhecer que tenha sido vendida. Localizada a Sra. Maria Helena, via telefone, esta alegou desconhecer toda a situação, dizendo que vendera a fazenda em 2009, via procuração específica e com prazo determinado, e que não assinou nenhum documento cedendo o imóvel para exploração pecuária. Pelo que foi averiguado, se constata que o imóvel não foi visitado pelo ASTEC ou por outra pessoa na época da análise da operação. (…)” Agora, parte do despacho da Polícia Federal, em síntese (ID 185558864 – pág. 31/40): “(…) 2 Os fatos vieram a lume com a representação ofertada pelo Banco do Brasil S/A dando conta de fraude na contratação de Cédulas Rurais Pignoratícias com recursos do PRONAF nos valores de individuais de R$ 129.000,00 e RS 129.948,00, para a aquisição de bovinos para serem criados na fazenda Renascer, no município de Palmeirópolis de propriedade de MARIA HELENA ALVES FLEURY. Contudo, averiguações encetadas pelo agente financeiro apontaram indícios de que: a) no referido imóvel rural não existem os bens financiados, ou seja, não há criação de gado na referida fazenda; b) os lindeiros da fazenda não bens conheceriam os supostos criadores de gado e tomadores dos empréstimos: c) eles também não são conhecidos na ADAPEC e não apresentaram documentação de comprovação de vacinas; d) Haroldo Soares Guimarães, residente em Palmeirópolis, afirmou que a fazenda é totalmente bruta; e) apesar de constar que ZELIO CARRIJO celebrou contratos de comodato (com base em procuração que não dava poderes para tal f1. 380) com cada tomador de empréstim0 em nome da senhora MARIA HELENA, esta teria afirmado que vendeu a fazenda em 2009 e não cedeu o imóvel para exploração agropecuária. 3. Com efeito, ADILIO RAFAEL GONÇALVES GOMES, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00527-5, com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato. Declaração de Aptidão ao Pronaf), conforme consta no dossiê de fl. 14/67. 4. IVANY DA SILVA, em 2011. obteve financiamento com recursos do PRONAF, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00563-1. com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato, Declaração de Aptidão ao Pronaf), conforme consta no dossiê de fl. 255/309. 5. MARTHA BORGES DE MELO, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00530-5, com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato, Declaração de Aptidão ao Pronaf), conforme consta no dossiê de fl. 68/119. 6. UILSON PEREIRA GOMES, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF conforme Cédula Pignoratícia n 40/00519-4. com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato, Declaração de Aptidão ao Pronaf), conforme consta às fl. 841/801 (mídia anexa). 7. DANIEL RODRIGUES DA SILVA, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00533-X, com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato, Declaração de Aptidão ao Pronaf), conforme consta no dossiê de fl. 120/176. 8. MARCIO RODRIGUES DOS SANTOS, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00484-8, com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato, Declaração de Aptidão ao Pronaf). conforme consta no dossiê de fl. 177/254. 9. DANILO VIEIRA DA SILVA, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00539-9, com o Banco do Brasil de Palmeirópolis com base em documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato. Declaração de Aptidão ao Pronaf), conforme consta no dossiê de f 310/372. 10. Cumpre esclarecer que o suposto Contrato de Comodato foi firmado entre os nacionais acima referido e MARA HELENA, naquele ato representado por ZÉLIO CARRIJO com base em procuração contestada pela suposta outorgante MARIA HELENA. 11. MARIA HELENA não foi ouvida ainda nos autos, entretanto, segundo informações do próprio Banco do Brasil ela não teria cedido a fazenda para exploração agropecuária, mas teria vendido o imóvel no ano de 2009 (f1. 07, in fine). 12. Apurou-se, ainda, que elaboração dos "Projetos de Investimento Agropecuário teria sido realizado pela empresa Centro-Oeste Consultoria (ILTON RODRIGUES SANTIAGO JUNIOR E CIA LTDA -ME). Com efeito. em todos os dossiês citados acima, constam projetos que teriam sido elaborados pela empresa CENTRO-OESTE CONSULTORIA. com a finalidade de viabilizar a fraude. Sendo alguns deles subscrito por RICARD0 GOMES MARCHINI e outros sequer constava a assinatura do técnico. 13. Segundo o apurado na ação disciplinar n. 120.909-04608, promovida pelo Banco do Brasil, as pessoas acima nominadas. obtiveram, ainda no ano de 2012. outro financiamento na modalidade PRONAF Custeio (ver fl. 13). 14. Ainda, na referida ação disciplinar, constatou-se que a fraude não Se limitou aos contratos acima mencionados. Com efeito. REINALDO RIBEIRO SANTOS, em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF, conforme Cédula Pignoratícia n 40/562-3. 15. ELLIDA PEREIRA SILVA. em 2011. obteve financiamento com recursos do PRONAF-Mais Alimentos, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00483-X e em 2012, obteve financiamento PRONAF - Custeio, operação n. 460801207 com o Banco do Brasil de Palmeirópolis. 16. ANDRE LUIZ FERREIRA REZENDE. em 2011, obteve financiamento com recursos do PRONAF-Mais Alimentos, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00576-3 em 2012, obteve financiamento RONAF-Custeio. operação n. 460801188 com o Banco do Brasil de Palmeirópolis. 17. JOSÉ DO REGO NETO, em 2011, obteve financiamento com recursos do BB INVEST. AGROP. TRAD. conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00494-5 e em 2012. obteve financiamento PRONA – Custeio, operação n. 40005 79 com o Banco do Brasil de Palmeirópolis. 18. CRISTIANE OLIVEIRA RAMOS. em 2011. obteve inanciamento com recursos do PRONAF-Mais Alimentos, conforme Cédula Pignoratícia n. 40/00243-8 com o Banco do Brasil de Palmeirópolis. (…) 57. De tudo que foi apurado até a presente data, ressai NAVES, na qualidade de funcionário do Banco do Brasil S/A. agência de Palmeirópolis, em comunhão de desígnios com ZÉLIO CARRIJO. RICARDO GOMES MACHINI e ADILSON ALVES PIMENTA, lograram obter financiamento mediante a falsificarão de documentos em nome de ADILIO RAFAEL GONCALVES GOMES, UILSON PEREIRA GOMES, MÁRCIO RODRIGUES DOS SANTOS, MARTHA BORGES DE MELO, IVANY DA SILVA, DANIEL RODRIGUES DA SILVA e DANILO VIEIRA DA SILVA. 58. Outrossim, foram carreados aos autos elementos de prova indicando que ADILIO RAFAEL GONCALVES GOMES, UILSON PEREIRA GOMES, MARTHA BORGES DE MELO, IVANY DA SILVA, participaram, do esquema fraudulento, ao obter financiamento para o qual não preenchia os requisitos. 59 Em relação à IVANY DA SILVA e DANILO VIEIRA DA SILVA, embora haja indícios de suas participações, até o momento não se conseguiu ouvi-los. 60 No concernente à Cédula de Crédito Rural firmada por MARCIO RODRIGUES DOS SANTOS, os elementos de prava apontam para a falsidade não só da documentação referente a operação de crédito, mas também para a própria existência de tal pessoa (ver fls. 615/619). (…)” Vejamos o depoimento das testemunhas arroladas pelo MPF e pelas defesas dos réus, obtidos em audiência, os quais merecem ser sintetizados – transcrição não literal: Testemunha: Uilson Pereira Gomes (arquivos de vídeo ID 788906973 e ID 788922459). Que se recorda dos fatos envolvendo uma situação de contrato de empréstimo do Pronaf; que no ano de 2012, morou num chácara no município de Minaçu/GO; que nunca pegou empréstimo em banco para aplicação na chácara; que não forneceu cópias dos seus documentos; que sabe que houve depósito nessa conta corrente em Palmeirópolis, mas que não teve acesso ao dinheiro; que ficou sabendo da existência dessa quando compareceu a delegacia da Polícia Federal. Testemunha: Sebastião Carlos Arriel (arquivos de vídeo ID 788922459 e ID 788932478). Que conta com 92 anos de idade; que nunca foi até a da fazenda renascer; que nada sobre o empréstimo do Pronaf; que não tinha relação com essas pessoas. Testemunha: Daniel Rodrigues da Silva (arquivos de vídeo ID 788932478 e ID 788945970). Que se recorda dos fatos envolvendo seu nome e contratos fraudulentos; que não conhece os réus; que não tem ideia de como seu nome foi envolvido nessa fraude; que nunca perdeu ou teve seus documentos roubados; que não foi ao banco; que prestou declarações junto a Polícia Federal; que não fez nenhum empréstimo junto ao Pronaf. Testemunha: Rosane Nogueira Ambrósio (arquivos de vídeo ID 788945970, ID 788971962, ID 788971965, ID 788971993, ID 788994477, ID 789016969 e ID 789017010). Que é funcionário do Banco do Brasil; que se recorda dos fatos; que o gerente do banco lhe chamou e informou que o banco havia feito pedido informações acerca dessas operações realizadas junto ao Pronaf; que as operações não foram feitas no mesmo dia; que as 7 operações foram feitas num período de 3 meses; que o réu RAUL DIAS NAVES era assistente de negócios, trabalhava na linha de frente; que as operações chegavam apenas para despacho; que todas as operações foram precedidas de uma análise por parte do réu RAUL DIAS NAVES; que pelo que entendeu, as pessoas nunca foram ao banco, nem abriram as contas; que RAUL DIAS NAVES não libera empréstimo, apenas fazia a fiscalização das operações. As outras testemunhas (Natalia Lucas de Paula, Lisângelo Cavalcante de Lima, Carlos Gonzaga Arriel e Ezequiel Vicente de Farias), arroladas pela acusação e pelas defesas dos réus, em nada contribuíram para elucidação dos fatos, tampouco para formação do convencimento deste Juízo, assim sendo, deixo de fazer a transcrição dos seus depoimentos (ID 789017010, ID 789054456, ID 789068467, ID 789091989, ID 789106993, ID 789134961, ID 789134993, ID 789170468, ID 789191492 e ID 789220456). Reparemos no interrogatório dos réus, obtidos em audiência, os quais merecem ser sintetizados – transcrição não literal: Réu: ADILSON ALVES PIMENTA (arquivos de vídeo ID 789220456, ID 789170536 e ID 789202536). Que conta com 58 anos de idade; que está aposentado por invalidez; que só sabe desenhar o próprio nome; que mora de favor, em terra rual; que nunca respondeu outro processo criminal; que sabe do que se trata o processo; que atuava no Movimento de Pequenos Agricultores (MPA); que assinava Declarações de Aptidão ao Pronaf (DAP); que não recebia dinheiro para essas assinaturas; que não conhece os réus RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES; que conhece ZÉLIO CARRIJO, CLÉVER FERREIRA COIMBRA, de vista; que não sabe usar computador. Réu: ZÉLIO CARRIJO (arquivos de vídeo ID 789202536, ID 789259479, ID 789274468 e ID 789292958). Que conta 61 anos de idade; que está desempregado; que tem uma companheira; que faz “bicos”; que recebe ajuda de um sobrinho; que sabe do que se trata o processo; que conhece Maria Helena; que comprou a terra da Sra. Maria Helena; que cedeu o uso da terra, em troca do valor de R$ 40.000,00; que quando fez o contrato, não tinha consciência de qualquer fraude; que não recebeu dinheiro; que não até o Banco de Brasil de Palmeirópolis/TO. Réu: CLÉVER FERREIRA COIMBRA (arquivos de vídeo ID 789292958, ID 789308461 e ID 789308477). Que conta com 56 anos de idade; que é advogado; que é divorciado; que tem dois filhos maiores; que nunca respondeu outro processo criminal; que sabe do que se trata o processo; que nada sabe informar acerca dos contratos de comodato; que ZÉLIO CARRIJO lhe mostrou um contrato de locação no valor de R$ 40.000,00; que não é o contrato presente nos autos; que comprou gado de “Reginaldo” em Palmeirópolis/TO; que trocou uma nota do gado com uma pessoa de Goiás; que o gado que circulou ficou em Palmeirópolis/TO; que o gado nunca transpôs a divisa entre os estados; que sua participação foi ter analisado o contrato de locação apresentado por ZÉLIO CARRIJO. Réu: RICARDO GOMES MARCHINI (arquivos de vídeo ID 789259524 e ID 789330465, ID 789348448, ID 789348481, ID 789363966 e ID 789374969). Que conta com 39 anos de idade; que é prestador de serviços (máquinas de terraplanagem); que nunca respondeu outro processo criminal; que é casado; que tem uma filha de 13 anos; que sabe do que se trata o processo; que era funcionário da empresa Centro Oeste Consultória; que nunca foi representante da empresa Centro Oeste Consultória, apenas lhe prestava serviços; que elaborou projetos para essa empresa; que não era funcionário de campo; que a empresa prestava serviços para os pequenos produtores do Pronaf; que quanto a elaboração dos projetos do Pronaf, a planilha era preenchida com as informações prestadas e o programa gerava a capacidade de pagamento; que não tinha relação com o réu RAUL DIAS NAVES, mas sabia que ele era funcionário do Banco do Brasil; que a determinação para confecção dos projetos do Pronaf, partiu do Sr. Ilton Rodrigues; que não tinha contato com os pequenos produtores; que não tinha contato direto com os clientes; que não levou os projetos ao Banco do Brasil; que não tinha contato com os funcionários do Banco do Brasil; que não conhece Zélio. Réu: RAUL DIAS NAVES (arquivos de vídeo ID 789348448, ID 789348481 e ID 789363966). Que conta com 53 anos de idade; que é motorista de caminhão; que nunca respondeu outro processo criminal; que é divorciado; que tem 04 filhos; que sabe do que se trata o processo; que foi demitido do Banco do Brasil; que atuou na elaboração das informações nos sistemas do banco; que alimentava o sistema; que a conta, os cartões de assinatura e as cédulas eram assinadas foram assinadas na sua presença; que alguma vezes, foi verificada a autenticidade das assinaturas por meio de cópias; que sabia que Ilton Rodrigues era dono da empresa Centro Oeste Consultória; que os 07 projetos foram levados por Ilton Rodrigues; que abriu a maioria das contas; que para abertura das contas, os clientes foram pessoalmente ao banco; que a maior parte do dinheiro não era liberada na conta dos clientes; que normalmente, o crédito era liberado diretamente na conta do vendedor do gado, por exemplo; que todos os documentos apresentados passaram como verdadeiros; que não conhece os réus ZÉLIO CARRIJO, CLÉVER FERREIRA COIMBRA ou ADILSON ALVES PIMENTA. Vejamos o perquirido pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelas defesas dos réus. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, em sede de alegações finais, sob a forma de memoriais escritos, aduziu o seguinte, em síntese (ID 1110195748): “(…) A - Materialidade do delito A materialidade dos crimes do art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86 está patenteada nas 7 cédulas pignoratícias juntadas aos autos, cujos números são n. 40/00527-5, 40/00530-5, 40/00533-X, 40/00484-8, 40/00563-1, 40/00539-9 e 40/00519-4. Todos estes contratos individualmente foram fraudados, o que acarretou num prejuízo de R$ 909.348,00 em recursos da União destinados ao PRONAF. A realização de operação de financiamento mediante uso de documentos ideologicamente falsos acarretou na consumação do crime do art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86, conforme será explanado abaixo. É necessário frisar que o entendimento jurisprudencial é no sentido da desnecessidade de o agente auferir algum proveito econômico neste tipo de crime, bastando a obtenção fraudulenta do financiamento. Eventual locupletamento ou desvio dos valores é mero exaurimento do crime. (…) Destarte, a prova da materialidade das condutas é inerente aos contratos de financiamento carreados aos autos. Os contratos de financiamento fraudulentos restaram patenteados a partir do simples cotejo dos dados com a representação formalizada pelo Banco do Brasil às f. 23/32 dos autos. Este documento atesta que, após a formalização do financiamento, aquela instituição financeira designou um fiscal para comparecer aos imóveis rurais nos quais haveria a aplicação dos recursos a fim de apurar sua efetiva aplicação regular. Todavia, ao proceder a diligências in loco, o fiscal João Luiz da Silva Zinn constatou que as propriedades que teriam sido fracionadas a partir das terras da "Fazenda Renascer" nem sequer existiam de fato como propriedades rurais individualizadas. Isto é, aqueles imóveis somente existiam no papel e foram utilizados para a tomada do crédito. As terras eram "brutas", isto é, não possuíam benfeitorias que possibilitassem o desenvolvimento de atividades agropecuárias regulares. Igualmente, ao comparecer ao local, o fiscal constatou que não havia bovinos sendo criados naquelas propriedades. B - Autoria delitiva Constatada a existência das operações fraudulentas mediante uso de documentos falsos, cumpre examinar a conduta dos réus a fim de apurar a autoria do crime. Consoante exposto na inicial e em seu aditamento, os denunciados engendraram uma associação criminosa voltada à obtenção de financiamentos fraudulentos com recursos da linha de crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF. Estes recursos eram operações de crédito que foram concedidas a juros subsidiados por meio do Banco do Brasil, instituição financeira perante a qual todo o processo relativo à elegibilidade do financiamento agrário fora realizada. A empreitada criminosa deu-se perante a agência do Banco do Brasil localizada no município de Palmeirópolis/TO, local em que laborava o denunciado Raul, cuja participação foi fundamental para a consecução do plano criminoso levado a efeito pelos acusados. A trama levada a efeito pelos réus nem era tão sofisticada, porém dependia de um ajuste de documentos falsos e da participação direta de empregado daquela instituição financeira para sua consumação. Inicialmente, o denunciado Zélio, através de uma procuração aparentemente legítima outorgada por Maria Helena Alves Fleury envolvendo a disposição do imóvel rural denominado "Fazenda Renascer", iniciou a pactuação de diversos contratos de comodato ideologicamente falsos com outros indivíduos. (…) Após a formalização dos contratos ideologicamente falsos de comodato, tendo como suposotos contratantes Adílio Rafael Gonçalves Gomes, Ivany da Silva, Daniel Rodrigues da Silva, Uilson Pereira Gomes, Márcio Rodrigues dos Santos, Danilo Vieira da Silva e Martha Borges de Melo, iniciou-se a consecução de novos documentos falsos para possibilitar a obtenção do financiamento fraudulento. Em um segundo momento, o grupo criminoso passou a obter documentos igualmente falsos para a tentar respaldar a contratação, de modo a indicar que os comodatários seriam pequenos produtores rurais e estariam aptos a contrair financiamentos perante o PRONAF. Um destes documentos essenciais para a empreitada criminosa eram declarações de aptidão ao PRONAF, de sorte a tentar legitimar a condição dos interessados em mutuários daquele programa. O denunciado Adílson, àquela época, atuava como coordenador estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) em Goiás, entidade ligada à Associação Camponesa da Regional Norte Nordeste Tratava-se de uma organização não governamental que congregava diversos produtores rurais. Buscaram os denunciados, portanto, atribuir aos supostos comodatários a condição de pequenos produtores rurais, malgrado não ostentassem eles aquela condição. O denunciado Adílson subscreveu diretamente ou, ainda, cedeu seu nome e o nome daquele movimento de agricultores para a consecução das fraudes. Das cédulas pignoratícias objeto da ação penal, o denunciado Adílson subscreveu diretamente as declarações de aptidão ao PRONAF que foram utilizadas nas operações de crédito relativas às cédulas: i) 40/00527-5 (em nome de Adílio Rafael); ii) 40/00530-5 (em nome de Martha Borges); iii) 40/00563-1 (em nome de Ivany da Silva); iv) 40/00519-4 (em nome de Uílson Pereira Gomes). No que toca às cédulas pignoratícias 40/00533-X (em nome de Daniel Rodrigues da Silva), 40/00484-8 (em nome de Márcio Rodrigues dos Santos), 40/00539-9 (Danilo Vieira da Silva), conquanto o denunciado Adílson não tenha assinado as declarações falsas utilizadas para instruir as propostas de financiamento, é certo que o grupo utilizou mecanismo similar e diretamente relacionado a ele. O grupo fez inserir em cadastro e formulário no site do então Ministério do Desenvolvimento Agrário os dados relativos ao suposto comodatário e solicitante do financiamento. Tratava-se do documento denominado "Extrato DAP de Agricultor", de modo a tornar possível a obtenção de financiamento pelo PRONAF. Todos estes documentos estavam igualmente ligados ao Movimento dos Pequenos Agricultores que era coordenado pelo denunciado Adílson, sendo sua participação também decisiva para a consecução destas fraudes. (…) De posse destes documentos que "demonstravam" a condição de pequenos agricultores dos proponentes, o grupo obteve igualmente projetos de investimento agropecuário falsos, todos subscritos pelo denunciado Ricardo Gomes Marchini, um dos mentores do esquema criminoso. Estes documentos eram igualmente essenciais na consecução do plano arquitetado pelo grupo, ao passo em que indicavam a existência de uma suposta atividade de consultoria para os interessados os quais buscavam crédito para alavancar seus negócios. Contudo, os documentos eram mero estratagema para a consumação do delito, a fim de dar ares verdadeiros para algo que não existia. Com estes documentos todos em ordem de modo a simular: i) a existência de uma propriedade rural a ser explorada; ii) a condição de pequenos agricultores dos interessados; iii) um projeto de investimento agropecuário, o grupo deu entrada em diversas solicitações de crédito perante o Banco do Brasil, através da agência de Palmeirópolis, onde laborava o denunciado Raul. A partir dali, cabia a Raul dar andamento perante o Banco do Brasil nos requerimentos de financiamento, o que ocorreu. Foi ele um dos responsáveis por subscrever os documentos apresentados, muitos dos quais falsos, para permitir a consumação da fraude. Ele integrava, ainda, o Comitê de Crédito daquela agência bancária, sendo ele um dos responsáveis por dar pareceres pela aprovação ou reprovação das propostas apresentadas. (…) Neste contexto, devem os réus sofrer a condenação pela prática de 7 condutas capituladas no art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, na forma do crime continuado. No que pertine a Raul, a agravante do art. 61, II, alínea "g" do CP está presente, uma vez que ele era empregado do Banco do Brasil e agiu com manifesta violação e abuso de poder em relação ao cargo por ele ocupado. Zélio, Ricardo e Adílson, a seu turno, também atuaram diretamente na consecução das fraudes, cada um a a seu modo, razão pela qual também devem ser condenados. Considerando a aplicação da regra do art. 71 em sua fração máxima (2/3 - 7 crimes), o Ministério Público Federal requer a aplicação da pena em regime semiaberto, uma vez que superior a 4 anos de reclusão para todos os denunciados. (…)” Concluiu o parquet federal, que os réus ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO pela praticaram o crime previsto no artigo 19, da Lei nº 7.492/86, c/c os artigos 29, caput e 71, ambos do Código Penal; e o réu RAUL DIAS NAVES praticou o crime previsto no artigo 19, da Lei nº 7.492/86, c/c os artigos 29, caput, 61, II, “g” e 71, todos do Código Penal. Requereu por fim, a absolvição do réu CLÉVER FERREIRA COIMBRA, com fundamento no artigo 383, VII, do Código de Processo Penal; e a condenação dos réus, solidariamente, ao ressarcimento do dano, no valor mínimo de R$ 909.348,00, em favor do PRONAF, na forma do artigo 387, IV, do Código de Processo Penal. RAUL DIAS NAVES, em sede de alegações finais, sob forma de memoriais escritos, pugnou: pelo reconhecimento de nulidade absoluta (ilegitimidade de parte); e pela absolvição, nos termos do artigo 397, I, II, III, Código de Processo Penal. Em síntese (ID 1120266776): “(…) As condições pessoais do acusado são inteiramente favoráveis. Ele é primário, tem bons antecedentes, condição de emprego e ocupação lícita (trabalha hoje como motorista entregador) portanto nunca se dedicou a atividade criminosa, não pertence a organização criminosa, não integra facção sendo um homem de boa índole!! O primeiro ponto a ser observado é a ilegitimidade do réu, ensejando nulidade absoluta do feito em razão de não ser ele o responsável pelas fraudes, alem de não ter se beneficiado dos recursos oriundos de tais transações fraudulentas. E isso será demonstrado a seguir e requerendo ao MPF que atribua aos verdadeiros culpados a prática do delito e as sanções nos termos da Lei. (…) O processo não está sendo legal, posto que atribuíram a um inocente a culpabilidade por ter praticado, em tese, fraude para conseguir financiamento, totalmente descabida da realidade fática e da função do réu a época dos fatos – assistente de negócios – sem atribuição alguma inerente ao cargo que ocupava. Se o interesse da justiça é proteger o interesse público, descumprindo ou imputado ao primeiro que aparece a culpa por tal fato criminoso sem observar as balizas do processo, eis que a nulidade absoluta é medida que se impõe. (…) A Priori, o réu é totalmente inocente das acusações que lhe são imputadas. Pra começar, ele não tinha poder, não era atribuição do réu liberar qualquer tipo de financiamento, ele simplesmente recebia a documentação dos proponentes e as encaminhava...e isso é de fácil constatação, basta verificar a matrícula de quem liberou o recurso, posto que a liberação prescinde de senha e o réu mesmo que quisesse jamais poderia liberar qualquer recurso a quem quer que seja. Pra entender melhor o tema, detalharemos como funciona um empréstimo via PRONAF e ao final Excelência será verificado de forma clara que o réu não tem nada a ver com a fraude. (…) Pelo exposto acima, O réu não tem participação alguma no evento criminoso, tanto o é que ele teve constrito no arresto de bens uma moto CG 125, 2007, e que sua função hoje é de motorista entregador. Perceba, o réu perdeu tudo que tinha, um emprego concursado no Banco do Brasil, perdeu um casamento de 25 anos consolidado porque a família se decepcionou; não teve acesso aos dossiês para o exercício do contraditório e ampla defesa no processo administrativo, foi exonerado de forma sumária. E quando a pena de demissão saiu fora concedido ao réu o direito ao recurso, este, sem nenhuma chance de expor o que realmente aconteceu. Uma tramóia cuja vítima fora o réu! (…) PORTANTO REITERAMOS QUE O RÉU FOI VÍTIMA DE UMA ARMAÇÃO.!!!! E PAGOU UM PREÇO CARO SEM DEVER NADA!!! JÁ OS VERDADEIROS ENVOLVIDOS ESTÃO POR AÍ, SOLTOS COMO SE NADA TIVESSE ACONTECIDO!! O réu não recebeu vantagem indevida alguma e isto será provado na audiencia de instrução e julgamento a ser designada o quanto antes por Vossa Excelência. O caput do art. 19, da Lei 7.492/86 utiliza o verbo obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira. Essa lei é conhecida como Lei dos Crimes do Colarinho Branco. É crime especial em relação ao crime de estelionato pelo principio da especialidade. Assim, o réu não obteve nada, a ação do verbo obter exprime algo para si e em fraude para alcaçar o financiamento. Mas essa tipificação penal não pode ser aplicada ao réu pois ele não fraudou nada, não fez financiamento de nada e por corolário não obteve nada financiado. Vale lembrar mais uma vez : o réu era funcionário do Banco, exercia a função de assistente de negócio, recebia documentos, conferia parecer pós análise dos mesmos e remetia para os seus superiores hierarquicos. O que acontecia a posteriori o réu não tinha acesso, não era possível saber para quem o recurso foi distribuído pois o mesmo era atribuição do Comitê de Crédito , composto por 02 (dois ) gerentes:o gerente de serviços e o gerente geral. (…)” RICARDO GOMES MARCHINI, por meio de defesa técnica, em sede de alegações finais, na forma de memoriais escritos, pugnou pela improcedência dos pedidos do MPF, por serem as provas frágeis, não revelando o dolo do agente. Em síntese (ID 1120266787): “(…) Em que pese os argumentos do Ministério Público, sua denúncia não tem fundamentos, eis que fora elaborada baseada em conjecturas e ilações e sem provas robustas e concretas da participação de Ricardo no evento criminoso. Primeiramente, o acusado era funcionário da Centro Oeste Consultoria e possuía um contrato de prestação de serviço com o proprietário legítimo da empresa, o senhor Ilton Rodrigues Santiago Junior. (…) Portanto, não tem a menor sustentação a tese do MPF de que o acusado era o administrador da Empresa Centro Oeste consultoria e que fora ele quem fraudou o Banco do Brasil. Perceba, ele realmente assinou os projetos a pedido do proprietário da empresa e fora remunerado pelo próprio proprietário. Agora, se os valores foram repassados a terceiros ou se os valores foram desviados ou se os valores foram para outras pessoas, aí não cabe ao técnico, mesmo sabendo que ele assina um termo de responsabilidade técnica, pois não há dolo em sua conduta, não há intenção de lesar os cofres públicos, posto eu ele agiu, no máximo com culpa, sem intenção de prejudicar quem quer que fosse. (…) Em verdade o banco foi vítima de um golpe envolvendo o gerente do Banco, o proprietário da Centro Oeste e aparentemente vários laranjas e ninguém foi arrolado no processo. Porem, entretanto, contudo, todavia, o que não cometera crime algum ou o que não teve participação alguma no evento criminoso que fraudou a Sociedade de Economia Mista ( Banco do Brasil ) este sim está pagando por um erro dos outros. Isso é um absurdo!! Não encontraram a quem punir os mais vulneráveis, ou seja, aqueles não subtraíram nada. ISSO NÃO É JUSTIÇA É VINGANÇA PRIVADA !!! RESOLVERAM QUERER O RESSARCIMENTO DOS VALORES FRAUDADOS ACUSANDO INJUSTAMENTE AQUELES QUE NADA TIVERAM OU PROVEITO ALGUM OBTIVERAM DA EMPREITADA CRIMINOSA!! (…) O acusado é primário, tem bons antecedentes, jamais fora preso ou processado, sua vida sempre foi pautada por ser trabalhador honesto e homem de bem, laborando no ramo agropecuário, pai de família exemplar. O acusado possui máquina escavadeira, caminhões e tratores que ele aluga para as fazendas e para quem lida no campo, sendo sua atividade lícita assim como seus rendimentos são todos com origem. O acusado fez um financiamento junto ao Banco para comprar uma máquina escavadeira. Logo abaixo o contrato de financiamento junto ao banco e as fotos da referida máquina trabalhando. Senão vejamos: (…)” CLÉVER FERREIRA COIMBRA, em sede de alegações finais, na forma de memoriais escritos, requereu a improcedência da pretensão punitiva, com fundamento no artigo 386, VII, do Código Processo Penal. Em síntese (ID 1126403765): “(…) II – MÉRITO DA MATERIALIDADE DO DELITO A materialidade dos crimes do art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86 alegada pelo MPF com relação as 7 cédulas pignoratícias juntadas aos autos, cujos números são n. 40/00527-5, 40/00530-5, 40/00533-X, 40/00484-8, 40/00563-1, 40/00539-9 e 40/00519-4 NÃO FICOU CARACTERIZADA EM RELAÇÃO AO RÉU CLÉVER FERREIRA COIMBRA, que não teve qualquer participação nos contratos que supostamente foram fraudados, e se houve prejuízo de R$ 909.348,00 em recursos da União destinados ao PRONAF não há prova nos autos da participação do CLÉVER, como pode-se ver das audiências de instrução e depoimentos das testemunhas e dos interrogatórios dos acusados que não tiveram qualquer participação com o mesmo. ID 788862449. O Réu CLÉVER não teve participação nas supostas fraudes alegada pelo MPF, pois atuou apenas como advogado de um dos réus não influenciando na suposta fraude do financiamento do PRONAF. Em outras palavras, não há materialidade do delito, pois incumbiria ao Ministério Público Federal o ônus de comprovar a imputação penal para os crimes imputados ao réu, como não o fez, há expressa afronta ao princípio da nãoculpabilidade. B - AUTORIA DELITIVA Mesmo se constatada a existência das operações fraudulentas mediante uso de documentos falsos, cumpre examinar a conduta dos réus a fim de apurar a autoria do crime. Neste contexto, o Ministério Público Federal requereu a condenação dos demais réus pela prática de 7 condutas capituladas no art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, na forma do crime continuado e a ABSOLVIÇÃO DO RÉU CLÉVER FERREIRA COIMBRA. Como forma de resguardar a higidez do ordenamento jurídico, requereu o Ministério Público Federal a absolvição do denunciado CLÉVER por ausência de prova suficiente para sua condenação, nos termos do art. 386, VIII, do CPP. O denunciado CLÉVER era advogado e patrocinava os interesses de Zélio. A inicial imputou a ele a condição de um dos mentores do esquema criminoso, ao passo em que ele teria chancelado e oferecido consultoria para a realização dos contratos falsos de comodato retratados nos autos. Pois bem. Se na fase de deflagração da ação penal prepondera o adágio in dubio pro societate, incumbindo ao Ministério Público o ajuizamento da ação penal se há prova da materialidade e indícios mínimos de autoria, tal regra é invertida na fase de julgamento. A prova para a condenação deve ser robusta e livre de dúvida razoável (guilty beyond reasonable doubt). Não é este o caso dos autos. Grifos nossos. Após a realização da instrução processual o Ministério Público Federal entendeu que não há prova suficiente para a condenação do Réu CLÉVER FERREIRA COIMBRA, e requereu sua ABSOLVIÇÃO e ainda fundamentou da seguinte forma: “... À míngua de prova robusta e inconcussa, é de rigor a absolvição do acusado nos termos do art. 386, VII, do CPP. Igualmente, tal qual já explicitado, postulou o Ministério Público Federal a absolvição do denunciado CLÉVER em sede de alegações finais por insuficiência de provas, deve o mesmo ser ABSOLVIDO por não ter cometido o crime a ele imputado na inicial e não ter conseguido o Ministério Público ter desincumbido de provar que cometeu. (…)” ZÉLIO CARRIJO, em sede de alegações finais, na forma de memoriais escritos, pugnou pela absolvição, uma vez que, inexistentes provas capazes e suficientes para ensejarem a condenação, nos termos do artigo 386, V e VII, do Código de Processo Pena. Por fim, caso haja condenação em reparação de danos, requereu a fixação em valor não superior ao contido na denúncia, qual seja R$ 779.448,00. Em síntese (ID 1138726291): “(…) I – DA ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO (ART. 386, VII, CPP) – DA APLICAÇÃO DA REGRA IN DUBIO PRO REO/FAVOR REI. Da análise do processo, verifica-se que o acusado merece ser absolvido, com base na disposição contida no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, tendo em vista que não há provas suficientes aptas a subsidiarem a condenação do acusado ZÉLIO CARRIJO, consoante se demonstrará a seguir. Pois bem! Consoante depoimento pessoal do referido acusado ZÉLIO CARRIJO (ID’s 789259479, 789274468, 789292958, 789308461 e 789308477), ele afirma que vendeu um trator que possuía à época para então comprar a propriedade “Fazenda Renascer” da Senhora Maria Helena Alves Fleury, negócio este que foi devidamente celebrado, contudo, aduz que deixou de realizar contrato de compra e venda por ter perdido seu irmão naquela época, o que acabou desmotivando-o em laborar na referida terra, além dos vários problemas de saúde que já o acometiam. Ademais, no que tange aos supostos contratos de comodato, garante que jamais cedeu gratuitamente suas terras, que realizou, na verdade, o aluguel (arrendamento) das terras da “Fazenda Renascer”. Na oportunidade, aponta que alugou para 04 (quatro) pessoas, por esta razão recebeu a quantia de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais). Além disso, afirma que antes da celebração dos aludidos contratos, consultou seu advogado, o Sr. Clever Ferreira Coimbra, o qual não apontou quaisquer irregularidades nos contratos, de maneira que o acusado ZÉLIO CARRIJO, sendo pessoa de pouca instrução, bem como baseado na confiança na palavra de seu advogado, na boa-fé firmou os referidos contratos, acreditando estar agindo corretamente e dentro das formalidades legais. Ainda, afirma o acusado ZÉLIO CARRIJO que não sabe ao certo, mas que entre os anos de 2010 e 2011, transferiu a “Fazenda Renascer” ao advogado Clever Ferreira Coimbra, como pagamento à título de honorários advocatícios por serviços que este havia prestado em favor daquele, pois não possuía mais condições para cuidar da referida terra em razão dos inúmeros problemas de saúde enfrentados, tendo, inclusive, que se mudar para a cidade de Goiânia-GO para tratamento. Assim sendo, Excelência, as terras da “Fazenda Renascer” sequer eram mais do acusado ZÉLIO CARRIJO quando os financiamentos perante ao PRONAF foram solicitados/realizados no Banco do Brasil de Palmeirópolis, restando evidente que o aludido acusado não tinha conhecimento da fraude discutida nestes autos, tampouco se beneficiou com os recursos supostamente desviados, de maneira que, o simples fato de ter celebrado contratos de “aluguéis” com os demais acusados, por si só, não é suficiente para ensejar sua condenação, sobretudo quando este procedimento ocorrera dentro das dependências do banco e por profissionais autorizados, ou seja, dentro das normalidades exigidas pelo próprio banco. Assim sendo, além dos contratos de “aluguéis” firmados (que por óbvio, não gozam de força probatória autônoma), nada mais há nos autos que demande certeza sobre a autoria do acusado no crime sub judice. As versões produzidas em juízo pelas testemunhas não trazem certeza absoluta acerca da participação do acusado na empreitada criminosa, uma vez que aduzem as testemunhas nunca terem sequer visto o acusado ZÉLIO CARRIJO nas dependências do Banco do Brasil de Palmeirópolis-TO. Portanto, verifica-se a fragilidade da argumentação do parquet, bem como dos depoimentos das testemunhas, eis que a autoria do delito pelo acusado ZÉLIO CARRIJO encontra-se nebulosa e falha, sendo que o conteúdo probatório carreado aos autos não faz transparecer de forma cabal e concreta que a autoria do delito descrito na exordial recaia sobre o acusado ZÉLIO. Por outro lado, o acusado, desde o início do processo afirma que nunca cedeu gratuitamente suas terras, tendo promovido, na verdade, aluguel das mesmas. Aduz, ainda, que na data dos fatos já encontrava-se na cidade de Goiânia-GO para tratamento de saúde, bem como já havia “transferido” a propriedade da “Fazenda Renascer” ao seu então advogado Clever Ferreira Coimbra como forma de pagamento de honorários. (…) Isto posto, exemplifica-se a aplicação da máxima favor rei, sendo a ABSOLVIÇÃO do acusado ZÉLIO CARRIJO medida que se impõe, nos termos do artigo 386, VII, do CPP, por ser medida mais adequada ao caso concreto. (…)” Por fim, a defesa dativa do réu ADILSON ALVES PIMENTA, em sede de alegações finais, na forma de memoriais escritos, pugnou pela absolvição, nos termos do artigo 386, IV, V e VII, Código de Processo Penal. Em síntese (ID 1156031787): “(…) II.1. DA ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DO DELITO Prima face, alega o Ministério Público Federal que a materialidade delitiva do artigo 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86, está configurada nas 07 (sete) cédulas pignoratícias juntadas aos autos, cujos números são n. 40/00527-5, 40/00530-5, 40/00533-X, 40/00484-8, 40/00563-1, 40/00539-9 e 40/00519-4, PORÉM, não ficou caracterizada em relação ao Denunciado ADILSON ALVES PIMENTA, pois, não teve qualquer participação nos contratos que supostamente foram fraudados. Ademais, se houve prejuízo de R$ 909.348,00 em recursos da União destinados ao PRONAF não há prova nos autos da participação do ADILSON ALVES PIMENTA, como pode-se ver nos depoimentos nas audiências de instrução e julgamento das testemunhas e dos interrogatórios dos acusados que não tiveram qualquer participação com o mesmo. Como se colhe dos autos, o Acusado ADILSON ALVES PIMENTA não teve qualquer participação nas supostas fraudes alegada pelo Ministério Público Federal. EX POSITIS, não há comprovação da materialidade delitiva supostamente cometida pelo Acusado ADILSON ALVES PIMENTA classificada no artigo 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86, portanto requer a ABSOLVIÇÃO do acusado, com fulcro no artigo 386, IV1 do CPP. II.2. DA ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE AUTORIA Da análise do processo, é necessário o reconhecimento da ausência de Autoria por parte do denunciado ADILSON ALVES PIMENTA, pelos elucidativos depoimentos das testemunhas e acusados nas audiências de instrução e julgamento. (…) Ou seja, conforme precedentes acima, não há nos autos prova da Autoria por parte do acusado ADILSON ALVES PIMENTA, motivo pelo qual não resta opção outra senão a ABSOLVIÇÃO, em observância ao princípio in dubio pro reo. EX POSITIS, conclui-se que não há presença da Autoria por parte do acusado, portanto requer a ABSOLVIÇÃO do acusado, com fulcro no artigo 386, VII2 do CPP, da prática do delito previsto no artigo 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86. II.3. DA ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO Caso haja superação das teses descritas acima, o que não se espera, podemos basear também a absolvição do Acusado, seguindo o princípio da presunção de inocência (in dubio pro reo) que nas palavras do doutrinador em sua obra Jurisprudencial Criminal (V.2 pg.446) de Heleno Claudio Fragoso: (…) O que deve ocorrer no presente caso, pois não há elementos suficientes para comprovar a relação do Acusado com os fatos narrados. Dessa forma, o processo deve ser resolvido em favor do Denunciado, conforme desta Celso de Mello no seguinte precedente: (…) Em relação à acusação que lhe é imposta, o Denunciado é inocente. Para a sua condenação à prova da autoria deve ser plena e convincente, ao passo que para absolvição basta a dúvida, consagrando o princípio do in dubio pro reo, contido no artigo 386, incisos V e VII3, do Código de Processo Penal Brasileiro. Logo, a defesa reputa necessário que seja reconhecido o Princípio Constitucional do in dubio pro reo, na medida que não existem provas de ter o Acusado concorrido para infração penal. Desta forma, deve o Réu ser ABSOLVIDO por não existirem elementos de prova suficientes para condená-lo e não há provas de sua autoria e materialidade, nos moldes do artigo 386, incisos IV, V e VII, do Código de Processo Penal Brasileiro. (…) A condenação exige certeza absoluta, fundada em dados objetivos indiscutíveis, o que não ocorre no caos em tela. Razão pela qual, mesmo com o recebimento da denúncia, no que data máxima vênia, discordamos não há que imputar ao Acusado a conduta denunciada, levando em consideração e devido respeito ao princípio constitucional do in dubio pro reo. EX POSITIS, não sendo o conjunto probatório suficiente para afastar toda e qualquer dúvida quanto à responsabilidade criminal do acusado, imperativa a sentença absolutória. A prova da autoria deve ser objetiva e livre de dúvida, pois só a certeza autoriza a condenação no juízo criminal. Não havendo provas suficientes, a absolvição do réu deve prevalecer. Assim, REQUER a Vossa Excelência que julgue improcedente a denúncia oferecida em face de ADILSON ALVES PIMENTA, absolvendo o mesmo, nos termos do artigo 386, IV, V e VII, baseado no princípio do IN DUBIO PRO REO, visto a ausência de provas contida nos autos, além da real incerteza da participação do mesmo na ação criminosa praticada. II.4. DA NECESSIDADE DE ABSOLVIÇÃO DO DENUNCIADO De todo o exposto, a escorreita conclusão a que se chega é a de que o denunciado não praticou os atos que lhe foram imputados na denúncia, tampouco qualquer outro ilícito, devendo ser absolvido das acusações que sofre no presente feito, o que desde já se requer. No caso, não há prova concreta e inequívoca capaz de levar à certeza de que houve a prática do suposto delito previsto no artigo 19, parágrafo único, da Lei n. 7492/86, por parte do Denunciado. Outrossim, se o conjunto probatório não permitir precisar de forma indiscutível e cristalina a existência da autoria e materialidade, cumpre ao magistrado optar pela absolvição com base no princípio do in dúbio pro réu. Por derradeiro, em caso de condenação, o que não se acredita, requer-se sejam consideradas as circunstâncias sociais e pessoais (primário, com residência fixa e trabalho lícito), bem como da conduta e dos antecedentes do Denunciado. (…)” Pois bem. Destarte, cuida-se de condutas dos réus consubstanciadas na obtenção, mediante fraude, de financiamento em instituição financeira oficial - Banco do Brasil - com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), no importe total de de R$ 909.348,00, através da contratação de financiamento consubstanciada nas cédulas pignoratícias nº 40/00527-5, nº 40/00530-5, nº 40/00533-X, nº 40/00484-8, nº 40/00563-1, nº 40/00539-9 e nº 40/00519-4, todas expedidas por aquela instituição financeira . Subsumindo-se à figura típica descrita no artigo 19, da Lei nº 7.492/86., tendo sido praticada, por diversas vezes, de forma continuada (art. 71, caput, CP). (...) Do réu CLÉVER FERREIRA COIMBRA. (...) Dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO. A ação dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, encontra-se muito bem narrada na denúncia (ID 184783928), senão vejamos: “Os denunciados RAUL DIAS NAVES, ZÉLIO CARRIJO, CLEVER FERREIRA COIMBRA, ADILSON ALVES PIMENTA e RICARDO GOMES MACHINI, no ano de 2011, obtiveram financiamento, com recursos do PRONAF, perante o Banco do Brasil de Palmeirópolis/TO, utilizando-se de documentos ideologicamente falsos (Contrato de Comodato e Declaração de Aptidão ao Pronaf) em nome de ADÍLIO RAFAEL GONÇALVES GOMES, UILSON PEREIRA GOMES, MÁRCIO RODRIGUES DOS SANTOS, MARTHA BORGES DE MELO, IVANY DA SILVA, DANIEL RODRIGUES DA SILVA e DANILO VIEIRA DA SILVA.”. Também restou bem esclarecido todo o esquema criminoso, quando do requerimento de aditamento à denúncia, a saber (ID 926899689): “(…) Primeira série de fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00527-5 Em data de 28 de outubro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Adílio Rafael Gonçalves Gomes, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00527-5 expedida por aquela instituição financeira. (…) Segunda série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00530-5 Em data de 8 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Martha Borges de Melo, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00530-5 expedida por aquela instituição financeira. (…) Terceira série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/0053 3 – X Em data de 11 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Daniel Rodrigues da Silva, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00533-X expedida por aquela instituição financeira. (…) Quarta série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 484-8 Em data de 20 de setembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Márcio Rodrigues dos Santos, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.948,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00484-8 expedida por aquela instituição financeira. (…) Quinta série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 563-1 Em data de 23 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Ivany da Silva, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00563-1 expedida por aquela instituição financeira. (…) Sexta série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 539-9 Em data de 18 de novembro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Danilo Vieira da Silva, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00539-9 expedida por aquela instituição financeira. (…) Sétima série da fatos – Cédula pignoratícia n. 40/00 519-4 Em data de 17 de outubro de 2011, em horário não especificado, porém na agência do Banco do Brasil do município de Palmeirópolis/TO, localizada na Rua Cinco, n. 255 – Centro, daquela localidade, os denunciados Zélio, Ricardo, Cléver, Adílson e Raul, agindo mediante comunhão de desígnios criminosos e divisão de tarefas e também em concurso com Uílson Pereira Gomes, obtiveram, mediante fraude, financiamento em instituição financeira oficial, consistente no Banco do Brasil, com recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) no importe de R$ 129.900,00, através da contratação de financiamento consubstanciada na cédula pignoratícia n. 40/00519-4 expedida por aquela instituição financeira. (…) Assim agindo, os denunciados Zélio Carrijo, Cléver Ferreira Coimbra, Adílson Alves Pimenta e Ricardo Gomes Marchini praticaram as condutas delitivas previstas no art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, c/c art. 29, caput, c/c art. 71, ambos do CP por, pelo menos, sete vezes. Já o denunciado Raul Dias Naves praticou as condutas delitivas previstas no art. 19, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, c/c art. 29, caput, art. 61, II, alínea “g” e art. 71, caput, todos do CP, por, pelo menos, sete vezes. (…)” Ou seja, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL narrou 07 (sete) séries de fatos criminosos em relação aos réus: * 1ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00527-5; * 2ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00530-5; * 3ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00533-X; * 4ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00484-8; * 5ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00563-1; * 6ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00539-9; e * 7ª série de fatos – Cédula Pignoratícia nº 40/00519-4. Pois bem, no decorrer de toda a instrução, tentou-se comprovar a materialidade dos sete fatos criminosos retromencionados, fatos tipificados no artigo 19, da Lei nº 7.492/86. Todos os contratos (Cédulas Pignoratícias) mencionados alhures foram fraudados, acarretando num prejuízo de R$ 909.348,00 (novecentos e nove mil, trezentos e quarenta e oito reais) em recursos da União destinados ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Para execução do delito descrito no artigo 19, da Lei nº 7.492/86 os coautores se utilizaram documentos ideologicamente falsos, para a realização das operações de financiamento, ou seja, por meio de fraude. Frise-se, a empreitada criminosa ocorreu perante a agência do Banco do Brasil do no município de Palmeirópolis/TO, que tinha como funcionário, o réu RAUL DIAS NAVES, que teve participação imprescindível para consecução das fraudes. As condutas protagonizadas pelos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO trazem prova de materialidade inerente aos contratos de financiamento fraudados, que foram carreados aos autos. Com a representação formulada pelo Banco do Brasil (ID 184783931 – pág. 04/13) foi possível perceber que após a formalização do financiamento, o banco designou um funcionário (fiscal), para in loco, verificar se houve aplicação dos recursos junto aos imóveis rurais, apurando-se a efetiva aplicação regular dos recursos oriundos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Quando da realização da diligência in loco, João Luiz da Silva Zinn, fiscal de operações do Banco do Brasil, constatou que as propriedades que deveriam receber os recursos públicos e que teriam sido desmembradas da "Fazenda Renascer" nem sequer existiam de fato como propriedades rurais individualizadas. Vejamos, mais uma vez, parte do relatório (ID 184783931 – pág. 15/16, ID 184783937 – pág. 08/09, ID 184854888 – pág. 08/09 e ID 185449935 – pág. 30/31): “(…) Mutuário não localizado. Faz parte de grupo de 07 pessoas que dividiram a fazenda RENASCER em lotes de 51,60ha, através de contrato de comodato, cujos 02 roteiros fornecidos não proporcionam chegada ao imóvel. (…) Grupo de 07 pessoas que receberam contrato de comodato: (…) Danilo Vieira da Silva; Márcio Rodrigues dos Santos: Uilson Pereira Gomes; Daniel Rodrigues da Silva: vany da Siva; Adlio Rafael Gonçalves Gomes e Martha Borges de Melo. (…) Após seguir os roteiros indicados, além da busca de informações com pessoas dessas regiões, constatei que, além da fazenda e de sua proprietária, todos os nomeados acima eram desconhecidos. (…)”. Sobre o desmembramento das terras da “Fazenda Renascer", importante explicar que tal propriedade tinha uma área que totalizava 361,55 hectares e que a partir de uma procuração supostamente lavrada em cartório, o réu ZÉLIO CARRIJO, com o intuito de fraudar cédulas pignoratícias, fracionou ficticiamente aquela fazenda, em 07 (sete) imóveis menores de 51,60 hectares, cada. Os 07 (sete) suposto “novos” imóveis rurais seriam explorados economicamente por 07 (sete) supostos comodatários – Adílio Rafael Gonçalves Gomes, Ivany da Silva, Daniel Rodrigues da Silva, Uilson Pereira Gomes, Márcio Rodrigues dos Santos, Danilo Vieira da Silva e Martha Borges de Melo – que deveriam assumir a posição de pequenos produtores rurais, que teriam acesso aos recursos da linha de crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Recursos estes – operações de crédito – concedidos a juros subsidiados por meio do Banco do Brasil, instituição responsável por toda elegibilidade do financiamento agrário aqui em análise. Restou comprovado que os 07 (sete) contratos de comodato eram falsos e tinha por finalidade, unicamente de subsidiar as operações de financiamento fraudulentas, não havendo, “novos” imóveis rurais, nenhuma exploração efetiva das áreas. A partir do desmembramento das terras da “Fazenda Renascer", com o auxílio de contratos de comodatos ideologicamente falsos, os criminosos obtiveram financiamento consistente em 07 (sete) cédulas pignoratícias, que totalizaram prejuízo financeiro em desfavor do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), no montante de R$ 909.348,00. Para melhor compreensão dos fatos, necessário observar a atuação de cada um dos réus, na empreitada criminosa: * ZÉLIO CARRIJO era e a pessoa responsável por simular os contratos de comodato (ID 184783931 – pág. 17/18, ID 184783937 – pág. 02/03) com os supostos contratantes. ZÉLIO CARRIJO era o responsável pela obtenção e falsificação de documentos de determinada propriedade rural que serviria para comprovar a existência de uma atividade rural por parte do proponente, para isso, obteve documentos relativos ao imóvel rural denominado “Fazenda Renascer” - de propriedade de Maria Helena Alves Fleury – que teria negociado o imóvel com este réu, ainda no ano de 2009, mas sem a adequada transferência de propriedade. A partir dessa dessa suporta negociação (venda informal), ZÉLIO CARRIJO obteve para si uma procuração (ID 184780438 – pág. 31) em que Maria Helena Alves Fleury outorgou-lhe poderes para negociar o imóvel. Com essa procuração, ZÉLIO CARRIJO firmou contratos ideologicamente falsos (ID 184783937 – pág. 02/03, ID 184780396 – pág. 01, ID 184854879 – pág. 20/21, ID 184854883 – pág. 29/30, ID 184854888 – pág. 21/22 e ID 185449941 – pág. 19/17) com os comodatários – Adílio Rafael Gonçalves Gomes, Ivany da Silva, Daniel Rodrigues da Silva, Uilson Pereira Gomes, Márcio Rodrigues dos Santos, Danilo Vieira da Silva e Martha Borges de Melo. * RICARDO GOMES MARCHINI na condição de representante da empresa Centro Oeste Consultoria, foi responsável por elaborar e subscrever o Projeto de Investimento (ID 184780438 – pág. 02/23) que subsidiou a contratação de financiamento fraudulento; * ADILSON ALVES PIMENTA na qualidade de credenciado, atuando como coordenador estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) em Goiás, entidade ligada à Associação Camponesa da Regional Norte Nordeste, emitiu Declarações de Aptidão ao Pronaf ideologicamente falsas (ID 184780438 – pág. 01, ID 184854871 – pág. 03 e ID 185449941 – pág. 24), em favor dos denunciados beneficiários, uma vez que, estes não se enquadravam no perfil de agricultores rurais. Este réu subscreveu, diretamente, as declarações de aptidão ao PRONAF, utilizadas nas operações de crédito relativas às cédulas nº 40/00527-5, nº 40/00530-5, nº 40/00563-1 e nº 40/00519-4; e * RAUL DIAS NAVES na qualidade de funcionário (assistente de negócios) do Banco do Brasil do município Palmeirópolis/TO, foi o responsável por realizar toda a análise e aprovação da documentação referente aos financiamentos ora investigados. Em sede policial, Lisângelo Cavalcante de Lima e Roseane Nogueira Ambrosio, funcionários do Banco do Brasil, narraram que RAUL DIAS NAVES participou das transações fraudulentas (ID 185516387 – pág. 17/18 e ID 185570886 – pág. 17/18). Em Juízo, a testemunha Rosane Nogueira Ambrósio, arrolada pelo MPF, afirmou que todas as operações foram precedidas de uma análise por parte do réu RAUL DIAS NAVES (arquivos de vídeo ID 788945970, ID 788971962, ID 788971965, ID 788971993, ID 788994477, ID 789016969 e ID 789017010). Também perante este Juízo, as testemunhas Uilson Pereira Gomes (arquivos de vídeo ID 788906973 e ID 788922459), Sebastião Carlos Arriel (arquivos de vídeo ID 788922459 e ID 788932478), Sebastião Carlos Arriel (arquivos de vídeo ID 788922459 e ID 788932478) e Daniel Rodrigues da Silva (arquivos de vídeo ID 788932478 e ID 788945970), disseram que nada sabiam sobre empréstimos do PRONAF, bem como, que não têm ideia de seus nomes foram envolvidos na fraude. As outras testemunhas (Natalia Lucas de Paula, Lisângelo Cavalcante de Lima, Carlos Gonzaga Arriel e Ezequiel Vicente de Farias), arroladas pela acusação e pelas defesas dos réus, em nada contribuíram para elucidação dos fatos, tampouco para formação do convencimento deste Juízo (ID 789017010, ID 789054456, ID 789068467, ID 789091989, ID 789106993, ID 789134961, ID 789134993, ID 789170468, ID 789191492 e ID 789220456). Durante seus interrogatórios, os réus negaram a prática de qualquer crime. ADILSON ALVES PIMENTA disse que que assinava Declarações de Aptidão ao Pronaf (DAP), mas que não recebia dinheiro para isso. Informou que não conhece os réus RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES, mas que conhece, de vista, os réus ZÉLIO CARRIJO e CLÉVER FERREIRA COIMBRA (arquivos de vídeo ID 789220456, ID 789170536 e ID 789202536). ZÉLIO CARRIJO confirmou conhecer Maria Helena, bem como, ter comprado suas terras, cedendo o uso, em troca do valor de R$ 40.000,00. De acordo com o réu, quando fez o contrato, não tinha consciência de qualquer fraude (arquivos de vídeo ID 789202536, ID 789259479, ID 789274468 e ID 789292958). CLÉVER FERREIRA COIMBRA disse nada saber acerca dos contratos de comodato e que ZÉLIO CARRIJO lhe mostrou um contrato de locação no valor de R$ 40.000,00, mas que não se trata to contrato presente nos autos(arquivos de vídeo ID 789292958, ID 789308461 e ID 789308477). RICARDO GOMES MARCHINI disse, em síntese (arquivos de vídeo ID 789259524 e ID 789330465, ID 789348448, ID 789348481, ID 789363966 e ID 789374969): “Que conta com 39 anos de idade; que é prestador de serviços (máquinas de terraplanagem); que nunca respondeu outro processo criminal; que é casado; que tem uma filha de 13 anos; que sabe do que se trata o processo; que era funcionário da empresa Centro Oeste Consultória; que nunca foi representante da empresa Centro Oeste Consultória, apenas lhe prestava serviços; que elaborou projetos para essa empresa; que não era funcionário de campo; que a empresa prestava serviços para os pequenos produtores do Pronaf; que quanto a elaboração dos projetos do Pronaf, a planilha era preenchida com as informações prestadas e o programa gerava a capacidade de pagamento; que não tinha relação com o réu RAUL DIAS NAVES, mas sabia que ele era funcionário do Banco do Brasil; que a determinação para confecção dos projetos do Pronaf, partiu do Sr. Ilton Rodrigues; que não tinha contato com os pequenos produtores; que não tinha contato direto com os clientes; que não levou os projetos ao Banco do Brasil; que não tinha contato com os funcionários do Banco do Brasil; que não conhece Zélio.”. Por fim, RAUL DIAS NAVES negou de forma veemente a p´ratica de qualquer crime, em síntese (arquivos de vídeo ID 789348448, ID 789348481 e ID 789363966): “Que conta com 53 anos de idade; que é motorista de caminhão; que nunca respondeu outro processo criminal; que é divorciado; que tem 04 filhos; que sabe do que se trata o processo; que foi demitido do Banco do Brasil; que atuou na elaboração das informações nos sistemas do banco; que alimentava o sistema; que a conta, os cartões de assinatura e as cédulas eram assinadas foram assinadas na sua presença; que alguma vezes, foi verificada a autenticidade das assinaturas por meio de cópias; que sabia que Ilton Rodrigues era dono da empresa Centro Oeste Consultória; que os 07 projetos foram levados por Ilton Rodrigues; que abriu a maioria das contas; que para abertura das contas, os clientes foram pessoalmente ao banco; que a maior parte do dinheiro não era liberada na conta dos clientes; que normalmente, o crédito era liberado diretamente na conta do vendedor do gado, por exemplo; que todos os documentos apresentados passaram como verdadeiros; que não conhece os réus ZÉLIO CARRIJO, CLÉVER FERREIRA COIMBRA ou ADILSON ALVES PIMENTA.”. Quanto ao réu RAUL DIAS NAVES, importante mencionar que, em decorrência de sua participação nos fatos, foi demitido da agência, nos termos do Processo Administrativo Disciplinar nº 120.909-04608 – Audit/Goiânia 8375-5/20120002037-10, conforme trazido pela representação formulada pelo Banco do Brasil (ID 184783931 – pág. 09). Pois bem, compulsando os autos, verifica-se que, de fato, nos dias 20.09.2011, 17.10.2011, 28.10.2011, 08.11.2011, 11.11.2011, 18.11.2011 e 23.11.2011, os réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, em conluio, obtiveram financiamentos fraudulentos com recursos da linha de crédito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Essas operações de crédito foram concedidas a juros subsidiados por meio do Banco do Brasil, instituição financeira perante a qual todo o processo fraudulento fora realizado. Dos elementos de prova dos autos, evidenciou-se que as condutas dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO foram pautadas pelo dolo, elemento subjetivo do tipo penal a ele imputado na denúncia e na peça de aditamento, amoldando-se plenamente ao crime descrito. Restou comprovado que os réus praticaram o crime delineado no artigo 19, da Lei nº 7.492/86. O contexto probatório produzido nos autos é suficiente e apto a caracterizar a ação dos réus. Noutro giro, não restou comprovada nos autos qualquer causa que pudesse excluir a ilicitude da conduta aqui tratada, bem como está suficientemente demonstrada a potencial consciência da ilicitude do ato levado a cabo pelos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, sem esquecer de mencionar a ausência de elementos que indiquem serem estes, inimputáveis ou portadores de alguma patologia capaz de diminuir suas capacidades de discernimento no momento da ação delituosa. DA MATERIALIDADE E AUTORIA: restam comprovadas nos autos, não havendo dúvidas de que os réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO cometeram o ilícito. A materialidade do delito está consubstanciada, plenamente comprovada: a) representação formulada pelo Banco do Brasil (ID 184783931 – pág. 04/13); b) relatório de fiscalização (ID 184783931 – pág. 15/16, ID 184783937 – pág. 08/09, ID 184854888 – pág. 08/09 e ID 185449935 – pág. 30/31); c) despacho da Polícia Federal (ID 185558864 – pág. 31/40); d) declarações prestadas em sede policial (ID 185449944 – pág. 36/37 e ID 185516387 – pág. 01/11); e) relatório policial (ID 185570894 – pág. 16/31); f) cópias das cédulas pignoratícias (ID 184783931 – pág. 21/29, ID 184783937 - pág. 10/20, ID 184780396 – pág. 05/13, ID 184854883 – pág. 01/09, ID 184854888 - pág. 10/19 e ID 185449937 – pág. 01/09); g) declaração, supostamente expedida por Maria Helena Alves Fleury - autorização para exploração de imóvel sob regime de comodato (ID 184783931 – pág. 17/18); h) declaração de aptidão ao Pronaf, subscrita por ADILSON ALVES PIMENTA (ID 184780438 – pág. 01, ID 184854871 – pág. 03 e ID 185449941 – pág. 24); i) projeto de investimento agropecuário, confeccionado em nome da empresa Centro Oeste Consultoria (ID 184780438 – pág. 02/23); j) procuração pública firmada entre Maria Helena Alves Fleury e ZÉLIO CARRIJO (ID 184780438 – pág. 31); k) contratos de comodatos (ID 184783937 – pág. 02/03, ID 184780396 – pág. 01, ID 184854879 – pág. 20/21, ID 184854883 – pág. 29/30, ID 184854888 – pág. 21/22 e ID 185449941 – pág. 19/17); l) oitiva de testemunha (arquivos de vídeo ID 788906973, ID 788922459, ID 788932478, ID 788945970, ID 788971962, ID 788971965, ID 788971993, ID 788994477, ID 789016969, ID 789017010, ID 789054456, ID 789068467, ID 789091989, ID 789106993, ID 789134961, ID 789134993, ID 789170468, ID 789191492 e ID 789220456); e m) interrogatório dos réus (arquivos de vídeo ID 789220456, ID 789170536, ID 789202536, ID 789259479, ID 789274468, ID 789292958, ID 789308461, ID 789308477, ID 789259524, ID 789330465, ID 789348448, ID 789348481 e ID 789363966). DA TIPICIDADE: os elementos objetivos e subjetivos do tipo estão presentes nas condutas protagonizadas por parte dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO. Os réus exerceram, de modo amplo, o verbo nuclear do tipo penal: “Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira”. Comprovadas a materialidade e a autoria do delito definido no artigo 19, da Lei nº 7.492/86, tendo sido demonstradas acima de qualquer dúvida razoável, bem como, sendo o acervo probatório colhido nos autos, coerente e harmônico, no sentido de comprovar que os réus obtiveram, mediante fraude, financiamento com recursos oriundos do PRONAF – Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar – perante a agência do Banco do Brasil de Palmeirópolis/TO, com o auxílio de documentação falsa, por meio de sete operações consubstanciadas nas cédulas pignoratícias nº 40/00527-5, nº 40/00530-5, nº 40/00533-X, nº 40/00484-8, nº 40/00563-1, nº 40/00539-9 e nº 40/00519-4, confirmando a conduta criminosa delineada na denúncia, bem como, ratificada no aditamento à denúncia, medida que se impõe ao caso é a condenação dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO. Desse modo, forçosa a condenação dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO nas penas do artigo 19, da Lei nº 7.492/86. Vejamos: “Art. 19. Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira: Pena – Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. A pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é cometido em detrimento de instituição financeira oficial ou por ela credenciada para o repasse de financiamento.” (grifo nosso) Em conclusão de todo o exposto, analisados os fatos e as teses de defesa, não havendo nenhuma causa justificante, exculpante ou, ainda, extintiva da punibilidade do agente, tenho que os réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, cometeram fato típico, antijurídico e culpável, delineando-se, com isso, a consumação do crime previsto no artigo 19, da Lei nº 7.492/86. As defesas dos réus que apelaram não infirmam o acerto da sentença que se lastreou em um conjunto probatório coeso e robusto e que não deixa margem para dúvidas razoáveis. Com efeito, a materialidade delitiva está solidamente comprovada pelas (1) sete Cédulas Rurais Pignoratícias: 40/00527-5 (ID 304183046, pp. 21/29), 40/00530-5 (ID 304183048, pp. 10/18), 40/00533-X (ID 304183050, pp. 05/13), 40/00484-8 (ID 304183052, pp. 01/09), 40/00563-1 (ID 304183055, pp. 10/17), 40/00539-9 (ID 304183057, pp. 01/09) e 40/00519-4; (2) pelos contratos de comodato ideologicamente falsos; (3) pelas Declarações de Aptidão ao PRONAF (DAPs) emitidas fraudulentamente; (4) pelos projetos de investimento agropecuário fictícios e, de forma contundente; (5) pelo relatório de fiscalização do Banco do Brasil, que atestou que os imóveis rurais eram “totalmente brutos”, sem qualquer benfeitoria ou atividade pecuária. A autoria e o dolo, por sua vez, emergem da análise conjunta e articulada da participação de cada um dos réus, como bem detalhou o juízo sentenciante. A empreitada criminosa não foi fruto de atos isolados, mas de uma ação concertada / unidade de desígnios e com nítida divisão de tarefas: - O apelante Zélio Carrijo foi o responsável por fornecer a base física para a fraude, utilizando-se de uma procuração para fracionar ficticiamente a “Fazenda Renascer” justamente em 07 (sete) imóveis menores de 51,60 hectares, cada, e curiosamente firmar os (07) sete contratos de comodato falsos que davam aparência de legitimidade aos supostos mutuários e que serviram de base para as 7 cédulas pignoratícias que acarretaram num prejuízo de R$ 909.348,00 em recursos da União destinados ao PRONAF. Sua alegação de que apenas exerceu um direito de propriedade (vide contrarrazões dele no ID. 307819530, pp. 34/35) é insustentável diante da comprovada falsidade e do propósito ilícito dos contratos. - O apelante Adilson Alves Pimenta, na condição de credenciado e atuando como coordenador de uma entidade de pequenos agricultores, foi peça-chave ao emitir as DAPs (Declarações de Aptidão ao Pronaf) fraudulentas, atestando uma condição de pequeno produtor rural que os beneficiários dos financiamentos não possuíam, pois estes sequer se enquadravam no perfil de agricultores rurais. Sem esses documentos, as operações não seriam possíveis. E, embora não tenham recorrido da sentença condenatória, as condutas dos outros 2 corréus condenados também foram individualizadas e corretamente analisadas e identificadas na sentença[6]. O dolo, portanto, não é presumido, mas extraído da própria conduta dos agentes. A complexidade do esquema, a pluralidade de documentos falsificados e a articulação entre os participantes ao longo de meses demonstram, de forma inequívoca, a vontade livre e consciente de todos em obter, mediante fraude, os financiamentos junto à instituição financeira oficial executora do PRONAF, in casu, o Banco do Brasil S.A. Dessa forma, a sentença condenatória está corretamente fundamentada nas provas dos autos, não havendo que se falar em absolvição por insuficiência probatória ou em aplicação do princípio in dubio pro reo. De ser mantida, pois, a condenação. 6. Do recurso do MPF O Ministério Público Federal recorre pleiteando a reforma da sentença em três pontos: reparação do dano, dosimetria da pena privativa de liberdade e pena de multa, neste ponto pleiteando a majoração da quantidade de dias-multa, bem como sua majoração unitária. O recurso merece provimento parcial. 6.1 Da Reparação Mínima dos Danos (Art. 387, IV, do CPP) O MPF defende a necessidade de impor aos réus a condenação solidária na obrigação de reparar o dano provocado, requerendo: ii) no mérito, seja o recurso provido para: a) impor aos réus a condenação solidária na obrigação de reparar o dano provocado no importe mínimo de R$ 909.348,00, devidamente acrescidos de juros de mora e atualização monetária desde a data dos desvios, na forma do art. 387, IV, do CPP, uma vez que houve pedido na denúncia, no aditamento e nas alegações finais e o quantum debeatur nem sequer foi questionado pelos apelados; A r. sentença, de fato, foi omissa quanto ao pedido de fixação de valor mínimo para reparação dos danos, expressamente já formulado na denúncia, inclusive com valor expresso (ID 304183045, pp. 07/08): 3. FIXAÇÃO DO VALOR MÍNIMO DA REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA(S) INFRAÇÃO(ÕES) Desde logo, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer, além da aplicação da sanção penal, a condenação dos denunciados no pagamento de valor mínimo da reparação dos danos causados pela infração penal, com fundamento no art. 387, caput e inciso IV, do Código de Processo Penal, no importe de R$ 779.448,00 (setecentos e setenta e nove mil e quatrocentos e quarenta e quatro reais), referente aos valores obtidos de forma fraudulento nos financiamentos em comento. O artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal estabelece que o juiz, ao proferir sentença condenatória, fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido. Trata-se de um efeito da condenação, que visa conferir maior celeridade e efetividade à reparação da vítima. No caso em tela, o dano material é certo e líquido, correspondendo ao valor total dos sete financiamentos fraudulentamente obtidos, que, conforme apontado na denúncia e reconhecido na sentença, totaliza R$ 909.348,00 (novecentos e nove mil e trezentos e quarenta e oito reais). Esse valor constitui o prejuízo direto causado ao erário, representado pelos recursos do PRONAF. A tese defensiva de que seria necessária instrução probatória específica para apurar o quantum não se aplica à hipótese, pois o valor do dano emerge diretamente da prova da própria materialidade do crime. Exigir outra fase probatória para comprovar um prejuízo que já é elemento central da ação penal seria atentar contra a economia e a efetividade processual. Dessa forma, o recurso do MPF deve ser provido para fixar a condenação solidária dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, ZÉLIO CARRIJO, RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES ao pagamento solidário de R$ 909.348,00, a título de reparação mínima dos danos, a ser devidamente atualizado e compensando-se eventuais valores já restituídos em outras vias. 6.2 Da Dosimetria da Pena: Do error in judicando na Aplicação das Causas de Aumento Da Readequação das Penas Privativas de Liberdade e do Regime Prisional de Cumprimento O juízo a quo fixou a pena-base no mínimo legal de 02 (dois) anos de reclusão e (implícitos) 10 dias-multa. Na segunda fase, manteve essa pena como intermediária, exceto em relação ao réu RAUL DIAS NAVES (que não recorreu), contra quem reconheceu a circunstância agravante prevista no artigo 61, II, ‘g’, do Código Penal – quando o crime cometido com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão – e, por conseguinte, agravou em 1/6 (um sexto) a pena aplicada na 1ª fase, fixando-a em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão pela prática do crime descrito no artigo 19 da Lei 7.492/86. Na terceira fase, assim majorou a pena dos 4 réus sentenciados: 1.c) 3ª FASE – CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E DE AUMENTO DA PENA Não incidem causas de diminuição de pena. Há, no entanto, duas causas de aumento de pena, especificamente quanto à prática do crime de financiamento fraudulento (art. 19, Lei nº 7.492/89). Primeiro, a prevista no parágrafo único, do artigo 19, da Lei nº 7.492/86 – quando o delito é cometido em detrimento de instituição financeira oficial ou credenciada que trabalha com recursos públicos – devendo a pena ser aumentada em 1/3 (um terço). Por fim, a presença de causa de aumento de pena (concurso homogêneo – parte geral do CP), qual seja a prevista no artigo 71, do Código Penal, consistente no cometimento de crime em continuidade delitiva. No presente caso, aliada às conexões previstas no caput do artigo 71, do Código Penal (conexões de caráter espacial e temporal), a ação dos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI restou caracterizada pela prática, por diversas vezes, do crime descrito no artigo 19, da Lei nº 7.492/86. Destarte, deve este Magistrado, ao fixar a fração de majoração da pena para o crime continuado, observar o número de infrações cometidas (critério objetivo), bem como, as circunstâncias judiciais descritas no artigo 59 do Código Penal (critério subjetivo). Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (AgRG no Resp: 1387471 MG 2013/0188131-3, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 04/11/2014, DJe 17/11/2014). Aumento a pena das rés em 2/3 (dois terços). No que concerne à forma de calcular a incidência da segunda causa majorante (parte geral do Código Penal), entendo que o cômputo deva se dar pelo chamado "método fracionário (ou isolado)", porque mais favorável aos réus. Aplicando-se a causa de aumento de pena prevista na parte geral do Código Penal – continuidade delitiva – sobre a pena intermediária e não sobre a pena já majorada. Portanto, ACRESÇO mais 01 (um) ano e 04 (quatro) meses à sanção fixada na segunda fase, para os réus ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO; e mais 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias à sanção fixada na segunda fase, para o réu RAUL DIAS NAVES. (destaques no original) Nesse ponto, o MPF defende a existência de error in judicando na dosimetria e a necessidade de que a majorante do crime continuado incida após as demais causas de aumento de pena e não pelo chamado “método fracionário (ou isolado)”, e, como consequência, a majoração das penas privativas de liberdade e de multa, essa tanto em seu aspecto global quantitativo quanto em seu aspecto unitário, além de aplicar o regime semiaberto para aqueles que tiveram o regime aberto fixado na sentença (ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI). No ponto, os pedidos recursais estão assim redigidos: ii) no mérito, seja o recurso provido para: (...); b) seja reconhecido o error in judicando contido na sentença condenatória quando tratou da figura do crime continuado (art. 71 do CP) como se fosse uma simples causa de aumento de pena da terceira etapa da dosimetria penal, em franca violação ao art. 68 e seu parágrafo único, uma vez que ela não integra o critério trifásico, incidindo após a fixação de pena para cada delito, nos termos da fundamentação doutrinária; c) por conseguinte, seja a pena dos apelados Zélio, Ricardo e Adílson majorada para o patamar mínimo de 4 anos, 5 meses e 10 dias de reclusão, modificando-se o regime inicial de resgate para o semiaberto, nos termos do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal; d) seja a pena do recorrido Raul recrudescida para o patamar mínimo de 5 anos, 2 meses e 6 dias de reclusão, mantido o regime inicial semiaberto, na forma do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal; e) seja a pena de multa dos apelados Zélio, Ricardo e Adílson aumentada para 35 dias-multa, à razão unitária de ½ do salário mínimo vigente ao tempo dos crimes; f) no que toca ao recorrido Raul, seja a pena de multa majorada para o patamar de 45 dias-multa, também à razão unitária de ½ do salário mínimo vigente ao tempo dos crimes. Assiste razão ao MPF porque a jurisprudência vem firmando a adoção do critério / método de cálculo sucessivo, cumulativo ou de efeito cascata e não o da “incidência isolada” sobre a pena provisória (aplicado na sentença). Com efeito, a jurisprudência Pátria, incluindo a desta Turma (e.g., ACR 0006559-96.2018.4.01.3000, DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA, TRF1 – DÉCIMA TURMA, PJe 22/11/2024) adota o critério cumulativo ou do “efeito cascata” (e não da incidência isolada), no que tange ao concurso de causas de aumento de pena. No mesmo sentido: “Havendo pluralidade de causas de aumento, adota-se ‘(...) o critério cumulativo ou do ‘efeito cascata’, no que tange ao concurso de causas de aumento ou diminuição de pena’ (AgRg no HC n. 723.412/SC, Rel. Min. JESUÍNO RISSATO (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 4/11/2022)” (ACR 0032742-82.2015.4.01.3300, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, TRF1 – DÉCIMA TURMA, PJe 21/10/2024). Assim, sobre a pena provisória de 2 anos de reclusão e 10 dias-multa aplicada na sentença aos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, faço incidir, na terceira fase, a causa especial de aumento de pena do art. 19, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (A pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é cometido em detrimento de instituição financeira oficial ou por ela credenciada para o repasse de financiamento), resultando na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa. E sobre essa pena faço incidir a fração já empregada na sentença – de 2/3 – em decorrência da continuidade delitiva, resultando na pena definitiva de 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa. Em relação ao réu RAUL DIAS NAVES, faço incidir, na terceira fase, a causa especial de aumento de pena do art. 19, parágrafo único, da Lei 7.492/86 sobre a pena provisória/intermediária de 2 anos e 4 meses de reclusão e (implícitos) 11 dias-multa que, acrescida de 1/3, resulta em 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa. E sobre essa pena faço incidir a fração já empregada na sentença – de 2/3 – em decorrência da continuidade delitiva, resultando na pena definitiva de 5 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 6 (seis) dias de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa. Por conseguinte, também dou provimento ao pleito do MPF para fixar o regime semi-aberto aos réus ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI, ZÉLIO CARRIJO, nos termos do art. 33, § 2º, ‘b’, do Código Penal. Para o réu Raul o juízo a quo já estabeleceu o regime semiaberto, ponto observado pelo MPF em seu apelo ao pugnar que seja “mantido o regime inicial semiaberto, na forma do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal” (item ‘e’ dos pedidos recursais). Quanto à substituição ou não da pena corporal por restritivas de direitos, a alteração do quantum de pena privativa de liberdade a partir de provocação recursal do MPF gera o dever de o juízo analisar, de ofício e ex lege, a substituição ou não da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. No ponto, em relação aos corréus ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO é caso de reformar a sentença para, em razão do novo quantum de pena privativa de liberdade – de 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa – deixar de substituir a pena corporal por privativas de liberdade, pois não preenchido o requisito objetivo do art. 44, I, CP. Em relação ao corréu RAUL DIAS NAVES fica mantido o capítulo da sentença em que se declarou que “NÃO estão presentes os requisitos objetivos para a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, nos moldes do artigo 44, do Código Penal”. 6.3 Da Pena de Multa Quanto ao pleito do MPF para que ocorra a majoração do valor unitário de cada dia-multa, de 1/30 (da sentença) para ½ do salário mínimo vigente ao tempo dos crimes aos réus Zélio, Ricardo, Adílson e Raul, assim fundamentou-se esse pleito (ID 304185355, pp. 14/15): No que toca ao valor do dia-multa, nova correção deve ser feita. Sua Exa. entendeu que o dia-multa deveria ser fixado no mínimo legal de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do crime, porém descurou completamente dos elementos fáticos. Inicialmente, os réus não são pessoas pobres ou miseráveis na acepção estrita do termo jurídico, o que justificaria a fixação no patamar mínimo previsto em lei. Ao contrário, trata-se de crime contra o sistema financeiro nacional perpetrado por um ex-empregado do Banco do Brasil, um consultor financeiro e de investimentos rurais e outros indivíduos que exploravam economicamente a produção rural e que aplicaram um golpe milionário no PRONAF. Não se trata, portanto, de pessoas miseráveis que foram encontradas pescando em período proibido em um rio para o seu sustento, tampouco “mulas” de tráfico ou mesmo “sacoleiros” do Paraguai que descaminhavam ou contrabandeavam pequenos bens. Ao revés, trata-se de criminosos que atuavam com desenvoltura e amplo conhecimento para fraudar financiamentos bancários em linha de crédito destinada a uma política pública de juros subsidiados para agricultura familiar. Imagine desviar mais de R$ 909.000,00 em outubro de 2011, cujo valor atualizado corresponde a mais de R$ 1.737.000,00 (somente atualização monetária sem juros de mora por se tratar de ato ilícito), e ser “punido” com uma multa que corresponde a menos de R$ 1.000,00. Data venia, o valor é risível e insignificante, devendo o valor do dia-multa ser ele exasperado para, no mínimo ½ do salário mínimo vigente ao tempo do crime. Como indicado, não são pessoas que trabalhavam como lavradores, mas sim empregado de banco estatal, consultor financeiro que hoje trabalha com garimpo possivelmente criminoso e outros produtores rurais que se ajustaram para fraudar o PRONAF. Trata-se de pessoas que possuem e possuíam recursos financeiros, não merecendo nenhum tipo de tratamento leniente por parte do Poder Judiciário com a prática de inúmeras fraudes graves. A punição deve ser séria de sorte a atender às finalidades da pena, notadamente a prevenção geral e especial, a fim de impedir a desgregação social. Essa fundamentação é inidônea para o fim proposto pelo MPF porque o valor unitário do dia-multa deve ser estabelecido de maneira condizente à situação econômica do réu. No mesmo sentido já decidiu o STJ: “Nos termos da orientação desta Casa, ‘(...). Tão só quando da fixação do valor unitário do dia-multa, a análise da condição socioeconômica é objeto de apreciação. (...)’ (AgRg no REsp 1.263.860/PA, relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 5/12/2014)” (AgRg no HC 706.045/BA, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 10/5/2022, DJe de 16/5/2022). Ademais, não há nos autos nenhum indicativo de que os 4 réus tenham condições financeiras para suportar o ônus. Dá-se, pois, parcial provimento ao apelo do MPF. 7. Da Prescrição da Pretensão Punitiva na Modalidade Retroativa Em razão da diminuição da pena corporal de ambos os réus, ora apelante, há de ser examinada a (in)ocorrência de prescrição da pretensão punitiva, a qual, por ser matéria de ordem pública, que deve ser declarada em qualquer fase do processo, nos termos do art. 61, caput, do Código de Processo Penal. E por ser matéria cognoscível de ofício, pode inclusive ser analisada em relação aos 2 corréus sentenciados que não recorreram (RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES). Na hipótese, constata-se que, após realização do novo cálculo, a pena privativa de liberdade, excluído o acréscimo decorrente da continuidade delitiva (súmula 497 STF e art. 119, CP), resulta na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão para os corréus ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO, e de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão para o corréu RAUL DIAS NAVES, cujos montantes atraem o prazo prescricional, pela pena em concreto, de 8 (oito) anos ex vi do art. 109, IV c/c art. 110, § 1º, ambos do CP. Na hipótese, os fatos ocorreram entre 20 de setembro de 2011 (cédula pignoratícia 40/00484-8) e 23 de novembro de 2011 (cédula pignoratícia 40/00563-1), e o recebimento da denúncia, primeiro marco interruptivo da prescrição (art. 117, I, CP), ocorreu em 06 de março de 2020 (ID 304185047), portanto, quando já implementado o prazo prescricional de 8 anos e, por conseguinte, está configurada a prescrição na modalidade retroativa tradicional (operada entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação em Secretaria da sentença condenatória). Ante o exposto: 1) Nego provimento ao recurso de apelação de ZÉLIO CARRIJO. 2) Dou parcial provimento ao recurso de apelação de ADILSON ALVES PIMENTA, apenas para deferir o pedido de gratuidade da justiça (ID 304185357 c/c ID 304185106). 2) Dou parcial provimento ao recurso de apelação do MPF para: 2.1) Condenar solidariamente os réus ADILSON ALVES PIMENTA, ZÉLIO CARRIJO, RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES ao pagamento de R$ 909.348,00, a título de reparação mínima dos danos, a ser devidamente atualizado e compensando-se eventuais valores já restituídos em outras vias. 2.2) Readequando a dosimetria: 2.2.1) Majorar a pena de ADILSON ALVES PIMENTA, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO de 04 (quatro) anos de reclusão e pagamento de 19 (dezenove) dias-multa para 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa, bem como estabelecer o regime prisional semiaberto e sem substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, mantido o valor unitário de cada-dia multa fixado na sentença. 2.2.2) Majorar a pena de RAUL DIAS NAVES de 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa para 5 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 6 (seis) dias de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença (valor unitário de cada-dia multa fixado na sentença, o regime prisional semiaberto e a não substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos). 3) De ofício (art. 61 do CPP), e com fundamento nos artigos 107, inciso IV (primeira figura), 109, inciso IV, c/c art. 110, § 1º, e art. 117, I e IV, todos do Código Penal, declaro a extinção da punibilidade dos apelantes ADILSON ALVES PIMENTA e ZÉLIO CARRIJO, estendendo-a, de ofício, aos réus RICARDO GOMES MARCHINI e RAUL DIAS NAVES, em razão do advento da prescrição da pretensão punitiva, pela pena em concreto, na modalidade retroativa, contudo, condicionando essa extinção da punibilidade ao trânsito em julgado para a acusação. Em face do item 2 supra, anote-se a justiça gratuita para o apelante ADILSON ALVES PIMENTA, como determina o art. 164, VI, do Regimento Interno deste Tribunal. É o voto. Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora [1] Art. 26. A ação penal, nos crimes previstos nesta lei, será promovida pelo Ministério Público Federal, perante a Justiça Federal. [2] Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; [3] Art. 1º da Lei 1.060/50 (não revogado pelo art. 1.072, III, da Lei 13.105/15): Os poderes públicos federal e estadual, independente da colaboração que possam receber dos municípios e da Ordem dos Advogados do Brasil, - OAB, concederão assistência judiciária aos necessitados nos termos da presente Lei. [4] Lei 13.105/15: art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. (...) Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. (...) § 3o Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. § 4o A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça. [5] Art. 1º da Lei 7.115/83: A declaração destinada a fazer prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador bastante, e sob as penas da Lei, presume-se verdadeira. [6] - Ricardo Gomes Marchini, como representante técnico da empresa Centro Oeste Consultoria, elaborou os projetos de investimento agropecuário falsos, conferindo um verniz técnico à fraude. - Raul Dias Naves, funcionário do Banco do Brasil, foi o agente interno que, na função de assistente de negócios, viabilizou o esquema, analisando e dando curso às sete operações fraudulentas, ignorando as diversas inconsistências e violando seu dever funcional, fato que culminou em sua demissão por justa causa. Nesse ponto, não há como ignorar parte da representação formulada pelo Banco do Brasil, precisamente a seguinte: Por fim, verificou-se, ainda, diversas falhas na contratação das operações tais como: a) operações contratadas sem a realização de vistora prévia; b) operações contratadas mediante apresentação de Contratos de Comodato inválidos, com a assinatura do Sr Zélio Carrjo, em que esse só lhe foi concedido o poder de vender e transferir o imóvel e não fazer Contratos de Comodatos com o nome da então proprietária, Maria Helena; c) operações contratadas mediante apresentação de DAP's (Declaração de Aptidão ao PRONAF) emitidas por entidade de outro estado, atestando que Os mutuários não residiam no imóvel; d) liberação dos recursos diretamente as contas correntes dos mutuários tendo sido os recursos destinados a pessoas diferentes daquelas emitentes das Notas Fiscais; e) que vários cheques emitidos pelos mutuários beneficiaram pessoas de um determinado círculo, inclusive a empresa de ATNI (Assistência Técnica em Nível de Imóvel), que depositou parte do valor na conta corrente da esposa do funcionário do Banco, Raul Dias Naves, em que esse realizou todas as análises das operações, sendo o próprio funcionário a pessoa que indicou a empresa para firmar convênio com a agência. Os fatos alusivos a participação do Sr. Raul Dias Naves, aliás, foram materializados em processo administrativo nº 120.909 – Audit/Goiânia 8375-5/20120002037-10, que culminou na demissão do funcionário. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região APELAÇÃO CRIMINAL (417) n. 1000499-93.2020.4.01.4302 VOTO REVISÃO O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS: Nada a acrescentar ao Relatório. 2. Adoto os fundamentos expostos pela em. Relatora, para o fim de (i) rejeitar as preliminares arguídas por ZÉLIO CARRIJO; (ii) deferir a gratuidade de justiça a ADILSON ALVES PIMENTA; (iii) afirmar estarem demonstradas a materialidade e a autoria do delito tipificado no art. 19, da Lei nº 7.492/86 e atribuído a ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO; (iv) rever a dosimetria da pena, e; (v) declarar extinta a punibilidade de ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO pela prescrição da pretensão punitiva do Estado, considerada a pena ora fixada. 3. Pelo exposto, (i) NEGO PROVIMENTO à apelação de ZÉLIO CARRIJO; (ii) DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações de ADILSON ALVES PIMENTA e do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, e; (iii) DECLARO extinta a punibilidade de ADILSON ALVES PIMENTA, RAUL DIAS NAVES, RICARDO GOMES MARCHINI e ZÉLIO CARRIJO pela prescrição da pretensão punitiva do Estado, considerada a pena ora fixada. É o voto. MARCUS VINICIUS REIS BASTOS Desembargador Federal Revisor PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL DE 2ª INSTÂNCIA TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO GAB 31 - DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA PROCESSO: 1000499-93.2020.4.01.4302 PROCESSO REFERÊNCIA: 1000499-93.2020.4.01.4302 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) APELANTES: Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros REPRESENTANTES DOS APELANTES: CLEVER FERREIRA COIMBRA - GO11587-A e GRACIANO SILVA - TO7990-A APELADOS: Ministério Público Federal (Procuradoria) e outros REPRESENTANTES DOS APELADOS: CLEVER FERREIRA COIMBRA - GO11587-A e GRACIANO SILVA - TO7990-A E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 19 DA LEI 7.492/1986. OBTENÇÃO FRAUDULENTA DE FINANCIAMENTO EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OFICIAL COM RECURSOS DO PRONAF. USO DE DOCUMENTOS IDEOLOGICAMENTE FALSOS. CONCURSO DE PESSOAS. CONTINUIDADE DELITIVA. DOSIMETRIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA POR DANO. RECURSO DO MPF PROVIDO. RECURSOS DOS RÉUS NÃO PROVIDOS. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. I. CASO EM EXAME 1. Apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelos réus Z. C. e A. A. P. contra sentença da Vara Federal Cível e Criminal de Gurupi/TO, que julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar os recorrentes, bem como os corréus R. D. N. e R. G. M., pela prática do delito previsto no art. 19 da Lei 7.492/1986, em concurso de pessoas (art. 29 do CP), em continuidade delitiva (art. 71 do CP), com agravante do art. 61, II, “g”, do Código Penal para R. D. N., absolvendo C. F. C. 2. Consta dos autos a prática reiterada, no ano de 2011, de fraudes em contratações de cédulas pignoratícias no âmbito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), mediante apresentação de documentos falsificados perante a agência do Banco do Brasil em Palmeirópolis/TO. 3. O Ministério Público Federal interpôs apelação com vistas a: (i) impor aos réus a condenação pela reparação do dano e de forma solidária; (ii) corrigir a dosimetria das penas, afastando o chamado "método fracionário (ou isolado)" adotado na sentença e aplicando corretamente a continuidade delitiva sobre a pena obtida anteriormente pela aplicação da causa de aumento de 1/3 do parágrafo único do art. 19 da Lei 7.492/86, adotando-se, para tanto, o critério / método de cálculo sucessivo, cumulativo ou de efeito cascata, após a terceira fase do art. 68 do CP; e (iii) majorar as penas privativas de liberdade, de multa e alterar o regime inicial para semiaberto para 3 corréus. 4. O réu Z. C. interpôs recurso requerendo a concessão da gratuidade da justiça e, preliminarmente, alegando nulidades processuais relativas ao aditamento da denúncia, impedimento de advogado, incompetência da Justiça Federal, prescrição da pretensão punitiva. Requer a absolvição ou, subsidiariamente, pela anulação do processo desde o recebimento da denúncia. 5. O réu A. A. P. também requereu a concessão da gratuidade da justiça e apelou para obter sua absolvição e, subsidiariamente, a redução da pena-base ao mínimo legal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 6. A controvérsia recursal comporta exame sob múltiplos enfoques: (i) Verificar a competência da Justiça Federal e, se competente, examinar a existência ou não de nulidades processuais aptas a ensejar a anulação da sentença ou do feito; (ii) Verificar se restaram comprovados a materialidade, a autoria e o dolo na prática do delito do art. 19 da Lei 7.492/1986, com emprego de documentos ideologicamente falsos, em concurso de pessoas e em continuidade delitiva; (iii) Aferir a adequação da dosimetria penal adotada na sentença, especialmente quanto à forma de aplicação do art. 71 do CP; (iv) Apurar a viabilidade de imposição de condenação dos réus pelo prejuízo causado à instituição financeira pública e ao PRONAF. III. RAZÕES DE DECIDIR 7. Questões preliminares. 7.1 Deve ser deferido o pedido de gratuidade da justiça apenas ao apelante A. A. P., que juntou declaração de hipossuficiência econômica. 7.2 A defesa de Z. C. suscitou a incompetência da Justiça Federal, alegando que os recursos obtidos fraudulentamente eram de natureza privada. Tal tese não se sustenta diante do objeto do crime. Os valores obtidos fraudulentamente decorrem do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), política pública federal estruturada com recursos públicos, inclusive de origem orçamentária da União e operada por instituição financeira pública federal (Banco do Brasil S.A.), com finalidade específica. Conforme pacificado na jurisprudência dos tribunais superiores, a lesão ou o risco de lesão a bens, serviços ou interesses da União atrai a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, IV, da Constituição Federal c/c art. 26 da Lei 7.492/86. O vínculo direto do financiamento com programa federal e instituição bancária pública torna incontroversa a competência da Justiça Federal. 7.3 A outra preliminar alegada por Z. C. diz respeito à nulidade processual por suposto impedimento do advogado constituído, o qual teria sido indevidamente impedido de exercer a defesa técnica após ser indevidamente incluído como parte no feito. Consta nos autos que a alegada inclusão do advogado não resultou em prejuízo processual à defesa, que permaneceu ativa por meio de outros procuradores habilitados. O causídico/réu afastado da defesa de outro corréu foi posteriormente readmitido pelo juízo a quo após sua absolvição transitada em julgado. O princípio pas de nullité sans grief afasta a nulidade por ausência de demonstração de prejuízo concreto à ampla defesa. 7.4 A segunda preliminar versa sobre a nulidade do aditamento à denúncia. A tese defensiva sustenta que o Ministério Público teria extrapolado os limites legais do aditamento, inovando na imputação sem assegurar novo contraditório. No entanto, a jurisprudência pacífica do STJ e do STF admite o aditamento da denúncia até a sentença, nos termos do art. 384 do CPP, especialmente quando visa esclarecer ou individualizar fatos já constantes da denúncia original. No caso, o aditamento apenas detalhou as operações fraudulentas em série, individualizando condutas e promovendo melhor delimitação do objeto acusatório, o que, longe de prejudicar os réus, assegurou a observância ao devido processo legal. 8. Da arguida prejudicial de mérito – prescrição. Em relação ao crime efetivamente imputado (art. 19 da Lei 7.492/1986), a denúncia foi recebida em 06/03/2020, sendo os fatos apurados datados de 2011. No entanto, houve causas interruptivas reconhecidas no curso do processo, notadamente a sentença penal condenatória proferida em 23/08/2022, conforme art. 117, IV, do CP. Ademais, houve recurso do MPF pugnando pela majoração da pena, a atrair o cálculo da prescrição pela pena em abstrato, cujo prazo não se implementou entre os marcos interruptivos prescricionais. 9. Apelos das defesas quanto à condenação. 9.1 O conjunto probatório é robusto e permite concluir, com segurança, pela atuação coordenada e deliberada dos réus para obtenção indevida de recursos públicos do PRONAF. As cédulas pignoratícias formalizadas em nome de terceiros foram instruídas com documentação que não correspondia à realidade, contendo elementos falsificados ou ideologicamente inverídicos. Os projetos técnicos, declarações de aptidão, contratos de comodato e autorizações de uso de imóvel rural não refletiam relações jurídicas verdadeiras, revelando a existência de fraude premeditada. 9.2 Os elementos colhidos durante a instrução, incluindo os documentos bancários, depoimentos e perícias, demonstram de forma clara a divisão de tarefas entre os agentes. A conduta dos apelantes Z. C. e A. A. P. foi individualizada e essencial para a concretização da fraude na obtenção de financiamento. 10. Recurso do MPF. 10.1 Procede o pedido de fixação de valor mínimo para reparação do dano, na forma do art. 387, IV, do CPP. O pedido foi formulado desde a denúncia, reafirmado nas alegações finais, e encontra respaldo no conjunto probatório, sendo cabível a responsabilização solidária dos condenados, diante da coautoria e do vínculo de interdependência entre as condutas. 10.2 A dosimetria aplicada na sentença mostra-se parcialmente equivocada. O crime continuado previsto no art. 71 do CP deve incidir como aumento posterior sobre a causa de aumento de pena do parágrafo único do art. 19 da Lei 7.492/1986, e não como simples causa de aumento isolada na terceira fase a incidir sobre a pena provisória/intermediária. Aplicado corretamente o aumento, os patamares das penas devem ser redimensionados e, para 3 corréus, reformar a sentença para fixar o regime semiaberto. 10.3 A pretensão do MPF de majoração do valor unitário de cada dia-multa, de 1/30 (da sentença) para ½ do salário mínimo vigente ao tempo dos crimes, não prospera porque deve levar em conta a análise da condição socioeconômica, não tendo o MPF se desincumbido do ônus probatório de demonstrar o equívoco na sentença. IV. DISPOSITIVO E TESE 11.1. Recurso de apelação de Z. C. não provido. 11.2 Recurso de apelação de A. A. P. parcialmente provido apenas para deferir o pedido de gratuidade da justiça. 11.3 Recurso de apelação do MPF parcialmente provido para: 11.3.1 Condenar solidariamente os réus A. A. P., Z. C., R. G. M. e R. D. N. ao pagamento de R$ 909.348,00, a título de reparação mínima dos danos, a ser devidamente atualizado e compensando-se eventuais valores já restituídos em outras vias. 11.3.2) Readequar a dosimetria: 11.3.2.1 Majorar a pena de A. A. P., R. G. M. e Z. C. de 04 (quatro) anos de reclusão e pagamento de 19 (dezenove) dias-multa para 4 (quatro) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa, bem como estabelecer o regime prisional semiaberto e sem substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, mantido o valor unitário de cada-dia multa fixado na sentença. 11.3.2.2 Majorar a pena de R. D. N. de 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa para 5 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 6 (seis) dias de reclusão e 23 (vinte e três) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença (valor unitário de cada-dia multa fixado na sentença, o regime prisional semiaberto e a não substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos). 11.4 De ofício, declarada a extinção da punibilidade dos apelantes A. A. P. e Z. C., estendendo-a, de ofício, aos réus R. G. M. e R. D. N., em razão do advento da prescrição da pretensão punitiva, pela pena em concreto, na modalidade retroativa, contudo, condicionando essa extinção da punibilidade ao trânsito em julgado para a acusação. Tese de julgamento: “1. A obtenção de financiamento junto a instituição financeira oficial com emprego de documentos ideologicamente falsos configura o crime previsto no art. 19 da Lei 7.492/1986. 2. Quando houver causa especial de aumento de pena, a continuidade delitiva deve incidir com o uso do critério / método de cálculo sucessivo, cumulativo ou de efeito cascata, e não pelo chamado "método fracionário (ou isolado)". 3. É cabível a fixação de valor mínimo para reparação do dano, quando expressamente requerido na denúncia.” Legislação relevante citada: Lei 7.492/1986, art. 19, parágrafo único; Código Penal, arts. 29, 61, II, “g”, 68, 71; Código de Processo Penal, arts. 384, 387, IV, 389, 613, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 723.412/SC, Rel. Min. JESUÍNO RISSATO (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 4/11/2022; STJ, AgRg no REsp 1.263.860/PA, relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 5/12/2014; STJ, AgRg no HC 706.045/BA, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 10/5/2022, DJe de 16/5/2022; TRF1, ACR 0032742-82.2015.4.01.3300, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, TRF1 – DÉCIMA TURMA, PJe 21/10/2024; TRF1, ACR 0006559-96.2018.4.01.3000, DESEMBARGADORA FEDERAL SOLANGE SALGADO DA SILVA, TRF1 – DÉCIMA TURMA, PJe 22/11/2024. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação de Z. C.; DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação de A. A. P. e do MPF e, DE OFÍCIO, declarar a extinção da punibilidade pela prescrição para os apelantes A. A. P. e Z. C., estendendo-a aos réus R. G. M. e R. D. N., nos termos do voto da Relatora. Brasília, data da assinatura eletrônica. Desembargadora Federal SOLANGE SALGADO DA SILVA Relatora

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