Municipio De Mirassol D'Oeste e outros x Municipio De Mirassol D'Oeste e outros
ID: 260819400
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: APELAçãO / REMESSA NECESSáRIA
Nº Processo: 1003022-04.2021.8.11.0011
Data de Disponibilização:
25/04/2025
Advogados:
IURI SEROR CUIABANO REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO IURI SEROR CUIABANO
OAB/MT XXXXXX
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VIVIANE SOUZA DO COUTO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1003022-04.2021.8.11.0011 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [Obrigação de …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1003022-04.2021.8.11.0011 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [Obrigação de Fazer / Não Fazer, Indenização / Terço Constitucional] Relator: Des(a). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE Turma Julgadora: [DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO] Parte(s): [SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLI MUNIC DE MIRASSOL DOESTE - CNPJ: 24.987.000/0001-95 (APELANTE), VIVIANE SOUZA DO COUTO - CPF: 878.798.591-87 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE MIRASSOL D'OESTE - CNPJ: 03.755.477/0001-75 (APELADO), IURI SEROR CUIABANO registrado(a) civilmente como IURI SEROR CUIABANO - CPF: 081.153.817-64 (ADVOGADO), IURI SEROR CUIABANO registrado(a) civilmente como IURI SEROR CUIABANO - CPF: 081.153.817-64 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE MIRASSOL D'OESTE - CNPJ: 03.755.477/0001-75 (APELANTE), SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLI MUNIC DE MIRASSOL DOESTE - CNPJ: 24.987.000/0001-95 (APELADO), VIVIANE SOUZA DO COUTO - CPF: 878.798.591-87 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES CÍVEIS. SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS. PROFESSORES. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS. FÉRIAS DE 45 DIAS. TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE O PERÍODO ADICIONAL DE 15 DIAS. DISTINÇÃO DE FÉRIAS E RECESSO ESCOLAR. INOCORRÊNCIA. INCLUSÃO DAS PARCELAS VINCENDAS. ART. 323 DO CPC. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA RETIFICADOS DE OFÍCIO. INCIDÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL N.° 113/21. RECURSO DO MUNICÍPIO DESPROVIDO. RECURSO DO SINDICATO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mirassol D’Oeste e pelo Município de Mirassol D’Oeste contra sentença que reconheceu o direito dos professores ao pagamento do terço constitucional de férias sobre os 15 dias adicionais, totalizando 45 dias de férias anuais, conforme previsto na Lei Complementar Municipal nº 026/2002. 2. O Sindicato busca a inclusão expressa das parcelas vincendas na condenação. O Município alega prescrição, incompetência da Justiça Comum e inexistência de direito ao terço constitucional sobre os 15 dias adicionais, sob o argumento de que a Lei Complementar nº 157/2016 teria revogado o direito a 45 dias de férias. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. Há quatro questões em discussão: (i) se a Justiça Comum é competente para julgar a demanda, diante da alegação de que a matéria seria trabalhista; (ii) se há prescrição quinquenal aplicável ao caso; (iii) se os professores municipais fazem jus a 45 dias de férias anuais, conforme previsto na Lei Complementar Municipal nº 026/2002, ou se esse direito teria sido revogado pela Lei Complementar nº 157/2016; e (iv) se o adicional de um terço constitucional deve incidir sobre todo o período de férias, incluindo os 15 dias adicionais. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A Justiça Comum é competente para processar e julgar a demanda, pois o vínculo entre o Município e os professores municipais tem natureza estatutária e administrativa, conforme entendimento do STF no Tema 43 da Repercussão Geral (RE 573.202) e na ADI 3.395. 5. Aplica-se a prescrição quinquenal, atingindo apenas as parcelas vencidas antes dos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, nos termos da Súmula nº 85 do STJ. 6. A Lei Complementar Municipal nº 026/2002, norma especial do magistério municipal, não foi revogada pela Lei Complementar nº 157/2016, prevalecendo o direito dos professores a 45 dias de férias anuais, conforme o princípio da especialidade. 7. O terço constitucional de férias deve incidir sobre todo o período de férias usufruído pelo servidor, conforme o art. 7º, XVII, da Constituição Federal, sem restrição aos 30 dias. 8. O entendimento do IRDR n. 1002789-40.2021.8.11.0000 (Tema 4 – TJMT) sobre a incidência do terço constitucional em 45 dias de férias dos professores estaduais é aplicável por analogia aos professores municipais, assegurando-lhes o mesmo direito, uma vez que não há distinção entre férias e recesso escolar para fins de pagamento do terço constitucional. 9. A obrigação de pagar o adicional de 1/3 deve se estender às parcelas vincendas, pois se trata de prestação sucessiva, nos termos do art. 323 do CPC. 10. A correção monetária e os juros moratórios devem observar os critérios fixados no Tema 810 do STF e no Tema 905 do STJ até 08/12/2021, e, a partir de 09/12/2021, aplica-se exclusivamente a Taxa SELIC como fator de correção monetária e juros de mora, conforme a Emenda Constitucional nº 113/2021. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Recurso do Município desprovido. Recurso do Sindicato provido para incluir expressamente as parcelas vincendas na condenação. Sentença parcialmente retificada, de ofício, para adequação dos critérios de correção monetária e juros moratórios. Tese de julgamento: 1. A Justiça Comum é competente para julgar demandas de servidores municipais sujeitos a regime jurídico-administrativo. 2. Em se tratando de relação de trato sucessivo, a prescrição quinquenal atinge apenas as parcelas vencidas antes dos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. 3. Em atenção ao princípio da especialidade, a Lei Complementar Municipal nº 026/2002, norma específica do magistério municipal, garante aos professores municipais o direito a 45 dias de férias anuais, prevalecendo sobre norma geral posterior, que não revogou expressamente essa prerrogativa. 4. O terço constitucional de férias incide sobre todo o período de férias usufruído pelo servidor, sem restrição aos 30 dias. 5. Não há distinção entre férias e recesso escolar para fins de pagamento do terço constitucional, devendo o adicional de 1/3 incidir sobre o período total de 45 dias quando previsto em legislação municipal. 6. A obrigação de pagar o adicional de 1/3 se estende às parcelas vincendas, enquanto durar a relação funcional. 7. A correção monetária e os juros moratórios devem observar os critérios fixados no Tema 810 do STF e no Tema 905 do STJ até 08/12/2021, e, a partir de 09/12/2021, aplica-se exclusivamente a Taxa SELIC como fator de correção monetária e juros de mora, conforme a Emenda Constitucional nº 113/2021. ________________________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 7º, XVII; CPC, art. 323; Lei Complementar Municipal nº 026/2002, art. 17; Lei Complementar Municipal nº 157/2016, art. 57. Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 43 da Repercussão Geral (RE 573.202); STF, ADI 3.395; STF, RE 870.947 (Tema 810); STJ, REsp 1.495.146/MG (Tema 905); STJ, Súmula 85; TJMT, IRDR nº 1002789-40.2021.8.11.0000 (Tema 4). R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Egrégia Câmara: Trata-se de remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mirassol D’Oeste e pelo Município de Mirassol D’Oeste, impugnando a sentença que reconheceu o direito dos professores ao pagamento do terço constitucional de férias também sobre os 15 (quinze) dias adicionais, além dos 30 (trinta) dias já concedidos, totalizando 45 (quarenta e cinco) dias de férias, nos termos da Lei Complementar Municipal nº 026/2002. Na origem, cuida-se de ação coletiva na qual o sindicato autor busca o reconhecimento do direito ao terço constitucional calculado também sobre os 15 dias de férias, argumentando que a Lei Complementar Municipal nº 026/2002, específica para o Magistério, assegura aos professores 45 dias de férias anuais. O Sindicato, em suas razões recursais, sustenta que a sentença deixou de contemplar de forma expressa as parcelas vincendas, embora tenha reconhecido o direito ao terço de férias sobre os 15 dias. Requer, pois, a reforma parcial da sentença para que se inclua a obrigação de pagar também as parcelas relativas a períodos futuros, até a efetiva implementação em folha. O Município de Mirassol D’Oeste, por sua vez, alega em seu apelo, preliminarmente, a ocorrência da prescrição e a incompetência absoluta da Justiça Comum, por entender que a demanda envolveria matéria de cunho trabalhista. No mérito, defende que a Lei Complementar nº 157/2016 teria revogado o art. 17 da Lei Complementar nº 026/2002, de modo que os professores fariam jus a apenas 30 dias de férias, sendo os outros 15 dias mero recesso escolar, sem direito ao adicional de 1/3. Pleiteia a reforma integral da sentença. Intimado (Id. 244922170), o Município deixou de apresentar contrarrazões. Já o Sindicato apresentou suas contrarrazões no Id. 244922175, rebatendo o apelo municipal. A Procuradoria-Geral de Justiça, por sua vez, manifestou-se pela ausência de interesse público que justificasse a sua intervenção no feito (Id. 257220695). Os autos foram remetidos a este Tribunal para reexame necessário (art. 496 do CPC) e julgamento dos recursos de apelação. É o relatório. Desembargador JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Relator V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. JOSÉ LUIZ LEITE LINDOTE Egrégia Câmara: De início, reconheço presentes os pressupostos de admissibilidade, o que justifica o conhecimento da remessa necessária e dos recursos. Como visto do relatório, trata-se de remessa necessária e recursos de apelação interpostos pelo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mirassol D’Oeste e pelo Município de Mirassol D’Oeste, impugnando a sentença que reconheceu o direito dos professores ao pagamento do terço constitucional de férias também sobre os 15 (quinze) dias adicionais, além dos 30 (trinta) dias já concedidos, totalizando 45 (quarenta e cinco) dias de férias, nos termos da Lei Complementar Municipal nº 026/2002. A controvérsia posta em julgamento cinge-se a quatro questões essenciais: (i) se a Justiça Comum é competente para processar e julgar a demanda, diante da alegação do Município de que a matéria envolveria relação trabalhista; (ii) se há a ocorrência da prescrição; (iii) se os professores municipais fazem jus a 45 (quarenta e cinco) dias de férias, conforme previsto na Lei Complementar Municipal nº 026/2002, ou se esse direito teria sido revogado pela Lei Complementar nº 157/2016; e (iv) se o adicional de um terço constitucional deve incidir também sobre os 15 dias adicionais de férias, e não apenas sobre os 30 dias pagos pelo Município. DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA O Município sustenta, em sede preliminar, que a matéria discutida nos autos envolveria questões de natureza trabalhista e, portanto, competiria à Justiça do Trabalho o seu processamento e julgamento. Entretanto, tal argumento não merece prosperar. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Tema 43 da Repercussão Geral (RE 573.202), fixou a tese de que compete à Justiça Comum processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local. Vejamos: “Compete à Justiça comum processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local editada antes da Constituição Federal de 1988, com fundamento no artigo 106 da Constituição de 1967, na redação que lhe deu a Emenda Constitucional 1/1969.” (Tema 43 – STF) No julgamento do RE 573.202 (que deu origem ao Tema 43), o STF concluiu que, mesmo em contratos temporários ou em regimes especiais previstos em lei municipal/estadual, a relação não se configura como típica relação trabalhista regida pela CLT. Nesse sentido, se o vínculo é criado por lei local que institui um regime administrativo diferenciado, ainda assim permanece no âmbito do Direito Administrativo. Por consequência, a competência para julgar esses litígios não é da Justiça do Trabalho, mas sim da Justiça Comum. Seguindo a orientação da Suprema Corte, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a Justiça do Trabalho não tem competência para demandas que envolvam servidores contratados por prazo determinado para necessidade temporária de excepcional interesse público (STJ, CC n. 115.742/RN, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 11/5/2011, DJe 17/5/2011). Importante destacar que, em oportunidade mais recente, o Supremo Tribunal Federal reafirmou esse entendimento ao julgar a ADI 3.395, concluindo que: “A interpretação adequadamente constitucional da expressão ‘relação do trabalho’ deve excluir os vínculos de natureza jurídico-estatutária, em razão do que a competência da Justiça do Trabalho não alcança as ações judiciais entre o Poder Público e seus servidores.” (ADI 3395, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 15/04/2020, DJe-165 de 30/06/2020) No mesmo sentido, já decidiu esta Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo: AGRAVO DE INSTRUMENTO — PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO — DIREITO DE SERVIDOR PÚBLICO — TEMPORÁRIO — DECLÍNIO PARA A JUSTIÇA DO TRABALHO — IMPOSSIBILIDADE — RELAÇÃO DE NATUREZA JURÍDICO-ADMINISTRATIVA — PROCESSO SELETIVO PÚBLICO — COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM — PRECEDENTES STF E STJ — RECURSO PROVIDO. O Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 3.395/DF-MC, reconheceu a incompetência da Justiça Trabalhista para o julgamento das causas envolvendo o Poder Público e seus servidores, vinculados por relação estatutária ou de caráter jurídico-administrativo. A contratação prevista no art. 37, inciso IX da Constituição para prestação de serviços a fim de atender necessidade temporária e excepcional da administração, por meio de edital de processo seletivo, por tempo determinado, não se trata de vínculo pertencente a CLT, mas sim vínculo de natureza administrativa. A competência para processar e julgar ações cujo objeto é a relação jurídica estabelecida entre o Poder Público e seus Servidores contratados por prazo determinado, em face de necessidade temporária de excepcional interesse público, é da Justiça Comum. (N.U 1017200-59.2019.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 17/05/2021, Publicado no DJE 24/05/2021) Com isso, fica pacificado o posicionamento de que as controvérsias entre o Poder Público e servidores vinculados a regimes jurídico-administrativos, ainda que de contratação temporária ou “especial”, devem ser apreciadas pela Justiça Comum, e não pela Justiça do Trabalho. Dessa forma, rejeita-se a preliminar de incompetência. DA PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO O Município também argui a prescrição quinquenal, a qual, de fato, deve ser aplicada ao caso concreto. Contudo, tal aplicação não implica na extinção do direito material pleiteado, mas apenas na limitação das parcelas exigíveis aos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. Nos termos da Súmula nº 85 do Superior Tribunal de Justiça, nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não houver negativa expressa do próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio que antecedeu o ajuizamento da demanda. Em caso semelhante, essa egrégia Câmara julgou: REMESSA NECESSÁRIA/RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – SERVIDOR COMISSIONADO – VERBAS RESCISÓRIAS DEVIDAS – APURAÇÃO E DESCONTO DE VALORES EVENTUALMENTE PAGOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO – MERO DISSABOR – JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA – OBSERVÂNCIA DOS TEMAS 905 DO STJ E 810 DO STF – RECURSO DESPROVIDO – SENTENÇA PARCIALMENTE RETIFICADA. Aos servidores públicos ocupantes de cargo em comissão é assegurado constitucionalmente, quando exonerados, o direito ao recebimento de 13° salário, bem como férias integrais e proporcionais acrescidas de um terço. Tratando-se a presente demanda de verba remuneratória, ou seja, de relação de trato sucessivo, incide a aplicação da Súmula n° 85 do STJ, que prevê a prescrição apenas em relação ao período anterior a cinco anos da propositura da ação, in casu, anteriores a 29/04/2012. Não há que se falar em indenização por danos morais quando não é demonstrado qualquer dano existente oriundo do não recebimento das verbas rescisórias. No tocante aos juros e correção monetária, os índices para atualização do débito serão fixados na liquidação da sentença, observado os Temas 810/STF e 905/STJ. (N.U 1003092-87.2017.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 06/10/2021, Publicado no DJE 15/10/2021) [grifo nosso] Sabendo disso, correta a sentença ao reconhecer a prescrição apenas para as parcelas vencidas anteriormente a 24/11/2016, respeitando o prazo quinquenal contado do ajuizamento da ação (24/11/2021). Dessa forma, rejeita-se a preliminar de prescrição. DO MÉRITO 1. Do direito a 45 dias de férias aos professores do município de Mirassol D’Oeste A sentença de primeiro grau analisou corretamente a questão sob a ótica do princípio da especialidade, aplicando a norma específica do magistério municipal em detrimento da norma geral do estatuto dos servidores municipais. Nos termos do artigo 2º, §2º, da LINDB, "a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior." Assim, pelo princípio lex specialis derogat legi generali (a lei especial derroga a lei geral), a norma especial do magistério municipal prevalece sobre a norma geral, garantindo aos professores municipais o direito a 45 dias de férias anuais. A Lei Complementar Municipal nº 026/2002, específica para o Magistério, estabelece de forma expressa esse direito, conforme se depreende do artigo 17, que prevê 45 dias de férias para os professores em exercício da função docente e 30 dias para aqueles que desempenham outras funções no magistério. Vejamos: Art. 17. O período de férias anuais do titular de cargo de professor será: I - quando em função docente, de quarenta e cinco dias; II - nas demais funções, de trinta dias. Parágrafo único. As férias do titular de cargo de professor em exercício nas unidades escolares serão concedidas nos períodos de férias e recessos escolares, de acordo com calendários anuais, de forma a atender às necessidades didáticas e administrativas do estabelecimento. Por sua vez, a Lei Complementar nº 157/2016, que disciplina o regime jurídico dos servidores municipais, não revogou expressamente essa previsão nem tratou integralmente da matéria, fixando apenas diretrizes gerais aplicáveis a todos os servidores, ressalvadas disposições especiais. Dessa forma, prevalece a norma especial (LC 026/2002), garantindo aos professores municipais o direito a 45 dias de férias anuais, conforme corretamente decidido pelo juízo de origem. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, conforme o seguinte precedente: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REIVINDICATÓRIA DE PROGRESSÃO FUNCIONAL – PRELIMINAR AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR AFASTADA - PROGRESSÃO DE CLASSE – LEI MUNICIPAL Nº 074/98 – OBSERVÂNCIA DA ASCENÇÃO DE CLASSE IMEDIATAMENTE SUPERIOR – PREENCHIMENTO DE REQUISITOS – TEORIA DA CARGA DINÂMICA DA PROVA – PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE - LEX SPECIALIS DEROGAT LEGI GENERALI - RECURSO DESPROVIDO. 1- Aplica-se ao caso a teoria da carga dinâmica da prova, segundo a qual o ônus da prova cabe àquela parte que tem melhores condições de produzi-la, in casu e indubitavelmente, o Município de Pedra Preta, detentor de todo acervo documental da vida funcional da apelada e das alterações legislativas promovidas pelo Executivo e Legislativo municipais na seara da carreira de magistério municipal. 2- O critério da especialidade define a aplicação do Estatuto do Magistério Municipal de Pedra Preta, pois as leis especiais se sobrepõem às gerais (lex especialis derrogat generali). 3 - . Por trata-se de pagamento de natureza remuneratória, incidi a retenção de 11% (onze por cento), a título de contribuição previdenciária. 4- Quanto aos juros de mora e correção monetária estes devem incidir nos termos da decisão do Temas 810 do STF e 905 do STJ (N.U 0001995-72.2018.8.11.0022, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 19/07/2022, Publicado no DJE 28/07/2022) [grifo nosso] Portanto, diante da inexistência de revogação expressa da Lei Complementar Municipal nº 026/2002 e da aplicação do princípio da especialidade, impõe-se o reconhecimento do direito dos professores municipais ao gozo de 45 dias de férias anuais, prevalecendo a norma específica do magistério sobre o regime geral dos servidores municipais, conforme corretamente decidido na sentença recorrida. 2. Do terço constitucional sobre os 15 dias adicionais Nos termos do artigo 7º, inciso XVII, da Constituição Federal, o terço constitucional incide sobre todo o período de férias anuais usufruído pelo servidor, sem qualquer limitação a apenas 30 dias. A legislação municipal, por sua vez, também não impõe qualquer restrição à incidência do adicional. O artigo 57 da Lei Complementar nº 157/2016, que regula o pagamento do terço constitucional, assegura o direito ao adicional sobre a remuneração das férias, sem qualquer distinção quanto à sua duração. Vejamos: Art. 57. Independentemente de solicitação, será pago ao servidor, por ocasião das férias, um adicional correspondente a 1/3 (um terço) da remuneração vigente no período, incluindo-se as diferenças advindas pelo exercício de função comissionada ou cargo em comissão. Logo, não há fundamento jurídico que justifique o pagamento do adicional apenas sobre parte das férias, sendo correta a sentença ao reconhecer o direito ao terço constitucional também sobre os 15 dias adicionais, garantindo o cumprimento integral da Constituição Federal e da legislação municipal vigente. Em caso análogo, este egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso consolidou o entendimento de que, inexistindo restrição constitucional quanto ao período de férias, o adicional deve incidir sobre todo o período previsto na legislação municipal, conforme ementa abaixo: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – PRESCRIÇÃO AFASTADA – PRÓPRIO AUTOR DO FEITO PUGNA PELO PAGAMENTO REFERENTE AOS 05 ANOS ANTERIORES AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO - PROFESSOR - FÉRIAS DE 45 DIAS - PREVISÃO EM PLANO DE CARGOS E SALÁRIOS - APLICAÇÃO DO TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE TODO O PERÍODO DE FÉRIAS – POSSIBILIDADE - ART. 7º, XVII, DA CF E ART. 49 DA LEI MUNICIPAL 681/2001 – RECURSO DESPROVIDO. [...] Não fazendo o art. 7º, XVII, da CF, qualquer distinção quanto ao período de férias, apenas determinando que o descanso será remunerado com um terço a mais que o salário normal, é devido o pagamento da parcela sobre os 45 dias previstos na Lei Municipal nº 681/2001. (N.U 0005256-73.2013.8.11.0037, NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 02/02/2016, Publicado no DJE 18/02/2016) [grifo nosso] Destarte, não havendo qualquer limitação constitucional ou legal quanto à incidência do terço constitucional sobre todo o período de férias anuais usufruído, correta a sentença ao reconhecer o direito dos professores ao pagamento do adicional também sobre os 15 dias adicionais, garantindo a plena aplicação da Constituição Federal e da legislação municipal vigente. 3. Da aplicação, por analogia, do IRDR n. 1002789-40.2021.8.11.0000 (Tema 4 – TJMT) aos professores municipais. Por oportuno, cumpre destacar que o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) n. 1002789-40.2021.8.11.0000 (Tema 4), julgado pela Seção de Direito Público deste egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o qual fixou a tese de que os professores da rede pública estadual, em efetivo exercício da docência, bem como os contratados em caráter temporário, têm direito ao gozo de 45 (quarenta e cinco) dias de férias e à incidência do terço constitucional sobre todo esse período. Vejamos a tese firmada naquele precedente: "Os professores integrantes da carreira dos profissionais da educação básica do Estado de Mato Grosso, que exercem as suas atividades dentro da sala de aula, e os professores contratados, em caráter temporário, fazem jus a quarenta e cinco (45) dias de férias, nos termos do artigo 54, i e § 1º, da lei complementar do Estado de Mato Grosso nº 50, de 1º de outubro de 1998, com a redação dada pela lei complementar do Estado de Mato Grosso nº 104, de 22 de janeiro de 2002. O adicional de um terço deve incidir sobre os quarenta e cinco (45) dias de férias para os professores integrantes da carreira dos profissionais da educação básica do estado de mato grosso, que exercem as suas atividades dentro da sala de aula, bem como para os professores contratados, em caráter temporário." (IRDR 4 - TJMT) No julgamento do referido tema, consignou-se que o art. 54, I e §1º, da Lei Complementar nº 50/1998 (com a redação conferida pela LC nº 104/2002) prevê expressamente o direito a 45 dias de férias anuais aos professores que atuam em sala de aula, bem como aos professores temporários, nos termos do seu art. 56. De igual forma, afastou-se o argumento de que haveria um “recesso” de 15 (quinze) dias, sem incidência do adicional de um terço, reafirmando que, dentro dos 45 dias, todo o período é considerado como férias e, portanto, remunerado com o terço constitucional. Embora o IRDR trate de situação envolvendo os professores do Estado de Mato Grosso, a fundamentação adotada no Tema 4 reforça a interpretação de que os 15 dias adicionais (fracionamento das férias em 30 + 15 dias) não podem ser considerados mero recesso para fins de afastar o pagamento do adicional de 1/3. Assim, tanto pelo princípio da simetria, quanto pela identidade de razão em sistemas jurídicos semelhantes (regime especial de magistério), o entendimento consagrado naquele precedente dá suporte ao direito dos professores municipais ao cômputo integral do terço de férias sobre os 45 dias. De igual modo, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso vem decidindo que o período total de 45 dias, sem distinção de férias (30 dias) e recesso (15 dias), deve ser considerado para fins de incidência do terço constitucional, inclusive em favor dos professores municipais, conforme se verifica dos precedentes a seguir: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA DO TERÇO CONSTITUCIONAL RETROATIVO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER – SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL – PROFESSORA – FÉRIAS DE 45 DIAS – TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE O TOTAL DAS FÉRIAS – LEI MUNICIPAL Nº 14/2015 – DISTINÇÃO DE FÉRIAS E RECESSO ESCOLAR – INOCORRÊNCIA – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. O Estatuto dos Profissionais da Educação do Município de Dom Aquino (Lei n. 14/2015) é cristalino ao conferir ao Professor o direito a 45 (quarenta e cinco) dias de férias, assim como a garantia de um terço de remuneração sobre esse período, não fazendo distinção entre férias e recesso escolar. 2. Com base nessa premissa, a base de cálculo para o pagamento do terço de férias do magistério do referido ente municipal é o período de 45 dias, previsto nos arts. 51 e 52 da Lei Municipal n. 14/2015. (N.U 0002750-94.2017.8.11.0034, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA RIBEIRO, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 23/06/2020, Publicado no DJE 09/07/2020) DIREITO ADMINISTRATIVO E TRABALHISTA. APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. PROFESSOR. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS SOBRE 45 DIAS. RECESSO ESCOLAR. INCIDÊNCIA SOBRE PERÍODO INTEGRAL. SENTENÇA REFORMADA. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta contra sentença de improcedência em ação de cobrança de terço constitucional de férias cumulada com obrigação de fazer, pleiteando o pagamento de 1/3 sobre 45 dias de férias anuais, conforme estipulado pela Lei Complementar Municipal n.º 139/2011. O Município apelado, sustentou que o adicional de férias deveria incidir apenas sobre 30 dias, alegando que os 15 dias restantes constituem recesso escolar. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se o adicional de 1/3 constitucional deve incidir sobre os 45 dias de descanso concedidos aos professores municipais, incluindo o período de recesso escolar, ou se é devido apenas sobre os 30 dias de férias. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Lei Complementar Municipal n.º 139/2011 prevê expressamente o direito dos professores municipais a 45 dias de descanso anuais, divididos entre 30 dias de férias e 15 dias de recesso escolar, garantindo o adicional de 1/3 sobre o período total. 4. O princípio da legalidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, impede o ente público de desvirtuar o comando da legislação local ao tentar diferenciar o recesso das férias para excluir parte do adicional constitucional. 5. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR - Tema 04), consolidou entendimento de que, havendo previsão legal, o terço constitucional deve incidir sobre o período integral de 45 dias de descanso dos professores. 6. A sentença limitando o adicional a 30 dias violou o direito dos servidores e contrariou o entendimento consolidado pelo TJMT em casos de demanda repetitiva. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso provido. Sentença reformada para condenar o Município de Sorriso ao pagamento do terço constitucional de férias sobre o total de 45 dias aos professores municipais, conforme Lei Complementar Municipal n.º 139/2011, incluindo as diferenças devidas nos últimos cinco anos, respeitada a prescrição quinquenal. Tese de julgamento: 1. O terço constitucional de férias dos professores municipais deve incidir sobre o total de 45 dias de descanso anual, quando previsto em lei, incluindo o período de recesso escolar. (N.U 1007365-19.2022.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 19/11/2024, Publicado no DJE 26/11/2024) Desse modo, resta consolidado nesta Corte Estadual de Justiça que, havendo previsão legal, o período integral de 45 dias, ainda que fracionado em 30 dias mais 15 dias, é integralmente considerado férias e deve ser remunerado pelo adicional constitucional de 1/3, inclusive para professores municipais. 4. Das parcelas vincendas O Sindicato, em sua apelação, requer a expressa extensão da condenação também às parcelas vincendas. Considerando que se trata de verba de trato sucessivo e que o direito ao pagamento do terço constitucional já foi reconhecido, é de rigor que a obrigação se estenda às parcelas futuras, enquanto perdurar a relação funcional dos substituídos. Outrossim, “À luz da disposição insculpida no art. 290, CPC/1973, (atual art. 323, NCPC), na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do Autor, e, por sua vez, inseridas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.” (N.U 0000220-54.2010.8.11.0005, MÁRCIO VIDAL, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 18/06/2018, Publicado no DJE 29/06/2018) 5. Dos consectários Legais A respeito dos consectários legais, apesar de não ter sido objeto de recurso, vale pontuar que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a correção monetária e os juros são matéria de ordem pública, podendo, inclusive, serem fixados de ofício. A propósito: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO DO AUTOR DA DEMANDA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. JULGAMENTO EXTRA OU ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. APLICAÇÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. TRIBUTÁRIO. ARTIGO 3º, DA LEI COMPLEMENTAR 118/2005. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. ARTIGO 4º, DA LC 118/2005. DETERMINAÇÃO DE APLICAÇÃO RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE DIFUSO. CORTE ESPECIAL. RESERVA DE PLENÁRIO. JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (RESP 1.002.932/SP). 1. A correção monetária é matéria de ordem pública, integrando o pedido de forma implícita, razão pela qual sua inclusão ex officio, pelo juiz ou tribunal, não caracteriza julgamento extra ou ultra petita, hipótese em que prescindível o princípio da congruência entre o pedido e a decisão judicial (Precedentes do STJ: AgRg no REsp 895.102/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15.10.2009, DJe 23.10.2009; REsp 1.023.763/CE, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 09.06.2009, DJe 23.06.2009; AgRg no REsp 841.942/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 13.05.2008, DJe 16.06.2008; AgRg no Ag 958.978/RJ, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, julgado em 06.05.2008, DJe 16.06.2008; EDcl no REsp 1.004.556/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 05.05.2009, DJe 15.05.2009; AgRg no Ag 1.089.985/BA, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 19.03.2009, DJe 13.04.2009; AgRg na MC 14.046/RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24.06.2008, DJe 05.08.2008; REsp 724.602/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 21.08.2007, DJ 31.08.2007; REsp 726.903/CE, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 10.04.2007, DJ 25.04.2007; e AgRg no REsp 729.068/RS, Rel. Ministro Castro Filho, Terceira Turma, julgado em 02.08.2005, DJ 05.09.2005). 2. É que: "A regra da congruência (ou correlação) entre pedido e sentença (CPC, 128 e 460) é decorrência do princípio dispositivo. Quando o juiz tiver de decidir independentemente de pedido da parte ou interessado, o que ocorre, por exemplo, com as matérias de ordem pública, não incide a regra da congruência. Isso quer significar que não haverá julgamento extra, infra ou ultra petita quando o juiz ou tribunal pronunciar-se de ofício sobre referidas matérias de ordem pública. Alguns exemplos de matérias de ordem pública: a) substanciais: cláusulas contratuais abusivas ( CDC, 1º e 51); cláusulas gerais ( CC 2035 par. ún) da função social do contrato ( CC 421), da função social da propriedade (CF art. 5º XXIII e 170 III e CC 1228, § 1º), da função social da empresa ( CF 170; CC 421 e 981) e da boa-fé objetiva ( CC 422); simulação de ato ou negócio jurídico ( CC 166, VII e 167); b) processuais: condições da ação e pressupostos processuais (CPC 3º, 267, IV e V; 267, § 3º; 301, X; 30, § 4º); incompetência absoluta ( CPC 113, § 2º); impedimento do juiz ( CPC 134 e 136); preliminares alegáveis na contestação ( CPC 301 e § 4º); pedido implícito de juros legais ( CPC 293), juros de mora ( CPC 219) e de correção monetária (L 6899/81; TRF-4a 53); juízo de admissibilidade dos recursos ( CPC 518, § 1º (...)" (Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in"Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante", 10a ed., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2007, pág. 669). 3. A correção monetária plena é mecanismo mediante o qual se empreende a recomposição da efetiva desvalorização da moeda, com o escopo de se preservar o poder aquisitivo original, sendo certo que independe de pedido expresso da parte interessada, não constituindo um plus que se acrescenta ao crédito, mas um minus que se evita. (...) 8. Recurso especial fazendário desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008”. (REsp n. 1.112.524/DF, relator Ministro Luiz Fux, Corte Especial, DJe de 30/9/2010). [grifo nosso] Nesse ponto, o Supremo Tribunal Federal, em repercussão geral (RE 870.947), reconheceu a inconstitucionalidade do artigo 1°-F da Lei n.° 9.494/97, com a redação dada pela Lei n.° 11.960/09, acerca dos juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, fixando a seguinte tese – Tema n.º 810: “1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina”. (RE 870947, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-262 DIVULG 17-11-2017 PUBLIC 20-11-2017). (Grifo nosso). Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.495.146-MG), definiu a seguinte tese – Tema n.º 905: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A INDÉBITO TRIBUTÁRIO. • TESES JURÍDICAS FIXADAS. 1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza. 1.1Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção monetária. No presente julgamento, o estabelecimento de índices que devem ser aplicados a título de correção monetária não implica pré-fixação (ou fixação apriorística) de taxa de atualização monetária. Do contrário, a decisão baseia-se em índices que, atualmente, refletem a correção monetária ocorrida no período correspondente. Nesse contexto, em relação às situações futuras, a aplicação dos índices em comento, sobretudo o INPC e o IPCA-E, é legítima enquanto tais índices sejam capazes de captar o fenômeno inflacionário. 1.2 Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão. A modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo, desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em relação aos casos em que não ocorreu expedição ou pagamento de precatório. 2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação jurídico-tributária. 3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação. 3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral. As condenações judiciais de natureza administrativa em geral, sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E. 3.1.1 Condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos. As condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos, sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês (capitalização simples); correção monetária: índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês; correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção monetária: IPCA-E. 3.1.2 Condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas. No âmbito das condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas existem regras específicas, no que concerne aos juros moratórios e compensatórios, razão pela qual não se justifica a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), nem para compensação da mora nem para remuneração do capital. 3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária. As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009). 3.3 Condenações judiciais de natureza tributária. A correção monetária e a taxa de juros de mora incidentes na repetição de indébitos tributários devem corresponder às utilizadas na cobrança de tributo pago em atraso. Não havendo disposição legal específica, os juros de mora são calculados à taxa de 1% ao mês (art. 161, § 1º, do CTN). Observada a regra isonômica e havendo previsão na legislação da entidade tributante, é legítima a utilização da taxa Selic, sendo vedada sua cumulação com quaisquer outros índices. 4. Preservação da coisa julgada. Não obstante os índices estabelecidos para atualização monetária e compensação da mora, de acordo com a natureza da condenação imposta à Fazenda Pública, cumpre ressalvar eventual coisa julgada que tenha determinado a aplicação de índices diversos, cuja constitucionalidade/legalidade há de ser aferida no caso concreto. • SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO. 5. Em se tratando de dívida de natureza tributária, não é possível a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009) – nem para atualização monetária nem para compensação da mora –, razão pela qual não se justifica a reforma do acórdão recorrido. 6. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, c/c o art. 256-N e seguintes do RISTJ”. (STJ, RECURSO ESPECIAL Nº 1.495.146 – MG, Primeira Seção, Relator: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, data do julgamento: 22/2/2018, DJe: 02/03/2018). (Grifo nosso). Contudo, recentemente houve alteração constitucional para modificar o índice de correção monetária nos casos em que a Fazenda Pública for condenada, por meio da Emenda Constitucional n.° 113/2021, que assim dispôs: “Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado”. Consequentemente, no momento do cumprimento do julgado, em atenção à alteração constitucional, os valores devem ser corrigidos em observância ao Tema n.° 810, do STF e 905, do STJ, até 08.12.2021 e, a partir de 09.12.2021, data de publicação da Emenda Constitucional n.° 113/2021, aplica-se somente a taxa Selic como fator de atualização monetária e juros de mora. Dessa forma, em sede de reexame necessário, procede-se à retificação parcial da sentença, de ofício, no tocante ao critério de atualização do débito, para determinar a aplicação exclusiva da Taxa SELIC como índice único de correção monetária e juros moratórios, a partir de 9/12/2021, mantendo-se os demais termos da condenação. DISPOSITIVO Ante o exposto, rejeito as preliminares, nego provimento ao recurso do Município de Mirassol D’Oeste e dou provimento ao recurso do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mirassol D’Oeste para determinar a inclusão expressa das parcelas vincendas na condenação, mantendo-se, no mais, a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Em sede de remessa necessária, nos termos do artigo 496, inciso I, do Código de Processo Civil, retifico parcialmente a sentença, de ofício, para determinar que, no cumprimento do julgado, sejam observados os critérios fixados nos Temas 810 do STF e 905 do STJ quanto à correção monetária e juros moratórios até 08/12/2021. A partir de 09/12/2021, em conformidade com a Emenda Constitucional nº 113/2021, a atualização do débito deverá ocorrer exclusivamente pela Taxa SELIC, aplicada de forma única tanto para correção monetária quanto para juros de mora. Mantêm-se, no mais, os demais termos da sentença. Condeno o Município de Mirassol D’Oeste ao pagamento dos honorários advocatícios sobre o proveito econômico obtido, cujo percentual deverá ser definido na fase de liquidação, conforme disposto no art. 85, § 4º, II, do Código de Processo Civil. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/04/2025
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