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Rebeka Esther Siqueira De Farias Furtado x Nu Pagamentos S.A.

ID: 306463440

Tribunal: TJCE Órgão: 3º Gabinete da 3ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0256315-82.2024.8.06.0001

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

REBEKA ESTHER SIQUEIRA DE FARIAS FURTADO

Polo Passivo:

NU PAGAMENTOS S.A.

Intimação

Advogados:

MARIA DO PERPETUO SOCORRO MAIA GOMES

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

ELIZANGELA DOS SANTOS SILVA

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Processo: 0256315-82.2024.8.06.0001 APELANTE: REBEKA ESTHER SIQUEIRA DE FARIAS FURTADO A… ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Processo: 0256315-82.2024.8.06.0001 APELANTE: REBEKA ESTHER SIQUEIRA DE FARIAS FURTADO APELADO: NU PAGAMENTOS S.A. Ementa: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. FRAUDE BANCÁRIA. TRANSFERÊNCIA VIA PIX NÃO RECONHECIDA. ATIVIDADE ATÍPICA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Apelação cível interposta por consumidora contra sentença de improcedência em ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, ajuizada em face de instituição financeira. A autora narra que, em abril de 2024, teve seu nome negativado indevidamente por conta de débito originado em duas transferências via PIX, não reconhecidas, realizadas por meio de cartão de crédito nos dias 5 e 7 de fevereiro de 2024. Apenas uma das transações foi estornada pelo banco, levando à manutenção da cobrança e à inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) determinar se houve falha na prestação do serviço bancário em decorrência da autorização de transações financeiras atípicas não reconhecidas pela autora; (ii) verificar a existência de dano moral indenizável pela inscrição indevida da autora em cadastro de inadimplentes. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A relação jurídica entre autora e instituição financeira caracteriza-se como relação de consumo, sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor e a responsabilidade objetiva da fornecedora pelos danos decorrentes de falhas na prestação do serviço. 4. A inversão do ônus da prova em desfavor da instituição financeira é admitida, dada a verossimilhança das alegações da consumidora e sua hipossuficiência técnica, conforme o art. 6º, VIII, do CDC. 5. A instituição financeira deixou de comprovar a regularidade das transações contestadas, embora tenha reconhecido a anomalia de uma delas ao efetuar o estorno, o que evidencia ausência de justificativa plausível para não estornar a outra operação, de características similares. 6. As transações foram realizadas em sequência, com valores elevados e para o mesmo destinatário, destoando do padrão de comportamento financeiro da autora, o que configura movimentações atípicas que poderiam ter sido identificadas e bloqueadas pela instituição, conforme jurisprudência consolidada do STJ (Tema 466 e Súmula 479). 7. A ausência de medidas eficazes de segurança bancária para prevenir fraudes demonstra falha na prestação do serviço, ensejando a responsabilidade da instituição. 8. A negativação do nome da autora em decorrência de débito ilegítimo configura dano moral presumido (in re ipsa), sendo indevida a manutenção de seu nome nos cadastros restritivos de crédito. 9. O valor da indenização por danos morais deve observar os critérios de razoabilidade, proporcionalidade, natureza do dano e porte econômico da ré, sendo fixado em R$ 3.000,00, conforme precedentes análogos da Corte. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: (I) A instituição financeira responde objetivamente por transações bancárias atípicas e não reconhecidas pelo consumidor, quando não demonstra a regularidade das operações e falha na adoção de mecanismos de segurança eficazes. (II) É indevida a inscrição do nome do consumidor em cadastro de inadimplentes quando decorrente de débito oriundo de fraude não solucionada pelo fornecedor. (III) O dano moral decorrente de negativação indevida configura-se in re ipsa e independe de comprovação do abalo sofrido. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, VIII, 14 e 3º; CPC, art. 373, II; CC, arts. 389, 398 e 406, § 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas nº 297, 362, 385 e 479; STJ, Tema 466; STJ, REsp nº 2.052.228/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 12.09.2023, DJe 15.09.2023; STJ, REsp nº 1.152.541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.09.2011. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 3ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso para, no mérito, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação interposto por Rebeka Esther Siqueira de Farias Furtado contra a sentença proferida pelo Juízo da 21ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE (ID 19657711), que, nos autos de ação de obrigação de fazer manejada pela apelante em desfavor de Nu Pagamento S.A, julgou improcedente o feito. Na exordial, em resumo, a autora relata que, em 26 de abril de 2024, foi surpreendida com a inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes em razão de um débito desconhecido junto à instituição financeira ré. Ao contatar o banco, identificou uma dívida referente a dois pagamentos PIX realizados via cartão de crédito: um no valor de R$ 6.261,88, efetuado em 5 de fevereiro, e outro de R$ 6.206,00, realizado em 7 de fevereiro, ambos destinados ao mesmo beneficiário. Apesar do estorno do segundo PIX, o primeiro permaneceu pendente, gerando cobranças de encargos e a subsequente negativação do nome da consumidora. Em sede de tutela de urgência, a autora pleiteia a intimação do requerido para que proceda à imediata exclusão de seu nome dos cadastros de inadimplentes, mantendo-se essa medida até o julgamento final da presente demanda. No mérito, requer a restituição integral do valor pago através do cartão de crédito, cumulada com a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, no montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Contestação (ID 19657691), em que a empresa ré, inicialmente, rebate a concessão de justiça gratuita à autora. No ponto mérito, alegou que a transação em questão foi realizada mediante a utilização da senha pessoal da autora e por meio de um dispositivo previamente autorizado, afastando qualquer irregularidade no processo. Sustentou, ainda, a inexistência de conduta ilícita que justificasse eventual indenização por danos morais, razão pela qual requereu a improcedência dos pedidos formulados pela autora na ação. Réplica (ID 19657698). Sobreveio a sentença (ID 19657711), julgando improcedente o feito, nos seguintes termos: "Isto posto, extinguindo o feito, com resolução de mérito, com fulcro no art. 490, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos iniciais. Condeno a autora no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, ficando, entretanto, sobrestadas as suas exigibilidades, por até cinco anos, nos termos do § 3.º, do artigo 98 do CPC, por ser aquele beneficiário da gratuidade judiciária." Irresignada, a parte autora, em face da sentença desfavorável, interpôs recurso voluntário (ID 19657713), alegando que as duas transações realizadas via PIX, nos valores de R$ 6.261,88 e R$ 6.206,00, não foram autorizadas por ela. Ao tomar conhecimento das cobranças, entrou em contato com a instituição financeira, a qual estornou apenas uma das transações, restando uma dívida pendente que resultou na negativação do seu nome. A autora sustentou que houve falha na segurança da plataforma do banco, considerando-se vulnerabilidades e possíveis fraudes que poderiam ser exploradas por terceiros. Invocou o entendimento jurisprudencial e doutrinário de que as instituições financeiras possuem responsabilidade objetiva por fraudes e delitos ocorridos em seus serviços, conforme o Código de Defesa do Consumidor (art. 14) e a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ao final, requereu a reforma da sentença, solicitando a restituição integral do valor cobrado indevidamente em seu cartão de crédito e a condenação do banco ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 15.000,00, de modo a atender ao caráter pedagógico, punitivo e reparatório. Contrarrazões (ID 19657718). É o relatório. Decido. VOTO Recurso que preenche os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão por que o admito e passo à análise de seus fundamentos. O ponto central da controvérsia no presente caso consiste em verificar a regularidade das transferências bancárias realizadas da conta da autora via cartão de crédito, operações que ela alega não ter autorizado, bem como analisar os fundamentos da responsabilidade civil atribuída à instituição financeira em decorrência desses eventos. A relação estabelecida entre o banco e a empresa correntista configura uma relação de consumo nos termos do Código de Defesa do Consumidor, ainda que envolvendo pessoa jurídica. Isso porque a instituição financeira atua de forma profissional e habitual na oferta de serviços bancários massificados, enquadrando-se na definição de fornecedor prevista no art. 3º do CDC. Em se tratando de ação baseada em uma relação de consumo, é aplicável ao caso a Lei n. 8.078/1990 e a Súmula nº. 297 do STJ, quanto à responsabilidade civil objetiva, baseada na teoria do risco, independentemente de culpa, e aplicação da inversão do ônus da prova em face da instituição financeira promovida, ainda mais quando o objeto da lide discute a inexistência ou nulidade de negócios jurídicos relacionados a contratos bancários, em que deve ser imputado à instituição financeira a juntada dos documentos que comprovem a contratação do serviço pelo consumidor, pois, em decorrência da atividade desempenhada, devem ser obrigatoriamente por ela mantidos. Por sua vez, o art. 14 do CDC atribui a responsabilidade objetiva ao fornecedor, pela reparação de danos causados aos consumidores por vícios relativos à prestação de serviços. Senão vejamos: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Nesse contexto, o art. 6º, VIII, do CDC, assegura a facilitação da defesa dos direitos do consumidor mediante a inversão do ônus da prova, in verbis: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; Assim, cabível a inversão do ônus probante em desfavor da instituição bancária, como medida adequada às ações deste tipo, porque, considerando a impossibilidade de a parte autora constituir prova negativa, compete ao banco trazer aos autos documentos hábeis a demonstrar a regularidade das transferências contestadas na exordial, nos termos do art. 373, inciso II, do CPC, c/c art. 14, § 3º, e incisos, do CDC. Os registros processuais indicam que, nos dias 5 e 7 de fevereiro de 2024, foram realizadas duas transações financeiras atípicas na conta da autora para a mesma conta, nos valores de R$ 6.261,88 e R$ 6.206,00, respectivamente, utilizando o cartão de crédito como forma de pagamento. Em data posterior, precisamente em 26 de abril de 2024, a autora foi informada da inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes em decorrência de duas transferências que alega desconhecer. Diante disso, contatou o banco réu, o qual efetuou o estorno da segunda transferência, no entanto, a cobrança da primeira transferência, acrescida de seus encargos legais, persistiu. Dos elementos probatórios constantes nos autos, emerge como fato incontroverso que a parte autora não efetuou as transferências em questão. Tal reconhecimento, inclusive, motivou o estorno do segundo PIX por parte da instituição financeira. Diante desse quadro, não se identifica qualquer distinção relevante entre as duas transações, dada a proximidade temporal, a semelhança dos valores e o mesmo destinatário bancário. Consequentemente, não se vislumbra justificativa plausível para o estorno de apenas uma das transferências. Ademais, torna-se evidente que a instituição financeira não implementou salvaguardas preventivas eficazes para obstar a efetivação das mencionadas operações, considerando que a autora nunca havia utilizado tal modalidade de serviço anteriormente, tampouco o fez posteriormente, restringindo-se o histórico a essas duas únicas transferências realizadas via cartão de crédito. Tal omissão representa uma falha manifesta no sistema de segurança da ré. Como resultado, foram autorizadas diversas transações atípicas sequenciais que, analisadas em conjunto, demonstram uma atividade financeira incompatível com a habitualidade do correntista. A responsabilidade do banco decorre do seu dever de impedir movimentações fraudulentas, especialmente quando as operações realizadas são suspeitas ou fogem completamente ao perfil habitual do consumidor. Mesmo que se levante a hipótese das transferências terem sido realizadas pela autora, é fundamental observar que esta contestou as transações imediatamente após ser notificado pelo banco. Além disso, as operações envolviam valores expressivos e incompatíveis com o padrão demonstrado nos autos, o que evidencia a ineficácia dos mecanismos de segurança da instituição. Portanto, é patente a falha na prestação dos serviços bancários, sobretudo no aspecto da segurança. Considerando o risco inerente à atividade, é incumbência do fornecedor adotar medidas eficazes para prevenir que seus clientes sejam lesados por fraudes. Sobre o tema, é pacífico o entendimento de que as instituições bancárias têm responsabilidade objetiva pelos danos oriundos de fraudes ou delitos cometidos por terceiros, pois isso decorre do risco inerente à atividade (fortuito interno), conforme Súmula 479 e Tema 466 do STJ. Nessa sequência, vale citar trecho de decisão proferida pelo STJ, com perfeita aplicação ao caso concreto: "[...] Veja-se que, nas fraudes e nos golpes de engenharia social, geralmente são efetuadas diversas operações em sequência, num curto intervalo de tempo e em valores elevados. Em razão desta combinação de fatores, as transações feitas por criminosos destoam completamente do perfil do consumidor e, portanto, podem e devem ser identificadas pelos bancos.10. A vulnerabilidade do sistema bancário, portanto, viola o dever de segurança que cabe às instituições financeiras e, por conseguinte, acarreta falha da prestação de serviço. E é precisamente esta falha que permite que o golpe sofrido pela vítima provoque prejuízos financeiros. 11. No ponto, não há que se argumentar que o desenvolvimento de mecanismos impeditivos de movimentações financeiras atípicas e que aparentem ilegalidade está desassociada da atividade bancária. Em verdade, somente as instituições financeiras detêm os meios adequados para recusar estas transações atípicas, uma vez que elas devem ser comparadas com o histórico do consumidor no que tange a valores, frequência e objeto. 12. Evidente, portanto, que a conduta das instituições financeiras de se manter inerte perante a ocorrência de diversas transações atípicas em poucos minutos concorre para permitir os golpes aplicados em seus correntistas. Assim, o nexo causal é estabelecido ao se concluir que poderia a instituição financeira ter evitado o dano sofrido em decorrência dos golpes, caso adotasse medidas de segurança mais eficazes.[...]" (STJ - REsp n. 2.052.228/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 12/9/2023, DJe de 15/9/2023) Portanto, fica devidamente caracterizada a responsabilidade civil da instituição bancária, principalmente pela falha na prestação do serviço de segurança, que possibilitou as transferências de valores da conta bancária da autora sem a devida prevenção. No que tange a inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito enseja, por si só, a configuração de dano moral (IN RE IPSA), sendo a respectiva condenação dispensável somente em casos de preexistente anotação lícita, assim como determina a súmula nº 385 do STJ, in verbis: "Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento." O dano moral, portanto, será devido quando o ato lesivo praticado atingir a integridade psíquica, o bem-estar íntimo, a honra do indivíduo, de modo que sua reparação, por meio de uma soma pecuniária, possibilite ao lesado uma satisfação compensatória dos dissabores sofridos, como ocorre no caso em tela. No que tange à fixação do quantum indenizatório, deve o magistrado se ater aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, em observância às circunstâncias em que o ato ilícito foi cometido, às consequências da ofensa ao lesado, o grau de culpa do ofensor, à eventual contribuição do ofendido em relação ao evento danoso e à situação econômica das partes. Como forma de definir o montante das indenizações por danos morais, o STJ tem trilhado o caminho do critério bifásico de fixação dos danos extrapatrimoniais: "Na primeira etapa, deve-se estabelecer um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes jurisprudenciais que apreciaram casos semelhantes. (...) Na segunda etapa, devem ser consideradas as peculiaridades do caso concreto, para fixação definitiva do valor da indenização, atendendo a determinação legal de arbitramento equitativo pelo juiz" (REsp nº 1.152.541/RS, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 13.09.2011). A reparação do dano moral cumpre, portanto, uma função de justiça corretiva ou sinalagmática, por conjugar, de uma só vez, a natureza satisfatória da indenização do dano moral para o lesado, tendo em vista o bem jurídico danificado, sua posição social, a repercussão do agravo em sua vida privada e social, e a natureza penal da reparação para o causador do dano, atendendo a sua situação econômica, a sua intenção de lesar (dolo ou culpa), a sua imputabilidade, etc. (MARIA HELENA DINIZ, Indenização por dano moral, Consulex, 1997, n. 3). Se não for possível, assim, fixar a indenização a partir dos critérios consagrados na jurisprudência, segundo os quais a quantia arbitrada pelo julgador possa ser idônea para, ao mesmo tempo, punir o agente, demovendo-o de reincidir na conduta danosa, e compensar a vítima pelo mal experimentado, sem enriquecê-la, é recomendável ao julgador, data vênia, fixar um valor a princípio expressivo, já que, valendo-se do princípio da razoabilidade, é inevitável concluir que a vocação punitiva da indenização do dano moral tem notória prevalência sobre a lenitiva. A capacidade econômica das partes também pesa pois quando é pessoa jurídica com grande poder econômico o valor da indenização deve ser, necessariamente, considerável, a fim de satisfazer, prevalentemente, a sua função punitiva. Realmente, o arbitramento da indenização moral não deve ser ínfimo tampouco excessivo e, somente, nestas 2 (duas) hipóteses, se divisa a autorização para o redimensionamento pela Corte. Dessarte, no que tange ao quantum indenizatório fixado, em observância ao que vêm sendo decidido por esta corte de segunda instância em casos semelhantes e, por se tratar a promovida de uma instituição de grande porte, entendo, em verdade, que a quantia fixada em sentença se encontra abaixo do padrão de condenações desta Corte para casos semelhantes, que gira em torno de R$ 3.000,00 (três mil reais). Corroborando o exposto colaciono julgados: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. CONTRATO BANCÁRIO. PESSOA ANALFABETA. EMPRÉSTIMO NÃO COMPROVADO. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL IN RE IPSA. VALOR INDENIZATÓRIO MANTIDO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. RECURSOS DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME Apelações cíveis interpostas em ação declaratória de inexistência de relação jurídica cumulada com indenização por danos morais e repetição de indébito. A autora, pessoa analfabeta, alegou nunca ter contratado empréstimo com o banco e requereu a exclusão de seu nome dos cadastros restritivos de crédito, bem como reparação moral e material. O juízo de origem julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo a inexistência da relação contratual, determinando a exclusão do nome da autora dos cadastros de inadimplentes e fixando indenização por danos morais em R$ 3.000,00, indeferindo, contudo, o pedido de repetição de indébito e compensação de valores. Há sete questões em discussão: (i) necessidade de sobrestamento do feito em razão do Tema 929/STJ; (ii) regularidade da relação contratual entre as partes; (iii) legitimidade da inscrição do nome da autora nos cadastros de inadimplentes; (iv) ocorrência de danos morais indenizáveis; (v) adequação do valor da indenização arbitrada; (vi) possibilidade ou não de compensação dos valores entre a indenização fixada e o montante supostamente recebido pela autora; e (vii) termo inicial dos juros moratórios sobre a indenização. A suspensão do feito com base no Tema 929/STJ não é cabível na fase de apelação, pois, conforme informações do STJ, a ordem de suspensão somente se impõe após a interposição de recurso especial ou agravo em recurso especial. A instituição financeira não comprovou a existência e validade do contrato que deu origem à negativação, apresentando instrumento diverso quanto à instituição e número (PAN/nº 306366036-3), o que evidencia a inexistência da relação jurídica alegada. Em se tratando de pessoa analfabeta, o contrato deve obedecer às formalidades legais do art. 595 do CC/2002, com assinatura a rogo e assinatura de duas testemunhas, formalidades não observadas no caso concreto. Configurada a falha na prestação do serviço, aplica-se a responsabilidade objetiva da instituição financeira, nos termos do art. 14 do CDC e da Súmula 479 do STJ. A negativação indevida do nome do consumidor enseja dano moral presumido (in re ipsa), conforme jurisprudência consolidada do STJ, sendo desnecessária a demonstração do prejuízo concreto. O valor da indenização por dano moral, arbitrado em R$ 3.000,00, encontra-se em conformidade com os parâmetros adotados pela jurisprudência da Câmara julgadora, revelando-se proporcional, razoável e suficiente para cumprir sua função compensatória e pedagógica. A alegação de compensação de valores não prospera, pois não restou comprovado vínculo entre o valor transferido à autora e o contrato que deu ensejo à negativação. Os juros moratórios devem incidir desde o evento danoso, por se tratar de responsabilidade extracontratual, conforme a Súmula 54 do STJ e o art. 398 do CC. Recursos desprovidos. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 98, §1º, VIII; CC/2002, arts. 398, 595, 166, 168, parágrafo único; CDC, arts. 14 e 42, parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.197.929/PR (Tema 466), Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção, j. 24.10.2012; STJ, Súmulas 54, 297 e 479; STJ, REsp 1.152.541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.09.2011; STJ, REsp 1.868.099/CE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 15.12.2020; TJCE, Apelação Cível 0007069-38.2017.8.06.0166, Rel. Des. Emanuel Leite Albuquerque, j. 16.10.2024; TJCE, Apelação Cível 0200644-49.2023.8.06.0053, Rel. Desa. Maria Regina Oliveira Camara, j. 16.10.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer dos recursos para, no mérito, negar-lhes provimento nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data da assinatura digital. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA Relator (Apelação Cível - 0201142-64.2024.8.06.0101, Rel. Desembargador(a) CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 16/04/2025, data da publicação: 16/04/2025) APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. AUSÊNCIA DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO AO CONSUMIDOR. ART. 43, § 2º, DO CDC. RESPONSABILIDADE CIVIL. PREJUÍZO IMATERIAL IN RE IPSA. MANUTENÇÃO DO VALOR FIXADO NA ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de Apelação Cível interposta por Boa Vista Serviços S.A, visando reformar a sentença proferida pelo juízo da 39ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza, que, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c danos morais n° 0211282-06.2023.8.06.0001, proposta por Marlúcia Maria Alves de Mesquita, julgou procedentes os pedidos exordiais. 2. A exigibilidade de eventual crédito, ainda que comprovada, não torna lícita, por si só, a inscrição do nome do autor em cadastro restritivo. É necessário que o lançamento observe as normas procedimentais previstas em lei, entre as quais está a que impõe a prévia notificação do devedor, com mínima antecedência de dez dias, conforme art. 43, § 2º, do CDC. 3. Dispõe o enunciado n° 359 da Súmula do STJ que: ¿Cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição.¿ Nesse sentido, a responsabilidade solidária da recorrente decorre do disposto no artigo 7º, parágrafo único, do CDC: "tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo" 4. Já decidiu a Corte Cidadã que a notificação por e-mail não cumpre a finalidade de comunicar o usuário quanto ao iminente registro do seu nome nos registros de proteção ao crédito. Some-se a isso, com base nos documentos colacionados aos autos, que inexiste comprovação de entrega da correspondência pela via postal. 5. Portanto, existente a inscrição indevida no cadastro de inadimplentes, sem a prévia informação à apelada, há ocorrência de dano que prescinde de comprovação, conceituado como ¿in re ipsa¿. 6. No que lhe concerne, a estipulação do valor indenizatório deve levar considerar não só as condições pessoais do ofensor e da vítima, mas também os motivos, consequências e demais elementos que permeiam o evento e seus reflexos, evitando o enriquecimento desmedido e sem causa da vítima, mas visando impedir e inibir a novas condutas similares. 7. Dessarte, atento às peculiaridades do caso e ao caráter pedagógico da indenização, tem-se que a quantia fixada em primeira instância a título de danos morais, qual seja, R$ 3.000,00 (três mil reais) é proporcional, razoável e condiz com o parâmetro estabelecido por esta Corte de Justiça em situações homogêneas. Portanto, não há que se falar em reforma da sentença. 8. Recurso conhecido e não provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº. 0211282-06.2023.8.06.0001, ACORDAM os Desembargadores membros da 4ª Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer da apelação e negar-lhe provimento, nos termos do voto do Eminente Relator, parte integrante deste. Fortaleza, . DESEMBARGADOR JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Relator (Apelação Cível - 0211282-06.2023.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) JOSE EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO, 4ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 04/06/2024, data da publicação: 04/06/2024) RECURSO INTERNO EM APELO. CONHECIMENTO PARCIAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA CONFIRMADA. MANUTENÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO DE CRÉDITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS (SÚMULA 548/STJ). INSCRIÇÃO PREEXISTENTE LEGÍTIMA NÃO VERIFICADA (SÚMULA N. 385/STJ). DANOS MORAIS MANTIDOS (R$ 3.000,00). RECURSO DESPROVIDO NA PARCELA CONHECIDA. 1. Não compete à agravante discutir se correta ou não a inscrição feita, pois desde a origem o juiz singular já declarou que aquela inserção do nome da parte agravada no cadastro de inadimplentes é legítima. A problemática aqui reside na manutenção da inscrição, mesmo após a quitação do débito pela recorrida. 2. O veredicto destes autos está alinhado com o enunciado da Súmula 548 do STJ: "Incumbe ao credor a exclusão do registro da dívida em nome do devedor no cadastro de inadimplentes no prazo de cinco dias úteis, a partir do integral e efetivo pagamento do débito". 3. Considerando que in casu o pagamento da dívida deu-se em 2008, e até o ajuizamento da ação, no ano de 2010, a restrição permanecia, por certo, a recorrente incorreu em um ilícito civil ensejador de danos morais in re ipsa, não havendo, no mais, inscrição anterior legítima à debatido nos autos, ao ponto de atrair a incidência da Súmula n. 385 do STJ. 4. RECURSO CONHECIDO, EM PARTE, E DESPROVIDO. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em unanimidade de votos, por conhecer em parte e desprover o recurso. Fortaleza, 25 de maio de 2022 HERÁCLITO VIEIRA DE SOUSA NETO Presidente do Órgão Julgador (Agravo Interno Cível - 0471120-47.2010.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 25/05/2022, data da publicação: 26/05/2022) APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. ÚLTIMO PAGAMENTO REALIZADO. INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. NEGLIGÊNCIA DO APELANTE EM NÃO INFORMAR A SERASA DO ADIMPLEMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PROVA DO DANO MORAL DESNECESSÁRIA. DANO MORAL PRESUMIDO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO, DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1.Configura-se a negligência da empresa recorrente que, em vez de se certificar se a recorrida havia pago a última parcela do contrato de financiamento, preferiu inscrever seu nome no cadastro de inadimplentes do SPC e não proceder mesmo após 08(oito) meses do pagamento com a retirada do nome da mesma do rol dos inadimplentes, razão que torna abusivo tal procedimento, surgindo, assim, o dever de indenizar; 2. O dano moral configura-se in re ipsa, nos casos de inscrição irregular em órgãos de proteção ao crédito, isto é, prescinde de prova; 3.In casu, observa-se que o valor da indenização fixado pelo Juízo a quo em R$ 3.000,00 (Três mil reais), em razão de inscrição indevida do nome da apelada no SPC, encontra-se dentro do padrão da razoabilidade e proporcionalidade, correta a sentença de primeiro grau que condenou o Banco Minas Gerais ao pagamento de indenização por danos morais. 4.Condenação em honorários de 15% para o Apelante condenado. 5.Os juros moratórios fixados em 1% (hum por cento) incidirão a partir da data da citação. 6.Recurso de Apelação conhecido e desprovido, sentença confirmada. (Apelação Cível - N/A, Rel. Desembargador(a) FRANCISCO SUENON BASTOS MOTA, 5ª Câmara Cível, data do julgamento: N/A, data da publicação: N/A) Assim, utilizando as premissas anteriormente citadas e considerando os precedentes desta Corte para situações semelhantes, infere-se que o quantum, na realidade, deve ser majorado para R$ 3.000,00 (três mil reais), uma vez que razoável e proporcional para compensar o dano sofrido, além de atender o caráter pedagógico da medida a efeito de permitir reflexão do réu sobre a necessidade de atentar para critério de organização e métodos no sentido de evitar condutas lesivas aos interesses dos consumidores. Quanto ao pedido de restituição de valores pagos à título de cartão de crédito, verifica-se que os autos não contêm comprovantes de pagamento efetivo relativos à cobrança questionada. Diante da ausência de demonstração concreta do desembolso, rejeito tal pretensão. ISSO POSTO, conheço do presente recurso e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, reformando a sentença de primeira instância para: a) Determinar a desconstituição do débito objeto da lide e a nulidade das negativações realizadas pelo Suplicado no CPF da Autora. b) Condenar o banco recorrido ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescido de correção monetária pelo IPCA a partir da data do arbitramento (STJ, Súmula nº 362; CC, art. 389, parágrafo único), e de juros moratórios, contados desde a data do evento danoso, à taxa de 1% ao mês até a véspera da vigência da Lei nº 14.905/2024 e, a partir de então, à taxa correspondente à diferença entre a Selic e o IPCA (CC, arts. 398 e 406, § 1º; STJ, Súmula nº 54); Em virtude do parcial provimento do recurso, determino a inversão dos honorários advocatícios e das custas processuais, com a ressalva de que a base de cálculo dos honorários deverá recair exclusivamente sobre o valor da condenação. É como voto. Fortaleza (CE), data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Relator

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Rebeka Esther Siqueira De Farias Furtado x Nu Pagamentos S.A.

ID: 306463470

Tribunal: TJCE Órgão: 3º Gabinete da 3ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0256315-82.2024.8.06.0001

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

REBEKA ESTHER SIQUEIRA DE FARIAS FURTADO

Polo Passivo:

NU PAGAMENTOS S.A.

Intimação

Advogados:

MARIA DO PERPETUO SOCORRO MAIA GOMES

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

ELIZANGELA DOS SANTOS SILVA

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Processo: 0256315-82.2024.8.06.0001 APELANTE: REBEKA ESTHER SIQUEIRA DE FARIAS FURTADO A… ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Processo: 0256315-82.2024.8.06.0001 APELANTE: REBEKA ESTHER SIQUEIRA DE FARIAS FURTADO APELADO: NU PAGAMENTOS S.A. Ementa: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. FRAUDE BANCÁRIA. TRANSFERÊNCIA VIA PIX NÃO RECONHECIDA. ATIVIDADE ATÍPICA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Apelação cível interposta por consumidora contra sentença de improcedência em ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, ajuizada em face de instituição financeira. A autora narra que, em abril de 2024, teve seu nome negativado indevidamente por conta de débito originado em duas transferências via PIX, não reconhecidas, realizadas por meio de cartão de crédito nos dias 5 e 7 de fevereiro de 2024. Apenas uma das transações foi estornada pelo banco, levando à manutenção da cobrança e à inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) determinar se houve falha na prestação do serviço bancário em decorrência da autorização de transações financeiras atípicas não reconhecidas pela autora; (ii) verificar a existência de dano moral indenizável pela inscrição indevida da autora em cadastro de inadimplentes. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A relação jurídica entre autora e instituição financeira caracteriza-se como relação de consumo, sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor e a responsabilidade objetiva da fornecedora pelos danos decorrentes de falhas na prestação do serviço. 4. A inversão do ônus da prova em desfavor da instituição financeira é admitida, dada a verossimilhança das alegações da consumidora e sua hipossuficiência técnica, conforme o art. 6º, VIII, do CDC. 5. A instituição financeira deixou de comprovar a regularidade das transações contestadas, embora tenha reconhecido a anomalia de uma delas ao efetuar o estorno, o que evidencia ausência de justificativa plausível para não estornar a outra operação, de características similares. 6. As transações foram realizadas em sequência, com valores elevados e para o mesmo destinatário, destoando do padrão de comportamento financeiro da autora, o que configura movimentações atípicas que poderiam ter sido identificadas e bloqueadas pela instituição, conforme jurisprudência consolidada do STJ (Tema 466 e Súmula 479). 7. A ausência de medidas eficazes de segurança bancária para prevenir fraudes demonstra falha na prestação do serviço, ensejando a responsabilidade da instituição. 8. A negativação do nome da autora em decorrência de débito ilegítimo configura dano moral presumido (in re ipsa), sendo indevida a manutenção de seu nome nos cadastros restritivos de crédito. 9. O valor da indenização por danos morais deve observar os critérios de razoabilidade, proporcionalidade, natureza do dano e porte econômico da ré, sendo fixado em R$ 3.000,00, conforme precedentes análogos da Corte. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: (I) A instituição financeira responde objetivamente por transações bancárias atípicas e não reconhecidas pelo consumidor, quando não demonstra a regularidade das operações e falha na adoção de mecanismos de segurança eficazes. (II) É indevida a inscrição do nome do consumidor em cadastro de inadimplentes quando decorrente de débito oriundo de fraude não solucionada pelo fornecedor. (III) O dano moral decorrente de negativação indevida configura-se in re ipsa e independe de comprovação do abalo sofrido. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, VIII, 14 e 3º; CPC, art. 373, II; CC, arts. 389, 398 e 406, § 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas nº 297, 362, 385 e 479; STJ, Tema 466; STJ, REsp nº 2.052.228/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 12.09.2023, DJe 15.09.2023; STJ, REsp nº 1.152.541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.09.2011. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 3ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso para, no mérito, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação interposto por Rebeka Esther Siqueira de Farias Furtado contra a sentença proferida pelo Juízo da 21ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE (ID 19657711), que, nos autos de ação de obrigação de fazer manejada pela apelante em desfavor de Nu Pagamento S.A, julgou improcedente o feito. Na exordial, em resumo, a autora relata que, em 26 de abril de 2024, foi surpreendida com a inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes em razão de um débito desconhecido junto à instituição financeira ré. Ao contatar o banco, identificou uma dívida referente a dois pagamentos PIX realizados via cartão de crédito: um no valor de R$ 6.261,88, efetuado em 5 de fevereiro, e outro de R$ 6.206,00, realizado em 7 de fevereiro, ambos destinados ao mesmo beneficiário. Apesar do estorno do segundo PIX, o primeiro permaneceu pendente, gerando cobranças de encargos e a subsequente negativação do nome da consumidora. Em sede de tutela de urgência, a autora pleiteia a intimação do requerido para que proceda à imediata exclusão de seu nome dos cadastros de inadimplentes, mantendo-se essa medida até o julgamento final da presente demanda. No mérito, requer a restituição integral do valor pago através do cartão de crédito, cumulada com a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, no montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Contestação (ID 19657691), em que a empresa ré, inicialmente, rebate a concessão de justiça gratuita à autora. No ponto mérito, alegou que a transação em questão foi realizada mediante a utilização da senha pessoal da autora e por meio de um dispositivo previamente autorizado, afastando qualquer irregularidade no processo. Sustentou, ainda, a inexistência de conduta ilícita que justificasse eventual indenização por danos morais, razão pela qual requereu a improcedência dos pedidos formulados pela autora na ação. Réplica (ID 19657698). Sobreveio a sentença (ID 19657711), julgando improcedente o feito, nos seguintes termos: "Isto posto, extinguindo o feito, com resolução de mérito, com fulcro no art. 490, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos iniciais. Condeno a autora no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, ficando, entretanto, sobrestadas as suas exigibilidades, por até cinco anos, nos termos do § 3.º, do artigo 98 do CPC, por ser aquele beneficiário da gratuidade judiciária." Irresignada, a parte autora, em face da sentença desfavorável, interpôs recurso voluntário (ID 19657713), alegando que as duas transações realizadas via PIX, nos valores de R$ 6.261,88 e R$ 6.206,00, não foram autorizadas por ela. Ao tomar conhecimento das cobranças, entrou em contato com a instituição financeira, a qual estornou apenas uma das transações, restando uma dívida pendente que resultou na negativação do seu nome. A autora sustentou que houve falha na segurança da plataforma do banco, considerando-se vulnerabilidades e possíveis fraudes que poderiam ser exploradas por terceiros. Invocou o entendimento jurisprudencial e doutrinário de que as instituições financeiras possuem responsabilidade objetiva por fraudes e delitos ocorridos em seus serviços, conforme o Código de Defesa do Consumidor (art. 14) e a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ao final, requereu a reforma da sentença, solicitando a restituição integral do valor cobrado indevidamente em seu cartão de crédito e a condenação do banco ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 15.000,00, de modo a atender ao caráter pedagógico, punitivo e reparatório. Contrarrazões (ID 19657718). É o relatório. Decido. VOTO Recurso que preenche os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão por que o admito e passo à análise de seus fundamentos. O ponto central da controvérsia no presente caso consiste em verificar a regularidade das transferências bancárias realizadas da conta da autora via cartão de crédito, operações que ela alega não ter autorizado, bem como analisar os fundamentos da responsabilidade civil atribuída à instituição financeira em decorrência desses eventos. A relação estabelecida entre o banco e a empresa correntista configura uma relação de consumo nos termos do Código de Defesa do Consumidor, ainda que envolvendo pessoa jurídica. Isso porque a instituição financeira atua de forma profissional e habitual na oferta de serviços bancários massificados, enquadrando-se na definição de fornecedor prevista no art. 3º do CDC. Em se tratando de ação baseada em uma relação de consumo, é aplicável ao caso a Lei n. 8.078/1990 e a Súmula nº. 297 do STJ, quanto à responsabilidade civil objetiva, baseada na teoria do risco, independentemente de culpa, e aplicação da inversão do ônus da prova em face da instituição financeira promovida, ainda mais quando o objeto da lide discute a inexistência ou nulidade de negócios jurídicos relacionados a contratos bancários, em que deve ser imputado à instituição financeira a juntada dos documentos que comprovem a contratação do serviço pelo consumidor, pois, em decorrência da atividade desempenhada, devem ser obrigatoriamente por ela mantidos. Por sua vez, o art. 14 do CDC atribui a responsabilidade objetiva ao fornecedor, pela reparação de danos causados aos consumidores por vícios relativos à prestação de serviços. Senão vejamos: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Nesse contexto, o art. 6º, VIII, do CDC, assegura a facilitação da defesa dos direitos do consumidor mediante a inversão do ônus da prova, in verbis: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; Assim, cabível a inversão do ônus probante em desfavor da instituição bancária, como medida adequada às ações deste tipo, porque, considerando a impossibilidade de a parte autora constituir prova negativa, compete ao banco trazer aos autos documentos hábeis a demonstrar a regularidade das transferências contestadas na exordial, nos termos do art. 373, inciso II, do CPC, c/c art. 14, § 3º, e incisos, do CDC. Os registros processuais indicam que, nos dias 5 e 7 de fevereiro de 2024, foram realizadas duas transações financeiras atípicas na conta da autora para a mesma conta, nos valores de R$ 6.261,88 e R$ 6.206,00, respectivamente, utilizando o cartão de crédito como forma de pagamento. Em data posterior, precisamente em 26 de abril de 2024, a autora foi informada da inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes em decorrência de duas transferências que alega desconhecer. Diante disso, contatou o banco réu, o qual efetuou o estorno da segunda transferência, no entanto, a cobrança da primeira transferência, acrescida de seus encargos legais, persistiu. Dos elementos probatórios constantes nos autos, emerge como fato incontroverso que a parte autora não efetuou as transferências em questão. Tal reconhecimento, inclusive, motivou o estorno do segundo PIX por parte da instituição financeira. Diante desse quadro, não se identifica qualquer distinção relevante entre as duas transações, dada a proximidade temporal, a semelhança dos valores e o mesmo destinatário bancário. Consequentemente, não se vislumbra justificativa plausível para o estorno de apenas uma das transferências. Ademais, torna-se evidente que a instituição financeira não implementou salvaguardas preventivas eficazes para obstar a efetivação das mencionadas operações, considerando que a autora nunca havia utilizado tal modalidade de serviço anteriormente, tampouco o fez posteriormente, restringindo-se o histórico a essas duas únicas transferências realizadas via cartão de crédito. Tal omissão representa uma falha manifesta no sistema de segurança da ré. Como resultado, foram autorizadas diversas transações atípicas sequenciais que, analisadas em conjunto, demonstram uma atividade financeira incompatível com a habitualidade do correntista. A responsabilidade do banco decorre do seu dever de impedir movimentações fraudulentas, especialmente quando as operações realizadas são suspeitas ou fogem completamente ao perfil habitual do consumidor. Mesmo que se levante a hipótese das transferências terem sido realizadas pela autora, é fundamental observar que esta contestou as transações imediatamente após ser notificado pelo banco. Além disso, as operações envolviam valores expressivos e incompatíveis com o padrão demonstrado nos autos, o que evidencia a ineficácia dos mecanismos de segurança da instituição. Portanto, é patente a falha na prestação dos serviços bancários, sobretudo no aspecto da segurança. Considerando o risco inerente à atividade, é incumbência do fornecedor adotar medidas eficazes para prevenir que seus clientes sejam lesados por fraudes. Sobre o tema, é pacífico o entendimento de que as instituições bancárias têm responsabilidade objetiva pelos danos oriundos de fraudes ou delitos cometidos por terceiros, pois isso decorre do risco inerente à atividade (fortuito interno), conforme Súmula 479 e Tema 466 do STJ. Nessa sequência, vale citar trecho de decisão proferida pelo STJ, com perfeita aplicação ao caso concreto: "[...] Veja-se que, nas fraudes e nos golpes de engenharia social, geralmente são efetuadas diversas operações em sequência, num curto intervalo de tempo e em valores elevados. Em razão desta combinação de fatores, as transações feitas por criminosos destoam completamente do perfil do consumidor e, portanto, podem e devem ser identificadas pelos bancos.10. A vulnerabilidade do sistema bancário, portanto, viola o dever de segurança que cabe às instituições financeiras e, por conseguinte, acarreta falha da prestação de serviço. E é precisamente esta falha que permite que o golpe sofrido pela vítima provoque prejuízos financeiros. 11. No ponto, não há que se argumentar que o desenvolvimento de mecanismos impeditivos de movimentações financeiras atípicas e que aparentem ilegalidade está desassociada da atividade bancária. Em verdade, somente as instituições financeiras detêm os meios adequados para recusar estas transações atípicas, uma vez que elas devem ser comparadas com o histórico do consumidor no que tange a valores, frequência e objeto. 12. Evidente, portanto, que a conduta das instituições financeiras de se manter inerte perante a ocorrência de diversas transações atípicas em poucos minutos concorre para permitir os golpes aplicados em seus correntistas. Assim, o nexo causal é estabelecido ao se concluir que poderia a instituição financeira ter evitado o dano sofrido em decorrência dos golpes, caso adotasse medidas de segurança mais eficazes.[...]" (STJ - REsp n. 2.052.228/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 12/9/2023, DJe de 15/9/2023) Portanto, fica devidamente caracterizada a responsabilidade civil da instituição bancária, principalmente pela falha na prestação do serviço de segurança, que possibilitou as transferências de valores da conta bancária da autora sem a devida prevenção. No que tange a inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito enseja, por si só, a configuração de dano moral (IN RE IPSA), sendo a respectiva condenação dispensável somente em casos de preexistente anotação lícita, assim como determina a súmula nº 385 do STJ, in verbis: "Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento." O dano moral, portanto, será devido quando o ato lesivo praticado atingir a integridade psíquica, o bem-estar íntimo, a honra do indivíduo, de modo que sua reparação, por meio de uma soma pecuniária, possibilite ao lesado uma satisfação compensatória dos dissabores sofridos, como ocorre no caso em tela. No que tange à fixação do quantum indenizatório, deve o magistrado se ater aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, em observância às circunstâncias em que o ato ilícito foi cometido, às consequências da ofensa ao lesado, o grau de culpa do ofensor, à eventual contribuição do ofendido em relação ao evento danoso e à situação econômica das partes. Como forma de definir o montante das indenizações por danos morais, o STJ tem trilhado o caminho do critério bifásico de fixação dos danos extrapatrimoniais: "Na primeira etapa, deve-se estabelecer um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes jurisprudenciais que apreciaram casos semelhantes. (...) Na segunda etapa, devem ser consideradas as peculiaridades do caso concreto, para fixação definitiva do valor da indenização, atendendo a determinação legal de arbitramento equitativo pelo juiz" (REsp nº 1.152.541/RS, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, j. em 13.09.2011). A reparação do dano moral cumpre, portanto, uma função de justiça corretiva ou sinalagmática, por conjugar, de uma só vez, a natureza satisfatória da indenização do dano moral para o lesado, tendo em vista o bem jurídico danificado, sua posição social, a repercussão do agravo em sua vida privada e social, e a natureza penal da reparação para o causador do dano, atendendo a sua situação econômica, a sua intenção de lesar (dolo ou culpa), a sua imputabilidade, etc. (MARIA HELENA DINIZ, Indenização por dano moral, Consulex, 1997, n. 3). Se não for possível, assim, fixar a indenização a partir dos critérios consagrados na jurisprudência, segundo os quais a quantia arbitrada pelo julgador possa ser idônea para, ao mesmo tempo, punir o agente, demovendo-o de reincidir na conduta danosa, e compensar a vítima pelo mal experimentado, sem enriquecê-la, é recomendável ao julgador, data vênia, fixar um valor a princípio expressivo, já que, valendo-se do princípio da razoabilidade, é inevitável concluir que a vocação punitiva da indenização do dano moral tem notória prevalência sobre a lenitiva. A capacidade econômica das partes também pesa pois quando é pessoa jurídica com grande poder econômico o valor da indenização deve ser, necessariamente, considerável, a fim de satisfazer, prevalentemente, a sua função punitiva. Realmente, o arbitramento da indenização moral não deve ser ínfimo tampouco excessivo e, somente, nestas 2 (duas) hipóteses, se divisa a autorização para o redimensionamento pela Corte. Dessarte, no que tange ao quantum indenizatório fixado, em observância ao que vêm sendo decidido por esta corte de segunda instância em casos semelhantes e, por se tratar a promovida de uma instituição de grande porte, entendo, em verdade, que a quantia fixada em sentença se encontra abaixo do padrão de condenações desta Corte para casos semelhantes, que gira em torno de R$ 3.000,00 (três mil reais). Corroborando o exposto colaciono julgados: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. CONTRATO BANCÁRIO. PESSOA ANALFABETA. EMPRÉSTIMO NÃO COMPROVADO. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL IN RE IPSA. VALOR INDENIZATÓRIO MANTIDO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. RECURSOS DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME Apelações cíveis interpostas em ação declaratória de inexistência de relação jurídica cumulada com indenização por danos morais e repetição de indébito. A autora, pessoa analfabeta, alegou nunca ter contratado empréstimo com o banco e requereu a exclusão de seu nome dos cadastros restritivos de crédito, bem como reparação moral e material. O juízo de origem julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo a inexistência da relação contratual, determinando a exclusão do nome da autora dos cadastros de inadimplentes e fixando indenização por danos morais em R$ 3.000,00, indeferindo, contudo, o pedido de repetição de indébito e compensação de valores. Há sete questões em discussão: (i) necessidade de sobrestamento do feito em razão do Tema 929/STJ; (ii) regularidade da relação contratual entre as partes; (iii) legitimidade da inscrição do nome da autora nos cadastros de inadimplentes; (iv) ocorrência de danos morais indenizáveis; (v) adequação do valor da indenização arbitrada; (vi) possibilidade ou não de compensação dos valores entre a indenização fixada e o montante supostamente recebido pela autora; e (vii) termo inicial dos juros moratórios sobre a indenização. A suspensão do feito com base no Tema 929/STJ não é cabível na fase de apelação, pois, conforme informações do STJ, a ordem de suspensão somente se impõe após a interposição de recurso especial ou agravo em recurso especial. A instituição financeira não comprovou a existência e validade do contrato que deu origem à negativação, apresentando instrumento diverso quanto à instituição e número (PAN/nº 306366036-3), o que evidencia a inexistência da relação jurídica alegada. Em se tratando de pessoa analfabeta, o contrato deve obedecer às formalidades legais do art. 595 do CC/2002, com assinatura a rogo e assinatura de duas testemunhas, formalidades não observadas no caso concreto. Configurada a falha na prestação do serviço, aplica-se a responsabilidade objetiva da instituição financeira, nos termos do art. 14 do CDC e da Súmula 479 do STJ. A negativação indevida do nome do consumidor enseja dano moral presumido (in re ipsa), conforme jurisprudência consolidada do STJ, sendo desnecessária a demonstração do prejuízo concreto. O valor da indenização por dano moral, arbitrado em R$ 3.000,00, encontra-se em conformidade com os parâmetros adotados pela jurisprudência da Câmara julgadora, revelando-se proporcional, razoável e suficiente para cumprir sua função compensatória e pedagógica. A alegação de compensação de valores não prospera, pois não restou comprovado vínculo entre o valor transferido à autora e o contrato que deu ensejo à negativação. Os juros moratórios devem incidir desde o evento danoso, por se tratar de responsabilidade extracontratual, conforme a Súmula 54 do STJ e o art. 398 do CC. Recursos desprovidos. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, art. 98, §1º, VIII; CC/2002, arts. 398, 595, 166, 168, parágrafo único; CDC, arts. 14 e 42, parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.197.929/PR (Tema 466), Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção, j. 24.10.2012; STJ, Súmulas 54, 297 e 479; STJ, REsp 1.152.541/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.09.2011; STJ, REsp 1.868.099/CE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 15.12.2020; TJCE, Apelação Cível 0007069-38.2017.8.06.0166, Rel. Des. Emanuel Leite Albuquerque, j. 16.10.2024; TJCE, Apelação Cível 0200644-49.2023.8.06.0053, Rel. Desa. Maria Regina Oliveira Camara, j. 16.10.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer dos recursos para, no mérito, negar-lhes provimento nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data da assinatura digital. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA Relator (Apelação Cível - 0201142-64.2024.8.06.0101, Rel. Desembargador(a) CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 16/04/2025, data da publicação: 16/04/2025) APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. AUSÊNCIA DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO AO CONSUMIDOR. ART. 43, § 2º, DO CDC. RESPONSABILIDADE CIVIL. PREJUÍZO IMATERIAL IN RE IPSA. MANUTENÇÃO DO VALOR FIXADO NA ORIGEM. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de Apelação Cível interposta por Boa Vista Serviços S.A, visando reformar a sentença proferida pelo juízo da 39ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza, que, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c danos morais n° 0211282-06.2023.8.06.0001, proposta por Marlúcia Maria Alves de Mesquita, julgou procedentes os pedidos exordiais. 2. A exigibilidade de eventual crédito, ainda que comprovada, não torna lícita, por si só, a inscrição do nome do autor em cadastro restritivo. É necessário que o lançamento observe as normas procedimentais previstas em lei, entre as quais está a que impõe a prévia notificação do devedor, com mínima antecedência de dez dias, conforme art. 43, § 2º, do CDC. 3. Dispõe o enunciado n° 359 da Súmula do STJ que: ¿Cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição.¿ Nesse sentido, a responsabilidade solidária da recorrente decorre do disposto no artigo 7º, parágrafo único, do CDC: "tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo" 4. Já decidiu a Corte Cidadã que a notificação por e-mail não cumpre a finalidade de comunicar o usuário quanto ao iminente registro do seu nome nos registros de proteção ao crédito. Some-se a isso, com base nos documentos colacionados aos autos, que inexiste comprovação de entrega da correspondência pela via postal. 5. Portanto, existente a inscrição indevida no cadastro de inadimplentes, sem a prévia informação à apelada, há ocorrência de dano que prescinde de comprovação, conceituado como ¿in re ipsa¿. 6. No que lhe concerne, a estipulação do valor indenizatório deve levar considerar não só as condições pessoais do ofensor e da vítima, mas também os motivos, consequências e demais elementos que permeiam o evento e seus reflexos, evitando o enriquecimento desmedido e sem causa da vítima, mas visando impedir e inibir a novas condutas similares. 7. Dessarte, atento às peculiaridades do caso e ao caráter pedagógico da indenização, tem-se que a quantia fixada em primeira instância a título de danos morais, qual seja, R$ 3.000,00 (três mil reais) é proporcional, razoável e condiz com o parâmetro estabelecido por esta Corte de Justiça em situações homogêneas. Portanto, não há que se falar em reforma da sentença. 8. Recurso conhecido e não provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº. 0211282-06.2023.8.06.0001, ACORDAM os Desembargadores membros da 4ª Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer da apelação e negar-lhe provimento, nos termos do voto do Eminente Relator, parte integrante deste. Fortaleza, . DESEMBARGADOR JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Relator (Apelação Cível - 0211282-06.2023.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) JOSE EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO, 4ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 04/06/2024, data da publicação: 04/06/2024) RECURSO INTERNO EM APELO. CONHECIMENTO PARCIAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA CONFIRMADA. MANUTENÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO DE CRÉDITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS (SÚMULA 548/STJ). INSCRIÇÃO PREEXISTENTE LEGÍTIMA NÃO VERIFICADA (SÚMULA N. 385/STJ). DANOS MORAIS MANTIDOS (R$ 3.000,00). RECURSO DESPROVIDO NA PARCELA CONHECIDA. 1. Não compete à agravante discutir se correta ou não a inscrição feita, pois desde a origem o juiz singular já declarou que aquela inserção do nome da parte agravada no cadastro de inadimplentes é legítima. A problemática aqui reside na manutenção da inscrição, mesmo após a quitação do débito pela recorrida. 2. O veredicto destes autos está alinhado com o enunciado da Súmula 548 do STJ: "Incumbe ao credor a exclusão do registro da dívida em nome do devedor no cadastro de inadimplentes no prazo de cinco dias úteis, a partir do integral e efetivo pagamento do débito". 3. Considerando que in casu o pagamento da dívida deu-se em 2008, e até o ajuizamento da ação, no ano de 2010, a restrição permanecia, por certo, a recorrente incorreu em um ilícito civil ensejador de danos morais in re ipsa, não havendo, no mais, inscrição anterior legítima à debatido nos autos, ao ponto de atrair a incidência da Súmula n. 385 do STJ. 4. RECURSO CONHECIDO, EM PARTE, E DESPROVIDO. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em unanimidade de votos, por conhecer em parte e desprover o recurso. Fortaleza, 25 de maio de 2022 HERÁCLITO VIEIRA DE SOUSA NETO Presidente do Órgão Julgador (Agravo Interno Cível - 0471120-47.2010.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 25/05/2022, data da publicação: 26/05/2022) APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. ÚLTIMO PAGAMENTO REALIZADO. INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. NEGLIGÊNCIA DO APELANTE EM NÃO INFORMAR A SERASA DO ADIMPLEMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PROVA DO DANO MORAL DESNECESSÁRIA. DANO MORAL PRESUMIDO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO, DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1.Configura-se a negligência da empresa recorrente que, em vez de se certificar se a recorrida havia pago a última parcela do contrato de financiamento, preferiu inscrever seu nome no cadastro de inadimplentes do SPC e não proceder mesmo após 08(oito) meses do pagamento com a retirada do nome da mesma do rol dos inadimplentes, razão que torna abusivo tal procedimento, surgindo, assim, o dever de indenizar; 2. O dano moral configura-se in re ipsa, nos casos de inscrição irregular em órgãos de proteção ao crédito, isto é, prescinde de prova; 3.In casu, observa-se que o valor da indenização fixado pelo Juízo a quo em R$ 3.000,00 (Três mil reais), em razão de inscrição indevida do nome da apelada no SPC, encontra-se dentro do padrão da razoabilidade e proporcionalidade, correta a sentença de primeiro grau que condenou o Banco Minas Gerais ao pagamento de indenização por danos morais. 4.Condenação em honorários de 15% para o Apelante condenado. 5.Os juros moratórios fixados em 1% (hum por cento) incidirão a partir da data da citação. 6.Recurso de Apelação conhecido e desprovido, sentença confirmada. (Apelação Cível - N/A, Rel. Desembargador(a) FRANCISCO SUENON BASTOS MOTA, 5ª Câmara Cível, data do julgamento: N/A, data da publicação: N/A) Assim, utilizando as premissas anteriormente citadas e considerando os precedentes desta Corte para situações semelhantes, infere-se que o quantum, na realidade, deve ser majorado para R$ 3.000,00 (três mil reais), uma vez que razoável e proporcional para compensar o dano sofrido, além de atender o caráter pedagógico da medida a efeito de permitir reflexão do réu sobre a necessidade de atentar para critério de organização e métodos no sentido de evitar condutas lesivas aos interesses dos consumidores. Quanto ao pedido de restituição de valores pagos à título de cartão de crédito, verifica-se que os autos não contêm comprovantes de pagamento efetivo relativos à cobrança questionada. Diante da ausência de demonstração concreta do desembolso, rejeito tal pretensão. ISSO POSTO, conheço do presente recurso e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, reformando a sentença de primeira instância para: a) Determinar a desconstituição do débito objeto da lide e a nulidade das negativações realizadas pelo Suplicado no CPF da Autora. b) Condenar o banco recorrido ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescido de correção monetária pelo IPCA a partir da data do arbitramento (STJ, Súmula nº 362; CC, art. 389, parágrafo único), e de juros moratórios, contados desde a data do evento danoso, à taxa de 1% ao mês até a véspera da vigência da Lei nº 14.905/2024 e, a partir de então, à taxa correspondente à diferença entre a Selic e o IPCA (CC, arts. 398 e 406, § 1º; STJ, Súmula nº 54); Em virtude do parcial provimento do recurso, determino a inversão dos honorários advocatícios e das custas processuais, com a ressalva de que a base de cálculo dos honorários deverá recair exclusivamente sobre o valor da condenação. É como voto. Fortaleza (CE), data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA Relator

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Maria Dirce Moraes De Oliveira x Cemil Centro Medico Materno Infantil Ltda e outros

ID: 277721495

Tribunal: TJPR Órgão: 3ª Vara da Fazenda Pública de Umuarama Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0001823-90.2019.8.16.0173

Data de Disponibilização: 23/05/2025

Polo Ativo:

MARIA DIRCE MORAES DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

CEMIL CENTRO MEDICO MATERNO INFANTIL LTDA MUNICíPIO DE UMUARAMA/PR

Conclusão

Advogados:

MARÍLIA AGUIAR FAVARO

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ROBSON MORTEAN

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

RAIANY CRISTINA DE OLIVEIRA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

FRANCIELLEN BERTOCELLO DE CARVALHO

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE UMUARAMA 3ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE UMUARAMA - PROJUDI Rua Des. Antonio Ferreira da Costa, nº 3693 - Zona I - Umuarama/PR - CEP: 87.501-200 - Fone: … PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE UMUARAMA 3ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE UMUARAMA - PROJUDI Rua Des. Antonio Ferreira da Costa, nº 3693 - Zona I - Umuarama/PR - CEP: 87.501-200 - Fone: 44 3259-7423 - E-mail: umu-3vj-s@tjpr.jus.br Autos nº. 0001823-90.2019.8.16.0173 Processo: 0001823-90.2019.8.16.0173 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Indenização por Dano Material Valor da Causa: R$106.800,00 Autor(s): Maria Dirce Moraes de Oliveira Réu(s): CEMIL CENTRO MEDICO MATERNO INFANTIL LTDA Município de Umuarama/PR SENTENÇA 1. Relatório Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais movida por Maria Dirce Moraes de Oliveira em face de Município de Umuarama/Pr, Hospital Cemil, Luiz Antonio De Melo Costa e Ana Livia Nonis De Oliveira. A parte autora alegou que: a) em 04/11/2018 passou mal se deslocou ao hospital de plantão (CEMIL), sendo atendida pelo SUS, pela médica Dra. Ana Lívia Nonis de Oliveira, cujo médico responsável era o Dr. Luiz Antonio De Melo Costa; b) foram ministrados alguns medicamentos sem investigação das causas de dor e sem realização de exames; c) em 05/11/2018 os filhos da autora a levaram no médico particular (Dr. Marcio Brasileiro) que, com exame de toques abdominais, diagnosticou a autora com apendicite, quadro confirmado com os exames realizados posteriormente; d) no mesmo dia, foi realizada cirurgia para retirada do apêndice inflamado, que havia rompido; e) teria falecido se não tivesse consultado em médico particular no dia seguinte; f) os réus são solidariamente responsáveis; g) faz jus à indenização por danos morais no valor de R$-100.000,00; h) faz jus à indenização pelos danos materiais sofridos no valor de R$-6.800,00; i) deve ser aplicado o CDC e invertido o ônus da prova. Requereu o benefício da justiça gratuita e a condenação dos réus ao pagamento de indenização. Recebida a inicial, foi concedido o benefício da justiça gratuita (mov. 7.1). Restou infrutífera a tentativa de conciliação (mov. 25.1). O réu Cemil - Centro Médico Materno Infantil Ltda apresentou contestação (mov. 55). Preliminarmente, aduziu ilegitimidade passiva, visto que a autora não foi atendida em suas dependências, mas na Associação Beneficente São Francisco de Assis. No mérito, sustentou que: a) a autora foi prontamente atendida ao chegar no pronto-socorro, foi realizado exame de anamnese e foi prescrita a medicação pertinente; b) ao realizar o exame a médica assistente afastou as hipóteses catastróficas e constatou Sinal de Blumberg Negativo (sem dor à descompressão brusca da fossa ilíaca direita), motivo por que não houve diagnóstico de apendicite naquele momento; c) a paciente respondeu ao tratamento prescrito e não foi necessária a internação ou exames complementares; d) a dor era recente, por isso não era possível identificar a apendicite naquele momento e a médica seguiu rigorosamente o protocolo de atendimento; e) persistindo as dores, a autora deveria ter retornado ao nosocômio réu para nova avaliação no dia seguinte; f) não houve negligência ou erro de diagnóstico; g) a autora não correu risco de morte, pois o pós operatório diagnosticou a patologia ainda em estágio inicial; h) inexiste conduta ilícita da ré, não havendo pressuposto legal para a indenização; i) inexistência de nexo de causalidade; j) subsidiariamente, o quantum indenizatório deve ser reduzido; k) não deve ser invertido o ônus da prova. Pugnou pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva com extinção do processo ou, no mérito, pela improcedência dos pedidos. Juntou documentos. A ré Ana Lívia Nonis de Oliveira contestou a ação e defendeu que: a) a autora foi prontamente atendida ao chegar no pronto-socorro, foi realizado exame de anamnese e foi prescrita a medicação pertinente; b) ao realizar o exame a médica assistente afastou as hipóteses catastróficas e constatou Sinal de Blumberg Negativo (sem dor à descompressão brusca da fossa ilíaca direita), motivo por que não houve diagnóstico de apendicite naquele momento; c) a paciente respondeu ao tratamento prescrito e não foi necessária a internação ou exames complementares; d) a dor era recente, por isso não era possível identificar a apendicite naquele momento e a médica seguiu rigorosamente o protocolo de atendimento; e) persistindo as dores, a autora deveria ter retornado ao nosocômio réu para nova avaliação no dia seguinte; f) não houve negligência ou erro de diagnóstico; g) a autora não correu risco de morte, pois o pós operatório diagnosticou a patologia ainda em estágio inicial; h) inexiste conduta ilícita da ré; i) inexistência de responsabilidade civil, não havendo pressuposto legal para a indenização; j) inexistência de nexo de causalidade; k) subsidiariamente, o quantum indenizatório deve ser reduzido; l) não deve ser invertido o ônus da prova. Pugnou pela improcedência da ação e juntou documentos. O requerido Luiz Antônio de Melo Costa ofereceu contestação (mov. 32.1). Em preliminar aduziu ilegitimidade passiva ad causam, visto que não atendeu a autora em momento algum no pronto-socorro. No mérito, sustentou que: a) a autora foi prontamente atendida ao chegar no pronto-socorro, foi realizado exame de anamnese e foi prescrita a medicação pertinente; b) ao realizar o exame a médica assistente afastou as hipóteses catastróficas e constatou Sinal de Blumberg Negativo (sem dor à descompressão brusca da fossa ilíaca direita), motivo por que não houve diagnóstico de apendicite naquele momento; c) a paciente respondeu ao tratamento prescrito e não foi necessária a internação ou exames complementares; d) a dor era recente, por isso não era possível identificar a apendicite naquele momento e a médica seguiu rigorosamente o protocolo de atendimento; e) persistindo as dores, a autora deveria ter retornado ao nosocômio réu para nova avaliação no dia seguinte; f) não houve negligência ou erro de diagnóstico; g) a autora não correu risco de morte, pois o pós operatório diagnosticou a patologia ainda em estágio inicial; h) inexiste conduta ilícita da ré; i) inexistência de responsabilidade civil, não havendo pressuposto legal para a indenização; j) inexistência de nexo de causalidade; k) subsidiariamente, o quantum indenizatório deve ser reduzido; l) não deve ser invertido o ônus da prova. Pugnou pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva com extinção do processo ou, no mérito, pela improcedência dos pedidos. Juntou documentos. O Município de Umuarama/Pr contestou a ação (mov. 35.1). Em preliminar alegou ilegitimidade passiva, visto que cabe ao hospital réu indenizar a autora. No mérito, sustentou que: a) o Código de Defesa do Consumidor não se aplica a serviços públicos de saúde prestados pelo Município; b) ausência de culpa na conduta da médica, que adotou o procedimento correto; c) ausência de nexo causal entre a conduta da médica e eventuais danos sofridos pela autora; d) a autora não sofreu danos; e) a autora se dirigiu ao atendimento particular por sua escolha, de forma que indevida a indenização por danos materiais; f) ausência de danos morais; g) não há responsabilidade do Município; h) responsabilidade autônoma da Associação São Francisco de Assis e seus funcionários; i) em caso de responsabilização do Município, ela não deve ser solidária; j) caso haja condenação em dano moral, o quantum deve ser reduzido. Pugnou pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva com extinção do processo ou, no mérito, pela improcedência dos pedidos. Juntou documentos. A autora impugnou as contestações dos réus Hospital Cemil, Luiz Antonio de Melo Costa e Ana Lívia Nonis de Oliveira (mov. 36.1). Aduziu que: a) o atendimento ocorreu no Hospital Cemil, portanto a parte é legítima; b) o atendimento ocorreu sob a direção do réu Luiz Antonio de Melo Costa como médico responsável pelo plantão, de forma que legítimo; c) a autora foi atendida pelo médico particular apenas horas após o atendimento do plantão (que ocorreu de madrugada) e seu estado era o mesmo. A autora impugnou a contestação do réu Município De Umuarama/PR (mov. 39.1). Alegou que: a) o hospital atuava pelo SUS, responsável pelo Município, de forma que legítimo; b) mesmo não havendo remuneração direta pelos serviços, estes são remunerados pelo poder público, auferindo lucro, de forma que aplicável o CDC. Instados a especificar provas, a ré Cemil requereu a produção de prova documental, oral (depoimento pessoal da autora e oitiva de testemunhas) e pericial (mov. 51.1); a autora e o Município requereram prova documental e oral (depoimento pessoal da autora e oitiva de testemunhas) (mov. 52/53). Decisão saneadora (mov. 55.4). Extinção do feito em relação aos réus Ana Lívia e Luiz Antônio, em razão do Tema 940 do STF (mov. 166). Deferimento da realização de prova técnica simplificada (mov. 223). Audiência de instrução (mov. 365). Juntada de ultrassom (mov. 369.2). Alegações finais (mov. 377, 382 e 383). É o relatório. 2. Fundamentação Alega a autor que, em decorrência de mal atendimento pelos réus, não foi diagnosticada precocemente de quadro de apendicite, e correu risco de vida ao ser operada somente no dia seguinte. Por sua vez, os réus alegaram retidão do procedimento médico, não havendo ato ilícito praticado pela médica responsável pelo atendimento a justificar a indenização requerida. No caso, foi realizada produção de prova técnica simplificada (mov. 365.8), com a oitiva do perito médico Ramon Maximo Schulz Neto que, perguntado sobre o caso, relatou que foi um atendimento que, aparentemente, foi realizado exame físico e não solicitado outros exames; as versões das partes divergem quanto as dores sentidas pela autora e são essenciais saber pelo prontuário do atendimento; se ela sente dor pela descompressão brusca, colocam em um score para saber se precisa de exame de imagem ou não e, de acordo com o processo, não teve nenhum exame; o score é analisado com outros sinais como de náusea, vômito e localização da dor; se ela tivesse a dor com descompressão brusca e dor no abdômen inferior a direita, o que não ficou claro no processo, isso indicaria o exame de imagem; se houvesse a dor, seriam necessários exames de sangue e observação que poderia ser ambulatorial, solicitando que a paciente volte no outro dia para reavaliação; a questão da dor seria fundamental para solicitação de exames; o documento (mov. 1.6) tem bem pouca informação, tem medicação, o vômito, que pode ser um sinal de muita coisa abdominal, e uma dor abdominal iniciada a tarde, sem nenhuma localização; o vômito pode ser associado a uma dor abdominal, mas faltaria bastante informação que falaria a favor ou contra (a indicação de realização de exames complementares); pelo documento não é possível concluir o que a médica pensou que fosse no dia, porque tem dor e vômito apenas só, não dá para tirar muita informação disso; se não tratado, a evolução normal dessa doença, em quatro ou cinco dias, é evoluir para um quadro de sepse, podendo evoluir para morte; os medicamentos receitados são para dor e vômito e poderiam diminuir a dor no caso de apendicite; foram poucas horas de evolução da dor, poderia ser muita coisa; o problema é que tem uma evolução muito simplificada, a evolução da médica; só vômito e dor abdominal pode ser muita coisa, não tem localização da dor; fica um pouco difícil de pensar se é uma dor, porque pode ser desde diarreia até algo bem mais grave, muito aberto; a medicação foi efetiva para a dor que ela sentia; pela evolução e medicações, existe a conduta de solicitar pelo paciente uma reavaliação ou fazer ambulatorial, dependendo dos critérios da evolução do caso, e voltar no outro dia em 24h para reavaliação e, se necessário, fazer outros exames ou se tivesse alguns outros critérios, seria o caso de manter a paciente em observação, porque 11h da noite é mais difícil obter alguns exames; para indicação formal seria necessário saber se ela tinha febre, dor a descompressão, dor em defesa, se tinha histórico de migração da dor e, a depender dessas alterações, se ela tinha exame de sangue, então ela poderia ser observada no hospital até o outro dia ou em casa dependendo dessa questão; o exame de sangue normal no atendimento não descartaria a apendicite; um ultrassom normal, se a dor estivesse evoluindo para pior, também não descartaria, porque depende muito de quem faz a ultrassom e da fase que está; entre o atendimento no hospital e o atendimento com o outro profissional a dor aumentaria e o paciente poderia estar com febre e mais náusea e a tendência de localização da dor aumenta bastante; lida com casos como esse frequentemente; idealmente, faria essa medicação para dor e observaria essa paciente até o dia seguinte, pedindo para voltar, ou recomendaria exame de imagem no outro dia pela manhã para diagnosticar; a questão de não estar localizada a dor da paciente, não chamaria tanto a atenção para precisar da atenção de um cirurgião na hora; a medicação foi prescrita para aplicação no próprio hospital: 1 ampola de diporina, 1 ampola citoprofeno e 1 ampola de bromoprida em um soro de 100; a indicação pode ser de liberar e voltar no outro dia; não libera tão rápido assim, no meio da noite; se a paciente ainda tivesse com dor, acha que seria o caso de fazer o exame de imagem; a recomendação de pedir para retornar é muito importante; é um protocolo, persistindo a dor abdominal, retornar, de preferência, ao mesmo serviço; no prontuário do segundo atendimento (mov. 1.8), o apêndice já evoluiu, por ser mulher, ainda pode ter dúvidas de alguma alteração de ovário ou urinário, é um caso clássico de apendicite que pede exame de imagem e confirma; o ideal é ser operado de 6 a 8 horas, não deixando para outro dia; o prontuário não indica que era uma situação avançada de inflamação. Ainda, foi colhido o depoimento pessoal da autora e ouvidas cinco informantes (mov. 365): A autora, Maria Dirce Moraes de Oliveira (mov. 365.9), relatou que foi um domingo, começou uma dor do lado e achou que era um ar, foi aumentando e vomitou; quando foi perto da meia noite, foi no hospital e consultada, não aguentava de dor; a médica apertou um pouco e ela falou que não dava para saber o que era, mas iria medicar; foi para a sala e aplicou soro e remédio, ficou lá até umas três da manhã e foi embora, porque tinha diminuído; sua filha perguntou como estava no outro dia de manhã, falou que estava ruim de novo, então ela ligou no hospital, marcou e foi lhe buscar; o médico apertou e soltou, até gritou de dor; fez ultrassom e o Dr. Amauri falou que já podia ir direto para o hospital, não sabe se estava para estourar; passou no médico para saber sobre os valores e já foi para o hospital e fez a cirurgia na parte da tarde; quando saiu do hospital estava com dor, mas menos; não pediu exame, mas também não perguntou; achou que talvez era um gás; entendeu que dava para ir para casa pelo medicamento que tomou e melhorou; achou que cada vez melhoria mais, mas depois que dormiu acordou com mais dor; quando foi para hospital a dor era do lado direito; que foi em outro médico porque esse médico é antigo e teve suas crianças com ele; que no médico foi particular; que fez o ultrassom no Dr. Amauri, ele falou que nem ia cobrar nada; acha que não levou o ultrassom para o advogado. Priscila Moraes de Oliveira, filha da autora, ouvida na qualidade de informante (365.10), relatou que passou na casa de sua mãe e ela estava com dor; como ela não é uma pessoa de reclamar de dor facilmente, ela falou que iria esperar mais um pouco; a noite passou na casa dela novamente e ela estava branca de dor; no dia seguinte ela contou que tinha ido no médico e tomou medicação e foi liberada, voltou para casa com menos dor; falou que tinha que ir ao médico, então ligou no Dr. Márcio para ver se tinha consulta, marcou e levou ela; ele apertou a barriga dela e solto, quando ele soltou, ela deu um grito, então ele falou para ir ao Dr. Amauri fazer exame; conseguiu um horário e, enquanto estava fazendo o exame, ele falou para ir para o hospital, porque já estava quase rompendo; no mesmo dia já fez a cirurgia, no final da tarde; ela não falou se a médica pediu algum exame ou falou para voltar; voltou em outro médico porque tem mais confiança no Dr. Marcio, médico da família há muito anos; o médico diagnosticou muito rápido; passaram na clínica antes para pegar um papéis antes; ocorreu tudo bem depois da cirurgia; o doutor falou que foi por pouco, estava prestes a estourar; não esteve junto com a sua mãe no hospital a noite. Marcio Tadeu Faria Brasileiro, informante da ré (mov. 365.11), relatou que possui especialidade no aparelho digestivo; ela consultou no mesmo dia da cirurgia, era umas 11h, com uma dor abdominal; ao apalpar a região, realizou a manobra Blumberg que deu positiva, então suspeitou de apendicite; encaminhou a paciente uma ultrassonografia que confirmou o diagnóstico; o atendimento no consultório é rápido, com a experiência que tem, seguiu o protocolo; ela disse que a dor começou no dia anterior, após o almoço, havia pouco menos de 24h; com dor abdominal, em mulher, tem vários diagnósticos; não sabe se quando ela foi atendida a dor já estava localizada; a medicina não tem uma matemática, a dor pode ser localizada com 8h, 12h, 15h, até 24 horas, tem casos que ficam bloqueados até 72h; o exame é feito com a paciente deitada; é difícil dizer que se ela tivesse realizado o exame na noite anterior poderia ter dado negativo; não é sempre indicado o exame de imagem; uma dor abdominal pode ser alguma coisa que comeu, infecção urinária, não tem indicação de imediato de exame, depende muito do exame físico que vai caracterizar uma irritação peritoneal; na descrição da cirurgia (mov. 1.9, p. 4) consta apendicite aguda enfisematosa sem perfuração, perfuração é uma complicação; pelo início da dor dela é possível considerar em estágio inicial; ela não estava com risco de morte; a apendicite possui risco de perfuração e outras complicações; para diferenciar de outras doenças depende muito da experiência profissional; geralmente a paciente é liberada se estiver sem a dor e o médico manda voltar, a posteriori pode ser recomendado algum exame, mas durante a noite é difícil até encontrar um profissional que faz; a forma de tratamento vai depender muito do médico que atendeu, não pode generalizar muito; um alimento que você come no almoço pode causar dor e vômito; acredita que o vômito pode ser mais por uma indisposição estomacal do que a própria dor; se ela não está perfurada inicialmente, não vai dar uma dor lancinante a ponto de gerar vômito, cólica renal sim; a dor da apendicite é uma dor que você pode sentir conforme se movimente e, com analgésico, pode ficar 8 a 10 horas sem notar, se permanece merece uma investigação mais apurada. Luiz Antonio de Melo Costa, informante da ré (mov. 365.12), relatou que não estava presente no atendimento; é cirurgião do aparelho digestivo; a dor que a paciente sentia era recente; não havia razão para pensar que seria apendicite naquele momento; normalmente, após 12h do início da evolução do quadro não é suficiente para localizar a dor; normalmente, de 24 a 36 horas que começa a se caracterizar a dor do abdômen agudo, antes é só uma dor abdominal; quando você tem o abdômen agudo, você tem no exame físico uma reação dolorosa à descompressão súbita do abdômen e normalmente, na apendicite aguda, isso começa de 24 a 36, até 48 horas depois para ter esse sinal; com 10h de dor não era esperado que esse teste desse positivo; mesmo que não se tenha o sinal, não se deve ser descartado; de cada 10 dores abdominais que aparecem no pronto-socorro, um vai evoluir para o abdômen agudo; medicou, melhorou, vai para casa, não fica pedindo ultrassom para todo mundo; no plantão tem 150 atendimentos em 24h, não fica pedindo exame, senão sobrecarrega o sistema; em casos de suspeita, interna o paciente, pede exame laboratorial, não pede mais ultrassom, o mais importante é o exame na paciente, o que a doutora fez; a paciente não tem o anatomopatológico, já operou muitos casos com sinais clássicos que não eram; sem anatomo não tem como imputar nada a doutora; a Dra. Ana Lívia estava subordinada a ele nesse dia; o anatomopatológico é como se fosse uma biópsia; não discutiu o caso com Dra. Ana Lívia. Valdenir Bras da Silva, testemunha da ré (mov. 365.13), relatou que é técnico de enfermagem; nesse plantão, por volta das 22h se queixando de dor abdominal, chamaram a Dra. Ana Lívia, ela fez a anamnese na paciente, apalpou e disse que ia medicá-la e provável que iria internar ela; a paciente disse que a dor tinha passado; a doutora disse que iria internar, mas a paciente falou que não, que a dor já tinha passado; a medicação foi venosa, ela chegou a ficar um período no hospital; é técnico em enfermagem em urgência e emergência, trabalha no hospital há 16 anos; lembra dos pacientes; a paciente falou que caso a dor voltasse, a procurava; não sabe se a paciente assinou alguma coisa; é comum pessoas com dores abdominais e vômito chegarem ao hospital a noite; não faz parte da realização do prontuário; caso internasse, seria averiguada melhor a situação, mas ela não quis ficar; Ana Lívia Nonis De Oliveira, informante da parte ré (mov. 365.14), relatou que ela chegou no começo da noite se queixando de uma dor abdominal difusa associada a náuseas; realizou o protocolo do pronto-socorro, fez a anamnese, investigou as causas, fez exame físico nela, prescreveu medicação e seguiu conforme o protocolo; examinou a barriga da paciente, prescreveu medicação e, após, reexaminou; realizou o Blumberg, faz parte do protocolo, e ela não havia sinais de peritonite e o Blumberg deu negativo; as dores iniciaram no início da tarde, então era uma dor de início recente, havia poucas horas de evolução dessa dor; ela fez a medicação e teve melhora total dos sintomas, então reexaminou e acabou liberando ela; se ela ainda tivesse dor teria que prosseguir com a investigação, com exames de imagem, laboratoriais e internação hospitalar; como não era o caso da paciente, ela acabou melhorando do quadro da dor, ela foi liberada; estava de plantão; a dor abdominal é uma das maiores causas que levam o paciente ao pronto-socorro; normalmente quando o paciente faz a analgesia, tem uma evolução favorável; ela ficou um tempo em observação no pronto-socorro e, após não ter nenhuma queixa, foi liberada com uma receita de analgesia, com orientações para, se caso retornasse a dor, retornar ao pronto-socorro; apendicite é um diagnóstico diferencial de dor abdominal; tem diagnóstico diferencial de mais de 30 causas de dor abdominal, naquele momento ela não tinha nenhum nada no exame físico e anamnese que pudesse dizer que era apendicite, nenhum sinal de peritonite; geralmente a evolução da apendicite é uma dor abdominal difusa e com 24, 48 e até 72h a paciente começa ter dor abdominal periumbilical, sinais clássicos de apendicite; nesse caso, quando vem a dor direita, prossegue com exames de imagem para poder avaliar se é ou não; ela disse que não estava sentindo mais nada; ela teve o desejo de ir para casa porque ela não tinha mais nenhum sintoma, tudo havia cessado com analgesia; não tinha nenhum diagnóstico definitivo para a paciente, porque dor abdominal pode ser um quadro como uma gastroenterite, uma inflamação ovariana; toda dor abdominal é uma dor evolutiva, como ela tinha poucas horas de atendimento, inicialmente fez a anamnese e no exame físico não tinha nada que chamasse atenção, por isso não tinha um diagnóstico definitivo, se caso evoluísse, prosseguiria a investigação; não se investiga toda dor abdominal e poucos casos que entram no pronto-socorro evoluem desfavoravelmente; o quadro evolutivo impediu o diagnóstico; aquela dor é uma dor que se observa e aguardar a evolução; pode ser observação em casa, desde que a paciente seja orientada; ela foi orientada. Em análise à prova pericial e oral produzidas em audiência, observa-se que todos os médicos (inclusive perito) constataram que a dor sentida pela autora era recente e, por estar desacompanhada de outros sintomas típicos de apendicite (como dor à descompressão brusca na parede abdominal, por exemplo), poderia ser sinal de diversas enfermidades, não ensejando o pretenso diagnóstico precoce. Além disso, conforme aclarado pelo perito, a realização de outros exames para averiguação de eventual apendicite demandaria febre, dor à descompressão, dor em defesa, se tinha histórico de migração da dor (mov. 365.8), o que não ocorrido no caso, em que relatada apenas a dor abdominal e vômito (mov. 1.6). E, conforme narrado pela autora, houve melhora dos sintomas após a medicação realizada no hospital (365.9), o que afastou, ainda mais, a necessidade de novos exames. Desse modo, não havendo indícios a justificar realização de outros exames na parte autora por ocasião da internação e alta, ausente erro na conduta da médica, que liberou a autora após a melhora dos sintomas que justificaram sua internação. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO, POR OMISSÃO/DEMORA NO DIAGNÓSTICO DE APENDICITE – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA – RECURSO DOS AUTORES (PACIENTE/MENOR E SUA GENITORA) - (1) VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES – NÃO ACOLHIMENTO – (2) RESPONSABILIDADE OBJETIVA INDIRETA DO HOSPITAL PELOS SERVIÇOS MÉDICOS, SUJEITA À COMPROVAÇÃO DA CONDUTA CULPOSA DO RESPECTIVO PROFISSIONAL – QUADRO CLÍNICO INESPECÍFICO DO PACIENTE QUE NÃO POSSIBILITAVA O DIAGNÓSTICO PRECOCE DA APENDICITE – SINTOMAS QUE PODEM SER CONFUNDIDOS COM OS DE OUTRAS ENFERMIDADES – PRIMEIRO EXAME FÍSICO REALIZADO NÃO CONDIZENTE COM A MOLÉSTIA (ABDÔMEN PLANO, FLÁCIDO E INDOLOR À APALPAÇÃO) – EXAMES LABORATORIAL E DE IMAGEM REALIZADOS QUE, ADEMAIS, DETECTARAM A PRESENÇA DE INFECÇÃO NO TRATO URINÁRIO – INDICAÇÃO DE INTERNAMENTO PARA TRATAMENTO (USO DE ANTIBIÓTICOS) E OBSERVAÇÃO – POSTERIOR EVOLUÇÃO DO QUADRO (DISTENSÃO ABDOMINAL E DOR À APALPAÇÃO) QUE, COM A AVALIAÇÃO CLÍNICA E O EXAME DE ULTRASSONOGRAFIA, CONFIRMOU O DIAGNÓSTICO DE APENDICITE, LEVANDO À IMEDIATA TRANSFERÊNCIA DO INFANTE AO HOSPITAL ESPECIALIZADO EM PEDIATRIA, ONDE FOI SUBMETIDO À INTERVENÇÃO CIRÚRGICA, SEM QUALQUER INTERCORRÊNCIA – AUSÊNCIA DE FALHA NO DIAGNÓSTICO, DIANTE DA ATUAÇÃO MÉDICA EM CONSONÂNCIA COM A EVOLUÇÃO CLÍNICA DO PACIENTE – SENTENÇA MANTIDA, COM A MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.Apelação desprovida. (TJPR - 10ª Câmara Cível - 0021074-96.2017.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADORA ELIZABETH MARIA DE FRANCA ROCHA - J. 12.04.2025) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ERRO MÉDICO CUMULADA COM DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. SENTENÇA QUE JULGA IMPROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA JÁ CONCEDIDA EM PRIMEIRO GRAU. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL PARA NOVO REQUERIMENTO DE JUSTIÇA GRATUITA. ALEGAÇÕES ESTRANHAS À LIDE QUE NÃO PODEM SER CONHECIDAS. ARTIGO 932, III, CPC. PRETENSÃO À REPARAÇÃO POR ATRASO NO DIAGNÓSTICO DE APENDICITE. PERÍCIA MÉDICA ATESTANDO A PRESTAÇÃO DE TRATAMENTO ADEQUADO PELOS MÉDICOS E NOSOCÔMIO AO PACIENTE. CIRURGIA DE APENDICITE E INTERNAMENTO POSTERIOR QUE DECORRE DO QUADRO DE SAÚDE DO INFANTE. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O SERVIÇO MÉDICO E HOSPITALAR PRESTADOS E OS DANOS ALEGADOS PELO AUTOR. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS REQUERIDOS NÃO VERIFICADA. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, NÃO PROVIDA. (TJPR - 8ª Câmara Cível - 0023059-97.2019.8.16.0044 - Apucarana - Rel.: ANA CLAUDIA FINGER - J. 08.04.2024) INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ERRO MÉDICO. Apendicite. Diagnóstico não realizado na primeira vez que foi atendida no Pronto Socorro da corré. Realização de exames que não demonstravam a presença da referida moléstia. Sintomas que só se agravaram após o primeiro atendimento. Evidências de que a conduta adotada pela médica foi adequada ao quadro clínico apresentado pela autora. Ausência de falha na prestação de serviços. Responsabilidade civil não configurada. Precedentes deste E. Tribunal. Sentença mantida . Recurso desprovido. (TJ-SP - Apelação Cível: 0007069-77.2010.8 .26.0602 Bauru, Relator.: Mary Grün, Data de Julgamento: 01/10/2015, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 01/10/2015) Outrossim, conforme aclarado pelo perito e pelo médico que lhe atendeu (mov. 365.8 e 365.11), a apendicite da autora estava em estágio inicial (mov. 1.9, p.4 - sem perfuração), de modo que a ausência de diagnóstico no pronto-socorro não hábil a gerar prejuízo, sendo o diagnóstico e a internação posterior consequência da evolução da enfermidade. Por fim, a escolha da autora em buscar atendimento médico e cirurgia em outro local não gera dever de indenizar, já que poderia ter retornado ao mesmo hospital, após agravamento do quadro. Nesse sentido, infere-se que a autora optou pelo médico que já lhe atendida há anos, como narrado em depoimento. Destarte, a improcedência dos pedidos é a medida que se impõe. 3. Dispositivo Posto isso, com fundamento no artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, resolvo o mérito e JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial, nos termos da fundamentação. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10 % (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no artigo 85, § 3º e § 4º, inciso III do Código de Processo Civil, considerando a complexidade da causa e a necessidade de dilação probatória. Observe-se o artigo 98, § 3º do Código de Processo Civil na hipótese de beneficiário da justiça gratuita. Cumpram-se, no que forem pertinentes, as demais determinações do Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Umuarama, 21 de maio de 2025. Maira Junqueira Moretto Garcia Juíza de Direito

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Fabio Bueno Domingues e outros x Anuar Gantus e outros

ID: 324053106

Tribunal: TJPR Órgão: 2ª Vara Cível de Ponta Grossa Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0007069-68.2024.8.16.0019

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

FABIO BUENO DOMINGUES MELLANY AMANDA MAINARDES DOMINGUES

Polo Passivo:

ANUAR GANTUS MARIA APARECIDA KIRCHNER

Conclusão

Advogados:

HERCULANO AUGUSTO DE ABREU FILHO

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ADRIELE CAROLINE ANDRADE

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JOAO PAULO HENNEBERG

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TOBIAS FERNANDO MADUREIRA

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JULIANO RIBEIRO GOMES

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PONTA GROSSA 2ª VARA CÍVEL DE PONTA GROSSA - PROJUDI Rua Leopoldo Guimarães da Cunha, 590 - 2ª Vara Cível - Oficinas - Ponta Grossa/PR - CEP: 84.035-90… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PONTA GROSSA 2ª VARA CÍVEL DE PONTA GROSSA - PROJUDI Rua Leopoldo Guimarães da Cunha, 590 - 2ª Vara Cível - Oficinas - Ponta Grossa/PR - CEP: 84.035-900 - Fone: (42) 99987-6104 - E-mail: pg-2vj-e@tjpr.jus.br Processo: 0007069-68.2024.8.16.0019 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Indenização por Dano Moral Valor da Causa: R$117.335,70 Autor(s): FABIO BUENO DOMINGUES (RG: 125907415 SSP/PR e CPF/CNPJ: 073.895.359-89) Rua Paulino Primo Nadal, 291 - Neves - PONTA GROSSA/PR - CEP: 84.022-424 MELLANY AMANDA MAINARDES DOMINGUES (RG: 165000480 SSP/PR e CPF/CNPJ: 155.326.169-06) representado(a) por FABIO BUENO DOMINGUES (RG: 125907415 SSP/PR e CPF/CNPJ: 073.895.359-89) Rua Paulino Primo Nadal, 291 - Neves - PONTA GROSSA/PR - CEP: 84.022-424 Réu(s): ANUAR GANTUS (RG: 171009561 SSP/PR e CPF/CNPJ: 330.198.607-25) Rua Vereador Ernâni Batista Rosas, 1735 - Jardim Carvalho - PONTA GROSSA/PR - CEP: 84.015-150 MARIA APARECIDA KIRCHNER (RG: 45883167 SSP/PR e CPF/CNPJ: 675.856.399-53) Rua Vereador Ernâni Batista Rosas, 1735 - Jardim Carvalho - PONTA GROSSA/PR - CEP: 84.015-150 I – RELATÓRIO Os autores ingressaram com a presente ação relatando que no dia 24.12.2023 trafegavam pela Rua do Rosário, nesta cidade, com a motocicleta YS 150, placas SEP-5F36, quando o réu Anuar Gantus que conduzia o veículo Toyota CCross, placas SEB-6B20, de propriedade da ré Maria Aparecida Kirchner, pela Praça Barão do Rio Branco, sentido Rua Coronel Bittencourt, no cruzamento com a Rua do Rosário, avançou o sinal vermelho, causando violenta colisão com a motocicleta. Afirmaram que foram socorridos pelo SAMU, e a autora foi encaminhada à Santa Casa da Misericórdia, recebendo atendimento médico de emergência, pois sofreu concussão, restando internada na Unidade de Terapia Intensiva. Apontaram que o autor foi encaminhado à UPA Santana, recebendo atendimento médico, onde foram constatadas fraturas de punho e escápula. Arguiram que os réus não ofereceram qualquer tipo de auxílio aos autores. Discorreram que o autor ficou impossibilitado de exercer o seu trabalho como pedreiro, pois em decorrência das lesões advindas do acidente, ficou afastado por 45 dias. Pontuaram que, após o autor retornar ao trabalho, teve que ser direcionado para outra função, pois não está apto a desempenhar as funções anteriores ao acidente. Sustentaram a responsabilidade do réu, vez que avançou o sinal vermelho, dando causa ao acidente. Argumentaram a responsabilidade da ré, vez que é a proprietária do veículo envolvido no acidente. Argumentaram que a situação narrada lhes causou abalo moral, passível de indenização. Aduziram que tiveram gastos com medicamento e que o conserto da motocicleta foi orçado em R$ 17.278,00. Pugnaram a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária. Requereram a condenação dos réus no pagamento de indenização por danos materiais, morais, custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Os benefícios da gratuidade judiciária foram concedidos (ev.10.1). Os réus foram devidamente citados (ev.26.1 e 27.1). A audiência de conciliação restou infrutífera (ev.29.1). Os réus apresentaram defesa (ev.31.1) arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade da ré Maria, vez que entregou seu veículo para quem é devidamente habilitado, gerando a presunção de que este era apto a conduzir, não havendo qualquer hipótese legal que enquadre a responsabilidade solidária e objetiva do proprietário do veículo envolvido em acidente. No mérito, afirmaram que pelos registros das câmeras de monitoramento não é possível visualizar se o sinal estava verde, amarelo ou vermelho para o condutor do veículo que transitava pela Rua Coronel Bittencourt. Apontaram que a testemunha Mariana apresentou divergência das declarações, não havendo certeza de que o réu avançou o sinal vermelho e foi responsável pelo acidente. Alegaram que o réu permaneceu no local do acidente, até os autores serem encaminhados para atendimento médico hospitalar. Sustentou que não há nexo de causalidade entre a conduta dos réus e o resultado. Refutaram a ocorrência de abalo moral. Requereram a improcedência dos pedidos iniciais. Réplica no ev.34.1. Intimadas as partes para especificação de provas (ev.35.1), houve manifestação no ev.39.1 e 41.1. O Ministério Público exarou parecer no ev.46.1. O feito foi saneado, com a rejeição da preliminar arguida, a fixação dos pontos controvertidos e o deferimento da prova oral (ev.50.1). A audiência de instrumento e julgamento foi realizada, com a tomada de depoimento pessoal do autor e a inquirição de três testemunhas (ev.113.1). As partes apresentaram alegações finais (ev.121.1 e 123.1). O Ministério Público exarou parecer no ev.128.1. Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. II – FUNDAMENTAÇÃO A pretensão dos autores, de condenação dos réus no pagamento de indenização por danos materiais e morais, está calcada na alegação de que a culpa pelo acidente é do réu, o qual avançou o sinal vermelho e colidiu com a motocicleta, devendo responder pelos danos a que deu causa. Os réus, por sua vez, refutaram a alegação de culpa pelo acidente, argumentando que os vídeos colacionados não indicam se o sinal estava vermelho e a testemunha ouvida em sede policial não tinha certeza de que o sinal do autor estava verde. Negaram a existência de abalo moral. a) Da culpa pelo acidente Nos termos do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, cabe ao autor a prova dos elementos essenciais para a caracterização do ato ilícito previsto no artigo 186 do Código Civil. Segundo os artigos 186 c/c artigo 927, ambos do Código Civil, o dever de indenizar surge da ocorrência de dano e este deve ser consequência, dentre outras hipóteses, de ato ilícito de quem o produziu. E para que haja configuração do ato ilícito e consequentemente o dever de indenizar, faz-se imprescindível, dentre outras hipóteses, que o dano tenha sido causado por ação ou omissão voluntária, imprudente, negligente ou imperita, tratando-se de uma lesão a um direito legítimo. Oportuna é a lição de Maria Helena Diniz[1] quanto aos requisitos do artigo 186 do Código Civil: “a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência (RT 443/143, 450/65, 494/35, 372/323, 440/74, 438/109, 440/95, 477/111 e 470/241); b) ocorrência de um dano patrimonial ou moral, sendo que pela Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça serão cumuláveis as indenizações por dano material e moral decorrentes do mesmo fato (RT 436/97, 433/88, 368/181, 458/20, 434/101, 477/247, 490/94, 507/95 e 201, 509/69, 481/82 e 88, 478/92, 470/241, 469/236, 477/79 e 457/189; RTJ 39/38 e 41/844); e c) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente (RT 477/247, 463/244, 480/88, 481/211, 479/73 e 460/84”. Via de consequência, são requisitos essenciais para a caracterização da responsabilidade civil: a) o ato culposo do agente; b) o dano da vítima c) o nexo causal entre o ato culposo e o dano. Em sentido amplo, o ato culposo é estabelecido pelo artigo 186 do CC a título de dolo e culpa: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. A culpa, em sentido estrito, pode se dar através de imprudência, imperícia ou negligência. Imprudência consiste na ação precipitada, desponderada, irrefletida, na qual não procura o agente evitar um resultado previsível. Ocorre por meio de atitude ativa (comissiva), praticada quando o agente toma atitudes não justificadas, sem usar de nenhuma cautela. Imperícia é a inabilidade, a ignorância, a falta de conhecimento ou técnica profissional, revelando-se na condução de encargo ou serviço que venha a causar dano por falta de conhecimento acerca da imaestria da arte, profissão ou encargo. Por fim, negligência é a desatenção, a incúria, a inércia, o descaso, a desídia, a falta de cuidado capaz de gerar responsabilidade com culpa. Pela negligência, a culpa equivale a uma conduta passiva (omissiva). Como prova do acidente, os autores juntaram aos autos o boletim de ocorrência (ev.1.12) e vídeos que demonstram o momento da colisão (ev.1.37/1.38). Além disso, há a declaração de uma testemunha ocular (1.13). Há também os prontuários e exames médicos dos autores (ev.1.15/1.30), nota fiscal de compra de medicamentos (ev.1.31) e orçamento para conserto da motocicleta (ev.1.32/1.35). Foi produzida prova oral consistente no depoimento pessoal do autor e na oitiva de três testemunhas (ev.113.2/113.6). Em seu depoimento, o autor relatou que que é pai da Mellany, que à época do acidente estava com 12 anos; que parou no semáforo na Ultrapack, que o sinal abriu e que os sinais daquelas ruas abrem contínuo; que quando chegou na Rua do Rosário se deparou com o automóvel; que tem um semáforo na rua que ocorreu o acidente; que quando passou o sinal estava verde; que a velocidade máxima permitida no trajeto é 50km, mas não lembra qual era a velocidade que estava; que quem dirigia o veículo era o Sr. Anuar; que, como sequela, não ergue mais peso, devido a fratura da escapula; que sua filha ficou bastante traumatizada, inclusive, até hoje; que sua filha ficou 7/8 dias internadas, mas não tem sequela física; que ficou 1 dia hospitalizado; que não fez cirurgias; que trabalhava como pedreiro registrado anteriormente, recebendo uma média de 3 mil; que ficou afastado por 45 dias e recebeu auxilio acidente do INSS, por volta de 2 mil; que, posteriormente, ao retornar ao trabalho, ficou em outra função, devido a restrição médica de não conseguir levantar mais peso; que foi mandando embora do emprego após 1 mês do retorno e ficou fazendo “bicos”, praticamente, por 2024 inteiro; que recebeu seguro desemprego, no valor de um salário mínimo; que, à época que fez “bicos”, recebia, em média, 2 mil reais contando com o seguro; que recebeu o seguro por 4 meses; que em 2025 entrou em uma empresa de manutenção; que a moto era sua, mas não foi consertada e está abandonada; que o valor do orçamento para o conserto era, por volta, de 17 mil, sendo este o valor da moto também; que não recebeu o seguro DPVAT, que está suspenso e não está pagando; que a Mellany tem pavor de moto e nunca mais andou; que não sabe informar se a Mellany ficou com alguma restrição, pois não tem muitas informações sobre ela; que, hoje em dia, não tem desejo de andar mais de moto e tem medo; que não mora com a Mellany; que a Sr.Maria mandou ele ligar para seguradora, o que foi feito e que o rapaz que o atendeu informou que o cliente não se sente culpado; que em nenhum momento a Sr.Maria e o motorista assumiram culpa pelo acidente; que, após o acidente, ligou para o Sr.Anuar e ele falava que estava preocupado com a Mellany; que o Sr.Anuar não falou o que aconteceu no acidente; que ficou por um momento inconsciente no momento do acidente; que não falou com o Sr.Anuar no momento do acidente; que a Sra. Mariana estava trafegando na mesma via que ele e acredita que ela estava atrás dele; que não lembra de Mellany passou por cirurgia; que o Sr.Anuar permaneceu no local; que não lembra quanto tempo demorou para chegar socorro no local. A testemunha Mariana Aurora Almeida Correa afirmou que presenciou o acidente; que conhece a esposa do Sr. Fábio, mas só conhecia ele de vista; que não conhece o Sr. Anuar e a Sra. Maria; que, na via do acidente, estava no sentido da moto e ,entre o seu veículo e a moto, tinha outros dois veículos; que estava do lado esquerdo e a moto do lado direito; que estava descendo a Rua do Rosário; que acredita que o sinal já tinha aberto, pois no semáforo do posto, viu os veículos andando, então provavelmente todos os sinais estavam aberto; que o sinal do cruzamento estava verde; que não falou com o motorista do veículo; que soube que a Mellany ficou em estado grave e que o Sr. Fábio ficou fraturado; que soube que o Sr. Fábio ficou um tempo sem trabalhar e que pelo que sabe ele era pedreiro; que quando chegou ao local não tinha ninguém prestando socorro; que uma moça, que era médica, apareceu para prestar ajuda a Mellany; que acredita que o socorro chegou, no máximo, 5/10 minutos; que confirma que o sinal estava aberto para moto, conforme depoimento prestado na delegacia. Que viu o sinal abrir do posto, depois da Ultrapack. A testemunha Suzi de Paula Silva informou que conhece o Sr. Fábio e Mellany da igreja; que não presenciou o acidente; que só viu o motorista quando todos estavam indo para hospital e que, para ela, ele não falou nada sobre o acidente; que não falou com ninguém sobre o acidente no dia; que o Sr. Fábio falou que estava passando e o carro furou a preferencial; que, à época, Mellany ficou afastada da igreja, pois estava internada e que ela tinha trauma de sair de casa, não sabendo informar se ainda tem; que não tem visto Mellany na igreja; que o Sr. Fábio ficou um problema no ombro e lembra dele mancando na igreja; que o Sr. Fábio era autônomo, à época, trabalhando como pedreiro; que o Sr. Fábio ficou sem trabalhar e que fizeram uma ajuda para ele na igreja; que a moto deu “PT”, pois no dia chamou os meninos da igreja para carregar a moto até a igreja. A testemunha Alessandra Kelly Soares de Freitas afirmou que conheceu o Sr. Anuar e a Sra. Maria no dia do acidente; que foi a médica que prestou os primeiros socorros a Mellany; que o Sr. Anuar estava lá, fora do veículo, quando ela chegou; que o Sr. Anuar conversou com pessoas que estavam circulando, mas não se recorda de ter escutado algo; que não viu o acidente, apenas escutou, pois foi na esquina da sua casa; que recorda de ter escutado o som de aceleração da moto, não sabendo dizer a velocidade; que, na avaliação inicial, aparentemente, Mellany não tinha sequelas; que quando chegou o socorro especializado, se retirou; que não sabe se o Sr. Fábio teve sequelas; que o Sr.Anuar e Sra. Maria foram a sua casa para perguntar se a câmera da sua casa tinha a gravação do acidente, mas não tinha, pois só funciona ao vivo, não grava; que quando chegou ao local Mellany não estava consciente e usava capacete que parecia ser de adulto; que um trauma de alto impacto pode fazer o cérebro se deslocar um pouco. Do conjunto probatório, observa-se que as partes se envolveram em acidente no cruzamento entre as Ruas Coronel Bitencourt e Rua do Rosário, e os autores atribuem a responsabilidade ao réu, vez que realizou o cruzamento quando o semáforo estava vermelho. Pelos vídeos colacionados não é possível identificar se o semáforo estava verde, amarelo ou vermelho para o réu (ev.1.37/1.38). Entretanto, a testemunha ocular ouvida em audiência, Sra. Mariana, confirmou que transitava na via em que trafegavam os autores e visualizou, do posto, que se localiza na rua acima, que o sinal estava verde para os autores. Embora os réus tenham arguido a existência de divergência no depoimento da testemunha, não é o que se constata no caso em tela, já que esta foi clara e contundente ao afirmar que o sinal estava aberto para o autor, não apresentando nenhuma incerteza. Inclusive, nem mesmo o réu, condutor do veículo, nega a versão de que cruzou o sinal vermelho, apenas arguindo que não há como ter certeza de que o sinal estava vermelho. Ainda, importante consignar que a testemunha Mariana se encontrava na mesma via e próxima da motocicleta dos autores, que o tempo estava bom e claro, o que lhe possibilitava ver a dinâmica do acidente. Assim, pela prova produzida nos autos restou demonstrado que o réu avançou o sinal vermelho, já que infringiu a norma disposta no art.208 do CTB: Art. 208. Avançar o sinal vermelho do semáforo ou o de parada obrigatória, exceto onde houver sinalização que permita a livre conversão à direita prevista no art. 44-A deste Código: Desse modo, impõe-se o reconhecimento da culpa dos réus. b) Dos danos materiais O dano material é a lesão concreta que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável. O dano patrimonial pressupõe sempre ofensa ou diminuição de certos valores econômicos. No presente caso os danos materiais consistem no montante necessário para o conserto da motocicleta, na quantia de R$ 17.278,00 e a quantia arcada com medicamentos, no valor de R$ 57,70. Os réus não impugnaram os valores, aplicando-se o disposto no art.341 do CPC. No entanto, a fim de evitar enriquecimento ilícito, e considerando que o montante a ser dispendido para conserto da motocicleta é maior do que o valor do próprio bem na Tabela Fipe na época do acidente, a indenização em relação ao veículo deve se limitar a tal patamar, com os devidos consectários legais. Nesse sentido: RECURSOS INOMINADOS (2). ACIDENTE DE TRÂNSITO. CULPA DA RÉ NO ACIDENTE INCONTROVERSA. INSURGÊNCIA RECURSAL LIMITADA AOS MONTANTES INDENIZATÓRIOS . PERDA TOTAL DO VEÍCULO. RESSARCIMENTO COM BASE NA TABELA FIPE DA ÉPOCA DO ACIDENTE. PRECEDENTE DO STJ. DANOS MATERIAIS RELATIVOS AO VEÍCULO LIMITADO AO TETO DA TABELA FIPE . AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DO CAPACETE. AUTORA QUE COMPROVOU OS GASTOS COM LOCOMOÇÃO ENQUANTO AGUARDAVA O RECEBIMENTO DO PRÊMIO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS NO CASO CONCRETO. VÍTIMA QUE SOFREU LESÕES CORPORAIS . QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS. (TJ-PR 0000992-66 .2022.8.16.0131 Pato Branco, Relator.: Fernanda Bernert Michielin, Data de Julgamento: 08/03/2024, 2ª Turma Recursal, Data de Publicação: 27/03/2024) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL.AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. ACIDENTE DE TRÂNSITO . CRUZAMENTO SINALIZADO. CONDUTOR REQUERIDO QUE AVANÇÕU SINAL VERMELHO. CULPA CONFIGURADA. DEVER DE INDENIZAR . DANOS MATERIAIS. CONSERTO DO VEÍCULO QUE SUPERA O PREÇO DE MERCADO. INDENIZAÇÃO QUE DEVE FICAR LIMITADA AO VALOR DO VEÍCULO PREVISTO NA TABELA FIPE NA DATA DO EVENTO, DESCONTADA A IMPORTÂNCIA DO SALVADO. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO . (TJPR - 9ª C. Cível - AC - 1601876-1 - Cascavel - Rel.: Desembargador Coimbra de Moura - Unânime - J. 08 .02.2018) (TJ-PR - APL: 16018761 PR 1601876-1 (Acórdão), Relator.: Desembargador Coimbra de Moura, Data de Julgamento: 08/02/2018, 9ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 2205 22/02/2018) Desse modo, restando demonstrada a culpa do réu, diante da prova da culpa, do nexo causal e dos danos, impõe-se o acolhimento da pretensão inicial quanto aos danos materiais. c) Dos danos morais O dano moral constitui uma lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica provocada por fato lesivo. É o dano que não produz qualquer efeito patrimonial, o constrangimento que alguém experimenta em consequência de lesão em direito personalíssimo, ilicitamente produzida por outrem. Diante de sua configuração, os lesados indiretos e a vítima poderão reclamar sua reparação pecuniária, embora não peçam um preço para a dor que sentem ou sentiram, mas, tão-somente, que se lhes outorgue um meio de atenuar, em parte, as consequências da lesão jurídica por eles sofrida. Os autores sustentam que a autora permaneceu internada em UTI, sentiu dores, vários dias em crise, confusão mensal e concussão cerebral sofrida, inclusive com coágulo em razão do acidente; já o autor sofreu fatura em um dos punhos e escápulas, o que lhe impossibilitou de trabalhar por 45 dias e não sabe se poderá ter vida normal como antes do acidente. Pelo que consta dos autos, o autor sofreu fratura em punho e escápula, recebendo liberação na mesma data do acidente (ev.1.16). Além disso, embora tenha recebido alta para retorno ao trabalho, teve restrição para evitar grandes esforços (ev.1.28), o que contraria o cargo que atuava na época, vez que era pedreiro (ev.1.8). Já a autora tinha na época do acidente 12 anos de idade, chegou para atendimento médico com oscilação de nível de consciência, agitada, confusa e chorosa e ficou por mais de 4 dias internada a fim de fosse realizada a vigilância neurológica, inclusive passando o Natal internada (ev.1.23). Cahali traz como definição de dano moral “a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos”, tratando-se de dano “em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)” [2]. Assim, considerando que ambos os autores sofreram lesões decorrentes do acidente, a idade da autora na época do acidente - o que acarreta uma maior dificuldade em entender os fatos da vida e que esta permaneceu internada, é inconteste a ocorrência de abalo moral, não podendo o acidente em tela ser considerado mero dissabor. Em casos análogos: RECURSO INOMINADO – JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS EM FACE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – ACIDENTE DE TRÂNSITO –SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE RECLAMADA (ESTADO) – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E POR DANOS MORAIS – ALEGAÇÕES RECURSAIS GENÉRICAS DE ILEGITIMIDADE ATIVA, AUSÊNCIA DE BURACO NA PISTA, AUSÊNCIA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – PLEITO DE REFORMA DE SENTENÇA QUE NÃO MERECE ACOLHIMENTO – CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EVIDENCIADA – MÁ CONSERVAÇÃO DA RODOVIA – CAUSA PRIMÁRIA E DETERMINANTE DO ACIDENTE - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – DANOS MATERIAIS E MORAIS COMPROVADOS – RISCO À INTEGRIDADE FÍSICA – SEM LESÃO CORPORAL – DANO MORAL CONFIGURADO QUANTUM MANTIDO EM R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS)- SENTENÇA MANTIDA POR OUTROS FUNDAMENTOS JURÍDICOS. REFORMA EXCLUSIVAMENTE PARA ALTERAR OS CONSECTÁRIOS LEGAIS. Recurso da parte reclamada conhecido e parcialmente provido . (TJ-PR 00001244820228160209 Francisco Beltrão, Relator.: Marco Vinicius Schiebel, Data de Julgamento: 23/11/2024, 4ª Turma Recursal, Data de Publicação: 24/11/2024) APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SERVIDOR PÚBLICO . ACIDENTE DE TRABALHO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO MUNICÍPIO (1). RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA . ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. OMISSÃO ESTATAL NO DEVER DE ZELAR PELA SEGURANÇA DO SERVIDOR. DESEMPENHO DE ATIVIDADE EM DESACORDO COM RESTRIÇÕES IMPOSTAS EM READEQUAÇÃO, QUE RESULTOU EM LESÃO À INTEGRIDADE FÍSICA DO SERVIDOR . PROVA DE QUE A CHEFIA EXIGIA A REALIZAÇÃO DA TAREFA QUE CULMINOU NO ACIDENTE. CULPA EXCLUSIVA OU CONCORRENTE DA VÍTIMA NÃO CARACTERIZADA. PRESCINDIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO DANO MORAL. OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA . DANO “IN RE IPSA”. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. PLEITO DE REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO, INVERSÃO OU REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL NÃO ACOLHIDOS. RECURSO DO AUTOR (2) . PENSÃO MENSAL VITALÍCIA DEVIDA. DANO QUE CAUSOU REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. ART. 950 DO CÓDIGO CIVIL . MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO À TITULO DE DANO MORAL. CABIMENTO. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA INCIDENTES SOBRE O DANO MORAL. DATA DO EVENTO DANOSO . SÚMULA Nº 54/STJ. SENTENÇA REFORMADA PARA JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS. CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO AO PAGAMENTO INTEGRAL DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS . SENTENÇA ILÍQUIDA. DELEGAÇÃO DA FIXAÇÃO DO PERCENTUAL PARA O JUÍZO DA LIQUIDAÇÃO. RECURSO (1) DESPROVIDO E RECURSO (2) PROVIDO. (TJ-PR 00050857020198160004 Curitiba, Relator.: Rogério Luis Nielsen Kanayama, Data de Julgamento: 11/03/2024, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 12/03/2024) APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO CIVIL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA DE DANOS MATERIAIS, CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA – ACIDENTE DE TRÂNSITO – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL – ACIDENTE QUE ATINGIU A INTEGRIDADE FÍSICA DO AUTOR – DANOS MORAIS IN RE IPSA – ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTE TRIBUNAL – MONTANTE INDENIZATÓRIO – MINORAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – IMPORTE MANTIDO EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS) – OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE – PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1 . Presume-se a ocorrência de dano moral em caso de acidente de trânsito com vítima por decorrer de ofensa à integridade física da pessoa, ou seja, independe de demonstração do dano concreto, necessitando apenas da demonstração do fato, ora incontroverso nos autos. 2. Considerando-se as peculiaridades do caso concreto, as funções pedagógicas e inibitória da reprimenda, o caráter compensatório pela aflição e intranquilidade causadas pelo ato ilícito, a gravidade e a duração da lesão, a possibilidade de quem deve reparar o dano e as condições econômicas e sociais dos ofendidos, necessária a manutenção da indenização fixada na sentença referente aos danos morais, em R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada autor, quantia que se mostra razoável e proporcional . (TJPR - 8ª Câmara Cível - 0012132-76.2017.8.16 .0130 - Paranavaí - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ADEMIR RIBEIRO RICHTER - J. 06.03 .2023) (TJ-PR - APL: 00121327620178160130 Paranavaí 0012132-76.2017.8.16 .0130 (Acórdão), Relator.: Ademir Ribeiro Richter, Data de Julgamento: 06/03/2023, 8ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/03/2023) Dessa forma, diante da existência de ofensa moral à parte autora, do nexo de causalidade entre o ato ilícito do réu e o evento danoso, conclui-se pela configuração do dano moral, consoante prevê o art. 5º, inc. X da Constituição Federal. Via de consequência, cabível o direito à indenização, nos termos do art. 186 do CC, restando analisar o “quantum” indenizatório. Infere-se que o dano moral, no bojo dos princípios éticos e morais que norteiam nossa sociedade, atinge violações a direitos não patrimoniais, a exemplo da imagem, da honra, da privacidade, da auto-estima, da integridade psíquica, do nome etc. Nesse sentido, a apuração do quantum indenizatório não é tarefa fácil, porquanto o bem lesado (a honra, o sentimento, o nome etc) não se mede monetariamente, ou seja, não tem dimensão econômica ou patrimonial. Cabe, assim, ao prudente arbítrio do juiz e à força criativa da doutrina e da jurisprudência a instituição de critérios e parâmetros que haverão de presidir as indenizações por dano moral. Não se trata de um valor que se submete ao livre talante do julgador, sem quaisquer critérios, já que se deve ter em conta o escopo da reparação. No que pertine à figura do lesado, a reparação tem o fim de atenuar o seu sofrimento, uma vez que a supressão total não é possível faticamente. Por outro lado, no que tange ao lesante, tem-se por mira, com a fixação do quantum indenizatório, impor-lhe uma sanção para que seja desestimulado a praticar atos lesivos à personalidade de outrem. Dessa forma, o valor da reparação assume um duplo sentido, satisfativo-punitivo, sendo recomendável, entretanto, que o arbitramento seja razoável, com moderação e cuidado, sob pena de enriquecimento sem causa. Sobre o tema, assim ensina Caio Mário da Silva Pereira[3]: "A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva". Para Carlos Alberto Bittar[4], a indenização visa “restabelecer o equilíbrio no mundo fático rompido pelas conseqüências da ação lesiva, porque interessa à sociedade a preservação do equilíbrio da ordem existente e a defesa dos valores que reconhece como fundamentais na convivência humana”. Pelo exposto, diante a) da situação econômica das partes, a autora estudante e o autor pedreiro na época dos fatos, o réu aposentado e a ré de qualificação desconhecida; b) da repercussão do fato na vida pessoal de cada um dos autores; c) da potencialidade da ofensa; e, por fim; d) ante ao binômio compensação-punição, arbitro a reparação a título de dano moral no valor de R$ 5.000,00 para o autor e R$ 8.000,00 para a autora. III – DECISÃO ISTO POSTO, frente às normas legais referendadas e pelo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do art. 487 do CPC, para o fim de: a) condenar os réus a pagar indenização por danos materiais em favor do autor no montante de R$ 15.501,00 referente à motocicleta e R$ 57,70, corrigido monetariamente e acrescido de juros de mora pela taxa do art. 406 do CC, ambos a partir do evento danoso. b) condenar os réus a pagar indenização por danos morais em favor da autora, no valor de R$ 8.000,00, corrigido monetariamente a partir da presente sentença e acrescido de juros de mora pela taxa do art. 406 do CC a partir do evento danoso; c) condenar os réus a pagar indenização por danos morais em favor do autor, no valor de R$ 5.000,00a, corrigido monetariamente a partir da presente sentença e acrescidos de juros de mora pela taxa do art. 406 do CC a partir do evento danoso. Ressalte-se que diante da alteração trazida pela Lei 14905/2024 no disposto no art.406 do CC, deverá ocorrer a modulação da aplicação dos índices, isto é, INPC/IGP-DI e juros de mora de 1% ao mês até 29.08.2024; e a partir de 30.08.2024 IPCA e SELIC com dedução do IPCA, respeitados os devidos termos iniciais. Por fim, diante da sucumbência dos réus, condeno-os ao pagamento das custas, despesas processuais, bem como honorários advocatícios, estes fixados em 14% sobre o valor da condenação, considerando a complexidade da matéria versada (com audiência de instrução), o tempo despendido para a solução da causa (1 ano e quatro meses), o bom trabalho desenvolvido pelos profissionais e o lugar da prestação do serviço (ambos os procuradores residem nesta Comarca), conforme dispõe o art. 85, § 2° do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Dê-se ciência ao Ministério Público. [1] “Código Civil Anotado”, São Paulo: Saraiva, 1995, p. 152. [2] “CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 2. ed. rev., atual. e ampl. 3. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 20. [3]“Responsabilidade Civil”, cit. nº 49, p. 67, apud Juris Síntese Millennium, nº 44, 2002. [4]“Reparação por danos morais”, 3ª ed., SP: RT, 1999, pp. 25/26. Ponta Grossa, 11 de julho de 2025. Franciele Narciza Martins de Paula Santos Lima Juíza de Direito

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Esperanca Vigilancia Ltda e outros x Juízo Da Vara Do Trabalho De Penápolis

ID: 333806678

Tribunal: TRT15 Órgão: 2ª Seção de Dissídios Individuais Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 0010015-15.2025.5.15.0000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

ESPERANCA VIGILANCIA LTDA ESTADO DE SAO PAULO FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

JUÍZO DA VARA DO TRABALHO DE PENÁPOLIS

Acórdão

Advogados:

CLAUDIA APARECIDA MAGALHAES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 2ª SEÇÃO DE DISSÍDIOS INDIVIDUAIS Relatora: ANTONIA REGINA TANCINI PESTANA MSCiv 0010015-15.2025.5.15.0000 IMPET… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO 2ª SEÇÃO DE DISSÍDIOS INDIVIDUAIS Relatora: ANTONIA REGINA TANCINI PESTANA MSCiv 0010015-15.2025.5.15.0000 IMPETRANTE: FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS AUTORIDADE COATORA: JUÍZO DA VARA DO TRABALHO DE PENÁPOLIS 2ª SEÇÃO DE DISSÍDIOS INDIVIDUAIS MANDADO DE SEGURANÇA Nº 0010015-15.2025.5.15.0000 IMPETRANTE: FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS IMPETRADO: JUÍZO DA VARA DO TRABALHO DE PENÁPOLIS AUTORIDADE COATORA: CLEBER ANTÔNIO GRAVA PINTO TERCEIRO INTERESSADO: ESPERANÇA VIGILÂNCIA LTDA TERCEIRO INTERESSADO: ESTADO DE SÃO PAULO CUSTOS LEGIS: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Gab17 Relatório Trata-se de mandado de segurança com pedido liminar impetrado por FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS contra ato praticado pelo MM. Juízo da Vara do Trabalho de PENÁPOLIS, nos autos da reclamação trabalhista nº 0010126-15.2025.5.15.012, ajuizada pelo ora impetrante em desfavor de ESPERANÇA VIGILÂNCIA LTDA e do ESTADO DE SÃO PAULO. Alega, em síntese, que sua empregadora perdeu o posto de trabalho que mantinha no Ministério Público do Estado de São Paulo onde desempenhava suas funções de vigilante, requerendo a concessão de liminar na origem para determinar a anotação de baixa em sua CTPS, a entrega de guias TRCT e para habilitação no seguro-desemprego ou, ainda, a emissão de alvará com a declaração imediata de rescisão contratual com o bloqueio de faturas e cauções. Porém, além de o pedido ser indeferido o impetrante foi punido com a determinação para pagamento de multa por litigância de má-fé. Requer a concessão de liminar a fim de que seja autorizado o saque imediato dos depósitos de FGTS com a liberação do seguro-desemprego e, ainda, para que seja afastada a multa por litigância de má-fé. Atribuiu à causa o valor de R$ 3.415,61 . A liminar pretendida foi parcialmente deferida em 20/03/2025 (id. d39ff63). O Juízo impetrado prestou informações. O Ministério Público do Trabalho opinou pelo prosseguimento do feito. É o relatório. Fundamentação VOTO Reputo cabível a presente ação mandamental, dela portanto conhecendo, nos termos do entendimento jurisprudencial contido no item II da redação conferida à Súmula 414, do C. TST. Em análise liminar foi acolhido em parte o pedido do impetrante mediante os seguintes fundamentos e considerações: "Vistos. Trata-se de mandado de segurança com pedido liminar impetrado por contra ato praticado pelo MM. Juízo FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS da Vara do Trabalho de Penápolis, nos autos da reclamação trabalhista nº 0010126-15.2025.5.15.0124 por ele ajuizada em face de ESPERANÇA VIGILÂNCIA LTDA. e do ESTADO DE SÃO PAULO. Na petição inicial da ação de origem o reclamante narra, em síntese, que sua empregadora perdeu o posto de trabalho que mantinha no Ministério Público do Estado de São Paulo onde desempenhava suas funções de vigilante, requerendo a concessão de liminar para determinar a anotação de baixa em sua CTPS,a entrega de guias TRCT e para habilitação no seguro-desemprego ou, ainda, a emissão de alvará com a declaração imediata de rescisão contratual e o bloqueio de faturas e cauções. Os pedidos foram indeferidos na origem que lhe aplicou pena de multa por litigância de má-fé, considerando que a tutela de urgência formulada é vedada pela lei, fundamentando nesse ponto que: ...a pretensão esbarra no óbice inserto no art. 29-B da Lei federal nº 8.036/90, o qual veda a concessão de medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, assim como a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil de 1973 (correspondentes aos arts. 300 e 497 do atual CPC) que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS, do que resulta a indiscutível conclusão no sentido de que o dispositivo legal em análise impõe, como óbice intransponível ao acesso aos valores do FGTS, a prévia existência de um pronunciamento judicial devidamente acobertado pela coisa julgada material." - 59bf7fe Diante da referida decisão, o impetrante requer a concessão de tutela provisória de forma liminar para que seja autorizado o saque imediato dos depósitos de FGTS com a liberação do seguro-desemprego e, ainda, para afastar a multa aplicada por litigância de má-fé. DECIDO Reputo cabível a ação mandamental, por se tratar de decisão que não apresenta recurso imediato com efeito suspensivo. A decisão impetrada foi exarada nos seguintes termos: "Vistos e examinados. Com a entrada em vigor do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, estabeleceu o ordenamento jurídico o sistema da Tutela Provisória (gênero) do qual decorrem as espécies Tutela de Urgência (Antecipada e Cautelar) e a Tutela de Evidência. Sem embargo da nova racionalização sistêmica dos institutos voltados à concessão de provimentos de urgência pelo CPC, verifica-se da dicção do art. 300 do referido diploma legal que a concessão da tutela de urgência de natureza antecipada ou cautelar depende da existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo e, no caso da tutela de urgência concedida antecipadamente, a medida não será deferida caso exista perigo de irreversibilidade, a teor do art. 300, § 3º, do CPC. Depreende-se das alegações iniciais que o autor pretende a obtenção, por meio de tutela de urgência na modalidade antecipada, de alvará destinado à movimentação dos valores correspondentes ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) existentes em sua conta vinculada e/ou registro do término do contrato junto à CTPS, assim como a certidão judicial necessária à sua habilitação junto ao programa do Seguro Desemprego. Quanto ao pleito antecipatório de expedição de Alvará destinado a viabilizar a movimentação da conta vinculada do autor, cumpre destacar que a pretensão esbarra no óbice inserto no art. 29-B da Lei federal nº 8.036/90, o qual veda a concessão de medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, assim como a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil de 1973 (correspondentes aos arts. 300 e 497 do atual CPC) que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS, do que resulta a indiscutível conclusão no sentido de que o dispositivo legal em análise impõe, como óbice intransponível ao acesso aos valores do FGTS, a prévia existência de um pronunciamento judicial devidamente acobertado pela coisa julgada material. Cumpre destacar que, no aspecto em que estabelece restrições ao deferimento de liminares em mandados de segurança e ações cautelares, assim como a concessão de tutela antecipada, de caráter cautelar ou fundada em elementos de evidência, a constitucionalidade do art. 29-B foi reconhecida pelo C. Supremo Tribunal Federal(STF) por ocasião do julgamento das ADIs 2382, 2425 e 2479 e devidamente reafirmada nos autos da Rcl 39196 (Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Julgamento: 20/2/2020, Publicação: 2/3/2020), a qual também evidencia tratar se de absoluto sofismo o entendimento artificialmente construído com o objetivo de contornar, de modo ilegítimo, o quanto disposto em lei e já devidamente interpretado pela própria Corte Constitucional, o qual apregoa que a proibição insculpida no art. 29 B da Lei 8.036/90 refere-se apenas a pedidos deduzidos em face do agente operador do FGTS, ou seja, que a vedação legal teria sido estabelecida tão somente em relação aos requerimentos de concessão de liminares e antecipações de tutela destinadas à liberação do FGTS formulados em ações ajuizadas contra a Caixa Econômica Federal, o que difere da postulação deduzida com supedâneo em pedido realizado contra ex empregador. Eis o inteiro teor da Rcl 39196, a qual merece ser transcrita, a fim de corroborar que a presente decisão encontra-se em absoluta sintonia com o entendimento consagrado pelo C. STF acerca da matéria: Decisão Trata-se de Reclamação contra decisão do Relator do Mandado de Segurança 1003837.06.2019.5.02.0000 do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, que teria desrespeitado a autoridade das decisões proferidas por esta CORTE no julgamento das ADI's 2.382, 2.425 e 2.479 (Redator para o Acórdão Min. EDSON FACHIN, Pleno, DJe de 10/10/2018). O reclamante expõe, inicialmente, o seguinte contexto fático (doc. 1, fls. 2-5): A reclamante trabalhista postulou demanda na Justiça do Trabalho buscando o recebimento de seus haveres rescisórios. E pleiteou no processo digital nº ATOrd 1001470 51.2019.5.02.0374, pedido liminar de levantamento de seus depósitos da conta do FGTS, foi quando o juiz do trabalho da 4ª Vara do Trabalho de Mogi das Cruzes, indeferiu o pedido sob o argumento da decisão desta suprema corte que declarou a constitucionalidade do art. 29-B da Lei 8.036 /90, no bojo das ADIns 2382; 2425 e 2479. Por consequência do inconformismo, a reclamante trabalhista buscou a segunda instância - via mandado de segurança (processo eletrônico nº1003837 06.2019.5.02.0000), em que, mesmo após ter o juiz do trabalho prestados as informações ao TRT, o Relator Convocado achou por bem deferir a liminar desafiando a autoridade dos julgados vinculantes do STF. (...) O processo em destaque, está, atualmente, aguardando as contestações, situação que torna à luz ausência de trânsito e julgado; e ainda, afasta o sucedâneo recursal desta reclamação. Sustenta, em síntese, que "é nítida a violação da decisão proferida em ADIns 2382; 2425 e 2479, pois, esta, declina a constitucionalidade do art. 29-B da Lei 8.036/90, que veda a concessão de medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outra ações de natureza cautelar ou preventiva, nem a tutela antecipada, que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS: '[...]Art. 29 B. Não será cabível medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, nem a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS'" (doc. 1, fl. 8). Argumenta, para tanto, que "a Justiça Especializada, por seu órgão de segunda instância não se vinculou aos efeitos das ADIns 2382; 2425 e 2479 o que afrontou a autoridade da decisão da Corte Maior, produzindo a necessidade de interferência do Augusto Tribunal, perante a Justiça laboral" (doc. 1, fl. 8). Requer, ao final, "liminarmente, que seja deferida a suspensão do feito na origem, até a decisão final desta Reclamação, sob pena de prejuízo ao interesse público". No mérito, pede "a procedência da Reclamação, confirmando se a liminar retro, com o imediato cumprimento da decisão cassando a decisão exorbitante de seu julgado proferida pela Justiça do Trabalho, a garantir a autoridade dasADIns 2382; 2425 e 2479 até decisão final da ação trabalhista, como medida adequada à solução da controvérsia (CPC, art. 992 e 993)" (doc. 1, fl. 9). É o breve relato do necessário. Decido. A respeito do cabimento da reclamação para o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, dispõem os arts. 102, I, "l", e 103-A, caput e § 3º, ambos da Constituição Federal: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. Veja-se também o art. 988, I, II e III, do Código de Processo Civil de 2015: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III - garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; Os paradigmas invocados são as ADI's 2.382, 2.425 e 2.479 (Redator p/ o Acórdão Min. EDSON FACHIN, Pleno, DJe de 10/10/2018), julgadas improcedentes por esta SUPREMA CORTE. No julgamento das referidas ações diretas, o Tribunal Pleno, no ponto de interesse para a solução do presente caso, assentou que "a garantia fundamental da inafastabilidade de jurisdição não é afrontada pela vedação de medidas judiciais autorizadoras da movimentação das contas vinculadas do FGTS". Ao fazê-lo, o Plenário deste TRIBUNAL assentou a constitucionalidade da redação conferida ao art. 29-B da Lei 8.036/1990 pela Medida Provisória 2.197-43/2001, que possui o seguinte teor: Art. 29-B Não será cabível medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, nem a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS. Com relação ao ponto em debate, fiquei vencido na ocasião, pois, conforme registrei em meu voto, considero que medidas que impeçam a atividade jurisdicional como um todo, nesse caso, em particular, o exercício do poder geral de cautela pelo Poder Judiciário, infringem a previsão constitucional de inafastabilidade de Poder Judiciário (CF, art. 5º, XXXV), sendo, por essa razão, inconstitucionais. Não obstante minha posição em sentido contrário, eis a ementa resultante do julgamento das ADI's 2.382, 2.425 e 2.479 (Redator p/ o Acórdão Min. EDSON FACHIN, Pleno, DJe de 10/10/2018), idêntica nos três julgados: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA. REQUISITOS DA RELEVÂNCIA E URGÊNCIA. DIREITO À REPRESENTAÇÃO SINDICAL. CONTAS VINCULADAS AO FGTS. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. 1. A averiguação da presença dos requisitos da relevância e urgência para edição de medidas provisórias, não obstante possível como atividade jurisdicional desta Corte, não encontra, no presente caso, a excepcionalidade necessária para seu exercício. 2. Se ao tempo da edição da medida provisória, as suas disposições normativas obedeceram aos parâmetros constitucionais estabelecidos, não há inconstitucionalidade formal a ser declarada. 3. A exigência de comparecimento pessoal, vinculação dos depósitos referentes à correção dos saldos das contas respectivas e proibição de concessão de medidas judiciais para saque ou movimentação das contas referentes ao FGTS constituem restrições constitucionais que não atingem o núcleo essencial do direito à representação sindical e da Advocacia como função essencial à Justiça. 4. A garantia fundamental da inafastabilidade de jurisdição não é afrontada pela vedação de medidas judiciais autorizadoras da movimentação das contas vinculadas do FGTS. 5. Pedido da ação direta de inconstitucionalidade julgado improcedente (grifei). Na presente hipótese, assiste razão jurídica ao reclamante. A decisão impugnada deferiu medida liminar para determinar a expedição de alvará de modo a permitir a movimentação da conta de FGTS da ora beneficiária, em contrariedade ao disposto no art. 29-B da Lei 8.036/1990 (na redação dada pela Medida Provisória 2.197-43 /2001), conforme demonstrado no trecho a seguir transcritos (doc. 4, fls. 7-8): Um último argumento emerge da redação do próprio texto normativo tido por constitucional: "29-B. Não será cabível medida liminar em mandado de segurança, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, nem a tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS." Tal restrição não tangencia a tutela de evidência, que, como se sabe, segundo o artigo 311, do CPC, dispensa a comprovação da urgência e exige demonstração da viabilidade do direito, como ensina Donizetti: "a tutela de evidência não está lastreada na urgência, mas na evidência das provas apresentadas desde logo pelo autor, assim com o na hipótese de ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte" (DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de Direito Processual Civil. 19ª edição. São Paulo: Atlas, 2016.) Os elementos comprovados na inicial da reclamação trabalhista contemplam confirmação de ser a impetrante titular do direito à tutela de evidência, e, por isso, deve ser alterada a douta decisão impetrada, que constitui violação a direito líquido e certo. Em juízo de cognição sumária, defiro a liminar requerida, para que a vara em que tramita o processo expeça alvará para movimentação da conta do FGTS da impetrante. Como se observa, o Juízo reclamado deixou de observar a vedação legal, considerada hígida por esta SUPREMA CORTE, no que diz respeito à concessão de medida liminar ou tutela antecipada que impliquem saque ou movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS - em manifesta afronta ao resultado produzido pelo julgamento das ADI's 2.382, 2.425 e 2.479 (Redator p/ o Acórdão Min. EDSON FACHIN, Pleno, DJe de 10 /10/2018). Diante do exposto, com base no art. 161, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, JULGO PROCEDENTE a presente Reclamação para cassar a decisão impugnada (Mandado de Segurança 1003837-06.2019.5.02.0000, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região). Nos termos do art. 52, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, dispenso a remessa dos autos à Procuradoria-Geral da República. Comunique-se. Publique-se. Brasília, 20 de fevereiro de 2020. Ministro Alexandre de Moraes Relator Diante de tais circunstâncias, a rejeição do pedido de concessão da tutela de urgência na modalidade antecipada para fins expedição de alvará destinado ao acesso do autor aos valores do FGTS é medida que se impõe em face da legislação de regência. Verificado que, na hipótese destes autos, intenta o autor a concessão de um provimento de urgência cuja admissibilidade é expressamente vedada por texto expresso de lei, comino-lhe multa por litigância de má-fé, em importe correspondente a 2% (dois por cento) do valor corrigido da causa, a teor do quanto disposto no art. 793-C, Consolidação da Leis do Trabalho (CLT), de vez que configurada a hipótese tipificada pelo inciso I do art. 793-B, deste mesmo diploma legal. No que concerne ao pleito antecipatório de expedição de "alvará" destinado a viabilizar o acesso do autor aos valores do sistema do Seguro Desemprego, observa-se que a prova documental que acompanha a petição inicial não assegura, por si só, a probabilidade do direito, notadamente o enquadramento do autor no quanto disposto no art. 3º, incisos I, III, IV e V, da Lei federal nº 7.998/90, com a redação atribuída pela também Lei federal nº 13.134/2015. Quanto ao pedido de registro do término do contrato junto à CTPS, as alegações da exordial não se mostram devidamente comprovadas, razão pela qual constatam-se ausentes os elementos necessários para a concessão da medida antecipatória. Há de se destacar que inexiste nos autos comprovação da alegada rescisão contratual em 23/12/2024, omissão da qual decorre a necessidade de dilação probatória mais incisiva e da oferta do contraditório para que este juízo decida de forma acertada. Depreende-se, outrossim, das alegações iniciais que o autor pretende a obtenção, por meio de tutela de urgência na modalidade cautelar, de bloqueio de faturas e/ou cauções que a primeira reclamada tenha a receber das contratantes por ele relacionadas a fim de garantir os direitos pleiteados. Analisados os autos, tem-se que não restou comprovado o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, mormente porque o reclamante não conduziu a estes elementos de convicção que demonstrem, de modo inequívoco, a incapacidade financeira da empresa para o fim de honrar seus compromissos e tampouco a existência de indícios da prática de atos, pela parte reclamada, no sentido de desfazer-se do seu patrimônio com o objetivo de frustrar futura execução de eventual sentença condenatória que venha a ser proferida, casos em que o bloqueio do numerário se justificaria. Assim, por não verificados os pressupostos indispensáveis à concessão da Tutela de Urgência na modalidade antecipada e cautelar, a teor do art. 300, "caput", do CPC, INDEFIRO, nos moldes das razões acima consignadas, o requerimento formulado pelo acionante. Da análise dos autos eletrônicos, verifica-se que o autor não cadastrou todos os assuntos correspondentes aos pedidos formulados na inicial. Conforme previsto no Provimento GP-VPJ-CR 001/2023, o qual alterou o Provimento GP-VPJ-CR 5/2023 do E. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região: §6º - Identificada a deficiência na especificação dos assuntos ou no preenchimento dos dados estruturados obrigatórios, a Secretaria procederá à intimação da parte que esta indique, por meio de petição, os assuntos a serem registrados pela Secretaria, independentemente de despacho do juiz. Compulsando os autos, verifico que a petição inicial não atende o disposto no artigo 840, §1º, da Consolidação das Leis do Trabalho (C.L.T.), com a nova redação dada pela Lei Federal número 13.467/2017, eis que o autor deixou de apresentar todos os pedidos de forma individual e/ou líquida. É cediço que o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região possui entendimento firme no sentido de que a atribuição de valores individuais a todos os pedidos constitui requisito essencial da petição inicial, consoante redação conferida pela Lei nº 13.467/2017 ao parágrafo 1º do art. 840 da CLT, sob pena extinção destes. Entrementes, ainda de conformidade com a jurisprudência da E. Corte Regional, exige-se a concessão, nos casos em que se verifica a possibilidade de extinção do feito sem solução do seu mérito, de oportunidade para a apresentação de emenda à inicial, nos moldes preconizados no art. 321 do Código de Processo Civil (CPC), aplicado supletivamente ao Processo do Trabalho por força do art. 769 da CLT, tudo conforme demonstra a ementa abaixo transcrita: "AÇÃO AJUIZADA APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. PEDIDO SEM INDICAÇÃO DE VALOR. EXTINÇÃO DO FEITO AFASTADA, POIS AUSENTE INTIMAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA EMENDAR A PETIÇÃO INICIAL. INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 840, §1º, DA CLT E 321 DO CPC. A nova redação do §1º do art. 840 da CLT, inserida pela Lei nº 13.467/2017, exige a indicação do valor de cada pedido. Não cumprido integralmente o dispositivo, no caso da ação ajuizada a partir de 11/11/2017 (vigência da Lei nº 13.467/2017), deve-se determinar a emenda à inicial, com fulcro no art. 321 do CPC/2015. Recurso provido para afastar a extinção do feito e determinar o retorno dos autos, para que a requerente atribua valor ao pedido de implantação em folha de pagamento das diferenças salariais. Prejudicada a análise do recurso do Município. (PROCESSO nº 0010696-45.2018.5.15.0124 (ROT), Relatora Desembargadora: ELEONORA BORDINI COCA, data do julgamento: 16/12 /2019, a 4ª Câmara (Segunda Turma) do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Data de Publicação: 19/12/2019.)" Nesse contexto, para fins do art. 840, §1º, da CLT, cumulado com o art. 321 do CPC, deverá o autor apresentar emenda à petição inicial, adequando-a aos termos do referido artigo, sob pena de extinção, sem solução de mérito, dos seguintes pedidos não individualizados e/ou ilíquidos, consoante disposto no parágrafo 3º daquele mesmo dispositivo legal: "Baixa na C.T.P.S (23/01/2025 - projeção aviso prévio); entrega T.R.C.T e seguro desemprego, ou Alvará substitutivo; requer a condenação da reclamada ao pagamento das diferenças horas intrajornadas - art. 71 da CLT, com reflexos em DSR, adicional noturno, aviso prévio, férias + 1/3, 13º salário, FGTS + multa 40%" Verifica-se que o reclamante não atribuiu valor a cada reflexo individualmente, devendo tal ponto ser devidamente ajustado ao preceito insculpido no art. 840, §1º, da CLT, a teor do art. 321 do CPC. Consigne-se, por pertinente, que a remuneração das férias não se confunde com o valor de seu terço constitucional, assim como FGTS não se confunde com a indenização rescisória, dado tratar-se de parcelas distintas que podem até mesmo ser satisfeitas em momentos diversos durante o contrato (por exemplo: no caso das férias, pode o empregador promover a antecipação do terço constitucional sem efetuar o pagamento da remuneração do descanso). Portanto, cada uma das verbas deve ter seu valor especificado individualmente na petição inicial. Destaca-se que também aos pleitos cujo objeto compreende obrigações de fazer deve ser atribuído o respectivo valor, ainda que por estimativa nas hipóteses em que não se faz possível mensurar o valor da indenização devida quando da conversão daquela em perdas e danos na forma do art. 248 do Código Civil Brasileiro. Considerando que o valor atribuído à causa não corresponde ao montante formado pelo valor das pretensões individuais, deverá o autor promover a necessária emenda à inicial a fim de adequá-la aos comandos legais que disciplinam os requisitos básicos da petição inicial. Consigne-se, ainda, que deve o reclamante se atentar para a existência de outros pedidos que venham eventualmente a contar com o mesmo vício, porquanto o rol acima especificado ostenta natureza meramente exemplificativa, devendo o autor também providenciar a regularização destes a fim de adequá-los ao comando emergente do art. 840, §1º, da CLT. O demandante deverá, no prazo de quinze (15) dias, promover a emenda à petição inicial, sob pena de extinção, sem resolução de mérito, dos pedidos não individualizados, bem como daqueles aos quais não foram atribuídos valores individualizados. Outrossim, deverá, na oportunidade, sanar as irregularidades existentes, indicando todos os assuntos e respectivos códigos referentes aos pedidos deduzidos, a fim de viabilizar à secretaria o cadastramento destes na autuação, sob pena de extinção do feito, sem julgamento do mérito, no tocante aos pedidos em relação aos quais não forem indicados os respectivos assuntos, bem como corrigir a petição inicial, esclarecendo a razão pela qual o valor da causa não atende o quanto definido em lei, conforme determinado. (...) PENAPOLIS/SP, 25 de fevereiro de 2025. CLEBER ANTONIO GRAVA PINTO Juiz do Trabalho Titular" - id. 59bf7fe Pois bem, apesar dos argumentos lançados pelo impetrante, não há como deferir no presente caso a antecipação de tutela ora requerida quanto à liberação de FGTS e habilitação imediata no seguro-desemprego. Atente-se o impetrante que a Constituição Federal ampliou o direito de defesa, assegurando aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, assim como aos acusados em geral, o direito ao contraditório e à ampla defesa, devendo ser observado o devido processo legal (art. 5º, LV e LIV). Nessa esteira, não há dúvidas de que é necessário assegurar às impetradas o seu direito de defesa, garantindo a observância do devido processo legal. No presente caso depreende-se da narrativa do impetrante que a matéria ainda é controvertida, não tendo havido nem mesmo a formalização da dispensa e emissão de TRCT. Ainda que a empregadora do autor tenha perdido o posto de trabalho com o Estado de São Paulo não se sabe se os trabalhadores foram realocados para outro posto de serviço, devendo ser oportunizada a manifestação da impetrada. Quanto à multa por litigância de má-fé, no entanto, razão lhe assiste. Entendo que não se deve fazer uma interpretação literal do art. 29-B da Lei 8.036/90 e nem dos artigos 80, I, do CPC, e 793-B, I, da CLT. Com efeito, o objetivo precípuo das verbas decorrentes da dispensa, assim como o salário, é o de assegurar a existência minimamente digna da pessoa humana, possuindo caráter alimentar, razão pela qual devem preponderar frente ao art. 29-B da Lei 8.036/90. Dessa forma, deve ser observada a teoria da interpretação conforme a Constituição, e, nessa senda, garantir ao obreiro, quando preenchidos os requisitos legais para tanto, o acesso às verbas a que foi indevidamente privado, como já decidi nos autos do Mandado de Segurança nº 0005794-04.2016.5.15.0000. A aplicação do art. 29-B da Lei 9.036/90 tem aplicação divergente quando se trata de pedido em face do empregador, mostrando-se, com o devido respeito, excessivamente rigorosa a punição aplicada pela autoridade coatora ao realizar uma interpretação literal dos referidos dispositivos. A propósito, menciono precedente desta Seção Especializada no sentido de que a proibição constante do artigo 29-B da Lei nº 8.036/1990 diz respeito a pedidos deduzidos em face do agente operador do FGTS, tanto que é muito comum a concessão de tutelas provisórias em face do empregador para liberação de valores depositados na conta vinculada dos trabalhadores, como decidido no julgamento do Mandado de Segurança nº 0007069-17.2018.5.15.0000, com voto condutor da Desembargadora do Trabalho ELEONORA BORDINI COCA proferido em 17/10/2018. Portanto, até mesmo em razão da divergência acerca da aplicação do dispositivo, entendo que não se deve apenar o trabalhador nesse caso. Desse modo, embora não se reconheça no presente caso a plausibilidade necessária para determinação de pagamento/liberação imediato de verbas como quer o impetrante, deve ser afastada a multa aplicada, não se vislumbrando propriamente má-fé do impetrante em sua pretensão. Defiro parcialmente o pedido liminar formulado para excluir a multa por litigância de má-fé aplicada na origem. Intimem-se o impetrante e as reclamadas da ação principal, por seus advogados constituídos nos autos, na condição de litisconsorte necessário (R.I., art. 249, § 1º). Comunique-se a autoridade coatora para que preste informações no prazo legal. Após, remetam-se desde logo os autos para a D. Procuradoria do Trabalho (R.I., art. 250). Cumpridas as determinações, retornem conclusos. Campinas, 19 de março de 2025. ANTONIA REGINA TANCINI PESTANA Desembargadora Relatora" - id. d39ff63 Ao consultar o andamento processual da Reclamação Trabalhista observo que no dia 02/06/2025 foi proferida sentença acolhendo em parte os pedidos do autor, ocorrendo a perda superveniente do objeto da presente ação, nos termos do item III da Súmula n. 414 do E. TST, in verbis: "Súmula 414 (...) III - A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão ou o indeferimento da tutela provisória." Ante o exposto, jugo extinto o presente mandado de segurança, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC. Dispositivo DIANTE DO EXPOSTO, decido extinguir sem resolução do mérito o mandado de segurança impetrado por FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS em razão da perda superveniente do seu objeto, nos termos do artigo 485, VI, do CPC e do artigo 6º, §5º, da Lei 12.016/2009, conforme fundamentação. Custas indevidas. REGISTRO DA SESSÃO DE JULGAMENTO Em Sessão Ordinária realizada em 16 de julho de 2025, a 2ª Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgou o presente processo. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Desembargador JOSÉ OTÁVIO DE SOUZA FERREIRA Tomaram parte no julgamento as Excelentíssimas Magistradas e os Excelentíssimos Magistrados: ROBERTO NÓBREGA DE ALMEIDA FILHO ANTONIA REGINA TANCINI PESTANA RONALDO OLIVEIRA SIANDELA RICARDO ANTONIO DE PLATO JOSÉ CARLOS ABILE LUCIANA MARES NASR EVANDRO EDUARDO MAGLIO HELIO GRASSELLI MARI ANGELA PELEGRINI LEVI ROSA TOMÉ CARLOS EDUARDO OLIVEIRA DIAS SCYNTHIA MARIA SISTI TRISTÃO Participou da sessão para julgar processos de sua competência a Excelentíssima Desembargadora Antonia Regina Tancini Pestana. Convocados para compor a Seção e julgar processos de suas competências as Excelentíssimas Juízas Scynthia Maria Sisti Tristão (cadeira vaga) e Luciana Mares Nasr (cadeira do Excelentíssimo Desembargador João Batista da Silva) e os Excelentíssimos Juízes Ronaldo Oliveira Siandela (cadeira da Excelentíssima Desembargadora Eleonora Bordini Coca) e Evandro Eduardo Maglio (cadeira do Excelentíssimo Desembargador Fábio Bueno de Aguiar). Participaram da sessão para julgar processos de suas competências as Excelentíssimas Juízas Marina de Siqueira Ferreira Zerbinatti (cadeira do Excelentíssimo Desembargador Roberto Nóbrega de Almeida Filho), Cristiane Montenegro Rondelli (cadeira da Excelentíssima Desembargadora Mari Angela Pelegrini) e Patricia Glugovskis Penna Martins (cadeira do Excelentíssimo Desembargador José Otávio de Souza Ferreira). Ausentes, em férias, a Excelentíssima Desembargadora Eleonora Bordini Coca e o Excelentíssimo Desembargador Fábio Bueno de Aguiar; e, em licença-saúde, o Excelentíssimo Desembargador João Batista da Silva. O Ministério Público do Trabalho participou da sessão na pessoa do Excelentíssimo Procurador Regional do Trabalho Roberto Pinto Ribeiro. ACÓRDÃO Acordam as Excelentíssimas Senhoras Magistradas e os Excelentíssimos Senhores Magistrados da 2ª Seção Especializada em Dissídios Individuais em julgar o presente processo, nos termos do voto proposto pela Excelentíssima Desembargadora Relatora Votação Unânime. ANTONIA REGINA TANCINI PESTANA Desembargadora Relatora CAMPINAS/SP, 23 de julho de 2025. RODRIGO LOBO DA VEIGA JARDIM Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS

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Processo nº 0201901-62.2023.8.06.0101

ID: 325162382

Tribunal: TJCE Órgão: 4º Gabinete da 1ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0201901-62.2023.8.06.0101

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

BANCO PAN S.A. PEDRO GONCALVES DO NASCIMENTO PROCURADORIA GERAL DE JUSTICA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

RONALDO NOGUEIRA SIMOES

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ALBERTO JEFERSON RODRIGUES TEIXEIRA

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAPRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADODESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA PROCESSO: 0201901-62.2023.8.06.0101 - APELAÇÃO CÍVEL (198)APELANTE: P… ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAPRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADODESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA PROCESSO: 0201901-62.2023.8.06.0101 - APELAÇÃO CÍVEL (198)APELANTE: PEDRO GONCALVES DO NASCIMENTO, BANCO PAN S.A.APELADO: BANCO PAN S.A., PEDRO GONCALVES DO NASCIMENTO Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÕES CÍVEIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. PESSOA ANALFABETA. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO AUTOR NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recursos de apelação interpostos simultaneamente pela parte autora e pela instituição financeira contra sentença que julgou procedente ação declaratória de nulidade contratual cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais. Os fatos envolvem contratos de empréstimo consignado (nºs 308971436-8, 328467720-4 e 343244439-0) firmados com pessoa idosa e analfabeta, com descontos em benefício previdenciário, questionando-se a regularidade da contratação pela ausência de assinatura a rogo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há quatro questões em discussão: (i) definir se deve incidir a prescrição quinquenal; (ii) estabelecer se a ausência de assinatura a rogo torna inválidos os contratos firmados com pessoa analfabeta; (iii) definir se é devida a repetição do indébito e em qual modalidade; (iv) verificar se são configurados danos morais pelos descontos realizados. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Em relações consumeristas bancárias onde se discute a própria existência da relação contratual, aplica-se o prazo prescricional quinquenal do art. 27 do CDC, incidindo apenas sobre as parcelas anteriores ao quinquênio que precede o ajuizamento da demanda, considerando-se como termo inicial a data do último desconto indevido. 4. A ausência de assinatura a rogo em contratos firmados por pessoas analfabetas constitui vício de formalidade que torna inválido o negócio jurídico, conforme interpretação analógica do art. 595 do CC/2002, sendo formalidade indispensável para compensar a hipervulnerabilidade informacional desse grupo social. 5. A falha na prestação do serviço restou caracterizada pela não observância dos requisitos formais para contratação com pessoa analfabeta, não se desincumbindo a instituição financeira do ônus de demonstrar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito autoral. 6. A repetição do indébito deve seguir a modulação temporal estabelecida pelo STJ no EAREsp 676.608/RS, restituindo-se de forma simples os valores descontados antes de 30/03/2021 e em dobro os posteriores a essa data. 7. Os danos morais não se configuram quando os descontos indevidos representam valor ínfimo (R$ 107,80 mensais ou 8% do benefício), sem demonstração do comprometimento efetivo da renda da parte consumidora, caracterizando mero aborrecimento inerente à vida em sociedade. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso da parte autora não provido. Recurso da instituição financeira parcialmente provido. Tese de julgamento: "1. Aplica-se a prescrição quinquenal do art. 27 do CDC às ações consumeristas bancárias que discutem a existência da relação contratual, incidindo apenas sobre parcelas anteriores ao quinquênio que precede o ajuizamento. 2. A ausência de assinatura a rogo em contratos firmados com pessoas analfabetas constitui vício de formalidade que torna inválido o negócio jurídico, sendo exigência do art. 595 do CC/2002. 3. A repetição do indébito deve ser simples para valores descontados antes de 30/03/2021 e em dobro para os posteriores, conforme modulação temporal do STJ. 4. Descontos de valores ínfimos, ainda que indevidos, não configuram danos morais quando não comprometem efetivamente a renda do consumidor". _________ Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 27; CC, arts. 595, 186, 927; CPC, art. 373, II; CDC, art. 14. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 190.7394/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 04/05/2021; STJ, EAREsp 676.608/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, j. 21/10/2020; TJ-CE, IRDR nº 0630366-67.2019.8.06.0000, Rel. Des. Francisco Bezerra Cavalcante, j. 21/09/2020; TJCE, Apelação Cível - 0201631-38.2023.8.06.0101, Rel. Des. Jose Ricardo Vidal Patrocínio, 1ª Câmara Direito Privado, j. 18/09/2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer dos recursos para, no mérito, negar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento à apelação da instituição financeira, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data da assinatura digital. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIOPresidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIARelator RELATÓRIO Trata-se de recursos de apelação cível interpostos por Pedro Gonçalves do Nascimento e Banco PAN S.A. contra sentença (id. 15383214) proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Itapipoca, que julgou procedente os pedidos formulados na ação anulatória de negócio jurídico ajuizada por Pedro Gonçalves do Nascimento contra Banco PAN S.A., nos seguintes termos: [...] III - DISPOSITIVOAnte o exposto, extingo o processo com resolução de mérito, nos termos do Art. 487, inciso I, do CPC, julgando PROCEDENTE a pretensão autoral para: i) reconhecer a nulidade dos contratos nº 308971436-8, 328467720-4 e 343244439-0, devendo a parte Requerida interromper os descontos que se baseiam nos referidos instrumentos; ii) condenar a parte Requerida à restituição em dobro dos valores descontados da parte Requerente, sobre quais os incidirão correção monetária pelo INPC e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir de cada desconto, autorizada a compensação com os valores eventualmente depositados pelo polo passivo, sobre os quais incidirão correção monetária pelo INPC a partir da data do depósito, sob risco de enriquecimento ilícito da parte Requerente; iii) condenar o polo passivo ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 1.000,00 (um mil reais), com a incidência de juros moratórios de 1% ao mês a partir do primeiro desconto indevido e correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ).Diante da sucumbência, condeno o Requerido ao pagamento das custas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do Art. 85, §2º, do CPC. [...] Embargos de declaração (id. 15383220) opostos pelo Banco PAN S.A., com decisão (id. 15383225) rejeitando-os. Apelação cível (id. 15383222) interposta pela parte consumidora objetivando a reforma da sentença para que seja majorado o valor dos danos morais para R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Apelação cível (id. 15383230) interposta pela instituição financeira objetivando a reforma da sentença para que sejam julgados improcedentes os pedidos autorais, declarando-se regulares os descontos efetuados, ou subsidiariamente, a exclusão do dano moral e restituição na forma simples. Parecer do Ministério Público (id. 18873095) opinando pelo conhecimento das apelações, mas não se manifestando sobre o mérito por tratar-se de matéria patrimonial e ausência de previsão legal. É o que importa relatar. VOTO Conforme recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)[1], passo a proferir o meu voto em linguagem simples. Inicialmente, pontuo que é pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça (EAREsp 86.915[2]) de que a parte que já teve o benefício da justiça gratuita concedido não precisa renovar o pedido a cada recurso ou instância. Assim, considerando que o juízo a quo (de primeiro grau) concedeu o direito de não pagar as despesas do processo ao(à) autor(a), ora recorrente, mantenho a sua concessão e o(a) dispenso de comprovar o recolhimento do preparo, nos termos do art. 98, §1º, VIII, do CPC/2015, já que a isenção das custas também inclui os valores necessários para apresentar o recurso. Dito isso, após verificar que os recursos cumprem todos os requisitos legais[3], como terem sido apresentados no prazo correto, por quem tem direito e com as taxas pagas (id. 15383229) ou isentas, conheço dos recursos e adianto que a apelação interposta pela instituição financeira merece parcial provimento e a interposta pela parte autora não merece provimento. A matéria devolvida a este Tribunal tem como questão central verificar a regularidade da contratação dos empréstimos consignados referentes aos contratos de nºs. 308971436-8, 328467720-4 e 343244439-0 (id. 15383192, 15383196 e 15383191) - e o dever da instituição financeira em devolver os valores cobrados (repetição do indébito) e indenizar os supostos danos morais sofridos pela parte autora, que é idosa e analfabeta, além de analisar se devem ser majorados. Esclareço que, antes de analisar o mérito recursal, é necessário apreciara prejudicial de mérito em relação à ocorrência de prescrição, que merece acolhimento. Explico. Sobre o tema, a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou-se no sentido de que, em se tratando de relações consumeristas bancárias, nas quais se discute a própria existência da relação contratual (como é o caso dos autos), aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do CDC. A respeito, cito o seguinte julgado do STJ: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido . Precedentes. 3. O entendimento adotado pelo acórdão recorrido coincide com a jurisprudência assente desta Corte Superior, circunstância que atrai a incidência da Súmula 83/STJ. 4 . Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1799862 MS 2019/0062947-0, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 29/06/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/08/2020) [destacou-se] Assim, no caso em análise, verifico que foram impugnados três contratos (id. 15383124) com datas distintas de celebração, variando entre os meses de fevereiro de 2016, julho de 2019 e dezembro de 2020, cuja ação foi ajuizada em outubro de 2023, aplica-se à hipótese a regra das prestações de trato sucessivo, em que a última cobrança ocorreria em mar/2021 (id. 122760467), incidindo, assim, apenas a prescrição sobre as parcelas anteriores ao quinquênio que precede o ajuizamento da demanda. Portanto, acolho a prejudicial de mérito suscitada para aplicar a prescrição quinquenal apenas quanto às parcelas anteriores aos cinco anos que antecederam a propositura da ação. Enfrentada a prejudicial de mérito, passo à análise do mérito recursal. Da análise dos autos, verifico que o juízo a quo identificou a ausência de assinatura a rogo nos contratos, cujo requisito é essencial para instrumentos firmados por pessoas analfabetas. Entendo que a fundamentação utilizada se ancora em precedente do STJ (REsp 1907394/MT) que estabelece a obrigatoriedade desta formalidade para compensar a hipervulnerabilidade informacional. A respeito, cito o julgado: DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO . VALIDADE. REQUISITO DE FORMA. ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS. ART . 595 DO CC/02. PROCURADOR PÚBLICO. DESNECESSIDADE. 1 . Ação ajuizada em 20/07/2018. Recurso especial interposto em 22/05/2020 e concluso ao gabinete em 12/11/2020. 2. O propósito recursal consiste em dizer acerca da forma a ser observada na contratação de empréstimo consignado por idoso indígena que não sabe ler e escrever (analfabeto) . 3. Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4. Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art . 107 do CC/02. 5. Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6 . Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7. Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social . 8. Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos - em especial, os contratos de consumo - põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo. Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9 . O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato. O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10 . O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse. Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11. Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art . 654, caput, do CC/02. Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12 . Recurso especial conhecido e provido (STJ - REsp: 1907394 MT 2020/0205908-3, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 04/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/05/2021) [destacou-se] Ainda sobre o tema, houve a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 0630366-67.2019.8.06.0000, sob a relatoria do Desembargador Francisco Bezerra Cavalcante, versando acerca da legalidade do empréstimo contratado por pessoa analfabeta, mediante instrumento particular assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, o que, após ampla discussão, consolidou o seguinte entendimento: É CONSIDERADO LEGAL O INSTRUMENTO PARTICULAR ASSINADO A ROGO E SUBSCRITO POR DUAS TESTEMUNHAS PARA A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS ENTRE PESSOAS ANALFABETAS E INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, NOS DITAMES DO ART. 595 DO CC, NÃO SENDO NECESSÁRIO INSTRUMENTO PÚBLICO PARA A VALIDADE DA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO ANALFABETO NEM PROCURAÇÃO PÚBLICA DAQUELE QUE ASSINA A SEU ROGO, CABENDO AO PODER JUDICIÁRIO O CONTROLE DO EFETIVO CUMPRIMENTO DAS DISPOSIÇÕES DO ARTIGO 595 DO CÓDIGO CIVIL. Em consequência desta decisão, nos termos do art. 978, § único, e art. 985, ambos do Código de Processo Civil, conhece-se e julga se improvida a apelação nº 0000708-62.2017.8.06.0147, afetada como causa piloto, mantendo-se inalterada a sentença de primeiro grau que julgou improcedente a demanda de origem, impondo se, portanto, por consequência, a decisão ora proferida neste Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores: Emanuel Leite Albuquerque (presidindo a sessão), Vera Lúcia Correia Lima, Durval Aires Filho, Francisco Dorival Beserra Primo, Francisco Bezerra Cavalcante (Relator), Carlos Alberto Mendes Forte, Francisco Gomes de Moura, Raimundo Nonato Silva Santos, Lira Ramos de Oliveira, Heráclito Vieira de Sousa Neto, Francisco Mauro Ferreira Liberado, Francisco Luciano Lima Rodrigues, Maria do Livramento Alves Magalhães e José Ricardo Vidal Patrocínio. Ausentes justificadamente as Desembargadoras Maria Vilauba Fausto Lopes e Maria de Fátima de Melo Loureiro. Fortaleza-Ce, 21 de Setembro de 2020. EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE Desembargador Presidindo a sessão do Órgão FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE Desembargador Relator. (Relator (a): FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE; Comarca: Piquet Carneiro; Órgão julgador: Vara Única da Comarca de Piquet Carneiro; Data do julgamento: 21/09/2020; Data de registro: 22/09/2020) Assim, com base no referido IRDR, bem como na atual posição do STJ, verifico que não foi tolhida a autonomia de vontade da pessoa analfabeta em contratar, todavia se estabeleceu exigências visando a compensação de sua vulnerabilidade, de forma que, além da aposição de sua digital, conste a assinatura de um terceiro a rogo, bem como a subscrição por duas testemunhas. Isso, porque nas ações que versam sobre empréstimo consignado em que a parte autora é analfabeta, o art. 595, do Código Civil (CC/2002) dispõe que o instrumento contratual poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas: CC/2002, art. 595. No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. Nesse ponto, cabe destacar que a assinatura a rogo é a assinatura de um terceiro de confiança do contratante que não sabe ou não pode assinar, que é conferida por duas testemunhas que subscreverão o documento. Logo, embora o banco possa dispor de variados meios para realizar seus contratos de empréstimos, não é razoável que tenha a plena liberdade de escolha quando negocia com pessoa analfabeta, motivo pelo qual as exigências acima mencionadas devem ser observadas. Da análise dos autos, caracterizada restou a falha na prestação do serviço, pois a instituição financeira não demonstrou a regular contratação do empréstimo, uma vez que não consta a assinatura a rogo, razão pela qual entendo que os instrumentos contratuais são inválidos. Diferente não é o entendimento desta Primeira Câmara de Direito Privado: PROCESSO CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE EM PRIMEIRO GRAU. IRRESIGNAÇÃO DA AUTORA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. INSTRUMENTO CONTRATUAL FIRMADO COM PESSOA ANALFABETA. ART. 595 DO CPC. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. VÍCIO DE FORMALIDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MATERIAL CONFIGURADO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. MODULAÇÃO TEMPORAL. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ. DANO MORAL DEVIDO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Depreende-se da leitura dos fólios processuais que a autora/recorrente, busca através da presente demanda declarar nulo o negócio jurídico objeto do contrato de empréstimo consignado nº 804501876, citado na inicial, reaver em dobro os valores cobrados indevidamente em decorrência do pacto e, ainda, a condenação do banco, ora recorrido, ao pagamento de danos morais. 2. A condição de analfabeto não retira do contratante sua capacidade de firmar contratos desde que observados os requisitos previstos em lei, como a assinatura a rogo e a subscrição de duas testemunhas, conforme interpretação analógica do art. 595 do Código Civil, como forma de conferir validade ao negócio jurídico, vejamos: ¿No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas¿. 3. No caso concreto, é forçoso reconhecer que houve falha na prestação do serviço, causando danos de ordem moral e material a promovente/recorrente, visto que, embora a instituição bancária/recorrida tenha procedido a juntada do suposto instrumento contratual (fls. 150/154), o pacto está eivado de vício de formalidade, porquanto, não há neste a assinatura a rogo, formalidade indispensável à validade do negócio jurídico. 4. Assim, quando demonstrada a falha na prestação dos serviços pelo banco, configurado está o ilícito civil, conferindo daí ao lesado a devida reparação dos danos sofridos, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor e arts. 186 e 927 do Código Civil Brasileiro. 5. Repetição do indébito - Considerando a modulação temporal dos efeitos da decisão contida no EAREsp nº 676.608/RS, somente os valores descontados após a data da publicação do acórdão em que fixado o precedente (30/03/2021), deverão ser restituídos em dobro, os demais descontos, procedidos anteriormente, deverão ser restituídos de forma simples, visto que não restou demonstrada a má-fé da instituição bancária/recorrida. 6. Danos Morais - Sobre o dano moral, enxergo que é evidente a perturbação sofrida pela autora/apelante, em decorrência do ocorrido, ao ver os descontos no seu benefício previdenciário, uma vez que não houve autorização da prática deste ato e tampouco, conforme os elementos existentes nos autos, prova de que houve a correta celebração do instrumento contratual com a instituição financeira/recorrida. 7. Fixação - Fatores - Para quantificar a indenização por danos morais deve se levar em conta, dentre outros fatores, a extensão do dano, as condições socioeconômicas dos envolvidos e o sofrimento da vítima. Nessa ordem de ideias, atento ao cotejo desses fatores, e ainda, levando em consideração os valores dos descontos, arbitro o quantum indenizatório no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), frente ao quadro fático delineado nos autos, porque não se entremostra exagerado nem insignificante, uma vez que razoável e proporcional à ofensa perpetrada. 8. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada. A C Ó R D Ã O Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer do presente recurso, para dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do eminente Relator, parte integrante desta decisão. Fortaleza, 16 de outubro de 2024. FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador Exmo. Sr. EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE Relator (TJ-CE - Apelação Cível - 0007069-38.2017.8.06.0166, Rel. Desembargador(A) Emanuel Leite Albuquerque, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 16/10/2024, data da publicação: 16/10/2024) [destacou-se] DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/INEXISTÊNCIA CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TARIFA BANCÁRIA, PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. CONSUMIDOR ANALFABETO. NECESSIDADE DA ASSINATURA A ROGO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESTITUIÇÃO A TÍTULO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. DANO MORAL MANTIDO EM R$ 3.000,00. ASTREINTES MANTIDAS. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. Trata-se de ação declaratória de nulidade/inexistência contratual cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada por pessoa analfabeta, que alegou a irregularidade na cobrança de tarifa bancária denominada "padronizados prioritários I". A sentença de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido, declarando a nulidade do contrato, condenando o réu à devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, ao pagamento de indenização por danos morais e em astreintes. 3. A ausência de assinatura a rogo e de duas testemunhas no contrato firmado por pessoa analfabeta, conforme previsto no art. 595 do Código Civil, acarreta a nulidade do negócio jurídico. A instituição financeira não observou os requisitos formais, tornando inválido o contrato celebrado, nos termos dos arts. 166 e 168, §único, do Código Civil. 4. Configurado o defeito no serviço prestado, não tendo o banco procedido com as cautelas devidas para a contratação com a autora, assumiu o risco lesivo, gerando o dever de indenizar. Note-se que a instituição financeira não provou a ocorrência das excludentes de responsabilidades previstas no § 3º do art. 14 do CDC. 5. Repetição do Indébito: Os valores descontados indevidamente deverão ser restituídos em dobro, uma vez que os descontos ocorreram após o marco temporal estabelecido pelo STJ (30/03/2021), conforme o entendimento consolidado no EAREsp 676.608/RS, corrigidos monetariamente pelo INPC, a contar da data de cada desconto (súmula 43 STJ) e acrescidos de juros de 1% ao mês, a partir do evento danoso (súmula 54, STJ); 6. Danos Morais: Configurados os danos morais em razão dos descontos indevidos decorrentes de contrato nulo, que afetaram diretamente o benefício previdenciário do autor, comprometendo seu sustento. Verifica-se que o cálculo arbitrado pelo magistrado da instância de origem, fixado em R$ 3.000,00 (cinco mil reais), não destoou do importe habitualmente reconhecido nas Câmaras de Direito Privado deste Tribunal, devendo, assim, ser mantido em sua integralidade, inclusive com relação à correção monetária e aos juros de mora. 7. As astreintes foram arbitradas em valor razoável e proporcional às circunstâncias fáticas e jurídicas do caso, conforme entendimento consolidado na jurisprudência, respeitando seu o caráter pedagógico e coercitivo, considerando o porte econômico da instituição financeira recorrente, sem, contudo, ultrapassar o valor da causa. 8. Apelações conhecidas e desprovidas. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes recursos, acordam os Desembargadores membros da Primeira Câmara de Direito Privado deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer das apelações para negar-lhes provimento, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza-CE, data da assinatura digital. DES. FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador DESA. MARIA REGINA OLIVEIRA CAMARA Relatora (TJ-CE - Apelação Cível - 0200644-49.2023.8.06.0053, Rel. Desa. Maria Regina Oliveira Camara, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 16/10/2024, data da publicação: 16/10/2024) [destacou-se] Dessa forma, entendo que o banco não se desincumbiu do ônus de demonstrar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito autoral em relação à regularidade da contratação (art. 373, II, do CPC), mostrando-se, por outro lado, como indiscutíveis as deduções indevidas no benefício previdenciário da requerente, decorrentes do contrato impugnado. Assim, em razão da falha na prestação do serviço, não há outro caminho que não seja considerar a irregularidade da contratação. Quanto à restituição do indébito, sabe-se que os descontos realizados na conta da parte autora, em razão de contrato nulo, configuram falha na prestação do serviço e as cobranças indevidas constituem ato ilícito, na medida em que a instituição bancária deixou de agir com o cuidado necessário para o regular desenvolvimento de sua atividade, causando os danos e resultando, por via de consequência, na obrigação de repará-los, na forma dos arts. 186 e 927 do Código Civil. Vejamos: CC/2002, art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. CC/2002, art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Acrescente-se que, em se tratando de relação de consumo, a responsabilização pelos prejuízos causados ao consumidor é objetiva e independe de demonstração de culpa, nos termos do art. 14, caput, do CDC: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Desse modo, estando comprovado nos autos os descontos indevidos da conta bancária da parte autora, em razão de contrato nulo, o dano material é certo, assim como a obrigação da instituição financeira de repará-los. Assim, por ocasião do julgamento dos embargos de divergência em agravo em recurso especial EAREsp 676.608/RS, de relatoria do Ministro Og Fernandes, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi reformulado de modo a reconhecer o direito à restituição em dobro do indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados, por ser conduta contrária à boa-fé objetiva; porém, houve modulação dos efeitos do julgado para que o entendimento seja aplicado apenas para cobranças realizadas a partir da data da publicação do acórdão, em 30 de março de 2021. A respeito cito o julgado: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA FIXA. COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC). DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA. DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL). APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. (...) Fixação das seguintes teses. Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. Segunda tese: A ação de repetição de indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do prazo prescricional decenal, consoante previsto no artigo 205 do Código Civil, a exemplo do que decidido e sumulado no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de tarifas de água e esgoto (Súmula 412/STJ). Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão. (EAREsp 676.608/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/03/2021). Desse modo, tratando o caso dos autos de cobranças indevidas com início em fevereiro de 2016, agosto de 2019 e abril de 2021 até março de 2028 (id. 15383124 - págs. 2 e 4), entendo que as parcelas descontadas até 30/03/2021 sejam restituídas na forma simples e as posteriores devem ser em dobro. Por fim, quanto aos danos morais, verifico que o prejuízo mensal experimentado pela parte autora/recorrente, correspondente a um total de R$ 107,80 (id. 15383124) ou 8% do seu benefício, o que traduz quantia ínfima, sem qualquer indício de comprometimento da renda da parte consumidora. Logo, concluo por inexistir um efetivo abalo capaz de repercutir sobre valores extrapatrimoniais, resumindo-se a ocorrência em mero aborrecimento a que ficam sujeitos todos aqueles que compartilham a vida em sociedade, restando, assim, afastada a pretensão indenizatória. Nesse sentido converge a jurisprudência desta Primeira Câmara de Direito Privado, que, em reiterados julgados, reconhece que os descontos em valor ínfimo, ainda que indevidos, não são capazes, por si só, de ensejar a reparação por dano moral. A exemplo, cito o seguinte julgado: DIREITO DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CONSUMIDOR NÃO ALFABETIZADO. ART. 595 DO CC. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO CONCRETA SOBRE O REPASSE DO CRÉDITO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO SEU ONUS PROBANDI (ART. 373, II, CPC). REPETIÇÃO DO INDÉBITO. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES. VALORES DESCONTADOS ANTES DE 30/03/2021. EARESP 676.608/RS. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURADOS. DESCONTOS ÍNFIMOS. RECURSO DO RÉU CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO AUTOR PREJUDICADO. 1. Trata-se de recursos de Apelação Cível simultâneos interpostos por Francisco das Chagas dos Santos e Banco BMG S/A, objetivando a reforma da sentença de fls. 155/161, proferida pelo MM. Juiz de Direito Luiz Guilherme Costa Pedroso Silva, da 1ª Vara Cível da Comarca de Itapipoca/CE, nos autos da Ação Anulatória de Negócio Jurídico c/c Repetição de Indébito e Pedido de Indenização por Danos Morais ajuizada pelo particular em face da instituição financeira. 2. O cerne da controvérsia consiste em verificar a validade do contrato de empréstimo consignado nº 4643794406999, conforme delineado na petição inicial, celebrado entre a instituição financeira e a parte autora, bem como o cabimento de restituição em dobro e indenização por danos morais. 3. Sobre o assunto, esta e. Primeira Câmara de Direito Privado firmou entendimento de que a confirmação da regularidade ou irregularidade do negócio depende de provas concretas sobre (a) a anuência da consumidora sobre os descontos realizados em seu benefício e (b) o recebimento do crédito por parte da promovente. 4. O banco réu juntou a cópia do contrato de empréstimo consignado questionado, acompanhada tão somente da cópia dos documentos pessoais do autor e de uma tabela demonstrativa dos pagamentos referentes ao empréstimo (fls. 113/118). Cumpre salientar que consta na fl. 113 do contrato a impressão digital que supostamente pertence ao demandante, desacompanhada, contudo, da assinatura de um terceiro a rogo e das testemunhas, conforme orienta o art. 595 do Código Civil, vez que o autor é pessoa não alfabetizada, situação comprovada tanto pela documentação pessoal acostada pelo promovente (fl. 32), quanto pelo documento de identidade anexado ao contrato pelo próprio réu (fl. 115). 5. De mais a mais, não se pode perder de vista ainda que o banco requerido deixou de anexar comprovante de envio do crédito correspondente ao instrumento avençado. É fato que a ausência de comprovação de TED ou DOC, disponibilizado em nome do requerente, impossibilita a verificação da validade do contrato que deu ensejo aos descontos no benefício da parte autora, pois, como dito acima, a confirmação da regularidade do negócio depende de provas concretas sobre (a) a anuência do consumidor sobre os descontos realizados em seu benefício e (b) o recebimento do crédito por parte do promovente. 6. Feitas estas considerações, não há outro caminho senão reconhecer a inexistência do contrato questionado e o desconto indevido das parcelas no benefício previdenciário do demandante, que configuram falha na prestação de serviços do requerido, que ensejam reparação civil, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. 7. No que se refere ao pedido de restituição em dobro dos valores efetivamente descontados, oportuno destacar que o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça ¿ STJ é de que a restituição em dobro do indébito deve ser aplicada apenas às cobranças indevidas realizadas a partir de 30/03/2021 (EAREsp 676.608/RS). À luz de tais considerações, observa-se que, consoante documento demonstrativo dos descontos efetuados na conta bancária do requerente (fl. 118), o último pagamento foi realizado em dezembro de 2020, ou seja, anteriormente à data de 30.03.2021. Por tal razão, cumpre acolher o argumento do réu/recorrente, de que a repetição do indébito se dê na forma simples. 8. Com relação ao dano moral, tem-se que ele somente ocorre quando houver lesão a bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome etc., como se infere dos arts. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal. No caso em tela, houve desconto ínfimo no benefício previdenciário do autor, no valor de R$ 41,25 (quarenta e um reais e vinte e cinco centavos), em 4 parcelas, perfazendo um valor total de R$ 165,00 (cento e sessenta e cinco reais). Nesse contexto, entende-se que o consumidor não ficou desprovido de recursos financeiros para solver suas despesas ordinárias e, consequentemente, não houve dano extrapatrimonial. 9. Recurso do réu conhecido e parcialmente provido. Recurso do autor prejudicado. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer de ambos os recursos, para dar parcial provimento ao apelo do réu e declarar prejudicado o apelo do autor, nos termos do voto do Desembargador Relator. Fortaleza, data da assinatura digital. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Relator (TJCE - Apelação Cível - 0201631-38.2023.8.06.0101, Rel. Des. Jose Ricardo Vidal Patrocínio, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 18/09/2024, data da publicação: 18/09/2024) Diante do exposto, firme nas razões acima delineadas, conheço dos recursos para, no mérito, negar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento ao recurso da instituição financeira, tão somente, para afastar os danos morais reconhecidos pelo juízo a quo e aplicar a prescrição quinquenal quanto às parcelas anteriores aos cinco anos que antecederam a propositura da ação. Considerando a sucumbência recíproca, determino que os honorários advocatícios e as despesas processuais sejam rateados na proporção de 70% (fração a ser arcada pela instituição bancária) por 30% (a ser arcada pelo consumidor) sobre o valor da condenação. Ressalvo, entretanto, a condição suspensiva da condenação da parte autora (consumidora), nos termos do §3º do art. 98 do CPC/2015, tendo em vista que é beneficiária da gratuidade judiciária. Ficam as partes, desde logo, advertidas de que a oposição de embargos de declaração, com nítido intuito protelatório, ensejará a aplicação da multa prevista no art. 1.026, §§2º e 3º, do CPC/2015. É o voto que submeto à apreciação dos meus eminentes pares. Desembargador CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIARelator [1] In CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples. Brasília: CNJ, 2023. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2023/11/pacto-nacional-do-judiciario-pela-linguagem-simples.pdf. Acesso em: 27 jun. 2025. [2]Cf. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Informativo de Jurisprudência n. 015244. Disponível em: . Acesso em: 28 abr. 2025. [3] Por ser o juízo de admissibilidade prévio à análise do mérito recursal, necessário se faz verificar se a sua análise foi positiva, isto é, se estavam presentes os pressupostos intrínsecos - atinentes à existência do direito de recorrer (cabimento, interesse, legitimidade e inexistência de fato impeditivos do direito de recorrer) - e extrínsecos - atinentes ao seu exercício (tempestividade, regularidade formal e recolhimento do preparo). Somente no caso de ser negativo, né que a análise do mérito estaria impedida e o recurso não seria conhecido.

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Processo nº 0010898-50.2017.8.06.0126

ID: 256788147

Tribunal: TJCE Órgão: 4º Gabinete da 1ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0010898-50.2017.8.06.0126

Data de Disponibilização: 15/04/2025

Polo Ativo:

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. SEBASTIAO BEZERRA CAVALCANTE

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

WILSON SALES BELCHIOR

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ROKYLANE GONCALVES BRASIL

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAPRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADODESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA PROCESSO: 0010898-50.2017.8.06.0126 - APELAÇÃO CÍVEL (198)APELANTE: … ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAPRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADODESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA PROCESSO: 0010898-50.2017.8.06.0126 - APELAÇÃO CÍVEL (198)APELANTE: SEBASTIAO BEZERRA CAVALCANTE, BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., SEBASTIAO BEZERRA CAVALCANTE Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR PESSOA ANALFABETA. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. NULIDADE DO CONTRATO. REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSOS DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME 1. Apelações interpostas contra sentença que declarou a nulidade de contrato de empréstimo consignado firmado por pessoa analfabeta sem a observância dos requisitos do art. 595 do Código Civil. O banco foi condenado à repetição simples do indébito, e o pedido de indenização por danos morais foi indeferido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) verificar a regularidade do contrato firmado por pessoa analfabeta; (ii) definir se há direito à repetição do indébito em dobro; e (iii) estabelecer se há dano moral indenizável pelos descontos indevidos realizados no benefício previdenciário da parte autora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O contrato firmado por pessoa analfabeta deve observar a assinatura a rogo e a subscrição por duas testemunhas, conforme o art. 595 do Código Civil, sob pena de nulidade. 4. A instituição financeira não comprovou a regularidade da contratação, pois o contrato não continha assinatura a rogo, tornando-o inválido e evidenciando falha na prestação do serviço. 5. A repetição do indébito deve ocorrer na forma simples, pois os descontos indevidos ocorreram antes do marco temporal estabelecido pelo STJ no EAREsp 676.608/RS (30/03/2021), não sendo aplicável a devolução em dobro. 6. O dano moral não se configura, pois os descontos mensais eram de valor ínfimo e não comprometeram significativamente a subsistência da parte autora, tratando-se de mero aborrecimento. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recursos desprovidos. Tese de julgamento: 1. O contrato firmado por pessoa analfabeta sem a assinatura a rogo e a subscrição por duas testemunhas é inválido, nos termos do art. 595 do Código Civil. 2. A repetição do indébito decorrente de contrato nulo deve ocorrer na forma simples se os descontos foram realizados antes de 30/03/2021, conforme o entendimento fixado pelo STJ no EAREsp 676.608/RS. 3. O dano moral não se configura quando os descontos indevidos forem de valor ínfimo e não comprometerem a subsistência do consumidor, caracterizando mero aborrecimento. Dispositivos relevantes citados: CC/2002, arts. 166, 168, 186, 595 e 927; CPC/2015, arts. 85, §2º, 86 e 373, II; CDC, art. 14. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1862324/CE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 15/12/2020; STJ, EAREsp 676.608/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Corte Especial, j. 21/10/2020, DJe 30/03/2021; TJ-CE, IRDR nº 0630366-67.2019.8.06.0000, Rel. Des. Francisco Bezerra Cavalcante, j. 21/09/2020. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso para, no mérito, negar-lhe provimento nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data da assinatura digital. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIOPresidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIARelator RELATÓRIO Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Sebastião Bezerra Cavalcante e Banco Bradesco Financiamentos S.A. contra sentença de id. 15511452, proferida pelo juízo da 2ª Vara da Comarca de Mombaça, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação anulatória de contrato bancário c/c repetição de indébito e indenização. Petição inicial e documentos de ids. 15511261 a 15511293, em que o autor objetiva a declaração de nulidade de contrato bancário, repetição de indébito e indenização por danos morais, sob a alegação de que sofreu descontos indevidos em seu benefício previdenciário em razão de um empréstimo consignado que não reconhece. Como causa de pedir, alega fraude na contratação, inexistência de consentimento e a vulnerabilidade do consumidor. Despacho de id. 15511311 deferindo os benefícios da justiça gratuita ao autor. Contestação e documentos de ids. 15511327 a 15511341 e 15511314, em que a instituição financeira sustenta a validade do contrato e a regularidade dos descontos, pleiteando a improcedência da ação. Sentença recorrida de id. 15511452, subscrita pelo Juiz de Direito Thiago Marinho dos Santos , proferida nos seguintes termos: [...] Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, para: A) Declarar a inexistência do contrato n° 576692301, para cessarem todos os efeitos deles decorrentes; B) Condenar a parte promovida a restituir, na forma simples, todas as parcelas descontadas indevidamente até a efetiva suspensão ou extinção do contrato em apreço no benefício previdenciário da autora. Tais valores deverão ser acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária (INPC), ambos a partir do efetivo desembolso de cada parcela (súmulas 43 e 54 do STJ). Em virtude da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados estes no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, na proporção de 70% em desfavor do requerido e 30% em desfavor da autora, sendo que este último ficará sob condição suspensiva de exigibilidade, nos termos do §3º do art. 98 do CPC/2015. [...] Apelação cível interposta pela parte consumidora no id. 15511456, objetivando a reforma da sentença para que o banco seja condenado ao pagamento de indenização por danos morais e repetição do indébito em dobro. Apelação cível interposta pela instituição financeira Banco Bradesco Financiamentos S/A no id. 15511459, objetivando a reforma da sentença para afastar a declaração de nulidade do contrato e a obrigação de restituição dos valores descontados. Contrarrazões apresentadas no id. 15511471, em que a instituição financeira requer a manutenção da sentença e o desprovimento do recurso da parte autora. É o que importa relatar. VOTO Inicialmente, pontuo que o juízo a quo concedeu os benefícios da gratuidade judiciária ao(à) recorrente, motivo pelo qual mantenho a sua concessão e o(a) dispenso de comprovar o recolhimento do preparo, nos termos do art. 98, §1º, VIII, do CPC/2015, já que a gratuidade da justiça compreende os depósitos previstos em lei para interposição de recurso; quanto à instituição financeira, verifico que recolheu o preparo e o comprovou nos ids. 15511463 e 15511460. Realizado o juízo de admissibilidade (análise dos pressupostos intrínsecos - atinentes à existência do direito de recorrer - e extrínsecos - atinentes ao seu exercício), observo que todas as exigências legais foram cumpridas, razão pela qual conheço dos recursos. Passo ao juízo de mérito. Ao Tribunal cabe analisar: (i) a regularidade da contratação do empréstimo consignado - contrato nº. 576692301 - e o dever da instituição financeira em devolver os valores cobrados (repetição do indébito) e indenizar os supostos danos morais sofridos pela parte autora, que é idosa e analfabeta. Quanto à regularidade da contratação Conforme os autos, a parte autora alegou que vem sofrendo descontos indevidos em seu benefício previdenciário em razão de um empréstimo bancário (contrato nº 576692301) que ele não reconhece ter firmado. Na sentença, o juízo a quo entendeu que o contrato apresentado pela instituição financeira carece de validade por ausência da assinatura a rogo, requisito necessário para operações envolvendo pessoas analfabetas, em conformidade com o artigo 595 do CC/2002. Ademais, considerou que houve falha na prestação do serviço, sendo aplicável a responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor. Assim, foi declarada a inexistência do contrato discutido e o banco foi condenado a restituir, na forma simples, os valores descontados indevidamente, sendo indeferido o pedido de indenização dos danos morais. A respeito do tema, pontuo que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou o entendimento de que a celebração de contrato, quando realizado com qualquer das partes que não saiba ler nem escrever, independe de escritura pública. Nesse sentido, cito o seguinte jugado: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO COM ANALFABETO. 1. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. ENUNCIADO N. 284/STF. 2. ÔNUS DA PROVA. QUESTÃO ADSTRITA À PROVA DA DISPONIBILIZAÇÃO FINANCEIRA. APRECIAÇÃO EXPRESSA PELO TRIBUNAL LOCAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INVIABILIDADE. 3. VALIDADE DE CONTRATO FIRMADO COM CONSUMIDOR IMPOSSIBILITADO DE LER E ESCREVER. ASSINATURA A ROGO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS, OU POR PROCURADOR PÚBLICO. EXPRESSÃO DO LIVRE CONSENTIMENTO. ACESSO AO CONTEÚDO DAS CLÁUSULAS E CONDIÇÕES CONTRATADAS. 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. 1. É deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegação de violação do art. 1.022 do CPC/2015 se faz de forma genérica, sem a demonstração exata dos pontos pelos quais o acórdão tornou-se omisso, contraditório ou obscuro. Aplica-se, na hipótese, o óbice da Súmula n. 284/STF. 2. Modificar o entendimento do Tribunal local acerca do atendimento do ônus probatório não prescinde do reexame de matéria fático-probatória, o que é inviável devido ao óbice da Súmula 7/STJ. 3. A liberdade de contratar é assegurada ao analfabeto, bem como àquele que se encontre impossibilitado de ler e escrever. 4. Em regra, a forma de contratação, no direito brasileiro, é livre, não se exigindo a forma escrita para contratos de alienação de bens móveis, salvo quando expressamente exigido por lei. 5. O contrato de mútuo, do qual o contrato de empréstimo consignado é espécie, se perfaz mediante a efetiva transmissão da propriedade da coisa emprestada. 6. Ainda que se configure, em regra, contrato de fornecimento de produto, a instrumentação do empréstimo consignado na forma escrita faz prova das condições e obrigações impostas ao consumidor para o adimplemento contratual, em especial porque, nessa modalidade de crédito, a restituição da coisa emprestada se faz mediante o débito de parcelas diretamente do salário ou benefício previdenciário devido ao consumidor contratante pela entidade pagadora, a qual é responsável pelo repasse à instituição credora (art. 3º, III, da Lei n. 10.820/2003). 7. A adoção da forma escrita, com redação clara, objetiva e adequada, é fundamental para demonstração da efetiva observância, pela instituição financeira, do dever de informação, imprescindíveis à livre escolha e tomada de decisões por parte dos clientes e usuários (art. 1º da Resolução CMN n. 3.694/2009). 8. Nas hipóteses em que o consumidor está impossibilitado de ler ou escrever, acentua-se a hipossuficiência natural do mercado de consumo, inviabilizando o efetivo acesso e conhecimento às cláusulas e obrigações pactuadas por escrito, de modo que a atuação de terceiro (a rogo ou por procuração pública) passa a ser fundamental para manifestação inequívoca do consentimento. 9. A incidência do art. 595 do CC/2002, na medida em que materializa o acesso à informação imprescindível ao exercício da liberdade de contratar por aqueles impossibilitados de ler e escrever, deve ter aplicação estendida a todos os contratos em que se adote a forma escrita, ainda que esta não seja exigida por lei. 10. A aposição de firma de próprio punho pelo recorrente no contrato sub judice inviabiliza, contudo, a exigência de assinatura a rogo, mesmo que diante da alegação de letramento incompleto ou deficiente, como condição de validade do contrato. 11. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (STJ - REsp: 1862324 CE 2020/0038145-6, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 15/12/2020, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/12/2020) Ainda sobre o tema, houve a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 0630366-67.2019.8.06.0000, sob a relatoria do Desembargador Francisco Bezerra Cavalcante, versando acerca da legalidade do empréstimo contratado por pessoa analfabeta, mediante instrumento particular assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, o que, após ampla discussão, consolidou o seguinte entendimento: É CONSIDERADO LEGAL O INSTRUMENTO PARTICULAR ASSINADO A ROGO E SUBSCRITO POR DUAS TESTEMUNHAS PARA A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS ENTRE PESSOAS ANALFABETAS E INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, NOS DITAMES DO ART. 595 DO CC, NÃO SENDO NECESSÁRIO INSTRUMENTO PÚBLICO PARA A VALIDADE DA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO ANALFABETO NEM PROCURAÇÃO PÚBLICA DAQUELE QUE ASSINA A SEU ROGO, CABENDO AO PODER JUDICIÁRIO O CONTROLE DO EFETIVO CUMPRIMENTO DAS DISPOSIÇÕES DO ARTIGO 595 DO CÓDIGO CIVIL. Em consequência desta decisão, nos termos do art. 978, § único, e art. 985, ambos do Código de Processo Civil, conhece-se e julga se improvida a apelação nº 0000708-62.2017.8.06.0147, afetada como causa piloto, mantendo-se inalterada a sentença de primeiro grau que julgou improcedente a demanda de origem, impondo se, portanto, por consequência, a decisão ora proferida neste Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores: Emanuel Leite Albuquerque (presidindo a sessão), Vera Lúcia Correia Lima, Durval Aires Filho, Francisco Dorival Beserra Primo, Francisco Bezerra Cavalcante (Relator), Carlos Alberto Mendes Forte, Francisco Gomes de Moura, Raimundo Nonato Silva Santos, Lira Ramos de Oliveira, Heráclito Vieira de Sousa Neto, Francisco Mauro Ferreira Liberado, Francisco Luciano Lima Rodrigues, Maria do Livramento Alves Magalhães e José Ricardo Vidal Patrocínio. Ausentes justificadamente as Desembargadoras Maria Vilauba Fausto Lopes e Maria de Fátima de Melo Loureiro. Fortaleza-Ce, 21 de Setembro de 2020. EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE Desembargador Presidindo a sessão do Órgão FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE Desembargador Relator. (Relator (a): FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE; Comarca: Piquet Carneiro; Órgão julgador: Vara Única da Comarca de Piquet Carneiro; Data do julgamento: 21/09/2020; Data de registro: 22/09/2020) Assim, com base no referido IRDR, bem como na atual posição do STJ, verifica-se que não foi tolhida a autonomia de vontade da pessoa analfabeta em contratar, todavia se estabeleceu exigências visando a compensação de sua vulnerabilidade, de forma que, além da aposição de sua digital, conste a assinatura de um terceiro a rogo, bem como a subscrição por duas testemunhas. Isso, porque nas ações que versam sobre empréstimo consignado em que a parte autora é analfabeta, o art. 595, do Código Civil (CC/2002) dispõe que o instrumento contratual poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas: CC/2002, art. 595. No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. Nesse ponto, cabe destacar que a assinatura a rogo é a assinatura de um terceiro de confiança do contratante que não sabe ou não pode assinar, que é conferida por duas testemunhas que subscreverão o documento. No presente caso, observo que a parte autora/recorrente é pessoa analfabeta. Logo, embora o banco possa dispor de variados meios para realizar seus contratos de empréstimos, não é razoável que a instituição financeira tenha a plena liberdade de escolha quando negocia com pessoa analfabeta, motivo pelo qual as exigências acima mencionadas devem ser observadas. Da análise do contrato e documentos juntados nos ids. 15511342 a 15511349, caracterizada restou a falha na prestação do serviço, pois a instituição financeira não demonstrou a regular contratação do empréstimo, uma vez que não consta a assinatura a rogo, razão pela qual entendo que o instrumento contratual é inválido. Isso, porque a assinatura a rogo não se confunde e nem pode ser substituída pela mera aposição de digital ao contrato escrito (STJ - 3ª Turma. REsp 1.868.099-CE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 15/12/2020 (Info 684). Diferente não é o entendimento desta Primeira Câmara de Direito Privado: PROCESSO CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE EM PRIMEIRO GRAU. IRRESIGNAÇÃO DA AUTORA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. INSTRUMENTO CONTRATUAL FIRMADO COM PESSOA ANALFABETA. ART. 595 DO CPC. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. VÍCIO DE FORMALIDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MATERIAL CONFIGURADO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. MODULAÇÃO TEMPORAL. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ. DANO MORAL DEVIDO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Depreende-se da leitura dos fólios processuais que a autora/recorrente, busca através da presente demanda declarar nulo o negócio jurídico objeto do contrato de empréstimo consignado nº 804501876, citado na inicial, reaver em dobro os valores cobrados indevidamente em decorrência do pacto e, ainda, a condenação do banco, ora recorrido, ao pagamento de danos morais. 2. A condição de analfabeto não retira do contratante sua capacidade de firmar contratos desde que observados os requisitos previstos em lei, como a assinatura a rogo e a subscrição de duas testemunhas, conforme interpretação analógica do art. 595 do Código Civil, como forma de conferir validade ao negócio jurídico, vejamos: ¿No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas¿. 3. No caso concreto, é forçoso reconhecer que houve falha na prestação do serviço, causando danos de ordem moral e material a promovente/recorrente, visto que, embora a instituição bancária/recorrida tenha procedido a juntada do suposto instrumento contratual (fls. 150/154), o pacto está eivado de vício de formalidade, porquanto, não há neste a assinatura a rogo, formalidade indispensável à validade do negócio jurídico. 4. Assim, quando demonstrada a falha na prestação dos serviços pelo banco, configurado está o ilícito civil, conferindo daí ao lesado a devida reparação dos danos sofridos, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor e arts. 186 e 927 do Código Civil Brasileiro. 5. Repetição do indébito - Considerando a modulação temporal dos efeitos da decisão contida no EAREsp nº 676.608/RS, somente os valores descontados após a data da publicação do acórdão em que fixado o precedente (30/03/2021), deverão ser restituídos em dobro, os demais descontos, procedidos anteriormente, deverão ser restituídos de forma simples, visto que não restou demonstrada a má-fé da instituição bancária/recorrida. 6. Danos Morais - Sobre o dano moral, enxergo que é evidente a perturbação sofrida pela autora/apelante, em decorrência do ocorrido, ao ver os descontos no seu benefício previdenciário, uma vez que não houve autorização da prática deste ato e tampouco, conforme os elementos existentes nos autos, prova de que houve a correta celebração do instrumento contratual com a instituição financeira/recorrida. 7. Fixação - Fatores - Para quantificar a indenização por danos morais deve se levar em conta, dentre outros fatores, a extensão do dano, as condições socioeconômicas dos envolvidos e o sofrimento da vítima. Nessa ordem de ideias, atento ao cotejo desses fatores, e ainda, levando em consideração os valores dos descontos, arbitro o quantum indenizatório no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), frente ao quadro fático delineado nos autos, porque não se entremostra exagerado nem insignificante, uma vez que razoável e proporcional à ofensa perpetrada. 8. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada. A C Ó R D Ã O Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer do presente recurso, para dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do eminente Relator, parte integrante desta decisão. Fortaleza, 16 de outubro de 2024. FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador Exmo. Sr. EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE Relator (TJ-CE - Apelação Cível - 0007069-38.2017.8.06.0166, Rel. Desembargador(a) EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 16/10/2024, data da publicação: 16/10/2024) [destacou-se] DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/INEXISTÊNCIA CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TARIFA BANCÁRIA, PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. CONSUMIDOR ANALFABETO. NECESSIDADE DA ASSINATURA A ROGO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESTITUIÇÃO A TÍTULO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. DANO MORAL MANTIDO EM R$ 3.000,00. ASTREINTES MANTIDAS. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. Trata-se de ação declaratória de nulidade/inexistência contratual cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada por pessoa analfabeta, que alegou a irregularidade na cobrança de tarifa bancária denominada "padronizados prioritários I". A sentença de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido, declarando a nulidade do contrato, condenando o réu à devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, ao pagamento de indenização por danos morais e em astreintes. 3. A ausência de assinatura a rogo e de duas testemunhas no contrato firmado por pessoa analfabeta, conforme previsto no art. 595 do Código Civil, acarreta a nulidade do negócio jurídico. A instituição financeira não observou os requisitos formais, tornando inválido o contrato celebrado, nos termos dos arts. 166 e 168, §único, do Código Civil. 4. Configurado o defeito no serviço prestado, não tendo o banco procedido com as cautelas devidas para a contratação com a autora, assumiu o risco lesivo, gerando o dever de indenizar. Note-se que a instituição financeira não provou a ocorrência das excludentes de responsabilidades previstas no § 3º do art. 14 do CDC. 5. Repetição do Indébito: Os valores descontados indevidamente deverão ser restituídos em dobro, uma vez que os descontos ocorreram após o marco temporal estabelecido pelo STJ (30/03/2021), conforme o entendimento consolidado no EAREsp 676.608/RS, corrigidos monetariamente pelo INPC, a contar da data de cada desconto (súmula 43 STJ) e acrescidos de juros de 1% ao mês, a partir do evento danoso (súmula 54, STJ); 6. Danos Morais: Configurados os danos morais em razão dos descontos indevidos decorrentes de contrato nulo, que afetaram diretamente o benefício previdenciário do autor, comprometendo seu sustento. Verifica-se que o cálculo arbitrado pelo magistrado da instância de origem, fixado em R$ 3.000,00 (cinco mil reais), não destoou do importe habitualmente reconhecido nas Câmaras de Direito Privado deste Tribunal, devendo, assim, ser mantido em sua integralidade, inclusive com relação à correção monetária e aos juros de mora. 7. As astreintes foram arbitradas em valor razoável e proporcional às circunstâncias fáticas e jurídicas do caso, conforme entendimento consolidado na jurisprudência, respeitando seu o caráter pedagógico e coercitivo, considerando o porte econômico da instituição financeira recorrente, sem, contudo, ultrapassar o valor da causa. 8. Apelações conhecidas e desprovidas. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes recursos, acordam os Desembargadores membros da Primeira Câmara de Direito Privado deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer das apelações para negar-lhes provimento, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza-CE, data da assinatura digital. DES. FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador DESA. MARIA REGINA OLIVEIRA CAMARA Relatora (TJ-CE - Apelação Cível - 0200644-49.2023.8.06.0053, Rel. Desembargador(a) MARIA REGINA OLIVEIRA CAMARA, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 16/10/2024, data da publicação: 16/10/2024) [destacou-se] Dessa forma, entendo que o banco não se desincumbiu do ônus de demonstrar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito autoral (art. 373, II, do CPC), mostrando-se, por outro lado, como indiscutíveis as deduções indevidas no benefício previdenciário da requerente, decorrentes do contrato impugnado. Assim, em razão da falha na prestação do serviço, não há outro caminho que não seja considerar a irregularidade da contratação. Quanto à restituição do indébito, sabe-se que os descontos realizados na conta da parte autora, em razão de contrato nulo, configuram falha na prestação do serviço e as cobranças indevidas constituem ato ilícito, na medida em que a instituição bancária deixou de agir com o cuidado necessário para o regular desenvolvimento de sua atividade, causando os danos e resultando, por via de consequência, na obrigação de repará-los, na forma dos arts. 186 e 927 do Código Civil. Vejamos: CC/2002, art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. CC/2002, art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Acrescente-se que, em se tratando de relação de consumo, a responsabilização pelos prejuízos causados ao consumidor é objetiva e independe de demonstração de culpa, nos termos do art. 14, caput, do CDC: CDC, art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Desse modo, estando comprovado nos autos os descontos indevidos da conta bancária da parte autora, em razão de contrato nulo, o dano material é certo, assim como a obrigação da instituição financeira de repará-los. Assim, por ocasião do julgamento dos embargos de divergência em agravo em recurso especial EAREsp 676.608/RS, de relatoria do Ministro Og Fernandes, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi reformulado de modo a reconhecer o direito à restituição em dobro do indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados, por ser conduta contrária à boa-fé objetiva; porém, houve modulação dos efeitos do julgado para que o entendimento seja aplicado apenas para cobranças realizadas a partir da data da publicação do acórdão, em 30 de março de 2021. A respeito cito o julgado: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA FIXA. COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC). DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA. DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL). APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. (...) Fixação das seguintes teses. Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. Segunda tese: A ação de repetição de indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do prazo prescricional decenal, consoante previsto no artigo 205 do Código Civil, a exemplo do que decidido e sumulado no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de tarifas de água e esgoto (Súmula 412/STJ). Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão. (EAREsp 676.608/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/03/2021). Desse modo, tratando o caso dos autos de cobranças indevidas com início em abril de 2011 até março de 2013, entendo que as parcelas, por terem sido descontadas antes de 30/03/2021, devem ser restituídas na forma simples. Por fim, quanto aos danos morais, a jurisprudência desta Câmara possui entendimento no sentido de que é evidente a perturbação sofrida pelo consumidor ao ver sequenciais de descontos no seu benefício previdenciário, uma vez que não houve autorização da prática deste ato e tampouco prova de que houve a celebração de qualquer objeto contratual que pudesse ensejar a cobrança dos referidos descontos. A respeito, cito os seguintes julgados: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO ANULATÓRIA DE TARIFA BANCÁRIAS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E DANOS MATERIAIS. TARIFAS BANCÁRIAS. PARTE AUTORA QUE DECLARA NÃO HAVER CELEBRADO O CONTRATO EM LIÇA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE AUTORA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE COMPROVAR A LEGITIMIDADE DA CONTRATAÇÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES DE FORMA SIMPLES SE ANTERIORES AO DIA 30/03/2021 E DOBRADA SE POSTERIORES A ESTA DATA. DANO MORAL FIXADO EM R$ 1.000,00. CONDIZENTE AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso apelatório, para dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do relator, parte integrante desta decisão. Fortaleza, Data e hora no sistema. DESEMBARGADOR FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO Presidente do Órgão Julgador/Relator [Trecho extraído do corpo do acórdão: "[...] Dessa forma, o desconto de valores na conta de um beneficiário de benefício previdenciário, são considerados como dano moral in re ipsa, dada a natureza alimentar deste benefício [...]"] (TJ-CE - Apelação Cível - 0200069-77.2023.8.06.0041, Rel. Desembargador(a) FRANCISCO MAURO FERREIRA LIBERATO, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 02/10/2024, data da publicação: 02/10/2024) DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. LEGITIMIDADE DO DÉBITO NÃO COMPROVADA PELA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. AUSÊNCIA DO CONTRATO DEVIDAMENTE PREENCHIDO. CONSUMIDORA ANALFABETA. NECESSIDADE DA ASSINATURA A ROGO. REQUISITOS DO ART. 595 DO CC. NULIDADE DO CONTRATO - ART. 166 E 168 DO CC. DESCONTOS INDEVIDOS. NEGLIGÊNCIA CARACTERIZADA (STJ, AgRg no AREsp 327.606/RJ). DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. SÚMULA 479 DO STJ. RESTITUIÇÃO EM DOBRO A TÍTULO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO, NOS TERMOS DO EARESP 676.608/RS. DANO MORAL IDENTIFICADO. E ARBITRADO EM R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS). APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 54 E 362 DO STJ. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I ¿ O cerne da controvérsia reside na existência (ou não) de relação jurídica entre a parte autora e a Instituição Financeira quanto aos descontos referentes ao empréstimo consignado questionado. II ¿ Ressalta-se que consta dos autos que a autora, ora apelante, é pessoa analfabeta, o que se faz prova pelos documentos pessoais acostados juntos à exordial e, ainda, pelo próprio contrato acostado pela instituição financeira ao feito. III ¿ Como cediço, o art. 595 do Código Civil estabelece alguns requisitos para a validade dos instrumentos pactuados por pessoa analfabeta, quais sejam: a assinatura a rogo e que o contrato seja subscrito por duas testemunhas. Dessa forma, verifica-se a inobservância aos preceitos legais supramencionados, ao passo que, em que pese constar a subscrição por duas testemunhas, não consta nenhuma assinatura a rogo. IV ¿ Dessarte, é forçoso o reconhecimento da invalidade do negócio jurídico, visto que o instrumento não observa as formalidades contidas no art. 595 c/c arts. 166 e 168, parágrafo único, todos do Código Civil. V ¿ Configurado o defeito no serviço prestado, não tendo o banco procedido com as cautelas devidas para a contratação com a autora, assumiu o risco lesivo, gerando o dever de indenizar. Note-se que a instituição financeira não provou a ocorrência das excludentes de responsabilidades previstas no § 3º do art. 14 do CDC. VI ¿ A restituição das parcelas pagas deve ser realizada em dobro, porque o início dos descontos se deu no ano de 2022, ou seja, após o marco temporal estabelecido pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o EAREsp n. 676.608/RS. VII ¿ Indenização por danos morais fixada no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em conformidade com os valores habitualmente fixados nas Câmaras de Direito Privado deste Tribunal. Incidem correção monetária, pelo INPC, nos termos da súmula n° 362, do STJ, ou seja, a partir de seu arbitramento, enquanto os juros de mora devem ser calculados a partir do evento danoso, consoante o enunciado n° 54, da mesma corte superior e o art. 398, do Código Civil. VIII ¿ Recurso conhecido e parcialmente provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes recursos, acordam os Desembargadores membros da Terceira Câmara de Direito Privado deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso para dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza-CE, 19 de junho de 2024. DESEMBARGADORA CLEIDE ALVES DE AGUIAR Presidente DESEMBARGADORA MARIA REGINA OLIVEIRA CAMARA Relatora (TJ-CE - Apelação Cível - 0201078-47.2022.8.06.0029, Rel. Desembargador(a) MARIA REGINA OLIVEIRA CAMARA, 3ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 19/06/2024, data da publicação: 25/06/2024) Ressalvo, entretanto, que os Tribunais pátrios já afastaram a condenação em danos morais em casos nos quais, apesar de constatadas cobranças ou descontos indevidos, estes se deram sob valor ínfimo e, portanto, não teriam extrapolado o âmbito do mero dissabor, por não terem gerado ao indivíduo maiores consequências no plano fático. A exemplo, cito os seguintes julgados: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E DANOS MORAIS. DESCONTO INDEVIDO. VALOR ÍNFIMO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 283 E 284/STF. DANO MORAL INEXISTENTE. MERO ABORRECIMENTO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A ausência de impugnação, nas razões do recurso especial, de fundamento autônomo e suficiente à manutenção do aresto recorrido atrai, por analogia, o óbice da Súmula 283 do STF. 2. O Tribunal de origem concluiu que o desconto indevido de uma parcela no valor de R$ 28,00 (vinte e oito reais) no benefício previdenciário da recorrente não acarretou danos morais, pois representa valor ínfimo, incapaz de comprometer sua subsistência, bem como o valor foi restituído com correção monetária, de modo que ficou configurado mero aborrecimento. 3. A jurisprudência desta Corte entende que, quando a situação experimentada não tem o condão de expor a parte a dor, vexame, sofrimento ou constrangimento perante terceiros, não há falar em dano moral, uma vez que se trata de mero aborrecimento ou dissabor, mormente quando a falha na prestação de serviços, embora tenha acarretado aborrecimentos, não gerou maiores danos ao recorrente, como ocorreu na presente hipótese. 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1354773 MS 2018/0223715-7, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 02/04/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/04/2019) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PRELIMINAR SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES - OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE - REJEITADA - MÉRITO - CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO - AUSÊNCIA DE PROVA DA DISPONIBILIZAÇÃO DO DINHEIRO - DANO MORAL PRESUMIDO - NÃO OCORRÊNCIA - EXISTÊNCIA DE APENAS DOIS (02) DESCONTOS - RESTITUIÇÃO EM DOBRO - CABÍVEL - AUSÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Discute-se no presente recurso: a) a preliminar suscitada nas Contrarrazões de ofensa ao princípio da dialeticidade; e no mérito: b) a ocorrência, ou não, de dano moral na espécie, e c) ser, ou não, hipótese de restituição em dobro dos valores descontados. 2. O princípio da dialeticidade exige que o recurso seja apresentado por petição, contendo as razões pelas quais a parte insurgente deseja obter do segundo grau de jurisdição um novo pronunciamento judicial. Para tanto, a parte recorrente deve atacar, de forma específica, os fundamentos da sentença recorrida, sob pena de carecer de um dos pressupostos de admissibilidade recursal. Preliminar rejeitada. 3. A verificação do dano moral não reside exatamente na simples ocorrência do ilícito, de sorte que nem todo ato desconforme com o ordenamento jurídico enseja indenização por dano moral, sendo necessário, ao revés, que o ato ilícito seja capaz de irradiar-se para a esfera da dignidade da pessoa, ofendendo-a de maneira relevante. Precedente STJ. 4. Na espécie, verifica-se que não houve a cobrança descabida de valores, uma vez que, conforme narrado na petição inicial, e demonstrado pelo extrato de f. 43, ocorreu somente o débito indevido de duas (2) parcelas no valor módico de R$ 9,03 no benefício previdenciário do autorapelante, o que, por si só, não demonstra a ocorrência de danos morais 5. O parágrafo único, do art. 42, da Lei nº 8.078, de 11/09/1990 ( Código de Defesa do Consumidor) dispõe que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de "engano justificável". 6. No caso, não restou comprovada a regular pactuação da avença, portanto, é indevido o desconto realizado na folha de pagamento da parte autora, assim, não há como se afastar a condenação à restituição dos valores indevidamente descontados, bem como não há causa escusável capaz de afastar a regra da restituição em dobro. 7. Apelação Cível conhecida e parcialmente provida. (TJ-MS - AC: 08002092120178120004 MS 0800209-21.2017.8.12.0004, Relator: Des. Paulo Alberto de Oliveira, Data de Julgamento: 26/11/2020, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/11/2020). DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR - APELAÇÃO CÍVEL - COBRANÇA DE ANUIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO NÃO SOLICITADO - PRÁTICA ABUSIVA - REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO - CONDENAÇÃO QUE NÃO REFLETE A PETIÇÃO INICIAL - NULIDADE - DANO MORAL NÃO COMPROVADO - MERO DISSABOR - REJEIÇÃO DO PEDIDO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. I - O Código de Defesa do Consumidor reputa como prática abusiva o envio ou a entrega ao consumidor, sem solicitação prévia, de qualquer produto, ou fornecimento de qualquer serviço (Vide art. 39, inc. III). Inteligência do Verbete nº 532 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça; II - Apesar de manifesta a falha na prestação dos serviços, com o envio de cartão de crédito não solicitado e o desconto indevido de valores mensais a título de anuidade, a sentença deve ser declarada nula no tocante à condenação da instituição financeira à devolução em dobro dos valores descontados, já que é vedado ao juiz proferir sentença além (ultrapetita) ou diferente do que foi pedido (extra petita), sob pena de transgressão ao princípio da congruência, correlação ou adstrição (art. 492 do CPC) e, em última análise, ao contraditório (art. 7º do CPC), em devendo observar o conjunto da postulação (Vide arts. 322, § 2º e 492, ambos do CPC/15), refletindo a causa de pedir formulada na petição inicial; III - A sentença merece reparo, ainda, no tocante à condenação do Apelante ao pagamento de indenização por dano moral, já que evidenciado mero dissabor, em tendo havido a simples demonstração de cobrança indevida, em valor mensal ínfimo, sem a prova de consequências outras; IV - Recurso de Apelação conhecido e parcialmente provido. (TJ-MA - AC: 00098288520168100040 MA 0002662019, Relator: ANILDES DE JESUS BERNARDES CHAVES CRUZ, Data de Julgamento: 15/08/2019, SEXTA CÂMARA CÍVEL) APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C REPARAÇÃO DE DANOS. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA CONTRA A SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE ARBITROU INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EM PATAMAR INFERIOR AO PEDIDO. AUSÊNCIA DE DESCONTOS INDEVIDOS. INEXISTÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIA APTA A CONFIGURAR OS DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE NEGATIVAÇÃO DO NOME DO APELANTE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O presente recurso configura irresignação contra o decisum de Primeiro Grau que julgou parcialmente procedente a ação originária, declarando inexistente a relação contratual objeto de análise no feito e condenando o Requerido, ora Apelado, ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 3.000,00 (três mil reais). Em síntese, o pedido de reforma da sentença se volta para dois pontos: (i) o valor da indenização por danos morais arbitrada, defendendo o Apelante a sua majoração para o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais); e (ii) o critério definido para incidência os juros moratórios sobre o quantum indenizatório. 2. Quanto ao segundo ponto, verifica-se que o Apelante não possui interesse recursal para a reforma do decisum. Isso porque, nos termos da sentença, já estabeleceu o d. Juízo originário que o valor da indenização em comento deverá ser acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso, em observância ao enunciado sumular nº 54 da súmula do STJ. Dessa forma, a decisão apelada está em perfeita consonância com a pretensão recursal do Apelante quanto a esse ponto, não havendo o que se falar em provimento para reforma da decisão. 3. A jurisprudência pátria reconhece a natureza in re ipsa dos danos morais observados em razão de descontos indevidos realizados em contracheque, mostrando-se desnecessário, portanto, a demonstração da ocorrência de dano específico resultante daquela conduta. Para a análise do quantum adequado, é relevante levar em consideração a extensão do prejuízo experimentado pelo consumidor, o numerário indevidamente descontado de seus proventos e a situação econômica de ambas as partes. Tais fatores são aptos a permitir a conclusão por um montante proporcional, razoável e eficaz para o seu intuito, evitando-se tanto o enriquecimento sem causa da parte autora quanto uma reparação insuficiente dos danos efetivamente sofridos, sem se olvidar da função preventiva e punitiva da indenização por dano moral. 4. No caso em apreço, impende observar, entretanto, que não há notícia quanto à realização de descontos indevidos no contracheque do Apelante. Trata-se, na realidade, de circunstância incontroversa, uma vez que o próprio Autor afirmou a não ocorrência dos descontos em questão, mas apenas a contratação indevida de reserva de margem consignável para cartão de crédito (RMC) sem sua autorização. Assim, a situação em comento tende a revelar ausência do próprio dano moral alegado. Isso porque, ainda que casos dessa natureza normalmente revelem presunção quanto à existência do dano, há de se ressaltar que tal presunção não é absoluta, impondo-se que estejam presentes elementos mínimos suficientes à formação da própria presunção. 5. Os transtornos indicados e comprovados nos autos se restringem à informação de uma contratação não autorizada de um cartão de crédito consignado, estipulando-se uma reserva de margem consignável para o referido cartão (RMC) no contracheque do Promovente. Não restou comprovada a realização de qualquer desconto ou outra circunstância passível de retirar do ocorrido a natureza de mero dissabor e ensejar um dano moral indenizável. 6. Os Tribunais pátrios já afastaram a condenação em danos morais em casos nos quais, inobstante constatadas cobranças ou descontos indevidos, estes se deram sob valor ínfimo e, portanto, não teriam extrapolado o âmbito do mero dissabor, por não haverem gerado ao indivíduo maiores consequências no plano fático. 7. Dessa forma, não se vislumbram fundamentos fático-jurídicos para a majoração da indenização arbitrada a título de danos morais, cujo valor já se mostra superior ao necessário para fins de compensação pelos transtornos sofridos pelo Autor/Recorrente, matéria não revisitada em razão da ausência de recurso do Réu/Apelado. 8. Recurso parcialmente conhecido e desprovido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer parcialmente do recurso de apelação para, na parte conhecido, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Desembargador Relator. Fortaleza, data e assinatura digital registradas no sistema processual eletrônico. (TJCE - Apelação Cível - 0051042-69.2020.8.06.0091, Rel. Desembargador(a) JOSE RICARDO VIDAL PATROCÍNIO, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 15/02/2023, data da publicação: 15/02/2023) Entendo, portanto, que o prejuízo mensal experimentado pela parte autora/recorrente, correspondente a R$ 80,62 (id. 15511290), traduz quantia ínfima, sem qualquer indício de comprometimento da renda da parte consumidora, motivo pelo qual concluo por inexistir um efetivo abalo capaz de repercutir sobre valores extrapatrimoniais, resumindo-se a ocorrência em mero aborrecimento a que ficam sujeitos todos aqueles que compartilham a vida em sociedade, restando, assim, afastada a pretensão indenizatória. Nesse sentido converge a jurisprudência desta Primeira Câmara de Direito Privado, que, em reiterados julgados, reconhece que os descontos em valor ínfimo, ainda que indevidos, não são capazes, por si só, de ensejar a reparação por dano moral. A exemplo, cito o seguinte julgado: DIREITO DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CONSUMIDOR NÃO ALFABETIZADO. ART. 595 DO CC. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO CONCRETA SOBRE O REPASSE DO CRÉDITO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO SEU ONUS PROBANDI (ART. 373, II, CPC). REPETIÇÃO DO INDÉBITO. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES. VALORES DESCONTADOS ANTES DE 30/03/2021. EARESP 676.608/RS. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURADOS. DESCONTOS ÍNFIMOS. RECURSO DO RÉU CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO AUTOR PREJUDICADO. 1. Trata-se de recursos de Apelação Cível simultâneos interpostos por Francisco das Chagas dos Santos e Banco BMG S/A, objetivando a reforma da sentença de fls. 155/161, proferida pelo MM. Juiz de Direito Luiz Guilherme Costa Pedroso Silva, da 1ª Vara Cível da Comarca de Itapipoca/CE, nos autos da Ação Anulatória de Negócio Jurídico c/c Repetição de Indébito e Pedido de Indenização por Danos Morais ajuizada pelo particular em face da instituição financeira. 2. O cerne da controvérsia consiste em verificar a validade do contrato de empréstimo consignado nº 4643794406999, conforme delineado na petição inicial, celebrado entre a instituição financeira e a parte autora, bem como o cabimento de restituição em dobro e indenização por danos morais. 3. Sobre o assunto, esta e. Primeira Câmara de Direito Privado firmou entendimento de que a confirmação da regularidade ou irregularidade do negócio depende de provas concretas sobre (a) a anuência da consumidora sobre os descontos realizados em seu benefício e (b) o recebimento do crédito por parte da promovente. 4. O banco réu juntou a cópia do contrato de empréstimo consignado questionado, acompanhada tão somente da cópia dos documentos pessoais do autor e de uma tabela demonstrativa dos pagamento referentes ao empréstimo (fls. 113/118). Cumpre salientar que consta na fl. 113 do contrato a impressão digital que supostamente pertence ao demandante, desacompanhada, contudo, da assinatura de um terceiro a rogo e das testemunhas, conforme orienta o art. 595 do Código Civil, vez que o autor é pessoa não alfabetizada, situação comprovada tanto pela documentação pessoal acostada pelo promovente (fl. 32), quanto pelo documento de identidade anexado ao contrato pelo próprio réu (fl. 115). 5. De mais a mais, não se pode perder de vista ainda que o banco requerido deixou de anexar comprovante de envio do crédito correspondente ao instrumento avençado. É fato que a ausência de comprovação de TED ou DOC, disponibilizado em nome do requerente, impossibilita a verificação da validade do contrato que deu ensejo aos descontos no benefício da parte autora, pois, como dito acima, a confirmação da regularidade do negócio depende de provas concretas sobre (a) a anuência do consumidor sobre os descontos realizados em seu benefício e (b) o recebimento do crédito por parte do promovente. 6. Feitas estas considerações, não há outro caminho senão reconhecer a inexistência do contrato questionado e o desconto indevido das parcelas no benefício previdenciário do demandante, que configuram falha na prestação de serviços do requerido, que ensejam reparação civil, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. 7. No que se refere ao pedido de restituição em dobro dos valores efetivamente descontados, oportuno destacar que o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça ¿ STJ é de que a restituição em dobro do indébito deve ser aplicada apenas às cobranças indevidas realizadas a partir de 30/03/2021 (EAREsp 676.608/RS). À luz de tais considerações, observa-se que, consoante documento demonstrativo dos descontos efetuados na conta bancária do requerente (fl. 118), o último pagamento foi realizado em dezembro de 2020, ou seja, anteriormente à data de 30.03.2021. Por tal razão, cumpre acolher o argumento do réu/recorrente, de que a repetição do indébito se dê na forma simples. 8. Com relação ao dano moral, tem-se que ele somente ocorre quando houver lesão a bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome etc., como se infere dos arts. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal. No caso em tela, houve desconto ínfimo no benefício previdenciário do autor, no valor de R$ 41,25 (quarenta e um reais e vinte e cinco centavos), em 4 parcelas, perfazendo um valor total de R$ 165,00 (cento e sessenta e cinco reais). Nesse contexto, entende-se que o consumidor não ficou desprovido de recursos financeiros para solver suas despesas ordinárias e, consequentemente, não houve dano extrapatrimonial. 9. Recurso do réu conhecido e parcialmente provido. Recurso do autor prejudicado. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer de ambos os recursos, para dar parcial provimento ao apelo do réu e declarar prejudicado o apelo do autor, nos termos do voto do Desembargador Relator. Fortaleza, data da assinatura digital. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Relator (TJCE - Apelação Cível - 0201631-38.2023.8.06.0101, Rel. Desembargador(a) JOSE RICARDO VIDAL PATROCÍNIO, 1ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 18/09/2024, data da publicação: 18/09/2024) Por fim, quanto ao pleito de revisão dos honorários sucumbenciais, verifico que o juízo a quo os fixou no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (R$ 20.000,00), na proporção de 70% a ser arcado pelo banco réu e 30% pela parte autora, observando a condição suspensiva de exigibilidade prevista no §3º do art. 98 do CPC/2015. Entendo, porém, que seus argumentos não merecem prosperar, uma vez que fixação se encontra plenamente adequada aos parâmetros estabelecidos no art. 85, §2º do CPC/2015, que determina que os honorários sejam fixados entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação, do proveito econômico ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. Isso, porque o percentual de 10% representa exatamente o mínimo legal previsto na legislação processual. Considerando o grau de zelo profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado, bem como o tempo exigido para seu serviço, não se vislumbra qualquer motivo para majoração desse percentual. A distribuição proporcional dos honorários (70% para o réu e 30% para o autor) também reflete adequadamente a sucumbência recíproca, observando-se o critério da proporcionalidade em relação aos respectivos decaimentos das partes no tocante aos pedidos formulados inicialmente, em conformidade com o art. 86 do CPC/2015. Portanto, não havendo qualquer ilegalidade ou abuso de direito na fixação realizada pelo juízo a quo, deve ser mantida a sentença nesse ponto. Diante do exposto, firme nas razões acima delineadas, conheço dos recursos e, no mérito, nego-lhes provimento, mantendo a sentença recorrida em todos os seus termos. Considerando o trabalho adicional realizado em sede recursal pelos recorrentes, majoro os honorários advocatícios anteriormente fixados para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §11º, do CPC/2015. Ficam as partes, desde logo, advertidas de que a oposição de embargos de declaração, com nítido intuito protelatório, ensejará a aplicação da multa prevista no art. 1.026, §§2º e 3º, do CPC/2015. É o voto que submeto à apreciação dos meus eminentes pares. Desembargador CARLOS AUGUSTO GOMES CORREIA Relator

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Luglax Pintura Eletrostatica A Po Ltda Epp x Município De Maringá/Pr

ID: 325753695

Tribunal: TJPR Órgão: 1ª Vara da Fazenda Pública de Maringá Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0009001-05.2020.8.16.0190

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

LUGLAX PINTURA ELETROSTATICA A PO LTDA EPP

Polo Passivo:

MUNICíPIO DE MARINGá/PR

Conclusão

Advogados:

HEVERTON HOLSBACH DA SILVA

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LUIZ FERNANDO BOLDO DO NASCIMENTO

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MARCELA SANDRI PIRES

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE MARINGÁ - PROJUDI Avenida Pedro Taques, 294 - 18ª Andar - Torre… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE MARINGÁ - PROJUDI Avenida Pedro Taques, 294 - 18ª Andar - Torre Sul - Ed. Átrium Empresarial - Zona 07 - Maringá/PR - CEP: 87.030-008 - Fone: (44) 3472-2701 - E-mail: MAR-16VJ-S@tjpr.jus.br Autos nº. 0009001-05.2020.8.16.0190 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Dívida Ativa (Execução Fiscal) Valor da Causa: R$439.747,90 Autor(s): Luglax Pintura Eletrostatica a Po LTDA EPP Réu(s): Município de Maringá/PR Vistos e examinados estes autos: I. Relatório Trata-se de ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária cumulada com pedidos desconstitutivo e condenatório ajuizada por Luglax Pintura Eletrostática a Pó Ltda. em face da Fazenda Pública do Município de Maringá, ambas qualificadas e devidamente representadas nos autos. Aduziu a parte autora que se cuida de empresa de pequeno porte localizada em Maringá/PR, enquadrada no regime fiscal do Simples Nacional, e que sua atividade cinge-se à realização de pintura eletrostática utilizada na construção civil como etapa de industrialização de um bem que lhe é dado e após é devolvido ao cliente, “pois angaria ao bem um beneficiamento e após retornar ao seu cliente, é por ele (cliente) empregado em seu objeto final, seja um bem ou um serviço”. Sustentou que não se cuida de “um simples serviço de pintura”. Instruiu a petição inicial com registros fotográficos de seu estabelecimento, descrevendo o modo como é realizada a pintura eletrostática. Registrou, com amparo em suas notas fiscais, que seus clientes são indústrias, construtoras, arquitetos e grandes empresas que lhe remetem o bem para beneficiamento e após o integram em posterior etapa de industrialização ou comercialização, sendo estes bens consistentes em itens como: grades, chapas, tampas, tornos, ferragens etc. Consignou que não entrega o bem modificado ao seu consumidor final, “salvo raras exceções”. Mencionou que sua atividade é tributada pelo IPI e pelo ICMS, de forma que defendeu a higidez de tais exações e rechaçou a incidência ou ocorrência de fato gerador de ISSQN. Anotou que quando presta atividade final ao usuário, o que disse se dar de forma esporádica, recolhe o ISSQN, conquanto a sua atividade principal encontre-se sujeita apenas à incidência de ICMS e IPI. Narrou que, a despeito das atividades que precipuamente desenvolve, a Fazenda Pública ré atribuiu-lhe indevidamente, após fiscalização, o débito de R$ 197.529,91 (cento e noventa e sete mil, quinhentos e vinte e nove reais e noventa e um centavos) a título de ISSQN, vide auto de infração n. 33498/2013. Registrou que em momento algum o fiscal responsável solicitou ou pediu documentos com o fito de entender a atividade ou apurar os números em tese devidos, tampouco considerou os recolhimentos da autora ao fisco estadual. Além disso, assinalou que o cálculo para a constituição do tributo deu-se sobre a receita bruta total da autora, erigindo a nulidade do procedimento. Relatou que a sua dívida tributária atual junto à Fazenda Pública ré totaliza a monta de R$ 439.747,90 (quatrocentos e trinta e nove mil, setecentos e quarenta e sete reais e noventa centavos), e salientou que o débito encontra-se parcelado em razão do regime fiscal do Simples Nacional pelo qual optou, e diante da impossibilidade de que conste como inadimplente fiscal. Assim, disse que se encontra instada a recolher o ISSQN, sob o risco iminente de sofrer novas autuações a serem realizadas pela municipalidade ré, apesar de se encontrar sujeita à bitributação. Quanto ao fundamento jurídico de sua pretensão, citou o art. 4º do Decreto n. 7.212/2010, com o objetivo de conceituar a industrialização à luz do regulamento do IPI, bem como o disposto no item 14.5 do Código Tributário do Município de Maringá (Lei Complementar Municipal n. 677/2007), com redação dada pela Lei Complementar Municipal n. 1090/2017, para conceituar o serviço de pintura que rechaça exercer. Defendeu, ademais, que a cobrança nos moldes em que realizada resulta em bitributação, o que é vedado pela Constituição Federal. Ao final, requereu concessão de medida liminar com o fito de que a exigibilidade do débito fiscal fosse suspensa e pugnou pela inteira procedência da ação em sede de prestação jurisdicional definitiva, a fim de que se declare a inexistência da relação jurídico-tributária entre as partes no que tange à cobrança do ISSQN e, bem assim, a nulidade do débito fiscal inscrito, com a condenação da ré à restituição dos valores pagos indevidamente a título de ISSQN. Juntou documentos (cf. movs. 1.2 a 1.377). A medida liminar pugnada por indeferida na decisão de mov. 11.1. A ré Fazenda Pública do Município de Maringá apresentou contestação nos autos em mov. 18.1. No mérito, narrou que o auto de infração impugnado foi aplicado no âmbito do processo administrativo fiscal n. 61450/2013, que de seu turno originou-se na notificação n. 32821/2013, na qual o fisco municipal notificou a autora para apresentar os documentos contábeis com o objetivo de que fosse apurado o cumprimento da obrigação tributária com o recolhimento do ISSQN. Comentou que, na seara administrativa, decidiu-se pelo não cumprimento da legislação tributária municipal, motivo pelo qual a exação impugnada foi lavrada em 13 de setembro de 2013. Prosseguiu aduzindo que enquadra a atividade da parte autora de forma escorreita, de forma que a tributação sobre a prestação de serviços de qualquer natureza possui amparo no art. 156, inciso III, da Constituição Federal e, ainda, no que dispunham as leis pertinentes vigentes à época, sendo elas: a Lei Complementar n. 116/2003 e as Leis Complementares Municipais ns. 505/2003 e 677/2007. Comentou que a lista anexa à LC 116/2003 contemplou de forma exata os serviços realizados pela parte autora aos mais variados clientes, vide item 14.05, o que é corroborado, outrossim, pela legislação local. Ratificou, pois, a higidez do auto de infração n. 3498/2013. Sustentou, pois, que a “industrialização por encomenda” é atividade a ser tributada pela incidência do ISSQN, e não do ICMS, salientando que se cuidaria de atividade mista. Em tema de conclusão, assinalou que a celebração de parcelamento administrativo configura confissão de dívida e que a exação pauta-se pela atuação administrativa adstrita ao princípio da legalidade. Teceu comentários sobre a atualização monetária em caso de eventual determinação de repetição de indébito. Ao final, pugnou pela integral improcedência dos pedidos formulados pela parte autora. Impugnação à contestação em mov. 21.1, pela qual a parte autora ratificou a tese de que a atividade narrada na petição inicial deve sujeitar-se à incidência de ICMS, e jamais ISSQN. Além disso, rejeitou a tese de que o parcelamento administrativo do débito fiscal configuraria confissão de dívida. As partes especificaram as provas que pretenderam produzir nos autos em movs. 27.1 e 28.1. O Ministério Público manifestou a desnecessidade de sua intervenção nos autos (cf. mov. 31.1). Sobreveio decisão de saneamento e organização do processo em mov. 34.1, pela qual se deferiu a produção de prova pericial contábil pugnada. O laudo pericial foi juntado aos autos em mov. 136.1. A parte autora pugnou por esclarecimentos na forma da petição de mov. 139.1, e assim o fez a Fazenda Pública ré em mov. 140.1. Pela decisão de mov. 146.1, determinou-se a intimação do Sr. Perito que atua no feito para prestar os esclarecimentos pleiteados, o que resultou na nova manifestação exarada pelo expert em mov. 150.1 e, após, nova manifestação em mov. 157.1. Em mov. 167.1, a Fazenda Pública requereu a intimação da parte contrária para que juntasse documentação aos autos, em pleito que após foi aditado para amoldar-se ao rito da exibição de documentos (cf. mov. 174.1). A exibição de documentos requerida foi deferida por este Juízo, na forma da decisão de mov. 176.1, que ordenou a intimação da parte autora para manifestação. A ordem foi reiterada em mov. 184.1. A parte autora manifestou-se em mov. 187.1, no sentido de que a documentação foi descartada. Sobreveio nova manifestação da Fazenda Pública ré em mov. 190.1. O julgamento foi convertido em diligência por este Juízo na forma do pronunciamento de mov. 192.1, pela qual se determinou a intimação das partes para manifestarem-se acerca da possível prescrição da pretensão autoral, ainda que parcial, sendo esta questão suscitada de ofício. A parte autora manifestou-se em mov. 195.1, rechaçando eventual prescrição e pugnando pela inteira procedência da ação. A Fazenda Pública ré, de seu turno, manifestou-se pela prescrição da pretensão autoral, sob o argumento de que a presente ação foi ajuizada após decorrido o prazo prescricional quinquenal para se questionar o lançamento. Por fim, os autos vieram-me conclusos. É o relatório. Decido. II. Fundamentação Cuida-se de ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária cumulada com pedidos desconstitutivo e condenatório ajuizada por Luglax Pintura Eletrostática a Pó Ltda. em face da Fazenda Pública do Município de Maringá, na qual pugnou a parte autora pela procedência da ação a fim de que se declare a inexistência da relação jurídico-tributária entre as partes no que tange à cobrança do ISSQN e, bem assim, a nulidade do débito fiscal inscrito, com a condenação da ré à restituição dos valores pagos indevidamente a título de ISSQN. Verifica-se que a autora cumulou, autorizada pelo art. 327 do Código de Processo Civil[1], pedidos de três naturezas distintas: a) desconstitutiva, no que diz respeito ao débito fiscal constituído e que, de seu turno, remete-se ao auto de infração de n. 3498/2013; b) declaratória, no que tange à inexistência de relação jurídico-tributária entre as partes quanto à incidência de ISSQN, e; c) condenatória, quanto à eventual indébito. Malgrado tenha a parte autora adotado “nomen iuris” típico de pleito que busca a obtenção de tutela declaratória de forma indistinta, tem-se que, ao menos no que se liga ao pleito de declaração da “nulidade do débito fiscal inscrito e aberto de ISSQN” (cf. petição inicial de mov. 1.1, fl. 23), aludida prestação jurisdicional cuidar-se-ia, a bem da verdade, de desconstitutiva. A propósito do tema, bem esclarece a especializada doutrina de Leandro Paulsen ao comentar sobre a comumente denominada ação anulatória: “Quando o contribuinte é notificado para pagar determinado tributo contra ele lançado, tem a possibilidade de defender-se administrativamente, com efeito suspensivo da exigibilidade do respectivo crédito (art. 151, III, do CTN). Pode ocorrer, contudo, que não obtenha sucesso no processo administrativo. Ou, ainda, que prefira ir de pronto a juízo, hipótese em que estará abrindo mão da esfera administrativa. O contribuinte não deve olvidar que o ajuizamento de ação anulatória implica renúncia à esfera administrativa, de maneira que, se houver alguma impugnação ou recurso administrativo pendentes de julgamento, serão considerados prejudicados pela autoridade julgadora. É o que dispõe o art. 38, parágrafo único, da LEF: ‘A propositura, pelo contribuinte, da ação prevista neste artigo, importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto’. A ação anulatória é utilizada quando o sujeito passivo tenha como escopo anular lançamento já realizado pelo Fisco, desconstituindo o Auto de Infração ou ato administrativo equivalente. [...]. A prestação jurisdicional pretendida tem eficácia predominantemente desconstitutiva. Os fundamentos podem ser os mais variados, desde a inconstitucionalidade formal e material da lei instituidora do tributo, passando pela sua não aplicação ou melhor aplicação ao caso concreto, até vícios no procedimento de lançamento, no próprio ato de lançamento, ou, ainda, no processo administrativo-fiscal. [...]. Pode-se cumular pedidos declaratório e anulatório, a fim de obter, de uma única vez, tanto o reconhecimento de que inexiste a obrigação de pagar tributo em tais ou quais situações que podem vir a se repetir, como a anulação do lançamento indevidamente efetuado.” (in: Curso de Direito Tributário Completo. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. Grifos acrescidos). A devida conceituação do pedido que, à luz do dia, revela-se enquanto desconstitutivo mostra-se enquanto pressuposto essencial para a adequada análise da prescrição (questão suscitada de ofício por este Juízo quando do pronunciamento de mov. 192.1), porém não prejudica o pleito que possui viés declaratório ligado à (in)existência de relação jurídico-tributária - o qual se mostra autorizado na forma do art. 19, inciso I, do Código de Processo Civil: Art. 19. O interesse do autor pode limitar-se à declaração: I - da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica. Noutros termos, frisa-se que assumir enquanto desconstitutivo o pedido formulado no sentido de que seja “cancelado” o débito fiscal originado do auto de infração n. 33498/2013 não torna obstada a análise do pedido com viés eminentemente declaratório, ligado à existência ou não de obrigação tributária quanto à prática dos atos narrados ao longo da petição inicial e, por arrastamento, à (in)adequação da interpretação do Fisco. Tecidas as devidas considerações introdutórias sobre a temática, passo à análise da controvérsia. II.1. Da prejudicial de mérito. Da prescrição Consoante antecipado por este Juízo em mov. 192.1, a contestação oferecida pela Fazenda Pública ré nos autos em mov. 18.1 esclareceu que o auto de infração impugnado pela parte autora foi lavrado no dia 13 de setembro de 2013 (auto de infração n. 33498/2013), ao passo que a presente ação anulatória veio a ser ajuizada no dia 16 de dezembro de 2020. Ou seja: o feito foi ajuizado após decorrido por completo o quinquênio prescricional previsto no Decreto n. 20.910/1932. O pronunciamento retro deste Juízo, que instaurou o contraditório para que as partes se manifestassem a respeito de eventual prescrição da pretensão autoral, ainda que parcial, foi instruído por menção ao seguinte julgado proferido pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: RECURSO INOMINADO. ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE AÇÃO. INSURGÊNCIA RECURSAL DO AUTOR. TESES RECURSAIS REJEITADAS. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DIREITO ADMINISTRATIVO E DE TRÂNSITO. OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TRANSCURSO DO PRAZO DE 5 ANOS ENTRE A INFRAÇÃO (01.05.2016) E O AJUIZAMENTO DA PRESENTE DEMANDA (EM 27.06.2023) QUE OBJETIVAVA A DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE AUTO DE INFRAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRAZO QUINQUENAL PREVISO NO DECRETO Nº 20.910/1932. PRETENSÃO DO AUTOR QUE SE ENCONTRA FULMINADA PELA PRESCRIÇÃO. PRECEDENTES. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. [...]. (TJPR - 4ª Turma Recursal - 0020866-44.2023.8.16.0182 - Curitiba - Rel.: JUIZ DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS LEO HENRIQUE FURTADO ARAUJO - J. 16.12.2024. Grifos acrescidos). Nesta toada e valendo-se novamente das lições de Leandro Paulsen a respeito da comumente denominada ação anulatória, vê-se que, como antecipado, o prazo prescricional para o ajuizamento é de cinco anos (cf. art. 1º do Decreto n. 20.910/1932[2]); e tal lapso deve ser contado da notificação do lançamento ou do final do processo administrativo: “O prazo prescricional para o ajuizamento da ação anulatória é de cinco anos, aplicando-se o art. 1 o do Decreto n. 20.910/32, contatos da notificação do lançamento ou da decisão final do processo administrativo.” (“Idem”. Grifos acrescidos). Na jurisprudência da Corte Paranaense prevalece idêntico entendimento. Registre-se: APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. IPTU. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA E SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. IMÓVEL INVADIDO POR TERCEIROS. PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO ANULATÓRIA. OCORRÊNCIA. INAÇÃO DA PARTE INTERESSADA POR PERÍODO SUPERIOR AO PRAZO QUINQUENAL PREVISTO NO DECRETO Nº 20.910/1932. EXECUÇÃO FISCAL PROPOSTA PELO EXEQUENTE QUE NÃO TEM O CONDÃO DE INTERROMPER A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DO CONTRIBUINTE. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO TRIBUTÁRIA QUE DEVE SE LIMITAR AOS PERÍODOS COBRADOS NA EXECUÇÃO FISCAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. [...]. É entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça que para o ajuizamento de ação anulatória contra a Fazenda Pública, o prazo prescricional é aquele de 5 anos previsto no artigo 1º do Decreto nº 20.910/32, contado da notificação do lançamento. Confira-se o seguinte precedente: [...]. Analisando as CDAs cobradas nas execuções fiscais nº 16310-18.2014.8.16.0019 e 16314-55.2014.8.16.0019, constata-se que estas se referem a débitos dos exercícios de 2010 a 2013, e, visto se tratar de IPTU, o início do prazo prescricional para anulação do lançamento ocorreu após a notificação para pagamento, o qual ocorreu com o envio do carnê no primeiro dia do exercício, qual seja em 02.01.2010, 02.01.2011, 02.01.2012 e 02.01.2013, respectivamente. Confira-se: [...]. Considerando que o despacho de citação expedido nos autos das referidas execuções não é causa de interrupção da prescrição em relação a presente ação anulatória, correta a decisão que reconheceu a prescrição, visto que a demanda anulatória foi ajuizada em 14.03.2019, ou seja, após transcorrido o prazo prescricional quinquenal previsto no artigo 1º do Decreto nº 20.910/32, que findou quanto ao último exercício cobrado (02.01.2013) na data de 02.01.2018. Nesse sentido, já decidiu esse E. Tribunal: [...]. (TJPR - 1ª Câmara Cível - 0001289-50.2024.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR LAURI CAETANO DA SILVA - J. 27.05.2024. Grifos acrescidos). A questão é, anda, melhor esclarecida por julgado vinculante proferido pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, vinculado ao Tema Repetitivo 229 e assim ementado: PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. IPTU, TCLLP E TIP. INCONSTITUCIONALIDADE DA COBRANÇA DO IPTU PROGRESSIVO, DA TCLLP E DA TIP. AÇÃO ANULATÓRIA DE LANÇAMENTO FISCAL. CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRESCRIÇÃO. TERMO A QUO. ILEGITIMIDADE DO NOVO ADQUIRENTE QUE NÃO SUPORTOU O ÔNUS FINANCEIRO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 07 DO STJ. 1. O prazo prescricional adotado em sede de ação declaratória de nulidade de lançamentos tributários é qüinqüenal, nos moldes do art. 1º do Decreto 20.910/32. (Precedentes: AgRg no REsp 814.220/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2009, DJe 02/12/2009; AgRg nos EDcl no REsp 975.651/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/04/2009, DJe 15/05/2009; REsp 925.677/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2008, DJe 22/09/2008; AgRg no Ag 711.383/RJ, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ 24.04.2006; REsp 755.882/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ 18.12.2006) 2. Isto porque o escopo da demanda é a anulação total ou parcial de um crédito tributário constituído pela autoridade fiscal, mediante lançamento de ofício, em que o direito de ação contra a Fazenda Pública decorre da notificação desse lançamento. 3. A ação de repetição de indébito, ao revés, visa à restituição de crédito tributário pago indevidamente ou a maior, por isso que o termo a quo é a data da extinção do crédito tributário, momento em que exsurge o direito de ação contra a Fazenda Pública, sendo certo que, por tratar-se de tributo sujeito ao lançamento de ofício, o prazo prescricional é quinquenal, nos termos do art. 168, I, do CTN. [...]. (REsp n. 947.206/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 13/10/2010, DJe de 26/10/2010. Grifos acrescidos). Como visto na ementa acima, há distinção entre a pretensão anulatória (ou, melhor dizendo, desconstitutiva) e a pretensão de repetição de indébito, o que possui o condão de repercutir na respectiva contagem prescricional. Na primeira, objetiva-se “a anulação total ou parcial de um crédito tributário” - como inequivocamente pretendeu a parte autora em relação ao auto de infração n. 33498/2013 -, ao passo que na última visa-se a restituição de crédito tributário pago indevidamente ou a maior. Para elucidar ainda mais a questão, cito o que constou do voto do eminente Ministro Relator Luiz Fux: “No tocante à prescrição, é cediço que, com a finalidade de obstar a perenização das situações de incerteza e instabilidade geradas pela violação ao direito, e fulcrado no Princípio da Segurança Jurídica, o sistema legal estabeleceu um lapso temporal, dentro do qual o titular do direito pode provocar o Poder Judiciário, sob pena de perecimento da ação que visa tutelar o direito. Deveras, o prazo prescricional a ser observado em relação à ação declaratória de nulidade do lançamento, em decorrência da ausência de norma específica a regular a matéria, é qüinqüenal, nos moldes do art. 1º do Decreto 20.910/32, que assim dispõe: [...]. Deveras, a ação anulatória de lançamento fiscal objetiva a anulação total ou parcial de um crédito tributário constituído pela autoridade fiscal, mediante o lançamento de ofício, em que o direito de ação contra a Fazenda Pública decorre da notificação desse lançamento, sendo esse o termo inicial para a contagem da prescrição. [...]. Ao revés, a ação de repetição de indébito visa à restituição de crédito tributário pago indevidamente ou a maior, por isso que o termo a quo é a data da extinção do crédito tributário, momento em que exsurge o direito de ação contra a Fazenda Pública. Tratando-se de tributo sujeito ao lançamento de ofício, o prazo prescricional é quinquenal, nos termos do art. 168, I, do CTN.” (cf. voto vencedor no REsp n. 947.206/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 13/10/2010, DJe de 26/10/2010. Grifos acrescidos). E, em caso que se amolda ainda melhor ao presente, veja-se o seguinte julgado também proferido pelo Tribunal da Cidadania: PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. INCONSTITUCIONALIDADE DA COBRANÇA DO IPTU PROGRESSIVO, DA TCLLP E DA TIP. AÇÃO ANULATÓRIA DE LANÇAMENTO FISCAL. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. APLICAÇÃO DO ART. 1º DO DECRETO 20.910/32. AJUIZAMENTO DE AÇÃO ANULATÓRIA DO LANÇAMENTO POSTERIOR À PROPOSITURA DO EXECUTIVO FISCAL. AUSÊNCIA DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO NÃO DEBATIDO NA INSTÂNCIA "A QUO" (ART 267, VI, DO CPC). VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. 1. O prazo prescricional, em sede de ação declaratória de nulidade de lançamentos tributários, é qüinqüenal, nos moldes do art. 1º do Decreto 20.910/32. (Precedentes: AgRg no Ag 711.383/RJ, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ 24.04.2006; REsp nº 766.670/RJ, Relator Ministro LUIZ FUX, DJ de 31.08.2006; REsp 755.882/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ 18.12.2006) 2. Isto porque a presente demanda retrata hipótese em que o direito de ação contra a Fazenda Pública decorre da notificação do lançamento de ofício, e não da extinção do crédito tributário (art.168, I, do CTN), porquanto não encerra o caso sub judice pleito de repetição do indébito, mas de anulação total ou parcial de um crédito tributário definitivamente constituído. 3. In casu, o ora Recorrente ajuizou, em 02/07/03, ação anulatória dos lançamentos fiscais que constituíram créditos tributários relativos ao IPTU, TCLLP e TIP - tributos eivados de vício de inconstitucionalidade - referentes aos exercícios de 1995 a 1999, tendo sido os lançamentos efetuados nos meses de janeiro dos respectivos anos. 4. Conseqüentemente, na ausência de norma específica a regular a matéria, o prazo prescricional a ser observado é qüinqüenal, nos moldes do art. 1º do Decreto 20.910/32, razão pela qual ressoa inequívoca a ocorrência da prescrição quanto aos lançamentos efetuados nos exercícios de 1995 a 1998. [...]. 13. Recurso especial parcialmente provido, para decretar a prescrição da ação quanto ao exercício de 1998, nos termos da fundamentação expendida. (REsp n. 925.677/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 21/8/2008, DJe de 22/9/2008. Grifos acrescidos). Na casuística, a parte autora expressamente pugnou pela anulação total ou parcial de crédito tributário constituído enquanto consequência de auto de infração. Uma vez confrontada tal conjuntura com as decisões acima citadas, autoriza-se concluir que a parcela da demanda ora analisada veicula pretensão típica de ações anulatórias, o que é corroborado pela leitura dos pedidos formulados: “No mérito, CONFIRME a antecipação de tutela presente no item ‘a’, DECLARE a inexistência da relação jurídico-tributária entre as partes no que tange à cobrança do tributo ISSQN por ser a atividade da Autora fato gerador de ICMS e IPI, bem como, DECLARE a nulidade do débito fiscal inscrito e aberto de ISSQN em nome da Autora junto à Requerida; SUBSIDIARIAMENTE, caso necessário, DECLARE de todo modo a constituição do crédito Tributário nulo por abusividade e arbitrariedade, já que o Município Requerido arbitrou a base de cálculo do ISSQN cobrado sobre a receita bruta da Autora através dos números de seu livro de registro de saída sem levar em consideração a atividade da empresa, as etapas de industrialização, e ainda, não se limitou a eventual e esporádico serviço prestado, ou seja, aos fatos reais; Ainda, CONDENE a Ré a restituição dos valores pagos indevidamente pela Autora, atualizados com juros e correção monetária, sob pena de enriquecimento sem causa, pois diante de ato absolutamente nulo por ausência de fato gerador, os pagamentos eram absolutamente indevidos, ou, alternativamente, que ao menos sejam repetidos os pagamentos que ainda não estejam prescritos, devendo a parte Ré apresentar demonstrativo atualizado do débito e pagamentos efetivados.” (cf. petição inicial de mov. 1.1. Grifos acrescidos). Assim, por evidente que o prazo prescricional incidente é quinquenal e contado a partir da notificação do lançamento ou da decisão final do processo administrativo - e não da extinção do débito tributário, como quis fazer crer a parte autora em sua petição retro de mov. 195.1. A bem da verdade, convém esclarecer que o prazo aludido pela parte autora e previsto pelo art. 168, inciso I, do Código Tributário Nacional não se cuida de prazo prescricional, mas de prazo decadencial. Com efeito, não pode ser interrompido (como sugeriu a parte autora, ao aludir ao parcelamento administrativo), à luz da eloquente exposição feita na lição de Aliomar Baleeiro, atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi: “O prazo de cinco anos do art. 168 é de decadência, e, portanto, não pode ser interrompido. Vencedor, o sujeito passivo tem de pleitear a restituição dentro dessa dilação, contada da extinção do crédito, por qualquer meio admitido no CTN, nos casos dos incisos I e II do art. 165. E da data em que se tornar definitiva, isto é, irrecorrível a decisão administrativa ou judicial que anulou, reformou ou rescindiu a decisão condenatória, no caso do inciso III.” (in: Direito Tributário Brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. Grifos acrescidos). Exsurge enquanto corolário das razões acima expostas que não há como este Juízo desconstituir o lançamento fiscal pautado pelo auto de infração n. 33498/2013, porquanto, nesta parcela da demanda, o pleito deduzido na petição inicial encontra-se prejudicado pela prescrição. De todo modo, insta consignar que não ficam prejudicados os demais pedidos, de índoles declaratória (de inexistência de relação jurídico-tributária) e condenatória (com o objetivo de que, caso procedente o pedido declaratório, exista a repetição do indébito), cuja cumulação também é admitida pela doutrina: “A ação declaratória é utilizada em matéria tributária quando o contribuinte pretende ver reconhecido e declarado em juízo que a prática de determinados atos não gera obrigação tributária ou que a obrigação é inferior àquela que seria devida segundo a interpretação do Fisco. [...]. A ação declaratória também é utilizada para buscar a declaração de que o contribuinte efetuou pagamentos indevidos e de que tem direito à compensação do indébito segundo determinado critério. O pedido declaratório do direito de compensar pode ser cumulado com pedido condenatório de repetição do indébito tributário.” (in: Curso de Direito Tributário Completo. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. Grifos acrescidos). Aludida repetição, contudo, fica condicionada à procedência do pedido declaratório (de inexistência de relação jurídico-tributária) e, sendo o caso, será limitada ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação (cf. nesse sentido: TJPR - 3ª Câmara Cível - 0004011-09.2017.8.16.0179 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR IRAJA PIGATTO RIBEIRO - J. 30.11.2022[3]). Pelo exposto, reconheço a prescrição da pretensão autoral que possui natureza desconstitutiva (ou seja, que objetivava a declaração de nulidade do débito fiscal que veio a ser inscrito por força do auto de infração n. 33498/2013), julgando extinto o processo com resolução de mérito, nessa parcela, na forma do art. 487, inciso II, do Código de Processo Civil. Quanto ao restante da controvérsia, passo à sua análise na forma a seguir fundamentada. II.2. Do mérito Superada a questão atinente à pretensão autoral prejudicada pela prescrição, a controvérsia instaurada cinge-se principalmente aos seguintes aspectos: a) à possibilidade de que a parte autora debata em Juízo a incidência tributária após celebrar parcelamento administrativo; b) à (in)adequação da interpretação feita pelo Fisco quanto às atividades desenvolvidas pela parte autora. O primeiro aspecto da controvérsia atualmente se encontra tutelado por precedente qualificado proferido pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, a saber: acórdão proferido no âmbito do Recurso Especial n. 1.133.027/SP, vinculado ao Tema Repetitivo 375. Na ocasião, o Tribunal da Cidadania decidiu pela possibilidade de que os aspectos jurídicos da obrigação tributária sejam questionados em Juízo, mesmo quando há parcelamento ou confissão de dívida, e fixou a seguinte tese jurídica vinculante: Tema 375/STJ: “A confissão da dívida não inibe o questionamento judicial da obrigação tributária, no que se refere aos seus aspectos jurídicos. Quanto aos aspectos fáticos sobre os quais incide a norma tributária, a regra é que não se pode rever judicialmente a confissão de dívida efetuada com o escopo de obter parcelamento de débitos tributários. No entanto, como na situação presente, a matéria de fato constante de confissão de dívida pode ser invalidada quando ocorre defeito causador de nulidade do ato jurídico (v.g. erro, dolo, simulação e fraude).” (Grifos acrescidos). Não é diferente o entendimento colhido da jurisprudência do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO FISCAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRESCRIÇÃO MATERIAL. ADESÃO AO REFIC QUE NÃO IMPEDE A REVISÃO JUDICIAL DA OBRIGAÇÃO EM RELAÇÃO AOS SEUS ASPECTOS JURÍDICOS, COMO A PRESCRIÇÃO. TEMA 375 DO STJ. AJUIZAMENTO DA AÇÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LC Nº 118/2005. EXIGÊNCIA DA EFETIVA CITAÇÃO DO DEVEDOR PARA INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. INEXISTÊNCIA DE CAUSA INTERRUPTIVA VÁLIDA NO PRAZO LEGAL. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. [...]. (TJPR - 3ª Câmara Cível - 0003137-82.2021.8.16.0179 - Curitiba - Rel.: SUBSTITUTO RICARDO AUGUSTO REIS DE MACEDO - J. 02.06.2025. Grifos acrescidos). Vencida a matéria relativa à (im)possibilidade de questionamento judicial - que, em verdade, antes se ligaria ao próprio interesse de agir da parte autora -, volta-se ao aspecto principal da controvérsia remanescente: a existência ou não da relação jurídico-tributária que, na visão do Fisco Municipal, enseja a tributação das atividades desenvolvidas pela empresa autora mediante a incidência de ISSQN. Forçoso se torna, portanto, analisar o conjunto probatório que consta do caderno processual em sua completude, com o escopo de que antes seja bem delimitada qual a atividade precipuamente desenvolvida pela autora. Nesta senda, aqui cumpre anotar que, em consideração à opção do legislador pela fundamentação racional das decisões judiciais (cf. art. 371 do Código de Processo Civil[4]), a prova passa a exercer uma função epistêmica. De efeito, para além de uma função retórica, “i.e.”, de convencimento e persuasão do órgão jurisdicional, a prova exerce a função de instrumento de conhecimento, o que aqui deve ser considerado por este Juízo. A função epistêmica da prova é definida com eloquência pela obra de José Miguel Garcia Medina: “Para o processo, interessa a prova como instrumento de que se vale o órgão jurisdicional para descobrir e conhecer com exatidão os fatos da causa (função epistêmica, que considera a prova instrumento de conhecimento). Deve o magistrado ‘indicar na decisão as razões da formação de seu convencimento’ (art. 373 do CPC/2015). Diante disso, interessa saber não como o juiz crê que os fatos ocorreram, mas como o juiz conheceu o fato, através de atividade cognitiva baseada em passagens extraídas das informações colhidas na atividade probatórias, permitindo-se, assim, o controle da adequação entre o fato considerado provado pelo juiz e o fato identificado nas provas [...].” (in: Código de Processo Civil Comentado. 6. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020. p. 680. Grifos acrescidos). No mais, como aponta Luiz Guilherme Marinoni, o juiz pode chegar ao final do feito “em estado de dúvida e simplesmente aplicar a regra do ônus da prova, como também [...] julgar com base em verossimilhança ou inverter o ônus da prova em razão da ‘verossimilhança da alegação’” (in: Formação da Convicção e Inversão do Ônus da Prova Segundo as Peculiaridades do Caso Concreto. RT 862/11). O mesmo autor faz, porém, importante ressalva: “[...] estar convicto de que basta a verossimilhança não é o mesmo do que estar em dúvida.” (“idem”. Grifos acrescidos). No caso em tela, a adequada análise das provas produzidas pelas partes não poderia se dar à míngua da devida atenção a ser dada ao laudo pericial confeccionado por expert contábil. Inicialmente, o Sr. Perito juntou suas razões e conclusões no feito em mov. 136.1, valendo citar os seguintes quesitos e as respectivas respostas fornecidas: “‘a) a natureza dos serviços realizados pela parte autora;’ R.: Industrialização por encomenda, ou seja, industrialização efetuada para outro CNPJ, cuja a atividade de industrialização está sujeita a incidência de ICMS, conforme consta nos Autos: [...]. ‘b) o enquadramento ou não dos serviços realizados pela parte autora no rol de serviços que enseja a incidência de ISS;’ R.: Não, consubstanciado no que consta nos Autos e resposta ofertada na letra ‘a’ acima. Como se verifica na resposta ofertada no Ponto Controvertido do Juízo acima. ‘c) a competência para tributar a atividade desenvolvida pela parte autora;’ R.: Receita Estadual, conforme informado na Letra ‘a’ acima. ‘d) o dever, sendo o caso, de restituição dos valores pagos pela parte autora a título de ISS.’ R.: Município, por se tratar de imposto municipal. [...]. ‘2) A atividade da Autora está relacionada diretamente ao processo de industrialização por encomenda de outras indústrias?’ R.: Pelo que se observa via Contrato Social, e conforme se deduz pela resposta ofertada no Quesito item ‘1’ acima, a Requerente pode exercer as atividades de industrialização (sujeita a incidência de ICMS). ‘3) Se positivo, a Autora recebe o produto e realiza alguma etapa de industrialização e depois devolve o produto à empresa encomendante?’ R.: Sim, consubstanciado no requisitado. ‘4) Sendo positiva resposta, o senhor Perito, poderia informar se sobre essas operações há incidência do ISS?’ R.: Não, consubstanciado no requisitado. ‘5) Do mesmo modo, quando a Autora recebe o produto e realiza alguma etapa de industrialização e depois devolve o produto à empresa encomendante, esse processo está sujeito a incidência do ICMS?’ R.: Sim, conforme consta nos Autos. ‘6) Poderia o Sr. Perito informar, se, quando a Autora recebe o produto para realizar uma etapa de industrialização e depois devolve o produto à empresa encomendante, são emitidas notas fiscais dessas remessas?’ R.: Pelo que consta nos Autos, quanto a Autora recebe o produto para realizar uma etapa de industrialização e depois devolve o produto à empresa encomendante, as notas fiscais dessas remessas são emitidas. [...]. ‘15) Em conclusões finais, o Sr. Perito, pode afirmar se os serviços constantes das notas fiscais que deram origem aos autos de infrações ora discutidos, levando em consideração a natureza dos serviços e sua finalidade principal (industrialização ou comercialização), há incidência do ISS?’ R.: Em análise as notas fiscais anexadas nos Autos, com se observa e já foi destacado em respostas a Quesitos anteriores, as notas fiscais emitidas no qual tem natureza ou finalidade principal a industrialização, está sujeita a incidência de ICMS. [...]. ‘2) É possível constatar que o Autor recebe produto, realiza alguma etapa e depois entrega o item diretamente ao consumidor final, ou seja, ao tomador que não está na cadeia produtiva? Em outros termos, o Autor realiza alguma etapa e depois entrega o produto para destinatário final que não realizará a comercialização do item e nem mesmo posterior beneficiamento industrial?’ R.: Conforme se extrai dos Autos, a Autora, também realiza algumas operações desta natureza. ‘3) Das notas fiscais acostadas aos autos, em quais delas é possível identificar que os tomadores de serviço não possuem como objeto social atividades relacionadas à industrialização ou comercialização de produtos, a exemplo do que ocorre com a nota fiscal da TCCC de seq. 1.130 pág. 10, empresa que possui como objeto social a prestação de serviço de transporte?’ R.: Em virtude da qualidade das imagens das Notas Fiscais anexadas nos Autos, um grande número destes documentos fiscais restam comprometido a legibilidade, assim prejudicando a identificação dos itens questionados nos Quesitos e Pontos Controvertidos, enfim, não sendo possível afirmar com absoluta clareza, em virtude da não identificação das informações em algumas notas. Ante ao exposto, fico no aguardo, se possível, para dar mais consistência ao trabalho deste Perito, informações de como o tributo foi recolhido, se no campo de tributação da Receita Estadual (ICMS), ou no campo de tributação da Receita Municipal (ISS). Este Perito não identificou nos Autos, informações sobre o recolhimento destes tributos. [...]. ‘4) Os registros contábeis relacionados às receitas brutas que foram tributadas pelo ISS demonstram que houve recolhimento de ICMS sobre a totalidade do montante? Em outras termos, da receita bruta tributável pelo fisco municipal no Auto de Infração (seq. 1.8, fls. 8/11) há alguma prova de recolhimento de ICMS sobre toda essa Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em https://projudi.tjpr.jus.br/projudi/ - Identificador: PJT8V 3CUXE WDKAW ZXTDA PROJUDI - Processo: 0009001-05.2020.8.16.0190 - Ref. mov. 40.1 - Assinado digitalmente por Luiz Fernando Boldo do Nascimento 15/02/2022: JUNTADA DE PETIÇÃO DE REQUERIMENTO DE PERÍCIA. Arq: Petição receita que o contribuinte afirma ser relativo à circulação de mercadorias e não a prestação de serviços?’ R.: No MOV. 1.8, esta anexado o Contrato de Parcelamento nº 852 / 2014, neste movimento não foi anexado prova de recolhimento de ICMS. No MOV. 1.7, está anexado o Contrato de Parcelamento nº 753 / 2013. No MOV. 1.9, está anexado o extrato de ‘Débitos X Contribuinte’, emitido pela Prefeitura do Município de Maringá. Desde modo, resta informado que dos documentos acima, não consta que foi anexado prova de recolhimento de ICMS. [...]. ‘6) A descrição ‘mão de obra’ que consta na maioria das notas fiscais, a exemplo daquelas juntadas na seq. 1.20, fls. 1, 3, 5 e 8, permite concluir com absoluta certeza que houve o beneficiamento do produto na cadeia industrial, e não uma simples prestação do serviço de pintura?’ R.: Sim, caracterizando que houve processamento por encomenda para uma indústria. ‘7) O que o sr. Perito entende pela descrição ‘mão de obra’ constante na maioria das notas fiscais?’ R.: Observado o conceito ‘mão de obra’, entende que mão de obra designa o trabalho manual empregado geralmente na produção de indústrias, mas também pode ser utilizado para se referir ao trabalhador de qualquer empresa. Nos Autos, a ‘mão de obra’ que consta da maioria das notas fiscais, corresponde a serviço de industrialização por encomenda, ou seja, industrialização efetuada para outro CNPJ. Ante ao exposto, a maioria das notas fiscais, atendem o conceito acima.” (cf. mov. 136.1. Grifos acrescidos). Após, o laudo veio a ser complementado pelas manifestações de movs. 150.1 e 157.1, sendo oportuno destacar: “12) Considerando o Auto de Infração de mov. 1.6 e o período ali fiscalizado, o Sr. Perito pode informar se as notas fiscais que deram origem aos autos de infrações em questão, lavrados pelo município de Maringá, se tratam de produtos para remessa de industrialização e/ou comercialização pela encomendante? Ou seja, é crível que a empresa tenha uma linha de atuação com atividades tributadas pelo ICMS e justamente no período fiscalizado, surpreendentemente, desempenhe apenas atividades tributadas pelo ISS? RESPOSTA: Consubstanciado no Requisitado Das Notas que constam do Auto de Infração, anexado nos autos, da quase totalidade das Notas legíveis, se refere a venda produtos, tais como: cimento, areia, cal, pedra, peças de pequeno porte para mecânica (parafusos, porcas, arruelas, etc), materiais de informática e telefonia. Com exceção de pouquíssimas Notas de Prestação de Serviço, exemplos a Nota 29862 anexada no mov 1.12 e Nota de n° 001393, anexada no mov 1.21. 13) Nas notas fiscais tanto nas de recebimento das remessas como nas devoluções dessas remessas, poderia o Sr. Perito informar qual o código CFOP e a natureza da operação especificadas nas respectivas notas fiscais? Tomando por exemplo as notas fiscais de mov. 1.15, o que está informado no campo ‘Natureza da Operação’ no canto superior esquerdo? E qual código CFOP está informado no campo ‘Dados do Produto/Serviço’? RESPOSTA: Com fulcro no Requisitado, segue abaixo as informações: 14) O que significam os códigos das notas fiscais de remessas tanto das recebidas como das emitidas pela Autora? Tomando por exemplo as notas fiscais de mov. 1.15, o que significa o Código CFOP 5902 da Nota Fiscal nº 727? E o que significa o código CFOP 1901 da Nota Fiscal nº 5226? RESPOSTA: O Requisitado informa que todas ‘notas fiscais de remessas tanto das recebidas como das emitidas pela Autora?’; deste modo, solicita as especificações sobre essas operações que seguem abaixo. Especificações das Nf-e, acima solicitados: a) NF-e 727, código 5902, significa conforme contido no campo Natureza Operação, Retorno de Industrialização; b) NF-e 5.226, código 1901, significa conforme contido no campo Natureza da Operação, Entrada para Industrialização por Encomenda.” (cf. mov. 157.1. Grifos acrescidos). Do que foi exposto no laudo pericial, pode-se dizer que o expert, ao analisar as notas fiscais constantes do caderno processual - com a ressalva de que algumas seriam ilegíveis, como consignou o Sr. Perito -, concluiu que a atividade analisada tem natureza ou finalidade principal destinada à industrialização de bens, com menção à incidência de ICMS - e não de ISSQN. Lado outro, consequência do disposto no supracitado art. 371 do Código de Processo Civil é o que dispõe o art. 479 do mesmo diploma: “[o] juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito.” Com efeito, assume-se que inexiste vinculação automática do Juízo às conclusão do expert que no feito atuou enquanto auxiliar da justiça. O entendimento acima exposto encontra-se em consonância com a exegese definida pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, que já decidiu que “[o] julgador não fica vinculado à prova pericial, podendo decidir de modo contrário a ela quando houver nos autos outros elementos que o convençam” (cf. AgInt no REsp n. 1.951.126/DF, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 11/6/2024, DJe de 18/6/2024). Como consequência, a adequada análise do conjunto probatório - e do laudo pericial - não poderia ser procedida à míngua do enfrentamento das razões lançadas com o fito de impugnar as conclusões manifestadas pelo expert, lançadas predominantemente pela Fazenda Pública ré. Em um primeiro momento, a municipalidade ré argumentou que o laudo encontrar-se-ia equivocado por deixar de analisar as notas fiscais das quais se valeu o Fisco para lavrar o auto de infração inicialmente impugnado (cf. mov. 140.1). Após, a ré requereu a intimação da parte autora para “apresentar cópia legível de todas as notas fiscais referentes ao período que compreende o auto de infração”, o que ulteriormente foi aditado para atender ao rito da exibição de documentos, nos termos que seguem: “Diante do exposto, em síntese, requer-se o recebimento do pedido de exibição de documentos, com esteio no artigo 397, CPC, intimando-se a parte contrária para atender à solicitação do perito judicial, sob pena das implicações do art. 400 CPC, no que tange à: a) apresentação de cópia legível de todas as notas fiscais que foram analisadas no auto de infração, sendo elas: SÉRIE F nº 2175 a 5456, que estão expressamente apontadas no auto de infração; b) apresentação de prova do recolhimento de ICMS sobre todas as notas fiscais que foram analisadas no auto de infração, sendo elas: SÉRIE F nº 2175 a 5456, que estão expressamente apontadas no auto de infração.” (cf. mov. 174.1). O pleito foi recebido quando do pronunciamento de mov. 176.1, que ordenou a intimação da parte autora para dar nos autos sua resposta quanto à ordem de exibição de documento ou coisa. Em sequência, sobreveio recusa sob o argumento de que “não possui os documentos solicitados” (cf. mov. 187.1), uma vez que foram descartados pela empresa autora após decorrido o prazo de dez anos. Para além da razoabilidade da tese expendida pela parte autora, o que se assume ao menos “a priori”, rememora-se que a discussão acerca da exação constituída pelo auto de infração n. 33498/2013 encontra-se prejudicada pela prescrição (reconhecida no item II.1 da presente sentença). Ou seja, qualquer que fosse o desfecho da exibição de documentos pleiteada (com incidência ou não da consequência legal prevista pelo art. 400 do Código de Processo Civil[5]), tem-se que a questão que viria a ser dirimida já se encontra prejudicada. Nesta esteira e não restando demais razões tendentes a impugnar as conclusões havidas pelo Sr. Perito - notadamente se considerados os argumentos expendidos pela Fazenda Pública ré -, assume-se que o laudo pericial mostra-se apto a guiar este Juízo quanto à correta definição das circunstâncias fáticas. Assim e amparando-se nos elementos de prova que constam dos presentes autos, pode-se concluir, à guisa de arremate, que as atividades desenvolvidas pela parte autora mostram-se precipuamente destinadas à industrialização por encomenda. Por óbvio, todavia, que o múnus do expert não compreende a adequada definição jurídica de tal atividade. Ao revés, sua atividade limita-se a contribuir para o melhor esclarecimento da conjuntura fática de acordo com o “conhecimento técnico ou científico” de sua respectiva área de atuação (cf. art. 156, caput, do CPC), ao passo que a análise quanto aos aspectos jurídicos é adstrita à atividade julgadora, o que se dará doravante. Quanto à atividade desenvolvida pela parte autora, partindo-se do pressuposto já estabelecido de que se cuida de industrialização por encomenda, a parte ré defendeu em sede de contestação que se amoldaria à hipótese de incidência do ISSQN de acordo com a redação então vigente do item 14.05 da lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003 (que dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), “in verbis”: 14.05 – Restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos quaisquer. (Grifos acrescidos). Não é demais destacar, com vistas ao pleito declaratório deduzido nos autos, a atual redação do mesmo item, dada pela Lei Complementar n. 157/2016: 14.05 - Restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, plastificação, costura, acabamento, polimento e congêneres de objetos quaisquer. (Redação dada pela Lei Complementar n. 157/2016. Grifos acrescidos). De outro giro, a parte autora sustentou na petição inicial que “não entrega o bem modificado ao seu consumidor final, salvo rara exceção” (cf. mov. 1.1, fl. 5). Em contraponto, porém, a municipalidade ré argumentou que os clientes da autora seriam, sim, caracterizados enquanto destinatários finais, e que se cuidaria de atividade mista sujeita à tributação municipal, consoante disposto no art. 156, inciso III, da Constituição Federal cumulado com o que preceitua o art. 1º, § 2º, da LC 116/2003. Bem delineadas as propostas de interpretação das atividades da empresa autora feitas por cada uma das partes, vê-se que é plausível, em um primeiro momento, amoldar o labor desenvolvido de acordo com o item 14.05 - que seja de acordo com a sua redação original, quer seja de acordo com a redação dada pela LC 157/2016. Isso porque não há controvérsia no que diz respeito às etapas da atividade, que foi assim descrita pela própria parte autora na petição inicial: “Com efeito, considera-se pintura eletrostática um procedimento especial de beneficiamento de objetos em aço, ferro, ouro, alumínio, entre outros metais, em que não apenas se colore, mas também protege e dá maior durabilidade ao bem. Funciona como uma lavagem e reveste este metal com uma película de polímero termo-endurecível colorido. O pó químico garante uma flexibilidade na peça operada sem ofender a pintura. Muito utilizado no ramo da construção civil, o procedimento feito pela atividade da Autora é considerado, conforme será melhor detalhado adiante, como etapa de industrialização de um bem, pois angaria ao bem um beneficiamento e após retornar ao seu cliente, é por ele (cliente) empregado em seu objeto final, seja um bem ou um serviço, como ocorre por exemplo no caso dos arquitetos.” (cf. mov. 1.1, fl. 2. Grifos acrescidos). Ocorre que, antes de se assumir que a subsunção dar-se-ia com tamanha automaticidade, dando consequente razão ao Fisco Municipal, incumbe ao Juízo investigar a natureza do ISSQN para, somente então, concluir se é ou não o caso de sua incidência. Na forma do art. 156, inciso III, da Constituição Federal (e com redação dada pela Emenda Constitucional n. 3/1993), compete aos Municípios instituir impostos sobre “serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.” O § 3º do mesmo artigo, de seu turno, dispõe o que segue: Art. 156. [...]. § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar: (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 37, de 2002): I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas; (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 37, de 2002) II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 3, de 1993) III - regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 3, de 1993). A lei complementar mencionada pelo supracitado § 3º cuida-se, como já antecipado, da Lei Complementar n. 116/2003, que em seu art. 1º dispõe que “tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestados”. Quanto à lista anexa, o egrégio Supremo Tribunal Federal já decidiu em sede de Repercussão Geral (Tema 296) pela taxatividade da lista de serviços, “admitindo-se, contudo, a incidência do tributo sobre as atividades inerentes aos serviços elencados em lei em razão da interpretação extensiva”, vide tese jurídica fixada no âmbito do Recurso Extraordinário n. 784.439/AL. Novamente, vê-se que interpretação pouco aprofundada da questão tornaria a dar enquanto resposta a possibilidade de que as atividades da parte autora amoldar-se-iam aos serviços elencados pelo item 14.05 da LC 116/2003. Todavia, convém destacar que a mesma Corte Suprema proferiu julgado bastante elucidativo acerca da matéria e, bem assim, da distinção havida entre a tributação com base nos aspectos industrial, comercial e de prestação de serviços. Cuida-se de acórdão proferido no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.389/DF, assim ementado: EMENTA : CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONFLITO ENTRE IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA E IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E INTERESTADUAL. PRODUÇÃO DE EMBALAGENS SOB ENCOMENDA PARA POSTERIOR INDUSTRIALIZAÇÃO (SERVIÇOS GRÁFICOS). AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE AJUIZADA PARA DAR INTERPRETAÇÃO CONFORME AO O ART. 1º, CAPUT E § 2º, DA LEI COMPLEMENTAR 116/2003 E O SUBITEM 13.05 DA LISTA DE SERVIÇOS ANEXA. FIXAÇÃO DA INCIDÊNCIA DO ICMS E NÃO DO ISS. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. Até o julgamento final e com eficácia apenas para o futuro (ex nunc), concede-se medida cautelar para interpretar o art. 1º, caput e § 2º, da Lei Complementar 116/2003 e o subitem 13.05 da lista de serviços anexa, para reconhecer que o ISS não incide sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subseqüente de industrialização ou de circulação de mercadoria. Presentes os requisitos constitucionais e legais, incidirá o ICMS. (ADI 4389 MC, Relator(a): JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 13-04-2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-098 DIVULG 24-05-2011 PUBLIC 25-05-2011 RDDT n. 191, 2011, p. 196-206 RT v. 100, n. 912, 2011, p. 488-505. Grifos acrescidos). Do que se vê acima, é possível ler que a industrialização por encomenda (ou seja, a mesma atividade praticada pela parte autora) não é sujeita à incidência de ISSQN quando destinada à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria. De mais a mais, vale especial destaque o que constou do voto do eminente Relator, o Ministro Joaquim Barbosa: “Ao invés de adotar modelo harmônico de tributação pelo valor agregado, o sistema tributário atribuiu distintamente a cada ente federado competência para cobrar impostos com base nos aspectos industrial (União), comercial (estados e Distrito Federal) e de prestação de serviços (municípios e Distrito Federal) da atividade econômica. Trata-se de concepção fortemente arraigada nas noções mercantilistas e industriais que dividem a atividade econômica em setores primário, secundário, terciário e quaternário. Esse modelo dá margem a diversos conflitos por sobreposição de âmbitos de incidência. Para manter a coesão entre os entes federados e dar alguma certeza ao contribuinte, a Constituição estabelece que os conflitos de competência sejam resolvidos por lei complementar de normas gerais, a cargo da União (art. 146). Lembro que tanto os estados como a população dos municípios fazem-se representar na formação da vontade política da Nação e que, portanto, a lei complementar de normas gerais goza de legitimidade social, além de jurídica. Ao interpretar a legislação de regência à luz dos conceitos constitucionais de prestação de serviços e de circulação de mercadorias, esta Corte definiu que serviços gráficos feitos por encomenda e segundo especificações singulares se submeteriam ao ISS municipal. Por outro lado, serviços gráficos dos quais resultassem produtos colocados indistintamente no comércio, dotados de características e qualidade quase uniformes, sofreriam a incidência do ICMS estadual. [...]. Penso que os mesmos fundamentos que animaram os precedentes apontados são aplicáveis ao caso, mas com a devida ponderação. Nesta etapa histórica, os conceitos civilistas de serviços e de mercadorias servem de ponto de partida, mas não são suficientes. O fato gerador deve ser interpretado de acordo com a expressão econômica da base de cálculo e com o contexto da cadeia produtiva. Aires F. Barreto conceitua prestação de serviço como o esforço humano concretamente desenvolvido em benefício de outrem, com habitualidade, utilidade produtiva e finalidade lucrativa e sem subordinação funcional ou trabalhista. A jurisprudência desta Corte segue linha semelhante, ao entender não incidir o ISS sobre a locação de bens móveis, sobre a atividade realizada em benefício próprio (‘autoserviço’), ao passo em que a exação é cobrada no arrendamento mercantil (leasing). Contudo, conforme transparece nos julgados, a distinção entre a prestação de serviços e as operações de circulação de mercadorias é sutil. No RE 100.563, a Primeira Turma entendeu que o fornecimento de bebidas e alimentação por bares e restaurantes envolvia concomitantemente a venda de mercadorias (os alimentos preparados) e a prestação de serviços (utilização de mesa, toalha, guardanapo, gelo, trabalho de garçons, porteiro, cozinheiro etc). A indivisibilidade da amálgama serviços-mercadoria não impedia, naquele caso, a diferenciação entre as expressões econômicas de ambas as atividades, devendo a lei estadual ‘distinguir o preço dos serviços do preço das mercadorias’ como condição necessária à cobrança do imposto. Ademais, a distinção tributária entre operações de circulação de mercadorias e prestação de serviços não pode sequer ser obtida a partir de fatos naturais. Basta lembrar o fornecimento de água encanada: trata-se de mineral perfeitamente tangível, de expressão econômica, mas cuja lavra, beneficiamento e distribuição são costumeiramente classificados como prestação de serviços. [...]. Para o aparente conflito entre o ISS e o ICMS nos serviços gráficos, nenhuma qualidade intrínseca da produção de embalagens resolverá o impasse. A solução está no papel que essa atividade tem no ciclo produtivo. Conforme se depreende dos autos, as embalagens têm função técnica na industrialização, ao permitirem a conservação das propriedades físico-químicas dos produtos, bem como o transporte, o manuseio e o armazenamento dos produtos. Por força da legislação, tais embalagens podem ainda exibir informações relevantes aos consumidores e a quaisquer pessoas que com ela terão contato. Trata-se de típico insumo. Neste momento de juízo inicial, tenho como densamente plausível a caracterização desse tipo de atividade como circulação de mercadorias (‘venda’), ainda que fabricadas as embalagens de acordo com especificações do cliente, e não como a contratação de serviço. Aliás, a ênfase na encomenda da industrialização parece-me insuficiente para contrariar a tese oposta. Diante da sempre crescente complexidade técnica das atividades econômicas e da legislação regulatória, não é razoável esperar que todos os tipos de invólucro sejam produzidos de antemão e postos, indistintamente, à disposição das partes interessadas para eventual aquisição. Nem é adequado pretender que as atividades econômicas passem a ser verticalizadas, de modo a levar os agentes de mercado a absorver todas as etapas do ciclo produtivo. Assim, não há como equiparar a produção gráfica personalizada e encomendada para uso pontual, pessoal ou empresarial, e a produção personalizada e encomendada para fazer parte de complexo processo produtivo destinado a por bens em comércio.” (cf. voto do Min. Relator no âmbito da ADI4.389 MC/DF. Grifos acrescidos). Do excerto acima, pode-se ler a seguinte asserção assaz inequívoca: a “encomenda” não é fator determinante para definir algo como prestação ou não de serviços; ao revés, a análise deve pautar-se no papel que a atividade exerce no ciclo produtivo. No caso em exame, a atividade da empresa autora põe-se em harmonia com aquelas outras que excluiu o e. STF do âmbito de incidência do ISSQN, por possuir função técnica na industrialização, como também concluiu o expert que no feito atuou enquanto auxiliar da justiça. E, em caso bastante semelhante recentemente julgado pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Parará - também com amparo no pronunciamento proferido na ADI 4.389/DF -, decidiu-se que a pintura de peças metálicas por encomenda, quando intermediária no processo produtivo e destinada à integração em posterior circulação de mercadorias, não se sujeita à incidência do ISSQN. Veja-se: APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE A AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO TRIBUTÁRIO. INSURGÊNCIA DA AUTORA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.1. Trata-se de ação declaratória de inexigibilidade de débito tributário que almejou, dentre outros fundamentos, o reconhecimento da não incidência do ISSQN sobre a atividade praticada pela requerente, por se tratar de industrialização por encomenda no meio da cadeia produtiva e não prestação de serviços para o consumidor final. Almejou a nulidade dos autos de infração lavrados pelo Fisco Municipal.1.2. Em sentença, o Juízo a quo julgou improcedente a ação, compreendendo pela incidência do ISSQN, condenando a autora, pela sucumbência, em custas processuais e honorários advocatícios. 1.3. Em recurso de apelação cível, a autora aponta que suas atividades constituem apenas uma etapa do ciclo produtivo das empresas encomendantes e não a prestação de serviço a consumidor final. Aponta que o tema já foi consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, na ADI nº 4389/DF, no sentido de reconhecer que o ISSQN não incide sobre operações de industrialização por encomenda destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria. Requer o afastamento da incidência do ISSQN ou, subsidiariamente, o afastamento da multa fixada nos autos de infração lançados pelo Fisco Municipal. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2.1. Observar, com fulcro na jurisprudência dos Tribunais Superiores e da doutrina especializada, a incidência, no caso, do ISSQN ou do ICMS. 2.2. Verificar a possibilidade ou não de afastamento da multa lançada nos autos de infração lançados pelo Fisco Municipal. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.1. Para fins de definição da incidência do ISSQN ou do ICMS, é imperioso observar se a atividade da empresa autora constitui operação intermediária (atividade-meio) no processo de industrialização ou se é destinada ao consumidor final, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça dá tratamento diferenciado para cada uma das hipóteses. 3.2. Em se tratando de produção por encomenda destinada ao consumidor final, o Superior Tribunal de Justiça compreende pela incidência do ISSQN. Por outro lado, no caso de produção por encomenda não destinada ao consumidor final, o Supremo Tribunal Federal, na MC ADI nº 4389, definiu que se o beneficiamento de matérias-primas constituir operação intermediária do processo de industrialização, ou seja, se integrar processo subsequente de industrialização ou circulação de mercadoria, não incide o ISS, mas sim o ICMS. 3.3. As notas fiscais por amostragem acostadas ao processo administrativo fiscal, demonstram que a autora realizou serviços de pintura de peças metálicas por encomenda a empresas do comércio atacadista de ferragens e ferramentas, as quais, posteriormente à industrialização por encomenda, revendem os produtos à consumidores finais. 3.4. Atividades que embora encontrem correspondência na Lista Anexa à Lei Complementar nº 116/2003 (item 14.05), são executadas como atividade intermediária, ou seja, integram o processo subsequente de industrialização ou de circulação, o que leva à aplicação do entendimento exarado na MC ADI nº 4389/STF. 3.5. O recurso deve ser provido para reconhecer a inexigibilidade do débito tributário (ISSQN) sobre a atividade que era praticada pela autora/apelante, posto se tratar de Industrialização por encomenda no meio da cadeia produtiva e não prestação de serviços para consumidor final, declarando o cancelamento dos autos de infração sob nºs: 380.475, 380.476, 380.477 e 380.478.3.6. Pelo provimento do recurso, a Fazenda Pública Municipal deverá arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, observado o escalonamento do artigo 85, §5º, do Código de Processo Civil. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso conhecido e provido.4.2. Tese: “A atividade de industrialização por encomenda, quando intermediária no processo produtivo e destinada à integração em posterior circulação de mercadorias, não se sujeita à incidência do ISSQN, mas sim ao ICMS, conforme entendimento consolidado pelo STF na ADI 4389. O ISSQN incide apenas quando o serviço é prestado diretamente ao consumidor final, nos termos da jurisprudência dos Tribunais Superiores.” Dispositivos relevantes citados: - Artigo 155, inciso II, §2º, inciso X, alínea "b", da Constituição Federal.- Artigo 156, inciso III, da Constituição Federal.- Artigo 1º e artigo 2º, inciso IV, da Lei nº 87/1996 (Lei Kandir).- Artigo 1º, §2º, da Lei Complementar nº 116/2003.- Item 14.05 da Lista Anexa à Lei Complementar nº 116/2003. Jurisprudência relevante citada: - REsp 1.092.206/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, Primeira Seção, DJe 23/3/09, do Superior Tribunal de Justiça.- ADI 4389 MC, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 13/04/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-098 DIVULG 24-05-2011 PUBLIC 25-05-2011 RDDT n. 191, 2011, p. 196-206 RT v. 100, n. 912, 2011, p. 488-505, do Supremo Tribunal Federal.- AgInt no REsp n. 2.076.042/SP, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 27/11/2023, DJe de 29/11/2023, do Superior Tribunal de Justiça.- REsp n. 1.832.006/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 10/12/2019, DJe de 19/12/2019, do Superior Tribunal de Justiça.- Tema nº 816 (RE 882461/MG) do Supremo Tribunal Federal. (TJPR - 2ª Câmara Cível - 0007069-84.2022.8.16.0004 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR EUGENIO ACHILLE GRANDINETTI - J. 29.10.2024. Grifos acrescidos). Como visto, ainda que a atividade se amolde “a priori” ao serviço que dispõe o item 14.05 do anexo da LC 116/2003, tem-se que, quando intermediária, sujeita-se à incidência do ICMS, e não do ISSQN. Com razão, portanto, a parte autora no que diz respeito à inexistência de relação jurídico-tributária entre os atos que precipuamente pratica e a tributação por ISSQN defendida pelo Fisco Municipal, uma vez que sua atividade pode ser definida enquanto industrialização intermediária (ainda que sob encomenda), com vistas a posterior circulação da mercadoria objeto de beneficiamento. Revela-se procedente, portanto, o pedido declaratório. No que diz respeito à repetição do indébito, a matéria já foi brevemente antecipada no item II.1 da presente decisão (“Da prejudicial de mérito. Da prescrição”), onde se anotou que é possível a cumulação do pedido condenatório com a pretensão declaratória, desde que respeitado o quinquênio prescricional que antecedeu o ajuizamento da ação. A propósito do tema, registre-se: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE A CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS). ENERGIA ELÉTRICA. SELETIVIDADE E ESSENCIALIDADE [...]. DIREITO À COMPENSAÇÃO/REPETIÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE AO FISCO NO QUINQUÊNIO QUE ANTECEDEU A INTERPOSIÇÃO DA DEMANDA. INCIDÊNCIA DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS COM BASE NOS MESMOS CRITÉRIOS UTILIZADOS PELO ESTADO DO PARANÁ NA APURAÇÃO DE SEUS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS INSCRITOS EM DÍVIDA ATIVA. ÔNUS SUCUMBENCIAL INVERTIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS POSTERGADOS PARA FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. EXEGESE DO ART. 85, §4º, INCISO II DO CPC.RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 3ª Câmara Cível - 0005191-03.2017.8.16.0004 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ SEBASTIÃO FAGUNDES CUNHA - J. 16.04.2024. Grifos acrescidos). Consequentemente, vê-se que a parte autora faz jus à restituição dos valores pagos indevidamente a título de ISSQN no quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação (que se deu à época de 16 de dezembro de 2020), ou seja, do que foi pago para estes fins de 16 de dezembro de 2015 em diante, à luz dos arts. 165 e seguintes do Código Tributário Nacional, que tratam do pagamento indevido. Para atualização do valor a ser restituído, de natureza tributária, incidirá inicialmente o IPCA-15 para fins de correção monetária (art. 1º da Lei Complementar Municipal n. 463/2003 e vide STF, Recurso Extraordinário n. 870.947/SE, Tema 810 da Repercussão Geral), desde o pagamento indevido (enunciado de Súmula n. 162/STJ[6]) até o trânsito em julgado da presente sentença. A partir do trânsito em julgado, tanto para fins de correção monetária quanto de remuneração por juros da mora (enunciado de Súmula n. 188/STJ[7] e art. 167, parágrafo único, do CTN[8]), haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art. 3º da Emenda Constitucional n. 113/2021). Por fim, anoto que restam prejudicadas as demais teses apontadas pelas partes, uma vez que os demais argumentos deduzidos no processo são incapazes de infirmar a conclusão tomada por este Juízo (cf. art. 489, §1º, inciso IV, do Código de Processo Civil). III. Dispositivo Ante o exposto, reconheço a prescrição do pedido desconstitutivo formulado pela parte autora (em relação ao auto de infração n. 33498/2013) e, nesta parcela da ação, julgo parcialmente extinto o processo com resolução de mérito, o que faço com fundamento no art. 487, inciso II, do Código de Processo Civil. Em relação aos demais pedidos, julgo-os procedentes e, por consequência, julgo-os extintos com resolução de mérito com fundamento no art. 487, inciso I, do CPC, para o fim de: a) Declarar a inexistência de obrigação tributária no que diz respeito à incidência de ISSQN sobre a atividade predominantemente exercida pela autora (pintura eletrostática enquanto procedimento de beneficiamento), e; b) Condenar a parte ré, a título de repetição de indébito, ao pagamento da quantia paga indevidamente, observando-se o quinquênio prescricional que antecedeu o ajuizamento da presente ação, a ser atualizada na forma da fundamentação. A sucumbência é recíproca na forma do art. 86, caput, do Código de Processo Civil, tendo a autora vencido em aproximadamente 2/3 (dois terços) do pleito autoral, ao passo que 1/3 (um terço) tornou-se prejudicado pela prescrição. Desse modo, condeno ambas as partes ao pagamento das custas e despesas processuais, devendo a Fazenda Pública ré arcar com 66% (sessenta e seis por cento) dos ônus da sucumbência, e a parte autora arcar com os 34% (trinta e quatro por cento) restantes. A mesma proporção deverá ser observada em relação aos honorários advocatícios - que deixo de arbitrar por ora na forma do art. 85, § 4º, inciso II, do Código de Processo Civil[9], uma vez que a condenação imposta mostra-se pendente de liquidação. A presente sentença sujeita-se ao reexame necessário, na forma do enunciado de súmula n. 490 do egrégio Superior Tribunal de Justiça[10]. Cumpram-se, no mais, as determinações preconizadas pelo Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná. Oportunamente, arquivem-se os autos, com as baixas necessárias. Com a inclusão da presente sentença no sistema, dou-a por publicada. Registro conforme o Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná. Intimações e diligências necessárias. Maringá, datado e assinado eletronicamente. Márcio Augusto Matias Perroni Juiz de Direito [1] Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326. [2] Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem. [3] APELAÇÃO CÍVEL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO”. ICMS SOBRE ENERGIA ELÉTRICA. ART. 14, INCISO V, ALÍNEA “A”, DA LEI ESTADUAL N. 11.580/1996 (licms). [...]. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE, INVERTENDO-SE O ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. CONDENAÇÃO DA FAZENDA NA REPETIÇÃO DO INDÉBITO, RESPEITADO O QUINQUÊNIO QUE ANTECEDEU AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA NO EQUIVALENTE À TAXA REFERENCIAL DO SISTEMA ESPECIAL DE LIQUIDAÇÃO E CUSTÓDIA (SELIC). DÍVIDA DE CARÁTER TRIBUTÁRIO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA, CONSIDERANDO O PREVISTO NO ART. 38 DA LEI ESTADUAL N. 11.580/1996. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. [...]. A dizer, considerando o encargo assumido pelas usuárias consumidoras, é de se dar provimento ao recurso de Proforte S.A. Transporte de Valores, Protege S.A. Serviços Especiais e Protege Segurança Eletrônica, Monitoramento e Serviços Ltda. para o efeito de, reformando a sentença prolatada, reconhecer o direito à redução da alíquota de ICMS incidente sobre a energia elétrica dos 29% (vinte e nove por cento) cobrados para o percentual de 18% (dezoito por cento), a que sujeitas as operações em geral, conforme a Lei do ICMS paranaense, e, de conseguinte, à restituição dos valores indevidamente pagos a maior, mediante o pagamento de valores ou a compensação do crédito em conta gráfica, consoante opção do contribuinte, correspondentes às diferenças das alíquotas de ICMS previstas, respeitada, para o passado, como ressalvou o pedido inicial, a prescrição quinquenal a partir do ajuizamento da ação, nos termos do estabelecido no Decreto n. 20.910/1932 e no art. 168 do Código Tributário Nacional. (TJPR - 3ª Câmara Cível - 0004011-09.2017.8.16.0179 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR IRAJA PIGATTO RIBEIRO - J. 30.11.2022. Grifos acrescidos). [4] Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. [5] Art. 400. Ao decidir o pedido, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar se: I - o requerido não efetuar a exibição nem fizer nenhuma declaração no prazo do art. 398; II - a recusa for havida por ilegítima. Parágrafo único. Sendo necessário, o juiz pode adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o documento seja exibido. [6] Súmula 162/STJ: “Na repetição de indébito tributário, a correção monetária incide a partir do pagamento indevido.” [7] Súmula 188/STJ: “Os juros moratórios, na repetição do indébito tributário, são devidos a partir do trânsito em julgado da sentença.” [8] Art. 167. [...]. Parágrafo único. A restituição vence juros não capitalizáveis, a partir do trânsito em julgado da decisão definitiva que a determinar. [9] Art. 85. [...]. § 4º [...]. II - não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando liquidado o julgado; [10] Súmula 490/STJ: “A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a 60 salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.” (Grifos acrescidos).

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