Processo nº 5005196-97.2022.8.13.0407
ID: 276976078
Tribunal: TJMG
Órgão: 2º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Mateus Leme
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5005196-97.2022.8.13.0407
Data de Disponibilização:
23/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JARDEL MAGALHAES PEREIRA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Mateus Leme / 2º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Mateus Leme Rua Prefeito Alcides Cunha, 12, Centro…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Mateus Leme / 2º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Mateus Leme Rua Prefeito Alcides Cunha, 12, Centro, Mateus Leme - MG - CEP: 35670-000 PROCESSO Nº: 5005196-97.2022.8.13.0407 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) ASSUNTO: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Água] AUTOR: YAN JOSE FONSECA PRADOS CPF: 155.146.476-41 RÉU: COMPANHIA DE SANEAMENTO DE MINAS GERAIS COPASA MG CPF: 17.281.106/0001-03 SENTENÇA Vistos e etc. Versam os autos acerca de Ação de Indenização por Danos Morais promovida por Yan José Fonseca Prados em face de COPASA, onde alega em síntese que vem enfrentando problemas no fornecimento de água potável pela requerida desde o ano de 2020, sendo possível verificar sua ausência em dias úteis e finais de semanas, sendo que a referida interrupção ocorre sem aviso prévio, aduzindo que a falha no abastecimento de água tem lhe causado sofrimento, uma vez que é utilizada para a manutenção de suas atividades básicas pessoais e preparo de alimentos, asseverando, ainda, a existência de uma Ação Civil Pública em trâmite na 1ª Vara Cível desta Comarca, qual seja, a de número 5002108-22.2020.8.13.0407, na qual é reconhecida pelas autoridades competentes as falhas generalizadas na prestação dos serviços pela requerida, pelo que pugna pela procedência da ação, com a condenação da parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais no importe de R$14.544,00 (quatorze mil, quinhentos e quarenta e quatro reais). Recebida a inicial e regularmente citada a parte ré, esta apresentou contestação ao seq. 9681541711, onde aduz em sede de preliminar a litigância irresponsável caracterizada pela advocacia ofensora, a inépcia da inicial, a ilegitimidade ativa, a ausência de causa de pedir e impugna a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária aos autores. No mérito, aduz a existência de recomendação de reserva mínima de 500 litros de água para consumo de residência de pequeno tamanho e o mínimo necessário para 24 horas de consumo para prédios, motivo pelo qual, não há o que se falar em desabastecimento imediato, além de que, que pela fatura juntada pelos autores, não houve diminuição expressiva de consumo, o que leva à conclusão de que não houve falta de água em seu imóvel. Prossegue aduzindo que a interrupção em situação de emergência ou após aviso prévio, quando motivadas por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações não caracteriza a descontinuidade dos serviços. Alega ainda que não restaram comprovados os danos morais apontadas na exordial, de modo que as interrupções causaram uma espécie de desconforto ou aborrecimento, os quais não são suficientes para fundamentar eventual indenização, pelo que pugna pela improcedência da ação. Intimadas as partes para especificação de provas, pugnou a parte ré pelo julgamento antecipado da lide (ID 10178688159) e a parte autora, pela produção de prova testemunhal (ID 10186026890). Designada audiência de instrução e julgamento, foi ouvida a parte autora e uma testemunha, na qualidade de informante, bem como reiterado o pedido para que a COPASA acostasse ao feito relatório de consumo mensal do período da unidade domiciliar dos autores e relatório minucioso das datas em que houve o fechamento de água no bairro, contendo data e horário de fechamento e reestabelecimento do insumo referente ao período de março de 2020 a outubro de 2022, conforme se depreende de ata acostada ao seq. 10387487423. A parte ré apresentou os relatórios ao ID 10397472177 e, intimada, a parte ré apresentou memoriais finais ao ID 10397481821 e a parte autora ao ID 10415730553. Associados à presente demanda, encontram-se os autos de número 5005147-56.2022.8.13.0407, haja vista dizerem respeito ao mesmo núcleo familiar e versarem acerca da mesma matéria, motivo pelo qual, passo a relatá-los para fins de julgamento conjunto. Versam os autos acerca de Ação de Indenização por Danos Morais promovida por Bane Roberto da Fonseca em face de COPASA, onde alegam em síntese que vem enfrentando problemas no fornecimento de água potável pela requerida desde o ano de 2020, sendo possível verificar sua ausência em dias úteis e finais de semanas, sendo que a referida interrupção ocorre sem aviso prévio, aduzindo que a falha no abastecimento de água tem lhes causado sofrimento, uma vez que é utilizada para a manutenção de suas atividades básicas pessoais e preparo de alimentos. Assevera ainda a existência de uma Ação Civil Pública em trâmite na 1ª Vara Cível desta Comarca, qual seja, a de número 5002108-22.2020.8.13.0407, na qual é reconhecida pelas autoridades competentes as falhas generalizadas na prestação dos serviços pela requerida, pelo que pugna pela procedência da ação, com a condenação da parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais no importe de R$15.000,00 (quinze mil reais). Recebida a inicial e regularmente citada a parte ré, esta apresentou contestação ao seq. 9681980254, onde aduz em sede de preliminar a litigância irresponsável caracterizada pela advocacia ofensora, a inépcia da inicial, a ilegitimidade ativa, a ausência de causa de pedir e impugna a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária aos autores. No mérito, aduz a existência de recomendação de reserva mínima de 500 litros de água para consumo de residência de pequeno tamanho e o mínimo necessário para 24 horas de consumo para prédios, motivo pelo qual, não há o que se falar em desabastecimento imediato, além de que, que pela fatura juntada pelos autores, não houve diminuição expressiva de consumo, o que leva à conclusão de que não houve falta de água em seu imóvel. Prossegue aduzindo que a interrupção em situação de emergência ou após aviso prévio, quando motivadas por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações não caracteriza a descontinuidade dos serviços. Alega ainda que não restaram comprovados os danos morais apontadas na exordial, de modo que as interrupções causaram uma espécie de desconforto ou aborrecimento, os quais não são suficientes para fundamentar eventual indenização, pelo que pugna pela improcedência da ação. A parte autora apresentou ao seq. 9772243270 impugnação à contestação, onde refuta os termos da defesa e reitera o pleito inaugural. Intimadas as partes para especificação de provas, a parte requerente pugnou pela produção de prova testemunhal e documental (ID 10124519831). A parte ré, quedou-se inerte. Designada audiência de instrução e julgamento, foi determinado o aproveitamento da prova produzida nos autos de número 5005196-97.2022.8.13.0407, bem como reiterado o pedido para que a COPASA acostasse ao feito relatório de consumo mensal do período da unidade domiciliar dos autores e relatório minucioso das datas em que houve o fechamento de água no bairro, contendo data e horário de fechamento e reestabelecimento do insumo referente ao período de março de 2020 a outubro de 2022, conforme se depreende de ata acostada ao seq. 10387494517. A parte ré apresentou os relatórios ao ID 10400402821 e, intimada, a parte ré apresentou memoriais finais ao ID 10400458018 e a parte autora ao ID 10416645261. Associados à presente demanda, encontram-se os autos de número 5005145-86.2022.8.13.0407, haja vista dizerem respeito ao mesmo núcleo familiar e versarem acerca da mesma matéria, motivo pelo qual, passo a relatá-los para fins de julgamento conjunto. Versam os autos acerca de Ação de Indenização por Danos Morais promovida por Annaly Rezende Rabelo Fonseca em face de COPASA, onde alegam em síntese que vem enfrentando problemas no fornecimento de água potável pela requerida desde o ano de 2020, sendo possível verificar sua ausência em dias úteis e finais de semanas, sendo que a referida interrupção ocorre sem aviso prévio, aduzindo que a falha no abastecimento de água tem lhes causado sofrimento, uma vez que é utilizada para a manutenção de suas atividades básicas pessoais e preparo de alimentos. Assevera ainda a existência de uma Ação Civil Pública em trâmite na 1ª Vara Cível desta Comarca, qual seja, a de número 5002108-22.2020.8.13.0407, na qual é reconhecida pelas autoridades competentes as falhas generalizadas na prestação dos serviços pela requerida, pelo que pugna pela procedência da ação, com a condenação da parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais no importe de R$15.000,00 (quinze mil reais). Recebida a inicial e regularmente citada a parte ré, esta apresentou contestação ao seq. 9680401178, onde aduz em sede de preliminar a litigância irresponsável caracterizada pela advocacia ofensora, a inépcia da inicial, a ilegitimidade ativa, a ausência de causa de pedir e impugna a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária aos autores. No mérito, aduz a existência de recomendação de reserva mínima de 500 litros de água para consumo de residência de pequeno tamanho e o mínimo necessário para 24 horas de consumo para prédios, motivo pelo qual, não há o que se falar em desabastecimento imediato, além de que, que pela fatura juntada pelos autores, não houve diminuição expressiva de consumo, o que leva à conclusão de que não houve falta de água em seu imóvel. Prossegue aduzindo que a interrupção em situação de emergência ou após aviso prévio, quando motivadas por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações não caracteriza a descontinuidade dos serviços. Alega ainda que não restaram comprovados os danos morais apontadas na exordial, de modo que as interrupções causaram uma espécie de desconforto ou aborrecimento, os quais não são suficientes para fundamentar eventual indenização, pelo que pugna pela improcedência da ação. A parte autora apresentou ao seq. 9772231863 impugnação à contestação, onde refuta os termos da defesa e reitera o pleito inaugural. Intimadas as partes para especificação de provas, a parte requerente pugnou pela produção de prova testemunhal e documental (ID 10223251641). A parte ré, pugnou pelo julgamento antecipado da lide (ID 10219451570). Designada audiência de instrução e julgamento, foi determinado o aproveitamento da prova produzida nos autos de número 5005196-97.2022.8.13.0407, bem como reiterado o pedido para que a COPASA acostasse ao feito relatório de consumo mensal do período da unidade domiciliar dos autores e relatório minucioso das datas em que houve o fechamento de água no bairro, contendo data e horário de fechamento e reestabelecimento do insumo referente ao período de março de 2020 a outubro de 2022, conforme se depreende de ata acostada ao seq. 10387482634. A parte ré apresentou os relatórios ao ID 10398912372 e, intimada, a parte ré apresentou memoriais finais ao ID 10398868097 e a parte autora ao ID 10436406887. É o relatório. Pois bem, tendo sido suscitadas preliminares pelo requerido em sede de contestação, passo a analisá-las. Litigância Predatória Alega a parte ré em sede de preliminar que o procurador dos autores tem exercido advocacia ofensora/predatória, tendo ajuizado cerca de 600 ações perante o Juizado Especial e 200 na Justiça Comum, objetivando o recebimento de indenização em razão de falta de água, ressaltando que todas as ações são cópias fidedignas umas das outras, sendo que os únicos itens que mudam são os documentos pessoais juntados, nome e qualificação das partes. Sustenta que lhe causa estranheza o fato de nenhum outro advogado ter sido procurado para ajuizamento de ações com o mesmo fim, bem como não haver nenhum pedido de regularização do abastecimento de água. Pugna que seja oficiada a Subseção da OAB competente e o Conselho de Ética, bem como o NUMOPEDE do TJMG, para que se manifestem quanto aos indícios de prática vedada pelo Estatuto dos Advogados. De início cumpre salientar que não se pode olvidar a regra de presunção de boa-fé, ainda mais quando se leva em conta que a esmagadora maioria dos advogados é formada por profissionais habilidosos e probos, que honram e dignificam a profissão, considerada essencial à Justiça. Não obstante tal linha de orientação, não se nega que nossa legislação, conforme a jurisprudência pátria, admite a responsabilização processual do causídico pela litigância de má-fé, nas hipóteses em que este haja com comprovado abuso, nos termos do que dispõe o art. 6º do Código de Processo Civil. Da mesma forma, se submete o advogado as sanções administrativas e disciplinares que devem, naturalmente, ser aplicadas pelos Tribunais de Ética da Ordem dos Advogados. Pois bem, conforme será analisada após o exame da prova, de fato foi constatada a ocorrência de litigância predatória. Inépcia da inicial Sustenta a requerida que a petição inicial é inepta em razão da ausência de provas e causa de pedir, além de conter pedido genérico, haja vista que a parte autora relata situações genéricas, informando apenas a má prestação de serviço por parte da requerida, não sendo por esta possível precisar qual o período específico em que o imóvel ficou desabastecido. Data venia, quanto ao primeiro ponto, de se reconhecer que os documentos essenciais e imprescindíveis à propositura da ação vieram efetivamente aos autos com a exordial, não se excluindo a possibilidade de outras provas necessárias à comprovação dos fatos alegados sejam produzidas durante a dilação instrutória, já que não se trata de hipótese de julgamento antecipado no estado do processo. Outrossim, quanto a causa de pedir, verifica-se que esta origina-se na suposta falha no abastecimento de água pela parte ré, encontrando-se esta delimitada, ainda que não tenham sido indicados com precisão os dias e horários em que encontrava-se sem água, podendo ser objeto de prova que venha a elucidar tal ponto. No que atine o pedido genérico, data venia, tenho que tal alegação não merece prosperar, haja vista que o demandante pretende o recebimento de verba indenizatória, com o fim de reparar os danos morais que supostamente sofreu em decorrência dos fatos, motivo pelo qual não há o que se falar em pedido genérico. Ante o exposto, indefiro a preliminar suscitada. Necessidade de suspensão das ações individuais A parte demandada aduz a existência de uma ação civil pública, número 5002108-22.2020.8.13.0407, em tramitação perante a 1ª Vara Cível desta Comarca, em razão de supostas falhas do serviço de fornecimento de água à localidade, motivo pelo qual requereu a suspensão da presente demanda. Melhor sorte não merece a parte contestante neste ponto, visto que na Ação Civil Pública se busca compelir a empresa ré a fornecer de forma regular o serviço de abastecimento domiciliar de toda a população, enquanto nesta a pretensão deduzida busca a indenização individual decorrente dos supostos danos sofridos pelo referido desabastecimento. Desta forma, naturalmente, lícito constatar que muito embora a causa remota – desabastecimento – seja a mesma para ambos os processos, a causa próxima e os os pedidos são distintos, podendo as ações obterem decisões diferentes – procedência em uma e improcedência em outra -, sem que isto cause qualquer tipo de perplexidade ou indique a ocorrência de contradição. Vejo assim por bem indeferir o referido pleito de suspensão do processo. Impugnação à concessão das benesses da gratuidade judiciária Salientou a parte ré que a simples declaração não é satisfaz os requisitos para deferimento do pedido de gratuidade judiciária, já que, a seu ver, ausente a comprovação da alegada hipossuficiência. Pois bem, o direito à gratuidade da justiça encontra-se disciplinado no artigo 98 do Código de Processo Civil, que inaugura a seção que trata sobre o tema: Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. Rege ainda o § 3º do art. 99 do referido Codex:, "presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural". Nessa esteira, para a concessão da justiça gratuita à pessoa física, em qualquer fase do processo, basta a declaração no sentido de que não possui condições de arcar com as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios. Certo é, porém, que tal regra não é absoluta, contemplando exceções. Como exemplo, tem-se o artigo 99, § 2º, do CPC: Art. 99. (…) § 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos. Ora, não logrou a parte requerida em demonstrar, no caderno processual, qualquer elemento apto a afastar a presunção trazida pela declaração de hipossuficiência juntada pela autora, de modo que a mera insurgência da contestante contra o deferimento da gratuidade de justiça não se mostra suficiente para o indeferimento do benefício. Ressalte-se, ainda, que o fato de estar a parte assistida por advogado particular não impede a concessão do benefício, como bem ressaltado pelo artigo 99, § 4º, do novo Código de Processo Civil. O Juiz, pode determinar que se comprove a alegada hipossuficiência, desde que transpareça nos autos a obscuridade ou ainda que a declaração não condiz com a realidade, o que, na situação em exame, não restou demonstrado. Assim rejeito a preliminar em comento. Mérito A questão posta em debate, por sua repetição e constância, acabou por gerar uma Ação Civil Pública exigindo-se a regularização do serviço de abastecimento e a propositura em massa de centenas de ações repetitivas, todas reclamando da sistemática descontinuidade do abastecimento domiciliar de diversos bairros desta cidade. Neste diapasão, não obstante a necessidade de regularização do serviço, o que se examina aqui, em última instância, é na verdade a respeito ao direito da autora ao recebimento de indenização por danos morais. Considerando que no caso sub judice figura no polo passivo a COPASA-MG – empresa de economia mista, pessoa jurídica de direito privado prestadoras de serviço público, de rigor que deve esta responder objetivamente pelos danos causados a terceiros, nos moldes do que dispõe o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. Além disto, de se lembrar que segundo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, a relação entre concessionária de serviço público e o usuário final, para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como água e energia, é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Neste sentido: “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ROMPIMENTO DE TUBULAÇÃO DE ÁGUA. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM QUE DETERMINOU A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE O USUÁRIO E A CONCESSIONÁRIA. VÍTIMA DO EVENTO DANOSO. EQUIPARAÇÃO A CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I. Não há omissão ou obscuridade no acórdão recorrido, quando o Tribunal de origem pronuncia-se, de forma clara e precisa, sobre a questão posta nos autos, assentando-se em fundamentos suficientes para embasar a decisão. Precedentes do STJ. II. O acórdão recorrido encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que a relação entre concessionária de serviço público e o usuário final, para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como energia elétrica e água e esgoto, é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, motivo pelo qual deve ser mantida a inversão do ônus da prova. Precedentes do STJ: STJ, AgRg no AREsp 372.327/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 18/06/2014; STJ, AgRg no AREsp 483.243/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 02/06/2014. III. No que se refere à inversão do ônus da prova, a teor dos arts. 14, caput, e § 1º, e 17 do CDC, equiparam-se a consumidores as vítimas de evento danoso decorrente da prestação de serviço defeituoso. Assim, em se tratando de relação de consumo, em que caracterizada a responsabilidade objetiva da concessionária, perfeitamente cabível a inversão do ônus da prova. Precedentes. IV. Agravo Regimental desprovido.” (AgRg no AREsp 479.632/MS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/11/2014, DJe 03/12/2014, grifei) Destarte, registre-se, por relevante, em se tratando de matéria relacionada a danos oriundos de produtos ou serviços de consumo, é afastada a aplicação do Código Civil, tendo em vista o regime especial do Código de Defesa do Consumidor. Conforme salienta a melhor doutrina, só excepcionalmente aplica-se o Código Civil, ainda assim quando não contrarie o sistema e a principiologia do CDC (BENJAMIN, Antônio Herman V, MARQUES, Cláudia Lime, BESSA Leonardo Roscoe. Manual de Direito Consumidor, 5ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 153). Nestes moldes, não obstante a limitação da exordial, agravada pelas dificuldades geradas por uma situação que se prolonga no tempo e que, por esta razão mesma, se revela de indicação precisa no que tange as datas praticamente impossível, já que não existe o hábito de abrir protocolo em situações como a presente, na qual a deficiência do serviço é sistemática e se prolonga por longo período, de se reconhecer que a peça inicial não pode ser aclamada de inepta. No que tange especificamente a responsabilidade objetiva, leciona Sílvio Rodrigues o seguinte: “Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente. A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele. (Direito Civil. Volume IV.19. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 10) Cabe ponderar, contudo, que muito embora seja dispensada a demonstração da culpa pelo dano causado pela Administração Pública, é imprescindível a comprovação de que a conduta comissiva ou omissiva do funcionário tenha causado o dano alegado ou mesmo que houve a má prestação no serviço realizado pelo ente ligado à administração. Não resta dúvida que o serviço de abastecimento de água é complexo, encontrando-se sujeito a situações excepcionais ligados a fatores externos, como ocorreu no caso do rompimento da barragem de brumadinho, ou mesmo ligado à natureza, como a ocorrência de secas prolongadas que diminuam sensivelmente o volume de água dos rios de onde são feitas as captações. Por outro lado, naturalmente, existe o problema gerado pelo sucateamento dos equipamentos, com desperdício de água causado pelo rompimento de galeria, problemas de gestão interno, etc., que acabam por tornar o serviço deficiente ou inadequado, com desabastecimento não programado, de forma sistemática de prolongada, o que efetivamente acaba por gerar transtornos aos usuários. In casu, infere-se dos autos que restou incontroverso o fato de que a cidade enfrentou e, o que é pior e lastimável, ainda enfrenta, diversas crises de abastecimento de água, haja vista as diversas ações promovidas nesta e em outras cidades, bem como e principalmente, pela própria propositura pelo Ministério Público desta Comarca de Ação Civil Pública, na qual se cobra solução definitiva para o problema, sendo concedida liminar pela Justiça local, a qual veio a ser confirmada pelo egrégio Tribunal de Justiça. Apesar deste quadro, na contestação não se menciona sequer o fato de algum daqueles fatores externos imprevisíveis e nem seria lógico supor serem estas a causa do problema, posto que se assim fosse o problema não duraria anos, como os elementos dos autos estão a indicar. Em sede de audiência de instrução e julgamento, os autores tiveram a oportunidade de informar o seguinte: “que mora no bairro Centro; que no bairro Centro faltou água durante a pandemia; que acontecia com frequência; que a falta de água ocorria em dias aleatórios; que faltava água em média durante dois dias seguidos; que a Copasa não avisava com antecedência que faltaria água; que não ligou para a Copasa; que não anotaram a quantidade de dias certos que faltava água; que se sente desrespeitado; que não precisou fazer tratamento psicológico; que seu tio indicou o Dr. Jardel; que a caixa d’água da sua casa possui 500 litros; que a água da caixa dura um dia e meio, dois dias; que na sua casa moravam três pessoas; que não lhe foi prometido êxito na ação; que não sabe que no Juizado poderia ter entrado com ação sem advogado; que sabe que a ação busca somente o recebimento de indenização pelos danos sofridos; que nenhum caminhão-pipa esteve na sua casa, nem no bairro; que não obteve justificativas pela falta de água; que não tomou ciência da existência de problema que estava sendo solucionado pela Copasa; que avalia o serviço prestado pela Copasa como ruim; (…) que o serviço da Copasa antes da pandemia era normal; que sua casa fica numa região alta; que não sabe se algum conhecido ou parente entrou em contato com a Copasa; que antes da pandemia não se recorda de ter problemas com a Copasa; que não chegou a ser comunicado acerca de racionamento de água; que pensou em reclamar, mas não o fez.” (depoimento colhido do autor Yan José Fonseca Prados, por meio de sistema audiovisual) “que mora no bairro Centro; que no bairro Centro faltou água durante a pandemia; que acontecia com frequência; que a falta de água ocorria em dias aleatórios; que a Copasa não avisava com antecedência que faltaria água; que não ligou para a Copasa; que pensou em reclamar, mas não o fez; que não anotaram a quantidade de dias certos que faltava água; que se sente lesado, frustrado e indignado; que não precisou fazer tratamento psicológico; que a caixa d’água da sua casa possui 500 litros; que a água da caixa durava umas dez horas; que na sua casa moravam quatro pessoas; que não lhe foi prometido êxito na ação; que não sabe que no Juizado poderia ter entrado com ação sem advogado; que sabe que a ação busca somente o recebimento de indenização pelos danos sofridos; que sua irmã indicou o Dr. Jardel; que nenhum caminhão-pipa esteve na sua casa, nem no bairro; que não sabe se algum conhecido ou parente entrou em contato com a Copasa; que não chegou a ser comunicado acerca de racionamento de água; que não obteve justificativas pela falta de água; que não tomou ciência da existência de problema que estava sendo solucionado pela Copasa; que avalia o serviço prestado pela Copasa como péssimo; que o serviço da Copasa antes da pandemia era regular; (…) que quando faltava água recorrida à casa de algum parente ou amigo.” (depoimento colhido do autor Bane Rabelo da Fonseca , por meio de sistema audiovisual) “que mora no bairro Centro; que no bairro Centro faltou água durante a pandemia; que acontecia com frequência; que a falta de água ocorria em dias aleatórios; que a Copasa não avisava com antecedência que faltaria água; que não ligou para a Copasa; que pensou em reclamar, mas não o fez; que não anotaram os dias certos que faltava água; que se sente triste; que não precisou fazer tratamento psicológico; que sua amiga indicou o Dr. Jardel; que na sua casa moravam três pessoas; que a caixa d’água da sua casa possui 500 litros; que a água da caixa durava no máximo um dia; que não lhe foi prometido êxito na ação; que não sabe que no Juizado poderia ter entrado com ação sem advogado; que sabe que a ação busca somente o recebimento de indenização pelos danos sofridos; que nenhum caminhão-pipa esteve na sua casa, nem no bairro; que não chegou a ser comunicado acerca de racionamento de água; que não obteve justificativas pela falta de água; que não tomou ciência da existência de problema que estava sendo solucionado pela Copasa; (…) que quando faltava água recorrida à casa de algum parente ou amigo para tomar banho, tinham que comprar água para beber e comida.” (depoimento colhido do autor Bane Rabelo da Fonseca, por meio de sistema audiovisual) A testemunha, inquirida na qualidade de informante, informou que: 1)Perguntado(a)se o(a)informante pode informar se faltou água durante a pandemia? R: Sim. 2)Perguntado(a)se era frequente a falta de água? R: Sim. 3)Perguntado(a)até quantos dias seguidos faltavam água? R:Até 3 dias direto. 4)Perguntado(a)se faltava água aos finais de semana? Durante a semana também? R: Sim, durante a semana e durante os finais de semana também. 5)Perguntado(a)se a COPASA avisava com antecedência quanto a falta de Agua? R: Não. 6)Perguntado(a)se conhece os autores e se já conversou com os autores sobre os fatos? R: Que conversou com a autora e que se sentia revoltada. 7)Perguntado(a)qual a sensação dos moradores, como se apresentavam, quanto a falta de água? R: Que se sentia revoltada. 8)Perguntado(a)se sabe especificar as datas ou períodos em que faltou água no período da pandemia? R:Que não sabe. 9)Perguntado(a)se foi convidada por alguém para entrar com ação contra a COPASA? R: Que recebeu indicação de um senhor chamado “Jésus”, referente ao advogado Dr. Jardel Magalhães Pereira. 10) Perguntado(a) quantas pessoas moram na sua casa, o tamanho da sua caixa d'água? Quantas pessoas moram na casa da autora e o tamanho da caixa d'água dela? R: Que na sua casa moram três pessoas e que sua caixa d'água é de 500 litros. Que moram três na casa da autora e não sabe informar o tamanho da caixa d'água da autora. 11)Perguntado(a)se sabe informar quanto tempo dura a caixa d'água dela depois que falta água? R: Respondeu que durava até um dia. 12)Perguntado(a)se foi prometido êxito na ação? R:Que não lhe foi prometido nada. 13)Perguntado(a) se tem conhecimento de que a ação é apenas indenizatória? R: Que lhe foi informado. 14)Perguntado(a) por que não escolheu um advogado local? R: Porque já haviam lhe indicado o Dr. Jardel Magalhães. 15) Perguntado(a) se sabe que poderia entrar com ação pelo Juizado Especial sem um advogado? R: Que sim. 16) Perguntado(a) se ligou para a COPASA e anotou o número do protocolo? R: Que ligava pelo telefone. Que anotou o número do protocolo, porém, não passou para o advogado. 17)Perguntado(a)se outras pessoas da família entraram com ação contra a COPASA? R: Sim, o total de três pessoas. 18)Perguntado(a)se teve acesso à residência do(a) autor(a) para confirmar a falta de água? R:Que apenas conversaram. 19) Perguntado(a) se houve visita de caminhão-pipa no bairro? R: Que não. 20) Perguntado (a) há quanto tempo mora na região? R: Há 3 anos. 21) Perguntado (a) se ficou sabendo de alguma notícia de tentativa de solução amigável pela Copasa? R: Que não ficou sabendo. 22) Perguntado(a) qual avaliação dá ao serviço prestado pela Copasa e o por quê? R: Bem ruim, porque sempre faltou água. Do que para constar lavrei este termo que vai devidamente assinado. Dou fé.(testemunha inquirida na qualidade de informante, Daniela de Jesus Dias, por meio de sistema audiovisual) Tenho que resta assim induvidoso a sistemática falha na prestação de serviço, caracterizadora do nexo de causalidade, mesmo a se considerar os limites impostos pela teoria do risco administrativo. Destarte, não obstante os judiciosos argumentos deduzidos pelo ilustre contestante, a ausência de serviço ou defeito na sua prestação configuram responsabilidade na culpa administrativa que, segundo HELY LOPES MEIRELLES: “Representa o estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a tese objetiva do risco administrativo que a sucedeu, pois leva em conta a falta de serviço para dela inferir a responsabilidade da Administração. É o estabelecimento do binômio falta de serviço/culpa da Administração. Já aqui não se indaga da culpa subjetiva do agente administrativo, mas perquire-se a falta objetiva do serviço em si mesmo, como fato gerador da obrigação de indenizar o dano causado a terceiro. Exige-se, também, uma culpa, mas uma culpa especial da Administração, a que se convencionou chamar-se culpa administrativa. Esta teoria ainda pede muito da vítima, que, além da lesão sofrida injustamente, fica no dever de comprovar a falta do serviço para obter a indenização. A falta do serviço, no ensinamento de Duez, pode apresentar-se sob três modalidades: inexistência do serviço, mau funcionamento do serviço ou retardamento do serviço. Ocorrendo qualquer destas hipóteses, presume-se a culpa administrativa e surge o dever de indenizar” (Curso de Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 619) A empresa, conforme já salientado, repita-se por relevante, poderia perfeitamente ter alegado contaminação das águas dos rios e mananciais onde ocorre a captação, ou questões e fatores ligados ao meio ambiente, como estiagem forte, mas não o fez, optando por simplesmente negar a existência do próprio fato, brigando assim com a realidade e demonstrando, ante a comprovação do fato, a culpa administrativa. Mesmo que se vislumbre aqui um certo aproveitamento por parte dos jurisdicionados, isto não afasta e nem serve de defesa à concessionária, a qual insiste em se manter distante da solução do problema, procedendo as interrupções sem ao menos comunicar aos usuários de forma antecipada, o que agrava o sofrimento da população. Como cediço, a água é o ponto de partida, é a essência de toda vida, sendo, portanto, um direito humano básico, o qual deve receber especial atenção por parte daqueles que possuem o mister de fornecê-la à população. Vale apontar que a Organização das Nações Unidas, em 28 de julho de 2010, aprovou a Resolução 64/292, em que foi reconhecido o direito à água potável e ao saneamento básico como um direito essencial ao ser humano. Assim considerado, restando comprovado o desabastecimento prolongado e sistemático, tenho como demonstrados os requisitos do pedido, vale dizer, a falha na prestação do serviço, a culpa administrativa e o dano, posto que a convivência com a falta de água para atendimento das necessidades básicas ultrapassa em muito o mero dissabor. Neste sentido: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - MUNICÍPIO DE SANTANA DO RIACHO - COPASA - FORNECIMENTO DE ÁGUA - SERVIÇO ESSENCIAL - SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO POR DIAS - RESPONSABILIDADE IMPUTADA À COMPANHIA DE SANEAMENTO - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM - PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE - REDUÇÃO - REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. - A Lei nº 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico preconiza, em seu art. 2º, que os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base, dentre outros, nos princípios fundamentais de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos realizados de forma adequada à saúde pública, à conservação dos recursos naturais e à proteção do meio ambiente, observada ainda a segurança, qualidade, regularidade e continuidade. - Tendo a parte autora comprovado a ocorrência de suspensões frequentes no fornecimento de água de sua residência, de rigor a manutenção da sentença que condenou a COPASA a promover o abastecimento diário do reservatório de água da residência, quer por água encanada, por caminhão pipa ou outro meio eficaz de abastecimento. - A responsabilidade do Estado - assim compreendida a União, os Estados-membros e os Municípios - é objetiva, sob a modalidade do risco administrativo, respondendo a Administração Pública, suas autarquias, fundações, assim como as concessionárias de serviço público, pelos danos que seus agentes causarem a terceiros, sendo, para tanto, suficiente a prova do nexo de causalidade entre o ato praticado e o dano dele advindo, pelo que desnecessária a comprovação da culpa. - Demonstrada a falha na prestação do serviço essencial de fornecimento de água, é de reconhecer que a concessionária deve indenizar o usuário que sofreu com o desabastecimento e com a insegurança na prestação dos serviços. - Os danos morais devem ser arbitrados à luz do cânone da proporcionalidade, em que há relação de causalidade entre meio e fim, entre a ofensa e os objetivos da exemplaridade, e não, da razoabilidade, aplicável quando há conflito entre a norma geral e a norma individual concreta, entre o critério e a medida.” (TJMG - Apelação Cível 1.0000.22.156999-9/002, Relator(a): Des.(a) Luís Carlos Gambogi , 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 26/10/2023, publicação da súmula em 27/10/2023) Ultrapassado o mérito, no que tange à alegação de advocacia predatória, uma vez encerrada a instrução, de proceder a nova análise. Pode ser entendido a litigância predatória em primeiro lugar como aquela voltada a destruir a parte contrária, onde não se busca simplesmente sair vencedor ou resolver um problema, mas sim ele pretende prejudicar a parte contrária, causando-lhe um mal global. A segunda, aquela que é palco dos debates nos Tribunais, pode ser entendida naquela onde se busca o lucro de forma ilegítima, como ocorre, por exemplo, com pleitos indenizatório de dano moral na qual se sustenta a ilicitude da negativação ante a inexistência de contrato, quando de fato houve a contratação. Embora não analisado com a devida atenção, existe ainda uma terceira espécie, na qual a ação ilegítima parte do patrono, contudo, na qual o pedido em si formulado representa efetivamente uma lesão de direito passível de ressarcimento, exatamente o que ocorre aqui, onde os clientes foram procurados e estimulados a ingressar em juízo, contudo, a parte sofreu realmente um dano e por esta razão não pode haver denegação da Justiça. Na segunda hipótese, a meu sentir, a solução é a extinção do processo, sem julgamento do mérito ou com ele, a depender do caso, com imposição de multa à parte e, se houver conhecimento do advogado, também deste. Já terceira hipótese, pedidos legítimos estimulados por terceiros, a decisão mais acertada seria, sob pena de se premiar o autor da lesão em detrimento do real ofendido, é sancionar apenas aquele que captou indevidamente a clientela, multiplicando pleitos que, não obstante legítimos, não teriam a projeção numérica absurda não fosse o estímulo externo. Pois bem, de rigor reconhecer no caso vertente a ocorrência da terceira hipótese, onde resta demonstrada a existência de captação de clientes de forma anormal, o que se pode confirmar pelo depoimento da testemunha ouvida no processo de nº 5004689-39.2022.8.13.0407, com o que não se confunde a boa-fé da parte, a qual, ressalvadas as críticas que devem ser feitas ao patrono, em absolutamente afeta a existência real de seu direito. Vejo relevante colacionar o depoimento: “que eles nos procuraram e a gente assinou, porque estava faltando água demais; que não sabe o nome do homem, se é de Itaúna; que ele foi na sua casa e se apresentou como advogado e assinou a procuração; que não tinha manifestado desejo de entrar com a ação; que garantiram que ganharia a ação; que no seu bairro faltou água direto antes e depois da pandemia; que acontece co frequência; que ficam sem água dois, três dias direto; que tem caixa d’água na sua casa de 500 litros; que moram quatro pessoas na sua casa; que demora uns três dias para esvaziar a caixa; que tem conhecimento de que a ação busca somente o recebimento de indenização; (…) que conhece o Ivanir e o filho dele; que foi o Rodrigo quem lhe apresentou o advogado.” Inobstante tal fato, imperioso ressaltar que nos autos de número 5004514-45.2022.8.13.0407, a parte que figurava em seu polo ativo, compareceu nesta secretaria judicial e informou não ter conhecimento da demanda indenizatória, desconhecendo os procuradores constituídos, bem como não possuir interesse no prosseguimento da ação. Nestes moldes, a meu sentir, não há espaço para a extinção do processo sem julgamento do mérito ou de aplicação de sanção também ao cliente, cabendo a censura limitar-se àquele que procedeu a captação de clientela de forma predatória. Ante o exposto e de tudo mais que dos autos consta, julgo parcialmente procedente o pedido, para os fins de CONDENAR a ré COMPANHIA DE SANEAMENTO DE MINAS GERAIS – COPASA – a pagar aos autores YAN JOSÉ FONSECA PRADOS, BANE RABELO DA FONSECA E ANNALY REZENDE RABELO FONSECA, a quantia de R$ 2.500,00 (DOIS MIL E QUINHENTOS REAIS), acrescido de juros de um por cento ao mês a contar da citação e correção monetária com base nos índices da Corregedoria Geral de Justiça, a contar desta data. Incabível a condenação em custas judiciais e verba honorária por expressa vedação legal. P.R.I. Mateus Leme, 19 de maio de 2025. Eudas Botelho Juiz de Direito
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