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Processo nº 1011701-43.2023.8.11.0004

ID: 323281791

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE BARRA DO GARÇAS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1011701-43.2023.8.11.0004

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

MANOEL PEREIRA MAIA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

PABLO VIVAN MAIA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE BARRA DO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1011701-43.2023.8.11.0004. REQUERENTE: MANOEL PEREIRA MAIA REQUERIDO: MATO GROSSO PREVIDÊNCIA - MTPREV Visto… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE BARRA DO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1011701-43.2023.8.11.0004. REQUERENTE: MANOEL PEREIRA MAIA REQUERIDO: MATO GROSSO PREVIDÊNCIA - MTPREV Vistos. Trata-se de ação de concessão de aposentadoria por serviço especial ao professor cumulada com cômputo de período laborado em coordenações e assessoramento pedagógico ajuizada por Manoel Pereira Maia em face de Mato Grosso Previdência - MTPREV, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial de professor com a respectiva implementação, bem como o pagamento de valores retroativos e indenização por danos morais. Aduz o autor, em síntese, que é funcionário público da rede estadual de ensino de Mato Grosso desde 27 de março de 1989, ocupando o cargo de Professor, contando hoje com mais de trinta anos de magistério prestados ao estado. Afirma que em 28/01/2022, quando requereu administrativamente sua aposentadoria, já possuía os requisitos para a concessão do benefício, contudo, teve seu pedido indeferido pelo MTPREV, que reconheceu apenas 16 anos, 11 meses e 11 dias como tempo laborado na função de Professor, apesar de reconhecer 34 anos como servidor público. Requereu liminarmente a concessão da aposentadoria especial de professor, e, no mérito, a procedência da ação para reconhecer seu direito à aposentadoria especial por tempo de contribuição, com o reconhecimento dos períodos indicados. Postulou, ainda, o pagamento dos proventos retroativos desde a data do requerimento administrativo (28/01/2022) até a efetiva implementação do benefício, além de indenização por danos morais no valor de R$ 62.656,84. A decisão de id. 136316318 indeferiu o pedido de tutela de urgência e determinou a citação da parte ré. Devidamente citada, a autarquia previdenciária apresentou contestação (id. 142482269), argumentando, em síntese, que o autor não faz jus à aposentadoria especial por tempo de contribuição, uma vez que parte do período necessário ocorreu junto ao CEFAPRO (instituição voltada para a formação e qualificação dos profissionais da educação) e outra parte junto à Assessoria Pedagógica, não podendo ser considerados na contagem de tempo como efetivo exercício do magistério em estabelecimento de educação básica. O autor apresentou impugnação à contestação (id. 142836544), reiterando os argumentos da inicial e aduzindo que a expressão "quando exercidas em estabelecimento de educação básica" deve ser interpretada de maneira mais ampla, visto que, no estado de Mato Grosso, os Assessores Pedagógicos sempre ficaram em uma unidade própria. Destacou ainda que, enquanto Assessor Pedagógico em Barra do Garças/MT, tinha sob sua responsabilidade sete escolas de educação básica. Em decisão de id. 188968413, o juízo determinou que as partes se manifestassem sobre a produção de provas. A autarquia requerida informou que não tinha mais provas a produzir e requereu o julgamento antecipado do pedido (id. 189127841). A parte autora manifestou-se no mesmo sentido, informando que não desejava produzir mais provas (id. 189296155). É o relatório. Não havendo necessidade de produção de outras provas além daquelas já constantes dos autos, sendo os documentos juntados suficientes para a formação do convencimento deste juízo, o julgamento antecipado do mérito é medida que se impõe, a teor do disposto no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. A controvérsia principal reside na possibilidade de cômputo, para fins de aposentadoria especial de professor, dos períodos em que o autor laborou como Professor Formador no CEFAPRO e como Assessor Pedagógico na unidade de Barra do Garças/MT, além de outros períodos menores como professor interino e em escolas estaduais. De início, cumpre analisar o regramento constitucional e infraconstitucional atinente à aposentadoria especial de professor. O art. 40, §5º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, estabelece: "Art. 40. O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. (...) §5º Os ocupantes do cargo de professor terão idade mínima reduzida em 5 (cinco) anos em relação às idades decorrentes da aplicação do disposto no inciso III do § 1º, desde que comprovem tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio fixado em lei complementar do respectivo ente federativo." O Supremo Tribunal Federal, interpretando o alcance das expressões "funções de magistério" e "efetivo exercício", ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.772/DF, firmou o entendimento de que tais funções não se circunscrevem apenas ao trabalho em sala de aula, abrangendo também a preparação de aulas, a correção de provas, o atendimento aos pais e alunos, a coordenação e o assessoramento pedagógico, e ainda a direção de unidade escolar, desde que exercidos em estabelecimentos de ensino básico por professores de carreira. Posteriormente, ao julgar o RE 1.039.644/SC (Tema 965), o STF reafirmou sua jurisprudência dominante, fixando a seguinte tese: "Para a concessão da aposentadoria especial de que trata o art. 40, § 5º, da Constituição, conta-se o tempo de efetivo exercício pelo professor da docência e das atividades de direção de unidade escolar e de coordenação e assessoramento pedagógico, desde que em estabelecimentos de educação infantil ou de ensino fundamental e médio." Mais especificamente sobre o CEFAPRO, a Lei Estadual nº 8.405/2005, que tratava da estrutura administrativa e pedagógica dos Centros de Formação e Atualização dos Profissionais da Educação Básica do Estado de Mato Grosso, dispunha: "Art. 1º Os atuais Centros de Formação e Atualização dos Profissionais da Educação Básica - CEFAPROs/MT, criados através do Decreto nº 2.007, de 29 de dezembro de 1997, Decreto nº 2.319, de 08 de junho de 1998, e Decreto nº 53, de 23 de março de 1999, ficam transformados em unidades administrativas. Parágrafo único. Os Centros têm por finalidade a formação continuada, o uso de novas tecnologias no processo ensino-aprendizagem e a inclusão digital de profissionais da educação básica da rede pública estadual de ensino. (...) Art. 4º Além de considerar como exercício da docência extensivo ao professor que atuar nos CEFAPROs/MT, o disposto no art. 3º da Lei Complementar nº 159, de 18 de março de 2004, regulamentado pelo Decreto nº 3.057, de 13 de maio de 2004, bem como o disposto no art. 54 da Lei Complementar nº 50, de 1º de outubro de 1998, desde que devidamente designados pelo titular da pasta." O dispositivo acima transcrito, vigente à época dos fatos, considerava expressamente como "exercício da docência" as atividades desempenhadas pelos professores nos CEFAPROs, o que se coaduna com a natureza eminentemente pedagógica de tais atividades. Feitas essas considerações, passa-se à análise dos períodos controvertidos na presente demanda. 1. Períodos como professor interino (1.227 dias) O autor alega ter laborado como professor interino durante 1.227 dias (aproximadamente 3 anos, 4 meses e 9 dias) em contratos esparsos, antes de sua efetivação como servidor público. A documentação acostada aos autos, notadamente as Portarias nº 4045/89, 4241/89, 1354/90 e 1778/91, além do Contrato nº 437/92, comprova que o autor exerceu a função de professor interino em regime de contratação temporária entre 27/03/1989 e 24/12/1992. Estes períodos, conforme se verifica da vida funcional do autor (id. 135964666), foram efetivamente prestados na função de professor, em atividade típica de magistério, junto às escolas da rede estadual de ensino. Assim, tenho que os períodos laborados pelo autor como professor interino/temporário devem ser computados para fins de concessão de aposentadoria especial, uma vez que exerceu efetivamente a função de magistério em estabelecimentos de educação básica. 2. Período laborado no CEFAPRO (2.827 dias) O autor alega ter trabalhado no Centro de Formação e Atualização dos Profissionais da Educação Básica - CEFAPRO, de 02/02/2009 a 30/10/2016, perfazendo 2.827 dias (aproximadamente 7 anos, 11 meses e 27 dias). A questão central neste ponto é definir se as funções exercidas no CEFAPRO podem ser consideradas como "funções de magistério" para fins de aposentadoria especial, nos termos do art. 40, §5º, da Constituição Federal. A autarquia previdenciária alega que o CEFAPRO não se enquadra como estabelecimento de educação básica, requisito que considera fundamental para o cômputo do tempo especial. Contudo, conforme já exposto, a Lei Estadual nº 8.405/2005, vigente à época, expressamente considerava como "exercício da docência" as atividades desempenhadas pelos professores nos CEFAPROs (art. 4º). Além disso, embora o CEFAPRO não seja uma escola de educação básica em sentido estrito, suas atividades estão diretamente relacionadas ao processo educacional e à formação continuada dos profissionais que atuam na educação básica, o que evidencia a natureza eminentemente pedagógica do trabalho ali desenvolvido. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso já se manifestou em caso análogo: "REMESSA NECESSÁRIA - NÃO CONHECIMENTO - ARTIGO 496, §3º, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - VALOR INFERIOR AO TETO ESTABELECIDO - RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL - PROFESSOR - ATIVIDADES DESEMPENHADAS NO CEFAPRO - TEMPO COMPUTADO - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Hipótese dos autos em que o valor da condenação não atinge o limite estabelecido no art. 496, §3º, inciso II, do Código de Processo Civil, razão por que fica dispensado reexame necessário. 2. O período da atividade desenvolvida nos CEFAPROS deve ser computado para fins de aposentadoria especial de professor, ante a natureza eminentemente pedagógica, em consonância com os requisitos legais. 3. Recurso conhecido e não provido." (TJMT, Processo nº 1004722-70.2020.8.11.0004, Apelação Cível, Dr. Desembargador Relator Antônio Veloso Peleja Júnior, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data do Julgamento 29/11/2022) O acórdão acima citado tratou de situação semelhante à dos presentes autos, tendo reconhecido expressamente que o período de atividade desenvolvida nos CEFAPROS deve ser computado para fins de aposentadoria especial de professor, ante sua natureza eminentemente pedagógica. Ademais, o Supremo Tribunal Federal, ao fixar a tese do Tema 965, não restringiu as funções de magistério àquelas exercidas exclusivamente dentro do espaço físico das escolas de educação básica, mas sim àquelas relacionadas à docência, direção, coordenação e assessoramento pedagógico, desde que em estabelecimentos de educação infantil ou de ensino fundamental e médio. No caso concreto, embora o CEFAPRO seja uma unidade administrativa própria, sua atuação está diretamente relacionada aos estabelecimentos de educação básica, uma vez que sua finalidade é promover a formação continuada dos profissionais que atuam nesses estabelecimentos. Dessa forma, considerando a legislação estadual específica (Lei nº 8.405/2005), a jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso e a interpretação da tese fixada pelo STF no Tema 965, tenho que o período laborado pelo autor no CEFAPRO deve ser computado para fins de concessão de aposentadoria especial de professor. 3. Períodos laborados nas escolas Mal. Eurico Gaspar Dutra e Senador Filinto Muller (121 dias e 669 dias, respectivamente) O autor alega ter laborado como professor efetivo nas escolas Mal. Eurico Gaspar Dutra (121 dias) e Senador Filinto Muller (669 dias). Esses períodos não foram especificamente contestados pela autarquia previdenciária, que centrou sua defesa nos períodos laborados no CEFAPRO e na Assessoria Pedagógica. A documentação acostada aos autos, notadamente os boletins de pessoal (ids. 135964675, 135964676, 135964690), comprova que o autor exerceu funções de professor nas referidas escolas estaduais. Tratando-se de atividade típica de magistério exercida em estabelecimentos de educação básica, tais períodos devem ser computados para fins de concessão de aposentadoria especial de professor. 4. Período laborado como Assessor Pedagógico (596 dias) Por fim, o autor alega ter laborado como Assessor Pedagógico na unidade de Barra do Garças/MT, de 02/01/2019 a 20/08/2020, perfazendo 596 dias (aproximadamente 1 ano, 7 meses e 16 dias). A autarquia previdenciária alega que tal função, por ser exercida fora dos estabelecimentos de ensino básico, não pode ser computada para fins de aposentadoria especial. Contudo, conforme já exposto, o STF, ao julgar a ADI 3.772/DF e o RE 1.039.644/SC (Tema 965), reconheceu que as atividades de coordenação e assessoramento pedagógico integram as funções de magistério para fins de aposentadoria especial. No caso concreto, o autor, enquanto Assessor Pedagógico, tinha sob sua responsabilidade diversas escolas de educação básica do polo de Barra do Garças/MT, conforme alegado pelo autor e não contestado especificamente pela autarquia. O fato de o Assessor Pedagógico estar lotado em uma unidade administrativa própria não desnatura a natureza pedagógica de suas funções, que estão diretamente relacionadas ao processo educacional das escolas sob sua responsabilidade. Ademais, a Portaria nº 795/2018-GS/SEDUC/MT (id. 135964672), que nomeou o autor para exercer a função de Assessor Pedagógico, expressamente dispõe que tal função é exercida por Professores da Educação Básica do Estado de Mato Grosso. Nesse contexto, tendo em vista a natureza eminentemente pedagógica das funções de Assessor Pedagógico e sua relação direta com os estabelecimentos de educação básica, bem como a interpretação da tese fixada pelo STF no Tema 965, tenho que o período laborado pelo autor como Assessor Pedagógico deve ser computado para fins de concessão de aposentadoria especial de professor. Assim, da análise dos autos, verifico que a autarquia previdenciária reconheceu ao autor 15 anos, 11 meses e 4 dias (5.816 dias) como tempo de efetivo exercício de magistério para fins de aposentadoria especial. Somando-se a esse período os tempos ora reconhecidos - 1.227 dias como professor interino, 2.827 dias no CEFAPRO, 121 dias na escola Mal. Eurico Gaspar Dutra, 669 dias na escola Senador Filinto Müller e 596 dias como Assessor Pedagógico -, totalizamos 11.256 dias, que correspondem a 30 anos, 9 meses e 24 dias. Considerando que, para a concessão da aposentadoria especial de professor do sexo masculino, são necessários 30 anos de contribuição (10.950 dias), conforme disposto na legislação previdenciária, o autor já havia implementado os requisitos necessários antes de 20/08/2020, data da Emenda Constitucional Estadual nº 92/2020, que alterou as regras previdenciárias no âmbito do Estado de Mato Grosso. Assim, o autor faz jus à aposentadoria especial por tempo de contribuição de professor, devendo ser reconhecido seu direito à obtenção do benefício a partir da data do requerimento administrativo (28/01/2022). Prosseguindo, tendo em vista o reconhecimento do direito do autor à aposentadoria especial, impõe-se o pagamento dos proventos retroativos desde a data do requerimento administrativo (28/01/2022) até a efetiva implementação do benefício. Quanto ao pedido de indenização por danos morais, entendo que a controvérsia envolvendo a análise administrativa de tempo de serviço não configura, por si só, ato ilícito indenizável. O indeferimento do benefício em sede administrativa, mesmo que posteriormente considerado equivocado, não extrapola o exercício regular da função pública, inexistindo nos autos elementos concretos que indiquem abuso de poder, má-fé ou perseguição pessoal por parte da autarquia previdenciária. O mero indeferimento administrativo de benefício previdenciário, quando baseado em interpretação jurídica razoável, não configura ato ilícito causador de dano moral. Dessa forma, não caracterizado o ato ilícito, requisito essencial para a configuração do dever de indenizar, impõe-se a improcedência do pedido de indenização por danos morais. Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por Manoel Pereira Maia em face de Mato Grosso Previdência - MTPREV para: a) reconhecer o direito do autor à aposentadoria especial de professor por tempo de contribuição a partir da data do requerimento administrativo (28/01/2022); b) determinar à autarquia requerida que implemente o benefício de aposentadoria especial de professor em favor do autor, no prazo de 30 (trinta) dias. c) condenar a autarquia requerida ao pagamento dos proventos retroativos devidos desde a data do requerimento administrativo (28/01/2022) até a efetiva implementação do benefício, acrescidos de juros de mora, a partir da citação, pelos índices de remuneração da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09), e correção monetária, desde quando cada parcela deveria ter sido paga, pelo IPCA-E (RE 870.947). A partir de dezembro de 2021, sobre os valores deverá incidir, tão somente, a taxa SELIC para os encargos moratórios surgidos após o início da vigência da EC 113/2021. Os índices fixados podem sofrer alterações em casos de mudanças econômicas e legislativas; d) julgar improcedente o pedido de indenização por danos morais. Considerando que a parte autora sucumbiu em parte mínima, condeno a demandada às despesas e honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação. Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do artigo 496, § 3º, inciso II, do Código de Processo Civil, uma vez que o valor da condenação não ultrapassa 500 (quinhentos) salários mínimos. Após o trânsito em julgado, ao arquivo. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. BARRA DO GARÇAS, 10 de julho de 2025. Carlos Augusto Ferrari Juiz de Direito

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Elizabete Ortiz Troche x Banco Pan S.A.

ID: 316625525

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1004722-05.2024.8.11.0045

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

ELIZABETE ORTIZ TROCHE

Polo Passivo:

BANCO PAN S.A.

Sentença

Advogados:

RAFAEL FERREIRA ALVES BATISTA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE Processo nº 1004722-05.2024.8.11.0045 Autora: Elizabete Ortiz Troche Réu: Banco Pan S.A. SENTENÇA Trata-se de ação revisiona… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE Processo nº 1004722-05.2024.8.11.0045 Autora: Elizabete Ortiz Troche Réu: Banco Pan S.A. SENTENÇA Trata-se de ação revisional c/c repetição do indébito e indenização por danos morais ajuizada por Elizabete Ortiz Troche em face de Banco Pan S.A., todos devidamente qualificados nos autos, por meio da qual a parte autora busca a anulação de contrato de cartão de crédito consignado, a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados e indenização por danos morais, ou subsidiariamente, a revisão dos juros aplicados e a conversão do contrato para a modalidade de empréstimo consignado. Aduz a parte autora que, em um momento de crise financeira, procurou a parte requerida para contratar um empréstimo consignado, contudo, após algum tempo, notou um desconto mensal e contínuo de R$72,56 em sua Reserva de Margem Consignável (RMC), de modo que, ao buscar esclarecimentos junto ao suporte do requerido, foi informada de que o desconto se referia a um cartão de crédito com rotativo sem termo final, serviço que não havia sido solicitado. Alega que a parte requerida, utilizando-se de práticas abusivas, "maquiou" um contrato de cartão de crédito como se fosse um empréstimo consignado, sendo que o valor liberado era, na verdade, um saque do limite total do cartão de crédito, fato este não informado no ato da contratação. Alega também que foi induzida a erro pela parte ré, que, aproveitando-se de sua condição de vulnerabilidade, omitiu informações cruciais e alterou a realidade contratual para que a parte autora firmasse um contrato diferente do pretendido. Sustenta, por fim, que tentou diversas vezes solucionar a situação administrativamente, mas todas as tentativas foram infrutíferas, levando-a a buscar a intervenção do judiciário para que a justiça seja feita diante das práticas abusivas da instituição financeira. Ao fim, pugna pela procedência dos pedidos, concessão da tutela antecipada, justiça gratuita e tramitação prioritária, inversão do ônus da prova, designação de audiência virtual, declaração de nulidade do contrato de RMC, restituição em dobro dos valores pagos indevidamente, condenação em danos morais, ou subsidiariamente, conversão do contrato para empréstimo consignado com recálculo da dívida, e condenação do réu em custas e honorários advocatícios. Pela decisão de ID. 159694087, foram deferidos à autora os benefícios da justiça gratuita e concedida a tutela de urgência, “para o fim de determinar ao requerido que suspenda os descontos mensais no benefício previdenciário da requerente, denominados “Reserva de Margem para Cartão”, no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais)”, determinando-se ainda, a citação do réu. O réu apresentou contestação (ID. 169855511), arguindo, preliminarmente, a irregularidade da procuração; a falta de interesse de agir, pela ausência de tentativa de solução administrativa; e impugnou a a justiça gratuita. No mérito, alega que a contratação do cartão de crédito consignado foi legítima e transparente, formalizada mediante assinatura da autora em contrato claro e com a apresentação de seus documentos pessoais, sendo o crédito solicitado devidamente liberado em conta de sua titularidade. Aduz que a autora é pessoa capaz e tinha o dever de ler o contrato que assinou, cujas cláusulas são objetivas e de fácil compreensão, e que, portanto, não há vício de consentimento ou falha no dever de informação. Sustenta que não praticou qualquer ato ilícito, inexistindo defeito na prestação do serviço ou nexo de causalidade que justifique a reparação por danos morais ou a repetição de indébito. Com a contestação juntou documentos. A autora apresentou impugnação à contestação (ID. 170244218). Intimadas, as partes informaram não ter interesse na produção de provas. É O RELATÓRIO. DECIDO. Analisando os autos, observo que comporta julgamento antecipado, eis que embora a matéria seja de direito e de fato, estão presentes nos autos elementos suficientes que permitem a formação do convencimento do juízo. DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO ESPECÍFICA A petição inicial foi instruída com o instrumento de mandato regularmente subscrito pela autora, constando os poderes gerais de foro, conforme determina o art. 105, do Código de Processo Civil. O documento apresenta todos os elementos formais necessários à identificação da outorgante, do outorgado e do escopo da representação, não havendo omissão de requisito essencial que prejudique a validade do mandato. Ademais, eventual defeito formal seria suprível mediante concessão de prazo, nos termos do art. 76, § 2º, do Código de Processo Civil, o que não se revela necessário diante da regularidade do instrumento apresentado. Por tais razões, rejeito a preliminar suscitada. DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL O réu suscita, em preliminar, a carência da ação por falta de interesse de agir, ao argumento de que a parte autora não buscou previamente os canais administrativos para a solução do conflito. Ora, o interesse processual nasce no momento em que a parte tem necessidade de ir a juízo para atingir a tutela pretendida e, ainda, quando esta tutela jurisdicional lhe traz alguma utilidade do ponto de vista prático. É que a garantia constitucional, alusiva ao acesso ao Judiciário, engloba a entrega da prestação jurisdicional de forma completa estando à essência na norma inserida no inciso XXXV, do art. 5º, da Carta Magna, que dispõe verbis: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. No caso dos autos, a própria apresentação de contestação de mérito pelo réu, na qual se opõe frontalmente às alegações autorais, evidencia a existência de uma lide e configura, inequivocamente, a pretensão resistida, tornando presente o interesse processual para a demanda. Desse modo, afasto a preliminar. DA IMPUGNAÇÃO DA JUSTIÇA GRATUITA A autora apresentou declaração de hipossuficiência econômica, subscrita por seu representante legal, nos termos do artigo 99, §3º, do Código de Processo Civil, que dispõe: “Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural”. O requerido não trouxe prova idônea capaz de afastar a presunção legal, limitando-se a impugnação genérica e desacompanhada de elementos concretos que demonstrem capacidade econômica incompatível com o benefício. Dessa forma, subsiste a presunção de veracidade da declaração apresentada e não verificado qualquer abuso de direito processual. Por tais fundamentos, indefiro a impugnação e mantenho a gratuidade da justiça deferida à autora. MÉRITO Superadas as questões preliminares, o cerne da controvérsia reside em verificar a validade do negócio jurídico celebrado entre as partes, especificamente se a contratação de cartão de crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) decorreu de manifestação de vontade livre e informada por parte da consumidora ou se, ao contrário, configurou-se prática abusiva com vício de consentimento, ao ser-lhe imposto produto diverso do pretendido, que era um empréstimo consignado tradicional. De início, cumpre assentar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), entendimento este pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por meio da Súmula 297, que dispõe: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". Dessa forma, a análise da controvérsia deve ser pautada pelos princípios e regras do microssistema consumerista, notadamente o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, o princípio da boa-fé objetiva e, de maneira central para o caso em tela, o direito básico à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com a especificação correta de suas características e riscos, conforme preceitua o artigo 6º, inciso III, do CDC. O dever de informação, nas relações de consumo, não se exaure na mera entrega de um instrumento contratual. Exige-se da instituição financeira uma conduta ativa, leal e transparente, que assegure que o consumidor, especialmente o hipervulnerável – como é o caso da parte autora, por ser pessoa pensionista –, compreenda plenamente a natureza, os custos e as implicações do negócio que está a celebrar. Nessa perspectiva, dispõe o art. 52, do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre: I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional; II - montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros; III - acréscimos legalmente previstos; IV - número e periodicidade das prestações; V - soma total a pagar, com e sem financiamento.” Na verdade, é nesse ponto em específico que a questão toma contornos de abusividade, já que não há a devida informação ao consumidor de como os descontos dessa modalidade de contratação se dão (na prática) em relação ao valor emprestado, pois ninguém, em sã consciência, se proporia a celebrar um contrato que, pela forma de amortização é, a bem da verdade, uma dívida interminável porque o desconto se dá, apenas, em relação ao valor mínimo da fatura (ainda que haja dinheiro em conta para o pagamento de todo o montante devido ou saldo positivo frente à fonte pagadora), sendo, em relação ao remanescente, aplicada correção por meio de taxas de juros muito altas que acabam por aumentar, e não diminuir o montante devido, caracterizando, assim, verdadeira cláusula leonina de dificílima compreensão. Ora, é sabido que nas relações de consumo, as cláusulas contratuais precisam ser claras, assertivas e de fácil compreensão a todo e qualquer contratante – sobretudo aqueles considerados leigos no assunto – o que não se verifica no caso aqui tratado em que informações essenciais, como é o caso da forma de amortização do débito, se revelam dúbias a ponto de induzir em erro o consumidor, violando assim os princípios da informação e da transparência insculpidos no art. 46 do CDC. Vejamos: “Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.” Aplica-se, ademais, o disposto no art. 47, do mesmo codex, no sentido de que “As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”, não se olvidando, ainda, que o consumidor é reconhecido pelo referido código, como a parte vulnerável na relação de consumo (art. 4º, inciso I). A parte requerida defende a regularidade da contratação, juntando o "Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado", a "Solicitação de Saque via Cartão de Crédito Consignado e comprovantes de transferência de valores (id. 169855517). Contudo, uma análise detida dos autos e da própria natureza da operação questionada revela uma patente falha no dever de informação e o desvirtuamento da vontade da consumidora. A parte autora alega, desde a inicial, que sua intenção era contratar um empréstimo consignado simples, com parcelas fixas e prazo determinado, mas foi induzida a erro pela parte requerida, que formalizou a operação como um saque no limite de um cartão de crédito consignado. Essa modalidade, como é notório, revela-se substancialmente mais onerosa e prejudicial ao consumidor, pois os descontos mensais em folha de pagamento amortizam apenas uma pequena parte do débito (ou, por vezes, apenas os encargos), submetendo o saldo devedor remanescente a juros rotativos elevadíssimos, o que resulta em uma dívida praticamente perpétua e crescente. Os documentos apresentados pela instituição financeira, embora formalmente existentes, não são suficientes para comprovar que a parte autora anuiu de forma consciente com a modalidade de RMC. O fato de o valor ter sido creditado em sua conta não valida o vício de origem, pois o recebimento do montante é comum a ambas as operações (empréstimo consignado e saque via cartão). A essência da ilicitude reside na modalidade contratual que foi imposta. Corrobora a tese autoral a ausência de qualquer evidência de que a autora tenha, de fato, utilizado o cartão de crédito para outras finalidades, como compras em estabelecimentos comerciais. Com efeito, a única transação vinculada ao cartão foi o saque inicial do limite, o que descaracteriza o uso regular do produto e reforça a convicção de que a intenção da consumidora era, unicamente, a obtenção de um mútuo. A prática de "vender" um saque no cartão de crédito como se empréstimo fosse é abusiva, pois viola a boa-fé objetiva e coloca o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, IV, do CDC), submetendo-o a um endividamento contínuo e desproporcional. Diante do exposto, este juízo conclui que houve vício de consentimento, decorrente da violação do dever de informação por parte da instituição financeira. A vontade da parte autora foi direcionada à contratação de um empréstimo consignado tradicional, e não à adesão a um contrato de cartão de crédito com RMC, devendo o negócio jurídico ser adequado à real intenção da contratante. Não diferente é o entendimento do e. Tribunal de Justiça de Mato Grosso. “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA C/C NULIDADE E INDENIZATÓRIA – CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO – ILEGALIDADE CONSTATADA – CONSUMIDOR QUE, ACREDITANDO ESTAR CONTRATANDO MÚTUO CONSIGNADO, ADERIU A NEGÓCIO JURÍDICO DIVERSO – SAQUE DE LIMITE DE CARTÃO DE CRÉDITO – CONVERSÃO DA MODALIDADE DA OPERAÇÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – VIABILIDADE – FIXAÇÃO JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO – DEVOLUÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – MÁ FÉ NÃO VERIFICADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Necessária a conversão do contrato de cartão de crédito para crédito pessoal consignado para servidor público, ante comprovação de que o consumidor foi induzido a erro, configurando a prática abusiva e violação do dever de informação de boa-fé pela Instituição Financeira. Consequentemente deve-se incidir juros remuneratórios nas operações de saque realizadas, diante da conversão para a modalidade de crédito pessoal consignado para servidor público, fixadas dentro da taxa média praticada no mercado à época para empréstimos consignados (AREsp 1099613/MG) (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/txjuros). Não se verifica a intenção dolosa do apelado, portanto a devolução deve ser na forma simples (art. 42 do CDC).” (TJMT, RAC n. 1017446-24.2022.8.11.0041, 4ª Câm. Dir. Priv., Rela. Desa. Serly Marcondes Alves, j. 23.08.2023 – negritei e gritei). Reconhecida a abusividade da contratação na modalidade de cartão de crédito com RMC, impõe-se a sua nulidade, com a consequente conversão do negócio jurídico para um contrato de empréstimo consignado simples. Para tanto, o valor do principal (valor efetivamente creditado em favor da autora) deverá ser amortizado pelos descontos mensais já realizados em seu benefício previdenciário, aplicando-se à operação a taxa de juros média de mercado para operações de crédito pessoal consignado para beneficiários do INSS, divulgada pelo Banco Central do Brasil à época da contratação (10.04.2024), salvo se a taxa prevista no contrato anulado for mais benéfica à consumidora. Entretanto, não é possível a declaração de insistência do débito, ante a comprovação de que o autor recebeu o empréstimo. Avançando na elucidação da celeuma, sendo constatada a cobrança indevida na conta da autora, por certo que o mesmo faz jus a repetição do indébito, contudo, na forma simples e não em dobro como pretendido, após a devida apuração, em sede de liquidação de sentença, do que foi efetivamente descontado de forma errônea. A propósito: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. AUSÊNCIA. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. TR. PREVISÃO CONTRATUAL. INCIDÊNCIA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DOBRO. IMPOSSIBILIDADE. [...] 3. A jurisprudência iterativa da Terceira e Quarta Turma orienta-se no sentido de admitir, em tese, a repetição do indébito, ficando relegado às instâncias ordinárias o cálculo do montante, a ser apurado, se houver, mas sempre na forma simples. Precedentes. 4. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.” (STJ, REsp n. 401.589/RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 04.10.2004 – negritei) “Direito civil. Agravo no agravo de instrumento. Repetição do indébito. Forma simples. - O entendimento dominante neste STJ é no sentido de admitir a repetição do indébito na forma simples, e não em dobro, salvo prova da má-fé. Negado provimento ao agravo.” (STJ, AgRg no AG n. 570.214/MG, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 28.06.2004 – negritei). Prosseguindo com os pleitos da autora, no tocante ao dano moral, é certo que para fazer jus a indenização o ato ilícito deve restar devidamente comprovado, nos termos do art. 927, do C. Civil, porque ao estipular a responsabilidade indenizatória, vinculou-a de modo inseparável ao ato ilícito, ao tempo que, na falta deste, inexiste o dever de indenizar e improcedem todas as demandas intentadas com esse objetivo. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SUPOSTO DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL OBSTATIVA. DÍVIDA NÃO ATINGIDA PELA EFICÁCIA DA DECISÃO. EXISTÊNCIA DE DÉBITO. INSCRIÇÃO DEVIDA. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO QUE POSSIBILITE A PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. Ausente um dos requisitos ensejadores do dever de indenizar, qual seja, o ato ilícito, é de ser julgada improcedente a demanda, mantendo-se a sentença atacada. APELO PROVIDO.” (TJRS, RAC n. 70016858524, 9ª Câm. Cív., Rela. Des. Marilene Bonzanini Bernardi, j. 28.03.2007 – negritei). Assim, não obstante ao comportamento abusivo do banco demandado e do prejuízo experimentado pela parte autora, entendo que a situação não caracteriza, necessariamente, violação aos direitos da sua personalidade ou mesmo ofensa à honra subjetiva, permanecendo, portanto, a situação, na esfera do mero aborrecimento à afastar, portanto, a possibilidade de reparação, mesmo porque, sob a ótica do demandado, apenas estava cumprindo o que fora pactuado. Outro não é o entendimento do e. TJMT ao julgar questões semelhantes, verbis: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO POR CARTÃO DE CRÉDITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO CONSUMIDOR. INDUÇÃO A ERRO NA CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO DO VALOR MÍNIMO DA FATURA. ABUSIVIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE UTILIZAÇÃO E DO ENVIO DO CARTÃO. AUSÊNCIA DE RESPEITO AO DEVER DE INFORMAÇÃO AO CONSUMIDOR. VIOLAÇÃO AO ART. 6º E AO INCISO IV, DO ART. 51, DO CDC. AUTORA QUE PRETENDIA CONTRATAR EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PARA PAGAMENTO EM PARCELAS FIXAS. VALOR DISPONIBILIZADO MEDIANTE TED. CONVERSÃO DO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. RESTITUIÇÃO DAS QUANTIAS DE FORMA SIMPLES. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO BANCO RECORRIDO. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Configura prática abusiva ao consumidor o induzimento de contratação de empréstimo mediante cartão de credito consignado com aparência de mútuo comum com desconto na folha de pagamento, violando o dever de informação de boa-fé que devem nortear os contratos consumeristas. 2. Comprovado que o consumidor foi induzido a erro, o contrato deve ser convertido para a modalidade de empréstimo consignado, devendo ser adequada a taxa de juros à média de mercado para essa modalidade de empréstimo. 3. A simples constatação de encargos abusivos e a consequente revisão contratual não ensejam danos morais. 4. No caso dos autos, muito embora incida o Código de Defesa do Consumidor, não há nenhuma hipótese de dano “in re ipsa”, posto que sequer houve inscrição do nome do autor nos órgãos de proteção ao crédito, cabia a parte autora/recorrente comprovar que sofreu os danos morais. 5. Sentença reformada. 6. Recurso parcialmente provido.” (RAC n. 1001828-83.2019.8.11.0028, 1ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, j. 23.08.2022 – negritei). Destarte, não é o caso de condenação em dano moral na forma pretendida pela parte autora. DISPOSITIVO Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional c/c repetição do indébito e indenização por danos morais ajuizada por Elizabete Ortiz Troche em face de Banco Pan S.A., para a) DECLARAR a nulidade do contrato de cartão de crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC), por vício de consentimento, e determinar a sua conversão para a modalidade de empréstimo consignado simples; b) CONFIRMAR a liminar deferida e DETERMINAR que a parte requerida cesse em definitivo os descontos no benefício previdenciário da parte autora a título de "Reserva de Margem para Cartão de Crédito" ou rubrica equivalente, sob pena de multa correspondente ao dobro de cada valor indevidamente descontado após a intimação desta sentença; c) CONDENAR o réu a restituir, de forma simples, os valores eventualmente descontados a maior conta do autor, após apuração em sede de liquidação de sentença, acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a contar da citação e de cada desembolso, respectivamente, ficando, desde já suspenso novos descontos decorrentes da contratação em questão, até que haja a devida apuração do que já foi efetivamente pago, devendo comunicar, ainda, a unidade pagadora para a efetivação desta ordem; d) CONDENAR o réu ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, na forma do art. 85, §2º e art. 86, parágrafo único, ambos do CPC. Com o trânsito em julgado, certifique-se, procedendo às anotações de estilo e intime-se a autora para informar se tem interesse no cumprimento sentença na forma prevista na Lei, no prazo de 05 (cinco) dias. P.R.I. Cumpra-se. Cuiabá-MT, data registrada no sistema. Ana Paula da Veiga Carlota Miranda Juíza de Direito Colaboradora – Portaria 866/2025.

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