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"0005869-53.2024.8.26.0405" - Resultados da Busca – Página 56 de 56

Nato Construções E Participações Ltda x Edilberto Joay

ID: 311043472

Tribunal: TJPR Órgão: Vara da Fazenda Pública de Cantagalo Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 0001072-44.2025.8.16.0060

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

NATO CONSTRUçõES E PARTICIPAçõES LTDA

Polo Passivo:

EDILBERTO JOAY

Conclusão

Advogados:

GUILHERME HENRIQUE CORRÊA FONTOURA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

GUSTAVO HENRIQUE SPERANDIO ROXO

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

IVO DE PAULA MEDAGLIA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE CANTAGALO VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE CANTAGALO - PROJUDI Rua Santo Antonio, 350 - Fórum - Jardim Social - Cantagalo/PR - CEP: 85.160-000 - Fone: 42 330… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE CANTAGALO VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE CANTAGALO - PROJUDI Rua Santo Antonio, 350 - Fórum - Jardim Social - Cantagalo/PR - CEP: 85.160-000 - Fone: 42 3309 3740 - Celular: (42) 3309-3745 - E-mail: can-ju-sc@tjpr.jus.br Autos nº. 0001072-44.2025.8.16.0060 Processo: 0001072-44.2025.8.16.0060 Classe Processual: Mandado de Segurança Cível Assunto Principal: ISS/ Imposto sobre Serviços Valor da Causa: R$1.000,00 Impetrante(s): NATO CONSTRUÇÕES E PARTICIPAÇÕES LTDA Impetrado(s): EDILBERTO JOAY DECISÃO Trata-se de mandado de segurança impetrado por NATO CONSTRUÇÕES E PARTICIPAÇÕES LTDA. contra ato de EDILBERTO JOAY, Secretário de Finanças do Município de Virmond, órgão da Administração Direta do MUNICIPIO DE VIRMOND. Alega em apertada síntese que atua no ramo da construção civil, com expertise na execução de serviços na área de saneamento e esgoto e que participa de licitações públicas e firma contratos administrativos para obras de instalação, manutenção, melhoria se ampliação do sistema de esgoto sanitário e outros serviços de saneamento. Relata que nesse ramo, costuma prestar serviços para a Companhia de Saneamento do Paraná (SANEPAR) e Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN). No caso em tela, pactuou contrato com a SANEPAR de n. 63259/2025, para fins de execução de serviços no âmbito da Gerência Regional de Guarapuava (GRGA) que abrange as seguintes localidades/municípios: Campina do Simão, Entre Rios, Goioxim, Guará, Faxinal do Boa Vista, Palmeirinha, Turvo, Vila Operária, Laranjeiras do Sul, Nova Laranjeiras, Porto Barreiro, Rio Bonito do Iguaçu, Pitanga, Santa Maria do Oeste, Manoel Ribas, Catuporanga, Nova Tebas, Poema, Palmital, Laranjal, Marquinho, Foz do Jordão, Candói, Reserva do Iguaçu, Quedas do Iguaçu, Espigão Alto do Iguaçu, Cantagalo, Lagoa Seca, Virmond, Pinhão, Faxinal do Céu, Bom Retiro e Nova Divinéia. Em tal contrato os serviços que presta dizem respeito à manutenção de redes e ramais de água e de esgoto sanitário, execução de ampliação de redes de água e esgoto (SAR), recomposição de pavimentos passeio e rua, melhorias operacionais de água e esgoto sanitário e desenvolvimento operacional de acordo com a filosofia e metodologia do Sistema Gerencial de Manutenção – SGM e do Manual de Obras de Saneamento – MOS. Afirma que mesmo diante da ausência de previsão na LC 116/2003, há ameaça e risco de que a SANEPAR realize a retenção e recolhimento do ISSQN teoricamente devido ao município. Contudo, afirma que não há incidência do referido tributo quando da prestação dos serviços decorrentes do contrato 63259/2025. Teceu comentário quanto ao cabimento do Mandado de Segurança, regime legal e jurisprudencial para fins de cobrança do ISS, previsão legal municipal do ISS, direito a compensação ou restituição dos valores indevidamente recolhidos. Ao final requereu a concessão da liminar para que: (i) reconheça o direito da Impetrante de, para as competências futuras, não recolher valores a título de ISS sobre os serviços prestados no âmbito do Contrato Administrativo SANEPAR nº 63259/2025, por se tratarem de hipóteses de não incidência; (ii) subsidiariamente, autorize o depósito judicial dos valores eventualmente exigidos, a cada faturamento, para fins de suspensão da exigibilidade; (iii) determine à SANEPAR que se abstenha de reter valores a título de ISS; e (iv) determine à Autoridade Impetrada e ao Município de Virmond que se abstenham de promover cobrança administrativa ou judicial, inscrição em dívida ativa ou qualquer outra medida restritiva enquanto pendente o julgamento final do presente mandado de segurança Juntou documentos nos seq. 1.2 a 1.9. Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. DECIDO. 1. Recebo a inicial. 2. Liminar Inicialmente, destaco que, no mandado de segurança, a legitimidade passiva é do responsável pela ilegalidade ou abuso de poder. Noutros termos, "Para efeito de definição da legitimidade passiva ad causam no mandado de segurança, autoridade coatora é aquele que pratica o ato vergastado e que detém, por isso mesmo, capacidade para seu desfazimento" (STJ, AgRg no RMS 39.566/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 4.12.2013.). Segundo o art. 1.º da Lei n. 12.016/2009: Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso do poder, alguém sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte da autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. Quando se diz que o mandado de segurança exige a comprovação de direito líquido e certo, desde que os fatos alegados pelo impetrante estejam, desde já, comprovados, deve a petição inicial vir acompanhada dos documentos indispensáveis a essa comprovação. Daí a exigência de a prova, no mandado de segurança, ser pré-constituída. Existindo prova pré-constituída, é possível a concessão de medida liminar em mandado de segurança quando concorrerem dois requisitos: a relevância da fundamentação ou a plausibilidade da medida e o perigo de dano. É o que dispõe o art. 7º, inc. III, da Lei nº 12.016/2009, segundo o qual se suspenderá “o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida”. Segundo Hely Lopes Meirelles: Para a concessão da liminar devem concorrer os dois requisitos legais, ou seja, a relevância dos motivos em que se assente o pedido na inicial e a possibilidade da ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito – fumus boni juris e periculum in mora. (Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção, Habeas Data. 19 ed. atual. Por Arnoldo Wald. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 69-70). Sobre o conceito de probabilidade do direito, a doutrina leciona que: “A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica – que é aquela que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder “tutela provisória” (in Breves comentários ao novo Código de Processo Civil, Teresa Arruda Alvim Wabier et al, 1. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 47). Destarte, em que pese a Lei não exigir “prova inequívoca que convença da verossimilhança das alegações” para concessão da tutela antecipatória, exige, em sentido similar, a presença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito, persistindo, pois, o dever da parte que pleiteia a tutela antecipada trazer aos autos ao menos um início de prova suficiente a evidenciar a probabilidade de seu direito. No entendimento de HUMBERTO THEODORO JUNIOR, o perigo de dano “refere-se ao interesse processual em obter uma justa composição do litigio, seja em favor de uma ou de outra parte, o que não poderá ser alcançado caso se concretize o dano temido. Ele nasce de dados concretos seguros, objeto de prova suficiente para autorizar o juízo de grande probabilidade em torno do risco de prejuízo grave. Pretende-se combater os riscos, injustiças ou de dano derivados da espera pela finalização do curso normal do processo. Há que se demonstrar, portanto, o “perigo na demora da prestação da tutela jurisdicional” (NCPC, art. 300) (NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, 20ª edição, Editora Forense, página 361). Pois bem. Primeiro, entendo ser o autor parte legítima para discutir a exigibilidade/inexigibilidade do ISS, tendo em vista o contrato firmado com a SANEPAR, uma vez que, conforme entendimento do STJ, a pretensão repetitória de valores indevidamente recolhidos a título de ISS, na hipótese em que o ISS assume natureza indireta, cabe a quem sofre os encargos econômicos de tal recolhimento. (REsp 1661530/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/04/2017, DJe 02/05/2017). Some-se a isso o disposto na cláusula 23ª do contrato de seq. 1.6. Prosseguindo e, em cognição sumária, verifica-se que o edital de seq. 1.5, realizado pela SANEPAR, aponta a realização de licitação eletrônica de n. 65/2025 para fins de contratação de serviços de manutenção de redes e ramais de água e de esgoto sanitário, execução de ampliação de redes de água e esgoto (SAR), recomposição de pavimentos passeio e rua, melhorias operacionais de água e esgoto sanitário e desenvolvimento operacional de acordo com a filosofia e metodologia do Sistema Gerencial de Manutenção – SGM e do Manual de Obras de Saneamento – MOS, nas quantidades e parâmetros qualitativos definidos pela Sanepar, na área de abrangência da Gerência Regional de Guarapuava – GRGA, com fornecimento de materiais, conforme detalhado nos anexos do edital. Tem-se do contrato de seq. 1.6 (n. 63259) formalizado com a impetrante, indicando todos os serviços que deverão ser realizados pela contratada. Os serviços são aqueles dispostos na inicial. O documento de seq. 1.7 indica a área de abrangência para atuação da contratada (ora impetrante), sendo o município de Virmond uma delas. In casu, em análise superficial aos autos, entendo que se encontram presentes os requisitos para a concessão da medida. Explico: O imposto em questão encontra sua regulamentação no artigo 156, inciso III da Constituição Federal, que delimita a sua incidência, nos seguintes termos: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar; Denota-se que a empresa agravante requer o reconhecimento da não incidência ou a suspensão da exigibilidade do crédito tributário de ISS, nos termos do art. 151, inciso V, do CTB, decorrentes dos serviços que vierem a ser prestados no Contrato nº 63259 (e futuros), decorrentes dos serviços prestados, ou, de forma subsidiária, os depósitos dos valores eventualmente exigidos, a cada faturamento, para fins de suspensão da exigibilidade. Também objetiva a abstenção da SANEPAR em reter os valore à título de ISS, bem como pretende que a autoridade impetrada e ao município que se abstenham de promover a cobrança administrativa ou judicial, inscrição em dívida ativa ou qualquer outra medida restritiva enquanto pendente o julgamento A probabilidade do direito invocado pelo autor ficou demonstrado diante da documentação encartada (principalmente o contrato), bem como diante do veto presidencial dos itens 7.14 e 7.15 da Lei Complementar 116/2003. Conforme o disposto no art.3ª da Lei Complementar nº 116/2003: “Art. 3 O serviço considera-se prestado, e o imposto, devido, no local do o estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXV, quando o imposto será devido no local: (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016) (Vide ADIN 3142) I – do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do § 1 do art. 1 desta o o Lei Complementar; II – da instalação dos andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas, no caso dos serviços descritos no subitem 3.05 da lista anexa; III – da execução da obra, no caso dos serviços descritos no subitem 7.02 e 7.19 da lista anexa; IV – da demolição, no caso dos serviços descritos no subitem 7.04 da lista anexa; V – das edificações em geral, estradas, pontes, portos e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.05 da lista anexa; VI – da execução da varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e destinação final de lixo, rejeitos e outros resíduos quaisquer, no caso dos serviços descritos no subitem 7.09 da lista anexa; VII – da execução da limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.10 da lista anexa; VIII – da execução da decoração e jardinagem, do corte e poda de árvores, no caso dos serviços descritos no subitem 7.11 da lista anexa; IX – do controle e tratamento do efluente de qualquer natureza e de agentes físicos, químicos e biológicos, no caso dos serviços descritos no subitem 7.12 da lista anexa; X – (VETADO) XI – (VETADO) XII – do florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.16 da lista anexa; XII - do florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação, reparação de solo, plantio, silagem, colheita, corte, descascamento de árvores, silvicultura, exploração florestal e serviços congêneres indissociáveis da formação, manutenção e colheita de florestas para quaisquer fins e por quaisquer meios; (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016) XIII – da execução dos serviços de escoramento, contenção de encostas e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.17 da lista anexa; XIV – da limpeza e dragagem, no caso dos serviços descritos no subitem 7.18 da lista anexa; XV – onde o bem estiver guardado ou estacionado, no caso dos serviços descritos no subitem 11.01 da lista anexa; XVI – dos bens ou do domicílio das pessoas vigiados, segurados ou monitorados, no caso dos serviços descritos no subitem 11.02 da lista anexa; XVI - dos bens, dos semoventes ou do domicílio das pessoas vigiados, segurados ou monitorados, no caso dos serviços descritos no subitem 11.02 da lista anexa; (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016) XVII – do armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda do bem, no caso dos serviços descritos no subitem 11.04 da lista anexa; XVIII – da execução dos serviços de diversão, lazer, entretenimento e congêneres, no caso dos serviços descritos nos subitens do item 12, exceto o 12.13, da lista anexa; XIX – do Município onde está sendo executado o transporte, no caso dos serviços descritos pelo subitem 16.01 da lista anexa; XIX - do Município onde está sendo executado o transporte, no caso dos serviços descritos pelo item 16 da lista anexa; (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016) XX – do estabelecimento do tomador da mão-de-obra ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.05 da lista anexa; XXI – da feira, exposição, congresso ou congênere a que se referir o planejamento, organização e administração, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.10 da lista anexa; XXII – do porto, aeroporto, ferroporto, terminal rodoviário, ferroviário ou metroviário, no caso dos serviços descritos pelo item 20 da lista anexa. XXIII - do domicílio do tomador dos serviços dos subitens 4.22, 4.23 e 5.09; (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016) XXIV - do domicílio do tomador do serviço no caso dos serviços prestados pelas administradoras de cartão de crédito ou débito e demais descritos no subitem 15.01; (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016) XXV - do domicílio do tomador dos serviços dos subitens 10.04 e 15.09. (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016) XXV - - do domicílio do tomador do serviço do subitem 15.09. (Redação dada pela Lei Complementar nº 175, de 2020)” Portanto, os vetos representados nos incisos “X” e “XI” se referem aos itens 7.14 e 7.15 da lista de serviços constantes no anexo da LC 116/2003, que previam justamente a tributação sobre serviços de saneamento, esgotamento e tratamento sanitário, bem como sobre serviços de tratamento e purificação da água. Assim, como dito alhures, presente a probabilidade do direito, tendo em vista a inconsistência da retenção do CT de ISSQN, até mesmo diante das razões do veto: A incidência do imposto sobre serviços de saneamento ambiental, inclusive purificação, tratamento, esgotamento sanitários e congêneres, bem como sobre serviços de tratamento e purificação de água, não atende ao interesse público. A tributação poderia comprometer o objetivo do Governo em universalizar o acesso a tais serviços básicos. O desincentivo que a tributação acarretaria ao setor teria como consequência de longo prazo aumento nas despesas no atendimento da população atingida pela falta de acesso a saneamento básico e água tratada. Ademais, o Projeto de Lei nº 161 - Complementar revogou expressamente o art. 11 do Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, com redação dada pela Lei Complementar nº 22, de 9 de dezembro de 1974. Dessa forma, as obras hidráulicas e de construção civil contratadas pela União, Estados, Distrito Federal Municípios, autarquias e concessionárias, antes isentas do tributo, passariam ser taxadas, com reflexos nos gastos com investimentos do Poder Público. Dessa forma, a incidência do imposto sobre os referidos serviços não atende o interesse público, recomendando-se o veto aos itens 7.14 e 7.15, constantes da Lista de Serviços do presente Projeto de lei Complementar. Em decorrência, por razões de técnica legislativa, também deverão ser vetados o inciso X e XI do art. 3º do Projeto de Lei”. (Fonte: http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/LEIS/Mensagem_ Veto/2003/Mv362- 03.htm Veja-se que a tributação (previsão legal municipal) de tal atividade é contrária ao interesse público, até mesmo porque a execução de obras e serviços de saneamento mediante contrato firmado com a SANEPAR, trata de serviços expressamente vetados da lista anexa à LC n. 116/2003. Nesse sentido: Processual Civil e Tributário. Ação declaratória de inexistência de relação jurídica. ISS. Contrato de prestação de serviços com a SANEPAR. Manutenção de redes e ramais de água e esgoto sanitário, execução de ampliação de redes de água e esgoto sanitário (SAR), recomposição de pavimentos passeio e rua, melhoria operacional de água e esgoto sanitário e desenvolvimento operacional. Lei Complementar n. 116/2003. Lista Anexa. Itens 7.14 e 7.15 vetados pelo Chefe do Executivo. Serviços de saneamento ambiental, purificação, tratamento, esgotamento sanitário e congêneres, tratamento e purificação de água que não podem ser objeto de ISS. Precedentes. Requisitos para a antecipação da tutela antecipada presentes. Depósito mensal dos valores em juízo autorizado. Agravo de Instrumento provido. (TJPR - 1ª C.Cível - 0047087-33.2020.8.16.0000 - Guarapuava - Rel.: DESEMBARGADOR SALVATORE ANTONIO ASTUTI - J. 15.06.2021). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ISS. SERVIÇOS DE TRATAMENTO DE ÁGUA, SANEAMENTO AMBIENTAL E ESGOTAMENTO SANITÁRIO. OBRAS HIDRÁULICAS E DE CONSTRUÇÃO CIVIL DE MELHORIA DO SISTEMA DE ESGOTO SANITÁRIO. PRESTAÇÃO POR CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. NÃO-INCIDÊNCIA DO IMPOSTO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LISTA ANEXA DA LEI COMPLEMENTAR Nº 116/03. INTELIGÊNCIA DO VETO PRESIDENCIAL RELATIVO AOS ITENS QUE PREVIAM TAIS SERVIÇOS. SENTENÇA MANTIDA. APELO NÃO PROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE ALTERADA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO, REALIZADO DE OFÍCIO .” (TJPR - 1ª Câmara Cível - 0005869-57.2021.8.16.0075 - Cornélio Procópio - Rel.: SUBSTITUTO EVERTON LUIZ PENTER CORREA- J. 29.08.2023) Assim, demonstrada está a probabilidade do direito diante do exposto acima, bem como pelo fato de que a legislação atual não permite a cobrança do ISS sobre serviços de saneamento, uma vez que os itens que previam essa tributação foram excluídos da lista de serviços tributáveis pela Lei Complementar 116/2003. Por fim, quanto ao perigo da demora, tem-se que, sem o deferimento da tutela (mesmo que parcial), a impetrante poderá ser compelida a realizar o pagamento do tributo e, não o fazendo, ser inscrita no cadastro de inadimplentes e ter negada a emissão de certidão negativa o que prejudicará o regular desenvolvimento de suas atividades. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. ISS SOBRE OBRAS DE SANEAMENTO. II - DECISÃO QUE NEGOU ACOLHIMENTO À EXCEÇÃO DE PRÉ- EXECUTIVIDADE, DETERMINANDO, POR CONSEQUÊNCIA, O PROSSEGUIMENTO DO EXECUTIVO FISCAL. III - OBRAS DE SANEAMENTO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LEI COMPLEMENTAR Nº116/2003. ITENS 7.14 E 7.15 DA LISTA ANEXA QUE DISPUNHAM DE TAL ATIVIDADE.INCIDÊNCIA DE VETO PRESIDENCIAL. OBJETO DO CONTRATO QUE FIRMAVA OBRAS NO SISTEMA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA DE APUCARANA, COMPREENDENDO O TRATAMENTO DE EFLUENTES DA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUA, COM FORNECIMENTO TOTAL DE MATERIAIS. IV - DECISÃO AGRAVADA QUE RECONHECEU A POSSIBILIDADE DE ANÁLISE DO PEDIDO DE NÃO INCIDÊNCIA DE ISS NA EXECUÇÃO DE OBRAS DE SANEAMENTO EM SEDE DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE, PORÉM ENTENDEU NÃO SER POSSIVEL A ANÁLISE DA OBJEÇÃO APRESENTADA QUANTO A NECESSIDADE DE DEDUÇÃO DOS MATERIAIS FORNECIDOS DA BASE DE CÁLCULO DO TRIBUTO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO ESPECÍFICA QUANTO A NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. V - EXECUÇÃO FISCAL EXTINTA DIANTE DA INEXIGIBILIDADE DO TRIBUTO. VI -RECURSO PROVIDO. (TJ-PR - AI: 15409995 PR 1540999-5 (Acórdão), Relator: Desembargador Jorge de Oliveira Vargas, Data de Julgamento: 27/11/2018, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 2398 05/12/2018)” A reversibilidade da medida também se encontra presente, visto que a qualquer momento a decisão pode ser revogada, possibilitando a cobrança do valor apurado. Ressalto desde já a ausência de prejuízos ao município, visto que os depósitos judiciais serão deferidos Portanto, tenho que deve ser deferido o pedido para que haja o depósito integral em dinheiro do tributo em Juízo, já que trata de direito subjetivo do contribuinte previsto no artigo 151, II, do CTN e na Súmula n. 112 do Superior Tribunal de Justiça, tendo o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário independentemente de manifestação deste Juízo. Suspensa a exigibilidade dos valores, é direito do contribuinte obter certidão positiva com efeitos de negativa para fins de demonstração da regularidade tributária. Por outro lado, é imperioso pontuar que não cabe o deferimento do pedido “40 III” nos moldes requeridos, por não figurar a Sanepar no polo passivo, sendo apenas oficiada acerca da presente decisão. 2.1. Dito isso, DEFIRO PARCIALMENTE a tutela de urgência a fim de: (i) autorizar o depósito mensal em conta judicial, vinculada aos presentes autos, dos valores retidos e pagos pela SANEPAR a título de ISS sobre os serviços a ela prestados por força do Contrato nº 63259/2025, incidentes sobre cada faturamento, suspendendo assim a exigibilidade de tais créditos; e (ii) como consequência, após realizados os depósitos mensais, determino que o Município de Virmond, relativos aos débitos vinculados ao Contrato nº 63259/2025, se abstenha de inscrever o nome da Impetrante em dívida ativa ou negue a obtenção de certidão positiva com efeito de negativa, em conformidade com o art. 206, do CTN, ou, ainda, que adote qualquer medida restritiva de direito em seu desfavor. 3. Expeça-se mandado ou intimação por eventual meio eletrônico hábil disponível, para cumprimento imediato da presente decisão liminar. 3.1. Notifique-se a autoridade coatora do conteúdo da petição inicial, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações que entender necessárias (art. 7º, I, da Lei 12.016/2009). 4. Dê-se ciência ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, nos termos do art. 7º, II, da Lei 12.016/2009, para que, querendo, ingresse no feito. 5. Intime-se o impetrante para se manifestar sobre as informações eventualmente juntadas pelo impetrado, em 5 dias. 6. Abra-se vista ao Ministério Público, por 10 dias. (Lei n. 12.016/2009, art. 12) 7. Comunique-se a SANEPAR, mediante ofício, para que tome ciência da presente decisão. 8. À Secretaria para que observe o contido no art. 11 da Lei n. 12.016/2009. 9. Por fim, conclusos para sentença. Intimações e diligências necessárias. Cantagalo, data da assinatura eletrônica. Felipe Buzanelo Ferreira Juiz Substituto

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Processo nº 1013275-70.2024.8.11.0003

ID: 261213954

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1013275-70.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

NYLVAN JOSE DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1013275-70.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1013275-70.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI Turma Julgadora: [DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), JOSE VITOR MELO DE OLIVEIRA - CPF: 061.598.881-45 (APELANTE), LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL - CPF: 021.382.461-24 (APELANTE), NYLVAN JOSE DA SILVA - CPF: 030.868.171-19 (ADVOGADO), MERENCIANA CONSTANTE DUARTE - CPF: 921.573.941-68 (TERCEIRO INTERESSADO), CLEONICE DIAS - CPF: 514.121.361-72 (TERCEIRO INTERESSADO), ELIANE AVELINO DOS ANJOS - CPF: 482.321.061-15 (TERCEIRO INTERESSADO), GIANINA GUIMARAES PEREIRA - CPF: 004.307.111-23 (TERCEIRO INTERESSADO), JONAS SANGALLI - CPF: 032.304.861-70 (TERCEIRO INTERESSADO), PEDRO CARDOSO DE SA FILHO - CPF: 557.428.071-04 (TERCEIRO INTERESSADO), JOSE VITOR MELO DE OLIVEIRA - CPF: 061.598.881-45 (APELADO), LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL - CPF: 021.382.461-24 (APELADO), NYLVAN JOSE DA SILVA - CPF: 030.868.171-19 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1013275-70.2024.8.11.0003 APELANTE: LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL, MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, JOSE VITOR MELO DE OLIVEIRA Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSOS DE APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL. MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO DE JOSÉ VITOR MELO DE OLIVEIRA POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. COMPENSAÇÃO INTEGRAL COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. CUSTAS PROCESSUAIS. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO, E APELO DE LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame: 1. Recursos de Apelação interpostos contra sentença que condenou Leila Daiane Rodrigues Vidal pela prática do crime de tráfico de drogas em estabelecimento prisional (art. 33, caput, c.c. art. 40, III, da Lei 11.343/2006) e absolveu José Vitor Melo de Oliveira, por ausência de provas de autoria. II. Questão em discussão: 2. Há três questões em discussão: (i) saber se é cabível a reforma da absolvição de José Vitor Melo de Oliveira, diante de indícios de que seria o destinatário da droga; (ii) saber se deve ser redimensionada a pena imposta a Leila Daiane, com compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência, além do reconhecimento da minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas e da substituição da pena privativa de liberdade; (iii) saber se é possível isentar a acusada do pagamento das custas processuais. III. Razões de decidir: 3. A absolvição de José Vitor Melo de Oliveira deve ser mantida, pois ausentes provas concretas de que tenha solicitado, encomendado ou tido domínio da droga apreendida, sendo a acusação baseada apenas em presunções. 4. A jurisprudência do STJ entende que a mera solicitação da droga, sem recebimento no interior do presídio, constitui ato preparatório, atípico penalmente. 5. Quanto à pena de Leila Daiane, é devida a compensação integral da confissão espontânea com a reincidência específica, nos termos da jurisprudência pacificada. 6. Inviável o reconhecimento da minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, diante da reincidência. 7. Também não cabe substituição da pena privativa de liberdade, haja vista a reprimenda superior a 4 anos e a reincidência da ré. 8. A isenção ou suspensão das custas processuais deve ser decidida pelo juízo da execução penal, nos termos da jurisprudência consolidada. IV. Dispositivo e tese: 9. Recurso ministerial desprovido e apelo defensivo parcialmente provido. Teses de julgamento: 1. “A mera solicitação de entorpecente por preso, sem o efetivo recebimento da droga no estabelecimento prisional, configura ato preparatório e, portanto, penalmente atípico.” 2. “É admissível a compensação integral entre a agravante da reincidência específica e a atenuante da confissão espontânea.” 3. “A análise sobre a possibilidade de isenção ou suspensão das custas processuais deve ser realizada no âmbito da execução penal, a depender da situação financeira do condenado.” _______ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LIV e LVII; CP, art. 61, I; Lei 11.343/2006, arts. 33, caput, § 4º, e 40, III. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, AgRg no HC n. 957.919/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 12/2/2025, DJEN de 17/2/2025; STJ, AgRg no HC n. 928.085/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 17/9/2024, DJe de 19/9/2024; TJMT, N.U 0048191-06.2019.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, WESLEY SANCHEZ LACERDA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 17/12/2024, Publicado no DJE 19/12/2024; TJMT, N.U 0008437-23.2020.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 15/10/2024, Publicado no DJE 18/10/2024; STJ, REsp n. 1.931.145/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 22/6/2022, DJe de 24/6/2022; STJ, HC n. 853.654/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 26/11/2024, DJEN de 11/12/2024. ESTADO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1013275-70.2024.8.11.0003 APELANTE: LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL, MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, JOSE VITOR MELO DE OLIVEIRA RELATÓRIO EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIRA PERRI Egrégia Câmara: Cuida-se de Recursos de Apelação Criminal aforados pelo Ministério Público Estadual e por Leila Daiane Rodrigues Vidal, buscando a reforma da sentença proferida pelo juízo da 5ª Vara Criminal de Rondonópolis, que condenou a segunda recorrente à reprimenda de 7 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão, no regime inicialmente fechado, e 500 dias-multa, pela prática do crime de tráfico de drogas [art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006], e que absolveu José Vitor Melo de Oliveira da prática do crime da mesma natureza, por não visualizar, em relação a ele, provas bastantes para condenação. A 1ª Promotoria de Justiça de Rondonópolis postula a condenação do corréu JOSÉ VITOR MELO DE OLIVEIRA pela prática do crime de tráfico de drogas [art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006], ao argumento de que ele, “reincidente específico, foi quem adquiriu os entorpecentes, e a corré, sua esposa, deslocou-se até o presídio com a droga para atender sua determinação”. A defesa de LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL, por sua vez, pleiteia a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, bem como o direito de recorrer em liberdade. Busca o reconhecimento da minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei Antidrogas, e a compensação integral da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência. Pede, por fim, a isenção das custas processuais. Os recorridos, em contrarrazões, rechaçaram os argumentos aduzidos pelas partes contrárias. A Procuradoria-Geral da Justiça, em parecer da lavra do Procurador de Justiça, Antonio Sergio Cordeiro Piedade, opina pelo provimento do recurso ministerial e pelo desprovimento do apelo defensivo. É o relatório. À douta revisão. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1013275-70.2024.8.11.0003 VOTO EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIDA PERRI (RELATOR) Egrégia Câmara: Os acusados, LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL e JOSÉ VITOR MELO DE OLIVEIRA, foram denunciados pela prática do crime de tráfico de drogas perpetrado em estabelecimento prisional [art. 33, caput, c.c. art. 40, inciso III, ambos da Lei n. 11.343/2006], consoante se extrai de excerto da exordial acusatória, verbis: “Consta dos autos do incluso inquérito policial que na data de 12/5/2024, por volta das 09h00min, na Penitenciária Major Eldo de Sá Correa ‘(Mata Grande)’, neste município e Comarca, agentes penitenciários flagraram LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL, que, em associação, concurso de vontades e esforços ilícitos com JOSÉ VITOR MELO DE OLIVEIRA, adquiriram, receberam, trouxeram e transportaram 3 (três) porções, pesando 1,158,91 kg (um quilo, cento e cinquenta e oito centigramas e noventa e um miligramas), e, 1 (uma) porção, com massa de 321,63 g (trezentos e vinte e um gramas e sessenta e três centigramas), que, após serem submetidas à perícia, constatou-se tratarem, respectivamente, de MACONHA (3 porções) e de COCAÍNA (1 porções), drogas alucinógenas capazes de determinarem dependência física e/ou psíquica sem autorização ou em desacordo com determinação legal e regulamentar, consoante positiva aos Laudos Periciais, fls. 26/32, ID 157701351 e ID 157701360. Colhe-se dos autos, outrossim, que a relevante quantidade da droga foi adquirida e se destinava a JOSÉ VITOR MELO DE OLIVEIRA, esposo de LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL, que se encontrava custodiado na referida unidade prisional. São dos autos que no dia e hora supracitados a denunciada, que visitaria o seu marido JOSÉ VITOR no mencionado ergástulo público, passou pelo scanner corporal, momento em que os policiais penais observaram um objeto em suas partes íntimas. Em seguida, a denunciada foi encaminhada à sala de revista para busca minuciosa, onde a mesma retirou, de dentro da calcinha, 1 (uma) porção de cocaína (321,63 g) e 1 (uma) outra de maconha (213,35 g), além de um invólucro contendo diversos papéis de seda, utilizados para embalar drogas (Termo de apreensão, fl. 7, ID 157701351). Logo, a denunciada informou que estava levando as drogas e o papel de sede a pedido de seu esposo JOSÉ VITOR. Diante disso, LEILA foi encaminhada à Delegacia de Polícia, onde foi lavrado o auto de prisão em flagrante delito em seu desfavor. Colhe-se que, no dia seguinte (13/5/2024), ao dar entrada na unidade prisional feminina, nesta cidade, a denunciada foi submetida a revista minuciosa, sendo que, após longo período negativa para retirar a sua roupa, LEILA resolveu retirar de seu corpo uma outra porção de maconha, com odor de urina, ao passo que os policiais apreenderam outra porção da mesma droga, também com odor de urina, na janela da sala de revista, que ali foi deixada por LEILA. Na oportunidade, a denunciada acrescentou que em outras oportunidades já havia introduzido drogas na Penitenciária ‘Mata Grande’, escondidas nas dobras de seu corpo, devido ao seu excesso de pele, e que foi a primeira vez que introduziu entorpecentes no referido estabelecimento prisional, escondidos em sua vagina, bem como que procurou se desfazer do restante da droga que não foi localizada pelos policiais, na 1ª Delegacia de Polícia, porém, assim não o fez, pois ‘observou que o buraco do boi (vaso sanitário) era muito pequeno, não cabia o entorpecente’. Interrogado sobre os fatos, JOÃO VITOR optou pelo silêncio. Por fim, JOÃO VITOR é reincidente específico, registar 1 (um) executivo de pena com uma condenação (Autos 2000014-97.2023.8.11.0086), por tráfico de drogas. Em Alto Araguaia/MT, 1 (um) inquérito policial pelos crimes, em tese, de ameaça e integrar organização criminosa (Autos 1000845-35.2024.8.11.0020). Em Nova Mutum/MT, registra 1 (uma) condenação provisória pelo crime de homicídio qualificado (Autos 1004460-34.2021.8.11.0086). LEILA, de sua vez, é reincidente específica, registrando 1 (um) executivo de pena com uma condenação pelo crime de tráfico de drogas (Autos 0005869-20.2018.8.11.0037)”. Encerrada a instrução processual, JOÃO VITOR MELO DE OLIVEIRA foi absolvido da prática do crime de tráfico de drogas, por não visualizar, em relação a ele, provas bastantes para condenação, verbis: “Por outro lado, no que tange ao denunciado José Vitor Melo de Oliveira, verifica-se que a autoria delitiva não restou devidamente comprovada. Examinando os autos, constato que a controvérsia reside na atribuição da qualidade de destinatário da droga ao acusado. No caso específico de Jose Vitor, a denúncia sustenta que ele seria o destinatário da droga apreendida, embora não tenha sido encontrado em sua posse direta no momento da apreensão. Contudo, a acusação baseia-se na presunção de que a droga estava destinada e havia sido encomendada e/ou adquirida por ele, derivada do contexto em que foi encontrada na posse de sua esposa durante visita na penitenciária onde ele estava recluso. Conforme mencionado, a acusação formulada pelo Ministério Público baseia-se em meras presunções e indícios. Não há nos autos prova contundente de que Jose Vitor tenha adquirido, solicitado, encomendado ou de qualquer forma participado da aquisição ou transporte da droga. A existência de um vínculo matrimonial entre Leila e Jose Vitor, por si só, não é suficiente para lastrear uma condenação criminal, que exige prova incontroversa da autoria delitiva. A presunção de que Jose Vitor seria o destinatário, derivada unicamente do vínculo familiar com a portadora da substância, não supre a necessidade de prova robusta e inequívoca que a legislação exige para a condenação criminal. Convém ressaltar que, na fase inquisitorial, a coacusada Leila isentou consistentemente Jose Vitor da situação, afirmando que a substância não estava destinada a ele (ID 157700089). Em Juízo, a ré conformou tal versão. As testemunhas não souberam informar se o réu havia solicitado o entorpecente apreendido. Nesse contexto, é importante ressaltar que a condenação criminal deve ser proveniente de elementos seguros, precisos e desprovidos de qualquer dúvida, situação que não se verifica na presente ação penal, em que as provas produzidas durante a instrução não comportam juízo valorativo inequívoco acerca da autoria delitiva e, como tais, não servem de fundamento para o decreto condenatório. Portanto, ainda que existam alguns indícios sobre a autoria delitiva, tais circunstâncias, por si sós, não autorizam o decreto condenatório, sendo imperioso aplicar-se ao caso o princípio do in dubio pro reo, em que a dúvida acerca do envolvimento do agente no crime investigado resulta no afastamento da conduta delitiva a ele atribuída. [...] Logo, resta inviabilizado qualquer juízo valorativo de autoria criminosa quanto ao acusado neste feito, razão pela qual entendo que, no presente caso, as provas são insuficientes para subsidiar o decreto condenatório, não resta alternativa senão o afastamento da atribuição da conduta de tráfico de drogas tipificada na exordial acusatória. [...] Contudo, não restou comprovada a prática da conduta atribuída a Jose Vitor Melo de Oliveira (a suposta ‘encomenda’ do entorpecente), uma vez que não há provas suficientes de que ele tenha efetivamente solicitado ou encomendado a droga, ou de que estava ciente do transporte realizado por Leila Daiane Rodrigues Vidal”. Conquanto assista razão à 1ª Promotoria de Justiça de Rondonópolis, ao asseverar que são fortes os indícios de que JOSÉ VITOR tenha solicitado à LEILA DAIANE, sua esposa, a aquisição das drogas e sua entrega no estabelecimento prisional onde se encontrava custodiado, não há provas cabais e irrefutáveis de sua participação na empreitada delituosa. Por mais que os policiais penais MERENCIANA CONSTANTE DUARTE e ODIRLEY FRANCISCO RODRIGUES DA SILVA tenham asseverado, na fase judicial, que as drogas seriam destinadas ao preso JOSÉ VITOR MELO DE OLIVEIRA, a jurisprudência do STJ “firmou-se no sentido de que a mera solicitação, sem a efetiva entrega do entorpecente ao destinatário no estabelecimento prisional, configura mero ato preparatório, sendo, portanto, impunível em razão da atipicidade da conduta”, razão pela qual “interceptada a droga antes da entrega ao paciente, não há como imputar-lhe qualquer ato descrito no art. 33, caput, da Lei de Drogas”[1]. Neste mesmíssimo sentido, cito outro precedente da Corte Cidadã, segundo o qual: “A mera solicitação, ausente a entrega efetiva da droga ao destinatário em estabelecimento prisional, caracteriza, no máximo, ato preparatório do delito de tráfico de entorpecentes. Assim, sendo impunível, não há que se falar em tipicidade da conduta, sendo imperiosa a manutenção da absolvição do agravado”[2]. A despeito da expressiva quantidade de droga apreendida, consistente em 1,158,91kg [um quilo, cento e cinquenta e oito gramas e noventa e um centigramas] de cocaína, e 321,63g [trezentos e vinte e um gramas e sessenta e três centigramas] de maconha, a [suposta] solicitação feita por JOSÉ VITOR se trata de ato meramente preparatório. Ainda que JOSÉ VITOR seja reincidente específico na prática do crime de tráfico, e que haja provas [frágeis] a indicar que ele seria o destinatário das drogas apreendidas, não há evidências concretas de que ele tenha arquitetado a anterior aquisição dos estupefacientes e a logística da entrega no interior da unidade prisional. Vale consignar que LEILA DAIANE, apesar de confessar a prática do tráfico, negou a participação de seu esposo, dizendo que não estava levando a droga a pedido dele ou em nome dele. Além disso, a Policial Penal ELIANE AVELINO, em juízo, afirmou não se lembrar se LEILA DAIANE teria dito que a droga seria destinada ao seu esposo. A Policial Penal MERENCIANA CONSTANTE declarou que LEILA DAIANE teria afirmado que a droga seria destinada para JOSÉ VITOR, porém, “em nenhum momento ouviu dizer que era a mando dele”. Já o Policial Penal PEDRO CARDOSO assinalou que “ela não especificou para quem seria entregue”. Do mesmo modo, o Policial Penal ODIRLEY RODRIGUES FRANCISCO destacou que “a ré disse que a droga seria destinada ao seu esposo, mas que não se recorda de ela ter dito que seu esposo tinha pedido ou encomendado o entorpecente”. Nesse diapasão, ainda que haja provas a demonstrar que a droga seria destinada a JOSÉ VITOR, não existem evidências concretas no sentido de que ele tenha sido o responsável por arquitetar de dentro da prisão a aquisição das drogas, tampouco a logística para ingresso no estabelecimento prisional onde se encontrava. Forte em tais razões, deve ser mantida a absolvição imposta pelo juízo de origem. Digo isso porque, conforme já decidiu esta Câmara Criminal, “a mera suposição de que seria o destinatário da droga apreendida não configura, por si só, unidade de desígnios ou domínio do fato, inexistindo elementos que comprovem a autoria”[3]. Some-se a isso que, inexistindo provas de que “o primeiro apelante tenha solicitado ou recebido a droga dentro do presídio. A sua conduta é considerada atípica, conforme entendimento do STJ”[4]. Assim, não procede a pretensão recursal deduzida pela 1ª Promotoria de Justiça Criminal de Rondonópolis. Passo à análise do recurso interposto pela defesa de LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL. A defesa formula os seguintes pedidos: 1) direito de recorrer em liberdade; 2) a preponderância da atenuante da confissão espontânea na dosimetria da pena; 3) o reconhecimento da minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006; 4) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos; e, 5) a isenção das custas processuais. O juízo de origem, acertadamente, negou à apelante o direito de recorrer em liberdade. Com efeito, além de responder todo o processo cautelarmente segregada, a prisão foi mantida para garantia da ordem pública, haja vista a reincidência específica da acusada. Por essa razão, imprescindível a manutenção da prisão preventiva, haja vista o risco concreto de reiteração da prática delitiva. No atinente à reforma da individualização da pena na segunda fase dosimétrica, procede a pretensão defensiva. Segundo se infere dos autos, o juízo sentenciante, de maneira escorreita, sopesou de modo desfavorável a quantidade e a natureza da droga apreendida [1,158,91g de maconha e 321,23g de cocaína], fixando a pena-base em 6 anos de reclusão. Na segunda fase, foi reconhecida a circunstância atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência específica. Contudo, ao invés de promover a compensação integral entre elas, o juízo de primeira instância reputou preponderante a agravante da reincidência, aumentando a pena-base à fração de 1/8, ficando a pena intermediária estabelecida em 6 anos e 9 meses de reclusão. A despeito do posicionamento adotado pelo juízo de origem, é assente o entendimento jurisprudencial no sentido de que: “Recurso especial desprovido. Acolhida a readequação da Tese n. 585/STJ, nos seguintes termos: É possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação integral da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência, seja ela específica ou não. Todavia, nos casos de multirreincidência, deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal, sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea, em estrito atendimento aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade”[5]. Destarte, deve ser promovida a compensação integral da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência, mesmo sendo ela específica[6], como sói ocorrer no caso em apreço. Conquanto a juíza sentenciante tenha fundamentado as razões de seu convencimento com base no teor contido no Enunciado Orientativo n. 41 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas, convém salientar que sua redação atual não mais prevê a hipótese de compensação parcial nos casos de reincidência específica, mas apenas e tão-somente quando se tratar de multirreincidência, o que verifica na hipótese vertente. Com base em tais premissas, redimensiono a reprimenda intermediária para 6 anos de reclusão. Em contrapartida, não procede o pleito de reconhecimento da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, haja vista a reincidência da apelante. Conservada a majorante prevista no art. 40, inciso III, da Lei Antidrogas, fica a pena da apelante definitivamente estabelecida em 7 [sete] anos de reclusão, razão pela qual não há falar em substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, conforme postulado pela combatente defesa, quer em razão do quantum da reprimenda imposta, quer pela reincidência da acusada. Por fim, no que tange à pretendida isenção das custas, certo é que compete ao juízo da execução penal analisar o pleito de suspensão da exigibilidade de sua obrigação. À vista do exposto, em dissonância do parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO ao recurso ministerial, e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo defensivo para redimensionar a reprimenda imposta à LEILA DAIANE RODRIGUES VIDAL, fixando-a em 7 anos de reclusão, conservada a pena pecuniária em 500 dias-multa, haja vista a inexistência de irresignação ministerial neste sentido, mantendo-se o regime fechado para início de seu cumprimento. Conservo inalterados os demais termos da sentença hostilizada. É como voto. [1] STJ, AgRg no HC n. 957.919/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 12/2/2025, DJEN de 17/2/2025. [2] STJ, AgRg no HC n. 928.085/SP, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 17/9/2024, DJe de 19/9/2024. [3] TJMT, N.U 0048191-06.2019.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, WESLEY SANCHEZ LACERDA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 17/12/2024, Publicado no DJE 19/12/2024. [4] TJMT, N.U 0008437-23.2020.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 15/10/2024, Publicado no DJE 18/10/2024. [5] STJ, REsp n. 1.931.145/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 22/6/2022, DJe de 24/6/2022. [6] STJ, HC n. 853.654/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 26/11/2024, DJEN de 11/12/2024. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025

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Processo nº 5051965-46.2025.8.13.0024

ID: 332731068

Tribunal: TJMG Órgão: 2ª Vara de Tóxicos, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Comarca de Belo Horizonte Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS Nº Processo: 5051965-46.2025.8.13.0024

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

THIAGO HENRIQUE DE ARAUJO FERNANDES

Intimação

Advogados:

PEDRO HENRIQUE PINTO SARAIVA

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Belo Horizonte / 2ª Vara de Tóxicos, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Comarca de Belo Horizonte… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Belo Horizonte / 2ª Vara de Tóxicos, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Comarca de Belo Horizonte RUA MATO GROSSO, 468, 7º pvto, SANTO AGOSTINHO, Belo Horizonte - MG - CEP: 30190-081 PROCESSO Nº: 5051965-46.2025.8.13.0024 CLASSE: [CRIMINAL] PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITÓXICOS (300) ASSUNTO: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: THIAGO HENRIQUE DE ARAUJO FERNANDES CPF: 139.386.706-57 e outros SENTENÇA Vistos etc. 1– RELATÓRIO: O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, por seu órgão de execução, denunciou THIAGO HENRIQUE DE ARAUJO FERNANDES, qualificado nos autos, como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 e ALERANDRO NUNES JARDIM, qualificado nos autos, como incurso nas sanções do art. 37 da Lei nº 11.343/06, porque, de acordo com a inicial acusatória: “Consta do incluso inquérito policial que, no dia 28/01/2025, por volta das 22h31min, na Rua Castro Alves com Estrada Borges, nesta cidade e Comarca, o denunciado THIAGO HENRIQUE DE ARAUJO FERNANDES, consciente e voluntariamente, após adquirir, mantinha sob guarda, visando fornecer a terceiros, 04 (quatro) buchas de maconha, pesando cerca de 15,10g (quinze gramas e dez centigramas); 03 (três) pedras de crack, pesando cerca de 2,10g (dois gramas e dez centigramas); 13 (treze) frascos de loló, pesando cerca de aproximadamente 130 mL; e, 25 (vinte e cinco) pinos de cocaína, pesando cerca de 39,50g (trinta e nove gramas e cinquenta centigramas), conforme laudos toxicológicos preliminares de Ids:10403377021, 10403377023, 10403377024 e 10403377026, bem como definitivos de IDs:10403377022, 10403377025, 10403377028, drogas essas que determinam dependência física ou psíquica, agindo sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Nas mesmas condições de tempo e lugar, o denunciado ALERANDRO NUNES JARDIM colaborou, como informante, com grupo ou associação destinado à prática do tráfico de drogas.’’. Narrou, minuciosamente, como os fatos se deram na denúncia, à qual me reporto, em razão do princípio da economia processual. O órgão acusatório pleiteou, também, a condenação dos denunciados em danos morais e materiais. Notificados, os acusados apresentaram defesa preliminar. A denúncia foi recebida em 11 de junho de 2025. Durante a instrução processual foram ouvidas testemunhas arroladas pelas partes e realizado o interrogatório dos réus. Em alegações finais, o Ministério Público requereu a condenação do acusado THIAGO nos termos da denúncia, nos termos da denúncia, bem como a absolvição do réu ALEJANDRO, com fundamento no artigo 386, inciso V, do Código de Processo Penal. A Defesa de ALERANDRO, por sua vez, requereu a absolvição do acusado sustentando, em síntese, que não há provas suficientes para a condenação, bem como pleiteou a concessão da gratuidade de justiça. Finalmente, a Defesa de THIAGO requereu a absolvição do acusado sustentando, em síntese, que não há provas suficientes para a condenação. Subsidiariamente, pleiteou a desclassificação da conduta para o delito disposto no art. 28 da Lei de Drogas ou, em caso de condenação por tráfico, a fixação da pena-base no mínimo legal; a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06; e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. É o relatório. Passo a decidir. 2 – FUNDAMENTAÇÃO: Trata-se de ação penal pública incondicionada, por meio da qual o representante do MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL atribui ao acusado THIAGO HENRIQUE DE ARAÚJO FERNANDES, qualificado nos autos, a prática do delito tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06 e ao acusado ALERANDRO NUNES JARDIM, qualificado nos autos, a prática do delito tipificado no art. 37 da Lei nº 11.343/2006. Não vislumbro nos autos a ocorrência do curso de qualquer prazo prescricional. Presentes os pressupostos processuais, as condições da ação e não havendo questões prévias a enfrentar, passo à análise do mérito. 2.1 – Do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06: A materialidade do crime encontra-se sobejamente demonstrada, em face da juntada do auto de apreensão, do boletim de ocorrência e dos laudos toxicológicos, dos quais consta que a substância entorpecente apreendida era capaz de causar dependência física ou psíquica. No que tange à autoria, tenho que restou comprovada, pelas razões que passo a expor. Por ocasião da lavratura do APFD, o acusado THIAGO negou a prática delitiva, alegando que foi abordado e preso enquanto caminhava em direção à residência; que o material ilícito arrecadado não era de sua propriedade; e que portava apenas dinheiro no momento da abordagem. Em juízo, o réu mudou sua versão, passando a narrar que estava na casa de sua tia, no Bairro Belmonte; que pegou um mototáxi na saída do bar para ir até a boca de fumo; que foi ao local para comprar droga, pois é viciado em maconha; que, ao chegar, desceu da moto e pagou ao rapaz R$ 7,00, sendo que tinha R$ 110,00 em dinheiro; que, logo em seguida, a polícia o abordou dizendo que estava traficando, sendo que tinha acabado de chegar ao local; que estava no local há menos de um minuto; que não foram encontradas drogas em sua posse, apenas seu telefone celular e o dinheiro que havia restado após pagar a corrida; que não conhece os policiais que o abordaram; que acredita ter sido abordado em razão de seus antecedentes criminais; que tem passagem por roubo, mas não participa mais do crime; que não conhece o outro acusado; que foi ao local comprar droga para uso; que não conhece a região e não é de Belo Horizonte; que mora em Contagem; que não conhece Belo Horizonte, apenas a região do endereço de sua tia. Por sua vez, ALERANDRO permaneceu em silêncio em juízo e, na fase administrativa, declarou que, na data dos fatos, estava nas proximidades do condomínio onde reside, ocasião em que comprou de um indivíduo desconhecido um telefone celular, pelo valor de R$ 100,00; que, após a compra, foi abordado e preso; que não estava participando do tráfico no local e nem trabalhando como olheiro do tráfico. De forma contrária, a testemunha João Batista Pinto Júnior, policial militar, disse que participou do monitoramento no dia dos fatos, em um local já conhecido pela prática de tráfico de drogas, onde já haviam sido realizadas diversas operações e prisões; que estavam em um ponto escuro a cerca de 50 metros do local da ação, de modo que os suspeitos não pudessem vê-los; que observaram dois indivíduos em pé na rua; que visualizaram a chegada de uma motocicleta, momento em que um dos suspeitos foi atrás de um muro próximo a uma lixeira, pegou algo no chão e entregou ao motociclista; que durante toda a observação manteve contato com o motorista da viatura; que, ao confirmarem a suspeita de tráfico, acionaram a viatura e conseguiram abordar os réus; que ambos os abordados possuíam passagens por crimes diversos; que, durante busca no local, atrás do muro onde o suspeito foi visto anteriormente, encontraram substâncias ilícitas; que na posse de THIAGO foi arrecadado um celular, mas não se recorda se havia dinheiro; que o outro suspeito permaneceu em pé observando a entrada da rua, para alertar sobre a presença policial; que o motorista da viatura viu esse segundo suspeito avisando os demais sobre a chegada da polícia; que o tráfico naquela região é frequentemente visto no local e tem certa organização, mas sem vínculo com grandes facções criminosas; que não conhecia os réus, nem os havia abordado antes; que o monitoramento durou cerca de 10 a 15 minutos; que não sabe o que o réu teria gritado ao avistar a viatura; que o local não era um beco, mas uma rua sem saída que dava em um campo de futebol desativado; que a observação foi feita de dentro desse campo; que a distância entre os dois suspeitos era de aproximadamente 10 metros; que não se recorda de ter visto os dois conversando durante o monitoramento; que o monitoramento foi feito a olho nu, sem binóculo, junto ao soldado Tiago Carrijo, a uma distância de aproximadamente 30 a 50 metros; que o muro onde o objeto foi buscado ficava a cerca de 5 a 10 metros dos suspeitos; que se recorda vagamente dos suspeitos e não consegue, atualmente, identificar características físicas de nenhum deles; que não observou outras movimentações no local além da motocicleta, embora outro militar possa ter visto; que a motocicleta não foi abordada e que, devido à escuridão, não pôde identificar o modelo; que não conseguiu ver o que era o objeto passado ao motociclista, apenas atestou que se tratava de algo pequeno; que a droga foi encontrada atrás do muro, dentro de uma sacola; que o muro não possui portão ou porta, sendo aberto e servindo apenas como divisão entre a rua e o descampado e sendo de fácil transposição. Em sede administrativa, a testemunha, que figurou como condutor do APFD, narrou os fatos com riqueza de detalhes, declarando que visualizou THIAGO abaixar-se atrás de um muro próximo a uma lixeira, pegar um objeto e repassar a um motociclista: “QUE, durante a realização de operação de incursão nos aglomerados que margeiam o Anel Rodoviário, a guarnição GTR deslocou-se até a Vila Mirtes, conhecida como Pica-Pau, local amplamente reconhecido no meio policial como ponto de comercialização de entorpecentes; QUE, de um local privilegiado, a guarnição GTR 35121 visualizou dois indivíduos em pé no meio da rua, sendo um deles trajando camisa branca e calça jeans, e o outro, blusa clara e bermuda; QUE, após alguns minutos de observação, uma motocicleta aproximou-se do local, momento em que o indivíduo de camisa branca e calça jeans abaixou-se atrás de um muro próximo a uma lixeira, pegou um objeto e entregou ao motociclista, que então se retirou rapidamente; QUE tal atitude é típica da prática de tráfico de drogas; QUE, durante toda a ação, o outro indivíduo suspeito mantinha-se atento à entrada da rua, característica comum de olheiros, que têm a função de avisar sobre a presença policial; QUE, diante da atitude suspeita, foi realizada a abordagem dos indivíduos e, durante as buscas no local, atrás do muro, a guarnição localizou uma sacola contendo 25 pinos com substância semelhante à cocaína, 13 frascos contendo substância semelhante ao loló, 4 buchas de substância semelhante à maconha e 3 invólucros contendo substância semelhante ao crack; QUE, durante a abordagem, o indivíduo trajando camisa branca e calça jeans foi identificado como THIAGO HENRIQUE DE ARAÚJO FERNANDES, com quem foram encontrados R$ 103,00 em notas trocadas e um telefone celular, sendo que THIAGO possui passagens por homicídio, roubo, furto e associação ao tráfico; QUE o segundo indivíduo, trajando blusa clara e bermuda, foi identificado como ALERANDRO NUNES JARDIM, com quem foi encontrado um telefone celular, sendo que ALERANDRO possui passagens por tráfico e roubo; QUE, diante dos fatos e do flagrante presenciado, foi dada voz de prisão aos autores e ambos conduzidos à delegacia de polícia.” Da mesma forma, o militar Tiago Carrijo Pereira narrou que participou do monitoramento no dia dos fatos, junto de outros policiais, observando movimentação suspeita envolvendo dois indivíduos; que um dos indivíduos agia como olheiro, observando o entorno, enquanto o outro se dirigia até um local próximo ao muro para buscar algo dentro de uma sacola e entregar a transeuntes em troca de dinheiro; que, juntamente do sargento Júnior, se aproximou e efetuou a abordagem dos suspeitos; que o Cabo Nunes foi até onde um dos indivíduos costumava buscar os entorpecentes e localizou a sacola com as substâncias ilícitas; que, na posse de THIAGO, foi encontrada uma quantia em dinheiro, fracionada, totalizando pouco mais de cem reais; que THIAGO realizava a troca de objetos com terceiros, enquanto o outro indivíduo agia como olheiro, observando o movimento e possíveis viaturas; que o Cabo Nunes participou das diligências e do monitoramento, sendo que estava na viatura; que não ouviu gritos durante o monitoramento ou a abordagem; que estavam cerca de 45 a 50 metros do local durante o monitoramento, próximos da viatura; que não se recorda exatamente do tempo de duração do monitoramento; que a movimentação no local era mediana, tendo observado a chegada de uma motocicleta e de algumas pessoas a pé; que não se recorda da fisionomia dos réus e não é capaz de identificá-los atualmente; que o monitoramento foi feito a olho nu; que o muro em questão era de um lote vago, sem portão, permitindo acesso pela lateral; que não sabe exatamente onde a droga foi encontrada, sendo o Cabo Nunes quem a localizou atrás do muro; que viu THIAGO indo até a parte de trás do muro durante o monitoramento; que o outro réu agia como olheiro; que não se recorda da fisionomia de THIAGO, nem das roupas usadas por ele no dia; que os dois suspeitos não estavam lado a lado durante o monitoramento, pois o olheiro geralmente se posiciona afastado de quem realiza a venda; que não viu os dois conversando durante o monitoramento; que foi encontrada uma quantia em dinheiro durante a busca pessoal; que não se recorda exatamente da posição dos réus no momento da abordagem, apenas que estavam na rua. Por fim, a testemunha Bruno Nunes Vieira afirmou que o local dos fatos é conhecido no meio policial pela prática de tráfico de drogas; que montaram uma operação para prender os envolvidos; que participou do monitoramento e observou movimentação de motos, carros e pedestres entrando na rua sem saída, entregando dinheiro aos indivíduos e recebendo drogas em troca; que visualizou a troca de dinheiro por droga, mas não sabe precisar qual dos dois indivíduos realizava cada ato; que, ao chegarem ao local, os dois indivíduos estavam encostados em um muro e, atrás desse muro, foi localizada uma sacola com drogas, sendo que com um deles havia dinheiro; que ouviu um dos indivíduos gritar quando a viatura estava chegando, mas não conseguiu identificar qual deles gritou; que não visualizou os indivíduos indo até o local onde a droga foi encontrada; que se aproximou do local com a viatura; que era motorista da guarnição até março daquele ano e acredita que participou do monitoramento na ocasião dos fatos; que estavam presentes no monitoramento o soldado Carrijo e o sargento Júnior; que não se recorda do tempo de duração do monitoramento; que prefere não revelar detalhes sobre o método de monitoramento para não comprometer futuras operações; que estima que estavam a cerca de 50 metros do local dos fatos; que foram os próprios policiais da guarnição que realizaram a abordagem, sem apoio de outra equipe; que foi o responsável por arrecadar a droga atrás do murou; que durante o monitoramento observou que os dois indivíduos estavam próximos, um ao lado do outro, e que, à chegada de usuários, repassavam a droga e recebiam o dinheiro, mas não se lembra de quem fazia cada papel; que viu mais de dez pessoas realizando essa movimentação no local; que não consegue atualmente identificar os indivíduos pela fisionomia; que não se recorda de ter abordado algum usuário, apenas os dois suspeitos; que atrás do muro existe um campo de futebol e é possível chegar ao local apenas caminhando cerca de dez passos; que não se recorda de quem realizou a busca pessoal; que se recorda de ter ordenado que os dois colocassem a mão na cabeça e de ter ido atrás do muro, onde encontrou a sacola com droga; e que não se recorda das roupas usadas pelos suspeitos no dia dos fatos. Para a caracterização do delito previsto no artigo 33 da Lei nº 11.343, de 2006, desnecessário se faz seja o infrator colhido no próprio ato da venda da mercadoria proibida. O crime de tráfico de drogas se consuma, diante de mera conduta, com a prática de várias ações distintas, tratando-se de crime de ação múltipla e alternativa, todas previstas no art. 33 da Lei 11.343/06, dentre elas ter em depósito, trazer consigo, guardar, fornecer ainda que gratuitamente, substâncias entorpecentes, que não sejam para consumo pessoal. O dolo do agente se configura frente a critérios circunstanciais durante a ocorrência do crime, tais como a quantidade de droga apreendida, a forma de acondicionamento da mesma, os tipos de droga apreendida, as circunstâncias em que a substância entorpecente foi arrecadada, além de outros objetos ou dinheiro que tudo indica terem sido recebidos pela prática da traficância, podendo inferir, neste contexto, que a substância entorpecente seria utilizada para fins de tráfico. Sabe-se que o fato de a testemunha ser policial não invalida o depoimento, não torna a testemunha impedida ou suspeita, podendo constituir-se em elemento suficiente para formar o convencimento do julgador. De fato, a palavra firme e coerente de policiais militares é reconhecidamente dotada de valor probante, prestando-se à comprovação dos fatos narrados na denúncia sempre que isenta de qualquer suspeita e em harmonia com o conjunto probatório apresentado. In casu, a Defesa não produziu provas capazes de desmerecer os relatos dos policiais militares, cujos depoimentos, firmes e coesos, demonstram que o réu THIAGO, em local já conhecido pela mercancia ilícita de entorpecentes, foi visualizado dirigindo-se à parte posterior de um muro, de onde retirava objetos e os entregava a terceiros, recebendo algo em troca, conduta compatível com a dinâmica do tráfico. No exato local apontado pela conduta observada, as testemunhas relataram que foi localizada uma sacola contendo substâncias entorpecentes de diferentes espécies e, em poder do acusado, apreendida quantia em dinheiro trocado, circunstâncias que, em conjunto, confirmam sua participação ativa na comercialização de drogas na região, ainda que os entorpecentes não estivessem diretamente em sua posse. Todos os policiais também afirmaram que a área onde se deu a abordagem é reconhecida como ponto de tráfico, sendo constantemente monitorada por guarnições, o que reforça a credibilidade dos relatos, especialmente diante da coerência entre o comportamento atribuído ao réu, a apreensão da droga no exato local apontado e o dinheiro fracionado encontrado com ele. De outro lado, a versão apresentada pelo acusado em juízo, no sentido de que estaria no local apenas para adquirir drogas para consumo próprio, não encontra respaldo em nenhum outro elemento dos autos, destoando, inclusive, da narrativa inicialmente oferecida na fase policial, ocasião em que sequer reconheceu a proximidade com o ponto de tráfico, circunstância que compromete a verossimilhança de sua tese. Assim, em face da inexistência de excludentes de tipicidade, ilicitude ou culpabilidade, o caso é de condenação do réu THIAGO pelo crime descrito no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, não prosperando, por conseguinte, as teses defensivas em sentido contrário. 2.2. Do crime previsto no art. 37 da Lei nº 11.343/06: O crime previsto no artigo 37 da Lei nº 11.343/06 pressupõe a existência de um grupo, organização ou associação criminosa voltada à prática do crime de tráfico de droga. Ainda que dispensável a identificação dos envolvidos, entendo como necessário para a caracterização do crime ora em análise a demonstração de que o agente, de fato, colaborava com grupo, associação ou organização criminosa, o que não restou demonstrado no caso concreto. Conforme os depoimentos constantes do APFD e das oitivas em juízo, os policiais relataram que o réu ALERANDRO estaria posicionado na entrada da rua, em atitude considerada suspeita, supostamente atuando como olheiro, tendo sido mencionado, de forma genérica, que ele teria gritado algo no momento da aproximação da guarnição. Entretanto, nenhum dos policiais soube apontar, com segurança, o conteúdo do grito ou sua autoria, tampouco descrever qualquer conduta concreta do réu que caracterizasse efetiva colaboração com a traficância. Apenas um dos militares mencionou ter ouvido gritos anunciando a chegada da polícia, sem identificar o autor, enquanto os demais negaram ter presenciado qualquer anúncio semelhante, o que motivou, inclusive, o pedido de absolvição formulado pelo Ministério Público. Dessa forma, ausentes provas seguras de que o acusado tenha colaborado com grupo ou organização criminosa, impõe-se a absolvição de ALERANDRO quanto ao delito descrito no art. 37 da Lei nº 11.343/06, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. 3 – DISPOSITIVO: Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido contido na denúncia, para o fim de CONDENAR o acusado, THIAGO HENRIQUE DE ARAÚJO FERNANDES, nos termos do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, e ABSOLVER o acusado ALERANDRO NUNES JARDIM, da imputação de prática do crime previsto no art. 37 da Lei nº 11.343/06, com base no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Em consequência, para fins de individualização da pena, em obediência ao preceito constitucional insculpido no art. 5º, XLVI, passo à dosimetria, observando-se as diretrizes do artigo 68, caput, do CP e, ainda, a sistemática especial traçada pelos arts. 42 e 43 da Lei nº 11.343/2006. Analisando as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal e do art. 42 da Lei de Drogas, verifica-se que foi apreendida considerável quantidade de drogas na posse do acusado, de natureza variada e especial (39,5g de cocaína, 15,1g de maconha, 2,1g de crack e 130mL de loló), razão pela qual tenho como desfavorável a presente circunstância. A culpabilidade do acusado é reprovável, mas normal à espécie, pois inserida no próprio tipo, não podendo ser considerada desfavorável. O acusado possui máculas em seus antecedentes criminais, ante a existência de duas condenações por fatos anteriores, conforme CAC juntada aos autos (ID 10405859271, fls. 29/34). Assim, a presente circunstância é desfavorável, utilizando, para tanto, a condenação proferida na ação penal nº 0000944-08.2017.8.13.0474. Não há elementos que possibilitem averiguar a conduta social do denunciado, razão pela qual não pode ser tida em seu desfavor. Não existem informações suficientes à aferição da personalidade do agente, razão pela qual deixo de valorá-la. O motivo do delito constituiu-se pelo desejo de obter lucro fácil, o qual já é punido pela própria tipicidade e previsão do delito, de acordo com a própria objetividade jurídica do crime de tráfico ilícito de entorpecentes. Verifico que o crime foi cometido em circunstâncias normais, pelo que não se pode considerá-las desfavoráveis ao acusado. As consequências do crime não ultrapassam as inerentes ao tipo realizado. Não há que se falar em influência do comportamento da vítima para a prática do delito, uma vez que é a própria coletividade o sujeito passivo do crime em questão. Considerando a análise das circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 06 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. Na segunda fase, não concorrem circunstâncias atenuantes. Incide, de outro lado, a agravante da reincidência (art. 61, inciso I, do CP), relativa à condenação proferida nos autos da ação penal nº nº 0005869-47.2017.8.13.0474, conforme se extrai da CAC de ID 10405859271 (fls. 29/34). Assim, elevo em 1/6 a pena dosada na fase anterior e fixo a pena intermediária em 07 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa. Na terceira fase, inexistem causas de diminuição de pena, tampouco a inscrita no § 4º do art. 33 da Lei nº 1.343/06, considerando a reincidência e os maus antecedentes do acusado, o que é bastante para negar o privilégio. Assim, fixo a sanção definitiva em 07 (SETE) ANOS DE RECLUSÃO E 700 (SETECENTOS) DIAS-MULTA, ante a ausência de majorantes. À míngua de outros elementos acerca das condições financeiras do denunciado, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo (1/30) do salário-mínimo vigente na época do fato, devidamente atualizado nos moldes do art. 49, § 2º, do Código Penal. Com base no artigo 33, §§ 2º e 3º, c/c o artigo 59, ambos do Código Penal, o réu deverá iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime FECHADO, em razão do quantum de pena aplicado, das circunstâncias judiciais desfavoráveis e de sua reincidência. Deixo de conceder ao acusado a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, bem como a suspensão condicional da pena, já que ausentes os requisitos dos arts. 44 e 77 do Código Penal. Comandos finais Condeno o réu THIAGO ao pagamento de custas, nos termos do art. 804 do CPP. Nego ao acusado THIAGO o direito de recorrer em liberdade, tendo em vista a pena fixada na presente decisão, o regime inicial do cumprimento da reprimenda, bem como a subsistência dos requisitos que justificaram a decretação da prisão cautelar. Assim, independentemente do trânsito em julgado, com fundamento no verbete da Súmula nº 716 do Supremo Tribunal Federal, determino a expedição de carta de guia para a execução provisória da pena, a ser remetida ao juízo competente da Vara de Execuções Penais. Recomende-se o réu na prisão em que se encontra. Como consequência da absolvição do réu ALERANDRO, com base no art. 316 do CPP, REVOGO a prisão preventiva. Expeça-se alvará de soltura clausulado. Quanto às substâncias entorpecentes apreendidas, determino a incineração, que somente poderá ser realizada após lavratura do auto de levantamento das condições encontradas, com a delimitação do local, a ser efetuada pela autoridade policial responsável pela apreensão. Com fundamento nos arts. 62 e 63 Lei 11.343/06, decreto o perdimento do valor em dinheiro apreendido em favor da União. A quantia deverá ser destinada ao FUNAD – Fundo Nacional Antidrogas. Cumpra a Secretaria as diligências de praxe. Se necessário, comunique-se à Autoridade Policial para atender alguma providência a seu cargo. No que se refere aos celulares apreendidos, impõe-se a devolução destes aos acusados, uma vez que não serviram ao crime nem tampouco restou comprovada eventual origem ilícita (art. 91 do CP). Comunique-se à Autoridade Policial para as providências cabíveis. Decorrido o prazo, sem a apresentação do réu, destrua-se o aparelho de telefone celular, mediante lavratura do respectivo termo. Intimem-se pessoalmente o Ministério Público, os réus e a Defensoria Pública. A intimação do defensor constituído pelo denunciado THIAGO deverá ser feita por publicação, na forma do art. 392 do CPP. Após o trânsito em julgado: a) oficie-se ao Cartório Eleitoral, para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição da República; b) lance-se o nome do réu THIAGO no rol de culpados; c) faça a Sra. Escrivã as comunicações e anotações de praxe, inclusive ao Instituto de Identificação do Estado; d) expeça-se guia definitiva de execução de pena; e e) oficie-se à SENAD, para fins do artigo 63, parágrafo 4º, da Lei nº 11.343/2006. Cumpridas as determinações supra, arquive-se o feito, mediante prévia baixa no sistema. P.I.C. Belo Horizonte, data da assinatura eletrônica. GENOLE SANTOS DE MOURA Juiz(íza) de Direito 2ª Vara de Tóxicos, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Comarca de Belo Horizonte

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Ministério Público Do Estado Do Paraná x Luiz Carlos Milani Junior

ID: 280303187

Tribunal: TJPR Órgão: 3ª Vara Criminal de Curitiba Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0002126-59.2024.8.16.0196

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

MINISTéRIO PúBLICO DO ESTADO DO PARANá

Polo Passivo:

LUIZ CARLOS MILANI JUNIOR

Conclusão

Advogados:

RODOLPHO MUSSEL DE MACEDO

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PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 1 Vistos e examinados estes autos de Processo Crime, registrados sob o nº 0002126… PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 1 Vistos e examinados estes autos de Processo Crime, registrados sob o nº 0002126-59.2024.8.16.0196, em que é autor o MINISTÉRIO PÚBLICO e réu LUIZ CARLOS MILANI JUNIOR. I. RELATÓRIO LUIZ CARLOS MILANI JUNIOR, já qualificado nos autos em epígrafe, foi denunciado pela representante do Ministério Público por infração ao artigo 2º-A, da Lei nº 7.716/89 em razão da prática dos fatos delituosos descrito na denúncia de mov. 45.1. Oferecida a denúncia (mov. 45.1), esta foi recebida (mov. 55.1), oportunidade em que foi determinada a citação do réu para apresentação de resposta à acusação. Em seguida, o acusado foi devidamente citado (mov. 82.1) e apresentou resposta à acusação, por intermédio da Defensoria Pública (mov. 87.1). Posteriormente, em decisão proferida junto ao movimento 90.1, afastadas as possibilidades de absolvição imediata previstas no artigo 397 do CPP, foi mantido o recebimento da denúncia e agendada audiência de instrução. No decorrer da audiência de instrução, foi ouvida a vítima, três testemunhas e realizado o interrogatório do réu. Na fase do artigo 402, do CPP, a defesa requereu prazo para a juntada de documentos (movs. 125.1 e 126.1). Subsequente, a documentação defensiva foi juntada no mov. 128.PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 2 Nas alegações finais, o Ministério Público pugnou pela improcedência da pretensão punitiva deduzida na exordial acusatória, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, ante a insuficiência de elementos probatórios aptos a amparar um decreto condenatório, bem como pela ausência de dolo específico na conduta do acusado, evidenciando-se um contexto de provocações mútuas (mov. 132.1). A defesa, por meio das alegações finais constantes no mov. 136.1, requereu a absolvição do réu, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, ao argumento de que a conduta é atípica, diante da ausência de dolo específico necessário à configuração do delito imputado. É o relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO O acusado foi denunciado pela suposta prática do crime previsto no art. 2º-A da Lei nº 7.716/89, consistente em injúria racial, por ter, segundo a inicial acusatória, proferido ofensas de cunho discriminatório contra a vítima Maria José Santos Costa, utilizando expressões como “preta”, “macaca” e “fedida”, com o intuito de ofender sua dignidade em razão da cor da pele. Compulsando os autos, e uma vez encerrada a instrução criminal, após a devida apuração e valoração das provas, concluo que não restaram demonstrados elementos probatórios mínimos que assegurem a certeza necessária e suficiente à prolação de um decreto condenatório em face do acusado, conforme bem pontuado tanto pelo Ministério Público, quanto pela defesa. Em primeiro plano, perpasso ao exame da prova oral colhida em Juízo. Ei-la, pois:PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 3 Inicialmente, MARIA JOSÉ SANTOS COSTA, vítima, ouvida na condição de informante, relatou que estava em sua residência quando sua filha se dirigiu à sacada para pedir um lanche e, naquele momento, encontrava-se ao telefone com sua irmã, sendo que ambas riam durante a ligação. Em seguida, o acusado chegou de carro acompanhado da esposa e, ao descer do veículo, percebeu que a filha da declarante estava ao telefone com sua outra filha, o que teria ocorrido antes de sua chegada ao local. Nesse momento, Luiz discutia com sua esposa, que, ao olhar para cima e avistar a filha da declarante na sacada, disse: “Para de fazer isso comigo, pois os vizinhos ficam dando risada do que você está fazendo.” Informou que o acusado passou a dirigir ofensas à sua filha, proferindo xingamentos. Diante disso, aproximou-se para entender o que estava acontecendo, constatando que o acusado estava insultando sua filha, que reagia verbalmente. Afirmou então que saiu de sua casa para tentar conter a situação, ordenando que a filha entrasse. No entanto, ela respondeu: “Não, mãe, eu já estava aqui antes dele chegar. Não vou sair daqui”, apesar de sua insistência. Nesse instante, o réu disse: “Vai, obedeça a sua mãe, sua gorda”, ao que respondeu: “Cala a boca, seu idiota.” Após isso, Luiz continuou a proferir ofensas, dizendo: “o que você está falando aí sua preta, encardida, sua preta, macaca, fedida”. Relatou que revidou, xingando o réu, ocasião em que ele respondeu: “Você quer que eu vá aí te quebrar?”. Em seguida, o acusado dirigiu-se até a sacada da residência da declarante, onde havia um bloco de tijolo na área. Nesse momento, ela o advertiu, dizendo: “ Você não vem, porque se você pular aqui para dentro, não vai dar certo”. Logo depois, Luiz se pendurou na varanda com a intenção de pular. Informou que sua filha, ao perceber a situação, arremessou um tijolo no acusado, que caiu da varanda. Afirmou que, após a queda do acusado, a esposa dele passou a arremessar pedras contra ela e sua filha, motivo pelo qual ambas também revidaram, lançando pedradas. Mencionou que é vizinha do réu. Informou que reside com sua filha de 20 anos e maisPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 4 dois netos bebês. Destacou que, sempre que o acusado a vê na rua, passa a imitá-la com sons e gestos de macaco, e, em relação à sua filha, faz sinais como se estivesse com ânsia de vômito. Disse, ainda, que alguns vizinhos lhe orientaram a gravar tais atitudes sempre que presenciasse o acusado agindo dessa forma, porém ressaltou que nem sempre está com o celular em mãos para realizar as gravações. Alegou que não permanece mais no local, tendo sua filha se mudado recentemente, em razão do desconforto e do desgaste emocional causados pela situação. Declarou que ambas passaram a residir em outra rua e que não mantêm mais qualquer contato com o réu. Alegou que os fatos ocorreram na presença de diversos vizinhos, tendo um deles, inclusive, comentado que chegou a pensar que o acusado realmente invadiria o imóvel. Relatou, ainda, que, naquele dia, o proprietário da residência, José (a quem pagava o aluguel), desceu para conversar com o acusado, porém este se mostrou bastante agressivo. Informou que recebeu uma ligação da mãe do réu, a qual lhe pediu que retirasse a queixa. Relatou que respondeu negativamente, afirmando que estava agindo em defesa da filha, pois, caso uma das pedras lançadas atingisse algum de seus netos, as consequências poderiam ter sido graves. Acrescentou ainda que, diante disso, a mãe do réu declarou: “Você não sabe com quem está se metendo” . Ao ser questionada se procurou a Delegacia em razão dos novos acontecimentos, respondeu que não o fez. Indagada se, no momento dos fatos, teve conhecimento de todo o conteúdo da discussão entre o acusado e sua filha, afirmou que sim, tendo ouvido todas as ofensas proferidas por ele. Relatou que ouviu o réu e sua filha trocando xingamentos mutuamente, e que, durante a discussão, Luiz chegou a arremessar um chinelo, o qual foi devolvido por sua filha. Mencionou que o acusado chegou a dizer à sua filha que ninguém a queria, pois, segundo ele, “suas partes íntimas eram fedidas”, e que seus dentes eram tão feios que, se ela quisesse, ele mesmo faria um Pix para que colocasse um aparelho. Relatou que sua filha disse ao réu com palavras ofensivas,PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 5 chamando-o de “bêbado”, “drogado”, “idiota”, “retardado” e expressões semelhantes. Ao ser questionada se já havia tido discussões anteriores com o acusado, informou que não, pois nem o conhecia, acrescentando que ele era recém-chegado ao condomínio. Ao final, informou não conhecer a testemunha Madeleine. Em seguida, RAÍSSA SANTOS COSTA, testemunha, ouvida na condição de informante, relatou que a discussão do réu com sua mãe teve início por sua causa, esclarecendo que, inicialmente, foi o acusado quem começou a ofendê-la. Informou que, em seguida, o marido de sua mãe percebeu a situação e comentou: “Olha, acho que a Raíssa está discutindo lá na sacada”, momento em que sua mãe foi até a varanda e pediu que cessasse a discussão com o réu. Mencionou que nunca havia brigado anteriormente com Luiz, tampouco tiveram qualquer desentendimento. Declarou ainda não saber se o acusado proferiu as ofensas por estar alterado, visto que, à época, discutia com a própria esposa. Acrescentou que foi a esposa do réu quem afirmou que ela estaria “fazendo chacota” dela. Afirmou ter presenciado todas as ofensas proferidas por Luiz à sua genitora. Ao ser questionada se, após os referidos fatos, o acusado voltou a proferir xingamentos contra sua mãe, afirmou que não, esclarecendo que ele passou a direcionar as ofensas apenas a ela. Acrescentou que não mantém qualquer tipo de contato com o réu, sobretudo porque ambas já se mudaram da residência onde os fatos ocorreram. Declarou que os fatos ocorreram na presença de alguns vizinhos. Informou que a briga teve início por conta da esposa do réu, que, segundo ela, alegou que a declarante estava rindo dela, apenas porque o réu a estava ofendendo. Relatou que, em seguida, o acusado se aproximou e, de maneira agressiva, perguntou: "O que você está rindo de mim e da minha mulher, sua vagabunda? Desce aqui que você vai ver o que vai acontecer." Ressaltou que foi o acusado quem começou a ofendê-la, como se estivesse rindo da esposa dele, mas afirmou que isso não era verdade,PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 6 pois já estava na sacada antes deles chegarem. Explicou que a briga deles teve início porque a esposa do réu havia perdido a chave, o que a impediu de entrar. Nesse momento, Luiz começou a falar de forma agressiva, dizendo que iria agredi-la, e a esposa de Luiz pediu para ele parar, pois os vizinhos estavam rindo. Foi nesse momento que o réu começou a ofendê-la. Acredita que a raiva acumulada pela discussão entre o acusado e sua esposa se juntou e ele quis descontar na declarante. Declarou que revidou as ofensas quando o acusado a chamou de vagabunda, respondendo que ela não era mulher dele e que, com ela, ele não se "crescia" ao ponto de ficar a xingando. Em seguida, o acusado disse: “Desce aí então que eu faço você virar mulher. E se você não descer, eu subo.” Ao que respondeu: “Então pode subir, porque eu não vou descer.” A partir daí, começaram as trocas de ofensas entre ela e o réu. Ele, então, subiu na grade do portão da casa dele, que fica ao lado da sua residência, e disse que iria subir. Foi nesse momento que Luiz subiu também, e quando o acusado começou a colocar o pé para cima da sacada, pegou um bloco que estava ali por perto e disse: “Se você subir aqui na minha casa eu vou tacar em você”. Relatou que, no momento em que o acusado colocou a mão na sacada, ela arremessou o bloco na direção dele. Afirmou que o tijolo não acertou a cabeça do acusado, mas sim suas costas, e que, após o ocorrido, ele passou a ofender sua mãe. Informou que, a partir desse momento, o réu passou a ofender sua mãe, que, diante das agressões verbais, mandou-o calar a boca, e foi nesse momento que ele proferiu ofensas racistas contra a sua mãe. Afirmou que o réu repetia insistentemente a expressão “sua preta, sua macaca” ao se dirigir a sua mãe. Ao final, disse que os policiais chegaram depois dos fatos. Na sequência, CESAR AUGUSTO PINHEIRO JUSTINIANO JUNIOR, policial militar, relatou que se lembrava dos fatos. Informou que a equipe foi acionada devido a uma ocorrência de lesão corporal, decorrente de uma briga entre vizinhos. Ao chegarem ao local,PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 7 a vítima relatou que havia sido xingada com vários nomes, os quais não recordava no momento, e afirmou ter sido vítima de injúria racial, com o autor sendo seu vizinho, que estava alterado e havia se mudado recentemente para a região. Informou, ainda, que o autor não estava presente no local, mas, cerca de cinco minutos depois, enquanto a equipe conversava com a vítima, o acusado apareceu no carro, bastante danificado, acompanhado de sua esposa, e estava visivelmente alterado. Declarou que o réu não confessou o delito, apenas negou e se comportou de maneira debochada, refutando a acusação de injúria racial. Afirmou, ainda, que, ao chegarem ao local, não encontraram mais ninguém, exceto a esposa do réu e uma parente da vítima. Quando questionado se conhecia o acusado anteriormente, respondeu que não, afirmando ter conhecido o réu no dia dos fatos, em razão da ocorrência. Informou também que, aproximadamente um mês depois, houve uma nova ocorrência envolvendo o mesmo réu. Indagado se o acusado e sua esposa estavam embriagados, afirmou que sim, que ambos estavam bastante alterados. Mencionou que o para-brisa do veículo estava quebrado, mas não se recorda se o dano ocorreu durante a briga com a vizinha ou se a filha da ofendida havia lançado algo. Subsequente, MADELAINE EDUARDA DA CRUZ SARAIVA BARBOSA, ouvida na qualidade de informante, informou ser esposa do réu. Relatou que presenciou os fatos e que, ao chegarem em casa, ela e Luiz estacionaram o veículo em frente à residência. Contou que estavam juntos procurando a chave da casa, mas não a encontravam, motivo pelo qual começaram a retirar objetos do carro na tentativa de localizá-la. Afirmou que, diante da frustração, ambos ficaram nervosos e estressados. Nesse momento, Raíssa, que estava na sacada de sua residência — vizinha a deles —, começou a debochar da situação, rindo e fazendo piadas sobre a dificuldade do casal em encontrar a chave. Disseram que tentaram ignorar, mas, passados cerca de cinco a dez minutos, Raíssa não cessou os deboches. Informou quePODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 8 questionou Raíssa sobre o motivo das risadas, momento em que esta passou a proferir xingamentos contra ela e seu marido. Em resposta, Luiz também passou a xingá-la. Relatou que, nesse momento, a mãe de Raíssa apareceu e tentou puxá-la para dentro de casa, dizendo “para, Raíssa, para”, mas, como não conseguiu encerrar a discussão, também começou a ofender verbalmente tanto ela quanto o réu. Narrou que Raíssa possuía paralelepípedos grandes na sacada de sua residência e que tentou arremessá-los contra eles, mirando suas cabeças. Afirmou que conseguiu desviar, mas que o acusado se colocou à sua frente para protegê -la e acabou sendo atingido nas costas, sofrendo um ferimento considerável. Acrescentou que ouviu as ofendidas dizerem: “Vamos destruir o carro deles”, e, ao pensar em retirar o veículo do local, percebeu que já era tarde, pois elas começaram a arremessar objetos contra o automóvel, amassando e quebrando completamente o para- brisa. Informou que, diante da situação, ligou para a polícia, e que as ofendidas também disseram que acionariam a autoridade policial. Diante da situação, ficou receosa de que Raíssa e sua mãe jogassem mais objetos contra o veículo. Por esse motivo, decidiu, juntamente com Luiz, retirar o carro do local e dirigir-se até a casa da sogra, localizada a uma ou duas quadras de distância, com a intenção de também verificar se a chave da residência poderia estar lá. Durante o trajeto, permanecia em ligação com a polícia e, em determinado momento, disse ao acusado: “ Vamos rápido, porque a polícia deve estar chegando lá”. Informou que, ao retornarem, a viatura já se encontrava na esquina. Eles então sinalizaram para os policiais retornarem, a fim de relatar não apenas os danos causados ao veículo, mas também a ocorrência da lesão corporal. Relatou que, com a chegada dos policiais, foi informado que o réu seria preso em flagrante, sob a alegação de que havia chamado a mãe de Raíssa de “preta, macaca”. Explicou aos policiais que, de fato, houve troca de ofensas entre as partes, mas afirmou que Luiz, em momento algum, proferiu esse tipo de ofensa contra a ofendida, destacando que aPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 9 discussão ocorreu exclusivamente entre ele e Raíssa. Mencionou ser Bacharel em Direito e afirmou que, se tivesse ouvido seu marido proferir ofensas daquela natureza, jamais teria retornado ao local, pois ele seria preso em flagrante. Acrescentou que foi ela própria quem decidiu acionar a polícia e registrar um boletim de ocorrência, a fim de resolver a situação de forma legal. Pontuou que, passaram a acusá-la também de ter proferido ofensas. No entanto, os policiais informaram que apenas o réu seria conduzido, e ele acabou preso. Declarou que, após os fatos, tentou dialogar com a ofendida, assim como sua sogra procurou entrar em contato para tratar dos danos causados ao veículo. Relatou que, durante essa tentativa, a ofendida admitiu ter causado o dano, mas afirmou que não iria arcar com os prejuízos, e a situação permaneceu sem resolução. Declarou, ademais, que, antes de conduzirem o réu à Delegacia, os policiais o levaram até a UPA do Pinheirinho, e que ela o acompanhou até o local. Complementou dizendo que, quanto à alegação de que o acusado teria subido na sacada da ofendida, tal fato não ocorreu. Esclareceu que Luiz subiu apenas no portão da própria residência, uma vez que estavam sem a chave. Ressaltou, inclusive, que foi necessário acionar um chaveiro, pois haviam realmente perdido a chave. Mencionou que, em determinado momento, Raíssa e sua mãe disseram: “Olha, ele vai tentar entrar aqui dentro da nossa casa”, ao que respondeu: “Ele não está tentando entrar na casa de vocês, e sim na nossa, pois estamos sem a chave. Parem de nos importunar, só queremos encontrar uma forma de entrar em nossa residência”. Relatou que, àquela altura, elas já haviam causado diversos danos, jogado tijolos e até quebrado a calçada em frente à sua casa. Informou, ainda, que não houve confronto físico entre elas e que não fazia sequer um mês desde que haviam se mudado para o local. Destacou que Raíssa procurava provocá -la de diversas formas, chegando inclusive a afirmar que queria ficar com seu marido, que sabia seu nome e o do réu, e começou a proferir palavras horríveis, mencionando até mesmo sua profissão e até aPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 10 dele. Declarou que tanto ela como Luiz ficaram chocados ao perceber como Raissa possuía essas informações, sendo que não sabiam quem ela era e nunca haviam visto Raissa antes. Afirmou que ela e o acusado haviam bebido no dia, mas que não estavam alcoolizados e nem alterados. Relatou que não houve uma discussão direta com a mãe de Raíssa, pois o conflito estava restrito a ela. Informou que a mãe de Raíssa tentou interromper a discussão diversas vezes, mas que Raíssa insistiu em continuar. Acredita que, após algum tempo, a mãe dela se uniu à filha, dando sequência à discussão. Acrescentou que, embora reconhecesse que deveria ter agido de forma diferente para evitar a situação, o episódio acabou se tornando uma troca de ofensas mútuas. Reiterou que, apesar da troca de ofensas, em nenhum momento houve qualquer manifestação de racismo ou intolerância racial. Quando questionada se havia registrado um boletim de ocorrência sobre os fatos, afirmou que sim, e que, inclusive, há uma ação tramitando no Juizado, referente à lesão corporal e aos danos materiais, com audiência marcada para o mês de maio. Por fim, afirmou não ter conhecimento de qualquer nova ocorrência envolvendo Luiz. Por fim, o réu LUIZ CARLOS MILANI JUNIOR, em Juízo, negou a prática delitiva. Relatou que, na data dos fatos, retornava à sua residência acompanhado de sua esposa, após participarem de uma confraternização na casa de sua genitora. Informou que ambos haviam ingerido bebida alcoólica e, ao chegarem em casa, perceberam que estavam sem as chaves do imóvel. Diante disso, passaram a procurar pelas chaves, sem êxito, revirando objetos no interior do veículo, o que os deixou nervosos e estressados. Nesse contexto, afirmou que a senhora Raíssa passou a debochar da situação, fazendo piadas. Sua esposa, então, questionou qual seria o motivo do comportamento, ao que Raíssa respondeu, olhando diretamente para ela: “Tô achando engraçado, só isso.” Acrescentou que, a partir desse momento, Raíssa passou a proferirPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 11 ofensas e comentários depreciativos sobre a vida pessoal do casal, demonstrando conhecimento de informações que, segundo ele, desconhecia como poderiam ter chegado ao conhecimento da ofendida. A partir daí, iniciou-se uma discussão com troca de ofensas entre as partes. Relatou que a mãe de Raíssa chegou a intervir, afastando-a da sacada por cerca de dois minutos, mas que, em seguida, Raíssa retornou e continuou com as provocações. Diante da impossibilidade de acessar a residência pela porta, decidiu tentar pular o portão para entrar pela janela. Nesse momento, Raíssa passou a gritar, alegando que ele estaria tentando invadir sua residência, e arremessou pedras contra ele e contra o veículo, vindo a quebrar o para-brisa. Informou que, diante da situação, tentou retirar o carro do local, momento em que teve nova discussão com Maria, mãe de Raíssa, que se encontrava nas proximidades, pois já estava irritado com os danos causados ao automóvel. Ressaltou, contudo, que em nenhum momento houve qualquer ato de racismo ou injúria racial. Após retirar o veículo, dirigiu-se com sua esposa até a residência de sua mãe, na tentativa de localizar a chave. Destacou que foi ele, juntamente com sua esposa, quem acionou a polícia. Relatou que deixaram o local com o intuito de se afastar do conflito e buscar a chave, mas, ao lembrarem que haviam chamado os policiais, decidiram retornar, temendo que apenas a versão das ofendidas fosse ouvida. Ao retornarem, os agentes já estavam deixando o local. Aproximaram-se com o veículo e, nesse momento, foram informados de que ele seria preso em flagrante por suposta prática de injúria racial, com base nos relatos das ofendidas. Afirmou não compreender os motivos da prisão, uma vez que os policiais apenas relataram o que lhes fora dito pelas envolvidas. Foi conduzido no banco traseiro da viatura, sendo primeiramente encaminhado à UPA, em razão de lesão nas costasPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 12 causada por uma das pedras arremessadas, e, posteriormente, ao oitavo Distrito Policial. Ao ser questionado se, durante a discussão, proferiu qualquer expressão relacionada à cor da pele da ofendida, afirmou não se recordar exatamente das palavras utilizadas, mas negou veementemente que tenha feito qualquer referência de cunho racial. Indagado sobre as ofensas proferidas por Raíssa com o intuito de provocar sua esposa, afirmou não ter ouvido com clareza, pois estava concentrado na busca pelas chaves, mas recorda que Raíssa teria dito: “ Vou tirar uma casca do teu marido.” Afirmou, ainda, que não havia qualquer desavença anterior com Raíssa e que, após os fatos, não manteve qualquer tipo de contato com ela ou com Maria. Pois bem. Como é cediço, para prolatar a sentença condenató ria, o Juiz deve estar plenamente convencido de que o réu foi o autor do ilícito penal apurado, e, caso contrário, havendo dúvida quanto à sua responsabilidade, deverá absolvê-lo. Segundo a lição de Aury Lopes Jr., “ao lado da presunção de inocência, como critério pragmático de solução da incerteza (dúvida) judicial, o princípio in dubio pro reo corrobora a atribuição da carga probatória ao acusador e reforça a regra de julgamento (não condenar o réu sem que sua culpabilidade tenha sido suficientemente demonstrada). A única certeza exigida pelo processo penal refere-se à prova da autoria e materialidade, necessárias para que se prolate uma sentenç a condenatória. Do contrário, em não sendo alcançado esse grau de convencimento (e liberação de cargas), a absolvição é imperativa. Isso porque, ao estar a inocência assistida pelo postulado de sua presunção, até prova em contrário, essa prova contrária deve apontá-la quem negaPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 13 sua existência, ao formular a acusação. Trata-se de estrita observância ao nulla accusatio sine probatione”. 1 Transpondo os ensinamentos à hipótese em apreço, tem-se que o Direito Penal não pode atuar sob conjecturas ou probabilidades, havendo de se exigir, para o reconhecimento da responsabilidade criminal de alguém e impor-lhe uma sanção penal, a demonstração de forma real e eficaz do fato imputado. As provas, para compor o material de certeza de uma condenação criminal, devem ser evidentes a atestar a culpabilidade do acusado, não sendo possível, para tanto, basear-se na mera probabilidade de ter cometido os atos delitivos. Com efeito, valorada a prova oral colhida na instruçã o, vê-se que esta diverge, consideravelmente, do que foi narrado na denúncia (bem como de todo o elenco probante). Como mencionado alhures, o ônus probatório, em regra, recai sobre a acusação, não incumbindo ao réu, necessariamente, a produção de certeza quanto à sua inocência. Deste modo, a dúvida, consoante o princípio in dubio pro reo, remanesce em seu benefício. Trata-se, por admitir prova em contrário, de presunção relativa; e, por assim o ser, apenas a prova robusta é capaz de afastá-la – o que não se vislumbrou na hipótese vertente. Isso porque, qual pontuou a Defesa (mov. 136.1 ): [...]Da análise do acervo probatório, constata-se a ocorrência de ofensas recíprocas entre o acusado e a ofendida. Os fatos derivaram de desinteligência pretérita que culminou em altercação verbal exacerbada entre as partes.” 1 LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional v.1, 3.PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 14 E bem alvitrou o parquet (mov. 132.1): [...]Diante do conjunto probatório amealhado aos autos, verifica-se que os elementos colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa não são suficientes para decretar o édito condenatório em desfavor do acusado. “ De fato, ao perscrutar os relatos, torna-se indene de dúvidas que este imbróglio advém de agressões verbais recíprocas, trocadas em um momento de exaltação por ambas as partes, o que acabou gerando desentendimentos entre eles. Explico. Observa-se que a linha dos fatos apresentada nos depoimentos das partes diverge em diversos pontos. Enquanto a esposa do réu alega que Raíssa iniciou a discussão com provocações e chacotas, motivadas pela dificuldade de Luiz e Madelaine em encontrar as chaves da residência, por outro lado, Raíssa sustenta que se encontrava na sacada, conversando e rindo ao telefone com sua irmã e que Madelaine teria entendido erroneamente. Pois bem. Conforme extraído dos depoimentos das partes, a discussão ocorreu de forma acalorada, sendo que o único ponto de convergência entre os relatos refere-se as ofensas recíprocas e às pedradas desferidas pela filha da ofendida contra o réu. Em Juízo, o acusado e Madelaine relataram que, diante das chacotas, todos passaram a trocar ofensas de forma recíproca, afirmando que a discussão teria sido iniciada por Raíssa, filha da ofendida, a qual posteriormente teria se envolvido diretamente no conflito. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pg. 503.PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 15 Após o envolvimento da ofendida na discussão, que inicialmente se desenvolvia entre Raíssa, o réu e sua esposa, este, supostamente, teria ofendido Maria, dirigindo-lhe as seguintes palavras: “preta”, “macaca” e “encardida”, no contexto da discussão supramencionada. Durante o desenrolar da discussão, os ânimos se acirraram de maneira considerável, a ponto de Raíssa lançar tijolos e/ou paralelepípedos contra o acusado e sua esposa, bem como no veículo do casal. Em razão das lesões causadas, foi imprescindível que o réu fosse inicialmente encaminhado à UPA para atendimento médico, antes de ser conduzido à Delegacia. Quanto à situação mencionada, Raíssa afirmou em Juízo que o réu tentou adentrar sua residência escalando o portão, razão pela qual teria arremessado objetos contra ele. Todavia, o acusado esclareceu que subiu no portão com o intuito de acessar a sua própria residência, negando qualquer tentativa de invasão. Diante do intenso desentendimento, ambas as partes declararam que acionariam a polícia para resolver a situação, conforme consta nos respectivos depoimentos prestados em Juízo. Ei-la a síntese dos fatos; assinalemos, agora, os seus pormenores. Como se pode inferir da análise conjunta dos relatos, que foi corroborada por todas as partes, houve uma discussão generalizada, cuja causa originou-se da contenda iniciada entre Raíssa, Madelaine, Luiz e, posteriomente, Maria. Não obstante tal constatação, fato é que, na prática, as narrativas apresentadas pelo réu e pela ofendida não se coadunam com o conjunto probatório reunido, tanto na esfera judicial quanto na fase extrajudicial. Senão vejamos as discrepâncias.PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 16 Inicialmente, destaco os relatos da ofendida e da sua filha quanto à motivação que levou ao início da discussão: MARIA JOSÉ SANTOS: “Luiz discutia com sua esposa, que, ao olhar para cima e avistar a filha da declarante na sacada, disse: “Para de fazer isso comigo, pois os vizinhos ficam dando risada do que você está fazendo.” Informou que o acusado passou a dirigir ofensas à sua filha, proferindo xingamentos.” RAÍSSA SANTOS COSTA: “Relatou que, em seguida, o acusado se aproximou e, de maneira agressiva, perguntou: "O que você está rindo de mim e da minha mulher, sua vagabunda? Desce aqui que você vai ver o que vai acontecer." Ressaltou que foi o acusado quem começou a ofendê-la, como se estivesse rindo da esposa dele, mas afirmou que isso não era verdade, pois já estava na sacada antes de eles chegarem.” Passo, agora, à análise dos depoimentos do réu e de sua esposa quanto à motivação que deu origem à discussão: MADELAINE EDUARDA DA CRUZ SARAIVA BARBOSA: “Nesse momento, Raíssa, que estava na sacada de sua residência — vizinha a deles —, começou a debochar da situação, rindo e fazendo piadas sobre a dificuldade do casal em encontrar a chave. Disseram que tentaram ignorar, mas, passados cerca de cinco a dez minutos, Raíssa não cessou os deboches. Informou que então questionou Raíssa sobre o motivo das risadas, momento em que esta passou a proferir xingamentos contra ela e seu marido.” LUIZ CARLOS MILANI JUNIOR: “Informou que, nesse momento, Raíssa começou a debochar da situação, fazendo piadas. Sua esposa, então, questionou qual era a graça e o motivo daquele comportamento, ao que Raíssa respondeu, olhando diretamente para ela: “ Tô achando engraçado, só isso.” É evidente que, pelo teor dos depoimentos destacados, a ofendida e o réu apresentam versões completamentePODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 17 divergentes sobre o que teria motivado as agressões mútuas entre eles. Nesse contexto, salienta-se a relevância dos relatos no que diz respeito às supostas ofensas injuriosas de cunho racial atribuídas ao acusado, o qual, ao ser indagado sobre tais ofensas, respondeu que: “[...] Informou que, diante disso, tentou retirar o carro dali, momento em que Maria, mãe de Raíssa, estava próxima e uma nova discussão teve início, pois ele já estava irritado com os danos causados ao veículo. Ressaltou, contudo, que não houve qualquer ato de racismo ou injúria racial durante os acontecimentos.”. A ofendida, por seu turno, prossegue afirmando que Luiz a ofendeu: “[...] Após isso, Luiz continuou a proferir ofensas, dizendo: “o que você está falando aí sua preta, encardida, sua preta, macaca, fedida”. Relatou que revidou, xingando o réu, ocasião em que ele respondeu: “Você quer que eu vá aí te quebrar?”. Pois bem. Diante das divergências apresentadas pelas partes, outra não é a conclusão, senão de que tanto o acusado quanto à ofendida, envolveram-se em uma troca de ofensas mútuas, no calor de uma discussão originada por um mal-entendido inicial e intensificada por provocações recíprocas — não restando evidenciada, no caso concreto, a intenção deliberada do réu de cometer injúria racial. Outrossim, infere-se que o réu foi alvo do arremesso de paralelepípedos, os quais lhe causaram lesões. Vejamos:PODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 18 Diante desse cenário, ao contrário do que sustenta a exordial acusatória, o contexto dos fatos revela um quadro de intenso estresse emocional entre as partes envolvidas. Portanto, o delito imputado ao réu não se encontra configurado, uma vez que não ficou demonstrado que ele tenha agido com dolo específico, estando ausente o elemento subjetivo de subjugá-la ou menosprezá-la em razão de sua cor. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: APELAÇÃO CRIME – SENTENÇA CONDENATÓRIA PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO O ART. 140, §3°, DO CÓDIGO PENAL. IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DE PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ART, 140, §3°, DO CÓDIGO PENAL, SOB O ARGUMENTO DA INEXISTÊNCIA DO FATO E AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO – PROVIMENTO – INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – TESTEMUNHAS PRESENCIAIS QUE NÃO ESTABELECEM A INJÚRIA RACIAL – OFENSAS MÚTUAS DURANTE DISCUSSÃO EXALTADA – ELEMENTO SUBJETIVO E ANIMUS INJURIANDI NÃOPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 19 CARACTERIZADO - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO.RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.(TJ-PR- 2ª Câmara Criminal- 0002322- 39.2018.8.16.0099 – Jaguapitã- Mauro Bley Peireira Junior- 06/02/2023) APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE INJÚRIA RACIAL E LESÃO CORPORAL. (ARTIGO 140, § 3º, E 129, CAPUT, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). 1) AUSÊNCIA DE PROVAS DE MATERIALIDADE DA I NJÚRIA. PALAVRA DA VÍTIMA QUE SE ENCONTRA ISOLADA. FUNDADA DÚVIDA SOBRE A EXISTÊNCIA DO CRIME. ABSOLVIÇÃO DEVIDA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 386, INCISO VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DEMAIS TESES PREJUDICADAS. 2) PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DAS LESÕES CORPORAIS. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS ATRAVÉS DO LAUDO DE LESÕES CORPORIAS E DEPOIMENTOS COLHIDOS EM JUÍZO. 3) ALEGADA SUBSUNÇÃO DO FATO AO TIPO PENAL DE INJÚRIA REAL. AUSÊNCIA DOS ELEMENTOS DO TIPO. DOLO DE OFENDER A INTEGRIDADE FÍSICA. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE LESÃO CORPORAL. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.(TJ-PR- 2ª Câmara Criminal- 0005869-70.2017.8.16.0019-Ponta Grossa- José Carlos Dalacqua- -22/06/2018) Dentro desse cenário, para a configuração da conduta delituosa, é imprescindível que reste evidenciada a intenção do agente, ao proferir palavras de cunho discriminatório, de atribuir à vítima conceitos depreciativos e qualidades negativas, com o claroPODER JUDICIÁRIO Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba f 20 propósito de inferiorizá-la em razão de critérios juridicamente protegidos — como, no presente caso, em virtude da cor. Ora, no que se refere ao crime de injúria racial, necessário perquerir, no caso concreto se o autor da conduta, ao fazer elementos da raça ou cor de outras pessoas agiu com dolo, expressando conceito odioso em relação a ela. No caso dos autos, não demonstrado, de forma cabal, o elemento subjetivo ínsito à empreitada delituosa, é de rigor a absolvição do acusado. III - DISPOSITIVO: Face o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a denúncia, para o fim de ABSOLVER o réu LUIZ CARLOS MILANI JUNIOR, já qualificado, pela prática dos fatos imputados na exordial acusatória , o que faço com fulcro no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal. Procedam-se as baixas e as anotações necessárias. Cumpra-se, no que for aplicável, o contido no Código de Normas da douta Corregedoria Geral da Justiça. Intime-se a vítima, nos termos do art. 201, 2º do Código de Processo Penal. Não constam apreensões registradas na capa dos autos, ou tampouco consta registrado o depósito de fiança. Publique-se. Registre-se e Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. Curitiba, data da assinatura digital. Camile Santos de Souza Siqueira Juíza de Direito

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Processo nº 5009824-03.2023.4.03.6100

ID: 312820793

Tribunal: TRF3 Órgão: 9ª Vara Cível Federal de São Paulo Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5009824-03.2023.4.03.6100

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

CENTRO HOSPITALAR ATIBAIA LTDA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

MARCIO CHARCON DAINESI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5009824-03.2023.4.03.6100 / 9ª Vara Cível Federal de São Paulo AUTOR: CENTRO HOSPITALAR ATIBAIA LTDA Advogado do(a) AUTOR: MARCIO CHARCON DAINESI - SP204643 REU: AGENC… PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5009824-03.2023.4.03.6100 / 9ª Vara Cível Federal de São Paulo AUTOR: CENTRO HOSPITALAR ATIBAIA LTDA Advogado do(a) AUTOR: MARCIO CHARCON DAINESI - SP204643 REU: AGENCIA NACIONAL DE SAUDE SUPLEMENTAR S E N T E N Ç A Petição sob o Id nº 355067116: Trata-se de embargos de declaração, opostos pelo CENTRO HOSPITALAR ATIBAIA LTDA, em face da sentença proferida sob o Id nº 353394616. Aduz a existência de omissões e contradições na sentença embargada, as quais passa a expor: 1) Relata que a sentença não observou, na análise da AIH 3520109492636 que a própria beneficiária AMANDA CRISTINA DE SOUZA declarou à Operadora embargante que estava grávida no momento em que aderiu ao plano de saúde coletivo, dia 01/09/2019, e que o parto cesariano a que foi submetida (internação entre 03/04/2020 a 05/04/2020) não reportou qualquer intercorrência médica, o que afasta o caráter de urgência atribuído a este parto cesariano, e faz incidir o prazo de carência de 300 (trezentos) dias previsto na Clausula XV – Períodos de Carência, item 3, subitem 3.5, do contrato coletivo, que obsta a cobrança de ressarcimento ao SUS para tal procedimento, e de modo análogo para os procedimentos de parto verificados nas AIH´s 3520112151325 e 3520115047086; 2) Que não se manifestou sobre as excludentes contratuais de caráter eletivo – apresentado para 22 (vinte e duas) APAC´s – e de não cobertura dos procedimentos de hormonioterapia – apresentado para 15 (quinze) APAC´s, que apenas foram citadas na fundamentação; 3) Que deixou de se pronunciar sobre a cobrança do ressarcimento à luz do voto do Ex-Ministro Relator da ADI nº 1.931-DF e de sua natureza restitutória confirmada no julgamento do RE 597.064/RJ, bem como, sobre o excesso de cobrança praticado pelo IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento em relação à Tabela do SUS para os mesmos procedimentos verificados nas 28 (vinte e oito) APAC´s / AIH´s abrangidas pela GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI; e 4) Incorreu em contradição com o entendimento firmado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça de que “é a partir da notificação da decisão do processo administrativo que se apura os valores a serem ressarcidos (constituição do crédito), uma vez que, somente a partir de tal momento, o montante de crédito será passível de ser quantificado” ao convalidar a cobrança de juros de mora estampada na GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI, posto que qualquer encargo relativo à mora somente é devido a partir do momento em que a dívida se torna exigível, o que se dá com sua constituição definitiva, com o trânsito em julgado da decisão administrativa. Discorre, a seguir, de forma mais detalhada, sobre as aludidas omissões e contradições, em relação às AIHS em discussão: A-Beneficiária AMANDA CRISTINA DE SOUZA. Aduz que, tendo o parto cesariano sido realizado na beneficiária no período de 03/04/2020 a 05/04/2020, resta evidente que ela não cumpriu o prazo de carência de 300 (trezentos) dias estabelecido na cláusula contratual XV, período de carência, item 3, subitem 3.5, do contrato coletivo. Que, sendo assim, a cobrança referente ao Ressarcimento ao SUS desta AIH deverá ser anulada. Pontua que, ainda que as beneficiárias das AIH´s 3520112151325 e 3520115047086 não tenham declarado à Operadora embargante que se encontravam grávidas no momento em que aderiram ao respectivo plano de saúde coletivo, os procedimentos de parto a que foram submetidas também não reportaram intercorrência médica e, portanto, não se deram em caráter de urgência, o que também obsta a cobrança do ressarcimento ao SUS, e que, assim, aguarda que tal omissão seja sanada, e, por decorrência, que as cobranças exigidas a título de ressarcimento ao SUS para as AIH´s nºs 3520109492636, 3520112151325 e 3520115047086 também sejam anuladas. Discorre sobre a omissão na apreciação das excludentes contratuais de caráter eletivo – apresentado para 22 (vinte e duas) APAC´s – e de não cobertura dos procedimentos de hormonioterapia – apresentado para 15 (quinze) APACs´s Aduz que, em que pese o esforço desse Juízo em responder sobre o que chamou de “excludentes contratuais”, os impedimentos de caráter eletivo – apresentado para 22 (vinte e duas) APAC´s – e de não cobertura dos procedimentos de hormonioterapia – apresentado para 15 (quinze) APAC´s, que apenas foram citados na fundamentação, não tiveram a devida apreciação, ainda que tenham sido rechaçados pela Agência Reguladora no âmbito administrativo. Que, desta forma, entende a embargante que estas excludentes contratuais devam ser submetidas à análise desse MM. Juízo. Que, no intuito de colaborar com a apreciação pretendida, pede vênia a embargante para transcrever estas excludentes: Caráter eletivo do atendimento: Destaca que, no presente caso, o caráter da internação ou procedimento, deu-se através do Código 01 – Eletivo, conforme demonstrado pelo ABI e confessado por essa Agência Reguladora; Produto não cobre procedimento de hormonioterapia, conforme disposto no artigo 10, § 4º, da lei 9.656/1998 e na resolução normativa - rn nº 428, de 07/11/2017. eventual cobrança deverá ser condicionada à comprovação pela ANS do cumprimento das diretrizes de utilização para cobertura obrigatória dos procedimentos -DUT nº 64, constante do Anexo II, da Resolução Normativa RN nº 428/2017. Aduz que, em navegação junto ao site do Hospital Israelita Albert Einstein na especialidade de Oncologia constam informações específicas e valiosas sobre o tratamento de “hormonioterapia” https://www.einstein.br/especialidades/oncologia/exames-tratamentos/hormonioterapia. Pontua que, ainda que assim não se entenda, considerando-se que, na maioria dos casos, a terapia hormonal no tratamento de câncer é medicamentosa, e que o artigo 22, inciso X, da Resolução Normativa RN nº 428/2017 autoriza a cobertura de medicamentos para tratamento antineoplásico domiciliar de uso oral sob a técnica da hormonioterapia, a prescrição destes medicamentos deverá estar de acordo com as Diretrizes de Utilização para Cobertura Obrigatória dos Procedimentos DUT Nº 64 (Terapia Antineoplásica oral para tratamento do câncer) que constam do Anexo II da referida Resolução Normativa (págs. 63 / 67). Discorre, a seguir, sobre conceitos de hormonioterapia, sustentando que o tratamento para o câncer é chamado de tratamento antineoplásico, pois atua na destruição de uma neoplasia (formação). Aduz que, de acordo com o artigo “Hormonioterapia antineoplásica: o que é? Como atua? Quais os principais tipos?” publicado no site informativo da ABCMED, “A hormonioterapia antineoplásica é uma manipulação do sistema endócrino para tratar algumas neoplasias malignas e seu objetivo é impedir que os hormônios se liguem a seus receptores e atuem como fator de crescimento das células malignas”. Que a hormonioterapia é a terapia mais eficiente para tratar os tumores malignos que tenham os chamados receptores hormonais para o estrogênio ou para a progesterona. Assinala que, se houver a presença de receptores de um desses hormônios, a manipulação deles pode ser feita para tratar algumas neoplasias, em qualquer fase da doença, mesmo no caso de doença metastática” (https://www.abc. med.br/p/exames-eprocedimentos/587942/hormônioterapia+antineoplásica+o+que+e+como+atua+quais+os+principais+tipos.htm). Pontua que, nesse contexto, ainda que o procedimento de Terapia antineoplásica oral, para tratamento do câncer conste listado no Anexo I da Resolução Normativa RN nº 428/2017, sua cobertura por planos de segmentação ambulatorial, hospitalar (com ou sem obstetrícia) e por planos-referência deverá ocorrer desde que observadas as condições estipuladas na respectiva Diretriz de Utilização – DUT, que assim se encontra descrita no item 64, do Anexo II, da referida Resolução Normativa. In casu, que, tendo o procedimento de hormonioterapia sido realizado em uma Unidade Prestadora de Atendimento vinculada ao SUS – Sistema Único de Saúde, e não à rede credenciada pela Operadora, é incumbência da Autarquia Ré demonstrar que respeitou os critérios da DUT Nº 64 (Terapia Antineoplásica oral para Tratamento do Câncer), para que a obrigatoriedade de sua cobertura possa ser imposta à Operadora, e que o ônus da prova neste caso incumbe à Autarquia ré, ante a alegação de fato impeditivo ao direito do Autor (artigo 373, inciso II, do CPC). Que, ante o exposto, embora entenda ser indevido o ressarcimento ao SUS do procedimento de hormonioterapia verificado na presente APAC, por não se encontrar prevista no rol de procedimentos obrigatórios da Resolução Normativa RN 428/2017, eventual cobrança deverá ser condicionada à comprovação pela ANS do cumprimento das diretrizes de utilização para cobertura obrigatória dos procedimentos - DUT Nº 64 - constante no Anexo II da Resolução Normativa RN nº 428/2017. Aduz que, convém salientar que em 12/03/2019 a C. Quarta Turma do Eg. Tribunal Regional Federal da 3ª Região anulou a r. sentença proferida pelo MM. Juízo de 1º grau nos autos da Ação Ordinária nº 0005869- 35.2012.4.03.6100/SP, ajuizada por esta mesma embargante em face da ANS, nos seguintes termos: “A sentença prolatada, assim, afigura-se citra petita e omissa quanto a aspectos relevantes para o julgamento da causa, razão pela qual deve-se reconhecer sua nulidade. E, expostos tais elementos, entendo inviável a aplicação analógica do art. 1.013, § 3º do CPC/15 (§ 2º do art. 515 do CPC/73), já que o restante do julgamento dependeria de larga incursão fática e documental a respeito de alegações em que ausente manifestação do juízo sentenciante”. Que, assim, reconhecida a nulidade da sentença proferida, determina-se a devolução dos autos ao Juízo de origem para prosseguimento do feito. Aduz a embargante que pede vênia para transcrever este V. Acórdão, da lavra da E. Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE, publicado no Diário Oficial de 22/03/2019 (id nº 355067140, pág.18). Após transcrever, na íntegra, o voto em questão, em algumas laudas, e reportar algumas jurisprudências, igualmente, em inteiro teor, do E. STJ (id nº 355067140, pág. 22 e ss), discorreu sobre: C) A omissão na apreciação da cobrança do ressarcimento à luz do voto do ex-ministro relator da adi nº 1.931-df e de sua natureza restitutória confirmada no julgamento do re 597.064/rj. da ausência de manifestação sobre o excesso de cobrança promovido pelo IVR – índice de valoração do ressarcimento em relação à tabela do sus para os mesmos procedimentos verificados nas 28 (vinte e oito) apac´s / aih´s abrangidas pela gru nº 29412040007113937 - 86º abi. Aduz que a nova redação do § 1º, do artigo 32, da Lei nº 9.656/1998 (dada pela Lei nº 12.469/2011), já vigente à época dos atendimentos verificados nas 28 (vinte e oito) APAC´s / AIH´s abrangidas pela GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI, prevê que “o ressarcimento será efetuado pelas operadoras ao SUS com base em regra de valoração aprovada e divulgada pela ANS, mediante crédito ao Fundo Nacional de Saúde – FNS. Pontua que, em cumprimento ao previsto no destacado § 1º do artigo 32 da Lei nº 9.656/1998, a Diretoria Colegiada da Autarquia Embargada baixou a Resolução Normativa RN nº 251, que instituiu o IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento para fins de ressarcimento dos atendimentos prestados aos beneficiários de planos privados de assistência à saúde, por instituições públicas ou privadas, integrantes do Sistema Único de Saúde – SUS, a partir da competência de janeiro de 2008. Que, ainda que tenha sido reconhecida a constitucionalidade do artigo 32 da Lei nº 9.656/1998, é notório que o IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento, consistente na aplicação da alíquota de 1,5 sobre a Tabela do SUS, acaba por impor a cobrança de valores genéricos, únicos e nacionais, sem qualquer respeito ao caráter indenizatório do instituto jurídico em referência, e não se coaduna com a norma do § 8º do artigo 32 da Lei nº 9.656/1998. Aduz que, se ressarcimento pressupõe recomposição, esta deve ocorrer pelos valores efetivamente gastos nos atendimentos dos beneficiários de planos de saúde pelas unidades públicas e privadas, credenciadas ou contratadas, pelo Sistema Único de Saúde, e não mediante um índice imposto de forma unilateral e aleatória através de resolução normativa. Este é o entendimento do Egrégio Supremo Tribunal Federal exarado na decisão liminar proferida nos autos da ADI nº 1931-8 pelo então E. Ministro Relator Maurício Corrêa, que, quando de seu voto, transcrito no Id nº 355067140). Que, outrossim, nenhuma linha foi arguida pela r. sentença sobre o voto do Ex-Ministro Relator da ADI nº 1931-DF e o decorrente raciocínio de que a base de cálculo para se exigir das Operadoras de Planos e Seguros de Saúde o ressarcimento ao SUS é o total da importância por este gasta em cada um dos atendimentos, sob pena da inobservância violar o disposto no artigo 884 do Código Civil, incidindo assim em manifesta omissão. Pontua que o índice imposto pela Autarquia embargada por meio da Resolução Normativa RN nº 251, de 19/04/2011, vai de encontro a este entendimento firmado pelo Eg. Supremo Tribunal Federal quanto à natureza jurídica civil e o caráter indenizatório do ressarcimento ao SUS. Que não se pode olvidar que, sendo o IVR um índice a ser aplicado sobre a Tabela do SUS, a sua essência, a sua natureza deve refletir e representar variações, ou seja, captar mudanças e oscilações, que podem ser de custos ou de dados, relativos a um determinado setor ou a um determinado produto. Porém, a Resolução Normativa RN nº 251/2011 deixou de demonstrar quais são esses dados ou custos que são acompanhados e refletidos por tal índice, bem como quais produtos fazem parte desse controle. Em suma, que a ANS não explicou quais foram as bases para a instituição do IVR, bem como quais as variações que culminaram na estipulação de tal índice no importe de ‘1,5 (um vírgula cinco)’. Que a incerteza e obscuridade denunciadas colidem com o disposto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988, que preceitua que a administração pública deve, em seus atos, primar pela observância dos princípios da legalidade e da publicidade. Além de tais princípios, a administração pública também deve observar o princípio da razoabilidade previsto no artigo 2º, da Lei 9.784 de 1999. Mas que, no entanto, a malsinada Resolução Normativa RN nº 251 desrespeitou frontalmente tais princípios. Pontua que, em relação às 28 (vinte e oito) APAC´s / AIH´s abrangidas pela GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI, a comparação dos preços praticados pelo Índice de Valoração do Ressarcimento – IVR em relação aos preços praticados pela Tabela do SUS para os mesmos procedimentos fez com que a Embargante apurasse com base na planilha reproduzida abaixo um excesso de cobrança no importe de R$ 7.712,01 (sete mil, setecentos e doze reais e um centavo), o que demonstra a abusividade dos preços cobrados pelo IVR (gráfico apresentado com os embargos, sob o Id nº 355067140). Traz julgado no sentido de confirmar o entendimento supra, citado, na íntegra, em três laudas (id nº 355067140, pág.30). Que, caso a ANS continue com a exigência do recolhimento das importâncias relativas ao ressarcimento ao SUS com base no IVR, ocorrerá o justo receio de favorecimento ilícito, através do qual se utiliza da máquina administrativa, custeada pelas empresas privadas de assistência à saúde, para auxiliar as entidades públicas e privadas vinculadas ao SUS. Que o valor cobrado a título de ressarcimento por meio do IVR, por ser superior aos despendidos pelas operadoras ou mesmo superior ao valor recebido pelo SUS dos repasses governamentais, contradiz a máxima da vedação ao enriquecimento ilícito, o que demonstra a ilegalidade deste índice. E que, destarte requer a embargante seja sanada a omissão apontada, devendo a Resolução Normativa RN nº 251, de 19/04/2011, que instituiu o ‘IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento’, ser declarada nula por inconstitucionalidade e ilegalidade, conforme as razões acima expendidas e, ato contínuo, a GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI deverá ser reemitida com a dedução do valor de R$ 7.712,01 (sete mil, setecentos e doze reais e um centavo), proveniente da diferença entre o IVR e a Tabela do SUS para os mesmos procedimentos. D) Discorre sobre a contradição praticada pela r. sentença com o entendimento firmado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça ao convalidar a cobrança de juros de mora estampada na GRU nº 29412040007113937 Aduz que a r sentença rebateu a alegada ilegalidade da cobrança dos juros de mora durante o processo administrativo de apuração do débito de ressarcimento ao SUS estampada na GRU nº 29412040007113937 sob o seguinte argumento: “a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça entende que não obstante a discussão administrativa sobre a exigibilidade do crédito público, os respectivos encargos moratórios são devidos desde o vencimento do prazo original de pagamento, notadamente porque a interposição de recurso administrativo não tem aptidão de alterar a data inicial de vencimento do crédito”. Que o discurso entonado por esse MM. Juízo para convalidar a cobrança de juros de mora é contraditório com o entendimento firmado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça (acórdão citado – AgInt no AResp nº 1.601.262/SP). Pede vênia para destacar o excerto de sentença proferida em 11/02/2021 pelo MM. Juízo de outra Vara Cível, em consonância com seu entendimento (id nº 355067140, pág.32). Que, demais disso, à luz do que dispõe o artigo 394 do Código Civil, a cobrança dos juros de mora praticada pela Autarquia embargada não tem como prevalecer, posto que referido dispositivo aduz que a mora só ocorre quando o devedor não efetua o pagamento, ou quando o credor se recusa a receber no local, no local e na forma ajustada pela lei. Ao final, aduz que “no caso vertente, os pedidos formulados pela embargante são cumulados em ordem sucessiva, e cada qual possui causa de pedir (fatos e fundamentos jurídicos) distinta, o que é manifestamente admissível pelo Sistema Processual Civil vigente, segundo o qual, na eventualidade de rejeição (improcedência) do pedido principal, há que ser apreciado o pedido posterior ou subsidiário. Por oportuno, pede vênia para transcrever a ementa de Acórdão proferido em ação similar pela C. Sétima Turma Especializada do Eg. TRF da 2ª Região, da Relatoria do E. Desembargador Reis Friede, publicado no DJU de 1º/07/2005, em que restou configurado que a não apreciação de todos os pedidos importa em julgamento citra petita, com a consequente declaração de nulidade da r. sentença. Que, assim, a ausência de manifestação expressa com relação aos temas destacados no capítulo anterior (II – Do mérito) caracteriza o que a melhor doutrina denomina de decisão infra ou citra petita. A seguir, cita jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a corroborar seu entendimento (id nº 355067140, pág.36). Aduz, na sequência, novamente, reiterando ponto já arguido, nestes mesmos embargos, que este Juízo (a) não observou na análise da AIH 3520109492636 que a própria beneficiária AMANDA CRISTINA DE SOUZA declarou à Operadora embargante que estava grávida no momento em que aderiu ao plano de saúde coletivo, dia 01/09/2019, e que o parto cesariano a que foi submetida (internação entre 03/04/2020 a 05/04/2020) não reportou qualquer intercorrência médica, o que afasta o caráter de urgência atribuído a este parto cesariano, e faz incidir o prazo de carência de 300 (trezentos) dias previsto na Clausula XV – Períodos de Carência, item 3, subitem 3.5, do contrato coletivo, que obsta a cobrança de ressarcimento ao SUS para tal procedimento, e de modo análogo para os procedimentos de parto verificados nas AIH´s 3520112151325 e 3520115047086. Reitera, esclarecendo os pontos já arguidos: Que este Juízo não se manifestou sobre as excludentes contratuais de caráter eletivo – apresentado para 22 (vinte e duas) APAC´s – e de não cobertura dos procedimentos de hormonioterapia – apresentado para 15 (quinze) APAC´s, que apenas foram citadas na fundamentação; Que deixou de se pronunciar sobre a cobrança do ressarcimento à luz do voto do Ex-Ministro Relator da ADI nº 1.931- DF e de sua natureza restitutória confirmada no julgamento do RE 597.064/RJ, bem como sobre o excesso de cobrança praticado pelo IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento em relação à Tabela do SUS para os mesmos procedimentos verificados nas 28 (vinte e oito) APAC´s / AIH´s abrangidas pela GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI; e Que incorreu em contradição com o entendimento firmado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça de que “é a partir da notificação da decisão do processo administrativo que se apura os valores a serem ressarcidos (constituição do crédito), uma vez que, somente a partir de tal momento, o montante de crédito será passível de ser quantificado” ao convalidar a cobrança de juros de mora estampada na GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI, posto que qualquer encargo relativo à mora somente é devido a partir do momento em que a dívida se torna exigível, o que se dá com sua constituição definitiva, com o trânsito em julgado da decisão administrativa. E que resta, portanto, configurada a violação ao artigo 1.022, incisos I e II, do CPC. Nesses termos, requer que o Juízo emita pronunciamento quanto as questões suscitadas, para fins de se evitar a nulidade do julgado, por negativa de prestação jurisdicional, nos termos do artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, e, principalmente, por ofensa aos princípios constitucionais do duplo grau de jurisdição e, consequentemente, do devido processo legal. Petição sob o Id nº 360308061: Apresenta a ANS, recurso de apelação, em face da sentença proferida nos autos. Foi certificada a tempestividade dos embargos de declaração (id nº 364945465) e proferido despacho, que determinou que, ante o caráter infringente dos embargos, fosse a ANS intimada a manifestar-se, no prazo de 10 (dez) dias (id nº 365688290). A ANS apresentou contrarrazões aos embargos declaratórios (Id nº 369399125, pág.15). Discorreu sobre os termos da sentença, aduzindo que a parte autora praticamente reescreveu a inicial, a pretexto de opôs embargos de declaração. Discorreu sobre os pontos arguidos pela embargante, e pugnou pela impossibilidade de rediscussão de mérito, em sede de embargos declaratórios, para pedir-se novo julgamento, contrário ao entendimento do Juízo. Pugnou, ante a inexistência de vícios na decisão embargada, pela aplicação da multa prevista no §2º, do artigo 1026, do CPC (Id nº 369399125, pág.15). Vieram os autos conclusos para decisão. É O RELATÓRIO. DECIDO. Inicialmente, observo que o artigo 1022, do Código de Processo Civil/2015 preceitua serem cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II- suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que: I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento; II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º. (...) No caso em tela, em que pese a extensa peça recursal apresentada pela parte embargante, não se vislumbram os aludidos vícios ali apontados. Traz-se a lume, todavia, para fins de efetiva compreensão da embargante, os pontos já abordados pelo Juízo, a título de esclarecimento, destacando os respectivos tópicos da sentença que abordaram os pontos suscitados: (...) ANÁLISE DAS AIHS 3520109492636, 3520112151325, 3520115047086 Observo que a sentença embargada apreciou este ponto, no item B, da fundamentação, verbis: (...) A-ATENDIMENTO REALIZADO EM TEMPO EM QUE O BENEFICIÁRIO AINDA NÃO HAVIA CUMPRIDO O PRAZO DE CARÊNCIA Sustenta a parte autora que em relação à beneficiária AMANDA CRISTINA DE SOUZA, esta se encontrava em carência para parto de internação, em 27/06/2020, e não teria cumprido o prazo de carência de 300 (trezentos) dias, conforme previsto na Clausula XV – Períodos de Carência, item 3, subitem 3.5, e no artigo 12, inciso V, alínea “a”, da Lei nº 9.656 de 1998. Que a beneficiária foi incluída no plano de saúde coletivo em 01/09/2019, e que ela apenas teria o procedimento de parto coberto a partir de 27/06/2020. E que tal situação ocorreu, ainda, em relação a outros dois atendimentos, sendo três, assim, as AIHs que devem ser excluídas do ressarcimento, ante o não cumprimento do período de carência: AIH´s nº 3520109492636, 3520112151325, 3520115047086. Conforme documentos juntados aos autos, e cópia fotográfica reproduzida na contestação da ANS (id nº 291593866, pag.12), verifica-se que a AIHs de atendimento em questão foram prestadas em caráter de urgência (a 1ª AIH, no período de 03/04/2020 a 05/04/2020, a 2ª, no período de 13/06/2020 a 15/06/2020, a 3ª, no período de 23/04/2020 a 24/04/2020, códigos de usuários: 375061330, 582000460 e 518001451). Sem razão, igualmente, a parte autora, uma vez que, tal como assentado, quanto ao atendimento fora da área geográfica, nos termos do artigo 12, V, alínea 'c', e artigo 35-C, da Lei n. 9.656/1998, com redação vigente à época dos atendimentos questionados, é obrigatória a cobertura do atendimento nos casos de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizada em declaração do médico assistente, e de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações do processo gestacional. Dessume-se dos referidos dispositivos legais a obrigatoriedade do plano de saúde ao atendimento de seus beneficiários em caráter emergencial, ainda que no prazo de carência. Nesse mesmo sentido, já se manifestou igualmente, o TRF-3: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. OPERADORAS DE PLANO DE SAÚDE. RESSARCIMENTO AO SUS. CONSTITUCIONALIDADE VIABILIDADE DA COBRANÇA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. APLICAÇÃO DO DECRETO 20.910/1932. TABELA TUNEP. LEGALIDADE. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. - Relativamente à questão da prescrição da cobrança de dívida decorrente do ressarcimento ao SUS, verifica-se que a prescrição a ser aplicada na hipótese é a quinquenal, em virtude do que dispõe o Decreto 20.910/32, consoante remansosa jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Regional. - Da mesma forma, uma vez que só se pode falar em ressarcimento após a notificação do devedor acerca da decisão administrativa, a prescrição somente começa a correr a partir dessa, não havendo de se argumentar, no caso em apreciação, tampouco da ocorrência de prescrição quinquenal. - Ademais, não houve paralisação do processo administrativo por mais de 05 anos, não havendo de se cogitar eventual prescrição intercorrente. - Superada tal questão, cumpre esclarecer que o C. Supremo Tribunal Federal decidiu, quando do julgamento da ADI 1931 MC/DF, da Relatoria do Exmo. Ministro Maurício Corrêa, pela constitucionalidade do artigo 32 da Lei nº 9.656/98, a qual, alterada pela Medida Provisória nº 2.177-44/01, impõe às sociedades operadoras de serviços de saúde o ressarcimento ao SUS das despesas geradas por usuários de seus planos privados. - Assim, o contrato celebrado pelo consumidor com a operadora de plano de saúde acarreta para essa última a obrigação de arcar com as despesas oriundas da relação contratual. Logo, quando a entidade privada não suprir as necessidades do indivíduo contratante, obriga-se a ressarcir aquele que prestar o serviço em seu nome, sob pena de enriquecimento sem causa e geração de custos à sociedade, estranha ao contrato, em afronta ao disposto no artigo 199, § 2º, da Constituição Federal. - Daí porque, à evidência, restam afastados os argumentos acerca da inconstitucionalidade e a ofensa ao princípio da legalidade das disposições constantes do art. 32 da Lei nº 9.656/98 por necessidade de edição de lei complementar, por violação ao caráter suplementar da participação das operadoras privadas de plano de saúde ou por violação à livre iniciativa. - Da mesma maneira, não se afigura eventual violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa nas resoluções que regem o instituto. O procedimento que rege a cobrança, no âmbito administrativo, é levado a cabo após a apreciação definitiva dos recursos apresentados pelos interessados, a quem é oferecida oportunidade de impugnação ampla. - Ademais, as especificidades apontadas no recurso também não justificam o provimento do apelo. - Realmente, não procedem as alegações de insubsistência da cobrança do ressarcimento ao SUS fundamentadas nas questões fáticas/contratuais apresentadas pela autora – a) atendimentos realizados fora da área de abrangência contratada pelos usuários; b) atendimentos realizados sem prévia autorização, por mera liberalidade dos usuários e fora da rede credenciada; c) procedimentos que não têm cobertura; d) atendimentos realizados quando do cumprimento de período de carência. - Ao que se infere da documentação colacionada, tais atendimentos/tratamentos foram realizados em regime de emergência e urgência, conclusão esta que não restou afastada, nem assim o poderia, pelas meras alegações da parte, a quem incumbia o ônus de afastar a presunção de veracidade e legalidade dos atos administrativos combatidos. - Nesses termos, incide na hipótese a conclusão de que tais atendimentos não estavam afastados da cobertura dos respectivos planos de saúde, nos termos das resoluções e disposições legais aplicáveis (arts. 12 e 35-C da Lei nº 9.656/98). - Agregado o fato, de que a indicação da exclusão de pacientes do plano de saúde da requerida anteriormente ao atendimento realizado pelo SUS não foi demonstrada pela apelante, e, nos termos da sentença, deve ser rejeitada por ausência de qualquer instrução processual, não tendo, dessa forma, o condão de afastar a presunção de legitimidade e veracidade das CDAs. impugnadas. - No tocante à aplicação da Tabela TUNEP, nos termos da jurisprudência uníssona desta Corte Regional, não se verifica nela qualquer ilegalidade, tendo sido implementada pela ANS por conta de seu poder regulatório, nos termos dos §§ 1º e 8º do art. 32 da Lei nº 9.656/98. - Não prosperam também as alegações de retroatividade da Lei nº 9.656/1998, visto que as cobranças que a autora pretende afastar referem-se a atendimentos realizados após a vigência da lei de regência, sendo irrelevante que os contratos de saúde que geraram as cobranças de ressarcimento tenham sido firmados anteriormente, visto tratar-se de relação entre a apelante e o Estado. - Assim, de ser mantido o julgamento a quo de rejeição dos presentes embargos à execução, devendo subsistir a Execução Fiscal n° 003460-12.2014.4.03.6102. - Recurso não provido (TRF da 3ª Região, ApCiv/SP n. 0005100-16.2015.4.03.6102, Quarta Turma, Rel. Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE, J. 22/09/2023, Intimação via sistema DATA: 02/10/2023). De rigor, assim, a manutenção das referidas cobranças, na GRU em questão. (...) Assim, não se vislumbra eventual vício, na decisão embargada o tocante à segurada e AIHs, em questão. B- OMISSÃO SOBRE EXCLUDENTES CONTRATUAIS: de caráter eletivo – apresentado para 22 (vinte e duas) APAC´s – e de não cobertura dos procedimentos de hormonioterapia – apresentado para 15 (quinze) APAC´s, que apenas foram citadas na fundamentação Referida questão foi enfrentada expressamente na decisão embargada, no item específico sobre o tema. Senão, vejamos: (...) VII- INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO CONTRATUAL DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO, EM RAZÃO DO CARÁTER ELETIVO DO ATENDIMENTO Aduz a parte autora a inexistência à obrigação contratual de cobertura do procedimento em razão do caráter eletivo do atendimento, conforme AIH´s nsº 3520221435467, 3520235397272, (hemodiálise); 3520221645688 (hormonioterapia), 3520221911338 (quimioterapia), 3520221911734 (hormonioterapia), 3520221911734 (hormonioterapia), 3520221922844 (hormonioterapia de carcinoma avançado); 3520235152038, 3520235152038, 3520239866088 (hormonioterapia de adenocarcinoma de próstata avançado); 3520235408790, 520235408800 (hormonioterapia de carcinoma de mama em estágio III); 3520235409669 (hormonioterapia de carcinoma de mama em estágio I); 3520239626046 (hormonioterapia do carcinoma de mama avançado); 3520239617720 (facoemulsificação com implante de lente intra-ocular dobrável); 3520239624979 (quimioterapia de doença mieloproliferativa rara). Em relação aos procedimentos relacionados à Hormonioterapia, houve expressa decisão administrativa do dever de ressarcimento, em razão de se tratar de procedimento de cobertura obrigatória, na época do atendimento, nos termos da decisão administrativa (id nº 291593866, pag.12). A mesma conclusão se dá em relação aos procedimentos de quimioterapia, hemodiálise e da facoemulsificação, uma vez que na seara administrativa sequer foi ventilada a tese de atendimento eletivo, sendo as impugnações oferecidas sob fundamentos de inconstitucionalidade do art. 32, da Lei nº 9.656/98 ou, então de cobertura parcial e/ou beneficiário em carência, o que restou da mesma forma afastado. Assim, não se vislumbra a alegada omissão, no caso. C- OMISSÃO SOBRE A COBRANÇA do ressarcimento à luz do voto do Ex-Ministro Relator da ADI nº 1.931-DF e de sua natureza restitutória confirmada no julgamento do RE 597.064/RJ, bem como, sobre o excesso de cobrança praticado pelo IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento em relação à Tabela do SUS para os mesmos procedimentos verificados nas 28 (vinte e oito) APAC´s / AIH´s abrangidas pela GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI; e Sem razão, a parte autora, eis que a sentença, de forma fundamentada não acolheu a sua tese de que haveria excesso no IVR, repetida agora nos embargos, verbis: (...) “IX- ÍNDICE IVR – ÍNDICE DE VALORAÇÃO DO RESSARCIMENTO Sustenta a parte autora, ainda, a ilegalidade de IVR – Índice de Valoração do Ressarcimento, utilizada para a cobrança das 28 Autorizações de Procedimento Ambulatorial (APAC´S)/ AIHS (Autorizações de Internação Hospitalar), abrangidas pela GRU nº 2941204000711393, e o excesso de cobrança promovido pelo índice IVR. Sustenta a autora que a base de cálculo, para se exigir o ressarcimento ao SUS é o total da importância por este gasta em cada um dos atendimentos, sob pena da inobservância violar o disposto no artigo 884 do Código Civil, e que, por conseguinte, não é possível que a Autarquia Ré venha a cobrar ditos créditos com base no chamado IVR, índice instituído sem qualquer parâmetro para todos os eventos, sem qualquer respeito ao caráter indenizatório do instituto jurídico em referência, preconizado unanimemente pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento de processo da ADI 1931-8-DF. Ademais, aduziu que a ANS não explicou quais foram as bases para a instituição do IVR, bem como quais as variações que culminaram na estipulação de tal índice no importe de ‘1,5 (um vírgula cinco), e que a incerteza e obscuridade denunciadas colidem com o disposto no artigo 37, da Constituição Federal, que preceitua que a administração pública deve, em seus atos, primar pela observância dos princípios da legalidade e da publicidade. Que, além de tais princípios, a administração pública também deve observar o princípio da razoabilidade previsto no artigo 2º, da Lei 9.784/1999. No entanto, a malsinada Resolução Normativa RN nº 251 desrespeitou frontalmente tais princípios, de forma que há um excesso de cobrança, no importe de R$ 7.712,01 (sete mil, setecentos e doze Reais e um centavos), conforme planilha que juntou, diferença entre o IVR e a tabela do SUS (id nº 310689031, pag.48). Sem razão, todavia, a parte autora. Observo que o artigo 32 da Lei n. 9.656/1998 atribuiu à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a implementação da tabela de procedimentos e valores que servirão de base para o ressarcimento ao SUS, observando-se as previsões contidas no aludido diploma normativo. Nessa senda, no exercício da competência atribuída pelo artigo 32 da Lei n. 9.656/1998, a Diretoria Colegiada da ANS editou a Resolução n. 17, de 30/03/2000, instituindo a Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos (TUNEP), que foi sendo atualizada por meio de Resoluções posteriores. Acresça-se, ainda, que a Lei n. 9.961/2000, criadora da Agência Nacional de Saúde Suplementar, dispõe em seu artigo 4º, inciso VI, a competência da agência reguladora para “estabelecer normas para ressarcimento ao Sistema Único de Saúde – SUS”. Assim, considerando-se as atribuições da ANS de regulamentar, fiscalizar e controlar as ações e os serviços de saúde, bem como a previsão contida nas Leis ns. 9.656/1998 e 9.961/2000, não se verifica violação do princípio da legalidade na edição da TUNEP. Acerca do Índice de Valoração do Ressarcimento (IVR), insta consignar que foi implementado com base no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS), o qual contém informações sobre os gastos públicos em saúde, nas três esferas de governo. O cálculo do IVR não se baseia apenas no valor nominal da prestação do serviço ou valor do procedimento, mas leva em consideração todas as despesas envolvidas no atendimento do beneficiário do plano de saúde, seja de forma direta ou indireta. Desse modo, não há qualquer ilegalidade na aplicação do IVR para o cálculo dos valores a serem ressarcidos. Frise-se, ainda, que a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar que os valores exigidos com a utilização do IVR, de fato excedem a média de valores cobrados pelas operadoras de planos de saúde, o que afrontaria o parágrafo 8º, do artigo 32 da Lei n. 9.656/1998, limitando-se a fazer afirmações genéricas e exemplificativas que não se prestam para afastar todo o trâmite (inclusive com a participação pública) para a confecção das referidas normas. Nesse sentido, já se manifestou a E. Quarta Turma do TRF-3, verbis: ADMINISTRATIVO. AÇÃO SOB O RITO ORDINÁRIO. RESSARCIMENTO AO SUS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO APTA A ILIDAR A PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS. TABELA TUNEP. IVR. LEGALIDADE. I – Com o ressarcimento ao SUS o Estado busca a reparação pelo atendimento prestado, evitando-se o enriquecimento sem causa do privado à custa da prestação pública do serviço à saúde, tem natureza ressarcitória (compensatória), busca também a concretização de outros princípios de fonte constitucional, como o da solidariedade e do Estado Democrático, revelando-se um instrumento para o exercício da função regulatória do Estado sobre o mercado de Saúde Suplementar. Precedentes desta E. Corte. II – À vista da presunção da legitimidade dos atos administrativos, cabia à apelante provar que os atendimentos referentes às AIHs em questão não se enquadram nas situações previstas em lei, ônus do qual não se desincumbiu. III - No caso em tela, a apelante não especificou em seu recurso quais atendimentos foram realizados fora da área de abrangência geográfica do contrato nem quais se referem a beneficiários em período de carência. Além disso, não trouxe aos autos qualquer documentação referente aos contratos para comprovar qual a área de abrangência dos mesmos, nem quais os prazos de carência, devendo ser mantida, portanto, a sentença. IV A tabela TUNEP foi criada e aprovada pela Resolução do Conselho de Saúde Complementar nº 23/99, que foi concebida a partir de um processo participativo e consensual, desenvolvido no âmbito da Câmara da Saúde Suplementar, no qual foram envolvidos gestores estaduais e municipais do SUS, representantes das operadoras e das unidades prestadoras de serviços integrantes do SUS. A Tabela TUNEP não possui qualquer ilegalidade e foi implementada pela Agência Nacional de Saúde (ANS) a partir de seu poder regulador do mercado de saúde suplementar, §§ 1º e 8º do artigo 32 da Lei nº 9.656/98, portanto, não se revelando desarrazoados ou arbitrários. V - Em relação à utilização do IVR, denota-se que a sua construção foi implementada com base no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS), que traz informações sobre os gastos públicos em saúde, divididos nas três esferas de governo. VI - O IVR é calculado tendo por base o quanto representa os gastos administrativos em relação às despesas com assistência hospitalar e ambulatorial, sendo que, a partir dos dados apresentados pelos municípios e estado para os anos de 2002 a 2009, foi encontrado o IVR no valor de 1,5. Ou seja, no cálculo não se leva em conta apenas os gastos assistenciais, mas também outros diretos e indiretos envolvidos no atendimento, não havendo qualquer ilegalidade na utilização desse índice. VII - Em razão da manutenção da improcedência da ação, deve ser acolhido o pleito da apelada para aplicação da regra do § 11 do art. 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários advocatícios arbitrados na sentença em 1%. VIII – Recurso de apelação da autora improvido. Acolhido o pedido da apelada, em sede de contrarrazões, para majoração dos honorários advocatícios (sucumbência recursal). (TRF 3ª Região, 4ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL - 5002213-33.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, j. 26/03/2024, DJEN: 10/04/2024) ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. RESSARCIMENTO AO SUS. ARTIGO 32 DA LEI Nº 9656/98. CONSTITUCIONALIDADE. ILEGALIDADE DA TABELA TUNEP E IVR. NÃO CONFIGURADA. PRESCRIÇÃO. NÃO CONSTATADA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ASSEGURADO. VIGÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. - No julgamento da ADIn nº 1931-8/DF, o STF limitou-se a declarar a inconstitucionalidade dos artigos 10, § 2º, e 35-E da Lei n. º 9.656/1998, bem como do art. 2º da Medida Provisória n. 2.177-44/200. - O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 597064, representativo da controvérsia, declarou constitucional o ressarcimento previsto no artigo 32 da Lei n.º 9.656/98, o qual é aplicável aos procedimentos médicos, hospitalares ou ambulatoriais custeados pelo SUS e posteriores a 04.06.1998, assegurados o contraditório e a ampla defesa, no âmbito administrativo, em todos os marcos jurídicos (Plenário, 07.02.2018). - Os valores da TUNEP e do IVR decorrem de deliberação da Diretoria Colegiada da ANS, com a participação da Câmara Técnica, que busca estabelecer um diálogo entre a agência reguladora e os membros da Câmara de Saúde Suplementar, o que inclui a participação de representantes das operadoras de planos de saúde, realizada mediante procedimento administrativo e considera todos os custos suportados pelo SUS no referido atendimento. -O prazo de prescrição é quinquenal nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública. Pelo princípio da isonomia, o mesmo prazo deve ser aplicado no presente pleito, cujo entendimento está de acordo com a sistemática da cobrança de créditos não tributários da fazenda pública. O termo inicial da prescrição deve ser contado da notificação para pagamento após apurado o quantum debeatur pela administração. - As normas emanadas da ANS estabelecem os procedimentos administrativos de impugnação da cobrança, a fim de permitir às operadoras a sua defesa quanto à inexigibilidade do ressarcimento, de modo que os argumentos do recorrente não comprovam violação do princípio da legalidade, mas, tão somente, exprimem a sua insatisfação com a estrutura estabelecida pela autarquia. - As AIH estão de acordo com a vigência da Lei n.º 9.656/1998, pois não é a celebração do contrato o fato gerador da cobrança e sim o efetivo atendimento por meio do SUS de paciente possuidor de plano de saúde. - Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, APELAÇÃO CÍVEL - 2292220 - 0015809-53.2014.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, j. 15/08/2018, e[1]DJF3 17/09/2018 De rigor, assim, a rejeição da alegação de obscuridade ou contradição, na abordagem do item atinente a ilegalidade do índice IVR ou de cobrança em excesso. D- Contradição com o entendimento firmado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça de que “é a partir da notificação da decisão do processo administrativo que se apura os valores a serem ressarcidos (constituição do crédito), uma vez que, somente a partir de tal momento, o montante de crédito será passível de ser quantificado” ao convalidar a cobrança de juros de mora estampada na GRU nº 29412040007113937 - 86º ABI, posto que qualquer encargo relativo à mora somente é devido a partir do momento em que a dívida se torna exigível, o que se dá com sua constituição definitiva, com o trânsito em julgado da decisão administrativa. Sem razão, a embargante, todavia, não havendo contradição na sentença, pelo simples fato de não anuir com o pedido da embargante, em relação aos juros de mora, tendo sido dedicado um capítulo especial para o tema, verbis: (...) “IX- ILEGALIDADE DA COBRANÇA DE JUROS DE MORA – NA GRU 29412040007113937 DURANTE O PROCESSO ADMINISTRATIVO DE APURAÇÃO DO DÉBITO DE RESSARCIMENTO AO SUS Sustenta a autora que a ré aplica expediente arbitrário e ilegal, decorrente da incidência dos juros de mora no processo administrativo de cobrança do ressarcimento ao SUS no sentido de desestimular as Operadoras na apresentação de defesas e recursos administrativos. Que, ademais disso, à luz do que dispõe o artigo 394 do Código Civil, a cobrança dos juros de mora praticada pela Autarquia Ré não tem como prevalecer, posto que referido dispositivo aduz que a mora só ocorre quando o devedor não efetua o pagamento, ou quando o credor se recusa a receber no local, no local e na forma ajustada. E que, nos termos dos § 3º e § 4º do artigo 32, da Lei 9.656/1998, para a aplicação respectivamente de juros de mora e de multa moratória, há necessidade de que a Operadora não realize o pagamento do ressarcimento até o 15 (decimo quinto) dia da data de recebimento da notificação de cobrança feita pela ANS, a qual somente poderá ser expedida pela Autarquia ao final do processo administrativo. E que, dessa forma, temos que a Resolução Normativa nº 377, de 08/05/2015, viola frontalmente os parágrafos 3º e 4º do artigo 32 da Lei 9.656/1998, que disciplina que os juros de mora e multa de mora só serão contados no mês seguinte ao do vencimento. Aduz que, assim, deve ser afastada a cobrança dos juros de mora, no valor de R$ 4.217,69 (quatro mil, duzentos e dezessete reais e sessenta e nove centavos), contados desde o final do prazo para oferecimento de impugnação administrativa referente a esta GRU. Sem razão, todavia, a parte autora. A alegação da ilegalidade da incidência dos juros moratórios não merece prosperar, tendo em vista que o acréscimo encontra previsão expressa no multicitado art. 32, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 9.656/98: (...) § 3º. A operadora efetuará o ressarcimento até o 15º (décimo quinto) dia da data de recebimento da notificação de cobrança feita pela ANS. § 4º. O ressarcimento não efetuado no prazo previsto no § 3º será cobrado com os seguintes acréscimos: I - juros de mora contados do mês seguinte ao do vencimento, à razão de um por cento ao mês ou fração; II - multa de mora de dez por cento. (...) Observa-se que, a alínea "b" do § 1º, do art. 33 da RN n.º 358, de 27 de novembro de 2014, incluído pela RN nº 377, de 08 de maio de 2015, somente replica, sob outra forma, a semântica legal em questão: Art. 33. A notificação da OPS, na forma do art. 20 desta Resolução, fixa a data de vencimento do prazo para pagamento do valor devido para ressarcimento ao SUS, que ocorre pelo decurso de 15 (quinze) dias, após o fim do prazo de impugnação, previsto no art. 21 desta Resolução. § 1º. A apresentação de impugnação ou de recursos tempestivos no curso do processo suspende a exigibilidade do crédito de ressarcimento ao SUS, mantendo-se inalterada: a) a sua data de vencimento descrita no caput; e b) a fluência dos juros de mora. Observo que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça entende que não obstante a discussão administrativa sobre a exigibilidade do crédito público, os respectivos encargos moratórios são devidos desde o vencimento do prazo original de pagamento, notadamente porque a interposição de recurso administrativo não tem aptidão de alterar a data inicial de vencimento do crédito, verbis: TRIBUTÁRIO. PROCESSOS ADMINISTRATIVOS EM DISCUSSÃO NO CARF. PROCESSOS PENDENTES HÁ MAIS DE 360 (TREZENTOS E SESSENTA) DIAS. NÃO EXCLUSÃO DOS JUROS DE MORA. PROVIDÊNCIA QUE ESTÁ CONDICIONADA AO DEPÓSITO DO VALOR DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DEFLAGRAÇÃO DE OPERAÇÃO DA POLÍCIA FEDERAL. PARALISAÇÃO TEMPORÁRIA DA ATUAÇÃO DO CARF. MATÉRIA DECIDIDA MEDIANTE FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO. NÃO CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE ANALISAR QUESTÕES NÃO PREQUESTIONADAS OU DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Na origem, Mandado de Segurança postulando a suspensão da incidência de juros de mora sobre créditos tributários em discussão no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) há mais de 360 (trezentos e sessenta) dias ou que tiveram seu julgamento suspenso em decorrência da "Operação Zelotes", procedimento deflagrado pela Polícia Federal que levou o Ministério da Fazenda a paralisar temporariamente as atividade do órgão. 2. Mantendo a sentença de primeiro grau, o Tribunal de origem rejeitou a pretensão sob o fundamento de que a instauração do processo administrativo fiscal suspende a exigibilidade do crédito, mas, "para desincumbir-se dos juros de mora, o contribuinte deve realizar o depósito do montante integral [...] No caso em análise, não há notícia de depósito do montante integral para fins de não imputar ao contribuinte os juros moratórios incidentes durante o período de pendência do processo administrativo" (fl.278, e-STJ). AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO 3. Não se constata omissão no acórdão que decidiu os Embargos de Declaração opostos na origem. 4. Consignou-se no aresto que "o art. 24 da Lei n° 11.457/2007 faz referência ao prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a ser observado pela Administração Pública [...] não havendo menção expressa aos casos de exclusão dos juros e/ou da correção monetária quando do descumprimento daquele prazo" (fls. 279-280, e-STJ). 5. Afirmou-se ainda no julgado que, "em relação ao pedido de suspensão dos juros devido à paralisação do CARF como consequência da 'Operação Zelotes', deflagrada em 26.03.2015, com o objetivo desarticular suposta organização criminosa atuante naquele Conselho [...], somente o depósito do montante integral é causa de impedimento da incidência dos juros de mora, que ocorre 'ex lege', (artigo 151, II, c.c art. 156, VI, do CTN) certo que não consta dos autos que a empresa impetrante tenha procedido nesse sentido" (fl. 280, e-STJ). 6. Não se configura a ofensa aos arts. 489, § 1º, e 1.022 do Código de Processo Civil/2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado. PENDÊNCIA DE DECISÃO HÁ MAIS DE 360 (TREZENTOS E SESSENTA DIAS): AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO À EXCLUSÃO DOS JUROS 7. A previsão do art. 24 da Lei 11.457/2007 não dá suporte à pretensão da recorrente, porquanto a norma não versa sobre juros: apenas torna obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte. 8. O que esse preceito estabelece é o direito a uma decisão dentro do prazo nele previsto. 9. Quanto aos juros, o dispositivo que regula o tema é o art. 161 do Código Tributário Nacional, do qual o Superior Tribunal de Justiça extrai o seguinte sentido: "para desincumbir-se dos juros de mora, o contribuinte deveria ter realizado o depósito do montante integral do crédito, nele incluídos os juros de mora até a data do depósito" (REsp 1847706/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 12.5.2020). Na mesma linha: AgInt no REsp 1.638.268/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 1.3.2017; REsp 1.033.296/MG, Relator Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 1.12.2008. (...) CONCLUSÃO 15. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta extensão, não provido. (REsp n. 1.889.631/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24/11/2020, DJe de 18/12/2020.) Não se vislumbra, assim, ilegalidade na cobrança de juros de mora, na GRU nº 29412040007113937, durante o processo administrativo de apuração.” (...) Assim, devem ser rejeitados os presentes embargos declaratórios, ante a inexistência de omissão, contradição ou obscuridade. No mais, é de se considerar que é pacífico o entendimento de que os embargos de declaração destinam-se a sanar as contradições intrínsecas do pronunciamento judicial (error in procedendo), e não sua suposta injustiça ou contradições extrínsecas (error in iudicando) entre o pronunciamento judicial e disposições legais ou a prova dos autos. Inexistente, assim, nas 38 laudas, em que praticamente reescreve a embargante a inicial, qualquer vício no julgado em questão, verificando-se que a parte autora/embargante insurge-se contra o próprio mérito da decisão, forçoso concluir que o que busca é a alteração do julgado, com modificação da decisão de mérito, o que não é possível nesta escorreita via, porquanto, como é cediço, os embargos declaratórios não possuem o efeito infringente do julgado, o que deverá ser buscado na via recursal apropriada. Nesse sentido: RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC. CONCESSÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. OFENSA CARACTERIZADA. 1. Os embargos de declaração são cabíveis somente quando o provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade, nos ditames do art. 535, incisos I e II, do CPC, ou revele patente a ocorrência de erro material. 2. Apenas excepcionalmente admite-se que os embargos de declaração - espécie recursal ordinariamente integrativa - tenha efeitos modificativos, sendo imprescindível, para tanto, a constatação da presença dos referidos vícios, cuja correção importe necessariamente em alteração da conclusão jurisdicional impugnada. 3. A simples mudança de entendimento do tribunal de origem acerca de matéria anteriormente apreciada, ausentes erro material, omissão, contradição ou obscuridade, não autoriza a atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração. Precedentes. 4. Recurso especial provido." (STJ, Recurso Especial nº 1.523.256-BA, Terceira Turma, Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19.5.2015). E: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. RECEBIMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO COM PEDIDO DE EFEITO MODIFICATIVO COMO MERO PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 538 DO CPC. RECURSO PROVIDO. 1. Configura violação ao art. 538 do CPC o recebimento de embargos de declaração como mero "pedido de reconsideração", ainda que contenham nítido pedido de efeitos infringentes. 2. Tal descabida mutação: a) não atende a nenhuma previsão legal, tampouco aos requisitos de aplicação do princípio da fungibilidade recursal; b) traz surpresa e insegurança jurídica ao jurisdicionado, pois, apesar de interposto tempestivamente o recurso cabível, ficará à mercê da subjetividade do magistrado; c) acarreta ao embargante grave sanção sem respaldo legal, qual seja a não interrupção de prazo para posteriores recursos, aniquilando o direito da parte embargante, o que supera a penalidade objetiva positivada no art.538, parágrafo único, do CPC. 3. A única hipótese de os embargos de declaração, mesmo contendo pedido de efeitos modificativos, não interromperem o prazo para posteriores recursos é a de intempestividade, que conduz ao não conhecimento do recurso. 4. Assim como inexiste respaldo legal para se acolher pedido de reconsideração como embargos de declaração, tampouco há arrimo legal para se receber os aclaratórios como pedido de reconsideração. Não se pode transformar um recurso taxativamente previsto no art. 535 do CPC em uma figura atípica, "pedido de reconsideração", que não possui previsão legal ou regimental. 5. Recurso especial provido. (REsp 1522347/ES, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/09/2015, DJe 16/12/2015). DISPOSITIVO: Ante o exposto, conheço dos embargos de declaração, posto que tempestivos, para, no mérito, REJEITÁ-LOS, ante a inexistência dos alegados vícios apontados pela embargante, restando mantida a sentença, tal como proferida. Intime-se a parte autora a apresentar contrarrazões ao recurso de apelação ofertado pela ANS, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do §1º, do artigo 1010, do CPC. Após, remetam-se os autos ao E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com as formalidades de praxe. P.R.I. São Paulo, data da assinatura eletrônica. CRISTIANE RODRIGUES FARIAS DOS SANTOS Juíza Federal

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