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Processo nº 1031826-56.2023.4.01.0000

ID: 322210251

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1031826-56.2023.4.01.0000

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES POSTO DA MATA LTDA

Acórdão

Advogados:

FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1031826-56.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 1064473-89.2023.4.01.3400 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) POLO ATIVO: UNIÃO FEDERAL… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1031826-56.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 1064473-89.2023.4.01.3400 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) POLO ATIVO: UNIÃO FEDERAL POLO PASSIVO:CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES POSTO DA MATA LTDA REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A RELATOR(A):RAFAEL PAULO SOARES PINTO PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) n. 1031826-56.2023.4.01.0000 R E L A T Ó R I O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pela UNIÃO FEDERAL contra decisão que, nos autos da ação ordinária ajuizada por Centro de Formação de Condutores Posto da Mata Ltda., deferiu pedido de tutela de urgência para suspender os efeitos da Portaria nº. 238/2014-DENATRAN, autorizando a parte autora a exercer suas atividades sem a exigência de uso de sistema de monitoramento eletrônico. A agravante sustenta, em síntese, que a decisão recorrida desconsiderou os requisitos legais para a concessão de medida antecipatória, especialmente quanto à vedação de esgotamento do objeto da lide, à ausência de reversibilidade da medida e à inexistência de plausibilidade jurídica da pretensão inicial. Argumenta que o CONTRAN possui competência legal para regulamentar o processo de formação de condutores, inclusive quanto à estrutura e requisitos das aulas práticas, sendo legítima e legal a regulamentação técnica infralegal emanada da Portaria nº 238/2014-DENATRAN, à luz do disposto nos arts. 12, incisos I, X e XV, e 141 do Código de Trânsito Brasileiro. Afirma, ainda, que a norma não impõe aquisição de equipamentos específicos, permitindo soluções compartilhadas e itinerantes, sem ferir a livre concorrência. Em contrarrazões, o agravado sustenta que a Portaria nº 238/2014-DENATRAN extrapola os limites do poder regulamentar, inovando o conteúdo da Resolução nº 493/2014 (revogada pela Resolução nº 789/2020), ao impor obrigações como a anotação e a transmissão eletrônica de relatórios, além do videomonitoramento das aulas, sem respaldo legal. Argumenta que, sendo o DENATRAN órgão meramente executivo, não possui competência normativa para editar tal exigência, e que tanto o TRF1 quanto outras Turmas do Tribunal vêm reconhecendo o vício de legalidade e de competência desses atos normativos. Ressalta que os custos impostos pelas exigências afetam diretamente a atividade econômica dos CFCs e que a decisão agravada encontra amparo em jurisprudência consolidada da Corte. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) n. 1031826-56.2023.4.01.0000 V O T O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): Inicialmente, revela-se cabível o presente Agravo de Instrumento, nos termos do art. 1015, I do Código de Processo Civil - CPC, eis que desafia decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória, razão pela qual admito o presente recurso. A controvérsia versa sobre a legalidade da Portaria nº. 238/2014-DENATRAN, especialmente no que se refere à exigência de sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção de dados relativos às aulas práticas ministradas pelos Centros de Formação de Condutores – CFCs. O artigo 12 do Código de Trânsito Brasileiro, em seus incisos I, X e XV, estabelece que a competência para normatizar o processo de formação de condutores, incluindo conteúdo didático-pedagógico, avaliações e fiscalização, é do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, órgão normativo e coordenador do Sistema Nacional de Trânsito. O DENATRAN, por sua vez, possui natureza executiva, incumbindo-lhe a execução e cumprimento da legislação de trânsito, e o estabelecimento apenas de procedimentos sobre aprendizagem e habilitação de condutores de veículos, a teor do art. 19 do CTB. Assim, ao editar a Portaria nº 238/2014, introduzindo obrigações que não constam da Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de videomonitoramento e a transmissão eletrônica de dados em tempo real, extrapolou as funções legais que lhe são atribuídas, tendo em vista que a referida Resolução determinou somente a recepção eletrônica do relatório e não a anotação e transmissão de dados. A atividade regulamentar dos órgãos executivos está subordinada aos limites estabelecidos na legislação. Não se admite, portanto, inovação normativa autônoma por parte de órgãos administrativos sem delegação expressa da norma legal superior, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade. Em casos semelhante, confiram-se os seguintes precedentes: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO. PORTARIA N.º 238/2014 DO DENATRAN. INSTRUÇÃO 602/2015 DO DETRAN/DF. LEGITIMIDADE DA UNIÃO. PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Discute-se nos autos a legalidade da Portaria do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) n.º 238/2014 e, por conseguinte, da Instrução n.º 602/2015 do DETRAN/DF, que trouxe a exigência de implantação de sistema de "monitoramento eletrônico" por vídeo para aprendizagem e habilitação de condutores de veículos automotores, impondo despesas e obrigações de incorporação de tecnologias que repercutem no equilíbrio econômico-financeiro dos empreendimentos privados, que mantêm os centros de formação de condutores. 2. A legitimidade da União para compor polo passivo da presente ação é justificada pela discussão da legalidade da Portaria n.º 238/2014 do DENATRAN (órgão com atribuição executiva, subordinado à Secretaria Executiva do Ministério da Infraestrutura), que trouxe a possibilidade de os órgãos executivos de trânsito editarem normas e rotinas complementares acerca do sistema eletrônico relativo às aulas de prática de direção veicular. 3. O Código de Trânsito Brasileiro define a composição e competência dos órgãos que integram o Sistema Nacional de Trânsito, atribuindo ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) a coordenação e normatização dos procedimentos sobre aprendizagem de condutores, e ao DENATRAN, o cumprimento e execução da legislação de trânsito. Ao contrário do CONTRAN, que possui poder regulamentar com limite na própria lei que lhe atribui competência, o DENATRAN, sendo órgão meramente executivo, extrapola as funções delineadas no Código de Trânsito Brasileiro ao pretender regulamentar o sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção dos relatórios de avaliação elaborados pelos instrutores relativos às aulas de prática de direção veicular. 4. De igual modo, os DETRANS são reconhecidos como órgãos de atribuição nitidamente administrativa, sem delegação para o exercício do poder regulamentar. O DETRAN/DF, ao editar a Instrução 602/2015, com apoio na Portaria do DENATRAN n.º 238/2014, extrapolou as atribuições fixadas pelo art. 22 da Lei n.º 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), que lhe atribui a função de "realizar, fiscalizar e controlar o processo de formação, aperfeiçoamento, reciclagem e suspensão de condutores, expedir e cassar Licença de Aprendizagem, Permissão para Dirigir e Carteira Nacional de Habilitação, mediante delegação do órgão federal competente". 5. Por tais razões, diante de evidente violação ao princípio da reserva legal, mostra-se razoável suspender os efeitos da Portaria DENATRAN n.º 238/2014 e da Instrução 602/2015 do DETRAN/DF, de modo que a parte autora possa exercer suas atividades de prestação de serviços de ensino para aprendizagem de condutores de veículos automotores, sem a exigência de uso do monitoramento eletrônico. 6. A legislação de regência carece de previsão no que diz respeito à obrigatoriedade de implementação de sistema de monitoramento eletrônico, sendo, portanto, inadmissível que instrumento infralegal venha instituir a obrigação sem a correspondente previsão legal 7. Diante de tal cenário, comprovado o cumprimento da tutela de urgência, nada mais resta a ser deliberado, nestes autos 8. Apelação desprovida” (AC 1035362-02.2019.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL ROSANA NOYA ALVES WEIBEL KAUFMANN, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 28/03/2025 PAG) “DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO DE TRÂNSITO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. SISTEMA ELETRÔNICO DE MONITORAMENTO REMOTO NAS AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN E DETRAN/GO. ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo DETRAN/GO contra sentença que reconheceu a inexigibilidade do uso de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, previsto na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e na Portaria nº 43/2020 do DETRAN/GO. 2. A questão central consiste em definir a legalidade da exigência de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, estabelecida por portarias do DENATRAN e DETRAN/GO, à luz da superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN. 3. O Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97) estabelece distinção clara entre as competências dos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito, cabendo ao CONTRAN estabelecer normas regulamentares e ao DENATRAN apenas estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN extrapolou os limites do poder regulamentar ao instituir sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas, criando obrigação não prevista no CTB ou em Resolução do CONTRAN. 5. A superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN não convalida os atos normativos questionados, pois embora preveja controle informatizado, não autoriza expressamente o sistema de monitoramento remoto com captação de imagens e transmissão em tempo real. 6. Precedentes do TRF1 confirmam a ilegalidade da exigência de sistema de monitoramento eletrônico sem respaldo em lei (AI 1011566-94.2019.4.01.0000). 7. A exigência questionada implica significativo ônus financeiro e operacional aos Centros de Formação de Condutores, além de possível violação à privacidade dos alunos, não podendo ser imposta por mero ato administrativo. 8. Recurso de apelação desprovido. 9. Ficam majorados os honorários advocatícios em 2% sobre a base de cálculo adotada na sentença, nos termos do art. 85, § 11 do CPC” (AC 1015347-66.2020.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 07/03/2025 PAG). Desse modo, correta a decisão agravada ao reconhecer a violação ao princípio da legalidade e ao deferir a tutela de urgência para suspender os efeitos da Portaria nº 238/2014-DENATRAN. Está igualmente presente o perigo de dano, haja vista que a imposição de custos elevados e imediatos para aquisição ou adequação tecnológica impacta diretamente a continuidade das atividades dos CFCs, podendo inviabilizar financeiramente os pequenos estabelecimentos. A alegada irreversibilidade dos efeitos da decisão, por si só, não obsta a concessão da medida de urgência quando esta visa impedir dano de difícil reparação e encontra amparo em orientação jurisprudencial consolidada, como no presente caso. Posto isso, nego provimento ao Agravo de Instrumento interposto. É o voto. Des(a). Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a) PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 1031826-56.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 1064473-89.2023.4.01.3400 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) POLO ATIVO: UNIÃO FEDERAL POLO PASSIVO:CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES POSTO DA MATA LTDA REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. PORTARIA Nº. 238/2014-DENATRAN. EXIGÊNCIA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. TUTELA DE URGÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Agravo de Instrumento interposto contra decisão que deferiu pedido de tutela de urgência para suspender os efeitos da Portaria nº 238/2014-DENATRAN, autorizando o funcionamento de Centro de Formação de Condutores - CFC sem a exigência de sistema de monitoramento eletrônico. A agravante sustenta que a decisão violou os requisitos legais da medida antecipatória, defende a legalidade da portaria, com base nas competências do CONTRAN e DENATRAN, e argumenta inexistência de violação à livre concorrência. 2. O recurso é cabível nos termos do art. 1.015, I, do CPC, por impugnar decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória. 3. O art. 12 do CTB confere ao CONTRAN competência normativa sobre o processo de formação de condutores, enquanto o art. 19 do mesmo diploma atribui ao DENATRAN função meramente executiva. A Portaria nº 238/2014, ao impor obrigações não previstas na Resolução nº 493/2014 do CONTRAN — como videomonitoramento e transmissão eletrônica de dados em tempo real —, excede os limites da função executiva atribuída ao DENATRAN. 4. A atuação normativa de órgãos administrativos deve respeitar o princípio da legalidade. A inovação normativa sem previsão legal expressa configura extrapolação do poder regulamentar e ao princípio da legalidade, conforme precedentes deste Tribunal. 5. Presentes os requisitos para manutenção da tutela de urgência. A imposição de custos imediatos compromete a viabilidade econômica dos CFCs, caracterizando perigo de dano, ao passo que a decisão não esgota o objeto da lide e não é irreversível a ponto de inviabilizar sua concessão. 6. Recurso desprovido. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento ao Agravo de Instrumento interposto, nos termos do voto do relator. Brasília, Desembargador(a) Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a)

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Processo nº 1001260-60.2019.4.01.3300

ID: 322041591

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001260-60.2019.4.01.3300

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES MUNDIAL LTDA - ME

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1001260-60.2019.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1001260-60.2019.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO D… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1001260-60.2019.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1001260-60.2019.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES MUNDIAL LTDA - ME REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL RELATOR(A):RAFAEL PAULO SOARES PINTO PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1001260-60.2019.4.01.3300 R E L A T Ó R I O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): Trata-se de Apelação interposta por Centro de Formação de Condutores Mundial LTDA contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados, nos autos de ação proposta sob o rito ordinário, em que a parte autora objetiva o afastamento da exigência de monitoramento eletrônico das aulas práticas de direção veicular, estabelecida pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. A sentença também condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, nos termos do art. 85, §8º, do CPC, tendo em vista o ínfimo valor atribuído à causa. Em suas razões recursais, o apelante sustenta, em síntese, que os atos normativos impugnados extrapolam o poder regulamentar conferido aos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito, criando obrigação não prevista na legislação, especialmente no Código de Trânsito Brasileiro, o que configuraria violação ao princípio da legalidade e à separação dos poderes. Aduz, ainda, que o custo para a implantação e manutenção do sistema de monitoramento eletrônico é extremamente elevado, o que compromete o exercício da atividade econômica e afronta os princípios da livre concorrência e da isonomia, além de representar indevida transferência de responsabilidade fiscalizatória do Estado para os particulares. Por sua vez, em sede de contrarrazões recursais, a União sustenta a legalidade da Portaria nº 238/2014 do DENATRAN, que se limitaria à regulamentação da recepção eletrônica de relatórios de avaliação das aulas práticas, nos termos das competências atribuídas pelo Código de Trânsito Brasileiro. Ressalta que não há na referida portaria qualquer imposição quanto ao uso de filmagens ou monitoramento por vídeo, apontando que essa exigência decorre exclusivamente de normativos estaduais, especialmente do DETRAN/BA, de modo que a União não possui legitimidade passiva para figurar na demanda quanto a este ponto específico. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1001260-60.2019.4.01.3300 V O T O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): Ressalvado entendimento pessoal quanto à prevenção de gabinete diverso para o julgamento dos presentes autos, fundado no parágrafo único do art. 930 do CPC, bem como no art. 15 do Regimento Interno deste TRF e art. 3º da Resolução PRESI n. 10/2023, e em cumprimento ao Ofício PRESI 323/2024, passo à análise do presente processo. A Apelação preenche os requisitos de admissibilidade, de modo que passo à análise do seu mérito. A controvérsia versa sobre a legalidade da Portaria nº. 238/2014-DENATRAN, especialmente no que se refere à exigência de sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção de dados relativos às aulas práticas ministradas pelos Centros de Formação de Condutores – CFCs. O artigo 12 do Código de Trânsito Brasileiro, em seus incisos I, X e XV, estabelece que a competência para normatizar o processo de formação de condutores, incluindo conteúdo didático-pedagógico, avaliações e fiscalização, é do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, órgão normativo e coordenador do Sistema Nacional de Trânsito. Nos termos dos arts. 19, I, V e VI do Código de Trânsito Brasileiro, compete ao DENATRAN estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação de condutores, bem como regulamentar a execução das normas fixadas pelo CONTRAN. Assim, ao editar a Portaria nº 238/2014, introduzindo obrigações que não constam da Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de videomonitoramento e a transmissão eletrônica de dados em tempo real, extrapolou as funções legais que lhe são atribuídas, tendo em vista que a referida Resolução determinou somente a recepção eletrônica do relatório e não a anotação e transmissão de dados. Embora a União alegue que o texto da portaria federal não preveja, de forma literal, o monitoramento por vídeo, é fato que os atos normativos do DETRAN/BA que derivam diretamente da portaria federal passaram a exigir esse mecanismo como condição para credenciamento e operação dos CFCs. Ainda que não expressa, a omissão do DENATRAN em delimitar as balizas técnicas e operacionais permitiu interpretação expansiva por parte das autoridades estaduais, que resultou na violação aos limites do poder regulamentar. Ocorre que, conforme o art. 5º, II da Constituição Federal, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. O conteúdo da Portaria 238/2014, ao ser operacionalizado nos estados com exigência de monitoramento eletrônico audiovisual, passou a inovar a ordem jurídica, criando obrigação nova não prevista no Código de Trânsito Brasileiro. Trata-se, portanto, de hipótese clara de extrapolação normativa, vedada no ordenamento jurídico. A criação de novas exigências administrativas por meio de ato infralegal, sem amparo direto na legislação, configura desvio do poder regulamentar e fere o princípio da legalidade, conforme art. 5º, II da CF. A competência regulamentar não autoriza a inovação legislativa, tampouco a criação de obrigações autônomas, sob pena de subversão da separação dos poderes. No caso, não há previsão legal expressa no Código de Trânsito Brasileiro autorizando a exigência de monitoramento audiovisual como condição para formação prática de condutores. A interpretação extensiva de normas técnicas por atos infralegais não pode sobrepor-se aos direitos fundamentais dos administrados, especialmente quando impõe ônus desproporcionais e desamparados por lei. A imposição de medidas técnicas que extrapolam o texto legal configura vício de legalidade material por exceder os limites da função regulamentar. A atividade regulamentar dos órgãos executivos está subordinada aos limites estabelecidos na legislação. Não se admite, portanto, inovação normativa autônoma por parte de órgãos administrativos sem delegação expressa da norma legal superior, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade. Em casos semelhante, confiram-se os seguintes precedentes: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO. PORTARIA N.º 238/2014 DO DENATRAN. INSTRUÇÃO 602/2015 DO DETRAN/DF. LEGITIMIDADE DA UNIÃO. PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Discute-se nos autos a legalidade da Portaria do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) n.º 238/2014 e, por conseguinte, da Instrução n.º 602/2015 do DETRAN/DF, que trouxe a exigência de implantação de sistema de "monitoramento eletrônico" por vídeo para aprendizagem e habilitação de condutores de veículos automotores, impondo despesas e obrigações de incorporação de tecnologias que repercutem no equilíbrio econômico-financeiro dos empreendimentos privados, que mantêm os centros de formação de condutores. 2. A legitimidade da União para compor polo passivo da presente ação é justificada pela discussão da legalidade da Portaria n.º 238/2014 do DENATRAN (órgão com atribuição executiva, subordinado à Secretaria Executiva do Ministério da Infraestrutura), que trouxe a possibilidade de os órgãos executivos de trânsito editarem normas e rotinas complementares acerca do sistema eletrônico relativo às aulas de prática de direção veicular. 3. O Código de Trânsito Brasileiro define a composição e competência dos órgãos que integram o Sistema Nacional de Trânsito, atribuindo ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) a coordenação e normatização dos procedimentos sobre aprendizagem de condutores, e ao DENATRAN, o cumprimento e execução da legislação de trânsito. Ao contrário do CONTRAN, que possui poder regulamentar com limite na própria lei que lhe atribui competência, o DENATRAN, sendo órgão meramente executivo, extrapola as funções delineadas no Código de Trânsito Brasileiro ao pretender regulamentar o sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção dos relatórios de avaliação elaborados pelos instrutores relativos às aulas de prática de direção veicular. 4. De igual modo, os DETRANS são reconhecidos como órgãos de atribuição nitidamente administrativa, sem delegação para o exercício do poder regulamentar. O DETRAN/DF, ao editar a Instrução 602/2015, com apoio na Portaria do DENATRAN n.º 238/2014, extrapolou as atribuições fixadas pelo art. 22 da Lei n.º 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), que lhe atribui a função de "realizar, fiscalizar e controlar o processo de formação, aperfeiçoamento, reciclagem e suspensão de condutores, expedir e cassar Licença de Aprendizagem, Permissão para Dirigir e Carteira Nacional de Habilitação, mediante delegação do órgão federal competente". 5. Por tais razões, diante de evidente violação ao princípio da reserva legal, mostra-se razoável suspender os efeitos da Portaria DENATRAN n.º 238/2014 e da Instrução 602/2015 do DETRAN/DF, de modo que a parte autora possa exercer suas atividades de prestação de serviços de ensino para aprendizagem de condutores de veículos automotores, sem a exigência de uso do monitoramento eletrônico. 6. A legislação de regência carece de previsão no que diz respeito à obrigatoriedade de implementação de sistema de monitoramento eletrônico, sendo, portanto, inadmissível que instrumento infralegal venha instituir a obrigação sem a correspondente previsão legal 7. Diante de tal cenário, comprovado o cumprimento da tutela de urgência, nada mais resta a ser deliberado, nestes autos 8. Apelação desprovida” (AC 1035362-02.2019.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL ROSANA NOYA ALVES WEIBEL KAUFMANN, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 28/03/2025 PAG) “DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO DE TRÂNSITO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. SISTEMA ELETRÔNICO DE MONITORAMENTO REMOTO NAS AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN E DETRAN/GO. ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo DETRAN/GO contra sentença que reconheceu a inexigibilidade do uso de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, previsto na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e na Portaria nº 43/2020 do DETRAN/GO. 2. A questão central consiste em definir a legalidade da exigência de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, estabelecida por portarias do DENATRAN e DETRAN/GO, à luz da superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN. 3. O Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97) estabelece distinção clara entre as competências dos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito, cabendo ao CONTRAN estabelecer normas regulamentares e ao DENATRAN apenas estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN extrapolou os limites do poder regulamentar ao instituir sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas, criando obrigação não prevista no CTB ou em Resolução do CONTRAN. 5. A superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN não convalida os atos normativos questionados, pois embora preveja controle informatizado, não autoriza expressamente o sistema de monitoramento remoto com captação de imagens e transmissão em tempo real. 6. Precedentes do TRF1 confirmam a ilegalidade da exigência de sistema de monitoramento eletrônico sem respaldo em lei (AI 1011566-94.2019.4.01.0000). 7. A exigência questionada implica significativo ônus financeiro e operacional aos Centros de Formação de Condutores, além de possível violação à privacidade dos alunos, não podendo ser imposta por mero ato administrativo. 8. Recurso de apelação desprovido. 9. Ficam majorados os honorários advocatícios em 2% sobre a base de cálculo adotada na sentença, nos termos do art. 85, § 11 do CPC” (AC 1015347-66.2020.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 07/03/2025 PAG). Posto isso, dou provimento à apelação interposta para, reformando a sentença recorrida, julgar procedentes os pedidos formulados para afastar a exigência imposta pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018, naquilo que exigem monitoramento eletrônico audiovisual como condição para a formação prática de condutores, permitindo à empresa apelante e seus alunos a continuidade das atividades para as quais estão credenciados, sem o uso obrigatório do monitoramento eletrônico. Ante a inversão da sucumbência, condeno a parte apelada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 85, § 8º do CPC, ante o inestimável proveito econômico e o ínfimo valor atribuído à causa. É o voto. Des(a). Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a) PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 1001260-60.2019.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1001260-60.2019.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES MUNDIAL LTDA - ME REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. EXIGÊNCIA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO EM AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN Nº 238/2014 E PORTARIAS DETRAN/BA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO PROVIDO. 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados, nos autos de ação proposta sob o rito ordinário, em que a parte autora objetiva o afastamento da exigência de monitoramento eletrônico das aulas práticas de direção veicular, estabelecida pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. 2. A questão em discussão consiste em definir se a exigência de monitoramento eletrônico audiovisual nas aulas práticas de direção veicular, prevista na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e em normativos do DETRAN/BA, configura inovação normativa sem amparo legal, implicando extrapolação do poder regulamentar e ofensa ao princípio da legalidade. 3. O Código de Trânsito Brasileiro atribui ao CONTRAN a competência para normatizar os procedimentos de formação de condutores e ao DENATRAN a função executiva de regulamentar a execução das normas fixadas pelo CONTRAN. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN inovou ao prever obrigações não contempladas na Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de anotação e transmissão de dados em tempo real, configurando extrapolação do poder regulamentar. 5. A ausência de previsão legal expressa sobre a obrigatoriedade de monitoramento audiovisual torna ilegítima a imposição dessa exigência por meio de atos infralegais. 6. A vinculação entre a Portaria federal e os atos normativos estaduais, como os do DETRAN/BA, revela efeito vinculante indireto que resulta na criação de obrigação desprovida de base legal, violando o art. 5º, II da CF/1988. 7. Precedentes jurisprudenciais confirmam a ilegalidade da exigência de monitoramento eletrônico sem respaldo legislativo, reafirmando a impossibilidade de inovação normativa autônoma por parte de órgãos executivos do Sistema Nacional de Trânsito. 8. Recurso provido para julgar procedente o pedido formulado na inicial e afastar a exigência de monitoramento eletrônico audiovisual imposta pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. Em razão da inversão da sucumbência, honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00, nos termos do art. 85, § 8º do CPC, ante o inestimável proveito econômico e o ínfimo valor atribuído à causa. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à Apelação, nos termos do voto do relator. Brasília, Desembargador(a) Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a)

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Centro De Formacao De Condutores Casa Nova Ltda - Me x Departamento Estadual De Transito Da Bahia - Detran-Ba

ID: 322048104

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1011918-80.2018.4.01.3300

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES CASA NOVA LTDA - ME

Polo Passivo:

DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO DA BAHIA - DETRAN-BA

Acórdão

Advogados:

MARIA AUXILIADORA TORRES ROCHA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1011918-80.2018.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011918-80.2018.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO D… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1011918-80.2018.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011918-80.2018.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES CASA NOVA LTDA - ME REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARIA AUXILIADORA TORRES ROCHA - BA6916-A RELATOR(A):RAFAEL PAULO SOARES PINTO PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1011918-80.2018.4.01.3300 R E L A T Ó R I O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): Trata-se de Apelação interposta por Centro de Formação de Condutores Casa Nova Ltda – ME contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado em ação ordinária proposta em face do DETRAN/BA e da União Federal. A sentença também condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa. Em suas razões recursais, a apelante sustenta, em síntese, que houve extrapolação do poder regulamentar por parte do DENATRAN, ao editar a Portaria nº 238/2014, impondo exigência de monitoramento eletrônico das aulas práticas de direção veicular sem respaldo legal. Alega que tal obrigação não está prevista na Resolução CONTRAN nº 493/2014 (atual Resolução nº 789/2020) e tampouco no Código de Trânsito Brasileiro. Argumenta ainda que a referida portaria criou, de forma indevida, ônus excessivo às autoescolas, violando o princípio da legalidade e o devido processo legislativo, requerendo, por conseguinte, o afastamento da sua aplicação, bem como das Portarias nº 355/2016 e nº 1295/2018 do DETRAN/BA, editadas com base naquela. Por sua vez, em sede de contrarrazões recursais, a União defende a manutenção da sentença, afirmando a legalidade dos atos administrativos impugnados, destacando a competência do CONTRAN para regulamentar o processo de habilitação de condutores e a atuação legítima do DENATRAN na regulamentação complementar. Pleiteia, ao final, o não provimento do recurso e a majoração dos honorários advocatícios com fundamento no art. 85, §11, do CPC/2015. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1011918-80.2018.4.01.3300 V O T O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): A Apelação preenche os requisitos de admissibilidade, de modo que passo à análise do seu mérito. A controvérsia versa sobre a legalidade da Portaria nº. 238/2014-DENATRAN, especialmente no que se refere à exigência de sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção de dados relativos às aulas práticas ministradas pelos Centros de Formação de Condutores – CFCs. O artigo 12 do Código de Trânsito Brasileiro, em seus incisos I, X e XV, estabelece que a competência para normatizar o processo de formação de condutores, incluindo conteúdo didático-pedagógico, avaliações e fiscalização, é do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, órgão normativo e coordenador do Sistema Nacional de Trânsito. Nos termos dos arts. 19, I, V e VI do Código de Trânsito Brasileiro, compete ao DENATRAN estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação de condutores, bem como regulamentar a execução das normas fixadas pelo CONTRAN. Assim, ao editar a Portaria nº 238/2014, introduzindo obrigações que não constam da Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de videomonitoramento e a transmissão eletrônica de dados em tempo real, extrapolou as funções legais que lhe são atribuídas, tendo em vista que a referida Resolução determinou somente a recepção eletrônica do relatório e não a anotação e transmissão de dados. Embora a União alegue que o texto da portaria federal não preveja, de forma literal, o monitoramento por vídeo, é fato que os atos normativos do DETRAN/BA que derivam diretamente da portaria federal passaram a exigir esse mecanismo como condição para credenciamento e operação dos CFCs. Ainda que não expressa, a omissão do DENATRAN em delimitar as balizas técnicas e operacionais permitiu interpretação expansiva por parte das autoridades estaduais, que resultou na violação aos limites do poder regulamentar. Ocorre que, conforme o art. 5º, II da Constituição Federal, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. O conteúdo da Portaria 238/2014, ao ser operacionalizado nos estados com exigência de monitoramento eletrônico audiovisual, passou a inovar a ordem jurídica, criando obrigação nova não prevista no Código de Trânsito Brasileiro. Trata-se, portanto, de hipótese clara de extrapolação normativa, vedada no ordenamento jurídico. A criação de novas exigências administrativas por meio de ato infralegal, sem amparo direto na legislação, configura desvio do poder regulamentar e fere o princípio da legalidade, conforme art. 5º, II da CF. A competência regulamentar não autoriza a inovação legislativa, tampouco a criação de obrigações autônomas, sob pena de subversão da separação dos poderes. No caso, não há previsão legal expressa no Código de Trânsito Brasileiro autorizando a exigência de monitoramento audiovisual como condição para formação prática de condutores. A interpretação extensiva de normas técnicas por atos infralegais não pode sobrepor-se aos direitos fundamentais dos administrados, especialmente quando impõe ônus desproporcionais e desamparados por lei. A imposição de medidas técnicas que extrapolam o texto legal configura vício de legalidade material por exceder os limites da função regulamentar. A atividade regulamentar dos órgãos executivos está subordinada aos limites estabelecidos na legislação. Não se admite, portanto, inovação normativa autônoma por parte de órgãos administrativos sem delegação expressa da norma legal superior, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade. Em casos semelhante, confiram-se os seguintes precedentes: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO. PORTARIA N.º 238/2014 DO DENATRAN. INSTRUÇÃO 602/2015 DO DETRAN/DF. LEGITIMIDADE DA UNIÃO. PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Discute-se nos autos a legalidade da Portaria do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) n.º 238/2014 e, por conseguinte, da Instrução n.º 602/2015 do DETRAN/DF, que trouxe a exigência de implantação de sistema de "monitoramento eletrônico" por vídeo para aprendizagem e habilitação de condutores de veículos automotores, impondo despesas e obrigações de incorporação de tecnologias que repercutem no equilíbrio econômico-financeiro dos empreendimentos privados, que mantêm os centros de formação de condutores. 2. A legitimidade da União para compor polo passivo da presente ação é justificada pela discussão da legalidade da Portaria n.º 238/2014 do DENATRAN (órgão com atribuição executiva, subordinado à Secretaria Executiva do Ministério da Infraestrutura), que trouxe a possibilidade de os órgãos executivos de trânsito editarem normas e rotinas complementares acerca do sistema eletrônico relativo às aulas de prática de direção veicular. 3. O Código de Trânsito Brasileiro define a composição e competência dos órgãos que integram o Sistema Nacional de Trânsito, atribuindo ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) a coordenação e normatização dos procedimentos sobre aprendizagem de condutores, e ao DENATRAN, o cumprimento e execução da legislação de trânsito. Ao contrário do CONTRAN, que possui poder regulamentar com limite na própria lei que lhe atribui competência, o DENATRAN, sendo órgão meramente executivo, extrapola as funções delineadas no Código de Trânsito Brasileiro ao pretender regulamentar o sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção dos relatórios de avaliação elaborados pelos instrutores relativos às aulas de prática de direção veicular. 4. De igual modo, os DETRANS são reconhecidos como órgãos de atribuição nitidamente administrativa, sem delegação para o exercício do poder regulamentar. O DETRAN/DF, ao editar a Instrução 602/2015, com apoio na Portaria do DENATRAN n.º 238/2014, extrapolou as atribuições fixadas pelo art. 22 da Lei n.º 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), que lhe atribui a função de "realizar, fiscalizar e controlar o processo de formação, aperfeiçoamento, reciclagem e suspensão de condutores, expedir e cassar Licença de Aprendizagem, Permissão para Dirigir e Carteira Nacional de Habilitação, mediante delegação do órgão federal competente". 5. Por tais razões, diante de evidente violação ao princípio da reserva legal, mostra-se razoável suspender os efeitos da Portaria DENATRAN n.º 238/2014 e da Instrução 602/2015 do DETRAN/DF, de modo que a parte autora possa exercer suas atividades de prestação de serviços de ensino para aprendizagem de condutores de veículos automotores, sem a exigência de uso do monitoramento eletrônico. 6. A legislação de regência carece de previsão no que diz respeito à obrigatoriedade de implementação de sistema de monitoramento eletrônico, sendo, portanto, inadmissível que instrumento infralegal venha instituir a obrigação sem a correspondente previsão legal 7. Diante de tal cenário, comprovado o cumprimento da tutela de urgência, nada mais resta a ser deliberado, nestes autos 8. Apelação desprovida” (AC 1035362-02.2019.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL ROSANA NOYA ALVES WEIBEL KAUFMANN, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 28/03/2025 PAG) “DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO DE TRÂNSITO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. SISTEMA ELETRÔNICO DE MONITORAMENTO REMOTO NAS AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN E DETRAN/GO. ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo DETRAN/GO contra sentença que reconheceu a inexigibilidade do uso de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, previsto na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e na Portaria nº 43/2020 do DETRAN/GO. 2. A questão central consiste em definir a legalidade da exigência de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, estabelecida por portarias do DENATRAN e DETRAN/GO, à luz da superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN. 3. O Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97) estabelece distinção clara entre as competências dos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito, cabendo ao CONTRAN estabelecer normas regulamentares e ao DENATRAN apenas estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN extrapolou os limites do poder regulamentar ao instituir sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas, criando obrigação não prevista no CTB ou em Resolução do CONTRAN. 5. A superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN não convalida os atos normativos questionados, pois embora preveja controle informatizado, não autoriza expressamente o sistema de monitoramento remoto com captação de imagens e transmissão em tempo real. 6. Precedentes do TRF1 confirmam a ilegalidade da exigência de sistema de monitoramento eletrônico sem respaldo em lei (AI 1011566-94.2019.4.01.0000). 7. A exigência questionada implica significativo ônus financeiro e operacional aos Centros de Formação de Condutores, além de possível violação à privacidade dos alunos, não podendo ser imposta por mero ato administrativo. 8. Recurso de apelação desprovido. 9. Ficam majorados os honorários advocatícios em 2% sobre a base de cálculo adotada na sentença, nos termos do art. 85, § 11 do CPC” (AC 1015347-66.2020.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 07/03/2025 PAG). Posto isso, dou provimento à apelação interposta para, reformando a sentença recorrida, julgar procedentes os pedidos formulados para afastar a exigência imposta pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018, naquilo que exigem monitoramento eletrônico audiovisual como condição para a formação prática de condutores, permitindo à empresa apelante e seus alunos a continuidade das atividades para as quais estão credenciados, sem o uso obrigatório do monitoramento eletrônico. Ante a inversão da sucumbência, condeno a parte apelada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 85, § 8º do CPC, ante o inestimável proveito econômico e o ínfimo valor atribuído à causa. É o voto. Des(a). Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a) PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 1011918-80.2018.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011918-80.2018.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES CASA NOVA LTDA - ME REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARIA AUXILIADORA TORRES ROCHA - BA6916-A E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. EXIGÊNCIA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO EM AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN Nº 238/2014 E PORTARIAS DETRAN/BA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO PROVIDO. 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados, nos autos de ação proposta sob o rito ordinário, em que a parte autora objetiva o afastamento da exigência de monitoramento eletrônico das aulas práticas de direção veicular, estabelecida pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. 2. A questão em discussão consiste em definir se a exigência de monitoramento eletrônico audiovisual nas aulas práticas de direção veicular, prevista na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e em normativos do DETRAN/BA, configura inovação normativa sem amparo legal, implicando extrapolação do poder regulamentar e ofensa ao princípio da legalidade. 3. O Código de Trânsito Brasileiro atribui ao CONTRAN a competência para normatizar os procedimentos de formação de condutores e ao DENATRAN a função executiva de regulamentar a execução das normas fixadas pelo CONTRAN. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN inovou ao prever obrigações não contempladas na Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de anotação e transmissão de dados em tempo real, configurando extrapolação do poder regulamentar. 5. A ausência de previsão legal expressa sobre a obrigatoriedade de monitoramento audiovisual torna ilegítima a imposição dessa exigência por meio de atos infralegais. 6. A vinculação entre a Portaria federal e os atos normativos estaduais, como os do DETRAN/BA, revela efeito vinculante indireto que resulta na criação de obrigação desprovida de base legal, violando o art. 5º, II da CF/1988. 7. Precedentes jurisprudenciais confirmam a ilegalidade da exigência de monitoramento eletrônico sem respaldo legislativo, reafirmando a impossibilidade de inovação normativa autônoma por parte de órgãos executivos do Sistema Nacional de Trânsito. 8. Recurso provido para julgar procedente o pedido formulado na inicial e afastar a exigência de monitoramento eletrônico audiovisual imposta pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. Em razão da inversão da sucumbência, honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00, nos termos do art. 85, § 8º do CPC, ante o inestimável proveito econômico e o ínfimo valor atribuído à causa. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à Apelação, nos termos do voto do relator. Brasília, Desembargador(a) Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a)

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Centro De Formacao De Condutores Casa Nova Ltda - Me x Departamento Estadual De Transito Da Bahia - Detran-Ba

ID: 322048113

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1011918-80.2018.4.01.3300

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES CASA NOVA LTDA - ME

Polo Passivo:

DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO DA BAHIA - DETRAN-BA

Acórdão

Advogados:

MARIA AUXILIADORA TORRES ROCHA

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FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1011918-80.2018.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011918-80.2018.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO D… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1011918-80.2018.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011918-80.2018.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES CASA NOVA LTDA - ME REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARIA AUXILIADORA TORRES ROCHA - BA6916-A RELATOR(A):RAFAEL PAULO SOARES PINTO PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1011918-80.2018.4.01.3300 R E L A T Ó R I O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): Trata-se de Apelação interposta por Centro de Formação de Condutores Casa Nova Ltda – ME contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado em ação ordinária proposta em face do DETRAN/BA e da União Federal. A sentença também condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa. Em suas razões recursais, a apelante sustenta, em síntese, que houve extrapolação do poder regulamentar por parte do DENATRAN, ao editar a Portaria nº 238/2014, impondo exigência de monitoramento eletrônico das aulas práticas de direção veicular sem respaldo legal. Alega que tal obrigação não está prevista na Resolução CONTRAN nº 493/2014 (atual Resolução nº 789/2020) e tampouco no Código de Trânsito Brasileiro. Argumenta ainda que a referida portaria criou, de forma indevida, ônus excessivo às autoescolas, violando o princípio da legalidade e o devido processo legislativo, requerendo, por conseguinte, o afastamento da sua aplicação, bem como das Portarias nº 355/2016 e nº 1295/2018 do DETRAN/BA, editadas com base naquela. Por sua vez, em sede de contrarrazões recursais, a União defende a manutenção da sentença, afirmando a legalidade dos atos administrativos impugnados, destacando a competência do CONTRAN para regulamentar o processo de habilitação de condutores e a atuação legítima do DENATRAN na regulamentação complementar. Pleiteia, ao final, o não provimento do recurso e a majoração dos honorários advocatícios com fundamento no art. 85, §11, do CPC/2015. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Processo Judicial Eletrônico Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1011918-80.2018.4.01.3300 V O T O O(A) EXMO(A). SR(A). DESEMBARGADOR(A) FEDERAL RAFAEL PAULO SOARES PINTO (RELATOR(A)): A Apelação preenche os requisitos de admissibilidade, de modo que passo à análise do seu mérito. A controvérsia versa sobre a legalidade da Portaria nº. 238/2014-DENATRAN, especialmente no que se refere à exigência de sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção de dados relativos às aulas práticas ministradas pelos Centros de Formação de Condutores – CFCs. O artigo 12 do Código de Trânsito Brasileiro, em seus incisos I, X e XV, estabelece que a competência para normatizar o processo de formação de condutores, incluindo conteúdo didático-pedagógico, avaliações e fiscalização, é do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, órgão normativo e coordenador do Sistema Nacional de Trânsito. Nos termos dos arts. 19, I, V e VI do Código de Trânsito Brasileiro, compete ao DENATRAN estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação de condutores, bem como regulamentar a execução das normas fixadas pelo CONTRAN. Assim, ao editar a Portaria nº 238/2014, introduzindo obrigações que não constam da Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de videomonitoramento e a transmissão eletrônica de dados em tempo real, extrapolou as funções legais que lhe são atribuídas, tendo em vista que a referida Resolução determinou somente a recepção eletrônica do relatório e não a anotação e transmissão de dados. Embora a União alegue que o texto da portaria federal não preveja, de forma literal, o monitoramento por vídeo, é fato que os atos normativos do DETRAN/BA que derivam diretamente da portaria federal passaram a exigir esse mecanismo como condição para credenciamento e operação dos CFCs. Ainda que não expressa, a omissão do DENATRAN em delimitar as balizas técnicas e operacionais permitiu interpretação expansiva por parte das autoridades estaduais, que resultou na violação aos limites do poder regulamentar. Ocorre que, conforme o art. 5º, II da Constituição Federal, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. O conteúdo da Portaria 238/2014, ao ser operacionalizado nos estados com exigência de monitoramento eletrônico audiovisual, passou a inovar a ordem jurídica, criando obrigação nova não prevista no Código de Trânsito Brasileiro. Trata-se, portanto, de hipótese clara de extrapolação normativa, vedada no ordenamento jurídico. A criação de novas exigências administrativas por meio de ato infralegal, sem amparo direto na legislação, configura desvio do poder regulamentar e fere o princípio da legalidade, conforme art. 5º, II da CF. A competência regulamentar não autoriza a inovação legislativa, tampouco a criação de obrigações autônomas, sob pena de subversão da separação dos poderes. No caso, não há previsão legal expressa no Código de Trânsito Brasileiro autorizando a exigência de monitoramento audiovisual como condição para formação prática de condutores. A interpretação extensiva de normas técnicas por atos infralegais não pode sobrepor-se aos direitos fundamentais dos administrados, especialmente quando impõe ônus desproporcionais e desamparados por lei. A imposição de medidas técnicas que extrapolam o texto legal configura vício de legalidade material por exceder os limites da função regulamentar. A atividade regulamentar dos órgãos executivos está subordinada aos limites estabelecidos na legislação. Não se admite, portanto, inovação normativa autônoma por parte de órgãos administrativos sem delegação expressa da norma legal superior, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade. Em casos semelhante, confiram-se os seguintes precedentes: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO. PORTARIA N.º 238/2014 DO DENATRAN. INSTRUÇÃO 602/2015 DO DETRAN/DF. LEGITIMIDADE DA UNIÃO. PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Discute-se nos autos a legalidade da Portaria do Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) n.º 238/2014 e, por conseguinte, da Instrução n.º 602/2015 do DETRAN/DF, que trouxe a exigência de implantação de sistema de "monitoramento eletrônico" por vídeo para aprendizagem e habilitação de condutores de veículos automotores, impondo despesas e obrigações de incorporação de tecnologias que repercutem no equilíbrio econômico-financeiro dos empreendimentos privados, que mantêm os centros de formação de condutores. 2. A legitimidade da União para compor polo passivo da presente ação é justificada pela discussão da legalidade da Portaria n.º 238/2014 do DENATRAN (órgão com atribuição executiva, subordinado à Secretaria Executiva do Ministério da Infraestrutura), que trouxe a possibilidade de os órgãos executivos de trânsito editarem normas e rotinas complementares acerca do sistema eletrônico relativo às aulas de prática de direção veicular. 3. O Código de Trânsito Brasileiro define a composição e competência dos órgãos que integram o Sistema Nacional de Trânsito, atribuindo ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) a coordenação e normatização dos procedimentos sobre aprendizagem de condutores, e ao DENATRAN, o cumprimento e execução da legislação de trânsito. Ao contrário do CONTRAN, que possui poder regulamentar com limite na própria lei que lhe atribui competência, o DENATRAN, sendo órgão meramente executivo, extrapola as funções delineadas no Código de Trânsito Brasileiro ao pretender regulamentar o sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção dos relatórios de avaliação elaborados pelos instrutores relativos às aulas de prática de direção veicular. 4. De igual modo, os DETRANS são reconhecidos como órgãos de atribuição nitidamente administrativa, sem delegação para o exercício do poder regulamentar. O DETRAN/DF, ao editar a Instrução 602/2015, com apoio na Portaria do DENATRAN n.º 238/2014, extrapolou as atribuições fixadas pelo art. 22 da Lei n.º 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), que lhe atribui a função de "realizar, fiscalizar e controlar o processo de formação, aperfeiçoamento, reciclagem e suspensão de condutores, expedir e cassar Licença de Aprendizagem, Permissão para Dirigir e Carteira Nacional de Habilitação, mediante delegação do órgão federal competente". 5. Por tais razões, diante de evidente violação ao princípio da reserva legal, mostra-se razoável suspender os efeitos da Portaria DENATRAN n.º 238/2014 e da Instrução 602/2015 do DETRAN/DF, de modo que a parte autora possa exercer suas atividades de prestação de serviços de ensino para aprendizagem de condutores de veículos automotores, sem a exigência de uso do monitoramento eletrônico. 6. A legislação de regência carece de previsão no que diz respeito à obrigatoriedade de implementação de sistema de monitoramento eletrônico, sendo, portanto, inadmissível que instrumento infralegal venha instituir a obrigação sem a correspondente previsão legal 7. Diante de tal cenário, comprovado o cumprimento da tutela de urgência, nada mais resta a ser deliberado, nestes autos 8. Apelação desprovida” (AC 1035362-02.2019.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL ROSANA NOYA ALVES WEIBEL KAUFMANN, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 28/03/2025 PAG) “DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO DE TRÂNSITO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. SISTEMA ELETRÔNICO DE MONITORAMENTO REMOTO NAS AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN E DETRAN/GO. ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo DETRAN/GO contra sentença que reconheceu a inexigibilidade do uso de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, previsto na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e na Portaria nº 43/2020 do DETRAN/GO. 2. A questão central consiste em definir a legalidade da exigência de sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas de direção veicular, estabelecida por portarias do DENATRAN e DETRAN/GO, à luz da superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN. 3. O Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97) estabelece distinção clara entre as competências dos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito, cabendo ao CONTRAN estabelecer normas regulamentares e ao DENATRAN apenas estabelecer procedimentos sobre aprendizagem e habilitação. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN extrapolou os limites do poder regulamentar ao instituir sistema eletrônico de monitoramento remoto nas aulas práticas, criando obrigação não prevista no CTB ou em Resolução do CONTRAN. 5. A superveniência da Resolução nº 789/2020 do CONTRAN não convalida os atos normativos questionados, pois embora preveja controle informatizado, não autoriza expressamente o sistema de monitoramento remoto com captação de imagens e transmissão em tempo real. 6. Precedentes do TRF1 confirmam a ilegalidade da exigência de sistema de monitoramento eletrônico sem respaldo em lei (AI 1011566-94.2019.4.01.0000). 7. A exigência questionada implica significativo ônus financeiro e operacional aos Centros de Formação de Condutores, além de possível violação à privacidade dos alunos, não podendo ser imposta por mero ato administrativo. 8. Recurso de apelação desprovido. 9. Ficam majorados os honorários advocatícios em 2% sobre a base de cálculo adotada na sentença, nos termos do art. 85, § 11 do CPC” (AC 1015347-66.2020.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE JORGE FONTES LARANJEIRA, TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 07/03/2025 PAG). Posto isso, dou provimento à apelação interposta para, reformando a sentença recorrida, julgar procedentes os pedidos formulados para afastar a exigência imposta pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018, naquilo que exigem monitoramento eletrônico audiovisual como condição para a formação prática de condutores, permitindo à empresa apelante e seus alunos a continuidade das atividades para as quais estão credenciados, sem o uso obrigatório do monitoramento eletrônico. Ante a inversão da sucumbência, condeno a parte apelada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 85, § 8º do CPC, ante o inestimável proveito econômico e o ínfimo valor atribuído à causa. É o voto. Des(a). Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a) PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 33 - DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 1011918-80.2018.4.01.3300 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011918-80.2018.4.01.3300 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: CENTRO DE FORMACAO DE CONDUTORES CASA NOVA LTDA - ME REPRESENTANTES POLO ATIVO: FABIO HENRIQUE DE CAMPOS CRUZ - RJ148587-A POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARIA AUXILIADORA TORRES ROCHA - BA6916-A E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CENTRO DE FORMAÇÃO DE CONDUTORES. EXIGÊNCIA DE MONITORAMENTO ELETRÔNICO EM AULAS PRÁTICAS. PORTARIA DENATRAN Nº 238/2014 E PORTARIAS DETRAN/BA. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO PROVIDO. 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados, nos autos de ação proposta sob o rito ordinário, em que a parte autora objetiva o afastamento da exigência de monitoramento eletrônico das aulas práticas de direção veicular, estabelecida pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. 2. A questão em discussão consiste em definir se a exigência de monitoramento eletrônico audiovisual nas aulas práticas de direção veicular, prevista na Portaria nº 238/2014 do DENATRAN e em normativos do DETRAN/BA, configura inovação normativa sem amparo legal, implicando extrapolação do poder regulamentar e ofensa ao princípio da legalidade. 3. O Código de Trânsito Brasileiro atribui ao CONTRAN a competência para normatizar os procedimentos de formação de condutores e ao DENATRAN a função executiva de regulamentar a execução das normas fixadas pelo CONTRAN. 4. A Portaria nº 238/2014 do DENATRAN inovou ao prever obrigações não contempladas na Resolução nº 493/2014 do CONTRAN, como a exigência de anotação e transmissão de dados em tempo real, configurando extrapolação do poder regulamentar. 5. A ausência de previsão legal expressa sobre a obrigatoriedade de monitoramento audiovisual torna ilegítima a imposição dessa exigência por meio de atos infralegais. 6. A vinculação entre a Portaria federal e os atos normativos estaduais, como os do DETRAN/BA, revela efeito vinculante indireto que resulta na criação de obrigação desprovida de base legal, violando o art. 5º, II da CF/1988. 7. Precedentes jurisprudenciais confirmam a ilegalidade da exigência de monitoramento eletrônico sem respaldo legislativo, reafirmando a impossibilidade de inovação normativa autônoma por parte de órgãos executivos do Sistema Nacional de Trânsito. 8. Recurso provido para julgar procedente o pedido formulado na inicial e afastar a exigência de monitoramento eletrônico audiovisual imposta pela Portaria DENATRAN nº 238/2014 e pelas Portarias DETRAN/BA nº 355/2016 e nº 1295/2018. Em razão da inversão da sucumbência, honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00, nos termos do art. 85, § 8º do CPC, ante o inestimável proveito econômico e o ínfimo valor atribuído à causa. A C Ó R D Ã O Decide a Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à Apelação, nos termos do voto do relator. Brasília, Desembargador(a) Federal RAFAEL PAULO SOARES PINTO Relator(a)

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