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Processo nº 1013323-04.2025.8.11.0000

ID: 306446671

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1013323-04.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO PAN S.A. CAPITAL CONSIG SOCIEDADE DE CREDITO DIRETO S.A EAGLE SOCIEDADE DE CREDITO DIRETO S.A. MEUCASHCARD SERVICOS TECNOLOGICOS E FINANCEIROS SA

Acórdão

Advogados:

PAULO GUILHERME DE MENDONCA LOPES

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013323-04.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Interpretação / Revisão de Contrato, Banc… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1013323-04.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Interpretação / Revisão de Contrato, Bancários, Superendividamento] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [DIEGO ROBERTO DA CRUZ - CPF: 364.023.928-80 (ADVOGADO), CLEDIR DOS SANTOS FERRAREZZI - CPF: 981.164.601-53 (AGRAVANTE), CAPITAL CONSIG SOCIEDADE DE CREDITO DIRETO S.A - CNPJ: 40.083.667/0001-10 (AGRAVADO), MEUCASHCARD SERVICOS TECNOLOGICOS E FINANCEIROS SA - CNPJ: 43.299.408/0001-19 (AGRAVADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (AGRAVADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/0001-91 (AGRAVADO), EAGLE SOCIEDADE DE CREDITO DIRETO S.A. - CNPJ: 45.745.537/0001-19 (AGRAVADO), ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO - CPF: 261.067.088-51 (ADVOGADO), PAULO GUILHERME DE MENDONCA LOPES - CPF: 064.148.418-62 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA POR SUPERENDIVIDAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DOS DESCONTOS ANTES DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido de tutela de urgência para suspensão ou limitação de descontos incidentes sobre a remuneração do agravante, em ação de repactuação de dívida por superendividamento, ajuizada em face de instituições financeiras. II. Questão em discussão 2. A controvérsia consiste em definir se é possível conceder tutela de urgência para suspender ou limitar descontos incidentes sobre os rendimentos do consumidor antes da realização da audiência conciliatória prevista no art. 104-A do CDC. III. Razões de decidir 3. A tutela provisória de urgência requer a presença concomitante da probabilidade do direito e do perigo de dano, conforme o art. 300 do CPC. 4. A Lei nº 14.181/2021 estabeleceu rito específico para a repactuação de dívidas por superendividamento, devendo-se respeitar a audiência de conciliação com os credores antes de qualquer medida antecipatória. 5. O art. 104-A do CDC e o Decreto nº 11.150/2022 excluem expressamente as operações de crédito consignado da análise do mínimo existencial, afastando a limitação dos descontos sem a devida observância do rito legal. 6. A decisão agravada está em consonância com o devido processo legal e com a jurisprudência dominante, não havendo elementos que justifiquem sua reforma nesta fase processual. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: “1. No procedimento previsto pela Lei nº 14.181/2021, a limitação de descontos sobre a remuneração do consumidor somente poderá ser apreciada após a audiência de conciliação designada nos termos do art. 104-A do CDC. 2. Operações de crédito consignado não integram a análise do mínimo existencial para fins de concessão de tutela antecipada.” Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 300; CDC, arts. 104-A e 104-B; Decreto nº 11.150/2022, art. 4º, I, "h". Jurisprudência relevante citada: TJMT, AI nº 1034405-28.2024.8.11.0000, Rel. Des. Marilsen Andrade Addario, j. 05.03.2025; TJMT, AI nº 1036660-56.2024.8.11.0000, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 05.03.2025; TJMT, AI nº 1037261-70.2023.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 19.02.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Agravo de Instrumento interposto por CLEDIR DOS SANTOS FERRAREZZI contra a decisão proferida pelo Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Cáceres, que, nos autos da Ação de Repactuação de Dívidas com Pedido Liminar n. 1002922-25.2025.8.11.0006, ajuizada em face de CAPITAL CONSIG SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRETO S/A, MEUCASHCARD SERVIÇOS TECNOLÓGICOS E FINANCEIROS LTDA., BANCO PAN S/A, BANCO DO BRASIL S/A e EAGLE SOCIEDADE DE CRÉDITO S/A, indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para limitação dos descontos relativos a empréstimos consignados e pessoais em 30% da renda líquida do Agravante, sob fundamento de ausência dos requisitos legais do art. 300 do CPC e da necessidade de realização prévia da audiência de conciliação prevista no art. 104-A do CDC (ID. 283052351, na origem). Em suas razões recursais, o Agravante alega, em síntese, que preenche os requisitos autorizadores da tutela de urgência, ante o comprometimento de cerca de 80% de sua renda líquida com descontos decorrentes de contratos de crédito, o que comprometeria seu mínimo existencial e violaria o princípio da dignidade da pessoa humana. Defende que a Lei nº 14.181/2021 autoriza a concessão de medidas que preservem o mínimo existencial antes mesmo da audiência conciliatória, inclusive mediante limitação provisória dos descontos a 30% dos rendimentos líquidos (ID. 283046899). A liminar vindicada foi indeferida (ID. 285018876). A agravada MEUCASHCARD SERVIÇOS TECNOLÓGICOS E FINANCEIROS apresentou em contrarrazões no ID. 290164387, defendendo a manutenção da decisão agravada, alegando que está alinhada com o comando normativo previsto no art. 104-A do CDC, que a análise da probabilidade do direito depende da demonstração de que a dívida é passível de repactuação após a conclusão da etapa conciliatória prevista na legislação, bem como que o produto contratado pelo Agravante é cartão de benefício consignado e não empréstimo tradicional. O BANCO PAN apresentou contrarrazões no ID. 288840366, alegando que a decisão agravada está bem fundamentada, que a Lei 14.181/21 privilegiou a via da autocomposição e que não cabe concessão de tutela de urgência dentro da primeira fase do procedimento de repactuação, sustentando ainda que o Agravante conscientemente assinou os contratos e autorizou os descontos, não havendo ilegalidade nos descontos efetuados, conforme jurisprudência do STJ no Tema 1085, pugnando pelo desprovimento do recurso. Os agravados BANCO DO BRASIL, CAPITAL CONSIG e EAGLE SOCIEDADE DE CRÉDITO deixaram transcorrer in albis o prazo para oferecer contraminuta (ID. 290666394). Recurso tempestivo e isento de preparo (ID. 283081879). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Extrai-se dos autos que CLEDIR DOS SANTOS FERRAREZZI ajuizou Ação de Repactuação de Dívidas por Superendevidamento com Pedido de Liminar em desfavor do BANCO DO BRASIL S/A e diversas outras instituições financeiras, com a pretensão de rever e repactuar suas dívidas acumuladas em razão de sua situação de superendividamento, garantindo condições justas de pagamento sem comprometer sua subsistência. Em síntese, relatou que contraiu diversas obrigações financeiras junto às instituições requeridas, ora agravadas, resultando em um endividamento que ultrapassa sua capacidade de pagamento sem prejuízo do seu mínimo existencial. Argumentou que sua condição de superendividado decorre de fatores alheios à sua vontade, incluindo possíveis práticas abusivas das instituições financeiras envolvidas, além de alterações em sua renda e condições pessoais que comprometeram sua capacidade de adimplência. Diante disso, pleiteou, liminarmente, a suspensão da exigibilidade das dívidas perante os réus, bem como a proibição de inscrição de seu nome em cadastros restritivos de crédito até que seja concluída a repactuação da dívida nos moldes estabelecidos pelo Juízo. Contudo, ao apreciar o feito, o Juízo a quo indeferiu a tutela de urgência vindicada, nos seguintes termos, no que pertine: “(...) Cuida-se de AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS – SUPERENDIVIDAMENTO ajuizada por CLEDIR DOS SANTOS FERREREZZI em desfavor de CAPITAL CONSIG SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRETO S.A e OUTROS. A parte autora afirma que possui encargos financeiros mensais oriundos de contratos celebrados junto aos bancos e instituições demandadas, que, quando somados, comprometem sua renda líquida. Diante disso, volve-se ao Judiciário a fim de requerer, em sede de tutela de urgência, que sejam limitados os descontos a quantia equivalente a 30% de sua renda líquida mensal; a suspensão da exigibilidade dos demais valores devidos; que os requeridos se abstenham de incluir o nome da parte autora em cadastros de restrição de crédito. Vieram os autos conclusos. É o que merece registro. Fundamento e decido. Em princípio, recebo a inicial, já que preenche os requisitos do art. 319, do Código de Processo Civil e não incide nos defeitos do art. 330 do mesmo diploma legal. De igual modo, há que se deferir a gratuidade de Justiça ao requerente, vez que atende às condições estabelecidas no art. 98 CPC. Em sede de antecipação da tutela, a parte autora postula pela suspensão imediata dos descontos/cobrança através de desconto direto no salário da requerente em relação às dívidas contraídas junto aos réus e limitação dos descontos em 30% de seu rendimento líquido, bem como que os requeridos se abstenham de promover a negativação de seu nome. Pertinente à tutela provisória, o art. 300 do Código de Processo Civil exige para a concessão da tutela de urgência o delineamento da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e do perigo de dano ou no risco ao resultado útil do processo (periculum in mora). Apesar das substanciosas alegações da parte autora, tenho que a pretensão em sede de antecipação de tutela não há como ser concedida. Dos autos, vislumbra-se a necessidade de aprofundamento probatório para mais esclarecimentos acerca dos contratos celebrados entre autora e réus, a fim de perquirir solução pautada no princípio da razoabilidade, de modo a não se sacrificar unilateralmente o direito de nenhuma das partes, porquanto a parte devedora não pode ser privada integralmente de seu salário, enquanto o credor também não pode deixar de receber o valor que lhe é devido. Com efeito, a Lei n. 14.181/2021 incluiu o art. 104-A no CDC, o qual prevê que, “A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas”. Por se tratar de procedimento especial, é de extrema importância o Judiciário observar cada ato ali descrito, pois o legislador buscou a melhor forma de garantir a celeridade e eficiência ao consumidor que precisa renegociar suas dívidas para que tenha assegurado o mínimo existencial. Portanto, neste momento não há como suspender as cobranças e descontos relativos aos contratos mencionados, pois a legislação em comento não prevê tal suspensão, mas sim a existência de duas fases nesse procedimento. Na primeira, conciliatória (art. A04-A do CDC), o consumidor apresenta proposta de pagamento em até cinco anos, oportunidade em que poderá haver solução consensual. Na segunda, contenciosa, que só tem início se não houver êxito na audiência de conciliação, “o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado” (art. 104-B do CDC), os quais terão o prazo de 15 dias para juntar documentos e esclarecer as razões que os levaram a recusar o plano voluntário (§1º). A interpretação sistemática do mencionado artigo impõe a conclusão de que a suspensão das cobranças ou a sua limitação não deve ocorrer antes da realização da audiência de conciliação, na qual a parte autora apresentará aos seus credores a sua proposta de pagamento dos débitos, de modo a manter o seu mínimo existencial. O mais apropriado nesta situação é aguardar a audiência de conciliação (art. 104-A do CDC), o que viabilizará que os credores tenham acesso ao plano de pagamento e que se conheça a origem dos débitos. Nesse sentido, deste Tribunal: [...] Por conseguinte, nesse ponto está ausente o requisito da probabilidade do direito, o que impede a concessão da tutela antecipada para suspensão do total de débitos mensais, tampouco limitação do pagamento destes, conforme requerido (art. 300 do CPC). Com relação ao pleito antecipatório de abstenção de inclusão de seu nome em cadastro restritivo de crédito, não assiste razão à parte requerente. As partes mantém entre si relação jurídica. A anotação do devedor inadimplente configura exercício regular do direito do credor amparado pela legislação, inclusive pelo CDC, que tem como um de seus objetivos a proteção ao crédito, não devendo, portanto, ser impedida sem justo fundamento. Dessa forma, se débito existe, não há que se falar em irregularidade da inscrição do nome da demandante em cadastros de restrição. Dessa forma, não é possível o deferimento da pretensão tal como requer o demandante. Noutro giro, consta na petição inicial pleito de inversão do ônus da prova. É sabido que referente ao ônus da prova compete à parte autora fazer prova dos fatos constitutivos de seu direito e ao réu dos impeditivos, modificativos e extintivos. Contudo, o fato narrado na petição inicial deriva de relação de consumo, sendo direito do consumidor, entre outros, “a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova a seu favor, no processo civil, quando, a critério do Juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias da experiência” (CDC, Lei nº 8.078, de 11.09.1990, art. 6º, inc. VIII). A parte requerente na relação consumerista ocupa posição de hipossuficiência técnica, uma vez que a demonstração dos contratos é mais facilmente produzida pela instituição responsável pelo banco de dados, ora requerida, de forma que esta pretensão há de ser deferida. Nestes termos, colha-se do julgado: [...] Isso posto e por tudo mais que dos autos consta, decido: a) Receber a peça exordial, eis que preenche os requisitos previstos no art. 319 e 320 do CPC e não incide em nenhuma das hipóteses do art. 330 do Código de Processo Civil; b) Deferir a gratuidade de Justiça, forte no art. 98 CPC; c) Indeferir a liminar, conforme argumentos lançados acima, por ausência dos requisitos previstos no art. 300 CPC; d) Deferir a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII do CDC c/c art. 373, II CPC, em favor da parte requerente; e) Considerando a Portaria n.º 06/2023-NUPEMEC-PRES do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que dispõe sobre a instalação do CEJUSC do Superendividamento, com competência em todas as comarcas do Estado, determino a remessa do feito àquela unidade, para que receba o tratamento adequado para o conflito; f) Considerando que a apresentação do plano de pagamento junto à petição inicial e não somente na audiência de conciliação viabiliza a análise prévia das condições propostas pelos credores e pode auxiliar na negociação entre as partes, sendo medida adequada aos princípios da cooperação e da boa-fé, intime-se a parte autora para que, no prazo de 15(quinze) dias, promova a juntada do plano de pagamento, nos termos do art. 104-A do CDC; g) Considerando ainda que o disposto na Lei de Superendividamento não se aplica ao consumidor cujas dívidas decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor, intime-se a parte autora para que, no mesmo prazo do item anterior, comprove a desvinculação entre as dívidas objeto da ação e a aquisição de produtos ou de serviços de luxo, conforme dispõe o art. 54-A, § 3º do CDC; h) Para maiores informações sobre o rito da Lei n. 14.181/2021, destaco a leitura da Cartilha sobre o Superendividamento do Conselho Nacional de Justiça ; i) Os réus deverão ser intimados para apresentarem, com antecedência mínima de 20(vinte) dias da audiência de conciliação, cópias dos contratos pertinentes e planilha dos débitos; j) Cientifique-se o(s) credor(s) de que o não comparecimento injustificado à audiência de conciliação, ou de seu(s) procurador(es) com poderes especiais e plenos para transigir, acarretará a suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos da mora, bem como a sujeição compulsória ao plano de pagamento da dívida, se o montante devido ao(s) credor(es) ausente(s) for certo e conhecido pelo consumidor, e o pagamento do(s) crédito(s) do(s) credor(es) ausentes será(ão) estipulado(s) para ocorrer após o pagamento dos credores presentes à audiência conciliatória (art. 104-A, § 2.º, do CDC); k) Sendo frutífera a primeira fase, a sentença judicial que homologar o acordo descreverá o plano de pagamento da dívida e terá eficácia de título executivo e força de coisa julgada, nos termos do artigo 104-A, § 3º, do CDC; l) Se não houver êxito na fase conciliatória, intime-se a parte autora para que impulsione feito às providências do art. 104-B do CDC, a fim de que seja instaurado processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório, promovendo a citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado; m) Intimem-se. Cumpra-se. Expeça-se o necessário. (...)” (ID. 189573846, na origem) (g.n.) Irresignado, o Agravante interpôs o presente recurso, sob o argumento de que os descontos incidentes sobre sua renda líquida comprometem sua subsistência, bem como que a decisão recorrida desconsidera a jurisprudência que protege o mínimo existencial e resguarda a dignidade do devedor em situação de superendividamento. Pois bem. Inicialmente, cumpre consignar que o agravo de instrumento é um recurso secundum eventum litis, ou seja, tem a sua matéria de análise restrita ao acerto ou desacerto técnico da decisão recorrida, não podendo extrapolar para a matéria de fundo e nem para as que não foram deduzidas em primeiro grau, sujeito à supressão de instância. É certo que a tutela provisória de urgência exige a comprovação concomitante de dois requisitos: a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora), conforme o artigo 300 do Código de Processo Civil. Além disso, o § 3º do referido artigo dispõe que a tutela antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. A controvérsia recursal reside na possibilidade de concessão antecipada da tutela que determinou a limitação dos descontos em folha do agravante, antes da realização da audiência conciliatória prevista no artigo 104-A do Código de Defesa do Consumidor. Após detida análise dos autos, constata-se que não há elementos suficientes para o deferimento da tutela provisória, uma vez que a suspensão ou limitação dos descontos não decorre automaticamente do simples ajuizamento da ação, mas deve observar o procedimento específico estabelecido pela Lei n. 14.181/2021. A referida lei, conhecida como Lei do Superendividamento, introduziu um rito processual próprio para a renegociação de dívidas de consumidores superendividados, privilegiando a autocomposição entre devedor e credores. O artigo 104-A do Código de Defesa do Consumidor estabelece que, ao receber o pedido de repactuação da dívida, o Juízo deve designar audiência de conciliação com os credores, para que o consumidor possa apresentar um plano de pagamento viável e proporcional à sua capacidade financeira. Assim, a interpretação sistemática das disposições do Código de Defesa do Consumidor e do Código de Processo Civil conduz à conclusão de que a limitação ou suspensão dos descontos não pode ser imposta antes da realização da audiência conciliatória, sob pena de intervenção judicial prematura nas relações contratuais e de desequilíbrio econômico entre as partes. Assim, conforme exposto na decisão liminar, à época da decisão agravada, a audiência de conciliação ainda não havia sido realizada. Portanto, o Juízo singular agiu em conformidade com o artigo 104-A do CDC, respeitando o devido processo legal e o procedimento estabelecido. Nesse sentido é a jurisprudência deste Tribunal, vejamos: “RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE REPACTUAÇÃ DE DÍVIDA POR SUPERENDIVIDAMENTO – TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA – REQUISITOS PARA LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS AO PERCENTUAL DE 30% – DESCABIMENTO – AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO AINDA NÃO REALIZADA – NECESSIDADE DE ANÁLISE DO PLANO DE PAGAMENTO PELOS CREDORES – RECURSO DESPROVIDO. 1. Não havendo ocorrido a audiência de conciliação em Ação de Repactuação de Dívidas, não se evidencia a probabilidade do direito da parte autora para limitação dos descontos de empréstimos consignados em 30% dos rendimentos da devedora. 2. Nesta hipótese, seu plano de pagamento sequer foi analisado pelos credores, devendo primeiro ser realizada a audiência de conciliação, instaurado o processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas, nos termos do Art. 104-B do CDC, afigurando-se prematura a concessão da tutela pretendida. [...]” (N.U 1034405-28.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 10/03/2025 – grifo nosso). “DIREITO DO CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA PARA LIMITAÇÃO DE DESCONTOS INCIDENTES SOBRE A REMUNERAÇÃO DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE PROBABILIDADE DO DIREITO. INVIABILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. [...] Não há previsão legal para a limitação automática dos descontos incidentes sobre a remuneração antes da conclusão da fase conciliatória, sendo inviável a concessão da tutela de urgência pleiteada. O entendimento jurisprudencial reforça que, na Ação de Repactuação de Dívidas, a mera alegação de superendividamento não autoriza a suspensão dos pagamentos ou a limitação dos descontos antes da observância do rito legal específico. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso Não Provido. Tese de julgamento: No procedimento de repactuação de dívidas previsto na Lei n. 14.181/2021, a limitação de descontos incidentes sobre a remuneração do consumidor não pode ser concedida por meio de tutela de urgência antes da realização da audiência de conciliação, pois o rito legal deve ser observado integralmente. [...]” (N.U 1036660-56.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 05/03/2025 – grifo nosso). Ademais, no que tange ao mínimo existencial, destaca-se que o Decreto n. 11.150/2022, que regulamenta a Lei do Superendividamento, estabelece de forma expressa que as parcelas decorrentes de operações de crédito consignado regidas por legislação específica não integram sua avaliação (art. 4º, inciso I, alínea “h”). Esse dispositivo reforça a impossibilidade de limitar os descontos antes da observância do procedimento legal, porquanto tais valores não podem ser considerados para fins de comprometimento da subsistência do consumidor, afastando, portanto, o fundamento utilizado para justificar a tutela antecipada. A propósito: “DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. SUPERENDIVIDAMENTO. REPACTUAÇÃO. EXCLUSÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS E DÍVIDAS COM GARANTIA REAL. LIMITE LEGAL DE DESCONTOS OBSERVADO. RECURSO NÃO PROVIDO. [...] 4.O Decreto nº 11.150/2022 exclui, para fins de análise do comprometimento do mínimo existencial, as dívidas decorrentes de operações de crédito consignado e de contratos com garantia real, conforme o art. 4º, parágrafo único, inciso I, alínea “h”, e o §1º do art. 104-A do CDC. [...] IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso não provido. Tese de julgamento: 1.O procedimento de repactuação de dívidas previsto na Lei nº 14.181/2021 não se aplica às dívidas decorrentes de operações de crédito consignado e de contratos com garantia real, conforme disposto no art. 104-A, §1º, do CDC e no art. 4º, parágrafo único, do Decreto nº 11.150/2022. [...]”. (N.U 1037261-70.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/02/2025, Publicado no DJE 19/02/2025 – grifo nosso) Portanto, não se verifica a probabilidade do direito alegado, visto que a legislação aplicável exige a observância do procedimento específico de repactuação de dívidas. Dessa forma, a ausência desse requisito fundamental impossibilita a concessão da tutela de urgência, tornando inviável a antecipação dos efeitos pretendidos pela parte agravante na origem. Assim, conclui-se que a decisão agravada corretamente indeferiu a tutela pleiteada, pois aplicou o artigo 300 do Código de Processo Civil com base nos fatos disponíveis à época, observando a exigência de comprovação cumulativa dos requisitos para a concessão da tutela de urgência. Por fim, salienta-se que o entendimento formado nesta fase inicial do processo não vincula o Juízo de origem, nem define o mérito da causa, devendo ser reconsiderado com as provas que surgirem ao longo do processo, as quais certamente esclarecerão com maior precisão os pontos levantados pelo agravante. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento interposto por CLEDIR DOS SANTOS FERRAREZZI, mantendo inalterada a decisão recorrida por seus próprios fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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