Delci Ferreira De Almeida x Banco Bradesco Financiamentos S.A.
ID: 339629202
Tribunal: TJRS
Órgão: Secretaria da 14ª Câmara Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5002322-92.2025.8.21.0155
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
BERNARDO BUOSI
OAB/SP XXXXXX
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GABRIEL DINIZ DA COSTA
OAB/RS XXXXXX
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NADIA MARIA KOCH ABDO
OAB/RS XXXXXX
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VINICIUS KOCH ABDO
OAB/RS XXXXXX
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Apelação Cível Nº 5002322-92.2025.8.21.0155/RS
TIPO DE AÇÃO:
Alienação fiduciária
RELATOR
: Desembargador PAULO SERGIO SCARPARO
APELANTE
: DELCI FERREIRA DE ALMEIDA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: VINICIUS KO…
Apelação Cível Nº 5002322-92.2025.8.21.0155/RS
TIPO DE AÇÃO:
Alienação fiduciária
RELATOR
: Desembargador PAULO SERGIO SCARPARO
APELANTE
: DELCI FERREIRA DE ALMEIDA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: VINICIUS KOCH ABDO (OAB RS103860)
ADVOGADO(A)
: NADIA MARIA KOCH ABDO (OAB RS025983)
ADVOGADO(A)
: GABRIEL DINIZ DA COSTA (OAB RS063407)
APELADO
: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: BERNARDO BUOSI (OAB SP227541)
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL.
JUROS REMUNERATÓRIOS.
OS JUROS REMUNERATÓRIOS COBRADOS POR INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS DEVEM OBEDECER ÀS ESTIPULAÇÕES DO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, POR FORÇA DO ENUNCIADO N° 596 DA SÚMULA DO STF. CONSOANTE ORIENTAÇÃO EMANADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, NOS MOLDES DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 (RESP. N. 1.061.530/RS), A CARACTERIZAÇÃO DA ABUSIVIDADE DO CONTRATO COM RELAÇÃO AOS JUROS REMUNERATÓRIOS DEPENDE DA COMPROVAÇÃO CABAL DE QUE ESTÃO SENDO COBRADAS TAXAS QUE EXCEDAM SIGNIFICATIVAMENTE A MÉDIA DE MERCADO. INCUMBE AO DEVEDOR PROVAR QUE O PERCENTUAL PACTUADO DISCREPA DA PRAXIS DO MERCADO. CASO EM QUE NÃO VERIFICADA A ABUSIVIDADE DOS JUROS.
TARIFA DE CONTRATAÇÃO.
CASO EM QUE não há cobrança de tarifa de cadastro.
SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA.
TEMA 972/STJ:
“NOS CONTRATOS BANCÁRIOS EM GERAL, O CONSUMIDOR NÃO PODE SER COMPELIDO A CONTRATAR SEGURO COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OU COM SEGURADORA POR ELA INDICADA.”
COMPROVADA, NO CASO, A VENDA CASADA.
Honorários
extrajudiciais
.
de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é válida a cláusula contratual que estabelece a possibilidade de cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais em caso de mora ou inadimplemento por parte do consumidor.
DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA:
O AJUIZAMENTO DE AÇÃO REVISIONAL, POR SI SÓ, NÃO AFASTA A MORA DO DEVEDOR. PARA QUE SE DÊ A DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA, FAZ-SE NECESSÁRIA A AVERIGUAÇÃO DA ABUSIVIDADE DOS ENCARGOS CONTRATUAIS CONTRATADOS PARA O PERÍODO DE NORMALIDADE CONTRATUAL, ISTO É, INCIDENTES ANTES DO PERÍODO DE INADIMPLÊNCIA. ORIENTAÇÃO EMANADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, NOS MOLDES DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 (RESP. N. 1.061.530/RS). NA HIPÓTESE, NÃO VERIFICADA A ABUSIVIDADE DOS ENCARGOS CONTRATUAIS NO PERÍODO DA NORMALIDADE, A MORA DEVE SER MANTIDA.
REPETIÇÃO EM DOBRO.
DESCABIMENTO
.
É CABÍVEL A REPETIÇÃO SIMPLES DOS VALORES QUE TENHAM SIDO INDEVIDAMENTE COBRADOS, INDEPENDENTEMENTE DA PROVA DE ERRO OU DE MÁ-FÉ POR PARTE DO BANCO. OUTROSSIM, A COMPENSAÇÃO DECORRE DA LEI, CONFORME DISPOSTO NOS ARTIGOS 368 E 369 DO CÓDIGO CIVIL.
APELAÇÃO conhecida em parte e, no que conhecida, PARCIALMENTE PROVIDA.
DECISÃO MONOCRÁTICA
De início, adoto o relatório da sentença (
evento 28, SENT1
):
Cuidam os autos de ação revisional ajuizada por
DELCI FERREIRA DE ALMEIDA
contra
BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A..
Relatou a parte autora ter celebrado com o réu contrato bancário para financiamento de veículo com garantia de alienação fiduciária. Defendeu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, requerendo antecipação de tutela e a revisão contratual em razão da nulidade de cláusulas contratuais abusivas. Pediu, ainda, a descaracterização da mora e a restituição ou compensação dos valores pagos a maior. Juntou documentos.
Citada, a parte ré apresentou contestação. No mérito, alegou que as partes realizaram contratação sem vícios, sendo possíveis, lícitas e válidas as cláusulas entabuladas. Juntou documentos.
Sem mais provas, vieram os autos conclusos.
Sobreveio julgamento cujo dispositivo constou:
Isso posto,
JULGO IMPROCEDENTE
a ação revisional ajuizada por
DELCI FERREIRA DE ALMEIDA
contra
BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.
, relativa ao(s) contrato(s) objeto(s) dos autos.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, que restam suspensas em tendo havido o deferimento da AJG.
A parte autora interpõe apelação (
evento 33, APELAÇÃO1
). Em suas razões recursais, reitera a abusividade da taxa de juros remuneratórios, da venda casada de seguro, da cobrança de tarifa para a concessão do crédito, de honorários advocatícios extrajudiciais. Requer a descaracterização da mora e a repetição de indébito na forma dobrada.
Contrarrazões no
evento 40, CONTRAZAP1
.
Cuida-se de recurso de apelação interposto em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos deduzidos em ação revisional de contrato bancário. Examino-o na forma como segue:
Juros Remuneratórios
Como é sabido, em se tratando a credora de instituição financeira, a pactuação de juros remuneratórios em taxa superior a 12% ao ano somente se revela abusiva se comprovado, inequivocamente, que a taxa avençada excede à média de mercado.
Em outras palavras,
a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade
(Súmula 382, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/05/2009, DJe 08/06/2009).
Com efeito, as instituições financeiras não se sujeitam à limitação imposta pela Lei de Usura.
Nesse sentido, dispõe o enunciado nº 596 da Súmula do STF que
as
disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional
.
Outrossim, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça assentou seu posicionamento a respeito do tema da limitação dos juros remuneratórios em ação revisional de contratos bancários, ao julgar o recurso repetitivo REsp n. 1.061.530/RS, da relatoria da Ministra Nancy Andrighi, nos moldes do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973.
No julgamento do recurso em comento, as orientações emanadas por aquele Sodalício quanto aos juros remuneratórios restaram assim ementadas:
I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d)
É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.
É dizer, somente é dado ao Poder Judiciário intervir na taxa livremente contratada
se constatado oportunamente por prova robusta que outras instituições financeiras, nas mesmas condições, praticariam percentuais muito inferiores
(REsp 915.572/RS, Quarta Turma, DJe 1003.2008).
Vale referir que o voto condutor do mencionado recurso repetitivo (REsp n. 1.061.530/RS), proferido pela Ministra Nancy Andrighi, traz importantes referências acerca dos critérios para a averiguação da abusividade dos juros:
Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.
[...]
Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro.
Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).
As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).
A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.
Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros.
A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia [...], ao dobro [...] ou ao triplo [...] da média.
Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos.
Como se vê, a aferição da abusividade dos juros praticados pela instituição financeira dependerá da comprovação inequívoca de que a taxa avençada excede substancialmente à média de mercado.
No caso em tela, a parte autora requereu a revisão da cédula de crédito bancário (
evento 21, CONTR2
), firmada em 26/12/2024.
A taxa de juros pactuada foi de
2,42% ao mês
, sendo que a taxa média divulgada pelo BACEN para o período era de
2,05% ao mês
(25471 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos: https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=getPagina).
Como se vê, os percentuais estipulados no contrato não diferem significativamente da taxa média de mercado apurada pelo Banco Central na época.
Assim, por não existir abusividade, impõe-se o desacolhimento do pedido no ponto.
Seguro de Proteção Financeira
Quanto ao seguro de proteção financeira, no Tema Repetitivo 972, o STJ firmou a seguinte tese:
"Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada."
Importante referir que o voto condutor do recurso repetitivo (REsp n. 1.639.259/SP), proferido pelo Ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, delimitou a controvérsia ao aspecto da liberdade contratual (a liberdade de escolher o outro contratante), ou seja, apenas para aquelas hipóteses em que "uma vez optando o consumidor pela contratação do seguro, a cláusula contratual já condiciona a contratação da seguradora integrante do mesmo grupo econômico da instituição financeira, não havendo ressalva quanto à possibilidade de contratação de outra seguradora, à escolha do consumidor".
No caso, analisando o contrato de financiamento (
evento 21, CONTR2
), verifica-se que foi assegurada ao cliente a liberdade de contratar ou não o seguro, contudo não há qualquer ressalva quanto à possibilidade dele escolher a seguradora, de modo que a contratação restou vinculada a uma seguradora pré-determinada pelo credor fiduciário. Dessa forma, restou configurada a venda casada.
Nesse sentido, a jurisprudência desta Colenda Câmara:
APELAÇÃO CÍVEL.
ALIENAÇÃO
FIDUCIÁRIA
. AÇÃO
REVISIONAL
DE CONTRATO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICÁVEL ÀS OPERAÇÕES DE CONCESSÃO DE CRÉDITO E FINANCIAMENTO. SÚMULA N. 297 DO STJ. JUROS REMUNERATÓRIOS. TRATANDO-SE DE RELAÇÃO DE CONSUMO, PARA LIMITAÇÃO/REVISÃO DA TAXA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADA, HÁ QUE SE OBSERVAR SE EXISTE DESVANTAGEM EXAGERADA PARA O CONSUMIDOR, CONSIDERANDO-SE DIVERSOS FATORES APONTADOS PELA JURISPRUDÊNCIA, COM SIGNIFICATIVA DISCREPÂNCIA ENTRE A TAXA ESTABELECIDA NO CONTRATO E A TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN PARA O PERÍODO DA CONTRATAÇÃO (RESP N. 2.009.614/SC, RESP N. 1.061.530/RS). DA TARIFA DE CADASTRO. CONFORME ENTENDIMENTO DO E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (RESP N. 1.251.331/RS), “PERMANECE VÁLIDA A TARIFA DE CADASTRO EXPRESSAMENTE TIPIFICADA EM ATO NORMATIVO PADRONIZADOR DA AUTORIDADE MONETÁRIA, A QUAL SOMENTE PODE SER COBRADA NO INÍCIO DO RELACIONAMENTO ENTRE O CONSUMIDOR E A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA”, RESSALVADA EVENTUAL ABUSIVIDADE NO CASO CONCRETO.
DO
SEGURO
. NOS CONTRATOS BANCÁRIOS EM GERAL, O CONSUMIDOR NÃO PODE SER COMPELIDO A CONTRATAR
SEGURO
COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OU COM
SEGURADORA
POR ELA INDICADA (RESP N. 1.639.259/SP E RESP N. 1.639.320/SP).
COMPENSAÇÃO E/OU REPETIÇÃO SIMPLES. CABÍVEL CASO VERIFICADA A COBRANÇA DE VALORES INDEVIDOS. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA E TUTELA PROVISÓRIA. DEPENDE DO RECONHECIMENTO DE ABUSIVIDADE EM ENCARGO(S) PREVISTO(S) PARA O PERÍODO DA NORMALIDADE CONTRATUAL (JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO DE JUROS). DO PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSÁRIA A INDICAÇÃO EXPRESSA DE TODOS OS FUNDAMENTOS LEGAIS EVENTUALMENTE INCIDENTES NO CASO, SENDO SUFICIENTE PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50061196620238216001, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miriam A. Fernandes, Julgado em: 19-12-2023).
APELAÇÃO CÍVEL.
ALIENAÇÃO
FIDUCIÁRIA
. REVISÃO DE CONTRATO. MONOCRÁTICA. CERCEAMENDO DE DEFESA INOCORRENTE. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO DOS JUROS AO PERCENTUAL DA TAXA MÉDIA DO MERCADO, QUANDO FOREM ABUSIVOS, TAL COMO PUBLICADO PELO BACEN EM SEU SITE. POSIÇÃO DO STJ CONSUBSTANCIADA NO ACÓRDÃO PARADIGMA - RESP 1.061.530/RS. INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE NO CASO CONCRETO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. A INCIDÊNCIA DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS É PERMITIDA, MAS DESDE QUE CONSTE SUA PACTUAÇÃO DE FORMA EXPRESSA NO INSTRUMENTO CONTRATUAL, NOS TERMOS DO RESP Nº 973.827-RS, DE RELATORIA DA MIN. MARIA ISABEL GALLOTTI. COMO ESTE É O CASO DOS AUTOS, A CAPITALIZAÇÃO É MANTIDA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. REQUER O APELANTE, ORA AUTOR DA
REVISIONAL
, O AFASTAMENTO DA COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. OCORRE QUE, NO CONTRATO JUNTADO NOS AUTOS, NÃO HÁ PREVISÃO DO REFERIDO ENCARGO NO PERÍODO MORATÓRIO. ASSIM, NÃO DEVE SER CONHECIDO O PEDIDO NESTA PARTE POR FALTA DE INTERESSE EM RECORRER. TARIFA DE CADASTRO – A TARIFA DE CADASTRO SOMENTE PODERÁ INCIDIR NO INÍCIO DO RELACIONAMENTO ENTRE O CONSUMIDOR E A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, DESDE QUE CONTRATADO EXPRESSAMENTE, RESSALVADO A ANÁLISE DA ABUSIVIDADE NO CASO CONCRETO, SE COMPARADA COM A MÉDIA MENSAL DIVULGADA PELO BACEN. SÚMULA Nº 566 DO STJ. AUSÊNCIA DA ABUSIVIDADE ALEGADA. DESPESA DE REGISTRO DO CONTRATO E TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO SEDIMENTADO NO RESP. REPETITIVO Nº 1.578.553/SP – TEMA 958/STJ. DESPESA DE REGISTRO DE CONTRATO MANTIDA, EIS QUE ADEQUADA AOS PARÂMETROS CONTRATADOS. NÃO ESTANDO ACOSTADO AOS AUTOS O LAUDO DE AVALIAÇÃO DO BEM, RESTA PROVADA A EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
SEGURO
DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO NOS RESP N. 1.639.259/SP E RESP N. 1.639.320/SP – TEMA 972/STJ. “NOS CONTRATOS BANCÁRIOS EM GERAL, O CONSUMIDOR NÃO PODE SER COMPELIDO A CONTRATAR
SEGURO
COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OU COM
SEGURADORA
POR ELA INDICADA.” VENDA CASADA CONFIGURADA, AFASTADA SUA PACTUAÇÃO.
COMPENSAÇÃO DE VALORES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. A FIM DE EVITAR O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DE UMA DAS PARTES, A COMPENSAÇÃO DE VALORES E A REPETIÇÃO DO INDÉBITO SÃO DEVIDAS, RESPEITANDO O DISPOSTO NOS ARTIGOS 369 E 876, AMBOS DO CC. A RESTITUIÇÃO DEVE OCORRER DE FORMA SIMPLES, E COMO CONSEQUÊNCIA LÓGICA DO JULGADO. DA MORA E DA TUTELA ANTECIPADA. AUSENTE A ABUSIVIDADE NOS ENCARGOS PREVISTOS PARA A NORMALIDADE CONTRATUAL, A TUTELA ANTECIPADA DEVE SER INDEFERIDA. APELO PROVIDO EM PARTE.(Apelação Cível, Nº 50081040920238210072, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto Sbravati, Julgado em: 15-12-2023).
APELAÇÃO CIVEL.
ALIENAÇÃO
FIDUCIÁRIA
EM GARANTIA. AÇÃO
REVISIONAL
. 1. INOCORRÊNCIA DE DECISÃO EXTRA PETITA. 2. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ÀS OPERAÇÕES DE CONCESSÃO DE CRÉDITO E FINANCIAMENTO. SÚMULA N. 297 DO STJ. 3. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS APÓS A EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170/2001 E DESDE QUE EXPRESSAMENTE PACTUADA NO CONTRATO (RESP 973827/RS, J. 27/06/2012). 4. A COBRANÇA DOS ENCARGOS MORATÓRIOS NÃO PODE ULTRAPASSAR A SOMA DOS ENCARGOS REMUNERATÓRIOS E MORATÓRIOS ESTABELECIDOS NO CONTRATO. SÚMULAS 30 E 472 DO STJ E RESP 1.580.114. 5. LEGÍTIMA A COBRANÇA DA TARIFA DE CADASTRO, DESDE QUE EXPRESSAMENTE PREVISTA NO CONTRATO E, MEDIANTE ANÁLISE DO CASO CONCRETO E COTEJO DOS PREÇOS NO MERCADO (VALOR MÉDIO DE MERCADO DIVULGADO PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL), NÃO FIQUE CARACTERIZADO ABUSO NO VALOR COBRADO. 6. SEDIMENTADO PELO E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO RESP N. 1.578.553 AS TESES: “2.3. VALIDADE DA TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM DADO EM GARANTIA, BEM COMO DA CLÁUSULA QUE PREVÊ O RESSARCIMENTO DE DESPESA COM O REGISTRO DO CONTRATO, RESSALVADAS A: 2.3.1. ABUSIVIDADE DA COBRANÇA POR SERVIÇO NÃO EFETIVAMENTE PRESTADO; E A 2.3.2. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ONEROSIDADE EXCESSIVA, EM CADA CASO CONCRETO”.
7.
SEGURO
DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. AO FINANCIADO DEVE SER ASSEGURADA A LIBERDADE DE CONTRATAR E COM QUEM CONTRATAR (RESP 1639320/SP, DJE 17/12/2018).
8. CABÍVEL A COMPENSAÇÃO E/OU REPETIÇÃO SIMPLES, CASO VERIFICADA A COBRANÇA DE VALORES INDEVIDOS. 9. SUCUMBÊNCIA. DECAIMENTO MÍNIMO DA PARTE DEMANDADA. PRELIMINAR REJEITADA. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS. (Apelação Cível, Nº 50030516420238210034, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em: 07-12-2023).
Dessa forma, configurada a venda casada, deve ser afastada a cobrança do seguro.
Tarifa de Cadastro
A parte apelante, no ponto, carece de interesse de agir, pois não há cobrança desta tarifa no contrato:
O recurso, no ponto, não merece ser conhecido.
Dos honorários extrajudiciais
Em relação à cláusula que prevê a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais, improspera o apelo da parte autora, à luz da jurisprudência do STJ:
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS C/C RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. PREVISÃO CONTRATUAL DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS. ADMISSIBILIDADE. CLÁUSULA GENÉRICA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Nas relações de consumo, havendo expressa previsão contratual, ainda que em contrato de adesão, não se tem por abusiva a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais em caso de mora ou inadimplemento do consumidor. Igual direito é assegurado ao consumidor, em decorrência de imposição legal, nos termos do art. 51, XII, do CDC, independentemente de previsão contratual (REsp 1002445/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Rel. p/ Acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 25/8/2015, DJe 14/12/2015).
2. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no REsp n. 1.623.134/TO, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 12/6/2023, DJe de 15/6/2023.)
Cumpre salientar que, no caso, se está diante de pretensão meramente declaratória, deduzida no bojo de uma ação de índole revisional, dado que não se tem notícia da cobrança administrativa de tal rubrica.
Ressalvo, todavia, que a cobrança em concreto dos ditos honorários exige comprovação da prestação de serviços, adequação do montante cobrado em relação aos serviços efetivamente prestados, além de não cumulação com honorários advocatícios sucumbenciais, em caso de ajuizamento de ação judicial para fins de cobrança da dívida.
Da descaracterização da mora
A propósito do tema, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça proferiu as seguintes conclusões (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009):
I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.
[...]
ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA
a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora;
b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.
Destarte,
simples ajuizamento de ação revisional
não afasta a mora do devedor. Faz-se necessária a averiguação da abusividade dos encargos contratuais contratados para o período de normalidade contratual, isto é, incidentes antes do período de inadimplência.
De consequência, havendo irregularidades quanto aos juros remuneratórios e à capitalização mensal dos juros, impõe-se o afastamento dos encargos de mora até o recálculo da dívida.
No caso dos autos, não restou configurada abusividade no que pertine aos juros remuneratórios ou à capitalização dos juros, de modo que não é possível afastar-se a mora nem deferir os pedidos de vedação de inscrição nos cadastros restritivos de crédito e manutenção na posse do bem.
Compensação/ Repetição do Indébito
Quanto à repetição do indébito, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial, no julgamento do EREsp nº 1.413.542/RS, assim decidiu acerca da matéria:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC. REQUISITO SUBJETIVO. DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA. IRRELEVÂNCIA. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA. ART. 927, § 3º, DO CPC/2015.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. Trata-se de Embargos de Divergência que apontam dissídio entre a Primeira e a Segunda Seções do STJ acerca da exegese do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor - CDC. A divergência refere-se especificamente à necessidade de elemento subjetivo para fins de caracterização do dever de restituição em dobro da quantia cobrada indevidamente.
2. Eis o dispositivo do CDC em questão: "O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável" (art. 42, parágrafo único, grifo acrescentado).
ENTENDIMENTO DA EMINENTE MINISTRA RELATORA
3. Em seu judicioso Voto, a eminente Relatora, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, lúcida e brilhante como sempre, consignou que o entendimento das Turmas que compõem a Seção de Direito Privado do STJ é o de que "a devolução em dobro só ocorre quando comprovada a má-fé do fornecedor". Destacou que os arestos indicados como paradigmas "firmam ser suficiente para que haja a devolução em dobro do indébito a verificação da culpa."
4. A solução do dissídio, como antevê a eminente Relatora, pressupõe seja definido o que se deve entender, no art. 42, parágrafo único, pelo termo "engano justificável". Observa ela, corretamente, que "a conclusão de que a expressão 'salvo hipótese de engano justificável' significa 'comprovação de má-fé do credor' diminui o alcance do texto legal em prejuízo do consumidor, parte vulnerável na relação de consumo" (grifo acrescentado). Dessa forma, dá provimento aos Embargos de Divergência, pois, "ao contrário do que restou consignado no acórdão embargado, não é necessária a comprovação da má-fé do credor, basta a culpa."
5. Por não haver óbices processuais, irreparável a compreensão da eminente Relatoria original quanto ao conhecimento do recurso.
6. A Relatora, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, com precisão cirúrgica, aponta dois pressupostos fundamentais do modelo hermenêutico que rege a aplicação do CDC: a) vedação à interpretação e à analogia que diminuam "o alcance do texto legal em prejuízo do consumidor" e b) valorização ético-legislativa da "parte vulnerável na relação de consumo". DIVERGÊNCIA ENTRE A PRIMEIRA SEÇÃO (DIREITO PÚBLICO) E A SEGUNDA SEÇÃO (DIREITO
PRIVADO) DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
7. Para fins de Embargos de Divergência - resolver teses jurídicas divergentes dentro do STJ -, estamos realmente diante de entendimentos discrepantes entre a Primeira e a Segunda Seções no que tange à aplicação do parágrafo único do art. 42 do CDC, dispositivo que incide sobre todas as relações de consumo, privadas ou públicas, individuais ou coletivas.
8. "Conhecidos os embargos de divergência, a decisão a ser adotada não se restringe às teses suscitadas nos arestos em confronto - recorrido e paradigma -, sendo possível aplicar-se uma terceira tese, pois cabe a Seção ou Corte aplicar o direito à espécie" (EREsp 513.608/RS, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, DJe 27.11.2008). No mesmo sentido: "O exame dos embargos de divergência não se restringe às teses em confronto do acórdão embargado e do acórdão paradigma acerca da questão federal controvertida, podendo ser adotada uma terceira posição, caso prevalente" (EREsp 475.566/PR, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, DJ 13/9/2004). Outros precedentes: EREsp 130.605/DF, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Segunda Seção, DJ 23/4/2001; e AgRg nos EREsp 901.919/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 21/9/2010. HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR E O ART. 42,
PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC
9. Em harmonia com os ditames maiores do Estado Social de Direito, na tutela de sujeitos vulneráveis, assim como de bens, interesses e direitos supraindividuais, ao administrador e ao juiz incumbe exercitar o diálogo das fontes, de modo a - fieis ao espírito, ratio e princípios do microssistema ou da norma - realizarem material e não apenas formalmente os objetivos cogentes, mesmo que implícitos, abonados pelo texto legal. Logo, interpretação e integração de preceitos legais e regulamentares de proteção do consumidor, codificados ou não, submetem-se a postulado hermenêutico de ordem pública segundo o qual, em caso de dúvida ou lacuna, o entendimento administrativo e o judicial devem expressar o posicionamento mais favorável à real superação da vulnerabilidade ou mais condutivo à tutela efetiva dos bens, interesses e direitos em questão. Em síntese, não pode "ser aceita interpretação que contradiga as diretrizes do próprio Código, baseado nos princípios do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor e da facilitação de sua defesa em juízo" (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 12/12/2011). Na mesma linha da interpretação favorável ao consumidor: AgRg no AREsp 708.082/DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, DJe 26/2/2016;
REsp 1.726.225/RJ, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe 24/9/2018; e REsp 1.106.827/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 23/10/2012. Confira-se também: "O mandamento constitucional de proteção do consumidor deve ser cumprido por todo o sistema jurídico, em diálogo de fontes, e não somente por intermédio do CDC" (REsp 1.009.591/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 23/8/2010).
10. A presente divergência deve ser solucionada à luz do princípio da vulnerabilidade e do princípio da boa-fé objetiva, inarredável diretriz dual de hermenêutica e implementação de todo o CDC e de qualquer norma de proteção do consumidor. O art. 42, parágrafo único, do CDC faz menção a engano e nega a devolução em dobro somente se for ele justificável. Ou seja, a conduta-base ou ponto de partida para a repetição dobrada de indébito é o engano do fornecedor. Como argumento de defesa, a justificabilidade (= legitimidade) do engano, para afastar a devolução em dobro, insere-se no domínio da causalidade, e não no domínio da culpabilidade, pois esta se resolve, sem apelo ao elemento volitivo, pelo prisma da boa-fé objetiva.
11. Na hipótese dos autos, necessário, para fins de parcial modulação temporal de efeitos, fazer distinção entre contratos de serviços públicos e contratos estritamente privados, sem intervenção do Estado ou de concessionárias. REPOSICIONAMENTO PESSOAL DO RELATOR PARA O ACÓRDÃO SOBRE A MATÉRIA
12. Ao apresentar a tese a seguir exposta, esclarece-se que o Relator para o acórdão reposiciona-se a respeito dos critérios do parágrafo único do art. 42 do CDC, de modo a reconhecer que a repetição de indébito deve ser dobrada quando ausente a boa-fé objetiva do fornecedor na cobrança realizada. É adotada, pois, a posição que se formou na Corte Especial, lastreada no princípio da boa-fé objetiva e consequente descasamento de elemento volitivo, consoante Voto-Vista do Ministro Luis Felipe Salomão e manifestações apresentadas pelos eminentes Pares, na esteira de intensos e ricos debates nas várias sessões em que o tema foi analisado. Realça-se, quanto a esses últimos, trecho do Voto do Ministro Og Fernandes: "A restituição em dobro de indébito (parágrafo único do art. 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do agente que cobrou o valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva". CONTRATOS QUE ENVOLVAM O ESTADO OU SUAS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS
13. Na interpretação do parágrafo único do art. 42 do CDC, deve prevalecer o princípio da boa-fé objetiva, métrica hermenêutica que dispensa a qualificação jurídica do elemento volitivo da conduta do fornecedor.
14. A esse respeito, o entendimento prevalente nas Turmas da Primeira Seção do STJ é o de dispensar a exigência de dolo, posição sem dúvida inspirada na preeminência e inafastabilidade do princípio da vulnerabilidade do consumidor e do princípio da boa-fé objetiva.
A propósito: REsp 1.085.947/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJe 12/11/2008; AgRg no REsp 1.363.177/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 24/5/2013; REsp 1.300.032/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13/3/2013; AgRg no REsp 1.307.666/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 12/3/2013; AgRg no REsp 1.376.770/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 13/9/2016; AgRg no REsp 1.516.814/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 25/8/2015; AgRg no REsp 1.158.038/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 3/5/2010; AgInt no REsp 1.605.448/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 13/12/2017; AgRg no AgRg no AREsp 550.660/RJ, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 15/12/2015; AgRg no AREsp 723.170/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 28/9/2015; AgRg no Ag 1.400.388/RJ, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 10/11/2014.
15. Na Segunda Seção há também precedente que rechaça o requisito do dolo para repetição do indébito em dobro: "Somente na presença de má-fé ou culpa o pagamento em dobro é devido" (AgRg no AREsp 162.232/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 20.8.2013).
16. Agrega-se ao raciocínio construído na Primeira Seção a regra geral de que a responsabilidade do Estado e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva em relação a danos causados a terceiros (art. 37, § 6º, da CF/1988).
Cito precedentes do STJ sobre o tema: REsp 1.299.900/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 13/3/2015; AgInt no REsp 1.581.961/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 14/9/2016; AgInt no REsp 1.711.214/MT, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 18/11/2020; REsp 1.736.039/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 7/6/2018; AgInt no AREsp 1.238.182/PE, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 17/9/2018; AgInt no AREsp 937.384/PE, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 26/6/2018; REsp 1.268.743/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 7/4/2014; REsp 1.038.259/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/2/2018.
17. Quanto ao art. 37, § 6º, da Carta Magna, o Supremo Tribunal Federal sedimentou, sob o rito da Repercussão Geral, a posição de que "a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal" (RE 591.874, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 26.8.2009, Repercussão Geral - Mérito, DJe 18.12.2009). Na mesma linha: ARE 1.043.232 AgR, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe 13/9/2017; RE 598.356, Relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe 1º/8/2018; ARE 1.046.474 AgR, Relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 12/9/2017; e ARE 886.570 ED, Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 22/6/2017.
18. Ora, se a regra da responsabilidade civil objetiva impera, universalmente, em prestações de serviço público, como admitir que, nas relações de consumo - na presença de sujeito (consumidor) caracterizado ope legis como vulnerável (CDC, art. 4º, I) -, o paradigma jurídico seja o da responsabilidade subjetiva (com dolo ou culpa)? Seria contrassenso atribuir tal privilégio ao fornecedor, mormente por ser fato notório que dezenas de milhões dos destinatários finais dos serviços públicos, afligidos por cobranças indevidas, personificam não só sujeitos vulneráveis, como também sujeitos indefesos e hipossuficientes econômica e juridicamente, ou seja, carentes em sentido lato, destituídos de meios financeiros, de informação e de acesso à justiça.
19. Compreensão distinta, centrada na necessidade de prova de elemento volitivo, na realidade inviabiliza a devolução em dobro, p.
ex., de pacotes de serviços telefônicos jamais solicitados pelo consumidor, bastando ao fornecedor invocar uma justificativa qualquer para seu engano. Nas condições do mercado de consumo massificado, impingir ao consumidor prova de dolo ou culpa corresponde a castigá-lo com ônus incompatível com os princípios da vulnerabilidade e da boa-fé objetiva, legitimando, ao contrário dos cânones do microssistema, verdadeira prova diabólica, o que contraria frontalmente a filosofia e ratio eticossocial do CDC.
Assim, a expressão "salvo hipótese de engano justificável" do art. 42, parágrafo único, do CDC deve ser apreendida como elemento de causalidade, e não como elemento de culpabilidade. CONTRATOS QUE NÃO ENVOLVAM
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS
20. Como se sabe, recursos em demandas que envolvam contratos sem natureza pública, como os bancários, de seguro, imobiliários, de planos de saúde, entre outros, são de competência da Segunda Seção.
Tendo em vista a controvérsia existente nos contratos de natureza bancária, o eminente Ministro Paulo de Tarso Sanseverino submeteu o REsp 1.517.888/SP ao rito dos recursos repetitivos, no âmbito da Corte Especial, ainda pendente de julgamento. Em sessão da Corte Especial que examinava os EAREsp 622.897/RS, deliberou-se dar continuação ao julgamento dos Embargos de Divergência sobre o mesmo tema, sem necessidade de sobrestar o feito em virtude da afetação da matéria como repetitivo.
21. Tal qual ocorre nos contratos de consumo de serviços públicos, nas modalidades contratuais estritamente privadas também deve prevalecer a interpretação de que a repetição de indébito deve ser dobrada quando ausente a boa-fé objetiva do fornecedor na cobrança realizada. Ou seja, atribui-se ao engano justificável a natureza de variável da equação de causalidade, e não de elemento de culpabilidade, donde irrelevante a natureza volitiva da conduta que levou ao indébito. RESUMO DA PROPOSTA DE TESE RESOLUTIVA
DA DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL
22. A proposta aqui trazida - que procura incorporar, tanto quanto possível, o mosaico das posições, nem sempre convergentes, dos Ministros MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, NANCY ANDRIGHI, LUIS FELIPE
SALOMÃO, OG FERNANDES, JOÃO OTÁVIO DE NORONHA E RAUL ARAÚJO -
consiste em reconhecer a irrelevância da natureza volitiva da conduta (se dolosa ou culposa) que deu causa à cobrança indevida contra o consumidor, para fins da devolução em dobro a que refere o parágrafo único do art. 42 do CDC, e fixar como parâmetro excludente da repetição dobrada a boa-fé objetiva do fornecedor (ônus da defesa) para apurar, no âmbito da causalidade, o engano justificável da cobrança.
23. Registram-se trechos dos Votos proferidos que contribuíram diretamente ou serviram de inspiração para a posição aqui adotada (grifos acrescentados):
23.1. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: "O requisito da comprovação da má-fé não consta do art. 42, parágrafo único, do CDC, nem em qualquer outro dispositivo da legislação consumerista. A parte final da mencionada regra - 'salvo hipótese de engano justificável' - não pode ser compreendida como necessidade de prova do elemento anímico do fornecedor."
23.2. MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA: "Os requisitos legais para a repetição em dobro na relação de consumo são a cobrança indevida, o pagamento em excesso e a inexistência de engano justificável do fornecedor. A exigência de indícios mínimos de má-fé objetiva do fornecedor é requisito não previsto na lei e, a toda evidência, prejudica a parte frágil da relação."
23.3. MINISTRO OG FERNANDES: "A restituição em dobro de indébito (parágrafo único do art. 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do agente que cobrou o valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva."
23.4. MINISTRO RAUL ARAÚJO: "Para a aplicação da sanção civil prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, é necessária a caracterização de conduta contrária à boa-fé objetiva para justificar a reprimenda civil de imposição da devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente."
23.5. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: "O código consumerista introduziu novidade no ordenamento jurídico brasileiro, ao adotar a concepção objetiva do abuso do direito, que se traduz em uma cláusula geral de proteção da lealdade e da confiança nas relações jurídicas, prescindindo da verificação da intenção do agente - dolo ou culpa - para caracterização de uma conduta como abusiva (...) Não há que se perquirir sobre a existência de dolo ou culpa do fornecedor, mas, objetivamente, verificar se o engano/equívoco/erro na cobrança era ou não justificável."
24. Sob o influxo da proposição do Ministro Luis Felipe Salomão, acima transcrita, e das ideias teórico-dogmáticas extraídas dos Votos das Ministras Nancy Andrighi e Maria Thereza de Assis Moura e dos Ministros Og Fernandes, João Otávio de Noronha e Raul Araújo, fica assim definida a resolução da controvérsia: a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo. PARCIAL MODULAÇÃO TEMPORAL
DOS EFEITOS DA PRESENTE DECISÃO
25. O art. 927, § 3º, do CPC/2015 prevê a possibilidade de modulação de efeitos não somente quando alterada a orientação firmada em julgamento de recursos repetitivos, mas também quando modificada jurisprudência dominante no STF e nos tribunais superiores.
26. Na hipótese aqui tratada, a jurisprudência da Segunda Seção, relativa a contratos estritamente privados, seguiu compreensão (critério volitivo doloso da cobrança indevida) que, com o presente julgamento, passa a ser completamente superada, o que faz sobressair a necessidade de privilegiar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos jurisdicionados.
27. Parece prudente e justo, portanto, que se deva modular os efeitos da presente decisão, de maneira que o entendimento aqui fixado seja aplicado aos indébitos de natureza contratual não pública cobrados após a data da publicação deste acórdão.
TESE FINAL
28. Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS
29. Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão.
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
30. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido fixou como requisito a má-fé, para fins do parágrafo único do art. 42 do CDC, em indébito decorrente de contrato de prestação de serviço público de telefonia, o que está dissonante da compreensão aqui fixada.
Impõe-se a devolução em dobro do indébito.
CONCLUSÃO
31. Embargos de Divergência providos.
(EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021.)
Como se vê, em relação a cobranças anteriores a 30.03.2021, a repetição em dobro do indébito pressupõe a demonstração do pagamento indevido e da má-fé do credor. Após,
a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo
.
No caso em tela, em se tratando de ação de revisão contratual, tem-se que não há suporte fático necessário à pretendida repetição em dobro do indébito, sob qualquer prisma que se examine a questão.
Ora, tratando-se de caso em que a cobrança estava lastreada em cláusula contratual, hígida, portanto, até a revisão judicial, não se poderia falar em má-fé do credor, em relação a eventuais pagamentos anteriores a 30.03.2021
1
, tampouco violação da boa-fé objetiva, após a referida data
2
.
Via de consequência, a repetição do indébito dar-se-á na forma simples.
De outra parte, a compensação decorre da lei, conforme disposto nos artigos 368 e 369 do Código Civil.
Assim, cabível a compensação/ restituição simples do indébito, atualizada pelo IPCA desde o desembolso. A contar da citação, incidirá a Taxa Selic, como critério único, a título de correção monetária e juros de mora, seja por força do julgado no REsp 1.795.982/STJ, seja em razão da novel disposição do artigo 406, parágrafo 1º, do diploma civilista, deduzido do seu montante o correspondente ao mencionado índice de atualização monetária.
A despeito do provimento parcial do apelo, dada a sucumbência mínima da instituição financeira, mantém-se os encargos sucumbenciais fixados na sentença.
Ante o exposto,
conheço em parte do apelo e, na parte conhecida, dou parcial provimento.
1. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. COBRANÇA DE TARIFAS DE CADASTRO, DE REGISTRO DE CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. ABUSIVIDADE NÃO CARACTERIZADA. ACÓRDÃO ESTADUAL EM TOTAL SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. SÚMULA 83/STJ. DEVOLUÇÃO EM DOBRO INDEVIDA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.1. A jurisprudência pacífica desta Corte Superior é no sentido de ser possível, de forma excepcional, a revisão da taxa de juros remuneratórios prevista em contratos de mútuo, sobre os quais incide a legislação consumerista, desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada, mediante a colocação do consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1º, do CDC), de acordo com as peculiaridades do julgamento em questão.2. A Corte de origem afastou a natureza abusiva dos juros remuneratórios pactuados, considerando que, na espécie, a taxa cobrança não foi significativamente mais elevada do que a de mercado. Rever tal conclusão demandaria reexame de matéria fática, inviável em recurso especial, nos termos das Súmulas 5 e 7/STJ.3. Tendo o Tribunal local concluído pela inexistência de abusividade atinente às tarifas de registro e de avaliação do bem, o acolhimento da pretensão recursal também demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos e a análise e interpretação de cláusulas contratuais, o que se mostra impossível ante a natureza excepcional da via eleita, conforme enunciado das Súmulas n. 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça.4. Em relação à repetição em dobro de valores, o julgado estadual está em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que firmou o entendimento de que a repetição em dobro do indébito pressupõe a existência de pagamento indevido juntamente com a má-fé do credor, o que não ocorreu na espécie.5. Agravo interno improvido.(AgInt no AREsp n. 2.496.313/GO, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 19/8/2024, DJe de 23/8/2024.)
2. APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. OBJETO. CONTRATO DE MÚTUO Nº 1342062 (COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO), NO VALOR DE R$ 10.435,00, DATADO DE 09/11/2018 ENCARGOS DA NORMALIDADE . JUROS REMUNERATÓRIOS. APLICAÇÃO DAS ORIENTAÇÕES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, EXTRAÍDAS DOS JULGAMENTOS DOS RECURSOS ESPECIAIS REPRESENTATIVOS DE CONTROVÉRSIA N. 1.061.530/RS E N. 1.112.879/PR. AFINADO A ISSO, O ENTENDIMENTO DESTA CÂMARA É DE QUE A TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS DEVE SER LIMITADA SOMENTE QUANDO FOR SUPERIOR À TAXA MÉDIA DE MERCADO REGISTRADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL – BACEN, À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO E EM CONFORMIDADE COM A RESPECTIVA OPERAÇÃO, SOMADA DO PERCENTUAL DE 30% (TRINTA POR CENTO), TIDO COMO A MARGEM TOLERÁVEL. NO CASO, CONSIDERANDO QUE AS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONSTANTES NOS CONTRATOS REVISANDOS FORAM PACTUADAS ACIMA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN (CRÉDITO PESSOAL CONSIGNADO PARA TRABALHADOR DO SETOR PÚBLICO - CÓDIGOS 25467 E 20745), AINDA QUE ACRESCIDAS DE 30%, TEM-SE COMO CARACTERIZADA A ALEGADA ABUSIVIDADE, DEVENDO SER LIMITADOS OS JUROS REMUNERATÓRIOS, CONFORME DETERMINADO NA SENTENÇA. NO PONTO, RECURSO DESPROVIDO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO E COMPENSAÇÃO DE VALORES. É CABÍVEL A REPETIÇÃO DO INDÉBITO E COMPENSAÇÃO DE VALORES QUANDO PROCEDIDAS MODIFICAÇÕES NO CONTRATO, CASO COMPROVADO O PAGAMENTO A MAIOR. OUTROSSIM, EM RECENTE DECISÃO, A CORTE ESPECIAL DO STJ APROVOU TESE NO SENTIDO DE QUE A RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC) INDEPENDE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE COBROU VALOR INDEVIDO, REVELANDO-SE CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. NO CASO, TRATANDO-SE DE DEMANDA REVISIONAL, TAL ENTENDIMENTO NÃO SE APLICA, UMA VEZ QUE ATÉ A DECISÃO QUE REVISA O CONTRATO O DÉBITO MOSTRA-SE HÍGIDO, NÃO HAVENDO FALAR EM COBRANÇA DE VALOR INDEVIDO. ENTRETANTO, DIANTE DA MODIFICAÇÃO CONTRATUAL, MOSTRA-SE CABÍVEL A COMPENSAÇÃO DE VALORES E A REPETIÇÃO DO INDÉBITO, NOS TERMOS DA SENTENÇA. NO PONTO, RECURSO DESPROVIDO. APELAÇÃO DESPROVIDA, POR UNANIMIDADE. (Apelação Cível, Nº 50752271420218210001, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Maraschin dos Santos, Julgado em: 31-08-2022). APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. MAJORAÇÃO. REMUNERAÇÃO DIGNA AO TRABALHO DESEMPENHADO PELO ADVOGADO. I. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: I. A POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS A MAIOR EM RAZÃO DE ENCARGOS CONTRATUAIS ABUSIVOS; II. A NECESSIDADE DE MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS ARBITRADOS NA SENTENÇA. III. RAZÕES DE DECIDIR: QUANTO AO PEDIDO DE REPETIÇÃO EM DOBRO, AINDA QUE O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA TENHA FIRMADO ENTENDIMENTO SEGUNDO O QUAL A RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO INDEPENDE DA DEMONSTRAÇÃO DE MÁ-FÉ, SENDO EXIGIDA APENAS A CARACTERIZAÇÃO DE CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA POR PARTE DO FORNECEDOR, VERIFICA-SE QUE NO CASO CONCRETO TAL CONDUTA NÃO RESTOU CONFIGURADA. TRATA-SE DE REVISÃO CONTRATUAL EM QUE A CONTRATAÇÃO SE MOSTRAVA HÍGIDA ATÉ O PRONUNCIAMENTO JUDICIAL, NÃO SE PODENDO AFIRMAR, POR SI SÓ, QUE A COBRANÇA DE ENCARGOS SUPERIORES À MÉDIA DE MERCADO CONFIGURA MÁ-FÉ OU AFRONTA À BOA-FÉ OBJETIVA. ASSIM, A RESTITUIÇÃO EM DOBRO NÃO SE JUSTIFICA. CONTUDO, UMA VEZ CONSTATADO O PAGAMENTO A MAIOR, É CABÍVEL A REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO OU A COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS COM EVENTUAIS PARCELAS VINCENDAS OU INADIMPLIDAS. NO TOCANTE AOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS, ENTENDO QUE O VALOR ARBITRADO NA SENTENÇA NÃO SE MOSTRA COMPATÍVEL COM A COMPLEXIDADE DA MATÉRIA, O TEMPO DESPENDIDO PARA O DESLINDE DA CONTROVÉRSIA E O ZELO PROFISSIONAL EVIDENCIADO NOS AUTOS, RAZÃO PELA QUAL É DEVIDA SUA MAJORAÇÃO, EM ATENÇÃO AO ART. 85, §§ 2º E 8º, DO CPC. DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CPC, ARTS. 85, §§ 2º E 8º; CDC, ART. 42, P.U.JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, ERESP 376.608/RS, REL. MIN. OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, J. 12.12.2018; TJRS, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5075227-14.2021.8.21.0001, 24ª CÂMARA CÍVEL, REL. DES. JORGE MARASCHIN DOS SANTOS, J. 31.08.2022. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50167228820258210001, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vivian Cristina Angonese Spengler, Julgado em: 03-07-2025). APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. 1. Uma vez indicadas as razões de fato e os fundamentos jurídicos pelos quais o autor postula a reforma da sentença recorrida, na forma do artigo 1.010, inciso II, do Código de Processo Civil, impõe-se a rejeição da preliminar de não conhecimento da apelação, suscitada pela requerida em contrarrazões. 2. A revogação do benefício da gratuidade de justiça anteriormente concedido decorre da demonstração efetiva da capacidade financeira da parte para efetuar o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios incidentes na ação judicial. Reconhecida a incapacidade financeira do consumidor para efetuar o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, impositiva a rejeição da impugnação ao benefício da gratuidade da justiça deferido em seu favor. 3. Os negócios jurídicos bancários estão sujeitos às normas inscritas no CDC (Súmula 297 do STJ), com consequente relativização do ato jurídico perfeito e do princípio pacta sunt servanda. 4. Inviável a revisão, de ofício, das cláusulas contratuais, nos termos da Súmula 381 do STJ. 5. Nos termos definidos pelo Egrégio STJ no julgamento do REsp n. 1.639.320/SP, submetido ao regime dos recursos repetitivos, a estipulação de seguro, em contratos bancários, deve garantir ao consumidor, além da opção de contratar ou não o seguro, a possibilidade de escolher a instituição com a qual contratar, sob pena de configurar venda casada, prática abusiva nos termos do artigo 39, inciso I, do CDC. 6. Restando demonstrada a cobrança de encargos abusivos, deve ser admitida a compensação e, acaso constatado saldo em favor do consumidor, a repetição simples dos valores pagos por ele a maior à instituição financeira, sob pena de enriquecimento sem causa, consoante previsto no artigo 884, caput, do Código Civil. 7. A Corte Especial do Egrégio STJ, ao interpretar o alcance do disposto no artigo 42, parágrafo único, do CDC, no julgamento do EREsp 1.413.542/RS, consolidou a jurisprudência daquele Tribunal no sentido de ser irrelevante, para a aferição da responsabilidade do fornecedor à repetição, em dobro, do montante cobrado indevidamente, a demonstração do elemento volitivo – isto é, a eventual má-fé do fornecedor –, bastando que a cobrança seja contrária à boa-fé objetiva. 8. A boa-fé objetiva, entendida como cláusula geral de proteção da lealdade e da confiança nas relações jurídicas, não é afrontada quando a cobrança, até então promovida pela instituição financeira, estava lastreada no contrato firmado pelas partes, indicando o pagamento de prestações mensais em valor pré-fixado, não podendo o consumidor alegar surpresa quanto ao cumprimento do acordado. 9. Ônus sucumbenciais redistribuídos e redimensionados. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.(Apelação Cível, Nº 50255404220248210008, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mário Crespo Brum, Julgado em: 26-06-2025).
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