Processo nº 1003094-92.2024.8.11.0008
ID: 291809948
Tribunal: TJMT
Órgão: 2ª VARA DE BARRA DO BUGRES
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 1003094-92.2024.8.11.0008
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE BARRA DO BUGRES SENTENÇA Processo: 1003094-92.2024.8.11.0008. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: EUGENIO PELACHIM REQUERIDO: …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE BARRA DO BUGRES SENTENÇA Processo: 1003094-92.2024.8.11.0008. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: EUGENIO PELACHIM REQUERIDO: MUNICÍPIO DE PORTO ESTRELA Vistos, 1. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em desfavor do MUNICÍPIO DE PORTO ESTRELA e de EUGENIO PELACHIM, todos qualificados nos autos em epígrafe. 2. Narra a exordial, em síntese, que fora instaurado procedimento administrativo pela Promotoria de Justiça, com a finalidade de fiscalizar e acompanhar o funcionamento das Unidades de Saúde da Família: USF Flávio Faria e USF Nova Esperança, ambas do Município de Porto Estrela/MT. Relata que, inicialmente, realizaram-se vistorias com o preenchimento de questionário de fiscalização contido no Ofício Circular nº 003/2023/PJEDCC pelo Técnico Administrativo e, após, expediu-se a Notificação Recomendatória nº 37/2023 ao Prefeito e ao Secretário Municipal de Saúde, para providenciarem a solução das irregularidades apontadas, os quais permaneceram inertes e não se manifestaram. Segue relatando que, foram realizadas perícias nas Unidades de Saúde supracitadas, a fim de melhor delimitar as condições das edificações, sendo apontado nos Relatórios Técnicos nº 871/2024 (Id. 168651133, págs. 66/93 – USF Flávio Faria) e nº 870/2024 (Id. 168651135, págs. 07/34), de modo geral, que a conservação das edificações está muito ruim, bem assim apresentam situações estruturais que devem ser resolvidas o mais breve possível, além de problemas relacionados à acessibilidade e segurança de tais locais, em desconformidade com a NBR 9050/2020. Diante disto, relata que fora expedida nova Notificação Recomendatória nº 009/2024 ao Prefeito e ao Secretário Municipal de Saúde, para a solução dos problemas identificados, sendo que os requeridos novamente ignoraram a notificação. 3. Por fim, relata que os locais continuam a funcionar sem atender aos padrões mínimos exigidos pela legislação, inclusive, sem a instalação elétrica adequada, expondo a grave risco as pessoas que ali trabalham e a população. Assim, considerando o intuito procrastinador do Município em providenciar o saneamento efetivo das irregularidades apontadas na Notificação Recomendatória nº 37/2023 e nos Relatórios Técnicos nº 870/2024 e nº 871/2024, considerando que, embora notificado duas vezes, permaneceu inerte, bem assim as promessas de conseguir recursos estaduais e federais apresentadas há um ano não se concretizaram, requer, em sede liminar, que os requeridos sejam compelidos a realizarem as reformas e adequações nas Unidades de Saúde: USF Flávio Faria e USF Nova Esperança, ambas do Município de Porto estrela/MT. 4. Com a exordial, colacionou documentos. 5. Recepcionado os autos (ID n. 169993622), fora acolhida parcialmente a liminar, bem como determinada a citação da parte requerida. 6. A parte ré, devidamente citada (ID n. 170683415), apresentou contestação ao ID n. 174669078, pugnando pela improcedência dos pedidos iniciais, haja vista a impossibilidade de intervenção ante a separação dos poderes. 7. Em vistas, a parte autora pugnou pelo julgamento antecipado da lide, com a procedência da ação nos exatos termos da inicial (ID n. 178666711). 8. Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. 9. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em desfavor do MUNICÍPIO DE PORTO ESTRELA e de EUGENIO PELACHIM, todos qualificados nos autos em epígrafe. 10. Verifica-se que as partes estão bem representadas, bem como, o feito encontra-se suficientemente instruído, cabendo seu julgamento. 11. Impende destacar, que os fatos foram provados por documentos, não sendo necessário, portanto, a designação de audiência instrução, motivo pelo qual procedo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que as provas juntadas aos autos são seguras e conclusivas, não havendo necessidade de se produzir provas em audiência, com fundamento no princípio da economia processual. 12. Dispõe o artigo 355, I, do Código de Processo Civil, que: “O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas; (...)” Ainda: “O juiz é o destinatário da prova, submetendo-se a seu prudente arbítrio a ponderação da necessidade da dilação instrutória, sem risco de lesar direito da parte, se o feito contém elementos suficientes para embasar sua convicção”. (TJSC – Apelação cível nº 97.003339-7, da Capital, Rel. Des. Francisco Borges). 13. Em que pese o feito estar sendo julgado de maneira antecipada, no caso em tela, não representa cerceamento de defesa ou violação ao princípio do contraditório, pois há nos autos elementos suficientes para que a decisão seja proferida, evitando-se que a causa tenha seu desfecho retardado. 14. No mesmo sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, litteris: “Inexiste cerceamento de defesa se os fatos alegados haveriam de ser provados por documentos, não se justificando a designação de audiência” (STJ-3° Turma, REsp 1.344-RJ, rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJU 4.12.89) 15. Superada esta fase, debruço-me no mérito da causa. 16. De início, registre-se que a conformação do Estado Democrático de Direito impede ao Poder Judiciário se imiscuir à função precípua do Executivo de administrar as suas atividades. Todavia, em situações excepcionais a atuação do Estado pode implicar na violação de direitos e deveres, ainda que por omissão, atraindo a intervenção judicial. 17. O Supremo Tribunal Federal proferiu julgamento que envolveu o tema em discussão, no bojo da ADPF 347, e, na ocasião, o Ministro Marco Aurélio teceu considerações em seu voto que merecem ser trazidas à baila: a intervenção judicial mostra-se legítima presente padrão elevado de omissão estatal frente a situação de violação generalizada de direitos fundamentais. Verificada a paralisia dos poderes políticos, argumentos idealizados do princípio democrático fazem pouco sentido prático. [...] No tocante ao possível óbice atinente à separação de Poderes, à alegação das capacidades institucionais superiores do Legislativo e do Executivo comparadas às do Judiciário, há de se atentar para as falhas estruturais ante o vazio de políticas públicas eficientes. É impertinente levar em conta, no caso examinado, essas formulações teóricas, uma vez que é a própria atuação estatal deficiente o fator apontado como a gerar e agravar a transgressão sistêmica e sistemática de direitos fundamentais. A intervenção judicial é reclamada ante a incapacidade demonstrada pelas instituições legislativas e administrativas, o que torna o argumento comparativo sem sentido empírico. Daí por que a intervenção judicial equilibrada, inclusive quando há envolvimento de escolhas orçamentárias, não pode ser indicada como fator de afronta às capacidades institucionais dos outros Poderes, se o exercício vem se revelando desastroso. (ADPF 347 MC, Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 09/09/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-031 DIVULG 18-02-2016 PUBLIC 19-02-2016) – grifo nosso. 18. Ainda, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 436.996-AgR, rel. Min. Celso de Mello, em 22, de novembro de 2005, que “embora resida primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar politicas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, determinar, ainda que em bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de politicas publicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas pelos órgãos estatais inadimplentes, cuja omissão por importar em descumprimento dos encargos politico-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatário mostra-se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional”. 19. A propósito, o Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento no sentido de que, em face do princípio da supremacia da Constituição, é lícito ao Poder Judiciário adotar, em sede jurisdicional, medidas destinadas a tornar efetiva a implantação de políticas públicas, se e quando se registrar situação caracterizadora de inescusável omissão estatal. 20. A vista disso, em que pese a discricionariedade da Administração Pública na definição de aplicação de recursos públicos e direcionamento de suas reformas, cabe ressaltar que incumbe ao Poder Público implementar um sistema de saúde seguro, sendo que, no caso de omissão deste, o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação dos poderes. 21. Ainda, sobre a temática, os Tribunais Superiores já prelecionaram: APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MINISTÉRIO PÚBLICO - INTERESSE SOCIAL - LEGITIMIDADE - ESCOLA ESTADUAL - PRECARIEDADE DA INFRAESTRUTURA - OBRAS DE REFORMA E MELHORIA - RISCO À SEGURANÇA - DIREITO À EDUCAÇÃO - INJUSTIFICÁVEL OMISSÃO ESTATAL - EXCEPCIONAL ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO - POSSIBILIDADE - NÃO OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES E À CLÁUSULA DA RESERVA DO POSSÍVEL - PRAZO DE CUMPRIMENTO - MODULAÇÃO - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. São indiscutíveis a legitimidade e o interesse do Ministério Público para propor ação civil pública na defesa de interesses sociais e de direitos individuais indisponíveis, mister que lhe foi atribuído pela própria Constituição Federal (caput, art. 127, CF), desde que esteja configurado interesse social relevante, como quando se discute direito à educação, de conteúdo inexoravelmente constitucional (art. 205). Conforme o excelso Supremo Tribunal Federal, o Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação ao princípio da separação dos poderes. Porém, devem estar presentes três requisitos, quais sejam, a natureza constitucional da política pública reclamada, a existência de correlação com os direitos fundamentais e a prova de que há omissão injustificada ou prestação deficiente pela Administração Pública. A educação constitui direito público subjetivo e representa verdadeira prerrogativa jurídica indisponível assegurada à criança e ao adolescente pela própria Constituição da Republica, constituindo dever do Estado viabilizar e facilitar o acesso ao ensino, para a realização prática deste direito fundamental. O direito do cidadão não poderá ser restringido por meras alegações de cunho orçamentário, incumbindo ao Estado organizar-se financeiramente para a prestação desses serviços, não cabendo a invocação do princípio da "Reserva do Possível" por meio de simples alegação, sem demonstração concreta da impossibilidade do cumprimento de suas atribuições constitucionais. A realização das obras necessárias na infraestrutura de instituição de ensino requer planejamento e organização por parte do ente público, assim, revelando-se exíguo o prazo definido para cumprimento da obrigação, imperiosa sua dilação. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.20.570296-2/001, Relator (a): Des.(a) Geraldo Augusto , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 23/03/2021, publicação da súmula em 25/03/2021) – grifo nosso. 22. Feitas tais considerações, tem-se no presente caso, situação excepcional, ante a violação às garantias fundamentais assegurada aos cidadãos pela Constituição Federal, com absoluta prioridade, nos termos do artigo 196 da CF. 23. Dito isso, tem-se que o artigo 196 da Constituição Federal dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido sempre mediante políticas públicas sociais e econômicas, pelo que o Ente Municipal não pode se esquivar do seu dever constitucional. 24. O direito fundamental à saúde está inserido no conceito de “dignidade humana”, previsto no inciso III do artigo 1º da Constituição Federal, e não há como se falar em dignidade se não houver condições mínimas de garantia da saúde do individuo. 25. Da mesma forma, a proteção ao direito à saúde é manifestada no caput do artigo 5º da Constituição, que defende o direito à vida, o mais fundamental dos direitos. Vejamos: Artigo 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, e à propriedade, nos termos seguintes. 26. Como direito social, o direito à saúde é o segundo a ser mencionado no caput do artigo 6º da Constituição Federal. A Lei Orgânica da Saúde (nº. 8.080/90), que dispõe sobre as condições para promoção, proteção, recuperação da saúde, bem como a organização e o funcionamento dos serviços, estabelece em seu art. º, caput e § 2º, vejamos: Art. 2º - A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 1º - O dever do Estado de garantir a saúde consiste na reformulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos e doenças e de outros agravos no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. 27. Com efeito, o dever do Estado (lato sensu) não se restringe apenas a organizar as políticas públicas que visem a combater e prevenir a população da propagação de doenças, mas também de promover um atendimento digno nas unidades de saúde que mantém a disposição da população. 28. Neste ponto, parece importante consignar que é certo que não cabe ao Judiciário discutir a implementação ou não de políticas públicas, ou impor programas políticos, ou direcionar recursos financeiros para estes ou aqueles fins por ele determinados. 29. Esse juízo discricionário cabe à Administração, entretanto, diante da omissão da administração em efetivar direitos fundamentais das pessoas, cabe ao Judiciário dar efetividade à lei, determinar que ela seja cumprida e respeitada pelos demais poderes, entregando a resposta efetiva às pretensões das partes. 30. Assim, pode-se afirmar que não compete ao Poder Judiciário estabelecer políticas públicas, porém, da mesma forma, não lhe é permitido calar-se ou omitir-se diante de situação fática de patente violação de garantias e direitos fundamentais assegurados pela Constituição da Republica. 31. Portanto, não há ofensa ao principio da separação dos poderes quando a atuação do Poder Judiciário visa suprir a inércia ou omissão estatal em implementar políticas públicas constitucionalmente previstas. 32. Este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal: Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo e Processual Civil. Direito à saúde. Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Ação civil pública. Limites territoriais da eficácia da decisão. Repercussão geral. Ausência. Legislação infraconstitucional. Ofensa reflexa. Precedentes. 1. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração Pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da Constituição Federal. 2. O Supremo Tribunal Federal, no exame do ARE nº 796.473/RS, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 21/10/14, concluiu pela ausência de repercussão geral da questão relativa aos limites territoriais da coisa julgada, tendo em vista a execução de sentença proferida em ação civil pública, dado seu caráter infraconstitucional. 3. Agravo regimental não provido. 4. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, pois não houve fixação prévia de honorários advocatícios na causa. (STF - RE 1021895 AgR, Relator (a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 29/09/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-239 DIVULG 19-10-2017 PUBLIC 20-10-2017). 33. Analisando detidamente os autos, especialmente os documentos carreados ao ID n. 168651133 e ID n. 168651135, tem-se a precariedade estrutural do prédio que se encontra as unidades de saúde, no município requerido. 34. O conjunto probatório constante nos autos, notadamente pelas diversas notificações encaminhadas pelo Ministério Público, notificação recomendatória (ID n. 168651135 – Pág. 66/68) e Relatório Técnico n. 870/2024 do Centro de Apoio Operacional do Ministério Público – CAO (ID n. 168651135 – Pág. 7/62), provou a inércia contumaz do Município em realizar as obras necessárias e urgentes na estrutura das unidades de saúde. 35. O Relatório Técnico n. 870/2024 do Centro de Apoio Operacional do Ministério Público – CAO (ID n. 168651135 – Pág. 7/62) revela diversas falhas estruturais nas unidades de saúde objeto da presente ação, situadas no município requerido, necessitando de uma reforma geral, bem como proceder com a adequação de acessibilidade. 36. Ainda, se depreende da documentação carreada aos autos, que apesar da notificação recomendatória (ID n. 168651135 – Pág. 66/68) o Município requerido deixou transcorrer in albis o prazo sem apresentar qualquer manifestação (ID n. 168651135 – Pág. 75). 37. Pois bem, tem-se que mesmo com o acionamento do Ministério Público não foi apresentado pelo Município qualquer solução satisfatória para o problema, nem sequer um planejamento, mesmo em longo prazo, de correção das falhas. 38. Logo, o tempo transcorrido desde o início da provocação ao Município para solução dos problemas, somado às falhas que foram constatadas pelo Centro de Apoio Operacional do Ministério Público – CAO (ID n. 168651135 – Pág. 7/62) aos direitos violados por ele, e à desídia em tratar adequadamente o tema, são fatores que desaguam na necessária intervenção judicial, com a procedência da pretensão do autor. 39. Outrossim, em que pese os argumentos elencados em contestação ao ID n. 174669078, registre-se que estes não demonstram fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito da parte autora, nos termos do artigo 373, II do CPC. 40. Isto posto, não pairam dúvidas que é dever do requerido reformar e manter as unidades de saúde municipais para que estejam aptas a atender a população, garantido as condições necessárias e adequadas para o seu regular funcionamento. 41. À vista disso, diante de todo o arcabouço documental que acompanhou a inicial, é certo que a segurança, a integridade física e a saúde da comunidade municipal está comprometida, necessitando as instituições de reformas, de forma a preservar a própria integridade física dos servidores e da população que frequenta das unidades de saúde. 42. Assim, eventual alegação de necessidade de observância à reserva do possível ou déficit financeiro, ou mesmo dificuldades burocráticas não constituem óbice ao dever da administração de prestar a devida assistência e não podem ser utilizados como argumentos para justificar gestões ineficientes, pois as políticas públicas que não concretizam os direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa humana, mormente quando desatendem o mínimo existencial, assegurado pela Carta Magna. 43. Ademais, não se pode alegar a escassez de recursos para se eximir de fornecer um ambiente adequado aos pacientes, interesse que sobrepõe o interesse financeiro da administração, devendo, se for o caso, realizar a melhor gestão dos recursos financeiros para tanto. 44. Nesse contexto, evidenciado que o Município não cumpriu com o seu dever constitucional, sendo o caso de intervenção do Poder Judiciário no cumprimento de políticas públicas, dando procedência ao pedido inicial, conforme já decidiu o E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso em casos semelhantes: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL C/C REEXAME NECESSÁRIO DE SENTENÇA– AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – REFORMA EM ESCOLA ESTADUAL – DIREITO SOCIAL E FUNDAMENTAL - OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES – OMISSÃO E INÉRCIA DO PODER PÚBLICO – POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NO CUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS – ARGUMENTO DE OFENSA AO DIREITO FINANCEIRO – IMPOSSIBILIDADE – INOVOCAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL – IMPOSSIBILIDADE – PEDIDO DE DILAÇÃO DE PRAZO – IMPOSSIBILIDADE – NÃO INFRINGÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - RECURSO DESPROVIDO E, EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO, SENTENÇA RATIFICADA. 1. Separação dos poderes. Inocorrência. Em se tratando de políticas públicas somente haveria invasão de competência caso não evidenciada a omissão do poder público na observância de um dever e uma OBRIGAÇÃO imposta pela Constituição Federal. 2. O direito social, essencial e fundamental à educação, é assegurado na lei maior, não sendo apenas uma faculdade, mas sim um dever estatal em cumprir e executar tal política pública, conforme preconiza os art. 6º e 205, ambos da Carta Magna. 3. Assim, de forma excepcional, tem o Poder Judiciário o dever de atuar no sentido de determinar que o poder público, ante a sua inércia e omissão, com o intuito de garantir a eficácia e a integridade de direitos individuais ou coletivos descritos na Constituição Federal. 4. Os problemas descritos na exordial estão relacionados às condições mínimas para o desenvolvimento das atividades cotidianas e rotineiras na unidade escolar, de forma que não pode o poder deixar de cumprir e atender as demandas e necessidades coletivas, haja vista que a Administração Pública deve garantir um mínimo existencial. Nesse norte, não procede ao argumento de limitações financeiras, escolhas condicionadas às autorizações orçamentárias, ofensa às normas de direito financeiro, pretensão ministerial vedada pelos princípios constitucionais regulares da execução orçamentária. 5. Argumento de cumprimento da OBRIGAÇÃO por meio do projeto/atividade 398 (Pró-ESCOLA) fixado na lei orçamentária anual (Lei Estadual nº 10.515/17) não encontra guarida nos autos, uma vez que se trata de matéria não suscitada e discutida somente no âmbito recursal, configurando, assim, inovação recursal, o que é vedado em nosso ordenamento jurídico por ofensa ao princípio do juiz natural e supressão de instância. 6. Aplicação do princípio da reserva do possível. 7. Inconcebível que o ESTADO deixe de cumprir as suas OBRIGAÇÕES constitucionais, uma vez que a Administração Pública deve garantir um mínimo existencial, em atenção a outro princípio fundamental e, também, de ordem constitucional, qual seja: o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, estampado no art. 1º, III, da Carta da República. Assim, não pode o Apelante invocar a aplicação da reserva do possível como forma de se esquivar a cumprir o núcleo básico do mínimo existencial. 8. Quanto ao pedido de dilação de prazo para execução das medidas e ofensa aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, o mesmo não procede, uma vez que a fixação de 180 (cento e oitenta) dias é um lapso temporal bastante generoso e suficiente para sanar os problemas descritos na exordial, não havendo que se falar em ofensa aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 9. Recurso de Apelação desprovido. Sentença ratificada. (N.U 0003670-84.2016.8.11.0040, 95837/2017, DESA.MARIA EROTIDES KNEIP BARANJAK, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 02/04/2018, Publicado no DJE 25/04/2018). – grifo nosso. REMESSA NECESSÁRIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – OBRIGAÇÃO DE FAZER – REFORMA E ADEQUAÇÃO DE ESCOLA MUNICIPAL – RISCO À SEGURANÇA, EDUCAÇÃO E SAÚDE – NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO A SEPARAÇÃO DOS PODERES – NÃO OCORRÊNCIA – SENTENÇA RATIFICADA. Não configura violação à separação dos poderes a ingerência do Poder Judiciário na determinação de adoção de políticas públicas constitucionalmente garantidas, por parte do ESTADO, quando este se mantém omisso em propiciar condições mínimas de salubridade e segurança às crianças e aos adolescentes de instituição de ensino de sua responsabilidade. A Constituição Federal assegura à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão; o Estatuto da Criança e do Adolescente reproduz a norma constitucional em seu art. 4º e, especialmente, no que se refere à educação, no art. 53. (N.U 0012010-73.2012.8.11.0002, ReeNec 24969/2018, DES.JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 18/12/2018, Publicado no DJE 22/01/2019). – grifo nosso. 45. Feitas tais considerações, a procedência da ação é a medida que se impõe. 46. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a presente ação, com fulcro no artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil, posto que, confirmo a liminar concedida ao ID n. 169992056, e, em consequência, condeno a parte requerida ao cumprimento de obrigação de fazer consistente em providenciar a execução da reforma e adequação nas Unidades de Saúde USF Flávio Faria e USF Nova Esperança,, todas localizadas no Município de Porto Estrela/MT, a fim de que sejam sanadas todas as irregularidades apontadas pelo relatório técnico nº 546/2024 do CAO (ID n. 168621039 – Pág. 17/72 ; 168622193 – Pág. 1/11), a fim de que sejam sanadas as irregularidades apontadas nas Notificações Recomendatórias nº 37/2023 e nº 009/2024, e nos Relatórios Técnicos nº 870/2024 e nº 871/2024, bem como, para que sejam providenciados os alvarás que estão ausentes nas referidas unidades, e, por conseguinte, concedo excepcionalmente, o prazo suplementar de 90 (noventa) dias para comprovação do seu cumprimento nos autos, e, em consequência extingo o feito com resolução de mérito. 47. Isento de custas e honorários, eis que incabíveis a espécie. 48. Transitado em julgado e nada mais sendo requerido, arquive-se os autos com as baixas e anotações de praxe. P.R.I.Cumpra-se. Barra do Bugres-MT, 05 de junho de 2025. Arom Olímpio Pereira Juiz de Direito
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