Processo nº 1024178-42.2025.8.11.0000
ID: 333564617
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1024178-42.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
24/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FABRICIO MONTEIRO OLIVEIRA
OAB/MT XXXXXX
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GRAVANTE: SIMONE APARECIDA DOS SANTOS AGRAVADO: BRADESCO SAUDE S/A Vistos, etc. Trata-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por SIMONE APARECIDA DOS SANTOS…
GRAVANTE: SIMONE APARECIDA DOS SANTOS AGRAVADO: BRADESCO SAUDE S/A Vistos, etc. Trata-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por SIMONE APARECIDA DOS SANTOS, contra decisão interlocutória proferida (ID. 200229424 – autos de origem - PJE n.º 1061245-15.2025.8.11.0041) pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá-MT, que indeferiu a tutela antecipada de urgência que visava determinar que o plano de saúde custeasse cirurgias reparadoras pós-bariátrica, sob os seguintes fundamentos: “Simone Aparecida dos Santos ajuizouação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgênciacontra Bradesco Saúde S/A, ambas qualificadas. Relata a inicial que a autora é beneficiária do plano de saúde oferecido pela ré, estando em dia com suas obrigações contratuais e sem qualquer carência a cumprir. Narra que, diagnosticada com obesidade severa, pesando 98kg, submeteu-se a cirurgia bariátrica, com expressiva perda ponderal de 38kg, atingindo 60kg. Afirma que após o procedimento, passou a apresentar sérias alterações decorrentes do excesso de pele remanescente, como abdome em avental, lipodistrofias em coxas, dorso, trocânteres, região pubiana e braços, flacidez e assimetrias mamárias, além de dermatites de repetição, dores lombares causadas por diástase dos músculos retos abdominais e dificuldades de higienização. Tais sequelas físicas têm comprometido sua qualidade de vida e agravado quadros de ansiedade e depressão. Informa que, por recomendação médica, procurou dar continuidade ao tratamento pós-bariátrico, sendo indicada a realização de múltiplos procedimentos cirúrgicos de caráter reparador e funcional, todos com urgência atestada por profissional da confiança da autora. A lista de cirurgias prescritas inclui: (i) dermolipectomia de braços (por lipodistrofia); (ii) toracoplastia; (iii) dermolipectomia abdominal com reconstrução da parede abdominal e tratamento de extensos ferimentos; (iv) dermolipectomia de dorso (lipodistrofia) com lifting de glúteos; (v) herniorrafia umbilical; e (vi) enxerto composto. Contudo, o plano de saúde autorizou apenas parte das intervenções, negando a cobertura de todas as demais, sob o argumento de que teriam finalidade estética. Sustenta que a negativa da ré contraria a Lei nº 14.454/2022, que modificou o caráter taxativo do rol da ANS, bem como o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 1069, que reconhece como parte integrante do tratamento da obesidade mórbida as cirurgias plásticas de caráter reparador indicadas pelo médico assistente após cirurgia bariátrica. Postula a concessão da tutela provisória de urgência, para determinar à ré que autorize e custeie integralmente todas as cirurgias prescritas, conforme indicado pelo médico cirurgião plástico Rodrigo Bernardino. Ao final, requer a condenação da seguradora de saúde ao pagamento de indenização por danos morais. A inicial foi instruída com diversos documentos. Os autos me vieram conclusos. É o relatório. Decido. Diante da alegação da autora de que está desempregada, bem como da juntada de cópia de sua CTPS, concedo à os benefícios da Justiça Gratuita (artigo 98, CPC). Em análise sumária aos autos e documentos que instruem o feito, verifico que a tutela pretendida é a provisória de urgência, prevista no art. 300, CPC. O art. 300 do Código de Processo Civil traz os pressupostos necessários para o deferimento da liminar pretendida: “A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.” Sobre esse tema, Fredie Didie Jr. leciona: “As tutelas provisórias de urgência (satisfativa ou cautelar) pressupõem a demonstração de ‘probabilidade do direito’ e do ‘perigo da demora’ (art. 300, CPC).” (Incurso de direito processual civil. Ed. Jus Podivm, Salvador, 2016, p.584). Deste modo, para o deferimento da tutela, deve estar evidenciada a probabilidade do seu direito e o perigo da demora, cumulativamente. In casu, a autora afirma ter sido submetida a cirurgia bariátrica para tratamento de obesidade mórbida há dois anos atrás, oportunidade em que reduziu seu peso de 98kg para 60kg. Como continuidade ao tratamento da obesidade, o médico especialista de sua confiança indicou os seguintes procedimentos reparadores:(i) dermolipectomia de braços (por lipodistrofia); (ii) toracoplastia; (iii) dermolipectomia abdominal com reconstrução da parede abdominal e tratamento de extensos ferimentos; (iv) dermolipectomia de dorso (lipodistrofia) com lifting de glúteos; (v) herniorrafia umbilical; e (vi) enxerto composto. A ré, por sua vez, autorizou apenas parte dos procedimentos, ensejando a propositura desta demanda, sob a justificativa de que há urgência na realização das cirurgias. Em que pese as alegações contidas na inicial de que as cirurgias reparadoras foram indicadas como continuidade ao tratamento de obesidade pós cirurgia bariátrica realizada há dois anos, há dúvida razoável acerca da natureza eminentemente estética dos procedimentos, o que motivou a ré a autorizar apenas parte das cirurgias. Ademais, embora o Relatório médico anexado ao Id. 199362365 indique a necessidade de urgência na realização dos procedimentos, nesta análise em que a cognição é feita de modo limitado,inexistemelementos que evidenciem risco eminente à saúde da paciente, especialmente porque segundo consta no mesmo relatório, a autora está com peso estabilizado há dois anos, o que por si só afasta o requisito do perigo da demora. Logo, pode a autora aguardar a dilação probatória para que este Juízo melhor analise a questão. Com efeito, tem decidido o TJMT em casos semelhantes nesse mesmo sentido. Vejamos algumas ementas: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE.CIRURGIAREPARADORAPÓS-BARIÁTRICA.TUTELADEURGÊNCIA. AUSÊNCIA DE REQUISITOS LEGAIS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME. Agravo de Instrumento interposto contra decisão da 10ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, que concedeututeladeurgênciapara determinar que o plano de saúde custeassecirurgiasreparadoraspós-bariátricas, fixando multa diária em caso de descumprimento. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO. A questão em discussão consiste em saber se estão presentes os requisitos legais para a concessão detuteladeurgência, diante da alegação de que os procedimentos médicos solicitados seriam estéticos e não urgentes, o que questiona a necessidade imediata de sua realização e a obrigatoriedade de cobertura pelo plano de saúde. III. RAZÕES DE DECIDIR. O laudo médico da autora indica necessidade decirurgiasreparadoras, mas não caracterizaurgêncianos termos do art. 35-C da Lei nº 9.656/1998. A seguradora apresentou dúvidas quanto à natureza estritamentereparadoradascirurgias, o que justifica a necessidade de instrução processual para averiguar o caráter estético oureparadordos procedimentos. O Tema 1069 do STJ estabelece que é devida a cobertura decirurgiasreparadoraspós-bariátricas, mas permite avaliação por junta médica quando houver controvérsia técnica sobre a indicação dos procedimentos. Atutelaantecipada possui natureza satisfativa e irreversível, o que, de acordo com o § 3º do art. 300 do CPC, não se aplica sem a demonstração inequívoca daurgênciae da irreversibilidade dos efeitos da decisão. A controvérsia técnica existente sobre a natureza dos procedimentos médicos deve ser resolvida após a devida instrução probatória, podendo, se for o caso, determinar a realização dascirurgiasposteriormente. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido para revogar a decisão que concedeu atuteladeurgência. Tese de julgamento: A concessão detuteladeurgênciacontra plano de saúde, para custeio decirurgiareparadorapós-bariátrica, exige demonstração inequívoca daurgênciamédica e da naturezareparadorado procedimento. Havendo dúvida técnica justificada quanto ao caráter estético dacirurgia, a questão deve ser resolvida mediante prova pericial no curso do processo. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 300; L. 9.656/1998, art. 35-C. Jurisprudência relevante citada: Tema 1069 do STJ; TJMT, AI nº 1024979-26.2023.8.11.0000; STJ, Tema 1069. (N.U 1018636-43.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/07/2025, Publicado no DJE 05/07/2025. Negritei.) AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – CIRURGIAREPARADORAPÓS-BARIÁTRICA – LIMINAR DEFERIDA NA ORIGEM – URGÊNCIANÃO DEMONSTRADA – DECISÃO REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Não havendo nos autos comprovação acerca daurgênciados procedimentos cirúrgicos pleiteados pela parte Autora, deve ser indeferido o pedido detutelaantecipada. (N.U 1018428-93.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 14/08/2024, Publicado no DJE 20/08/2024. Negritei.) AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE.TUTELADEURGÊNCIAINDEFERIDA. PRETENSÃO DE COBERTURA DECIRURGIAREPARADORAPÓS-BARIÁTRICA. LAUDO MÉDICO QUE ATESTA SER PACIENTE EM PÓS-OPERATÓRIO TARDIO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE COMPROVEM A NEGATIVA DE AGENDAMENTO DE PERÍCIA MÉDICA PELO PLANO DE SAÚDE. LAUDO MÉDICO QUE NÃO INDICA RISCO DE VIDA, NOS TERMOS DO ART. 35-C DA LEI 9.656/98.URGÊNCIANÃO VERIFICADA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O deferimento datutelaprovisória deurgênciapressupõe a demonstração da probabilidade do direito, bem como da comprovação do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. 2. No caso, há dúvidas sobre a negativa do procedimento pela operadora de saúde e, embora o relatório médico sinalize a probabilidade de direito, não comprova que a eventual demora na realização dacirurgiaplásticareparadorapoderá causar dano irreversível à paciente. Assim, não demonstrado o perigo de dano, imperioso a revogação da decisão hostilizada que compeliu a Operadora do plano de saúde a custear o procedimento. (TJ-MT 1001884.98-2022.8.11.0000, Relatora: Clarice Claudino da Silva, Data de Julgamento: 20/04/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/04/2022). 3. Recurso conhecido e desprovido. (N.U 1015119-64.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/08/2024, Publicado no DJE 21/08/2024. Negritei.) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - PLANO DE SAÚDE - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER –TUTELADEURGÊNCIACONCEDIDA – CIRURGIASREPARADORASPÓS BARIÁTRICA – NEGATIVA DA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE – DÚVIDA NA NATUREZA DACIRURGIA– NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA - PERIGO DE DANO NÃO COMPROVADO - DECISÃO REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO “Havendo dúvidas justificadas e razoáveis quanto ao caráter eminentemente estético dacirurgiaplástica indicada ao paciente póscirurgiabariátrica, a operadora de plano de saúde pode se utilizar do procedimento da junta médica, formada para dirimir a divergência técnico assistencial, desde que arque com os honorários dos respectivos profissionais e sem prejuízo do exercício do direito de ação pelo beneficiário, em caso de parecer desfavorável à indicação clínica do médico assistente, ao qual não se vincula o julgador” (Tema 1069 do STJ). (N.U 1014426-80.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/07/2024, Publicado no DJE 05/08/2024. Negritei.) Posto isto, INDEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA PROVISÓRIA requerida. [...]” A Agravante sustenta que perdeu 38 kg após cirurgia bariátrica e que sofre de sérias complicações físicas e emocionais decorrentes do excesso de pele, como infecções cutâneas, dores lombares e transtornos psicológicos, conforme laudo médico do Dr. Rodrigo Bernardino. Aduz que tais cirurgias são parte integrante do tratamento da obesidade mórbida e não possuem caráter meramente estético. Alega ainda que a negativa de cobertura, sob justificativa de ausência contratual ou falta de urgência, contraria a Lei nº 9.656/98, a jurisprudência consolidada no âmbito do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, e o entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece o caráter reparador e funcional dessas cirurgias. Defende que estão presentes os requisitos do art. 300 do CPC, tendo em vista a probabilidade do direito, diante da indicação médica expressa, e o perigo de dano, considerando o agravamento do quadro clínico caso os procedimentos não sejam realizados com urgência. Diante disso, pugna pela atribuição de efeito suspensivo e, no mérito, pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar a decisão agravada, autorizando o custeio integral das cirurgias reparadoras indicadas como parte do tratamento pós-cirurgia bariátrica. Dispensado recolhimento do preparo recursal por ser beneficiária da justiça gratuita. É o relatório. Decido. O presente recurso é tempestivo, possui cabimento com base no art. 1.015, parágrafo único, Código de Processo Civil, e preenche os demais requisitos de admissibilidade estabelecidos no art. 1.017 do referido diploma processual. A concessão do efeito suspensivo condiciona-se à relevância da fundamentação formulada pela agravante, bem como à possibilidade de lesão grave e de difícil reparação, nos termos dos artigos 995, § único, do Código de Processo Civil: “Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso”. É cediço que o art. 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil, no âmbito do Tribunal de Justiça, preconiza que o relator do agravo de instrumento poderá conceder efeito suspensivo ao recurso, ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, desde que demonstrada a plausibilidade do direito invocado e, ainda, o perigo de dano ou o risco de afetar o resultado útil do processo. Todavia, não se pode olvidar que em matéria de agravo de instrumento a análise é restrita ao acerto, ou desacerto, do ato recorrido, sob pena de caracterizar supressão de instância, isso sem descurar do caráter de cognição não exauriente que impera nesta fase processual. Impende salientar que para justificar o deferimento do pleito, é imprescindível que a parte demonstre a existência de perigo de dano, e que o prejuízo será irreversível ou de improvável recomposição caso não seja antecipada a tutela recursal vindicada. Além, é claro, da probabilidade do direito (art. 300 do CPC). Nesse diapasão, nos estreitos limites deste instrumental, o exame das questões de fundo do direito discutido, sendo pertinente apenas aferir se estão, ou não, presentes os requisitos necessários para concessão do efeito pretendido. No caso dos autos, verifica-se que os procedimentos cirúrgicos foram recomendados à autora/agravada pelo cirurgião plástico Dr. Rodrigo Bernardino (ID 199362365 do processo matriz), com a finalidade de corrigir deformidades decorrentes de significativa perda de peso (38 kg), após a realização de cirurgia bariátrica. O periculum in mora invocado pela parte agravante fundamenta-se, sobretudo, na suposta urgência da realização dos procedimentos cirúrgicos como meio de promover melhoria na qualidade de vida da paciente, tanto no aspecto físico quanto psicológico, especialmente por impactarem diretamente sua imagem pessoal e autoestima, bem como diante da ocorrência de dermatites por repetição e dores lombares. Contudo, a jurisprudência e a doutrina são firmes no sentido de que, para fins de concessão de tutela provisória de urgência, exige-se a presença cumulativa dos requisitos previstos no art. 300 do Código de Processo Civil, quais sejam: a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No presente caso, embora a relevância da questão esteja posta, a análise da urgência, sob o ponto de vista jurídico, não encontra respaldo suficiente nos elementos constantes dos autos. Não se ignora a importância das cirurgias reparadoras, tampouco a sua potencial influência positiva na qualidade de vida da paciente. No entanto, tais alegações, ainda que pertinentes, não constituem por si só motivo hábil a justificar o deferimento da tutela de urgência, sobretudo em se tratando de demanda que envolve cláusulas contratuais de plano de saúde e limites de cobertura, cuja verificação demanda instrução probatória adequada, inclusive mediante eventual realização de perícia técnica. Acresça-se que a parte agravante está em processo de emagrecimento há tempo considerável, não se tratando de uma situação recente, súbita ou emergencial. Ao iniciar o tratamento, contava com aproximadamente 38 kg a mais do que apresenta atualmente, cenário que, à época, era significativamente mais gravoso sob o ponto de vista clínico e funcional, inclusive quanto à sua qualidade de vida. Ainda assim, não se configurou risco imediato à vida que justificasse providência de urgência como a ora pleiteada. Ou seja, trata-se de um processo gradual, prolongado e planejado de readequação corporal, o qual naturalmente exige acompanhamento e avaliações periódicas, inclusive para definição da eventual necessidade e oportunidade da realização de procedimentos complementares, como é o caso das cirurgias ora requeridas. Ressalte-se, ainda, que a negativa do plano de saúde à cobertura dos procedimentos baseou-se na alegação de que estes não estão incluídos no rol da ANS, sendo classificados como de natureza estética, portanto sem cobertura obrigatória. A análise dessa alegação requer, de forma incontornável, dilação probatória, especialmente para avaliar se os procedimentos possuem, de fato, finalidade reparadora, o que poderá ser devidamente apurado por perícia médica no curso da instrução. Ainda que o profissional de saúde tenha classificado os procedimentos como urgentes, tal urgência foi relacionada à qualidade de vida da paciente, e não à existência de risco iminente à saúde ou à vida, requisito essencial para configuração do periculum in mora em sentido estritamente jurídico. Melhor dizendo, trata-se de demanda cuja urgência, embora sensível no plano subjetivo da autora, não se qualifica como jurídica nos moldes exigidos pelo ordenamento para antecipação de tutela. Ademais, embora a parte agravante tenha colacionado jurisprudência favorável de outros casos semelhantes, é importante destacar que a matéria em debate possui caráter essencialmente casuístico, de modo que a análise da tutela provisória deve considerar as particularidades de cada situação concreta. Dessa forma, diante da ausência de demonstração inequívoca de risco de dano grave ou de difícil reparação, e considerando a necessidade de instrução probatória para delimitar os contornos contratuais e médicos da controvérsia, mostra-se prudente o aguardo da instrução processual, que assegura o contraditório e a ampla defesa. Nos termos do art. 35-C da Lei nº 9.656/1998, os planos de saúde estão obrigados a cobrir apenas atendimentos de urgência ou emergência, caracterizados por risco imediato à vida ou por lesões irreparáveis, o que não se verifica no caso concreto. O tema foi recentemente enfrentado pelo Superior Tribunal de Justiça, que, sob o rito dos recursos repetitivos (REsp nº 1.870.834/SP e REsp nº 1.872.321/SP), fixou a Tese Repetitiva nº 1.069, reconhecendo a obrigatoriedade da cobertura das cirurgias plásticas de natureza reparadora ou funcional em pacientes pós-bariátricos, desde que indicadas pelo médico assistente. O STJ também admitiu que, havendo dúvidas justificadas quanto ao caráter reparador da cirurgia, a operadora pode recorrer a junta médica para dirimir a controvérsia, arcando com os respectivos custos, sem prejuízo do direito de ação do beneficiário. Fixou a Tese Repetitiva nº 1.069, nos seguintes termos: “(i) É de cobertura obrigatória pelos planos de saúde a cirurgia plástica de caráter reparador ou funcional indicada pelo médico assistente, em paciente pós-cirurgia bariátrica, visto ser parte decorrente do tratamento da obesidade mórbida; (ii) Havendo dúvidas justificadas e razoáveis quanto ao caráter eminentemente estético da cirurgia plástica indicada ao paciente pós-cirurgia bariátrica, a operadora de plano de saúde pode se utilizar do procedimento da junta médica, formada para dirimir a divergência técnico-assistencial, desde que arque com os honorários dos respectivos profissionais e sem prejuízo do exercício do direito de ação pelo beneficiário, em caso de parecer desfavorável à indicação clínica do médico assistente, ao qual não se vincula o julgador.” No caso em análise, o descompasso entre o laudo médico da paciente e o retorno negativo do plano levanta dúvidas razoáveis quanto à natureza dos procedimentos pleiteados, reforçando a necessidade de instrução probatória, inclusive com eventual perícia técnica, para verificar se as intervenções são realmente reparadoras ou meramente estéticas, bem como delimitar o nível de cobertura do plano à luz do contrato. Ademais, conforme a normativa da ANS, apenas a abdominoplastia e a correção da diástase abdominal estão expressamente previstas como de cobertura obrigatória no contexto pós-bariátrico. Os demais procedimentos dependem de justificativa clínica funcional, nos termos do art. 35-F da mesma lei, que assegura a cobertura dos atendimentos essenciais ao tratamento da enfermidade, dentro dos limites do contrato. Assim, não se pode presumir a cobertura de qualquer cirurgia complementar à bariátrica, sob pena de desvirtuar a regulamentação vigente. Por fim, a ausência de urgência real e a existência de controvérsia técnica sobre o direito alegado inviabilizam a concessão da tutela antecipada, recomendando-se o regular prosseguimento da instrução processual. Corroboram esse entendimento os julgados desta Egrégia Corte de Justiça: “AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PACIENTE COM OBESIDADE MÓRBIDA – PRESCRIÇÃO DE CIRURGIA PLÁSTICA CORRETIVA PÓS BARIÁTRICA – NEGATIVA DE COBERTURA PELO PLANO DE SAÚDE – NÃO APRESENTADA - PROCEDIMENTO NECESSÁRIO E COMPLEMENTAR AO TRATAMENTO DE QUEM REALIZA CIRURGIA BARIÁTRICA – NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA - DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. É indevida a concessão da antecipação da tutela quando há dúvidas acerca do caráter funcional e reparador das cirurgias pleiteadas por paciente pós-bariátrica, pois a questão requer dilação probatória para melhor esclarecimento. (N.U 1018858-45.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/09/2024, Publicado no DJE 11/09/2024)” RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA - PLANO DE SAÚDE - PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS PÓS-BARIÁTRICA - JULGAMENTO REPETITIVO - TEMA 1.069 DO STJ - DÚVIDAS RAZOÁVEIS DA OPERADORA QUANTO AO CARÁTER REPARADOR DOS PROCEDIMENTOS - AUSÊNCIA CUMULATIVA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 300, CAPUT, DO CPC/15 - DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO. Não obstante tenha a colenda Corte do STJ editado o TEMA 1.069 em julgamento dos Recursos Especiais nº 1870834/SP e nº 1872321/SP, donde se conclui pela obrigatoriedade de custeio dos procedimentos cirúrgicos pós-bariátrica, nos julgados ficou ainda consignado que “... havendo dúvidas justificadas e razoáveis quanto ao caráter eminentemente estético da cirurgia plástica indicada ao paciente pós-cirurgia bariátrica, a operadora de plano de saúde pode se utilizar do procedimento da junta médica, formada para dirimir a divergência técnico-assistencial, desde que arque com os honorários dos respectivos profissionais e sem prejuízo do exercício do direito de ação pelo beneficiário, em caso de parecer desfavorável à indicação clínica do médico assistente, ao qual não se vincula o julgador”. Assim, prudente o aguardo da instrução processual uma vez que não evidenciada a urgência para a realização do procedimento, no caso em que pleiteia o custeio da cirurgia reparadora pós-bariátrica.- (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1004032-14.2024.8.11.0000, Relator: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 17/04/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/04/2024) – Grifo Nosso AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - PLANO DE SAÚDE – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – PRETENDIDA COBERTURA DE CIRURGIA REPARADORA PÓS-BARIÁTRICA – URGÊNCIA NÃO VERIFICADA – NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA – DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO. O deferimento da tutela provisória de urgência pressupõe a demonstração da probabilidade do direito, bem como da comprovação do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. No caso, embora o relatório médico sinalize a probabilidade de direito, não comprova que a eventual demora na realização da cirurgia plástica reparadora poderá causar dano irreversível à paciente. Assim, não demonstrado o perigo de dano, imperioso a revogação da decisão hostilizada que compeliu a Operadora do plano de saúde a custear o procedimento. (N.U1001884-98.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADASCÍVEIS DE DIREITO PRIVADO,CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/04/2022, Publicado no DJE 22/04/2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – DEFERIMENTO DA LIMINAR PARA REALIZAÇÃO DE CIRURGIA PLÁSTICA REPARADORA NÃO ESTÉTICA EM FUNÇÃO DE EMAGRECIMENTO DRÁSTICO PROVINDO DE CIRURGIA BARIÁTRICA – AUSÊNCIA DE REQUISITO ESSENCIAL À CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA, QUAL SEJA, O PERIGO NA DEMORA – DECISÃO REFORMADA – Agravo Conhecido e Provido. Nos termos do art.300, doCPC, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso, embora haja probabilidade do direito da agravante, não se vislumbra, nesse momento processual, qualquer urgência para realização do procedimento cirúrgico pleiteado, uma vez que, conforme documentos juntados, há tão somente proposta de honorários médicos para a realização da cirurgia reparatória e atestado de psicóloga que acompanha a autora. Embora o relatório médico indique a necessidade da realização dos procedimentos, a especialista deixa de especificar o caráter de urgência e emergência destes. Não há, portanto, prova pré-constituída apta a demonstrar qualquer perigo à saúde física ou emocional da agravante com a eventual demora para a realização da cirurgia reparadora decorrente de cirurgia bariátrica realizada. Assim, conclui-se que não restou evidenciado o perigo da demora a autorizar o deferimento da medida liminar, afastando, neste momento processual, a situação de perigo de dano grave. (N.U1020590-66.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO,SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/02/2022, Publicado no DJE 09/03/2022) Assim, diante dos fatos e circunstâncias do caso concreto, não visualizo, nesta fase de cognição sumária, a confluência dos pressupostos para a concessão da medida liminar deferido em primeiro grau, sobretudo por não se tratar de situação em que há risco à vida da agravada, de modo que pode aguardar o regular trâmite do feito. Sobre o tema, assim entende a jurisprudência caseira: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE TUTELA ANTECIPADA DE URGÊNCIA – RESCISÃO CONTRATUAL – ART. 300 E 301 DO CPC – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS PARA O DEFERIMENTO – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Para a concessão da antecipação de tutela, nos termos do art. 300 do CPC, se mostra indispensável à comprovação de elementos que evidenciem a probabilidade do direito invocado pelo autor, somado ao perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. (N.U 1001157-47.2019.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/02/2024, Publicado no DJE 27/02/2024) Pelo exposto, indefiro a concessão de efeito suspensivo postulada pela agravante. Intime-se a parte Agravada para, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentar resposta ao recurso, nos termos do art. 1.019, II do CPC. Tratando-se de matéria exclusivamente patrimonial, fica dispensado o parecer do Ministério Público em razão de inexistir interesse público ou envolvimento de menor ou incapaz. Tomem-se as demais providências de estilo. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator
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