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Processo nº 1028898-80.2024.8.11.0002

ID: 259400165

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1028898-80.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

BANCO BMG SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028898-80.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS R… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028898-80.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [NILVA VELOSO DOS SANTOS - CPF: 271.712.992-87 (APELADO), CASSIO ROBSON DE ALMEIDA BEZERRA - CPF: 071.596.134-90 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), GLAUCO GOMES MADUREIRA - CPF: 223.213.118-19 (ADVOGADO), HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - CPF: 213.647.038-82 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO NÃO COMPROVADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. COBRANÇA INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. TERMO INICIAL DE JUROS E CORREÇÃO RETIFICADO DE OFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta pela instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de contrato de empréstimo consignado, determinou a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente (R$ 2.782,80) e fixou indenização por danos morais em R$ 5.000,00, além de honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se o banco comprovou a validade da contratação contestada pela consumidora; (ii) estabelecer a responsabilidade pelo dano moral e pela repetição de indébito; (iii) verificar a correção dos termos iniciais de juros e correção monetária. III. RAZÕES DE DECIDIR Aplicam-se ao caso as normas do Código de Defesa do Consumidor, impondo à instituição financeira o ônus de comprovar a regularidade da contratação, o que não ocorreu. A ausência de prova documental válida e a realização de descontos sem respaldo contratual configuram falha na prestação do serviço e justificam a indenização por danos morais. A restituição em dobro é devida ante a ausência de engano justificável, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. Mantido o valor da indenização por danos morais (R$ 5.000,00), considerado proporcional e razoável diante das circunstâncias do caso. Retificados, de ofício, os termos iniciais de incidência de juros e correção monetária sobre a devolução do indébito: juros desde o evento danoso (Súmula 54/STJ) e correção desde o prejuízo (Súmula 43/STJ). Indevida a compensação de valores e mantidos os honorários advocatícios fixados, majorados para 20% ante o desprovimento do recurso. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido, com retificação de ofício. Tese de julgamento: “1. Cabe à instituição financeira comprovar a regularidade do contrato impugnado pelo consumidor, sob pena de nulidade e responsabilidade por danos. 2. A cobrança indevida decorrente de contrato inexistente impõe restituição em dobro e enseja indenização por danos morais. 3. Em se tratando de relação extracontratual, os juros de mora incidem desde o evento danoso e a correção monetária desde o prejuízo, conforme Súmulas 54 e 43 do STJ.” R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por BANCO BMG S.A. contra sentença proferida pela MMª. Juíza de Direito Ester Belém Nunes da 1ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande, que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Contrato de Financiamento c/c Pagamento de Indébito e Indenização por Danos Morais proposta por Nilva Veloso dos Santos, julgou parcialmente procedentes os pedidos para declarar inexistente o apontamento indicado na inicial, condenar a parte ré à repetição de indébito em dobro no valor de R$ 2.782,80 (dois mil, setecentos e oitenta e dois reais e oitenta centavos) e à indenização por danos morais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta, em síntese, a regularidade da contratação e a ausência de má-fé, pugnando reforma integral da r. sentença. Afirma, também, que a contratação é válida, não havendo que se falar em dever de restituir valores. Defende, ainda, a inexistência de danos morais, pois não há comprovação de qualquer dano à personalidade do consumidor, tratando-se a situação por ele vivenciada de “mero dissabor”. Aponta a necessidade de compensação dos valores já recebidos pela autora e aduz que o termo inicial dos juros moratórios e da correção monetária devem ser alterados para incidir a partir da data do arbitramento, nos termos da Súmula 362 do STJ, por se tratar de relação contratual. Diante disso, requer o provimento do recurso, a fim de se reformar totalmente a r. sentença, julgando-se improcedente a ação. Subsidiariamente, que a restituição se dê de forma simples, e não em dobro, bem como que seja determinado o afastamento ou minoração dos danos morais, com aplicação da Súmula 362 do STJ, a compensação dos valores eventualmente recebidos e minoração dos honorários advocatícios. Contrarrazões no ID 275365009. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação interposto por Banco BMG S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação ajuizada por Nilva Veloso dos Santos, para, declarando inexistente o apontamento indicado na inicial, condenar a parte ré à repetição de indébito em dobro no valor de R$ 2.782,80 (dois mil, setecentos e oitenta e dois reais e oitenta centavos) e à indenização por danos morais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Insurge-se a instituição financeira requerida contra a sentença, pleiteando o provimento do recurso para que seja julgada total improcedente a demanda. Subsidiariamente, requer que a restituição se dê de forma simples, e não em dobro, bem como que seja determinado o afastamento ou minoração dos danos morais, a compensação dos valores eventualmente recebidos e minoração dos honorários advocatícios. De proêmio, impende ressaltar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacífica jurisprudência cristalizada na Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Nesse contexto, imperativa a análise da controvérsia sob o prisma da vulnerabilidade do consumidor e dos princípios da boa-fé objetiva, transparência e dever de informação que norteiam as relações consumeristas. DA REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO No tocante à alegação de que o contrato deve ser preservado, entendo que esta não merece acolhimento, uma vez que, havendo a inversão do ônus da prova, cabia à Ré/Apelante, demonstrar a existência e validade da contratação, o que não ocorreu no caso em tela. À luz do contexto probatório, nota-se que a instituição financeira não logrou êxito em demonstrar a legitimidade do negócio jurídico supostamente firmado, visto que sequer colacionou aos autos o instrumento contratual, limitando-se a defender, de forma genérica, a sua existência e validade. Por força do art. 373, II, do CPC, competia ao banco apelado demonstrar, de forma robusta, que houve legítima contratação, o que poderia ter sido feito por meio da juntada do contrato e comprovação de saques, movimentação bancária, gravação de ligação telefônica, ou mesmo laudo pericial que atestasse a autenticidade da assinatura. Nenhum desses elementos, contudo, foi apresentado nos autos. Com essas considerações, tendo em vista a fragilidade do acervo probatório produzido pela instituição financeira, que dispunha de diversos meios para demonstrar a legitimidade da contratação, mas não o fez, e diante dos demais elementos carreados aos autos, impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade da avença e, por consequência, da indevida realização de descontos no benefício previdenciário da apelante. DA RESTITUIÇÃO EM DOBRO Sem delongas, reconhecida a ilegitimidade da contratação, deve ser mantido o dever de restituição dos valores descontados indevidamente, na forma dobrada, conforme determinado pelo juiz singular na origem, pois alinho-me ao entendimento de que a expressão “salvo hipótese de engano justificável”, constante no art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser compreendida como elemento de causalidade, e não de culpabilidade, ao passo que o ônus probatório, para excludente da repetição dobrada, é do fornecedor e, não o fazendo, impõe-se a repetição do indébito em dobro. Sobre a temática, cito julgado deste Sodalício: “[...] 2. Apesar dos argumentos da instituição ré, de que os descontos no benefício previdenciário e depósito na conta da parte autora estão embasados em contrato devidamente contratado pela parte autora, não se desincumbiu do ônus probatório, uma vez que não apresentou cópia do contrato. Assim, merece ser declarada a inexistência da relação jurídica, com a consequente determinação de cancelamento dos descontos. 3. Comprovada a cobrança indevida, a restituição dobrada tem cabimento por força do parágrafo único do art. 42 do CDC, porquanto houve falha na prestação do serviço, sendo patente inocorrência de engano justificável. [...]” (TJMT, ApCiv 1000991-27.2021.8.11.0038, r. Nilza Maria Possas de Carvalho, j. 14/03/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, p. 16/03/2023) (g.n). Assim, não há que se falar em restituição na forma simples, tampouco no afastamento do dever de restituir os valores indevidamente descontados. DOS DANOS MORAIS Prosseguindo, apesar do esforço argumentativo da instituição financeira, tenho que restou demonstrada, na hipótese, a falha na prestação do serviço do banco requerido, por ter realizado descontos no benefício previdenciário da parte autora relativos a contrato de empréstimo consignado cuja legitimidade não foi comprovada. Assim, compreende-se que está caracterizada situação apta a ensejar a indenização em de danos morais. Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, a indenização por danos morais imposta no ato sentencial, no valor R$ 5.000,00 (cinco mil reais), mostra-se compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como, observados os princípios da moderação e razoabilidade. Aliás, quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Nesse sentido: “APELAÇÃO – AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – PERÍCIA GRAFOTÉCNICA REALIZADA NOS AUTOS – LEGITIMIDADE DA CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA – DESCONTOS IMOTIVADOS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO– MÁ-FÉ DO CREDOR CONSTATADA – RECURSO NÃO PROVIDO.Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. Constatada a má-fé, as parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas em dobro (art. 42 do CDC)”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2024, p. 02/07/2024) (g.n) Assim, mantenho a condenação por danos morais no valor fixado na sentença. DO TERMO INICIAL DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA Inicialmente, necessário consignar que sendo o contrato nulo, isso configura uma situação de responsabilidade extracontratual, pois não há um contrato válido que regule a relação entre as partes. A parte apelante sustenta que os juros moratórios e a correção monetária deveriam incidir a partir da data do arbitramento do valor da indenização, conforme Súmula 362 do STJ. Contudo, verifico que a sentença aplicou corretamente os índices e termos iniciais para correção monetária e juros de mora, em consonância com o entendimento jurisprudencial consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.” (Súmula 54) “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.” (Súmula 362) Portanto, quanto à indenização por danos morais, a correção monetária incide a partir da data do arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ, e os juros moratórios incidem a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ, exatamente como determinado na sentença. Por sua vez, no que concerne aos valores a serem restituídos, a Corte Superior já se manifestou no sentido de que os juros moratórios deverão incidir a partir do evento danoso, Súmula 54 do STJ, e que a correção monetária deverá ocorrer a partir do efetivo prejuízo, nos termos da Súmula 43. Neste ponto, considerando que juros e correção monetária são questões de ordem pública, procedo à retificação do termo inicial quanto aos valores a serem restituídos, para que ocorra nos moldes acima delineados. Consigne-se que “a questão pertinente aos juros moratórios e à correção monetária, por se tratar de matéria de ordem pública, pode ser conhecida de ofício pelo juiz, independentemente de pedido ou recurso da parte, e a alteração dos seus termos tampouco configura reformatio in pejus.” (STJ, AgInt no REsp 1.935.343/DF) DA COMPENSAÇÃO DE VALORES No que tange à compensação dos valores disponibilizados ao consumidor, verifico que a sentença determinou a devolução dos valores efetivamente desembolsados pelo apelado, referentes às parcelas pagas no contrato questionado. Não há, portanto, que se falar em enriquecimento ilícito, pois a condenação visa justamente restaurar o status quo ante, com a anulação dos contratos e devolução dos valores pagos indevidamente. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Por fim, a parte apelante pugna pela redução dos honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação. Todavia, o percentual fixado se mostra adequado e proporcional, levando em consideração os critérios estabelecidos no art. 85, § 2º, do CPC, quais sejam: o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço. Não há, portanto, razão para minoração dos honorários advocatícios, que foram fixados dentro dos parâmetros legais. Diante da ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, quanto à regularidade das cobranças impugnadas, bem como da inexistência de prova incontestável de que a consumidora possuía pleno conhecimento e consentiu expressamente com a contratação, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, por esses e seus próprios fundamentos, e em estrita observância aos princípios basilares que regem as relações de consumo, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável (art. 47 do CDC). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a sentença impugnada. Contudo, de ofício, retifico o termo inicial dos juros e da correção monetária incidentes sobre os valores a serem restituídos em dobro, para que a devolução observe o disposto nas Súmulas 43 e 54 do Superior Tribunal de Justiça. Majoro os honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1028898-80.2024.8.11.0002

ID: 259400168

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1028898-80.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

NILVA VELOSO DOS SANTOS

Acórdão

Advogados:

CASSIO ROBSON DE ALMEIDA BEZERRA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028898-80.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS R… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1028898-80.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [NILVA VELOSO DOS SANTOS - CPF: 271.712.992-87 (APELADO), CASSIO ROBSON DE ALMEIDA BEZERRA - CPF: 071.596.134-90 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), GLAUCO GOMES MADUREIRA - CPF: 223.213.118-19 (ADVOGADO), HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - CPF: 213.647.038-82 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO NÃO COMPROVADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. COBRANÇA INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. TERMO INICIAL DE JUROS E CORREÇÃO RETIFICADO DE OFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta pela instituição financeira contra sentença que declarou a inexistência de contrato de empréstimo consignado, determinou a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente (R$ 2.782,80) e fixou indenização por danos morais em R$ 5.000,00, além de honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se o banco comprovou a validade da contratação contestada pela consumidora; (ii) estabelecer a responsabilidade pelo dano moral e pela repetição de indébito; (iii) verificar a correção dos termos iniciais de juros e correção monetária. III. RAZÕES DE DECIDIR Aplicam-se ao caso as normas do Código de Defesa do Consumidor, impondo à instituição financeira o ônus de comprovar a regularidade da contratação, o que não ocorreu. A ausência de prova documental válida e a realização de descontos sem respaldo contratual configuram falha na prestação do serviço e justificam a indenização por danos morais. A restituição em dobro é devida ante a ausência de engano justificável, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. Mantido o valor da indenização por danos morais (R$ 5.000,00), considerado proporcional e razoável diante das circunstâncias do caso. Retificados, de ofício, os termos iniciais de incidência de juros e correção monetária sobre a devolução do indébito: juros desde o evento danoso (Súmula 54/STJ) e correção desde o prejuízo (Súmula 43/STJ). Indevida a compensação de valores e mantidos os honorários advocatícios fixados, majorados para 20% ante o desprovimento do recurso. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido, com retificação de ofício. Tese de julgamento: “1. Cabe à instituição financeira comprovar a regularidade do contrato impugnado pelo consumidor, sob pena de nulidade e responsabilidade por danos. 2. A cobrança indevida decorrente de contrato inexistente impõe restituição em dobro e enseja indenização por danos morais. 3. Em se tratando de relação extracontratual, os juros de mora incidem desde o evento danoso e a correção monetária desde o prejuízo, conforme Súmulas 54 e 43 do STJ.” R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por BANCO BMG S.A. contra sentença proferida pela MMª. Juíza de Direito Ester Belém Nunes da 1ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande, que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Contrato de Financiamento c/c Pagamento de Indébito e Indenização por Danos Morais proposta por Nilva Veloso dos Santos, julgou parcialmente procedentes os pedidos para declarar inexistente o apontamento indicado na inicial, condenar a parte ré à repetição de indébito em dobro no valor de R$ 2.782,80 (dois mil, setecentos e oitenta e dois reais e oitenta centavos) e à indenização por danos morais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta, em síntese, a regularidade da contratação e a ausência de má-fé, pugnando reforma integral da r. sentença. Afirma, também, que a contratação é válida, não havendo que se falar em dever de restituir valores. Defende, ainda, a inexistência de danos morais, pois não há comprovação de qualquer dano à personalidade do consumidor, tratando-se a situação por ele vivenciada de “mero dissabor”. Aponta a necessidade de compensação dos valores já recebidos pela autora e aduz que o termo inicial dos juros moratórios e da correção monetária devem ser alterados para incidir a partir da data do arbitramento, nos termos da Súmula 362 do STJ, por se tratar de relação contratual. Diante disso, requer o provimento do recurso, a fim de se reformar totalmente a r. sentença, julgando-se improcedente a ação. Subsidiariamente, que a restituição se dê de forma simples, e não em dobro, bem como que seja determinado o afastamento ou minoração dos danos morais, com aplicação da Súmula 362 do STJ, a compensação dos valores eventualmente recebidos e minoração dos honorários advocatícios. Contrarrazões no ID 275365009. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação interposto por Banco BMG S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação ajuizada por Nilva Veloso dos Santos, para, declarando inexistente o apontamento indicado na inicial, condenar a parte ré à repetição de indébito em dobro no valor de R$ 2.782,80 (dois mil, setecentos e oitenta e dois reais e oitenta centavos) e à indenização por danos morais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Insurge-se a instituição financeira requerida contra a sentença, pleiteando o provimento do recurso para que seja julgada total improcedente a demanda. Subsidiariamente, requer que a restituição se dê de forma simples, e não em dobro, bem como que seja determinado o afastamento ou minoração dos danos morais, a compensação dos valores eventualmente recebidos e minoração dos honorários advocatícios. De proêmio, impende ressaltar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacífica jurisprudência cristalizada na Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Nesse contexto, imperativa a análise da controvérsia sob o prisma da vulnerabilidade do consumidor e dos princípios da boa-fé objetiva, transparência e dever de informação que norteiam as relações consumeristas. DA REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO No tocante à alegação de que o contrato deve ser preservado, entendo que esta não merece acolhimento, uma vez que, havendo a inversão do ônus da prova, cabia à Ré/Apelante, demonstrar a existência e validade da contratação, o que não ocorreu no caso em tela. À luz do contexto probatório, nota-se que a instituição financeira não logrou êxito em demonstrar a legitimidade do negócio jurídico supostamente firmado, visto que sequer colacionou aos autos o instrumento contratual, limitando-se a defender, de forma genérica, a sua existência e validade. Por força do art. 373, II, do CPC, competia ao banco apelado demonstrar, de forma robusta, que houve legítima contratação, o que poderia ter sido feito por meio da juntada do contrato e comprovação de saques, movimentação bancária, gravação de ligação telefônica, ou mesmo laudo pericial que atestasse a autenticidade da assinatura. Nenhum desses elementos, contudo, foi apresentado nos autos. Com essas considerações, tendo em vista a fragilidade do acervo probatório produzido pela instituição financeira, que dispunha de diversos meios para demonstrar a legitimidade da contratação, mas não o fez, e diante dos demais elementos carreados aos autos, impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade da avença e, por consequência, da indevida realização de descontos no benefício previdenciário da apelante. DA RESTITUIÇÃO EM DOBRO Sem delongas, reconhecida a ilegitimidade da contratação, deve ser mantido o dever de restituição dos valores descontados indevidamente, na forma dobrada, conforme determinado pelo juiz singular na origem, pois alinho-me ao entendimento de que a expressão “salvo hipótese de engano justificável”, constante no art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser compreendida como elemento de causalidade, e não de culpabilidade, ao passo que o ônus probatório, para excludente da repetição dobrada, é do fornecedor e, não o fazendo, impõe-se a repetição do indébito em dobro. Sobre a temática, cito julgado deste Sodalício: “[...] 2. Apesar dos argumentos da instituição ré, de que os descontos no benefício previdenciário e depósito na conta da parte autora estão embasados em contrato devidamente contratado pela parte autora, não se desincumbiu do ônus probatório, uma vez que não apresentou cópia do contrato. Assim, merece ser declarada a inexistência da relação jurídica, com a consequente determinação de cancelamento dos descontos. 3. Comprovada a cobrança indevida, a restituição dobrada tem cabimento por força do parágrafo único do art. 42 do CDC, porquanto houve falha na prestação do serviço, sendo patente inocorrência de engano justificável. [...]” (TJMT, ApCiv 1000991-27.2021.8.11.0038, r. Nilza Maria Possas de Carvalho, j. 14/03/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, p. 16/03/2023) (g.n). Assim, não há que se falar em restituição na forma simples, tampouco no afastamento do dever de restituir os valores indevidamente descontados. DOS DANOS MORAIS Prosseguindo, apesar do esforço argumentativo da instituição financeira, tenho que restou demonstrada, na hipótese, a falha na prestação do serviço do banco requerido, por ter realizado descontos no benefício previdenciário da parte autora relativos a contrato de empréstimo consignado cuja legitimidade não foi comprovada. Assim, compreende-se que está caracterizada situação apta a ensejar a indenização em de danos morais. Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, a indenização por danos morais imposta no ato sentencial, no valor R$ 5.000,00 (cinco mil reais), mostra-se compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como, observados os princípios da moderação e razoabilidade. Aliás, quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Nesse sentido: “APELAÇÃO – AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – PERÍCIA GRAFOTÉCNICA REALIZADA NOS AUTOS – LEGITIMIDADE DA CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA – DESCONTOS IMOTIVADOS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO– MÁ-FÉ DO CREDOR CONSTATADA – RECURSO NÃO PROVIDO.Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. Constatada a má-fé, as parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas em dobro (art. 42 do CDC)”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2024, p. 02/07/2024) (g.n) Assim, mantenho a condenação por danos morais no valor fixado na sentença. DO TERMO INICIAL DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA Inicialmente, necessário consignar que sendo o contrato nulo, isso configura uma situação de responsabilidade extracontratual, pois não há um contrato válido que regule a relação entre as partes. A parte apelante sustenta que os juros moratórios e a correção monetária deveriam incidir a partir da data do arbitramento do valor da indenização, conforme Súmula 362 do STJ. Contudo, verifico que a sentença aplicou corretamente os índices e termos iniciais para correção monetária e juros de mora, em consonância com o entendimento jurisprudencial consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.” (Súmula 54) “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.” (Súmula 362) Portanto, quanto à indenização por danos morais, a correção monetária incide a partir da data do arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ, e os juros moratórios incidem a partir do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ, exatamente como determinado na sentença. Por sua vez, no que concerne aos valores a serem restituídos, a Corte Superior já se manifestou no sentido de que os juros moratórios deverão incidir a partir do evento danoso, Súmula 54 do STJ, e que a correção monetária deverá ocorrer a partir do efetivo prejuízo, nos termos da Súmula 43. Neste ponto, considerando que juros e correção monetária são questões de ordem pública, procedo à retificação do termo inicial quanto aos valores a serem restituídos, para que ocorra nos moldes acima delineados. Consigne-se que “a questão pertinente aos juros moratórios e à correção monetária, por se tratar de matéria de ordem pública, pode ser conhecida de ofício pelo juiz, independentemente de pedido ou recurso da parte, e a alteração dos seus termos tampouco configura reformatio in pejus.” (STJ, AgInt no REsp 1.935.343/DF) DA COMPENSAÇÃO DE VALORES No que tange à compensação dos valores disponibilizados ao consumidor, verifico que a sentença determinou a devolução dos valores efetivamente desembolsados pelo apelado, referentes às parcelas pagas no contrato questionado. Não há, portanto, que se falar em enriquecimento ilícito, pois a condenação visa justamente restaurar o status quo ante, com a anulação dos contratos e devolução dos valores pagos indevidamente. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Por fim, a parte apelante pugna pela redução dos honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação. Todavia, o percentual fixado se mostra adequado e proporcional, levando em consideração os critérios estabelecidos no art. 85, § 2º, do CPC, quais sejam: o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço. Não há, portanto, razão para minoração dos honorários advocatícios, que foram fixados dentro dos parâmetros legais. Diante da ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, quanto à regularidade das cobranças impugnadas, bem como da inexistência de prova incontestável de que a consumidora possuía pleno conhecimento e consentiu expressamente com a contratação, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, por esses e seus próprios fundamentos, e em estrita observância aos princípios basilares que regem as relações de consumo, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável (art. 47 do CDC). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a sentença impugnada. Contudo, de ofício, retifico o termo inicial dos juros e da correção monetária incidentes sobre os valores a serem restituídos em dobro, para que a devolução observe o disposto nas Súmulas 43 e 54 do Superior Tribunal de Justiça. Majoro os honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1002948-17.2021.8.11.0021

ID: 313896963

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA CRIMINAL DE ÁGUA BOA Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1002948-17.2021.8.11.0021

Data de Disponibilização: 02/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ADEVANILTON SANTOS SILVA

Intimação

Advogados:

MARCIO ROBERTO DIAS DE CARVALHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA CRIMINAL DE ÁGUA BOA SENTENÇA Processo: 1002948-17.2021.8.11.0021. 1. RELATÓRIO Trata-se de ação penal pública incondicionada em que o Ministério Públic… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA CRIMINAL DE ÁGUA BOA SENTENÇA Processo: 1002948-17.2021.8.11.0021. 1. RELATÓRIO Trata-se de ação penal pública incondicionada em que o Ministério Público Estadual, por intermédio de seu representante legal, ofertou denúncia em face de GABRIEL MARINHO DOS SANTOS, dando-o como incurso nas sanções previstas no art. 12, caput, da Lei n. 10.826/03, bem como contra ADEVANILTON SANTOS SILVA, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 14 do mesmo diploma legal. Narra a peça vestibular acusatória que: Consta do Inquérito Policial incluso que, no dia 29 de setembro de 2021, por volta das 18h30, em via pública, no Município de Cocalinho/MT, o denunciado ADEVANILTON SANTOS SILVA portou 01 (uma) arma de fogo, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, do tipo espingarda, calibre 32 e 05 (cinco) munições, calibre 32, de uso permitido, em perfeito estado de funcionamento, podendo ser utilizada eficazmente para a perpetração de crime, conforme se verifica no exame de eficiência de arma de fogo e munição, acostado no ID. 71542608 – p. 1 a 37. Depreende-se que, nas mesmas circunstâncias de local e data, na residência localizada à Rua Goiás, s/n, bairro Cidade Nova, ao lado do senhor Valdir, pai do Pepe e, em frente a casa do soldado P.M. Jota em Cocalinho/MT, o denunciado GABRIEL MARINHO DOS SANTOS possuiu e manteve sob sua guarda, armas de fogo e munições, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência, em perfeito estado de funcionamento, podendo ser utilizada eficazmente para a perpetração de crime, conforme se verifica no exame de eficiência de arma de fogo e munição, acostado no ID. 71542608 – p. 1 a 37. Revela o caderno investigativo que, os denunciados ADEVANILTON SANTOS SILVA e GABRIEL MARINHO DOS SANTOS mantinham em sua posse, os seguintes objetos apreendidos: Uma (01) arma de fogo, do tipo espingarda, calibre nominal 32 (trinta e dois), da marca CBC, modelo MOD 151, numero de serie 19960; Uma (01) arma de fogo, do tipo espingarda, calibre nominal 28 (vinte e oito), sem numero de série, marca e modelo aparente; Uma (01) arma de fogo, do tipo espingarda, calibre nominal 32 (trinta e dois), da marca ROSSI, numero de serie S534449; Uma (01) arma de fogo, do tipo espingarda, sem marca, modelo e numero de serie aparente, que apresenta calibre real (diâmetro interno do cano) de aproximadamente 12 mm (doze milímetros), compatível com o calibre nominal 32 (trinta e dois); Uma (01) arma de fogo, do tipo revólver, da marca TAURUS, calibre nominal .38 (ponto trinta e oito), o numero de serie 122771, juntamente com um coldre confeccionado em couro; Uma coronha e telha peça única, parte de uma arma longa; Dois canos confeccionados em metal, parte de arma longa; Três (03) estojos calibre nominal 32 (trinta e dois), da marca CBC; Dois (02) estojos calibre nominal 32 (trinta e dois), da marca CBC; Um (01) estojo calibre nominal 32 (trinta e dois), da marca CBC; Três (03) estojos calibre nominal 28 (vinte e oito), da marca CBC; Um (01) estojo calibre nominal 28 (vinte oito), da marca CBC; Dezoito (18) estojos calibre nominal doze (12), da marca CBC; Setenta e nove (79) espoletas tipo bateria, utilizadas para recarga de munição de arma de fogo; Dezesseis (16) espoletas tipo boxer, utilizadas para recarga de munição de arma de fogo; Setenta e seis (76) espoletas tipo boxer, utilizadas para recarga de munição de arma de fogo; Setenta e duas (72) espoletas tipo boxer, utilizadas para recarga de munição de arma de fogo; Cinco (05) espoletas tipo Beran, utilizadas para recarga de munição de arma de fogo; Seis recipientes contendo esferas de diversos tamanhos; e Três recipientes vazios usados com pólvoras. FATO 01 - Ao que se apurou, a guarnição da Polícia Militar em rondas de rotina pelas ruas do bairro Cidade Nova, em Cocalinho-MT, avistou o denunciado ADEVANILTON SANTOS SILVA que carregava consigo uma sacola que apresentava ter um cano em seu interior. Diante da observação dos policiais, realizaram a abordagem policial costumeira. Ao ser abordado, o denunciado ADEVANILTON SANTOS SILVA confessou que estava carregando uma arma de fogo, tipo espingarda, calibre 32, e cinco munições, também, calibre 32 dentro de sua sacola. Ao ser indagado se tinha outras armas, o denunciado afirmou aos policiais que sim, dentro de sua residência. Imediatamente, os policiais se deslocaram até o local informado pelo denunciado ADEVANILTON SANTOS SILVA, filho de GABRIEL MARINHO DOS SANTOS. FATO 02 – Nesse contexto, ao chegarem na residência, os policiais autorizados verbalmente pelos denunciados adentraram e, no local estava o denunciado GABRIEL MARINHO DOS SANTOS. Questionado pelos policiais se, no local haviam armas de fogo e munições, o denunciado GABRIEL MARINHO DOS SANTOS afirmou que sim, e apresentou um único registro de arma de fogo, calibre 38 dentre outras armas de fogo, munições e cartuchos. Durante a abordagem, os policiais se surpreenderam com a quantidade de objetos que estavam na residência dos denunciados ADEVANILTON SANTOS SILVA e GABRIEL MARINHO DOS SANTOS e, imediatamente apreenderam os objetivos supracitados, todos descritos no ID. 71542608 – p. 37. Logo em seguida, foi efetuada a prisão em flagrante e levados a delegacia. Presos em flagrante, o réu Adevanilton teve sua prisão convertida em preventiva, enquanto a Gabriel foi concedida liberdade provisória (67468944 - Pág. 30). A denúncia foi recebida em 02/03/2022 (77797754 - Pág. 1). Embora preso preventivamente por este processo, sobreveio aos autos notícia de que Adevanilton tinha sido posto em liberdade por progressão de regime (107720907 - Pág. 1). Não localizados, os réus foram citados por edital e, em 25/03/2024, foi determinada a suspensão do processo e do prazo prescricional (148530205 - Pág. 1). Adevanilton foi preso em 30/08/2024 (167471235 - Pág. 1) e teve sua prisão preventiva revogada, ocasião em que foi determinada a cisão processual (167991925 - Pág. 3). Devidamente citado, Adevanilton apresentou resposta à acusação (180955077 - Pág. 1). Em instrução, foi decretada a revelia do acusado e realizada a oitiva das testemunhas arroladas. Em seguida, as partes apresentaram alegações finais orais (197244931 - Pág. 1). O Ministério Público requereu a procedência da ação nos exatos termos da denúncia. A defesa, sustentando a inexistência de dolo específico e da periculosidade da conduta, bem como a atipicidade material do fato, pugnou pela absolvição do réu. Subsidiariamente, requereu a desclassificação para o crime de posse de arma de fogo e a fixação da pena no mínimo legal, do regime em aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito. Vieram os autos para sentença. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Trata-se de ação penal pública incondicionada, objetivando-se apurar a responsabilidade criminal do réu ADEVANILTON SANTOS SILVA, acusado da prática do delito previsto no artigo 14 da Lei 10.826/03. Antes de examinar o mérito da pretensão punitiva, constato que foram observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LV, CF), não havendo nulidades a sanar e nem irregularidades a suprir. 2.2 DA MATERIALIDADE E AUTORIA DO CRIME Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. A materialidade é demonstrada pelo termo de apreensão (67468941 - Pág. 7) e do exame pericial (71542608 - Pág. 4). A autoria delitiva é corroborada pelos depoimentos prestados e pela prova oral colhida no feito. Verifica-se que o acusado foi preso em flagrante portando a arma de fogo. Consoante perícia, todas as armas apreendidas estavam em condições normais de uso e funcionamento, e eficientes para disparo com produção de tiro. Em juízo, João Batista Rufino Cordeiro, policial militar, disse que o réu era seu vizinho; que há dias estava notando uma movimentação estranha; que achou que era tráfico de drogas, mas que outros vizinhos falaram que era arma de fogo; que estava em patrulha, quando visualizou um indivíduo com um saco e algo grande dentro, sendo respondido que era uma espingarda; que questionou se tinha mais armas em casa; que ele disse que sim e foram até lá; que o pai dele franqueou a entrada e localizou um revólver com registro vencido; que também localizaram munições e pedaços de arma, como se fosse uma oficina; que também foram até uma chácara onde tinham mais duas armas de fogo; que a abordagem se deu em virtude de denúncia prévia e em razão do objeto que ele levava, aparentando ser uma arma de fogo; que a arma estava desmontada; Humberto Tadeu Rezende Belém, policial militar, disse que estava em ronda, quando se deparou com o acusado andando com um saco aparentando ter uma espingarda dentro; que também localizaram vários outros petrechos e munições; que a arma estava desmontada; que o indivíduo disse que estava indo caçar. Sabe-se que “o crime de porte ilegal de arma de fogo consuma-se com a mera conduta de portar tal instrumento, por se tratar de delito de mera conduta ou de perigo abstrato, cujo objeto imediato é a segurança coletiva, não se exigindo qualquer finalidade específica, isto é, dolo específico” (STJ - AgRg no HC: 854409 SP 2023/0333408-3, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 04/03/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/03/2024). O fato de a arma estar desmontada quando da sua apreensão em nada altera a configuração do ilícito, até porque, como disse o policial, poderia ser montada em poucos minutos, além de que sua eficiência em produzir disparos foi atestada pela prova técnica. Em caso semelhante, foi o seguinte julgado pelo STJ: (...) irrelevante o fato de a arma estar desmuniciada ou desmontada para a configuração do crime” (STJ - AgRg no HC: 708346 SC 2021/0375686-6, Data de Julgamento: 14/06/2022, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/06/2022). Verifica-se, portanto, que o conjunto probatório revela-se seguro em demonstrar a responsabilidade criminal do acusado pelo crime imputado, não havendo falar em ausência de dolo ou de periculosidade. Embora os Tribunais Superiores admitam a atipicidade material da conduta nos crimes desta espécie, restringe-se somente aos casos em que são encontradas poucas munições desacompanhadas de arma, não sendo o caso em exame. Logo, afastadas as teses defensivas, não socorre ao réu qualquer causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade, sendo imputável, consciente da ilicitude de sua conduta à época dos fatos e lhes era exigível agir de forma diversa. Sendo a conduta típica, antijurídica e culpável, a condenação penal é medida de rigor. 3. DISPOSITIVO Ante todo o exposto, julgo PROCEDENTE a pretensão contida na denúncia para o fim de CONDENAR o réu ADEVANILTON SANTOS SILVA pela prática do crime previsto art. 14 da Lei 10.826/03. Ainda, CONDENO o réu ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do CPP. Consigna-se que eventual pretensão aos benefícios da gratuidade de justiça será avaliada pelo juízo das execuções penais. A concessão do benefício não exclui a condenação do acusado em custas processuais, os quais terão a exigibilidade suspensa pelo prazo de cinco anos. Nesse aspecto, registre-se que “a condenação ao pagamento das custas processuais deriva de imposição legal (CPP, art. 804), corolário da condenação, de modo, que a análise acerca da alegada hipossuficiência compete ao Juízo da Execução Penal, quando da exigência do respectivo pagamento” (TJMT, N.U 0001955-44.2018.8.11.0005). 4. DOSIMETRIA DA PENA Passo à dosimetria da pena (adoção do critério trifásico – artigo 68 CP), em estrita observância ao princípio constitucional da individualização da pena, insculpido no artigo 5º, XLVI, da Constituição Federal. O tipo penal descrito no art. 14 da Lei 10.826/03 prevê pena de reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. a) 1ª Fase: das Circunstâncias Judiciais (art. 59, CP) Impõe-se a análise das circunstâncias judiciais, contidas no artigo 59, CP, observado o preceito do inciso II do mesmo artigo, que determina a observância dos limites legais. Parto do mínimo legal (dois anos), com a devida vênia do entendimento doutrinário que inicia a aplicação da pena pelo termo médio, por entender aquela mais consentânea com o modelo imposto pelo Código Penal, e mais benéfica ao réu. Assim segue: - Culpabilidade: cuida esta circunstância judicial do grau de reprovabilidade da conduta da agente ou censurabilidade do delito cometido. In casu, revela-se ordinária à espécie; - Antecedentes: o réu não ostenta; - Conduta social: não há nos autos elementos suficientes que demonstrem a vida do réu em seu ambiente familiar e social, razão pela qual não será valorada; - Personalidade do agente: esta circunstância, consoante entendimento da doutrina moderna, deve ser aferida quando existentes nos autos laudos técnicos que demonstrem cabalmente o caráter do réu, visto que o Juiz, embora de formação acadêmica ampla, não dispõe de meios para determinar a personalidade da agente. Diante disso, tal circunstância não será valorada em detrimento do acusado; - Motivos do crime: considero que o motivo do crime é inerente à espécie, motivo pelo qual, não valoro esta circunstância; - Circunstâncias do delito: são normais à espécie; - Consequências do crime: não há consequências gravosas que extrapolem o tipo em epígrafe, pelo que deixo de valorar esta circunstância; e - Comportamento da vítima: o comportamento da vítima é circunstância judicial ligada à vitimologia, que deve ser necessariamente neutra ou favorável ao réu, sendo inviável sua utilização de forma desfavorável ao acusado no caso em apreço, visto que a vítima em nada contribuiu para a prática delitiva. Assim, atenta às circunstâncias judiciais analisadas, fixo a pena-base em 02 (dois) anos de reclusão e 10 dias-multa. b) 2ª Fase: das Circunstâncias Legais (art. 61 a 65, CP) Presente a agravante da reincidência (0005846-86.2017.8.11.0012) e sem atenuantes, fixo a pena intermediária em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 48 dias-multa. c) 3ª Fase: das Causas de Aumento e de Diminuição de Pena Sem causas de aumento ou diminuição de pena, fixo a pena definitiva em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 48 dias-multa. 4.1.1. Do valor do dia-multa Considerando as premissas acima, cada dia-multa será valorado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato delituoso, ante a inexistência de elementos concretos acerca da situação econômica do condenado (art. 60 do Código Penal). 5. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA A determinação do regime inicial de cumprimento de pena é dada em função da quantidade de pena e das circunstâncias judiciais do artigo 59, CP (artigo 33, §§2º e 3º, CP). Logo, considerando as circunstâncias judiciais, a reincidência e o quantum de pena fixado, fixo como regime inicial de cumprimento de pena o SEMIABERTO (art. 33, § 2°, alínea “c”, do Código Penal). 6. DA DETRAÇÃO PENAL (art. 387, §2º, CPP): Impõe assinalar que a Lei n.º 12.736/12 acresceu o § 2º ao art. 387 do Código de Processo Penal prevê o seguinte: O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. No caso em epígrafe, não há falar em detração, pois o período em que o réu ficou segregado cautelarmente não alcaçou o patamar necessário para progredir de regime, nos termos do artigo 112 da LEP. 7. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE (artigo 59, inciso IV, Código Penal) Por ser reincidente, inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, assim como a concessão da suspensão condicional da pena. 8. DA POSSIBILIDADE DE RECORRER EM LIBERDADE Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade, pois ausentes os requisitos que ensejam sua prisão preventiva, notadamente porque foi posto em liberdade durante a instrução processual. 9. DO VALOR MÍNIMO DE REPARAÇÃO DOS DANOS (art. 387, inciso IV, CPP) Tendo em vista se tratar de crime de perigo abstrato, tendo como vítima a incolumidade pública, não há falar em fixação de valor para reparação de danos. 10. PROVIDÊNCIAS FINAIS Após o trânsito em julgado da sentença, determino que: a) Expeça-se a Guia de Execução, remetendo-se à competente Vara de Execuções Penais; b) Expeçam-se ofícios ao Instituto de Identificação de Mato Grosso e ao Cartório Distribuidor, para as anotações de praxe, incluindo o nome do réu no rol dos culpados; c) Oficie-se ao E. Tribunal Regional Eleitoral para a suspensão dos direitos políticos do acusado, nos termos do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal, art. 71, § 2º do Código Eleitoral. d) Encaminhe-se o material bélico apreendido ao Comando do Exército (art. 25 da Lei 10.826/03), caso ainda esteja apreendido. Procedam-se às comunicações de praxe e ao contido na CNGC. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Às providências. Água Boa/MT, datado e assinado digitalmente. SILVANA FLEURY CURADO Juíza de Direito em substituição

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Alice Mendonca De Jesus x Instituto Nacional Do Seguro Social - Inss

ID: 327416717

Tribunal: TRF1 Órgão: Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de Itumbiara-GO Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1002948-39.2024.4.01.3508

Data de Disponibilização: 17/07/2025

Polo Ativo:

ALICE MENDONCA DE JESUS

Polo Passivo:

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Sentença Tipo A

Advogados:

AGNALDO MARQUEZ VIEIRA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

Subseção Judiciária de Itumbiara/GO Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de Itumbiara/GO PROCESSO: 1002948-39.2024.4.01.3508 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL … Subseção Judiciária de Itumbiara/GO Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de Itumbiara/GO PROCESSO: 1002948-39.2024.4.01.3508 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR: ALICE MENDONCA DE JESUS Advogado do(a) AUTOR: AGNALDO MARQUEZ VIEIRA - GO53225 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS TERCEIRO INTERESSADO: CENTRAL DE ANÁLISE DE BENEFÍCIO - CEAB/INSS SENTENÇA TIPO "A" - RESOLUÇÃO Nº. 535/06-CJF SENTENÇA Trata-se de ação previdenciária ajuizada por ALICE MENDONCA DE JESUS em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL/INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por idade. Relatório dispensado (Lei 9.099/1995, artigo 38 e Lei 10.259/2001, artigo 1º). Tenho por presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, merecendo destaque a existência de interesse processual por parte da autora, posto que o INSS indeferiu requerimento administrativo de aposentadoria por idade por ela apresentado em 21/09/2023 (ID 2197878518, fl. 151). Quanto à prejudicial de mérito, declaro, desde já, prescrita a pretensão referente a crédito vencido em data anterior ao quinquênio imediatamente anterior ao ajuizamento desta ação, que se deu em 11/11/2024. Não há, assim, preliminares ou prejudiciais que impeçam a apreciação do mérito da presente ação previdenciária na porção referente ao crédito vencido em data posterior a 11/11/2019. Do mérito. A teor da tabela de transição veiculada no art. 142 da Lei 8.213/91, a aposentadoria por idade de trabalhador urbano constitui benefício cuja concessão pressupõe, para além obviamente da idade (65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher – art. 48), a prova da carência, relativa ao número mínimo de contribuições exigidas em lei. Outrossim, o artigo 18 da Emenda Constitucional n. 103/2019 estabelece que o segurado filiado ao RGPS até a data de entrada em vigor da respectiva EC (13/11/2019) poderá aposentar-se quando preencher, cumulativamente, os requisitos de: (i) 60 (sessenta) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem; e (ii) 15 (quinze) anos de contribuição, para ambos os sexos. O §1º do aludido artigo prevê, ainda, que, a partir de 1º de janeiro de 2020, a idade de 60 anos da mulher, prevista no inciso I do caput, será acrescida em 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade. Quanto à idade legal (62 anos), a carteira de identidade com cópia reproduzida em meio à documentação que acompanha a exordial revela que foi alcançada pela parte demandante no mês de abril de 2019 (data de nascimento em 01/04/1957 – ID 2157926133). Impende então averiguar, à luz da referida tabela de transição, se há substrato probatório idôneo a ensejar o reconhecimento do exercício de atividade urbana pelo tempo minimamente necessário ao gozo do benefício em questão: 180 meses de carência. Na espécie, por ocasião do requerimento administrativo, formulado em 21/09/2023 (ID 2197878518), o INSS vinculou decisão informando o indeferimento do pedido em razão da requerente não ter atingido a carência exigida, tendo completado apenas 164 contribuições mensais. Na decisão, o INSS alegou que: a) o recolhimento das competências 05/2005, 03/2008, 04/2008 e 02/2009 foi realizado em valor inferior ao mínimo devido, sem a necessária complementação posterior; b) o recolhimento das competências 07/2014, 08/2014, 09/2014 e 03/2017 foi realizado em atraso, e por isso não foram computadas para fins de carência. Quanto à contagem do tempo de serviço, vale observar o seguinte. Os registros existentes no CNIS, em princípio, devem ser tidos por fiéis (artigo 29-A, da Lei 8.213/1991). Sobre o tempo de serviço registrado na CTPS incide a presunção iuris tantum de legitimidade e veracidade, somente ilidível mediante prova inequívoca em contrário. Tempos de serviço outros, não lançados na Carteira de Trabalho, somente são reconhecidos se comprovados por início de prova material, corroborada pela prova testemunhal, conforme determina o §3º, do artigo 55, da Lei 8.213/1991. No caso em tela, verifico, conforme extrato do CNIS de Id. 2197861638, que a autora: (i) efetuou recolhimentos, na qualidade de contribuinte individual, nos interregnos de 01/08/2004 a 30/06/2005, 01/08/2005 a 30/11/2005, 01/01/2006 a 31/08/2006, 01/10/2006 a 31/10/2006, 01/08/2007 a 31/05/2011, 01/03/2017 a 31/03/2017, 01/01/2023 a 31/07/2023 e de 01/10/2023 a 31/10/2023; (ii) efetuou recolhimentos, na qualidade de empregada doméstica entre 01/11/2004 30/11/2004; (iii) verteu contribuições, na qualidade de segurada facultativa, nos interregnos de 01/12/2011 a 31/12/2011, 01/01/2012 a 31/03/2012, 01/05/2012 a 31/08/2012, 01/09/2012 a 30/09/2012, 01/10/2012 a 31/12/2013, 01/07/2014 a 30/09/2015, 01/10/2015 a 31/12/2015, 01/01/2016 a 28/02/2017, 01/05/2017 a 31/08/2017, 01/10/2017 a 31/05/2020, 01/07/2021 a 31/12/2022, 01/09/2023 a 30/09/2023, 01/05/2024 a 31/05/2024 e de 01/01/2025 a 31/01/2025; (iv) usufruiu do benefício de auxílio-doença (NB 515.416.837-9) no período de 05/12/2005 31/01/2006; (v) recebe benefício de amparo social ao idoso (NB 714.616.600-8) desde 04/03/2024. No que tange às contribuições vertidas na modalidade “contribuinte individual”, ressalto que disciplinava o artigo 21 da Lei n. 8.212/90 que “a alíquota de contribuição dos segurados empresário, facultativo, trabalhador autônomo e equiparados, aplicada sobre o respectivo salário-de-contribuição”, era de 10% (dez por cento) para os salários-de-contribuição de valor igual ou inferior Cr$ 51.000,00 (cinquenta e um mil cruzeiros) – inciso I, e de 20 % (vinte por cento) para os demais salários-de-contribuição – inciso II. Com a redação dada pela Lei n. 9.876/99, o artigo citado passou a disciplinar que a alíquota de contribuição tanto do segurado contribuinte individual como do facultativo será de 20% (vinte por cento) sobre o respectivo salário-de-contribuição. Todavia, prevê também que, no caso do segurado contribuinte individual que trabalhe por conta própria, sem relação de trabalho com empresa ou equiparado e do segurado facultativo, em que se opte pela exclusão do direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a alíquota de contribuição incidente sobre o limite mínimo mensal do salário de contribuição será de 11% (onze por cento) – §2º. Outra modalidade contributiva é garantida ao segurado facultativo de baixa renda ou ao microempreendedor individual, que podem recolher contribuições com base em uma alíquota de 5%, desde que cumpridos os requisitos estabelecidos pela Lei n. 12.470/2011, que alterou a Lei n. 8.212/91, e pela LC 123/2006 e suas alterações. Conclui-se, que a alíquota de contribuição somente será de 5% para o contribuinte que: a) não possuir renda própria, dedicar-se exclusivamente ao trabalho doméstico no âmbito de sua residência e pertencer a família de baixa renda (segurado facultativo de baixa renda); ou b) for empresário individual que fature até R$ 81.000,00 (oitenta e um mil reais) ao ano, optante pelo Simples Nacional e que não esteja impedido de optar pela sistemática de contribuição diferenciada. Vale destacar que, de acordo com art. 21, §2º e §4º, da Lei n. 8.212/91, para validação de suas contribuições, o segurado facultativo de baixa renda, deve recolher sobre o percentual de 5% do valor do salário mínimo, estar inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal – CadÚnico e ter renda mensal de até 2 (dois) salários mínimos. No ponto, a TNU julgou o PEDILEF 513-43.2014.4.02.5154/RJ, ocorrendo seu trânsito em julgado no dia 24/01/2019, momento em que foi fixada tese jurídica representativa da controvérsia - TEMA 181, no sentido de que “a prévia inscrição no cadastro único, para programas sociais do governo federal – CADÚNICO, é requisito essencial para validação das contribuições previdenciárias vertidas na alínea “b”, do §2º, e § 4º, do art. 21, da Lei 8.212/91, e os efeitos dessa inscrição não alcançam as contribuições feitas anteriormente” (TNU PEDILEF 513-43.2014.4.02.5154/RJ). Necessário, ainda, rememorar que a TNU recentemente julgou o Tema 285 e fixou a tese de que “a atualização/revalidação extemporânea das informações do CadÚnico, realizada antes da exclusão do cadastro na forma regulamentar, autoriza a validação retroativa das contribuições pela alíquota de 5%, desde que comprovados os requisitos de enquadramento como segurado facultativo, na forma do art. 21, §2º, II, alínea b', da Lei 8.212/91” (PUIL 5018761-55.2018.4.04.7100/RS, Rel. Juiz Federal Ivanir Cesar Ireno Junior, 16/11/2021). Ora, o CadÚnico, regulamentado pelo Decreto nº 11.016 de 29/03/2022 e pela Portaria MC nº 810 de 14/09/2022, é um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda, permitindo que o governo conheça melhor a realidade socioeconômica dessa população. Manter o cadastro atualizado é, deveras, importante porquanto o governo utiliza estes dados para conhecer melhor as necessidades das famílias e oferecer benefícios e serviços sociais que contribuam para a melhoria de vida de todos. Há de se dizer que, mesmo sem mudança na família, o cadastro deve ser atualizado a cada 02 (dois) anos, obrigatoriamente. Importante, também, entender que os atos normativos supracitados criaram, no âmbito gerencial do CadÚnico, duas modalidades de exclusão: a) a exclusão lógica do cadastro, em que os dados das famílias são excluídos, mas permanecem acessíveis na base nacional do CadÚnico (artigo 2º, XVI, da Portaria MC nº 810 de 14/09/2022), sendo uma de suas hipóteses a do cadastrado cuja inclusão ou última atualização ocorreu há 48 (quarenta e oito) meses ou mais (art. 27, I, Portaria MC nº 810 de 14/09/2022); b) a exclusão física do cadastro, em que os dados das famílias são apagados em definitivo da base nacional do CadÚnico. Reputo necessária essa distinção vez que há consequências diferentes para cada tipo de exclusão, registradas na Portaria MC nº 810 de 14/09/2022, supracitada. É que, via de regra, a exclusão física do cadastro das famílias atendidas ocorrerá somente 05 (cinco) anos passados da exclusão lógica (art. 27, parágrafo único da Portaria MC nº 810 de 14/09/2022). Dessa forma, para que um cadastro seja excluído, por estar desatualizado, deverá ocorrer, sucessivamente, sua exclusão lógica e, após o interstício supracitado, sua exclusão física. Todas essas nuances foram enfrentadas pela Turma Nacional de Uniformização, ao firmar o entendimento do Tema 285, supracitado. Colho, do voto vencedor , o seguinte trecho, que elucidará o caso concreto: “No caso, como ficou registrado na tese, a compreensão do colegiado é a seguinte: (i) como regra, somente são válidas as contribuições de 5% feitas no período de 02 anos, no qual o cadastro está atualizado/revalidado; (ii) é obrigatória a atualização/revalidação na via administrativa, mesmo que extemporânea, para que as contribuições feitas no período de cadastro desatualizado/não revalidado possam ser validadas retroativamente na via judicial; (iii) o termo final da possibilidade de atualização/revalidação extemporânea é a exclusão do cadastro, na forma regulamentar, situação em que as contribuições feitas no período de cadastro desatualizado/não revalidado após os dois anos não podem ser validadas retroativamente; (iv) em todo caso, deve ficar demonstrado no processo judicial, pela controvérsia instaurada/veiculada e pelos meios de prova e ônus regulares, que no período de cadastro desatualizado/não revalidado estavam presentes os requisitos ensejadores do enquadramento como segurado facultativo, na forma do art. 21 1, § 2º, II, alínea 'b', da Lei 8.2122/91.” (TNU - Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei: 50187615520184047100, Relator: Juiz Federal Ivanir César Ireno Junior, DJe: 16/11/2021). Portanto, conclui-se que: (i) as contribuições à alíquota de 5% do facultativo de baixa renda apenas valem, em regra, no durante o prazo máximo de 2 (dois) anos contado da inscrição/atualização/revalidação de seu cadastro; (ii) excepcionalmente podem ser validadas as contribuições compreendidas após expirado o prazo retro e até o prazo máximo de 4 anos (exclusão lógica, conforme art. 27, I, Portaria MC nº 810 de 14/09/2022), isso sob a inafastável condição de que atualização/revalidação do cadastro seja feita antes de esgotado o prazo de 4 (quatro) anos; (iii) na hipótese retro, a validação das contribuições anteriores à atualização/revalidação do cadastro condiciona-se ainda à prova pelo segurado de que cumpria os requisitos legais de enquadramento como facultativo de baixa renda. Voltando-me ao caso concreto, destaco que a autora não juntou aos autos comprovante de inscrição no CadÚnico. Impende, ainda, esclarecer que a parte autora recolheu a complementação das competências de 10/2015 a 12/2015 e de 07/2021 a 05/2022 (ID 2197861638). Quanto ao recolhimento das competências 05/2005, 03/2008, 04/2008 e 02/2009 alegou na exordial não ter recolhido as diferenças por já ter cumprido as exigências mínimas para a concessão de sua aposentadoria por idade urbana. Destaco aqui o julgamento da TNU do PEDILEF 2009.71.50.019216-5/RS, que transitou em julgado em 25/03/2013, momento em que foi fixada tese jurídica representativa da controvérsia - TEMA 192, e da qual se pode extrair que serão consideradas para efeito de carência as contribuições recolhidas extemporaneamente somente caso não tenha havido a perda da qualidade de segurado, veja-se: “Recolhimento com atraso das contribuições posteriores ao pagamento da primeira contribuição sem atraso. Perda da qualidade de segurado. Impossibilidade de cômputos das contribuições recolhidas com atraso relativas ao período entre a perda da qualidade de segurado e a sua reaquisição para efeito de carência”. Quanto ao recolhimento das competências de 07/2014, 08/2014 e 09/2014 que foram realizados em atraso (pagamentos em 20/08/2014, 04/11/2014, 04/11/2014, respectivamente), forçoso reconhecer que, por ocasião do recolhimento em 15/07/2013, a autora já havia perdido a qualidade de segurada em 15/08/2014, considerando que a última contribuição tempestiva havia se dado na competência de 06/2013. Em relação ao recolhimento da competência de 03/2017 (pagamento em 19/04/2017) a autora não havia efetuado novo recolhimento tempestivo como contribuinte individual antes de 03/2017. Por fim, verifica-se nos documentos juntados que a requerente gozou de auxílio-doença previdenciário. Tal período também deve ser computado como carência para o benefício pleiteado, tendo em vista que o recebimento do benefício por incapacidade foi intercalado com períodos de trabalho, em perfeita consonância com o entendimento firmado pela TNU (PUIL 805-67.2015.4.03.6317 e Sumula 73), bem como pelo STF (RE 583.834). Assim, somando-se as contribuições constantes no CNIS da demandante com as reconhecidas na fundamentação alhures, concluo que, no dia 21/09/2023 (data do requerimento administrativo – ID 2197878518), contava a autora com tempo de contribuição de 15 (quinze) anos, 3 (três) meses e 17 (dezessete) dias, carência (180 contribuições) e idade mínima (66 anos, 5 meses e 20 dias) suficientes ao gozo da postulada aposentadoria por idade. Dispositivo. Com fundamento no exposto, declaro extinto o processo com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC) e JULGO PROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial para: a) condenar o INSS a implantar o benefício de APOSENTADORIA POR IDADE em prol de ALICE MENDONCA DE JESUS, com Data de Início do Benefício – DIB em 21/09/2023 (DER) e Data do Início do Pagamento – DIP em 01/07/2025, devendo a renda mensal ser apurada nos moldes do art. 18, §2º, c/c art. 26, §2º, I, da EC n. 103/2019; b) condenar a parte ré ao pagamento das parcelas vencidas entre as datas da DIB e da DIP acima definidas, pela via legal (RPV ou precatório), ficando autorizada a compensação de eventuais valores recebidos pela parte autora com referência ao período; c) determinar que: i) até 08/12/2021, as parcelas vencidas sejam atualizadas monetariamente pelo INPC, e, no tocante aos juros, de acordo com a sistemática prevista no art. 1°-F da Lei n° 9.497/97; ii) a partir de 09/12/2021, os valores retroativos sejam atualizados pela taxa SELIC, conforme determinado pelo art. 3º da EC n. 113/2021, sem quaisquer outros indexadores, uma vez que a mencionada taxa engloba correção monetária e juros. Deixo de antecipar os efeitos da tutela de urgência, porquanto não requerida na inicial e, ainda, em observância à tese firmado no Tema 692 pelo Colendo STJ (“a reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”). Sem custas nem honorários advocatícios nesta primeira instância (art. 55 da Lei 9.099/1995, artigo 55). Defiro o pedido de gratuidade da justiça, nos termos do artigo 98 e seguintes do Código de Processo Civil, considerando a declaração de hipossuficiência firmada pela autora (ID 2157926284), uma vez que inexistem nos autos elementos que a desconstituam. Sobrevindo o trânsito em julgado, intime-se a parte credora para, em 15 (quinze) dias, apresentar requerimento de cumprimento de sentença instruído com demonstrativo atualizado e discriminado do crédito, aplicando-se as exigências dispostas no artigo 534 do CPC. Oportunamente, arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Itumbiara/GO, (data da assinatura eletrônica). (assinado eletronicamente) FRANCISCO VIEIRA NETO Juiz Federal JSS

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Processo nº 1000292-40.2023.8.11.0014

ID: 259400318

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000292-40.2023.8.11.0014

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

LUCIA FERNANDES DE LIMA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JHONNY RICARDO TIEM

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000292-40.2023.8.11.0014 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Em… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000292-40.2023.8.11.0014 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [LUCIA FERNANDES DE LIMA - CPF: 033.435.931-76 (APELANTE), JHONNY RICARDO TIEM - CPF: 973.705.841-00 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. - CNPJ: 07.207.996/0001-50 (APELADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA REGULARIDADE PELO BANCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação declaratória de anulabilidade de negócio jurídico c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada contra instituição financeira, na qual a autora alegava inexistência de contratação de empréstimo consignado e descontos indevidos em seu benefício previdenciário. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se houve contratação válida de empréstimo consignado pela apelante; e (ii) estabelecer as consequências jurídicas decorrentes da eventual inexistência do contrato. III. RAZÕES DE DECIDIR Em relação de consumo, incide o CDC, cabendo ao fornecedor comprovar a regularidade da contratação quando contestada sua existência. A inexistência de comprovação da contratação válida impõe o reconhecimento da nulidade do negócio jurídico e da inexigibilidade do débito correspondente. A falha na prestação do serviço bancário, com descontos indevidos em benefício previdenciário, caracteriza dano moral in re ipsa, sendo devida indenização de R$ 5.000,00. A restituição dos valores descontados deve ocorrer de forma dobrada, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, ante a ausência de engano justificável por parte da instituição financeira. Inviável o pedido de compensação por ausência de comprovação de vantagem econômica indevida pela consumidora. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. Compete à instituição financeira comprovar a regularidade do contrato de empréstimo consignado quando contestada sua existência pelo consumidor. 2. A falha na prestação do serviço bancário que resulta em descontos indevidos em benefício previdenciário configura dano moral presumido, ensejando reparação. 3. É cabível a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente quando não demonstrado engano justificável, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.” R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por LUCIA FERNANDES DE LIMA contra sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Poxoréu, que, na presente Ação Declaratória de Anulabilidade de Negócio Jurídico c/c Repetição de Indébito c/c Indenização por Danos Morais, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Em suas razões recursais, a Apelante reitera que não firmou contrato de empréstimo consignado e que os descontos em seu benefício de aposentadoria são indevidos. Sustenta a possibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, sobretudo quanto à responsabilidade objetiva da instituição financeira e a ausência de demonstração de culpa exclusiva da vítima ou fato de terceiros. Afirma que a instituição financeira apelada não comprovou que houve proveito econômico do consumidor, tendo deixado de juntar demonstração de saques ou transferências bancárias, o que ratifica a alegação de que não realizou a contratação do empréstimo consignado. Diante disso, requer o provimento do recurso, para que seja declarada a ilegalidade dos descontos realizados em seu benefício, com a consequente restituição em dobro dos valores indevidamente descontados e condenação da instituição financeira à indenização por danos morais. Contrarrazões no ID 274533388, oportunidade em que a parte apelada suscita preliminar de violação ao princípio da dialeticidade. No mérito, pugna pelo desprovimento do recurso ou, subsidiariamente, pela possibilidade de compensação dos valores recebidos pela Apelante. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R VOTO (PRELIMINAR) – OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Colenda Câmara: Arguiu a Apelada que o recurso interposto pela Apelante LUCIA FERNANDES DE LIMA não deve ser conhecido, pois não há nas razões da apelação a impugnação aos fundamentos da sentença. É cediço que a apelação deve atacar os fundamentos da sentença, em atendimento aos requisitos dispostos no artigo 1.010 do Código de Processo Civil. Nos termos do artigo supracitado, tem-se que a motivação constitui um dos pressupostos do recurso, devendo constar a fundamentação na qual a parte recorrente baseia seu pedido de reforma da sentença. Tal fundamentação é responsável por limitar a matéria que será devolvida ao juízo de segundo grau. Extrai-se do ensinamento acima a evidência de que a parte apelante deve atacar, especificamente, os fundamentos da sentença que deseja rebater. Sobre o tema, colaciono o seguinte julgado: “[...] não há falar-se em ofensa ao princípio da dialeticidade se constatado que o recorrente ataca especificamente todos os pontos da sentença objurgada, apontando inclusive supostos equívocos cometidos pelo julgador singular. [...]"(TJMT, ApCiv 63258/2012, r. Marilsen Andrade Addario, p. 12/12/2012). No caso em exame, denota-se das razões recursais que a parte recorrente atendeu ao princípio da dialeticidade e aos requisitos previstos no artigo 1.010, III, do Código de Processo Civil, pois apresentou as razões de seu pedido de reforma, com os fundamentos de fato e de direito, e expresso pedido de que a sentença merece ser reformada. Além disso, a reiteração de algumas das razões expostas na Primeira Instância, por si só, não impede o conhecimento do recurso, desde que, pela leitura do apelo, seja possível identificar claramente os motivos pelos quais se requer a reforma da sentença. Deste modo, rejeito a preliminar suscitada. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Colenda Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação interposto por Lucia Fernandes de Lima contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. In casu, cinge-se a controvérsia à validade do contrato de empréstimo consignado nº 818546691, no valor de R$2.458,04, em 84 parcelas mensais de R$ 54,15, que o banco apelado afirma ter sido celebrado pela apelante em 25/11/2021. Como é cediço, em se tratando de relação consumerista, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, sendo pertinente a inversão do ônus da prova quando presentes os requisitos legais, conforme determina o art. 6º, VIII, do CDC. Portanto, caberia ao banco apelado comprovar a regularidade da contratação, demonstrando que o contrato foi efetivamente firmado pelo consumidor, o que não ocorreu na hipótese. DA REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO De início, cumpre destacar que a controvérsia posta nos autos diz respeito à própria validade do negócio jurídico, uma vez que a apelante nega ter firmado contrato de empréstimo consignado com a instituição financeira. Tendo isso em vista, é certo que a mera apresentação de instrumento contratual, desacompanhada de outros elementos que atestem o efetivo consentimento da consumidora, não é suficiente para comprovar a legitimidade da contratação, sobretudo diante da impugnação expressa e da ausência de indícios de benefício econômico à parte autora. Nesse contexto, competia ao banco apelado demonstrar, de forma robusta, que houve efetiva contratação, o que poderia ter sido feito por meio da comprovação de saque, movimentação bancária, gravação de ligação telefônica, ou mesmo laudo pericial que atestasse a autenticidade da assinatura. Nenhum desses elementos, contudo, foi apresentado nos autos. Ressalte-se que não se poderia exigir da parte autora a produção de prova negativa, como a demonstração de que não firmou o contrato ou de que a assinatura constante no documento não é sua. Nesse cenário, por força do art. 373, II, do CPC, cabia à instituição financeira comprovar a regularidade do negócio jurídico e a manifestação válida de vontade da parte consumidora, todavia, não logrou êxito em infirmar as alegações da autora. Isto posto, a ausência de comprovação do efetivo proveito econômico da autora e da autenticidade da assinatura constante no suposto contrato revela a fragilidade da tese defensiva e atrai o reconhecimento da invalidade do negócio jurídico, por vício de consentimento ou mesmo inexistência da manifestação de vontade. Diante dessas circunstâncias, impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade da avença e, por consequência, da indevida realização de descontos no benefício previdenciário da apelante. DOS DANOS MORAIS Prosseguindo, a realização de descontos em proventos previdenciários com base em contratação não comprovada pelo fornecedor configura falha na prestação do serviço bancário, nos termos do art. 14 do CDC, violando os deveres de cautela, transparência e segurança que regem as relações de consumo, e sendo, portanto, fato gerador de responsabilidade por danos morais. Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, embora o autor tenha requerido valor diverso na petição inicial, entendo que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) se mostra compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como observados os princípios da moderação e razoabilidade. Nesse sentido: “[...] Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. [...]”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/07/2024, Publicado no DJE 02/07/2024) (g.n) “[...] Se a parte autora alega não ter celebrado contrato de empréstimo com o banco requerido, a este incumbe comprovar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, como preceitua o art. 373, II, do CPC. Não comprovada pela instituição financeira a regularidade na contratação do empréstimo com a parte, torna-se inexistente o débito efetivado no benefício da aposentadoria, condição que enseja a restituição e configura ato ilícito passível de reparação, máxime porque o desconto indevido se deu sobre verba de natureza alimentar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. [...].” (TJMT, ApCiv 1000289-70.2022.8.11.0095, r. GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 08/11/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 14/11/2023) (g.n) Nesse contexto, dado que o contrato foi declarado inexistente, isso configura uma situação de responsabilidade extracontratual, pois não há um contrato válido que regule a relação entre as partes. Consequentemente, os juros de mora sobre a indenização por danos morais devem seguir a regra da Súmula 54 do STJ, incidindo a partir do evento danoso. Convergindo com o entendimento ora externado, colaciono precedente de minha relatoria: “(...) Indenização por danos morais: A jurisprudência é pacífica no sentido de que descontos indevidos em benefícios previdenciários configuram dano moral in re ipsa, ou seja, presumido. (...) Manutenção do termo inicial dos juros: Os juros de mora sobre a indenização devem incidir a partir do evento danoso, conforme a Súmula 54 do STJ, uma vez que se trata de responsabilidade extracontratual. (...)” (TJMT, ApCiv 1034946-40.2021.8.11.0041, r.MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/10/2024, p. 22/10/2024) (g.n) “[...] Demonstrado o ato ilícito pelo desconto em benefício previdenciário de empréstimo consignado não contratado, nasce a obrigação de indenizar os danos morais, independentemente da prova de prejuízo. [...] Tratando-se de responsabilidade civil extracontratual, os juros de mora devem incidir a partir do evento danoso, consoante o disposto na Súmula 54 do STJ. [...]” (TJMT, ApCiv 1000084-23.2022.8.11.0101, r. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 03/09/2024, p. 10/09/2024) (g.n) Ainda, fixo como termo inicial da incidência da correção monetária a contar da data do arbitramento, na medida em que a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelece que “a correção monetária do valor da indenização por dano moral começa a incidir a partir da data do arbitramento”. Nesse passo, a publicação da Lei nº 14.905/2024 promoveu alterações significativas em dispositivos do Código Civil, notadamente nos que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis (arts. 389 e 406). Referida norma estabeleceu que, nas hipóteses em que não houver pactuação ou previsão legal específica, deverão ser aplicados o IPCA como índice de atualização monetária e a Taxa Selic, deduzindo-se a correção monetária aplicável, como base para o cálculo dos juros moratórios. As referidas alterações passaram a produzir efeitos 60 dias após a publicação da lei (art. 5º, II), ocorrida em 1º/07/2024. Assim, com a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, entendo que o percentual dos juros de mora deve ser fixado em 1% (um por cento) ao mês, com fundamento no art. 406 do Código Civil combinado com o art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (conforme o Enunciado nº 20 da 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal), até a data em que a nova legislação começou a produzir efeitos. A partir de então, o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar as alterações introduzidas no Código Civil, aplicando-se a Taxa Selic como indexação para juros e correção monetária, na forma do art. 406, § 1º, do CC/02. DA RESTITUIÇÃO EM DOBRO Embora a instituição financeira defenda a impossibilidade de devolução do montante desembolsado pela consumidora ante o suposto risco de enriquecimento ilícito, verifica-se que, para além dos inúmeros descontos efetuados mensalmente de seu benefício previdenciário, não há evidências de que foram repassados quaisquer valores à conta bancária da apelante, razão pela qual não há que se falar em vantagem indevida. Isto posto, e verificada a irregularidade da contratação, torna-se insubsistente a dívida, autorizando a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados dos proventos da ora apelante, notadamente porque a instituição financeira se beneficiou ilicitamente dos valores subtraídos, conforme entendimento pacífico desta Corte, o qual é reiteradamente adotado por este Relator. Veja-se: “DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO. DESCONTOS INDEVIDOS EM CONTA CORRENTE. AUSÊNCIA DE CONTRATO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL IN RE IPSA. RECURSO PROVIDO.” (TJMT, ApCiv 1028549-62.2021.8.11.0041, r. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/02/2025, Publicado no DJE 07/02/2025) “DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO NÃO RECONHECIDO. BIOMETRIA FACIAL IMPUGNADA. FRAUDE COMPROVADA. ÔNUS DA PROVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJMT, ApCiv 1042836-93.2022.8.11.0041, r. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/02/2025, Publicado no DJE 21/02/2025) Acerca da determinação de que a repetição do indébito seja em dobro, assim entendo, pois alinho-me ao entendimento de que a expressão “salvo hipótese de engano justificável”, constante no art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser compreendida como elemento de causalidade, e não de culpabilidade, ao passo que o ônus probatório, para excludente da repetição dobrada, é do fornecedor e, não o fazendo, impõe-se a repetição do indébito em dobro. Sobre a temática, cito julgados deste Sodalício: “(...) 1. Não havendo nos autos qualquer prova quanto à celebração do contrato questionado na lide, resta caracterizada a responsabilidade da empresa, que responde objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros. 2. Apesar dos argumentos da instituição ré, de que os descontos no benefício previdenciário e depósito na conta da parte autora estão embasados em contrato devidamente contratado pela parte autora, não se desincumbiu do ônus probatório, uma vez que não apresentou cópia do contrato. Assim, merece ser declarada a inexistência da relação jurídica, com a consequente determinação de cancelamento dos descontos. 3. Comprovada a cobrança indevida, a restituição dobrada tem cabimento por força do parágrafo único do art. 42 do CDC, porquanto houve falha na prestação do serviço, sendo patente inocorrência de engano justificável. 4. Cuidando-se de descontos indevidamente realizados no benefício de aposentadoria do autor, é cabível a indenização por danos morais in re ipsa. 5. O valor da indenização por danos morais deve ser fixado em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, devendo ser majorados o valor arbitrado na sentença, a fim de atender ao caráter disciplinar e ressarcitório da condenação.” (TJMT, ApCiv 1000991-27.2021.8.11.0038, r. NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, j. 14/03/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, p. 16/03/2023) (g.n). “DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO INEXISTENTE. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. AUSÊNCIA DE ASSINATURA DA AUTORA. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL CONFIGURADO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. RECURSO DESPROVIDO. 1. O desconto indevido em benefício previdenciário decorrente de contrato inexistente configura falha na prestação do serviço, ensejando indenização por danos morais. 2. A repetição do indébito em dobro é devida quando não há comprovação de engano justificável por parte da instituição financeira, conforme art. 42, p.u., do CDC." (TJMT, ApCiv 1014108-76.2021.8.11.0041, r. MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 11/03/2025, p. 15/03/2025) (g.n) Assim, não há que se falar em restituição na forma simples, tampouco no afastamento do dever de restituir os valores indevidamente descontados. DA COMPENSAÇÃO DE VALORES Quanto ao pedido de compensação, tenho que este não merece acolhimento, pois, como exaustivamente mencionado, para além do fato de a restituição corresponder apenas a valores efetivamente desembolsados pela consumidora, a instituição financeira não comprovou que houve proveito econômico por parte da apelante. Não há, portanto, que se falar em enriquecimento ilícito, pois a condenação visa justamente restaurar o status quo ante, com a anulação dos contratos e devolução dos valores pagos indevidamente. CONCLUSÃO Diante da ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, quanto à regularidade das cobranças impugnadas, bem como da inexistência de prova incontestável de que a consumidora possuía pleno conhecimento e consentiu expressamente com a contratação, impõe-se a reforma da sentença recorrida, em estrita observância aos princípios basilares que regem as relações de consumo, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável (art. 47 do CDC). Com essas considerações, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por Lúcia Fernandes de Lima, para, reformando a sentença vergastada: (i) declarar a inexistência do negócio jurídico objeto da demanda e, por consectário lógico, a inexigibilidade do débito dele decorrente; (ii) determinar a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados; e (iii) condenar a instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), sobre o qual deverão incidir juros moratórios desde o evento danoso (Súmula 54/STJ) e correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362/STJ). Por conseguinte, modificado o julgado e provido em parte o recurso, tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora em seus pedidos, inverto o ônus de sucumbência fixado na origem. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1000292-40.2023.8.11.0014

ID: 259400321

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000292-40.2023.8.11.0014

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

Acórdão

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000292-40.2023.8.11.0014 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Em… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000292-40.2023.8.11.0014 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [LUCIA FERNANDES DE LIMA - CPF: 033.435.931-76 (APELANTE), JHONNY RICARDO TIEM - CPF: 973.705.841-00 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. - CNPJ: 07.207.996/0001-50 (APELADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA REGULARIDADE PELO BANCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação declaratória de anulabilidade de negócio jurídico c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada contra instituição financeira, na qual a autora alegava inexistência de contratação de empréstimo consignado e descontos indevidos em seu benefício previdenciário. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se houve contratação válida de empréstimo consignado pela apelante; e (ii) estabelecer as consequências jurídicas decorrentes da eventual inexistência do contrato. III. RAZÕES DE DECIDIR Em relação de consumo, incide o CDC, cabendo ao fornecedor comprovar a regularidade da contratação quando contestada sua existência. A inexistência de comprovação da contratação válida impõe o reconhecimento da nulidade do negócio jurídico e da inexigibilidade do débito correspondente. A falha na prestação do serviço bancário, com descontos indevidos em benefício previdenciário, caracteriza dano moral in re ipsa, sendo devida indenização de R$ 5.000,00. A restituição dos valores descontados deve ocorrer de forma dobrada, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, ante a ausência de engano justificável por parte da instituição financeira. Inviável o pedido de compensação por ausência de comprovação de vantagem econômica indevida pela consumidora. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. Compete à instituição financeira comprovar a regularidade do contrato de empréstimo consignado quando contestada sua existência pelo consumidor. 2. A falha na prestação do serviço bancário que resulta em descontos indevidos em benefício previdenciário configura dano moral presumido, ensejando reparação. 3. É cabível a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente quando não demonstrado engano justificável, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.” R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por LUCIA FERNANDES DE LIMA contra sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Poxoréu, que, na presente Ação Declaratória de Anulabilidade de Negócio Jurídico c/c Repetição de Indébito c/c Indenização por Danos Morais, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Em suas razões recursais, a Apelante reitera que não firmou contrato de empréstimo consignado e que os descontos em seu benefício de aposentadoria são indevidos. Sustenta a possibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, sobretudo quanto à responsabilidade objetiva da instituição financeira e a ausência de demonstração de culpa exclusiva da vítima ou fato de terceiros. Afirma que a instituição financeira apelada não comprovou que houve proveito econômico do consumidor, tendo deixado de juntar demonstração de saques ou transferências bancárias, o que ratifica a alegação de que não realizou a contratação do empréstimo consignado. Diante disso, requer o provimento do recurso, para que seja declarada a ilegalidade dos descontos realizados em seu benefício, com a consequente restituição em dobro dos valores indevidamente descontados e condenação da instituição financeira à indenização por danos morais. Contrarrazões no ID 274533388, oportunidade em que a parte apelada suscita preliminar de violação ao princípio da dialeticidade. No mérito, pugna pelo desprovimento do recurso ou, subsidiariamente, pela possibilidade de compensação dos valores recebidos pela Apelante. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R VOTO (PRELIMINAR) – OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Colenda Câmara: Arguiu a Apelada que o recurso interposto pela Apelante LUCIA FERNANDES DE LIMA não deve ser conhecido, pois não há nas razões da apelação a impugnação aos fundamentos da sentença. É cediço que a apelação deve atacar os fundamentos da sentença, em atendimento aos requisitos dispostos no artigo 1.010 do Código de Processo Civil. Nos termos do artigo supracitado, tem-se que a motivação constitui um dos pressupostos do recurso, devendo constar a fundamentação na qual a parte recorrente baseia seu pedido de reforma da sentença. Tal fundamentação é responsável por limitar a matéria que será devolvida ao juízo de segundo grau. Extrai-se do ensinamento acima a evidência de que a parte apelante deve atacar, especificamente, os fundamentos da sentença que deseja rebater. Sobre o tema, colaciono o seguinte julgado: “[...] não há falar-se em ofensa ao princípio da dialeticidade se constatado que o recorrente ataca especificamente todos os pontos da sentença objurgada, apontando inclusive supostos equívocos cometidos pelo julgador singular. [...]"(TJMT, ApCiv 63258/2012, r. Marilsen Andrade Addario, p. 12/12/2012). No caso em exame, denota-se das razões recursais que a parte recorrente atendeu ao princípio da dialeticidade e aos requisitos previstos no artigo 1.010, III, do Código de Processo Civil, pois apresentou as razões de seu pedido de reforma, com os fundamentos de fato e de direito, e expresso pedido de que a sentença merece ser reformada. Além disso, a reiteração de algumas das razões expostas na Primeira Instância, por si só, não impede o conhecimento do recurso, desde que, pela leitura do apelo, seja possível identificar claramente os motivos pelos quais se requer a reforma da sentença. Deste modo, rejeito a preliminar suscitada. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Colenda Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação interposto por Lucia Fernandes de Lima contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. In casu, cinge-se a controvérsia à validade do contrato de empréstimo consignado nº 818546691, no valor de R$2.458,04, em 84 parcelas mensais de R$ 54,15, que o banco apelado afirma ter sido celebrado pela apelante em 25/11/2021. Como é cediço, em se tratando de relação consumerista, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, sendo pertinente a inversão do ônus da prova quando presentes os requisitos legais, conforme determina o art. 6º, VIII, do CDC. Portanto, caberia ao banco apelado comprovar a regularidade da contratação, demonstrando que o contrato foi efetivamente firmado pelo consumidor, o que não ocorreu na hipótese. DA REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO De início, cumpre destacar que a controvérsia posta nos autos diz respeito à própria validade do negócio jurídico, uma vez que a apelante nega ter firmado contrato de empréstimo consignado com a instituição financeira. Tendo isso em vista, é certo que a mera apresentação de instrumento contratual, desacompanhada de outros elementos que atestem o efetivo consentimento da consumidora, não é suficiente para comprovar a legitimidade da contratação, sobretudo diante da impugnação expressa e da ausência de indícios de benefício econômico à parte autora. Nesse contexto, competia ao banco apelado demonstrar, de forma robusta, que houve efetiva contratação, o que poderia ter sido feito por meio da comprovação de saque, movimentação bancária, gravação de ligação telefônica, ou mesmo laudo pericial que atestasse a autenticidade da assinatura. Nenhum desses elementos, contudo, foi apresentado nos autos. Ressalte-se que não se poderia exigir da parte autora a produção de prova negativa, como a demonstração de que não firmou o contrato ou de que a assinatura constante no documento não é sua. Nesse cenário, por força do art. 373, II, do CPC, cabia à instituição financeira comprovar a regularidade do negócio jurídico e a manifestação válida de vontade da parte consumidora, todavia, não logrou êxito em infirmar as alegações da autora. Isto posto, a ausência de comprovação do efetivo proveito econômico da autora e da autenticidade da assinatura constante no suposto contrato revela a fragilidade da tese defensiva e atrai o reconhecimento da invalidade do negócio jurídico, por vício de consentimento ou mesmo inexistência da manifestação de vontade. Diante dessas circunstâncias, impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade da avença e, por consequência, da indevida realização de descontos no benefício previdenciário da apelante. DOS DANOS MORAIS Prosseguindo, a realização de descontos em proventos previdenciários com base em contratação não comprovada pelo fornecedor configura falha na prestação do serviço bancário, nos termos do art. 14 do CDC, violando os deveres de cautela, transparência e segurança que regem as relações de consumo, e sendo, portanto, fato gerador de responsabilidade por danos morais. Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, embora o autor tenha requerido valor diverso na petição inicial, entendo que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) se mostra compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como observados os princípios da moderação e razoabilidade. Nesse sentido: “[...] Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. [...]”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/07/2024, Publicado no DJE 02/07/2024) (g.n) “[...] Se a parte autora alega não ter celebrado contrato de empréstimo com o banco requerido, a este incumbe comprovar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, como preceitua o art. 373, II, do CPC. Não comprovada pela instituição financeira a regularidade na contratação do empréstimo com a parte, torna-se inexistente o débito efetivado no benefício da aposentadoria, condição que enseja a restituição e configura ato ilícito passível de reparação, máxime porque o desconto indevido se deu sobre verba de natureza alimentar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. [...].” (TJMT, ApCiv 1000289-70.2022.8.11.0095, r. GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 08/11/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 14/11/2023) (g.n) Nesse contexto, dado que o contrato foi declarado inexistente, isso configura uma situação de responsabilidade extracontratual, pois não há um contrato válido que regule a relação entre as partes. Consequentemente, os juros de mora sobre a indenização por danos morais devem seguir a regra da Súmula 54 do STJ, incidindo a partir do evento danoso. Convergindo com o entendimento ora externado, colaciono precedente de minha relatoria: “(...) Indenização por danos morais: A jurisprudência é pacífica no sentido de que descontos indevidos em benefícios previdenciários configuram dano moral in re ipsa, ou seja, presumido. (...) Manutenção do termo inicial dos juros: Os juros de mora sobre a indenização devem incidir a partir do evento danoso, conforme a Súmula 54 do STJ, uma vez que se trata de responsabilidade extracontratual. (...)” (TJMT, ApCiv 1034946-40.2021.8.11.0041, r.MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 15/10/2024, p. 22/10/2024) (g.n) “[...] Demonstrado o ato ilícito pelo desconto em benefício previdenciário de empréstimo consignado não contratado, nasce a obrigação de indenizar os danos morais, independentemente da prova de prejuízo. [...] Tratando-se de responsabilidade civil extracontratual, os juros de mora devem incidir a partir do evento danoso, consoante o disposto na Súmula 54 do STJ. [...]” (TJMT, ApCiv 1000084-23.2022.8.11.0101, r. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 03/09/2024, p. 10/09/2024) (g.n) Ainda, fixo como termo inicial da incidência da correção monetária a contar da data do arbitramento, na medida em que a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelece que “a correção monetária do valor da indenização por dano moral começa a incidir a partir da data do arbitramento”. Nesse passo, a publicação da Lei nº 14.905/2024 promoveu alterações significativas em dispositivos do Código Civil, notadamente nos que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis (arts. 389 e 406). Referida norma estabeleceu que, nas hipóteses em que não houver pactuação ou previsão legal específica, deverão ser aplicados o IPCA como índice de atualização monetária e a Taxa Selic, deduzindo-se a correção monetária aplicável, como base para o cálculo dos juros moratórios. As referidas alterações passaram a produzir efeitos 60 dias após a publicação da lei (art. 5º, II), ocorrida em 1º/07/2024. Assim, com a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, entendo que o percentual dos juros de mora deve ser fixado em 1% (um por cento) ao mês, com fundamento no art. 406 do Código Civil combinado com o art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (conforme o Enunciado nº 20 da 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal), até a data em que a nova legislação começou a produzir efeitos. A partir de então, o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar as alterações introduzidas no Código Civil, aplicando-se a Taxa Selic como indexação para juros e correção monetária, na forma do art. 406, § 1º, do CC/02. DA RESTITUIÇÃO EM DOBRO Embora a instituição financeira defenda a impossibilidade de devolução do montante desembolsado pela consumidora ante o suposto risco de enriquecimento ilícito, verifica-se que, para além dos inúmeros descontos efetuados mensalmente de seu benefício previdenciário, não há evidências de que foram repassados quaisquer valores à conta bancária da apelante, razão pela qual não há que se falar em vantagem indevida. Isto posto, e verificada a irregularidade da contratação, torna-se insubsistente a dívida, autorizando a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados dos proventos da ora apelante, notadamente porque a instituição financeira se beneficiou ilicitamente dos valores subtraídos, conforme entendimento pacífico desta Corte, o qual é reiteradamente adotado por este Relator. Veja-se: “DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO. DESCONTOS INDEVIDOS EM CONTA CORRENTE. AUSÊNCIA DE CONTRATO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL IN RE IPSA. RECURSO PROVIDO.” (TJMT, ApCiv 1028549-62.2021.8.11.0041, r. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/02/2025, Publicado no DJE 07/02/2025) “DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO NÃO RECONHECIDO. BIOMETRIA FACIAL IMPUGNADA. FRAUDE COMPROVADA. ÔNUS DA PROVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJMT, ApCiv 1042836-93.2022.8.11.0041, r. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/02/2025, Publicado no DJE 21/02/2025) Acerca da determinação de que a repetição do indébito seja em dobro, assim entendo, pois alinho-me ao entendimento de que a expressão “salvo hipótese de engano justificável”, constante no art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser compreendida como elemento de causalidade, e não de culpabilidade, ao passo que o ônus probatório, para excludente da repetição dobrada, é do fornecedor e, não o fazendo, impõe-se a repetição do indébito em dobro. Sobre a temática, cito julgados deste Sodalício: “(...) 1. Não havendo nos autos qualquer prova quanto à celebração do contrato questionado na lide, resta caracterizada a responsabilidade da empresa, que responde objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros. 2. Apesar dos argumentos da instituição ré, de que os descontos no benefício previdenciário e depósito na conta da parte autora estão embasados em contrato devidamente contratado pela parte autora, não se desincumbiu do ônus probatório, uma vez que não apresentou cópia do contrato. Assim, merece ser declarada a inexistência da relação jurídica, com a consequente determinação de cancelamento dos descontos. 3. Comprovada a cobrança indevida, a restituição dobrada tem cabimento por força do parágrafo único do art. 42 do CDC, porquanto houve falha na prestação do serviço, sendo patente inocorrência de engano justificável. 4. Cuidando-se de descontos indevidamente realizados no benefício de aposentadoria do autor, é cabível a indenização por danos morais in re ipsa. 5. O valor da indenização por danos morais deve ser fixado em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, devendo ser majorados o valor arbitrado na sentença, a fim de atender ao caráter disciplinar e ressarcitório da condenação.” (TJMT, ApCiv 1000991-27.2021.8.11.0038, r. NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, j. 14/03/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, p. 16/03/2023) (g.n). “DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO INEXISTENTE. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. AUSÊNCIA DE ASSINATURA DA AUTORA. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL CONFIGURADO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. RECURSO DESPROVIDO. 1. O desconto indevido em benefício previdenciário decorrente de contrato inexistente configura falha na prestação do serviço, ensejando indenização por danos morais. 2. A repetição do indébito em dobro é devida quando não há comprovação de engano justificável por parte da instituição financeira, conforme art. 42, p.u., do CDC." (TJMT, ApCiv 1014108-76.2021.8.11.0041, r. MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 11/03/2025, p. 15/03/2025) (g.n) Assim, não há que se falar em restituição na forma simples, tampouco no afastamento do dever de restituir os valores indevidamente descontados. DA COMPENSAÇÃO DE VALORES Quanto ao pedido de compensação, tenho que este não merece acolhimento, pois, como exaustivamente mencionado, para além do fato de a restituição corresponder apenas a valores efetivamente desembolsados pela consumidora, a instituição financeira não comprovou que houve proveito econômico por parte da apelante. Não há, portanto, que se falar em enriquecimento ilícito, pois a condenação visa justamente restaurar o status quo ante, com a anulação dos contratos e devolução dos valores pagos indevidamente. CONCLUSÃO Diante da ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, quanto à regularidade das cobranças impugnadas, bem como da inexistência de prova incontestável de que a consumidora possuía pleno conhecimento e consentiu expressamente com a contratação, impõe-se a reforma da sentença recorrida, em estrita observância aos princípios basilares que regem as relações de consumo, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável (art. 47 do CDC). Com essas considerações, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por Lúcia Fernandes de Lima, para, reformando a sentença vergastada: (i) declarar a inexistência do negócio jurídico objeto da demanda e, por consectário lógico, a inexigibilidade do débito dele decorrente; (ii) determinar a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados; e (iii) condenar a instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), sobre o qual deverão incidir juros moratórios desde o evento danoso (Súmula 54/STJ) e correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362/STJ). Por conseguinte, modificado o julgado e provido em parte o recurso, tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora em seus pedidos, inverto o ônus de sucumbência fixado na origem. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1007327-24.2022.8.11.0002

ID: 306366640

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007327-24.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

EXPRESSO ITAMARATI S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ADRIANO HENRIQUE LUIZON

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007327-24.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Extravio de bagagem,… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007327-24.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Extravio de bagagem, Transporte Rodoviário] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [EXPRESSO ITAMARATI S.A. - CNPJ: 59.965.038/0001-41 (APELANTE), ADRIANO HENRIQUE LUIZON - CPF: 121.580.598-50 (ADVOGADO), ELIZENIR BATISTA DANTAS - CPF: 726.773.504-59 (APELADO), GLORIA ALCANTARA DOS SANTOS - CPF: 087.540.469-39 (ADVOGADO), VITOR HUGO ALONSO CASAROLLI - CPF: 093.267.809-29 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE RODOVIÁRIO. EXTRAVIO TEMPORÁRIO DE BAGAGEM. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. ARBITRAMENTO MANTIDO. ALTERAÇÃO DA FORMA DE CÁLCULO DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.905/2024. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por Expresso Itamarati S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação de indenização por danos morais decorrente de extravio temporário de bagagem em transporte rodoviário intermunicipal contratado por Elizenir Batista Dantas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) verificar se houve comprovação do extravio da bagagem que justifique a responsabilização da empresa de transporte; (ii) analisar a adequação do valor fixado a título de indenização por dano moral; e (iii) definir se incide a nova sistemática de correção monetária e juros moratórios trazida pela Lei nº 14.905/2024. III. RAZÕES DE DECIDIR A comprovação do vínculo contratual e da devolução tardia da bagagem é suficiente para configurar falha na prestação do serviço, nos termos do art. 14 do CDC e do art. 734 do CC, atraindo a responsabilidade objetiva da transportadora. O extravio temporário de bagagem ultrapassa o mero aborrecimento e configura dano moral presumido (in re ipsa), não havendo necessidade de demonstração de prejuízo concreto. O valor da indenização fixado em R$ 4.000,00 observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo à função compensatória e pedagógica da reparação. Com a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, a partir da data legalmente estipulada, os juros moratórios e a correção monetária devem ser apurados com base na Taxa Selic, conforme o novo art. 406, § 1º, do CC/02, permanecendo aplicáveis, até então, os critérios anteriores (juros de 1% ao mês e correção pelo INPC). IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: O extravio temporário de bagagem caracteriza falha na prestação do serviço e enseja reparação por danos morais, independentemente de prova de culpa ou prejuízo concreto. A responsabilidade do transportador de passageiros é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC e do art. 734 do CC. A fixação do dano moral deve observar a razoabilidade, proporcionalidade e o caráter pedagógico da indenização. A Lei nº 14.905/2024 aplica-se às condenações cíveis quanto ao critério de juros e correção monetária, incidindo a Taxa Selic a partir da data de sua entrada em vigor. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de apelação cível interposta por EXPRESSO ITAMARATI S.A. em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Rondonópolis/MT, nos autos da ação de indenização por danos morais ajuizada por ELIZENIR BATISTA DANTAS, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Contra a sentença se insurge a apelante, sustentando, em síntese, que não há prova do extravio, ante a ausência de registro de reclamação pelo SAC, não preenchimento de formulário de extravio, apresentação pela autora de cartão de empresa diversa (Viação Ouro e Prata) e conversas por WhatsApp com pessoa denominada "Mulher da Rodoviária" que menciona garagem da "Eucatur", empresa sem relação com a apelante. Argumenta, ainda, que a falta de poucas roupas por pequeno período não justifica indenização, constituindo mero descumprimento contratual. Subsidiariamente, requer a diminuição da quantia fixada. Por fim, postula aplicação da Lei nº 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil. Contrarrazões em ID 289491367. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de apelação cível interposta por Expresso Itamarati S.A. contra sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos morais, que julgou parcialmente procedente a demanda ajuizada por Elizenir Batista Dantas. Na exordial, a autora (apelada) aduz que contratou serviços de transporte rodoviário da empresa ré para viagem de Várzea Grande/MT a Sinop/MT, realizada em 16/02/2022. Alega que, ao chegar ao destino em 17/02/2022, sua bagagem despachada não foi localizada, tendo sido informada que a mala havia sido equivocadamente direcionada para Sorriso/MT. Afirma que após diversas tentativas e contatos, conseguiu reaver a bagagem apenas em 21/02/2022, ao final da viagem. Diante disso, pleiteou indenização por danos morais e materiais, alegando falha na prestação do serviço de transporte. O magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos: “[...] Do mérito. Inicialmente, consigno que a relação jurídica estabelecida entre as partes é típica relação de consumo e, portanto, deve ser respeitado o que dispõem as normas e princípios do Código de Defesa do Consumidor. Esse é o entendimento do TJMT: [...] Nesta linha, registro que em se tratando de típico contrato de prestação de serviço, o transportador responde de forma objetiva pelos danos decorrentes da prestação defeituosa do serviço, nos termos do artigo14,caput, do CDC, persistindo enquanto não demonstrada culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, força maior e caso fortuito não vinculado à organização da atividade comercial. Pois bem. No caso em análise, constato que ficou comprovado que a autora efetivamente embarcou em ônibus da requerida, conforme passagem anexada aos autos (Id. 78256625), e que enfrentou dificuldade para reaver sua bagagem, sendo necessário retornar diversas vezes à rodoviária e realizar contato com funcionária da empresa, via aplicativo de mensagens, a fim de localizar a mala (Id. 78256627). É sabido que para que seja reconhecido o dever de indenizar, basta a comprovação de causa e efeito entre a ação ou omissão do fornecedor de serviços e o dano sofrido pela vítima (nexo causal), sendo desnecessário a culpa do agente. Em que se pese o desconhecimento mencionado pelo demandado, inclusive quanto ao suposto cartão de embarque estar em nome de terceiro, certo que é que a parte autora juntou comprovante da passagem emitida pela própria parte ré, inclusive com informações quanto a data da viagem, horário, poltrona e a passageira, ora, demandante, o que corrobora as alegações autorais. Deste modo, o polo ativo se desincumbiu do ônus que lhe cabia ao pleitear o seu direito, nos termos do art. 373, I do CPC. Por outro lado, verifico que a parte reclamada não apresentou qualquer fato modificativo, extintivo ou desconstitutivo do direito da autora, ônus que lhe cabia a teor do art. 373, II do CPC,inclusive, pediu o julgamento antecipado da lide. Nesta trilha, o demandado que presta serviço de transporte possui obrigação de resultado, e, portanto, o compromisso de transportar de forma segura e com qualidade, os passageiros e seus pertences no horário estabelecido, nos termos do art. 734 do Código Civil. Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor dispõe que o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido (artigo 14, § 1º, da Lei 8.078/90). Assim, caracterizado está o defeito do serviço cuidando-se, portanto, de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, previsto no artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor, respondendo o fornecedor, independentemente de culpa, sendo suficiente a prova da existência do fato decorrente de uma conduta injusta, o que restou comprovado no feito. Desta maneira, configura falha na prestação de serviço quando a bagagem despachada de um dos passageiros é perdida e não entregue no momento do respectivo desembarque. Nesse sentido: [...] Diante desse contexto, evidente a falha na prestação de serviço da parte ré e, por conseguinte, na responsabilidade da mesma em ressarcir e indenizar os danos causados à demandante. No caso concreto, a situação narrada ultrapassa o mero descumprimento contratual ou dissabor das relações da vida cotidiana, revelando dano moral à honra subjetiva da postulante. Quanto ao valor da reparação, o arbitramento sopesa as circunstâncias do caso concreto, leva em consideração as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. In casu, verifico que houve a devolução da bagagem, ainda que tardiamente, bem como, inexiste prova de aquisições de novos itens, motivo qual fixo a indenização em R$ 4.000,00. Em relação ao dano material, em que se pese a prova de pagamento de valores realizados nos dias 17,18 e 21/02/2022, não há comprovação destes serem realizados pela demandante, tampouco relacionado com o fato. Deste modo, não há provas documental específica que fundamente o valor almejado, ante a ausência de recibos ou comprovantes, motivo qual, não há que se falar em condenação da empresa ré ao ressarcimento por danos materiais. -Do dispositivo. Diante de todo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS DA INICIAL e extingo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: - Condenar o polo passivo pagar ao ativo, a título de danos morais, a quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de correção monetária pelo INPC a partir da prolação da sentença e juros de mora de 1% ao mês da citação. Ante a sucumbência recíproca, arbitro os honorários advocatícios e as despesas processuais em 20% (vinte por cento) do valor da causa, vedada a compensação. Reciprocamente sucumbentes, à custa e despesas processuais deverão ser divididas em partes iguais pelas partes, metade para cada. Todavia, tendo em vista que foi deferida a gratuidade da justiça ao polo ativo, sua cobrança ficará sob condição suspensiva nos termos do art. 98, § 3º do CPC. [...]” Contra a sentença se insurge a apelante, sustentando, em síntese, que não há prova do extravio, ante a ausência de registro de reclamação pelo SAC, não preenchimento de formulário de extravio, apresentação pela autora de cartão de empresa diversa (Viação Ouro e Prata) e conversas por WhatsApp com pessoa denominada "Mulher da Rodoviária" que menciona garagem da "Eucatur", empresa sem relação com a apelante. Argumenta, ainda, que a falta de poucas roupas por pequeno período não justifica indenização, constituindo mero descumprimento contratual. Subsidiariamente, requer a diminuição da quantia fixada. Por fim, postula aplicação da Lei nº 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil. A apelada refuta os argumentos recursais, defendendo que a documentação comprova a contratação do serviço e o extravio da bagagem. Alega, também, que o dano moral restou configurado pela falha na prestação do serviço, e o valor da indenização mostra-se adequado às circunstâncias do caso. Pois bem. Ab initio, imperioso ressaltar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme inteligência dos arts. 2º e 3º do referido diploma legal. No caso em tela, a primeira questão controvertida se refere à comprovação do extravio da bagagem, uma vez que a apelante sustenta inexistir prova suficiente do alegado extravio, apontando inconsistências nos documentos apresentados. Entretanto, a análise dos autos revela que a autora juntou comprovante da passagem rodoviária emitida pela própria empresa ré (ID 289489932), com informações precisas sobre data, horário, poltrona e identificação da passageira. Ademais, há nos autos conversas via aplicativo de mensagens demonstrando os contatos realizados para localização da bagagem (ID 289489934), as quais corroboram as alegações vertidas na inicial. Por sua vez, a argumentação da apelante sobre a menção a outras empresas (Eucatur, Viação Ouro e Prata) nas conversas não afasta a responsabilidade, considerando que tais referências podem decorrer de parcerias operacionais ou confusões no atendimento, questões internas da prestadora de serviços que não podem prejudicar o consumidor. Sabe-se que, em se tratando de relação de consumo, é aplicável o regime de responsabilidade objetiva previsto no art. 14 do CDC, independentemente de culpa, de modo que o transportador responde pelos danos decorrentes da prestação defeituosa do serviço, salvo comprovação de excludente de responsabilidade. Considerando que a empresa ré não se desincumbiu do ônus de infirmar os fatos aduzidos na inicial, os quais demonstram satisfatoriamente indícios da probabilidade do direito da autora, tenho que caracterizado o dever de indenizar. No transporte rodoviário, o extravio de bagagem constitui falha na prestação do serviço, frustrando a legítima expectativa do consumidor quanto à segurança e integridade de seus pertences. Neste sentido é o entendimento adotado por este eg. Tribunal de Justiça: “APELAÇÃO CÍVEL – TRANSPORTE RODOVIÁRIO – EXTRAVIO DE BAGAGEM – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA TRANSPORTADORA – DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL CONFIGURADO – VALOR PROPORCIONAL – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Nos termos do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade da empresa de transporte pelo extravio de bagagem é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC e art. 734 do Código Civil, salvo comprovação de excludente de responsabilidade, o que não ocorreu no caso concreto. O extravio definitivo de bagagem configura falha na prestação do serviço e enseja a reparação dos danos materiais e morais, sendo o dano moral presumido (in re ipsa), prescindindo de prova específica. O quantum indenizatório arbitrado para os danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), revela-se razoável e proporcional à lesão experimentada, em conformidade com a jurisprudência dominante. Sentença mantida. Recurso de apelação não provido.” (TJMT - N.U 1000365-19.2022.8.11.0023, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/03/2025, publicado no DJE 13/03/2025). No que tange ao dano moral, conquanto a empresa apelante sustente que o extravio temporário de bagagem constitui simples aborrecimento, insuficiente para configurar dano moral indenizável, tal alegação não prospera. Com efeito, o extravio de bagagem, ainda que temporário, ultrapassa o mero dissabor cotidiano, causando angústia, preocupação e transtornos ao passageiro, que se vê privado de seus pertences pessoais em cidade diversa da sua residência. O dano moral, in casu, prescinde de prova específica, configurando-se in re ipsa, conforme pacífico entendimento jurisprudencial: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – TRANSPORTE TERRESTRE – EXTRAVIO DEFINITIVO DE BAGAGEM – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA – DANOS MATERIAIS – RESOLUÇÃO ANTT – DANO MORAL CARACTERIZADO “IN RE IPSA” – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A responsabilidade civil traduz o dever de reparar o prejuízo em consequência de ofensa causada a um direito alheio - Comprovado o extravio de bagagem e impossibilitada a quantificação exata, a transportadora deve responder pela indenização de danos materiais de 10.000 (dez mil) vezes o coeficiente tarifário, nos termos da Resolução 1 .432 da ANTT. 2. O extravio de bagagem ultrapassa o mero aborrecimento da vida diária, sendo cabível a indenização por dano moral.” (TJMT, ApCiv 1006379-48.2023.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, JOAO FERREIRA FILHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/06/2024, Publicado no DJE 28/06/2024) (grifos nossos) “[...] O extravio definitivo de bagagem, de forma temporária e/ou definitiva, configura falha na prestação do serviço e, portanto, frustra a expectativa do consumidor depositada no serviço prestado, o que é suficiente para causar danos materiais e morais. O dano moral, pelo extravio de bagagens do passageiro, durante o transporte, independe da prova de prejuízo, porque, nestas hipóteses, o dano é presumido, bastando a comprovação da ocorrência do fato que o gerou. [...]” (TJMT, 1004224-91.2022.8.11.0007, CÂMARASCÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 188/10/2023, Publicado no DJE 18/10/2023, Publicado no DJE 18/10/2023) Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, a indenização por danos morais imposta no ato sentencial, no valor R$ 4.000,00 (quatro mil reais), mostra-se compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como, observados os princípios da moderação e razoabilidade. Aliás, quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Destaca-se: “O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida.”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2024, p. 02/07/2024) Assim, mantenho a condenação por danos morais no valor fixado na sentença. Por fim, quanto ao índice de correção monetária e juros, observo que a apelante sustenta a aplicação da taxa SELIC, invocando a necessidade de adequação à Lei nº 14.09/2024. Neste ponto, razão assiste a Recorrente, visto que a publicação da Lei nº 14.905/2024 promoveu alterações significativas em dispositivos do Código Civil, notadamente nos que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis (arts. 389 e 406). Referida norma estabeleceu que, nas hipóteses em que não houver pactuação ou previsão legal específica, deverão ser aplicados o IPCA como índice de atualização monetária e a Taxa Selic, deduzindo-se a correção monetária aplicável, como base para o cálculo dos juros moratórios. As referidas alterações passaram a produzir efeitos 60 dias após a publicação da lei (art. 5º, II), ocorrida em 1º/07/2024. Assim, com a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, entendo que o percentual dos juros de mora deve ser fixado em 1% (um por cento) ao mês, com fundamento no art. 406 do Código Civil combinado com o art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (conforme o Enunciado nº 20 da 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal), até a data em que a nova legislação começou a produzir efeitos. A partir de então, o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar as alterações introduzidas no Código Civil, aplicando-se a Taxa Selic como indexação para juros e correção monetária, na forma do art. 406, § 1º, do CC/02. Com essas considerações, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto pela empresa apelante, tão somente no ponto que discute os índices aplicáveis à correção monetária e juros moratórios, estabelecendo que os valores a serem restituídos sejam corrigidos pelo INPC e acrescido de juros de mora de 1% ao mês até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, devendo o cálculo da correção monetária e dos juros de mora, a partir de então, observar as modificações implementadas ao Código Civil, passando a incidir a Taxa Selic como indexação para juros e correção monetária, na forma do art. 406, § 1º, do CC/02 (incluídos pela Lei n. 14.905/2024), mantendo os demais termos do acórdão inalterados por seus próprios fundamentos. Não há falar em honorários recursais a favor da apelada, uma vez que condicionados ao desprovimento ou não conhecimento do recurso da parte apelante, sendo, portanto, incabíveis quando for provida a apelação, ainda que parcialmente, como na espécie (Tema 1059/STJ). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Processo nº 1007327-24.2022.8.11.0002

ID: 306366644

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007327-24.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ELIZENIR BATISTA DANTAS

Acórdão

Advogados:

GLORIA ALCANTARA DOS SANTOS

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VITOR HUGO ALONSO CASAROLLI

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007327-24.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Extravio de bagagem,… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007327-24.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Extravio de bagagem, Transporte Rodoviário] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [EXPRESSO ITAMARATI S.A. - CNPJ: 59.965.038/0001-41 (APELANTE), ADRIANO HENRIQUE LUIZON - CPF: 121.580.598-50 (ADVOGADO), ELIZENIR BATISTA DANTAS - CPF: 726.773.504-59 (APELADO), GLORIA ALCANTARA DOS SANTOS - CPF: 087.540.469-39 (ADVOGADO), VITOR HUGO ALONSO CASAROLLI - CPF: 093.267.809-29 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE RODOVIÁRIO. EXTRAVIO TEMPORÁRIO DE BAGAGEM. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. ARBITRAMENTO MANTIDO. ALTERAÇÃO DA FORMA DE CÁLCULO DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.905/2024. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por Expresso Itamarati S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação de indenização por danos morais decorrente de extravio temporário de bagagem em transporte rodoviário intermunicipal contratado por Elizenir Batista Dantas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) verificar se houve comprovação do extravio da bagagem que justifique a responsabilização da empresa de transporte; (ii) analisar a adequação do valor fixado a título de indenização por dano moral; e (iii) definir se incide a nova sistemática de correção monetária e juros moratórios trazida pela Lei nº 14.905/2024. III. RAZÕES DE DECIDIR A comprovação do vínculo contratual e da devolução tardia da bagagem é suficiente para configurar falha na prestação do serviço, nos termos do art. 14 do CDC e do art. 734 do CC, atraindo a responsabilidade objetiva da transportadora. O extravio temporário de bagagem ultrapassa o mero aborrecimento e configura dano moral presumido (in re ipsa), não havendo necessidade de demonstração de prejuízo concreto. O valor da indenização fixado em R$ 4.000,00 observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo à função compensatória e pedagógica da reparação. Com a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, a partir da data legalmente estipulada, os juros moratórios e a correção monetária devem ser apurados com base na Taxa Selic, conforme o novo art. 406, § 1º, do CC/02, permanecendo aplicáveis, até então, os critérios anteriores (juros de 1% ao mês e correção pelo INPC). IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: O extravio temporário de bagagem caracteriza falha na prestação do serviço e enseja reparação por danos morais, independentemente de prova de culpa ou prejuízo concreto. A responsabilidade do transportador de passageiros é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC e do art. 734 do CC. A fixação do dano moral deve observar a razoabilidade, proporcionalidade e o caráter pedagógico da indenização. A Lei nº 14.905/2024 aplica-se às condenações cíveis quanto ao critério de juros e correção monetária, incidindo a Taxa Selic a partir da data de sua entrada em vigor. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de apelação cível interposta por EXPRESSO ITAMARATI S.A. em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Rondonópolis/MT, nos autos da ação de indenização por danos morais ajuizada por ELIZENIR BATISTA DANTAS, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Contra a sentença se insurge a apelante, sustentando, em síntese, que não há prova do extravio, ante a ausência de registro de reclamação pelo SAC, não preenchimento de formulário de extravio, apresentação pela autora de cartão de empresa diversa (Viação Ouro e Prata) e conversas por WhatsApp com pessoa denominada "Mulher da Rodoviária" que menciona garagem da "Eucatur", empresa sem relação com a apelante. Argumenta, ainda, que a falta de poucas roupas por pequeno período não justifica indenização, constituindo mero descumprimento contratual. Subsidiariamente, requer a diminuição da quantia fixada. Por fim, postula aplicação da Lei nº 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil. Contrarrazões em ID 289491367. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de apelação cível interposta por Expresso Itamarati S.A. contra sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos morais, que julgou parcialmente procedente a demanda ajuizada por Elizenir Batista Dantas. Na exordial, a autora (apelada) aduz que contratou serviços de transporte rodoviário da empresa ré para viagem de Várzea Grande/MT a Sinop/MT, realizada em 16/02/2022. Alega que, ao chegar ao destino em 17/02/2022, sua bagagem despachada não foi localizada, tendo sido informada que a mala havia sido equivocadamente direcionada para Sorriso/MT. Afirma que após diversas tentativas e contatos, conseguiu reaver a bagagem apenas em 21/02/2022, ao final da viagem. Diante disso, pleiteou indenização por danos morais e materiais, alegando falha na prestação do serviço de transporte. O magistrado de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos: “[...] Do mérito. Inicialmente, consigno que a relação jurídica estabelecida entre as partes é típica relação de consumo e, portanto, deve ser respeitado o que dispõem as normas e princípios do Código de Defesa do Consumidor. Esse é o entendimento do TJMT: [...] Nesta linha, registro que em se tratando de típico contrato de prestação de serviço, o transportador responde de forma objetiva pelos danos decorrentes da prestação defeituosa do serviço, nos termos do artigo14,caput, do CDC, persistindo enquanto não demonstrada culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, força maior e caso fortuito não vinculado à organização da atividade comercial. Pois bem. No caso em análise, constato que ficou comprovado que a autora efetivamente embarcou em ônibus da requerida, conforme passagem anexada aos autos (Id. 78256625), e que enfrentou dificuldade para reaver sua bagagem, sendo necessário retornar diversas vezes à rodoviária e realizar contato com funcionária da empresa, via aplicativo de mensagens, a fim de localizar a mala (Id. 78256627). É sabido que para que seja reconhecido o dever de indenizar, basta a comprovação de causa e efeito entre a ação ou omissão do fornecedor de serviços e o dano sofrido pela vítima (nexo causal), sendo desnecessário a culpa do agente. Em que se pese o desconhecimento mencionado pelo demandado, inclusive quanto ao suposto cartão de embarque estar em nome de terceiro, certo que é que a parte autora juntou comprovante da passagem emitida pela própria parte ré, inclusive com informações quanto a data da viagem, horário, poltrona e a passageira, ora, demandante, o que corrobora as alegações autorais. Deste modo, o polo ativo se desincumbiu do ônus que lhe cabia ao pleitear o seu direito, nos termos do art. 373, I do CPC. Por outro lado, verifico que a parte reclamada não apresentou qualquer fato modificativo, extintivo ou desconstitutivo do direito da autora, ônus que lhe cabia a teor do art. 373, II do CPC,inclusive, pediu o julgamento antecipado da lide. Nesta trilha, o demandado que presta serviço de transporte possui obrigação de resultado, e, portanto, o compromisso de transportar de forma segura e com qualidade, os passageiros e seus pertences no horário estabelecido, nos termos do art. 734 do Código Civil. Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor dispõe que o serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido (artigo 14, § 1º, da Lei 8.078/90). Assim, caracterizado está o defeito do serviço cuidando-se, portanto, de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, previsto no artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor, respondendo o fornecedor, independentemente de culpa, sendo suficiente a prova da existência do fato decorrente de uma conduta injusta, o que restou comprovado no feito. Desta maneira, configura falha na prestação de serviço quando a bagagem despachada de um dos passageiros é perdida e não entregue no momento do respectivo desembarque. Nesse sentido: [...] Diante desse contexto, evidente a falha na prestação de serviço da parte ré e, por conseguinte, na responsabilidade da mesma em ressarcir e indenizar os danos causados à demandante. No caso concreto, a situação narrada ultrapassa o mero descumprimento contratual ou dissabor das relações da vida cotidiana, revelando dano moral à honra subjetiva da postulante. Quanto ao valor da reparação, o arbitramento sopesa as circunstâncias do caso concreto, leva em consideração as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. In casu, verifico que houve a devolução da bagagem, ainda que tardiamente, bem como, inexiste prova de aquisições de novos itens, motivo qual fixo a indenização em R$ 4.000,00. Em relação ao dano material, em que se pese a prova de pagamento de valores realizados nos dias 17,18 e 21/02/2022, não há comprovação destes serem realizados pela demandante, tampouco relacionado com o fato. Deste modo, não há provas documental específica que fundamente o valor almejado, ante a ausência de recibos ou comprovantes, motivo qual, não há que se falar em condenação da empresa ré ao ressarcimento por danos materiais. -Do dispositivo. Diante de todo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS DA INICIAL e extingo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: - Condenar o polo passivo pagar ao ativo, a título de danos morais, a quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de correção monetária pelo INPC a partir da prolação da sentença e juros de mora de 1% ao mês da citação. Ante a sucumbência recíproca, arbitro os honorários advocatícios e as despesas processuais em 20% (vinte por cento) do valor da causa, vedada a compensação. Reciprocamente sucumbentes, à custa e despesas processuais deverão ser divididas em partes iguais pelas partes, metade para cada. Todavia, tendo em vista que foi deferida a gratuidade da justiça ao polo ativo, sua cobrança ficará sob condição suspensiva nos termos do art. 98, § 3º do CPC. [...]” Contra a sentença se insurge a apelante, sustentando, em síntese, que não há prova do extravio, ante a ausência de registro de reclamação pelo SAC, não preenchimento de formulário de extravio, apresentação pela autora de cartão de empresa diversa (Viação Ouro e Prata) e conversas por WhatsApp com pessoa denominada "Mulher da Rodoviária" que menciona garagem da "Eucatur", empresa sem relação com a apelante. Argumenta, ainda, que a falta de poucas roupas por pequeno período não justifica indenização, constituindo mero descumprimento contratual. Subsidiariamente, requer a diminuição da quantia fixada. Por fim, postula aplicação da Lei nº 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil. A apelada refuta os argumentos recursais, defendendo que a documentação comprova a contratação do serviço e o extravio da bagagem. Alega, também, que o dano moral restou configurado pela falha na prestação do serviço, e o valor da indenização mostra-se adequado às circunstâncias do caso. Pois bem. Ab initio, imperioso ressaltar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme inteligência dos arts. 2º e 3º do referido diploma legal. No caso em tela, a primeira questão controvertida se refere à comprovação do extravio da bagagem, uma vez que a apelante sustenta inexistir prova suficiente do alegado extravio, apontando inconsistências nos documentos apresentados. Entretanto, a análise dos autos revela que a autora juntou comprovante da passagem rodoviária emitida pela própria empresa ré (ID 289489932), com informações precisas sobre data, horário, poltrona e identificação da passageira. Ademais, há nos autos conversas via aplicativo de mensagens demonstrando os contatos realizados para localização da bagagem (ID 289489934), as quais corroboram as alegações vertidas na inicial. Por sua vez, a argumentação da apelante sobre a menção a outras empresas (Eucatur, Viação Ouro e Prata) nas conversas não afasta a responsabilidade, considerando que tais referências podem decorrer de parcerias operacionais ou confusões no atendimento, questões internas da prestadora de serviços que não podem prejudicar o consumidor. Sabe-se que, em se tratando de relação de consumo, é aplicável o regime de responsabilidade objetiva previsto no art. 14 do CDC, independentemente de culpa, de modo que o transportador responde pelos danos decorrentes da prestação defeituosa do serviço, salvo comprovação de excludente de responsabilidade. Considerando que a empresa ré não se desincumbiu do ônus de infirmar os fatos aduzidos na inicial, os quais demonstram satisfatoriamente indícios da probabilidade do direito da autora, tenho que caracterizado o dever de indenizar. No transporte rodoviário, o extravio de bagagem constitui falha na prestação do serviço, frustrando a legítima expectativa do consumidor quanto à segurança e integridade de seus pertences. Neste sentido é o entendimento adotado por este eg. Tribunal de Justiça: “APELAÇÃO CÍVEL – TRANSPORTE RODOVIÁRIO – EXTRAVIO DE BAGAGEM – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA TRANSPORTADORA – DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL CONFIGURADO – VALOR PROPORCIONAL – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Nos termos do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade da empresa de transporte pelo extravio de bagagem é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC e art. 734 do Código Civil, salvo comprovação de excludente de responsabilidade, o que não ocorreu no caso concreto. O extravio definitivo de bagagem configura falha na prestação do serviço e enseja a reparação dos danos materiais e morais, sendo o dano moral presumido (in re ipsa), prescindindo de prova específica. O quantum indenizatório arbitrado para os danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), revela-se razoável e proporcional à lesão experimentada, em conformidade com a jurisprudência dominante. Sentença mantida. Recurso de apelação não provido.” (TJMT - N.U 1000365-19.2022.8.11.0023, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/03/2025, publicado no DJE 13/03/2025). No que tange ao dano moral, conquanto a empresa apelante sustente que o extravio temporário de bagagem constitui simples aborrecimento, insuficiente para configurar dano moral indenizável, tal alegação não prospera. Com efeito, o extravio de bagagem, ainda que temporário, ultrapassa o mero dissabor cotidiano, causando angústia, preocupação e transtornos ao passageiro, que se vê privado de seus pertences pessoais em cidade diversa da sua residência. O dano moral, in casu, prescinde de prova específica, configurando-se in re ipsa, conforme pacífico entendimento jurisprudencial: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – TRANSPORTE TERRESTRE – EXTRAVIO DEFINITIVO DE BAGAGEM – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA – DANOS MATERIAIS – RESOLUÇÃO ANTT – DANO MORAL CARACTERIZADO “IN RE IPSA” – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A responsabilidade civil traduz o dever de reparar o prejuízo em consequência de ofensa causada a um direito alheio - Comprovado o extravio de bagagem e impossibilitada a quantificação exata, a transportadora deve responder pela indenização de danos materiais de 10.000 (dez mil) vezes o coeficiente tarifário, nos termos da Resolução 1 .432 da ANTT. 2. O extravio de bagagem ultrapassa o mero aborrecimento da vida diária, sendo cabível a indenização por dano moral.” (TJMT, ApCiv 1006379-48.2023.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, JOAO FERREIRA FILHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/06/2024, Publicado no DJE 28/06/2024) (grifos nossos) “[...] O extravio definitivo de bagagem, de forma temporária e/ou definitiva, configura falha na prestação do serviço e, portanto, frustra a expectativa do consumidor depositada no serviço prestado, o que é suficiente para causar danos materiais e morais. O dano moral, pelo extravio de bagagens do passageiro, durante o transporte, independe da prova de prejuízo, porque, nestas hipóteses, o dano é presumido, bastando a comprovação da ocorrência do fato que o gerou. [...]” (TJMT, 1004224-91.2022.8.11.0007, CÂMARASCÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 188/10/2023, Publicado no DJE 18/10/2023, Publicado no DJE 18/10/2023) Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação. Deve-se observar os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito à vítima. Ao mesmo tempo, o valor deve ser significativo para que não passe despercebido, coibindo a conduta negligente do agente causador. O quantum não deve representar mero simbolismo, sob pena de esvaziar o caráter compensatório da sanção, mas não pode, também, impingir montante extremamente gravoso ao ofensor. Na presente situação, a indenização por danos morais imposta no ato sentencial, no valor R$ 4.000,00 (quatro mil reais), mostra-se compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como, observados os princípios da moderação e razoabilidade. Aliás, quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Destaca-se: “O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida.”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2024, p. 02/07/2024) Assim, mantenho a condenação por danos morais no valor fixado na sentença. Por fim, quanto ao índice de correção monetária e juros, observo que a apelante sustenta a aplicação da taxa SELIC, invocando a necessidade de adequação à Lei nº 14.09/2024. Neste ponto, razão assiste a Recorrente, visto que a publicação da Lei nº 14.905/2024 promoveu alterações significativas em dispositivos do Código Civil, notadamente nos que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis (arts. 389 e 406). Referida norma estabeleceu que, nas hipóteses em que não houver pactuação ou previsão legal específica, deverão ser aplicados o IPCA como índice de atualização monetária e a Taxa Selic, deduzindo-se a correção monetária aplicável, como base para o cálculo dos juros moratórios. As referidas alterações passaram a produzir efeitos 60 dias após a publicação da lei (art. 5º, II), ocorrida em 1º/07/2024. Assim, com a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, entendo que o percentual dos juros de mora deve ser fixado em 1% (um por cento) ao mês, com fundamento no art. 406 do Código Civil combinado com o art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (conforme o Enunciado nº 20 da 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal), até a data em que a nova legislação começou a produzir efeitos. A partir de então, o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar as alterações introduzidas no Código Civil, aplicando-se a Taxa Selic como indexação para juros e correção monetária, na forma do art. 406, § 1º, do CC/02. Com essas considerações, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto pela empresa apelante, tão somente no ponto que discute os índices aplicáveis à correção monetária e juros moratórios, estabelecendo que os valores a serem restituídos sejam corrigidos pelo INPC e acrescido de juros de mora de 1% ao mês até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, devendo o cálculo da correção monetária e dos juros de mora, a partir de então, observar as modificações implementadas ao Código Civil, passando a incidir a Taxa Selic como indexação para juros e correção monetária, na forma do art. 406, § 1º, do CC/02 (incluídos pela Lei n. 14.905/2024), mantendo os demais termos do acórdão inalterados por seus próprios fundamentos. Não há falar em honorários recursais a favor da apelada, uma vez que condicionados ao desprovimento ou não conhecimento do recurso da parte apelante, sendo, portanto, incabíveis quando for provida a apelação, ainda que parcialmente, como na espécie (Tema 1059/STJ). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Processo nº 0001062-48.2007.8.11.0099

ID: 336496022

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001062-48.2007.8.11.0099

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

COMERCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FABIO SILVA DE OLIVEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0001062-48.2007.8.11.0099 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). A… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0001062-48.2007.8.11.0099 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [COMERCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA - CNPJ: 01.909.329/0003-02 (APELANTE), FABIO SILVA DE OLIVEIRA - CPF: 025.906.581-17 (ADVOGADO), L. ANTONIO DA ROCHA & CIA LTDA - CNPJ: 05.317.572/0001-12 (APELADO), FLORENTINO APARECIDO MARTINS - CPF: 633.673.279-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULO APÓS QUITAÇÃO DA DÍVIDA – DANO MORAL CARACTERIZADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO – NEGLIGÊNCIA DO CREDOR – SENTENÇA ESCORREITA - RECURSO DESPROVIDO. O protesto de título após a quitação da dívida configura ato ilícito, uma vez que o protesto se destina a comprovar a impontualidade do devedor, condição que já não existia no momento da efetivação do ato notarial. A inclusão indevida em cadastros de inadimplentes e protesto, mesmo que por equívoco, configura dano moral presumido (in re ipsa), prescindindo de prova de prejuízo concreto. A alegação de que o pagamento ocorreu de forma atípica (depósito bancário direto, sem comunicação ou identificação do título) não exime o credor de seu dever de diligência em relação à gestão de seus recebíveis, sendo sua responsabilidade averiguar a quitação dos títulos, independentemente da forma de pagamento. A inobservância desse dever caracteriza negligência, elemento configurador da responsabilidade civil. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001062-48.2007.8.11.0099 APELANTE: COMÉRCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA. APELADO: L. ANTÔNIO DA ROCHA & CIA LTDA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por COMÉRCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA. contra sentença proferida pela MMª. Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Cotriguaçu/MT, Dra. Gezicler Luiza Sossanovicz Artilheiro, lançada nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais nº 0001062-48.2007.8.11.0099, ajuizada por L. ANTÔNIO DA ROCHA & CIA LTDA, que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o apelante “[...] ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento.” (sic) Ainda, condenou a parte apelante em honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da condenação. O apelante, em suas razões recursais, aduz que “A revés do que se concluiu o Juízo de piso, o protesto realizado pela Apelante deu-se em estrita observância à legislação vigente, especialmente ao disposto no art. 1º da Lei nº 9.492/1997. O título foi protestado após 07 (sete) dias de seu vencimento e a ausência de informação quanto à realização do pagamento, constituindo meio legítimo de prova da inadimplência. A mora da Apelada está evidenciada pelo pagamento realizado fora do prazo (em 20/09/2006), e, ainda assim, de forma atípica — mediante depósito bancário direto, sem qualquer comunicação ou identificação do título quitado. Tal circunstância impediu que a Apelante tomasse conhecimento de imediato e consequentemente impedir o protesto, razão pela qual afasta qualquer alegação de conduta culposa por parte da Apelante” (sic). Afirma que “Ademais, tratando-se de protesto lavrado em 2006, em cartório localizado no interior do Estado, deve-se considerar a ausência de sistemas automatizados e as limitações tecnológicas da época, o que explica o intervalo de 40 dias entre o vencimento e a lavratura do protesto. Nos termos do art. 188, inciso I, do Código Civil, não constituem atos ilícitos os praticados no exercício regular de direito. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é firme nesse sentido” (sic). Salienta que “Não há que se falar, igualmente, em exigência de conduta adversa, uma vez que a parte Apelada, ao promover a quitação em forma diversa da pactuada (depósito direto em conta ao invés de promover o pagamento do boleto) atraiu para si a responsabilidade de informar a Apelante acerca do ato realizado e assim evitar maiores prejuízos e o protesto do título” (sic). Defende que “A sentença recorrida desconsiderou, de forma equivocada, a repartição da carga dinâmica da prova (art. 373, I e II, do CPC) e o dever de cooperação (art. 6º do CPC), ao imputar à Apelante a responsabilidade por suposto protesto mantido indevidamente, mesmo diante da absoluta inércia da Apelada em adotar qualquer medida para cancelamento do apontamento. O pagamento efetuado diretamente na conta bancária da Apelante, sem a identificação do título, sem comunicação formal da quitação e sem o envio de comprovantes, impossibilitou o reconhecimento imediato do adimplemento. Nos termos do art. 19 da Lei nº 9.492/1997, o devedor deve apresentar a carta de anuência do credor ao tabelionato competente para promover o cancelamento do protesto. Trata-se de providência que depende exclusivamente da parte devedora” (sic). Sustenta que “Ressalta-se que o protesto não foi mantido de forma abusiva, mas sim por ausência de qualquer diligência da Apelada, o qual, mesmo após ser notificado extrajudicialmente pelo cartório, não tomou qualquer medida de regularização por quase um ano” (sic). Afiança que “não havendo prova de que o Apelado tenha sequer solicitado carta de anuência ou notificado o credor quanto à quitação, inexiste conduta omissiva ou comissiva da Apelante a ensejar responsabilidade civil. Ao contrário, a ausência de diligência da Apelada configura culpa exclusiva, que rompe o nexo de causalidade nos termos do art. 393 do Código Civil, afastando o dever de indenizar” (sic). Diz que “A condenação por dano moral mostra-se absolutamente desprovida de respaldo legal, fático e jurisprudencial. O ordenamento jurídico brasileiro exige, como pressuposto da responsabilidade civil, a presença de ato ilícito (art. 186 do CC), dano e nexo de causalidade. Nenhum desses elementos encontra respaldo nos autos. Em primeiro lugar, o protesto realizado foi ato legítimo, praticado no exercício regular de direito assegurado pelo art. 1º da Lei nº 9.492/1997 e amparado pelo art. 188, I, do Código Civil. Não havendo ilicitude na conduta da Apelante, inexiste pressuposto para o dever de indenizar. Ademais, o simples apontamento de título a protesto não enseja, por si só, dano moral – para tanto, deve-se analisar as peculiaridades do caso concreto” (sic). Pondera que “Não bastasse isso, o comportamento da Apelada compromete sua própria narrativa pois permaneceu inerte por cerca de 11 meses, sem buscar o cancelamento do protesto ou qualquer resolução administrativa da pendência, circunstância que revela ausência de abalo relevante ou urgência reparatória. O comportamento processual contraditório da Apelada, além de afastar o nexo de causalidade, evidencia tentativa de obtenção de vantagem indevida – o que veda o ordenamento jurídico à luz do art. 422 do Código Civil e do princípio da boa-fé objetiva. Assim, ausente prova do abalo à imagem empresarial, do prejuízo reputacional ou de conduta abusiva da Apelante, é imperativa a exclusão da condenação por dano moral, sob pena de se admitir a responsabilidade objetiva sem respaldo legal” (sic). A par destes argumentos, pede o provimento do apelo, para “[...] que seja julgada totalmente improcedente a ação proposta por L. ANTONIO DA ROCHA & CIA LTDA – ME; bem como seja afastada a condenação ao pagamento de indenização por danos morais” (sic). Sem contrarrazões. Preparo recursal devidamente recolhido, conforme Id. 293008894. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Recolhido o preparo, e estando adequado e tempestivo, CONHEÇO o apelo interposto, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Cinge a controvérsia recursal acerca da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o apelante “[...] ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento.” (sic) Ainda, condenou a parte apelante em honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da condenação. Colaciono trecho da sentença exarada pelo juízo a quo: “Trata-se de ação ordinária de indenização por danos morais proposta por L. Antonio da Rocha & Cia Ltda – ME em face de Comércio Regional de Alimentos Ltda, partes qualificadas nos autos. A controvérsia cinge-se à existência ou não de responsabilidade civil da parte requerida pela inscrição do nome da autora em cadastro de inadimplentes, consubstanciada em protesto de título realizado após sua quitação. Dos documentos acostados aos autos, resta incontroverso que o título foi efetivamente pago pela autora em 20/09/2006, conforme fls. 38 do Id. 66682872, ao passo que o protesto foi realizado em 10/11/2006 (fls. 40 do mesmo Id), ou seja, quase dois meses após a quitação da dívida. Ainda que o pagamento tenha ocorrido com atraso, é certo que a autora quitou integralmente a obrigação dois meses antes da lavratura do protesto, não havendo justificativa legal para sua formalização posterior. A alegação da ré de que entregou carta de anuência à autora para que esta providenciasse o cancelamento do protesto não a exonera da responsabilidade, pois o vício essencial reside na própria lavratura indevida do protesto, após o adimplemento da obrigação. A jurisprudência pátria tem reconhecido, de forma pacífica, que a inclusão indevida do nome em cadastro de inadimplentes, ainda que por equívoco, configura ato ilícito indenizável, sendo o dano presumido (in re ipsa). Logo, comprovada a inscrição posterior à quitação da dívida, resta caracterizado o ilícito, o dano e o nexo causal, preenchendo-se os requisitos do art. 186 do Código Civil [...] [...] Ressalto que, em sede de contestação, a parte requerida não trouxe qualquer prova capaz de refutar o protesto indevido. Também, não produziu qualquer prova nesse sentido. Dessa forma, é evidente que a autora comprovou fato constitutivo de seu direito, demonstrando a irregularidade do protesto. [...] Quanto ao quantum indenizatório, deve-se considerar o caráter punitivo-pedagógico da reparação, bem como a extensão do dano e a capacidade econômica das partes. Considerando os parâmetros adotados pela jurisprudência em casos análogos, e observadas as peculiaridades do caso concreto, entendo razoável e proporcional a fixação da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Dessa forma, o pedido inicial é procedente. III. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PROCEDENTE os pedidos iniciais, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC e condeno a parte requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento. Os juros de mora serão calculados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 406 do Código Civil, na sua redação original, e após a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024 (28/08/2024), a correção monetária deverá observar a variação do índice IPCA e os de juros de mora corresponderão à taxa referencial da SELIC, deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 do Código Civil e seus parágrafos. [...] Condeno a parte requerida ao pagamento de custas e honorários fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação.” (Id. 292011392) Pois bem. A controvérsia central reside na aferição da licitude do protesto de título e da configuração do dano moral, em face de um pagamento que a parte Apelada alega ter sido efetuado antes da lavratura do ato notarial. Nesse diapasão, o ponto nodal do qual emerge a sentença de primeiro grau, e que encontra pleno amparo nas contrarrazões apresentadas pela Apelada, é a inegável ilicitude do protesto lavrado após a quitação da dívida. Conforme evidenciado nos autos, o título foi integralmente pago em 20 de setembro de 2006, ao passo que o protesto foi efetivado somente em 10 de novembro de 2006, ou seja, quase dois meses após o adimplemento da obrigação. Este fato, por si só, fulmina qualquer pretensão de regularidade do ato cambial, haja vista que o protesto se destina a comprovar a impontualidade do devedor, condição que, no caso em tela, já não mais subsistia. Vejamos: Desse modo, a conduta do Apelante amolda-se perfeitamente ao conceito de ato ilícito, conforme preceitua o artigo 186 do Código Civil, que expressamente dispõe: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” O reconhecimento do dano moral, neste contexto, opera-se in re ipsa, ou seja, presume-se da própria ocorrência do fato danoso – a indevida inscrição em cadastros de inadimplentes –, prescindindo de prova de prejuízo concreto, tal como pacificado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, verbis: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA . CADASTRO DE INADIMPLENTES. DANO MORAL IN RE IPSA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME . DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. 1 . Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, a inscrição/manutenção indevida do nome do devedor no cadastro de inadimplente enseja o dano moral in re ipsa, ou seja, dano vinculado à própria existência do fato ilícito, cujos resultados são presumidos. 2. Hipótese em que o Tribunal a quo acerca da existência da prova e do nexo causal dos danos sofridos pelo recorrido, decorreu de convicção formada em face dos elementos fáticos existentes nos autos. Assim, considerando a fundamentação do acórdão objeto do recurso especial, os argumentos utilizados pela parte recorrente somente poderiam ter sua procedência verificada mediante o necessário reexame de matéria fática-probatória, o que é vedado a esta Corte, em razão do óbice da Súmulas n . 7/STJ. 3. A revisão do quantum arbitrado para a indenização por danos morais encontra óbice na Súmula n. 7/STJ, somente sendo possível superar tal impedimento nos casos de valor irrisório ou exorbitante, o que não é o caso dos autos .Agravo interno improvido.” (STJ - AgInt no REsp: 2085054 TO 2023/0241523-0, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 23/10/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/10/2023) (Destaquei) Colaciono ainda precedentes deste Sodalício em casos análogos: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA – PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DO DANO MORAL E MATERIAL OU REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO – NÃO ACOLHIMENTO – FATURA ADIMPLIDA NA DATA DO VENCIMENTO – PROTESTO INDEVIDO - DANO MORAL CONFIGURADO – DANO MATERIAL COMPROVADO – RESTITUIÇÃO DEVIDA - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O protesto do nome do consumidor, por débito adimplido, configura ato ilícito passível de reparação, e o dano moral, daí decorrente, presume-se, dispensando a produção de prova. O valor da indenização por dano moral deve ser arbitrado em consonância com princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, promovendo de modo justo a compensação do ofendido e a punição do ofensor, merecendo ser mantido o quantum indenizatório fixado na sentença. Cabível a restituição do valor desembolsado pelo autor, quando comprovado o pagamento referente ao cancelamento do protesto”. (N.U 1010341-59.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/09/2024, Publicado no DJE 30/09/2024) (Destaquei) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE RESTRIÇÃO DE CRÉDITO. MAJORAÇÃO DO DANO MORAL. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que reconheceu a inexistência de débito e condenou a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 por dano moral, em razão de inscrição indevida em órgão de proteção ao crédito, mantendo-se o termo inicial dos juros de mora e o índice de correção monetária definidos, bem como os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. II. Questão em discussão Questões em discussão: (i) saber se o valor da indenização por dano moral é suficiente à reparação do prejuízo causado; (ii) o termo inicial dos juros de mora e da correção monetária (iii) saber se os honorários advocatícios devem ser majorados. III. Razões de decidir A inscrição indevida do nome em cadastro de inadimplentes configura dano moral in re ipsa e enseja compensação, cujo valor deve ser razoável para atender ao caráter pedagógico e reparatório da condenação. O quantum de R$ 3.000,00 mostra-se insuficiente, devendo ser majorado para R$ 6.000,00, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. O termo inicial dos juros de mora, em caso de responsabilidade contratual, é a data da citação (art. 405 do CC). Correta a incidência da correção monetária desde o arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ. Mantido o percentual dos honorários advocatícios, diante da adequação aos critérios do CPC. IV. Dispositivo e tese Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: " A inscrição indevida em cadastro de inadimplentes gera dano moral in re ipsa. O valor da indenização por dano moral deve observar critérios de proporcionalidade e razoabilidade, considerando-se as circunstâncias do caso. Nas hipóteses de responsabilidade contratual, os juros de mora incidem a partir da citação." Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 389, p.u., 405 e 406, § 1º; CPC, art. 85, § 2º. Jurisprudência relevante citada: TJMT, RAC nº 9614/2010, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 5ª Câmara Cível, j. 14.04.2010.” (N.U 1003224-97.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/07/2025, Publicado no DJE 21/07/2025) (Destaquei) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. DÉBITO QUITADO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO PELA CONCESSIONÁRIA. REVELIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR DA INDENIZAÇÃO MANTIDO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em Exame 1. Recurso de apelação interposto pela Energisa Mato Grosso - Distribuidora de Energia S.A. contra sentença que declarou a inexistência de débito e condenou a concessionária ao pagamento de R$ 6.000,00 (seis mil reais) por danos morais, em razão de negativação indevida, mesmo após a quitação da fatura. II. Questão em Discussão 2. Discute-se: (i) a legitimidade da negativação do nome do consumidor por débito já quitado; (ii) a responsabilidade objetiva da concessionária pela falha na prestação do serviço; e (iii) a adequação do quantum indenizatório fixado. III. Razões de Decidir 3. Comprovado o pagamento da fatura pela Autora, recai sobre a concessionária o dever de demonstrar eventual excludente de responsabilidade, o que não foi feito. 4. A revelia da Ré e a ausência de comprovação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado, em conjunto com as provas carreadas aos autos, possibilitam o reconhecimento da falha na prestação do serviço e a responsabilização objetiva nos termos do art. 14 do CDC. 5. O dano moral é caracterizado pela negativação indevida e ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, sendo devida a indenização no valor fixado. 6. Quantum indenizatório mantido, por observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como o caráter punitivo-pedagógico da medida. IV. Dispositivo e Tese 7. Recurso desprovido. Tese de Julgamento: "A negativação indevida decorrente de falha na prestação de serviço essencial, com débito devidamente quitado, caracteriza dano moral indenizável, sendo devida a condenação da concessionária responsável." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; CPC, art. 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJSP, ApCiv 1083396-80.2022.8.26.0002; TJGO, ApCiv 5719239-73.2023.8.09.0051; TJMG, ApCiv 5001991-32.2015.8.13.0625, TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, TJMT, ApCiv 1000870-15.2020.8.11.0044; TJMT, RI 10286014420228110002.” (N.U 1011483-81.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/01/2025, Publicado no DJE 30/01/2025) (Destaquei) Ainda, quanto a alegação de que houve atipicidade do pagamento – mediante depósito bancário direto, sem comunicação ou identificação do título quitado – o que teria impedido o conhecimento imediato do adimplemento e, consequentemente, a prevenção do protesto, esta, não exime o credor de seu dever de diligência em relação à gestão de seus recebíveis, de modo que, a responsabilidade por averiguar a quitação de seus títulos, independentemente da forma de pagamento, recai sobre o próprio Apelante. Consequentemente, a inobservância desse dever caracteriza negligência, elemento configurador da responsabilidade civil, nos termos do já citado artigo 186 do Código Civil. Diante de todo o exposto, verifica-se que o Apelante não logrou em demonstrar a licitude do protesto realizado após a quitação da dívida, tampouco em afastar a sua responsabilidade objetiva pela conduta ilícita, ou descaracterizar o dano moral presumido. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo hígida a sentença proferida pela Magistrada de primeiro grau. Em razão do trabalho adicional na fase recursal, majoro a verba honorária de 10 para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, com fulcro no art. 85, §11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025

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Processo nº 0001062-48.2007.8.11.0099

ID: 336496023

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001062-48.2007.8.11.0099

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

L. ANTONIO DA ROCHA & CIA LTDA

Acórdão

Advogados:

FLORENTINO APARECIDO MARTINS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0001062-48.2007.8.11.0099 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). A… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0001062-48.2007.8.11.0099 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [COMERCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA - CNPJ: 01.909.329/0003-02 (APELANTE), FABIO SILVA DE OLIVEIRA - CPF: 025.906.581-17 (ADVOGADO), L. ANTONIO DA ROCHA & CIA LTDA - CNPJ: 05.317.572/0001-12 (APELADO), FLORENTINO APARECIDO MARTINS - CPF: 633.673.279-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULO APÓS QUITAÇÃO DA DÍVIDA – DANO MORAL CARACTERIZADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO – NEGLIGÊNCIA DO CREDOR – SENTENÇA ESCORREITA - RECURSO DESPROVIDO. O protesto de título após a quitação da dívida configura ato ilícito, uma vez que o protesto se destina a comprovar a impontualidade do devedor, condição que já não existia no momento da efetivação do ato notarial. A inclusão indevida em cadastros de inadimplentes e protesto, mesmo que por equívoco, configura dano moral presumido (in re ipsa), prescindindo de prova de prejuízo concreto. A alegação de que o pagamento ocorreu de forma atípica (depósito bancário direto, sem comunicação ou identificação do título) não exime o credor de seu dever de diligência em relação à gestão de seus recebíveis, sendo sua responsabilidade averiguar a quitação dos títulos, independentemente da forma de pagamento. A inobservância desse dever caracteriza negligência, elemento configurador da responsabilidade civil. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001062-48.2007.8.11.0099 APELANTE: COMÉRCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA. APELADO: L. ANTÔNIO DA ROCHA & CIA LTDA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por COMÉRCIO REGIONAL DE ALIMENTOS LTDA. contra sentença proferida pela MMª. Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Cotriguaçu/MT, Dra. Gezicler Luiza Sossanovicz Artilheiro, lançada nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais nº 0001062-48.2007.8.11.0099, ajuizada por L. ANTÔNIO DA ROCHA & CIA LTDA, que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o apelante “[...] ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento.” (sic) Ainda, condenou a parte apelante em honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da condenação. O apelante, em suas razões recursais, aduz que “A revés do que se concluiu o Juízo de piso, o protesto realizado pela Apelante deu-se em estrita observância à legislação vigente, especialmente ao disposto no art. 1º da Lei nº 9.492/1997. O título foi protestado após 07 (sete) dias de seu vencimento e a ausência de informação quanto à realização do pagamento, constituindo meio legítimo de prova da inadimplência. A mora da Apelada está evidenciada pelo pagamento realizado fora do prazo (em 20/09/2006), e, ainda assim, de forma atípica — mediante depósito bancário direto, sem qualquer comunicação ou identificação do título quitado. Tal circunstância impediu que a Apelante tomasse conhecimento de imediato e consequentemente impedir o protesto, razão pela qual afasta qualquer alegação de conduta culposa por parte da Apelante” (sic). Afirma que “Ademais, tratando-se de protesto lavrado em 2006, em cartório localizado no interior do Estado, deve-se considerar a ausência de sistemas automatizados e as limitações tecnológicas da época, o que explica o intervalo de 40 dias entre o vencimento e a lavratura do protesto. Nos termos do art. 188, inciso I, do Código Civil, não constituem atos ilícitos os praticados no exercício regular de direito. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é firme nesse sentido” (sic). Salienta que “Não há que se falar, igualmente, em exigência de conduta adversa, uma vez que a parte Apelada, ao promover a quitação em forma diversa da pactuada (depósito direto em conta ao invés de promover o pagamento do boleto) atraiu para si a responsabilidade de informar a Apelante acerca do ato realizado e assim evitar maiores prejuízos e o protesto do título” (sic). Defende que “A sentença recorrida desconsiderou, de forma equivocada, a repartição da carga dinâmica da prova (art. 373, I e II, do CPC) e o dever de cooperação (art. 6º do CPC), ao imputar à Apelante a responsabilidade por suposto protesto mantido indevidamente, mesmo diante da absoluta inércia da Apelada em adotar qualquer medida para cancelamento do apontamento. O pagamento efetuado diretamente na conta bancária da Apelante, sem a identificação do título, sem comunicação formal da quitação e sem o envio de comprovantes, impossibilitou o reconhecimento imediato do adimplemento. Nos termos do art. 19 da Lei nº 9.492/1997, o devedor deve apresentar a carta de anuência do credor ao tabelionato competente para promover o cancelamento do protesto. Trata-se de providência que depende exclusivamente da parte devedora” (sic). Sustenta que “Ressalta-se que o protesto não foi mantido de forma abusiva, mas sim por ausência de qualquer diligência da Apelada, o qual, mesmo após ser notificado extrajudicialmente pelo cartório, não tomou qualquer medida de regularização por quase um ano” (sic). Afiança que “não havendo prova de que o Apelado tenha sequer solicitado carta de anuência ou notificado o credor quanto à quitação, inexiste conduta omissiva ou comissiva da Apelante a ensejar responsabilidade civil. Ao contrário, a ausência de diligência da Apelada configura culpa exclusiva, que rompe o nexo de causalidade nos termos do art. 393 do Código Civil, afastando o dever de indenizar” (sic). Diz que “A condenação por dano moral mostra-se absolutamente desprovida de respaldo legal, fático e jurisprudencial. O ordenamento jurídico brasileiro exige, como pressuposto da responsabilidade civil, a presença de ato ilícito (art. 186 do CC), dano e nexo de causalidade. Nenhum desses elementos encontra respaldo nos autos. Em primeiro lugar, o protesto realizado foi ato legítimo, praticado no exercício regular de direito assegurado pelo art. 1º da Lei nº 9.492/1997 e amparado pelo art. 188, I, do Código Civil. Não havendo ilicitude na conduta da Apelante, inexiste pressuposto para o dever de indenizar. Ademais, o simples apontamento de título a protesto não enseja, por si só, dano moral – para tanto, deve-se analisar as peculiaridades do caso concreto” (sic). Pondera que “Não bastasse isso, o comportamento da Apelada compromete sua própria narrativa pois permaneceu inerte por cerca de 11 meses, sem buscar o cancelamento do protesto ou qualquer resolução administrativa da pendência, circunstância que revela ausência de abalo relevante ou urgência reparatória. O comportamento processual contraditório da Apelada, além de afastar o nexo de causalidade, evidencia tentativa de obtenção de vantagem indevida – o que veda o ordenamento jurídico à luz do art. 422 do Código Civil e do princípio da boa-fé objetiva. Assim, ausente prova do abalo à imagem empresarial, do prejuízo reputacional ou de conduta abusiva da Apelante, é imperativa a exclusão da condenação por dano moral, sob pena de se admitir a responsabilidade objetiva sem respaldo legal” (sic). A par destes argumentos, pede o provimento do apelo, para “[...] que seja julgada totalmente improcedente a ação proposta por L. ANTONIO DA ROCHA & CIA LTDA – ME; bem como seja afastada a condenação ao pagamento de indenização por danos morais” (sic). Sem contrarrazões. Preparo recursal devidamente recolhido, conforme Id. 293008894. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Recolhido o preparo, e estando adequado e tempestivo, CONHEÇO o apelo interposto, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. Cinge a controvérsia recursal acerca da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando o apelante “[...] ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento.” (sic) Ainda, condenou a parte apelante em honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da condenação. Colaciono trecho da sentença exarada pelo juízo a quo: “Trata-se de ação ordinária de indenização por danos morais proposta por L. Antonio da Rocha & Cia Ltda – ME em face de Comércio Regional de Alimentos Ltda, partes qualificadas nos autos. A controvérsia cinge-se à existência ou não de responsabilidade civil da parte requerida pela inscrição do nome da autora em cadastro de inadimplentes, consubstanciada em protesto de título realizado após sua quitação. Dos documentos acostados aos autos, resta incontroverso que o título foi efetivamente pago pela autora em 20/09/2006, conforme fls. 38 do Id. 66682872, ao passo que o protesto foi realizado em 10/11/2006 (fls. 40 do mesmo Id), ou seja, quase dois meses após a quitação da dívida. Ainda que o pagamento tenha ocorrido com atraso, é certo que a autora quitou integralmente a obrigação dois meses antes da lavratura do protesto, não havendo justificativa legal para sua formalização posterior. A alegação da ré de que entregou carta de anuência à autora para que esta providenciasse o cancelamento do protesto não a exonera da responsabilidade, pois o vício essencial reside na própria lavratura indevida do protesto, após o adimplemento da obrigação. A jurisprudência pátria tem reconhecido, de forma pacífica, que a inclusão indevida do nome em cadastro de inadimplentes, ainda que por equívoco, configura ato ilícito indenizável, sendo o dano presumido (in re ipsa). Logo, comprovada a inscrição posterior à quitação da dívida, resta caracterizado o ilícito, o dano e o nexo causal, preenchendo-se os requisitos do art. 186 do Código Civil [...] [...] Ressalto que, em sede de contestação, a parte requerida não trouxe qualquer prova capaz de refutar o protesto indevido. Também, não produziu qualquer prova nesse sentido. Dessa forma, é evidente que a autora comprovou fato constitutivo de seu direito, demonstrando a irregularidade do protesto. [...] Quanto ao quantum indenizatório, deve-se considerar o caráter punitivo-pedagógico da reparação, bem como a extensão do dano e a capacidade econômica das partes. Considerando os parâmetros adotados pela jurisprudência em casos análogos, e observadas as peculiaridades do caso concreto, entendo razoável e proporcional a fixação da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Dessa forma, o pedido inicial é procedente. III. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PROCEDENTE os pedidos iniciais, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC e condeno a parte requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento. Os juros de mora serão calculados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 406 do Código Civil, na sua redação original, e após a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024 (28/08/2024), a correção monetária deverá observar a variação do índice IPCA e os de juros de mora corresponderão à taxa referencial da SELIC, deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 do Código Civil e seus parágrafos. [...] Condeno a parte requerida ao pagamento de custas e honorários fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação.” (Id. 292011392) Pois bem. A controvérsia central reside na aferição da licitude do protesto de título e da configuração do dano moral, em face de um pagamento que a parte Apelada alega ter sido efetuado antes da lavratura do ato notarial. Nesse diapasão, o ponto nodal do qual emerge a sentença de primeiro grau, e que encontra pleno amparo nas contrarrazões apresentadas pela Apelada, é a inegável ilicitude do protesto lavrado após a quitação da dívida. Conforme evidenciado nos autos, o título foi integralmente pago em 20 de setembro de 2006, ao passo que o protesto foi efetivado somente em 10 de novembro de 2006, ou seja, quase dois meses após o adimplemento da obrigação. Este fato, por si só, fulmina qualquer pretensão de regularidade do ato cambial, haja vista que o protesto se destina a comprovar a impontualidade do devedor, condição que, no caso em tela, já não mais subsistia. Vejamos: Desse modo, a conduta do Apelante amolda-se perfeitamente ao conceito de ato ilícito, conforme preceitua o artigo 186 do Código Civil, que expressamente dispõe: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” O reconhecimento do dano moral, neste contexto, opera-se in re ipsa, ou seja, presume-se da própria ocorrência do fato danoso – a indevida inscrição em cadastros de inadimplentes –, prescindindo de prova de prejuízo concreto, tal como pacificado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, verbis: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA . CADASTRO DE INADIMPLENTES. DANO MORAL IN RE IPSA. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME . DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. 1 . Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, a inscrição/manutenção indevida do nome do devedor no cadastro de inadimplente enseja o dano moral in re ipsa, ou seja, dano vinculado à própria existência do fato ilícito, cujos resultados são presumidos. 2. Hipótese em que o Tribunal a quo acerca da existência da prova e do nexo causal dos danos sofridos pelo recorrido, decorreu de convicção formada em face dos elementos fáticos existentes nos autos. Assim, considerando a fundamentação do acórdão objeto do recurso especial, os argumentos utilizados pela parte recorrente somente poderiam ter sua procedência verificada mediante o necessário reexame de matéria fática-probatória, o que é vedado a esta Corte, em razão do óbice da Súmulas n . 7/STJ. 3. A revisão do quantum arbitrado para a indenização por danos morais encontra óbice na Súmula n. 7/STJ, somente sendo possível superar tal impedimento nos casos de valor irrisório ou exorbitante, o que não é o caso dos autos .Agravo interno improvido.” (STJ - AgInt no REsp: 2085054 TO 2023/0241523-0, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 23/10/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/10/2023) (Destaquei) Colaciono ainda precedentes deste Sodalício em casos análogos: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA – PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DO DANO MORAL E MATERIAL OU REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO – NÃO ACOLHIMENTO – FATURA ADIMPLIDA NA DATA DO VENCIMENTO – PROTESTO INDEVIDO - DANO MORAL CONFIGURADO – DANO MATERIAL COMPROVADO – RESTITUIÇÃO DEVIDA - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O protesto do nome do consumidor, por débito adimplido, configura ato ilícito passível de reparação, e o dano moral, daí decorrente, presume-se, dispensando a produção de prova. O valor da indenização por dano moral deve ser arbitrado em consonância com princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, promovendo de modo justo a compensação do ofendido e a punição do ofensor, merecendo ser mantido o quantum indenizatório fixado na sentença. Cabível a restituição do valor desembolsado pelo autor, quando comprovado o pagamento referente ao cancelamento do protesto”. (N.U 1010341-59.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/09/2024, Publicado no DJE 30/09/2024) (Destaquei) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE RESTRIÇÃO DE CRÉDITO. MAJORAÇÃO DO DANO MORAL. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que reconheceu a inexistência de débito e condenou a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 por dano moral, em razão de inscrição indevida em órgão de proteção ao crédito, mantendo-se o termo inicial dos juros de mora e o índice de correção monetária definidos, bem como os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. II. Questão em discussão Questões em discussão: (i) saber se o valor da indenização por dano moral é suficiente à reparação do prejuízo causado; (ii) o termo inicial dos juros de mora e da correção monetária (iii) saber se os honorários advocatícios devem ser majorados. III. Razões de decidir A inscrição indevida do nome em cadastro de inadimplentes configura dano moral in re ipsa e enseja compensação, cujo valor deve ser razoável para atender ao caráter pedagógico e reparatório da condenação. O quantum de R$ 3.000,00 mostra-se insuficiente, devendo ser majorado para R$ 6.000,00, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. O termo inicial dos juros de mora, em caso de responsabilidade contratual, é a data da citação (art. 405 do CC). Correta a incidência da correção monetária desde o arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ. Mantido o percentual dos honorários advocatícios, diante da adequação aos critérios do CPC. IV. Dispositivo e tese Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: " A inscrição indevida em cadastro de inadimplentes gera dano moral in re ipsa. O valor da indenização por dano moral deve observar critérios de proporcionalidade e razoabilidade, considerando-se as circunstâncias do caso. Nas hipóteses de responsabilidade contratual, os juros de mora incidem a partir da citação." Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 389, p.u., 405 e 406, § 1º; CPC, art. 85, § 2º. Jurisprudência relevante citada: TJMT, RAC nº 9614/2010, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 5ª Câmara Cível, j. 14.04.2010.” (N.U 1003224-97.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/07/2025, Publicado no DJE 21/07/2025) (Destaquei) “DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. DÉBITO QUITADO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO PELA CONCESSIONÁRIA. REVELIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR DA INDENIZAÇÃO MANTIDO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em Exame 1. Recurso de apelação interposto pela Energisa Mato Grosso - Distribuidora de Energia S.A. contra sentença que declarou a inexistência de débito e condenou a concessionária ao pagamento de R$ 6.000,00 (seis mil reais) por danos morais, em razão de negativação indevida, mesmo após a quitação da fatura. II. Questão em Discussão 2. Discute-se: (i) a legitimidade da negativação do nome do consumidor por débito já quitado; (ii) a responsabilidade objetiva da concessionária pela falha na prestação do serviço; e (iii) a adequação do quantum indenizatório fixado. III. Razões de Decidir 3. Comprovado o pagamento da fatura pela Autora, recai sobre a concessionária o dever de demonstrar eventual excludente de responsabilidade, o que não foi feito. 4. A revelia da Ré e a ausência de comprovação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado, em conjunto com as provas carreadas aos autos, possibilitam o reconhecimento da falha na prestação do serviço e a responsabilização objetiva nos termos do art. 14 do CDC. 5. O dano moral é caracterizado pela negativação indevida e ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, sendo devida a indenização no valor fixado. 6. Quantum indenizatório mantido, por observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como o caráter punitivo-pedagógico da medida. IV. Dispositivo e Tese 7. Recurso desprovido. Tese de Julgamento: "A negativação indevida decorrente de falha na prestação de serviço essencial, com débito devidamente quitado, caracteriza dano moral indenizável, sendo devida a condenação da concessionária responsável." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; CPC, art. 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJSP, ApCiv 1083396-80.2022.8.26.0002; TJGO, ApCiv 5719239-73.2023.8.09.0051; TJMG, ApCiv 5001991-32.2015.8.13.0625, TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, TJMT, ApCiv 1000870-15.2020.8.11.0044; TJMT, RI 10286014420228110002.” (N.U 1011483-81.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/01/2025, Publicado no DJE 30/01/2025) (Destaquei) Ainda, quanto a alegação de que houve atipicidade do pagamento – mediante depósito bancário direto, sem comunicação ou identificação do título quitado – o que teria impedido o conhecimento imediato do adimplemento e, consequentemente, a prevenção do protesto, esta, não exime o credor de seu dever de diligência em relação à gestão de seus recebíveis, de modo que, a responsabilidade por averiguar a quitação de seus títulos, independentemente da forma de pagamento, recai sobre o próprio Apelante. Consequentemente, a inobservância desse dever caracteriza negligência, elemento configurador da responsabilidade civil, nos termos do já citado artigo 186 do Código Civil. Diante de todo o exposto, verifica-se que o Apelante não logrou em demonstrar a licitude do protesto realizado após a quitação da dívida, tampouco em afastar a sua responsabilidade objetiva pela conduta ilícita, ou descaracterizar o dano moral presumido. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo hígida a sentença proferida pela Magistrada de primeiro grau. Em razão do trabalho adicional na fase recursal, majoro a verba honorária de 10 para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, com fulcro no art. 85, §11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025

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