1. Erick Willian Couto (Impetrante) x 2. Tribunal De Justiça Do Estado De Minas Gerais (Impetrado)
ID: 324985734
Tribunal: STJ
Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL
Classe: HABEAS CORPUS
Nº Processo: 0213370-34.2025.3.00.0000
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
ERICK WILLIAN COUTO
OAB/MG XXXXXX
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HC 1010741/MG (2025/0213370-6)
RELATOR
:
MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK
IMPETRANTE
:
ERICK WILLIAN COUTO
ADVOGADO
:
ERICK WILLIAN COUTO - MG202048
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GER…
HC 1010741/MG (2025/0213370-6)
RELATOR
:
MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK
IMPETRANTE
:
ERICK WILLIAN COUTO
ADVOGADO
:
ERICK WILLIAN COUTO - MG202048
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
PACIENTE
:
DANILO FERREIRA LOPES
CORRÉU
:
SILVANA FERREIRA DO AMARAL
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus, sem pedido liminar, impetrado em benefício de DANILO FERREIRA LOPES, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS no julgamento da Apelação Criminal n. 1.0000.24.378720-7/001.
Extrai-se dos autos que o paciente foi condenado à pena de 05 anos de reclusão, em regime fechado, e 01 ano de detenção, além do pagamento de 510 dias-multa pela prática dos crimes tipificados no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06 e no artigo 12, da Lei 10.826/03.
O Tribunal de origem deu parcial provimento à apelação interposta pelo paciente, a fim de abrandar o regime inicial de cumprimento de pena para o aberto, no que tange ao crime apenado com detenção, em acórdão assim ementado (fl. 22/23):
"APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE USO PERMITIDO – ABSOLVIÇÃO – DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE TRÁFICO PARA A CONDUTA DE POSSE DE ENTORPECENTE PARA CONSUMO PRÓPRIO – MATERIALIDADE, AUTORIA E DESTINAÇÃO MERCANTIL DEMONSTRADAS – IMPOSSIBILIDADE. Comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, bem assim, que os recorrentes estavam, de fato, praticando o tráfico de drogas, não há como acolher os pleitos de absolvição por insuficiência de provas e/ou de desclassificação para a conduta de posse para consumo próprio. RECONHECIMENTO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº. 11.343/06 – IMPERTINÊNCIA. Incabível a concessão da benesse prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº. 11.343/06, se demonstrado, pela natureza e quantidade das substâncias apreendidas, que o réu vinha se dedicando ao tráfico de drogas. ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL – CRIMES PUNIDOS COM RECLUSÃO E DETENÇÃO – NATUREZAS DISTINTAS – PARCIAL ACOLHIMENTO. Compete ao magistrado analisar, caso a caso, qual o regime prisional mais adequado para o início do cumprimento da pena imposta, em observância ao disposto nos artigos 33 e 59, ambos do Código Penal. O delito de posse irregular de arma de fogo é punido com detenção, pena que deve ser cumprida em regime semiaberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado, isto, já em fase de execução. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE – INVIABILIDADE. Não preenchidos os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. V. V. APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO RECLUSÃO E DETENÇÃO – REGIME PRISIONAL INICIAL – TOTAL DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE. Embora as penas de reclusão e de detenção não possam ser somadas, reconhecido o concurso material de crimes, o regime prisional inicial deverá ser estabelecido em conformidade com o total das reprimendas privativas de liberdade. "
No presente writ, a defesa sustenta o cabimento do habeas corpus concomitante ao recurso especial, ainda não apreciado pelo Tribunal de origem.
Alega a nulidade decorrente da abordagem policial, a ocorrência de busca domiciliar sem autorização judicial, bem como a inexistência de justa causa.
Enfatiza que "a testemunha Aroldo ainda confirmou a informação de que HAMILTON não autorizou a entrada da polícia na residência, nem sequer deu-lhe autonomia para tanto".
Argumenta sobre a necessidade do reconhecimento da minorante do tráfico privilegiado, pois afirma que "embora a colenda câmara julgadora tenha reconhecido a primariedade e os bons antecedentes do paciente, em decisão manifestamente contraditória, deixa de reconhecer a causa de diminuição de pena, com enfoque em mero pressuposto de que o mesmo vinha se dedicando a atividades criminosas, além de arguir como fundamento a natureza e a quantidade de droga apreendida".
Requer, no mérito, a concessão da ordem para o fim de "cassar a decisão da 1ª Câmara Criminal do TJMG, e declarar nulos os elementos probatórios colhidos desde o inquérito policial, por patente quebra de custódia nos termos do artigo 157, e seguintes do CPP, ante a violação indevida da honra e intimidade, nos termos do artigo 244 e seguintes do CPP, extinguir o processo por absoluta ausência de justa causa – 395, inciso III, do CPP, e absolver o paciente nos termos legais. Subsidiariamente, pugna pela concessão da ordem para para modificar a decisão vergastada, e aplicar a minorante do tráfico privilegiado, prevista no artigo 33, §4º, da Lei 11.343/06, e reduzir a pena base no patamar de 2/3, por se tratar de medida de direito e justiça".
O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem. (fls. 912/916).
É o relatório.
Decido.
Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração sequer deveria ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do próprio Superior Tribunal de Justiça.
Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável verificar a existência de eventual constrangimento ilegal.
É narrado nos autos que, em 20 de dezembro de 2023, por volta das 08h50, na rua Joaquim Pereira, nº 811, no bairro São João, em Abaeté/MG e na rua Manoel Antônio de Souza, nº 1450, no bairro São João, em Abaeté/MG, o paciente e Silvana Ferreira do Amaral, de forma consciente e voluntária, tinham em depósito e guardavam cocaína, crack, maconha e ecstasy, sem autorização legal e/ou regulamentar.
O paciente e a corré, na rua Manoel Antônio de Souza, nº 1450, no bairro São João, em Abaeté/MG, possuíam e mantinham sob suas guardas arma de fogo e munições de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.
Segundo apontado, a Polícia Militar recebeu notitia criminis de tráfico de drogas e posse de armas pelo paciente, tendo iniciado trabalho de inteligência com levantamento de seu histórico criminal e monitoramento de sua residência. Com isso, constataram que o paciente estaria exercendo a traficância em sua residência, situada na rua Joaquim Pereira, nº 811, no bairro São João, em Abaeté/MG, local em que, inclusive, possuiria arma de fogo e munições.
As diligências preliminares realizadas pela PMMG ainda apuraram que corré Silvana, genitora do paciente, seria conivente com as condutas criminosas do filho, auxiliando-o na prática delitiva, de modo que estaria permitindo o paciente de utilizar sua residência, situada na rua Manoel Antônio de Souza, nº 1459, no bairro São João, em Abaeté/MG, para guardar drogas, armas, munições e comercializar entorpecentes.
Provocado pela Polícia Militar, o Ministério Público requereu a expedição de mandado de busca e apreensão contra o paciente e a corré. Nos autos de nº 5002726-13.2023.8.13.0002, foi deferida a medida cautelar.
Em 20 de dezembro de 2023, por volta das 08h50, policiais militares deram início ao cumprimento da ordem judicial, quando se dirigiram à residência do paciente, situada na rua Joaquim Pereira, nº 811, no bairro São João, em Abaeté/MG, deram-lhe ciência do cumprimento da diligência autorizada judicialmente e iniciaram a incursão no local.
Durante as buscas na residência do paciente, os militares perceberam a presença da corré no local, momento em que o CB PM Diogo visualizou a corré Silvana arremessar algo pela janela da cozinha, em direção ao imóvel vizinho. Imediatamente, os militares foram à residência de Walisson, vizinho do paciente, que autorizou a entrada dos militares.
No imóvel de Walisson, os militares encontraram um tablete de maconha e uma balança de precisão. Em continuidade às buscas na residência do paciente, a SD Stepahny encontrou, na sala do imóvel, dentro de um copo, uma bucha de maconha e R$ 3.085,00 em espécie, além de 50 bolivar venezuelano.
O paciente e a corré foram presos em flagrante delito e conduzidos ao Quartel da PM para o registro da ocorrência. Nesse ínterim, a sala de operações da PMMG recebeu nova notitia criminis, dando conta de que o paciente, durante a madrugada, teria sido visto transportando uma grande bolsa, contendo possivelmente entorpecentes, para o imóvel situado na rua Manoel Antônio de Souza, nº 1450, no bairro São João, em Abaeté/MG.
Em razão das novas informações, os militares se dirigiram ao referido logradouro e lá apuraram que o imóvel pertence a Hamilton Ferreira do Amaral, tio do paciente e irmão da corré. Na ocasião da diligência, Hamilton estava na zona rural, mas autorizou, por meio de contato telefônico, o ingresso dos militares na casa. Colhida a devida autorização de entrada, os militares deram início às buscas domiciliares no imóvel situado na rua Manoel Antônio de Souza, nº 1450, no bairro São João, em Abaeté/MG. No local, no interior de um quarto utilizado pelo paciente, acondicionados dentro de uma caixa térmica de isopor, os militares encontraram uma grande quantidade de entorpecente, de natureza diversa (crack, cocaína, maconha e ecstasy), além de um revólver cal. 38, municiado com seis cartuchos intactos, mais oito munições cal. 38 e uma balança de precisão.
Colocadas as premissas fáticas, a teses arguidas dizem respeito à nulidade do procedimento da cautelar de busca e apreensão e a necessidade de reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 33 §4º da Lei 11.343/06.
Ocorre que as aludidas teses foram afastadas no acórdão guerreado pelos seguintes fundamentos:
“(...) Noutro ponto, o fato de, in casu, a diligência policial ter tido como ponto de partida a apresentação de “denúncias anônimas” se afigura como absolutamente irrelevante já que, anote-se, as condutas criminosas foram devidamente provadas, inclusive, em Juízo, respeitado o princípio constitucional do devido processo legal, de que são corolários o contraditório e a ampla defesa.
Os indícios colhidos ao longo da atividade policial, seja ela ostensiva/preventiva ou investigativa, são elementos meramente informativos, que, no momento oportuno, serão obrigatoriamente submetidos ao crivo do contraditório e controle por parte do Poder Judiciário.
Lado outro, reforce-se que a negativa incondicional de autoria da traficância constitui geralmente uma diretriz trilhada pelos traficantes.
Nestes termos, têm-se que as alegações defensivas se afiguram frágeis e incapazes de rebater a prova coligida em desfavor dos acusados, não havendo falar-se em ausência de veracidade, diante dos fortes elementos de convicção oferecidos nos autos, mormente, reitere-se, pelos documentos neles acostados, pelas circunstâncias da apreensão das drogas e, especialmente, pelos depoimentos das testemunhas, os quais, distante de incredibilidade, mostram-se firmes o suficiente para imputar-lhes a prática dos crimes pelos quais foram denunciados, processados e, ao final, após regular instrução, condenados.
Destarte, incabíveis tanto os pleitos de absolvição, formulados por Danilo e Silvana, quanto aquele de desclassificação, apresentado pelo primeiro, devendo ser mantida a condenação de ambos pela prática do delito de tráfico de entorpecentes.
(...)
Da reprimenda. Neste ponto, a Defesa de Danilo pleiteou o redimensionamento da pena, com sua fixação no mínimo, e posterior aplicação da causa especial de diminuição prevista no § 4º, do artigo 33, da Lei Antidrogas, com abrandamento do regime prisional e substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Crime de tráfico de drogas (artigo 33, caput, da Lei nº. 11.343/06):
A pena-base foi estabelecida acima do mínimo legal, em 06 (seis) anos de reclusão, e 600 (seiscentos) dias-multa.
Todas as circunstâncias judiciais (artigo 59 do Código Penal) foram tidas como favoráveis ou neutras.
Todavia, a circunstância especial relativa à natureza e quantidade das substâncias, foi desvalorada.
Correta a análise levada a efeito em primeiro grau.
Como cediço, a fixação da basilar é ato de discricionariedade vinculada ao limite estabelecido pelo legislador, cabendo ao julgador a análise das circunstâncias judiciais através do livre convencimento motivado.
Em se tratando de tráfico de drogas, é certo que devem ser levadas em consideração, de forma preponderante, as disposições do artigo 42 da Lei nº 11.343/2006.
A quantidade e natureza das substâncias apreendidas autorizam a fixação da pena-base em patamar acima do mínimo legal.
O dispositivo legal em estudo preconiza que tal circunstância é preponderante em relação àquelas descritas no artigo 59 do Código Penal.
In specie, vale repetir, foram apreendidos, aproximadamente, 2.413,25g (dois mil, quatrocentos e treze gramas, e vinte e cinco centigramas) de cocaína, 1.072,32g (mil e setenta e dois gramas e trinta e dois centigramas) de maconha, e 5,89g (cinco gramas e oitenta e nove centigramas) de ecstasy.
Evidente, pois, que a natureza e a quantidade dos entorpecentes apreendidos justificam a exasperação da pena-base.
Dessa forma, ainda que favorável a análise da totalidade das circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, em se tratando de tráfico ilícito de entorpecentes pode o juiz, atento a natureza e a quantidade do produto apreendido, fixá-la acima do mínimo legal, desde que, obviamente, o faça fundamentadamente.
Conforme pacífico entendimento doutrinário e jurisprudencial, basta que uma das circunstâncias seja desfavorável para que o julgador, utilizando-se de sua discricionariedade, e desde que respeitados os parâmetros mínimo e máximo fixados na lei, possa afastar a pena-base do mínimo.
Assim, diante da apreensão de considerável quantidade de cocaína, maconha e ecstasy em poder do réu – em especial, a primeira e a última, drogas reconhecidamente de alto poder viciante e deletério, que apresentam súbito indutor de dependência física e psíquica –, entendo justificada a fixação da pena-base acima do mínimo. (...)
Na segunda fase da dosimetria, foi reconhecida e aplicada a circunstância atenuante da confissão espontânea (artigo 65, inciso III, alínea ‘d’, do Código Penal).
A pena provisória foi estabelecida no mínimo legal.
Por fim, na terceira fase da dosimetria, não foi reconhecida qualquer causa de oscilação.
A Defesa reclamou a aplicação da minorante especial.
Sem razão.
Ao denegar o benefício, a d. magistrada ponderou:
“Não incidirá a causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º, LD, que autoriza o Juiz a reduzir as penas de 1/6 a 2/3, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas e nem integre organização criminosa.
Com a referida previsão, o legislador quis beneficiar aquelas pessoas que, por qualquer desvio de conduta, se envolveram com o delito de tráfico de drogas de forma isolada e eventual.
Como visto, são quatro os requisitos cumulativos exigidos para que o agente tenha acesso ao benefício.
A primariedade e os bons antecedentes referem-se ao histórico criminal do sujeito e devem ser apurados mediante análise da CAC, que deve conter condenações criminais transitadas em julgado por fatos anteriores ao ora apurado.
A não dedicação a atividades criminosas e a não integração a organização criminosa, por óbvio, diferem-se dos dois primeiros, pois, do contrário, seria manifestamente inútil a sua previsão legal. Assim, o não atendimento a tais requisitos pode ser demonstrado por outros meios, desde que seguros e idôneos para o fim de indicar que o acusado, embora primário e de bons antecedentes, não seja pessoa neófita no mundo do crime, possuindo algum tipo de envolvimento que permita concluir-se não ser “marinheiro de primeira viagem”.
Com efeito, a lei reservou a aplicação da benesse àquele sujeito que, em situação meramente circunstancial, acabou se envolvendo em um ato típico de traficância, sem que, contudo, esteja integrado, de alguma forma, ao mundo do crime, o que não ocorre com aquele que por diversas vezes se imiscui em situações desse jaez.
No caso, apesar de o acusado não ostentar antecedentes criminais, está sendo concomitantemente condenado, nestes autos, por posse ilegal de arma de fogo e munições, os quais seriam de propriedade de outros traficantes, conforme afirmado pelo próprio acusado.
Além disso, consoante consta dos autos de número 0003467-75.2022.8.13.0002, o réu foi condenado em sentença ainda não transitada em julgado pela prática do crime de tráfico de drogas.
Tais fatos, considerados em conjunto, demonstram o envolvimento mais aprofundado do réu com atividades criminosas.
Assim, os elementos acima referidos, aliados à quantidade e variedade das drogas apreendidas, demonstram que o acusado não faz jus ao benefício legal pleiteado.” (sentença – documento de ordem 150).
Pois bem.
Em relação ao reconhecimento da referida benesse, entendo ser necessário que o agente cumpra rigorosamente os requisitos elencados em lei de forma cumulativa e simultânea, ou seja, deve ser primário, apresentar bons antecedentes, não se dedicar a atividades delitivas ou integrar organização criminosa.
O objetivo do favor legal é reduzir a sanção penal daquele que se mostra traficante ocasional, principiante, dando-lhe oportunidade de procurar outro meio de vida.
Ele é direcionado para quem adere ao tráfico de drogas esporadicamente, muitas vezes para sustentar seu próprio vício, e não ao traficante contumaz, que exerce, permanentemente e com habitualidade, a atividade ilícita.
É verdade que Danilo é primário e possuidor de bons antecedentes.
Todavia, colhem-se indícios de que ele vinha se envolvendo de forma perene com atividades criminosas.
Como regra geral, traficantes ocasionais não são presos em poder de tamanha quantidade de cocaína, maconha e ecstasy e elevada soma monetária (R$ 3.085,00) sem comprovação de origem lícita.
Assim, é possível inferir que ele vinha se dedicando à prática de atividades criminosas, fazendo delas seu meio de subsistência, afigurando-me inviável a incidência da minorante prevista no § 4º, do artigo 33, da Lei de Tóxicos.
Diante disto, analisada a prova em seu conjunto e dentro do contexto em que ocorreram os fatos, valorizando-se os indícios, que sempre foram reconhecidos como elementos de convicção, entendo obstada a incidência da causa especial de diminuição de pena.
Por este motivo, não vislumbro possibilidade de diminuir-lhe a pena, concedendo-lhe o benefício almejado.
A pena restou concretizada no mínimo legal. (...)”.
Contudo, o pronunciamento sobre os temas resta obstacularizado. Isto porque, em consulta empreendida, percebe-se que foi interposto recurso especial pela defesa do ora paciente e juntado aos autos da ação penal nº 0000204-64.2024.8.13.0002, em 12/05/2025. Constata-se, ainda, que a parte alegou a existência de nulidade decorrente da abordagem policial, busca domiciliar sem autorização judicial e inexistência de justa causa. Sustentou a necessidade de reconhecimento do tráfico privilegiado, por ser, o ora paciente, primário e possuidor de bons antecedentes. Acrescentou que, embora o acórdão do Tribunal a quo tenha reconhecido a primariedade e os bons antecedentes do paciente, deixou de reconhecer a causa de diminuição de pena, ‘com enfoque em mero pressuposto de que o mesmo vinha se dedicando a atividades criminosas, além de arguir como fundamento a natureza e a quantidade de droga apreendida’. Ao final da peça recursal, buscou que ‘seja dado provimento ao presente recurso, para o fim de cassar a decisão da 1ª Câmara Criminal do TJMG, e declarar nulos os elementos probatórios colhidos desde o inquérito policial, por patente quebra de custódia nos termos do artigo 157, e seguintes do CPP, ante a violação indevida da honra e intimidade, nos termos do artigo 244 e seguintes do CPP, extinguir o processo por absoluta ausência de justa causa – 395, inciso III, do CPP, e absolver o recorrente nos termos legais. Subsidiariamente, pugna pelo provimento do recurso para modificar a decisão vergastada, e aplicar a minorante do tráfico privilegiado, prevista no artigo 33, §4º, da Lei 11.343/06, e reduzir a pena base no patamar de 2/3’. (https://portaldeservicos.pdpj.jus.br/consulta/autosdigitais?processo=0000204-64.2024.8.13.0002&dataDistribuicao=20250523000000, acesso em 12/07/2025, às 11h15).
As contrarrazões do Ministério Público Estadual foram apresentadas em 16/06/2025 e a última movimentação processual apontada é a seguinte: “16 de junho de 2025 - Recebimento no Gabinete da 3ª Vice-Presidência”. (https://portaldeservicos.pdpj.jus.br/consulta/autosdigitais?processo=0000204-64.2024.8.13.0002&dataDistribuicao=20250523000000, acesso em 12/07/2025, às 11h26).
Portanto, o impetrante, simultaneamente, interpôs o remédio heroico e o recurso especial, visando pronunciamento desta Corte de Justiça.
O pronunciamento na via estreita do habeas corpus é vedado, dada tal circunstância, pelo princípio da unirrecorribilidade, com exceção apenas para o Recurso Especial e o Extraordinário; o que não é a hipótese em apreço.
Sobre o tema, tem-se a compreensão doutrinária:
"Princípio da unirrecorribilidade das decisões. “A regra geral é que a cada decisão corresponda um único recurso. Atendendo ao princípio, o art. 593, §4º, CPP exclui a possibilidade de interposição do recurso sem sentido estrito, se da decisão cabe apelação, pois esta absorve aquele. (...) Há casos, porém, de decisões objetivamente complexas, com capítulos distintos, em que entram em jogo diversos requisitos de admissibilidade. (...) E, para todos os processos, existem ainda os casos de interposição simultânea do recurso extraordinário e do especial, se houver fundamentos legais e constitucionais que autorizem as duas impugnações; ou, ainda, os de embargos infringentes e mais os de recurso especial e/ou extraordinário, se na decisão houver uma parte unânime que possibilite o recurso aos tribunais superiores e uma não unânime, embargável. Entende-se que, nesses casos, cada capítulo da sentença é objeto de um recurso distinto, de modo que a hipótese não configura exceção ao princípio da unirrecorribilidade”. (GRINOVER, Ada Pellegrini, GOMES, Antonio Magalhães Filho, FERNANDES, Antonio Scarance Fernandes, Recursos no Processo Penal, 6ª edição, RT, p. 33). (grifos nossos).
Nesta esteira, cumpre consignar que não é admissível a tramitação concomitante de habeas corpus e recurso especial contra o mesmo ato judicial, em face do citado princípio da unirrecorribilidade das decisões judiciais.
Sobre a problemática, é entendimento pacífico nesta Corte Superior o de que a impetração de habeas corpus concomitantemente com recurso especial viola o princípio da unirrecorribilidade, pois se trata de indevida subversão do sistema recursal.
Cito os seguintes precedentes:
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto contra decisão monocrática que indeferiu liminarmente habeas corpus substitutivo de recurso próprio, buscando o reconhecimento da fragilidade do conjunto probatório para absolvição ou, subsidiariamente, a prescrição da pretensão punitiva.
II. Questão em discussão
2. A questão em discussão consiste em saber se é admissível a tramitação concomitante de habeas corpus e recurso especial contra o mesmo ato judicial, em face do princípio da unirrecorribilidade das decisões judiciais.
III. Razões de decidir
3. O princípio da unirrecorribilidade impede a tramitação simultânea de habeas corpus e recurso especial contra o mesmo ato judicial, sob pena de subversão do sistema recursal.
4. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça não admite habeas corpus substitutivo de recurso próprio, especialmente quando já interposto recurso especial com agravo.
5. A análise de mérito do habeas corpus não é cabível, pois a matéria pode ser apreciada no recurso especial em trâmite, evitando-se a supressão de instância.
IV. Dispositivo e tese
6. Agravo regimental desprovido.
Tese de julgamento: "1. O princípio da unirrecorribilidade impede a tramitação simultânea de habeas corpus e recurso especial contra o mesmo ato judicial. 2. Habeas corpus substitutivo de recurso próprio não é admissível quando já interposto recurso especial com agravo."
Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 647.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 842.200/SP, Min. Teodoro Silva Santos, Sexta Turma, julgado em 26.02.2024. (Processo AgRg no HC 963998 / RN AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS, 2024/0450008-0, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK (1183), Órgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento: 19/02/2025, Data da Publicação/Fonte, DJEN 24/02/2025). (grifos nossos).
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. TRÁFICO DE DROGAS. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto contra decisão que não conheceu de habeas corpus impetrado em favor de agravante condenado por tráfico de drogas, com fundamento na impossibilidade de utilização do habeas corpus como substitutivo de recurso próprio.
2. O agravante foi preso em flagrante com 8 cápsulas de cocaína, pesando aproximadamente 1 grama, e condenado à pena de 5 anos de reclusão e 500 dias-multa, nos termos do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.
3. A defesa alegou a atipicidade material da conduta pela aplicação do princípio da insignificância e, subsidiariamente, a desclassificação para o delito de porte para consumo pessoal, argumentando a ausência de provas suficientes da mercancia.
II. Questão em discussão
4. A questão em discussão consiste em saber se é cabível a impetração de habeas corpus como substitutivo de recurso próprio, em face do princípio da unirrecorribilidade.
5. A questão também envolve a análise da possibilidade de desclassificação da conduta do agravante para porte para consumo pessoal, considerando a quantidade de droga apreendida e a ausência de provas de mercancia.
III. Razões de decidir
6. O Superior Tribunal de Justiça entende que o habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, sob pena de subversão do sistema recursal e violação do princípio da unirrecorribilidade.
7. A impetração de habeas corpus concomitantemente com recurso especial viola o princípio da unirrecorribilidade, pois se trata de indevida subversão do sistema recursal.
8. A análise de desclassificação de conduta e atipicidade material da conduta requer revolvimento fático-probatório, o que é inviável na via do habeas corpus.
IV. Dispositivo e tese
9. Agravo regimental não provido.
Tese de julgamento: "1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, em respeito ao princípio da unirrecorribilidade. 2. A desclassificação de conduta e a análise de atipicidade material da conduta não são cabíveis na via do habeas corpus, por demandarem revolvimento fático-probatório".
Dispositivos relevantes citados: Lei n. 11.343/2006, art. 33; CPP, art. 28.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 946.588/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024; STJ, AgRg no HC 921.673/GO, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 16/9/2024.
(AgRg no HC n. 979.932/PR, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do TJSP), Sexta Turma, julgado em 11/6/2025, DJEN de 26/6/2025.) (grifos nossos).
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto contra decisão que não conheceu do habeas corpus, apresentado contra acórdão que afastou a abolitio criminis e determinou a remessa dos autos ao Juízo de origem para análise do mérito da ação penal.
2. O agravante alega que a interposição de recurso especial e extraordinário não impede o manejo do habeas corpus quando o recurso não é admitido na origem, e defende a existência de flagrante ilegalidade pelo julgamento extra petita.
II. Questão em discussão
3. A discussão consiste em saber se é possível a tramitação concomitante de habeas corpus e recursos especial e extraordinário contra o mesmo acórdão, haja vista o princípio da unirrecorribilidade.
4. Outra questão é saber se houve flagrante ilegalidade no acórdão que afastou a abolitio criminis e determinou a remessa dos autos ao Juízo de origem.
III. Razões de decidir
5. O Superior Tribunal de Justiça não admite a tramitação concomitante de habeas corpus e recursos contra o mesmo ato, em respeito ao princípio da unirrecorribilidade. 6. Não se vislumbra flagrante ilegalidade no acórdão impugnado, pois a fundamentação apresentada é suficiente para a solução da controvérsia, não havendo necessidade de análise pormenorizada de todas as alegações.
7. O julgador não é obrigado a se manifestar acerca de todas as teses expostas no recurso, desde que demonstre os fundamentos e os motivos que justificaram suas razões de decidir.
IV. Dispositivo e tese
8. Agravo regimental não provido.
Tese de julgamento: 1. O princípio da unirrecorribilidade impede a tramitação concomitante de habeas corpus e recursos especial e extraordinário contra o mesmo ato. 2. A fundamentação suficiente para a solução da controvérsia afasta a necessidade de análise pormenorizada de todas as alegações. Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 619 e 620; CP, art. 29.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 925.493/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 27.11.2024; STJ, AgRg no HC 739.614/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, Quinta Turma, julgado em 11.10.2022.
(AgRg no HC n. 907.762/DF, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do TJSP), Sexta Turma, julgado em 4/6/2025, DJEN de 11/6/2025.). (grifos nossos).
Direito processual penal. Agravo regimental. Habeas corpus como sucedâneo de recurso. Princípio da unirrecorribilidade. Agravo regimental improvido.
1. Agravo regimental interposto contra decisão que não conheceu do habeas corpus impetrado em favor de acusado de estupro, alegando cerceamento de defesa por não ter sido permitida sustentação oral em julgamento de recurso de apelação.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é uníssona em não admitir habeas corpus como substituto de recurso próprio ou revisão criminal, salvo em casos de flagrante ilegalidade.
3. O princípio da unirrecorribilidade impede o conhecimento de habeas corpus impetrado concomitantemente com recurso especial.
4. Não se constatou flagrante ilegalidade que justificasse a concessão de habeas corpus de ofício.
5. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC n. 764.527/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 4/6/2025, DJEN de 10/6/2025.) (grifos nossos).
Por tais razões, com fulcro no art. 34, XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do presente habeas corpus.
Publique-se.
Intimem-se.
Relator
JOEL ILAN PACIORNIK
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