Processo nº 5140985-50.2025.8.21.7000
ID: 313513173
Tribunal: TJRS
Órgão: Secretaria da 2ª Câmara Cível
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 5140985-50.2025.8.21.7000
Data de Disponibilização:
02/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DAIANE DOS PASSOS SABEDOT
OAB/RS XXXXXX
Desbloquear
Agravo de Instrumento Nº 5140985-50.2025.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Consulta
RELATOR
: Desembargador RICARDO TORRES HERMANN
AGRAVADO
: HEITOR KALEBE ZERVES SAUSEN DA SILVA
ADVOGADO(A)
: DAIANE DOS P…
Agravo de Instrumento Nº 5140985-50.2025.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Consulta
RELATOR
: Desembargador RICARDO TORRES HERMANN
AGRAVADO
: HEITOR KALEBE ZERVES SAUSEN DA SILVA
ADVOGADO(A)
: DAIANE DOS PASSOS SABEDOT (OAB RS121895)
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. MÉTODO ABA. INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO. CUMPRIMENTO PREFERENCIAL NA REDE PÚBLICA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME:
1. Agravo de instrumento interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul contra decisão que deferiu tutela provisória de urgência para fornecimento de atendimento de psicopedagogia com metodologia ABA, uma vez por semana, à criança diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO:
1. Há duas questões em discussão: (i) a necessidade de inclusão da União no polo passivo da demanda, por se tratar de tecnologia não incorporada ao SUS; (ii) a determinação de cumprimento da medida liminar, preferencialmente, pela rede pública de saúde.
III. RAZÕES DE DECIDIR:
1. A inclusão da União no polo passivo é necessária, conforme o art. 19-Q da Lei nº 8.080/90, pois o tratamento solicitado não está padronizado no SUS para o diagnóstico específico do autor.
2. A responsabilidade solidária dos entes federativos não impede o direcionamento do cumprimento da decisão ao ente competente, conforme as regras de descentralização e hierarquização do SUS, nos termos do Tema 793 do STF.
3. A manutenção da tutela de urgência se justifica pela presença dos requisitos legais, especialmente o
periculum in mora
, evidenciado pela urgência do tratamento para o adequado desenvolvimento do infante.
4. O cumprimento da medida judicial deve ocorrer, preferencialmente, pela via pública, sendo a contratação por meio da rede privada justificada apenas em caso de comprovada ineficácia ou indisponibilidade da terapêutica ofertada pelo SUS.
IV. DISPOSITIVO E TESE:
1. Recurso parcialmente provido para determinar a inclusão da União no polo passivo da demanda e o cumprimento preferencial da medida liminar na rede pública de saúde.
Tese de julgamento:
1. A inclusão da União no polo passivo é necessária em demandas que envolvem tratamentos não padronizados pelo SUS, e o cumprimento da medida judicial deve ocorrer, preferencialmente, pela rede pública.
___________
Dispositivos relevantes citados:
CF/1988, art. 5º, XXXV; CPC/2015, arts. 64, § 4º, 115, p.u.; Lei nº 8.080/1990, art. 19-Q.
Jurisprudência relevante citada:
STF, RE 855.178/SE, Rel. Min. Luiz Fux, j. 16.03.2015; TRF4, AG 5038057-13.2024.4.04.0000, Rel. Osni Cardoso Filho, j. 25.03.2025.
AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Vistos.
O
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
agrava da decisão que, proferida nos autos da ação ordinária ajuizada por
H.K.Z.S.S.
, deferiu a tutela provisória de urgência, para determinar o fornecimento de atendimento de psicopedagogia com inclusão de metodologia de ABA, na periodicidade de 1 (uma) vez por semana (
Evento 9.1
):
"[...] Ciente da manifestação apresentada pelo Ministério Público.
Defiro assistência judiciária gratuita a parte autora.
Há prova inequívoca da verossimilhança da alegação de que a parte autora necessita do tratamento e de que este é imprescindível para sua saúde e deve ser utilizado/realizado de forma contínua, conforme atestados médicos acostados ao evento 1. Há, ainda, prova de que a parte autora não pode prover as despesas com os referidos medicamentos sem se privar dos recursos indispensáveis para seu sustento e de sua família, conforme comprovantes de rendimentos juntados.
Há fundado receio de dano irreparável à saúde da parte autora, inclusive com aumento do número de internações hospitalares, o que oneraria o próprio demandado com gastos em internações, em decorrência de ausência de tratamento preventivo.
A Lei Estadual n.º 9.908/93 estabelece, em seu art. 1.º:
“O estado deve fornecer, de forma gratuita, medicamentos excepcionais para pessoas que não podem prover as despesas com os referidos medicamentos, sem privarem-se dos recursos indispensáveis ao próprio sustento e de sua família.
Parágrafo único. Consideram-se medicamentos excepcionais aqueles que devem ser usados com frequência e de forma permanente sendo indispensável à vida do paciente.”
Concedo, portanto, a antecipação de tutela para determinar que o requerido forneça, no prazo de 05 dias, o tratamento conforme requerido na inicial (item "1"), nas quantidades/modalidade especificada (atendimento de psicopedagogia com inclusão de metodologia de Análise Aplicada ao Comportamento - ABA - e na periodicidade indicada - 1x por semana).
1. Registre-se a tramitação prioritária.
2. Cite-se.
3. Intimem-se o Secretário da Saúde, bem como o Ministério Público."
Em suas razões recursais, o Estado sustenta, em síntese, a carência de ação por ausência de negativa administrativa e o indevido direcionamento do tratamento a clínicas particulares. Argui a necessidade de inclusão da União no polo passivo da demanda, com base no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, por se tratar de tecnologia não incorporada ao SUS. Defende que o atendimento para Transtorno do Espectro Autista é de competência e responsabilidade municipal. No mérito, alega que o tratamento com psicopedagogo possui natureza educacional, não sendo prestação de saúde. Invoca a aplicação do Tema 06 do STF, aduzindo a ausência de demonstração de segurança, eficácia e inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS. Afirma a disponibilização pelo SUS do tratamento multidisciplinar requerido, devendo ser observada a ordem cronológica e o princípio da isonomia. Discorre sobre a ausência de comprovação da superioridade de métodos específicos para TEA, como o ABA, frente ao tratamento ofertado pela rede pública. Argumenta a inexistência de
periculum in mora
e a irreversibilidade da medida. Requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, o seu provimento para cassar a decisão recorrida ou, subsidiariamente, determinar a inclusão da União no polo passivo e o direcionamento da obrigação ao Município. Solicita o prequestionamento da matéria. Pede provimento (
Evento 1.1
).
Não são apresentadas contrarrazões.
O Ministério Público manifesta-se por julgar prejudicado o agravo de instrumento (
Evento 18.1
).
Vêm os autos conclusos.
É o relatório.
O recurso comporta julgamento monocrático, na forma do artigo 932, VIII, do CPC combinado com o art. 206, XXXVI, do Regimento Interno do TJRS.
No caso em exame, H.K.Z.S.S., criança, representada nos autos por sua guardiã legal e alegando possuir o diagnóstico de
Transtorno do Espectro Autista (CID 10 F84.0),
ajuizou a presente ação ordinária contra o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Farroupilha, objetivando, em síntese,
atendimento de psicopedagogia com inclusão de metodologia de Análise Aplicada ao Comportamento (ABA),
alegando não dispor de recursos para custear os serviços por conta própria (
Evento 1.1
).
Deferida a tutela de urgência, insurge-se o Estado.
Pois bem.
No tocante ao cerne do recurso, para evitar inútil tautologia, reproduzo, como razões de decidir, os fundamentos que externei quando do
parcial deferimento do pedido do efeito suspensivo
(
Evento 5.1
):
"Cumpre salientar, de início, que a questão atinente à tutela de urgência e à necessidade de inclusão da União no polo passivo já foi objeto de análise em sede de cognição sumária nos autos do Agravo de Instrumento nº
5112070-88.2025.8.21.7000
, interposto pelo Município de Farroupilha contra a mesma decisão liminar ora hostilizada.
Naquela oportunidade, em decisão proferida em 02 de maio de 2025 (
5.1
), e integrada pela decisão dos embargos de declaração de 06 de maio de 2025 (
14.1
), esta Relatoria já se manifestou sobre a matéria.
Desse modo, para evitar inútil tautologia, adoto como razões de decidir os fundamentos lá empregados, os quais, em essência, reconheceram a necessidade de inclusão da União no polo passivo da demanda, por se tratar de pleito de fornecimento de terapia
não padronizada
pelo SUS para o quadro clínico específico do autor, mantendo, contudo, os efeitos da tutela de urgência deferida na origem.
Transcrevo, por oportuno, os principais excertos da fundamentação expendida no Agravo de Instrumento nº 5112070-88.2025.8.21.7000:
" [...]
Salienta-se que em virtude do julgamento do Tema 1234 pelo Supremo Tribunal Federal, houve a alteração de entendimento desta Câmara no que diz respeito à competência para julgamento de ações envolvendo tecnologias
não
padronizadas pelo Sistema Único de Saúde.
Assim, em razão de recentes decisões do STF, salientando que a interpretação do Tema 793 deve considerar a responsabilidade direta da União pelo fornecimento de tratamentos complexos pretendidos, como se dá nos casos de
tratamentos não padronizados pelo SUS
, com a sua inclusão no polo passivo da demanda, a ser providenciada pelo juiz da causa, evitando-se o descompasso entre a previsão orçamentária e a concretização da despesas na área da saúde,
estou revendo minha posição, em observância à eficácia vinculante dessas decisões
.
Estabelecido isso, cumpre tecer algumas considerações introdutórias acerca do direito fundamental à saúde e, mais especificamente, sobre o fornecimento de tratamento multidisciplinar pelo Poder Público.
A Carta Magna em seu artigo 196, erige a
saúde
como direito fundamental de todos e dever inafastável do Estado (latu sensu), assegurando sua efetivação mediante políticas sociais e econômicas voltadas à redução do risco de doenças e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços necessários à sua promoção, proteção e recuperação. Nesse sentido, para além do art. 196, igualmente o disposto nos artigos 6º, caput, e 23, inciso II da Constituição Federal, bem como o artigo 241, caput, da Constituição Estadual.
Convergindo neste prisma, preceitua a Lei nº 8.080/90, que regula o Sistema Único de Saúde, em seu artigo 6º: "estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS): I - a execução de ações: (...) d) de
assistência terapêutica integral
, inclusive farmacêutica".
Não obstante, em um cenário de judicialização massiva de ações envolvendo o direito à saúde, foram fixadas diversas teses pelos Tribunais Superiores com o objetivo de dirimir controvérsias acerca da competência, obrigatoriedade e dispêndio, pelos entes públicos, em relação ao fornecimento de medicamentos, tratamentos, insumos e materiais, padronizados ou não, no âmbito do Sistema Único de Saúde.
Nesse cenário, e no que pertine ao caso concreto, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 855.178, Rel. Min. Luiz Fux, Tema 793 da Repercussão Geral, reafirmou sua jurisprudência acerca da responsabilidade solidária dos entes federados pelo dever de prestar assistência à saúde. Nesta oportunidade, fixou-se a seguinte tese:
“O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente.” (DJe de 16/03/2015)
Posteriormente, o Plenário da Suprema Corte desproveu os embargos de declaração opostos contra a referida decisão, em acórdão que porta a seguinte ementa:
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados.
O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. 2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 4. Embargos de declaração desprovidos.” (Plenário, DJe de 16/4/2020 - grifei).
No voto-vista condutor do acórdão no RE nº 855.178/SE-ED, o Ministro Edson Fachin fez os seguintes esclarecimentos, à guisa de conclusão:
“[...]3.
Quanto ao desenvolvimento da tese da solidariedade enuncia-se o seguinte:
i) A obrigação a que se relaciona a reconhecida responsabilidade solidária é a decorrente da competência material comum prevista no artigo 23, II, CF, de prestar saúde, em sentido lato, ou seja: de promover, em seu âmbito de atuação, as ações sanitárias que lhe forem destinadas, por meio de critérios de hierarquização e descentralização (arts. 196 e ss. CF);
ii) Afirmar que ‘o polo passivo pode ser composto por qualquer um deles (entes), isoladamente ou conjuntamente” significa que o usuário, nos termos da Constituição (arts. 196 e ss.) e da legislação pertinente (sobretudo a lei orgânica do SUS n. 8.080/90) tem direito a uma prestação solidária, nada obstante cada ente tenha o dever de responder por prestações específicas, que devem ser observadas em suas consequências de composição de polo passivo e eventual competência pelo Judiciário;
iii) Ainda que as normas de regência (Lei 8.080/90 e alterações, Decreto 7.508/11, e as pactuações realizadas na Comissão Intergestores Tripartite) imputem expressamente
a determinado ente a responsabilidade principal (de financiar a aquisição) pela prestação pleiteada, é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo, como responsável pela obrigação, para ampliar sua garantia,
como decorrência da adoção da tese da solidariedade pelo dever geral de prestar saúde;
iv) Se o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal não compuser o polo passivo da relação jurídico-processual,
sua inclusão deverá ser levada a efeito pelo órgão julgador,
ainda que isso signifique deslocamento de competência;
v) Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses), a União necessariamente comporá o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90), de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão, nos termos da fundamentação;
vi) A dispensa judicial de medicamentos, materiais, procedimentos e tratamentos pressupõe
ausência ou ineficácia da prestação administrativa e a comprovada necessidade,
observando, para tanto, os parâmetros definidos no artigo 28 do Decreto federal n. 7.508/11”. (grifo nosso)
E mais:
“[...] A compreensão de que qualquer cidadão pode demandar qualquer pessoa política, independentemente do que prevê a lei e as pactuações no âmbito do SUS sobre a respectiva atribuição, aliada ao fato de não se admitir o chamamento (do ente correto) aos processo,
tende a acarretar a falência do SUS em médio ou longo prazo.
(…)
Disso facilmente também se conclui que, ao adotar o entendimento da ‘solidariedade irrestrita’ ACABA-SE COM O PODER DO GESTOR DE PLANEJAR E DE EXECUTAR AS POLÍTICAS PÚBLICAS QUE LHE É LEGALMENTE ATRIBUÍDA.
(…)
De todo o exposto, é possível concluir que, em minha óptica, a solidariedade tal como interpretada - ‘irrestritamente’ (ou seja: conferindo poder ilimitado de escolha ao cidadão e impossibilitando a adequada discussão e defesa por parte do ente político legalmente responsável; a) tem aprofundado as desigualdades sociais e não as diminuído; b) tem piorado a prestação da saúde mais básica: retirado recursos inclusive de medidas preventivas, como do saneamento básico e da vacinação infantil, da atenção à saúde dos idosos;
c) tem desestruturado o sistema de saúde e orçamentário dos entes políticos
; d) tem
aumentado exponencialmente gastos sem a correlata melhora na prestação de saúde; e ainda
: e) tem retirado
do campo próprio – do Legislativo, ao desrespeitar as normas legais de regência e do Executivo,
ao retirar-lhe a escolha e a gestão – os poderes de planejar, executar e gerir políticas públicas – atribuições constitucionalmente definidas.
Em face desse quadro, visualizo,
por meio do aprimoramento da jurisprudência quanto à solidariedade, a possibilidade de dar um passo à frente para racionalizar o sistema do SUS, conferir-lhe eficiência, incluindo a economia
(com menos recursos, obter melhores resultados). (…).
Neste caso, ou seja: quando se trata de pedido de dispensa de medicamento
ou de tratamento padronizado na rede pública sem dúvida está-se diante de demanda cujo polo passivo e consequente competência são regulados por lei ou outra norma;
e disso não deve se desviar o autor na propositura da ação até para que seu pedido, se deferido, seja prestado de forma mais célere e mais eficaz.
É preciso, assim,
respeitar a divisão de atribuições: esteja ela na própria lei ou decorra
(também por disposição legal – art. 32 do Decreto 7.508/11)
de pactuação entre os entes, deve figurar no polo passivo a pessoa política com competência administrativa para o fornecimento daquele medicamento, tratamento ou material.
[...]”. (grifos meus)
Sobreveio, então, a Tese fixada em sede de Repercussão Geral – Tema 793 que, para além de assentar a tese de
responsabilidade solidária
entre os entes federativos nas demandas prestacionais da saúde, fixou
o dever
de as autoridades judiciais direcionarem
o cumprimento das decisões para fornecimento de prestações de saúde aos entes competentes de
acordo com as regras de organização do Sistema Único de Saúde
:
“
Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
” (grifos meus)
Assim, não obstante a faculdade conferida ao autor em direcionar a demanda prestacional de saúde para quaisquer entes federativos, isolada ou conjuntamente,
depreende-se o dever da autoridade judicial no direcionamento da execução da ordem judicial de prestação de saúde, à luz da repartição de competências,
que advém da imperativa necessidade de racionalização administrativa e financeira do sistema, com vistas ao atingimento da máxima eficiência na aplicação dos recursos, evitando, assim, o congestionamento de ações judiciais.
Reproduzo, nesse sentido, a ementa da Rcl 49.909, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, que vai ao encontro do exposto:
“CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO EM RECLAMAÇÃO. MUDANÇA JURISPRUDENCIAL. INDEVIDA APLICAÇÃO DO TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL PELO JUÍZO DA ORIGEM. ÔNUS OBRIGACIONAL A SER SUPORTADO PELA UNIÃO. NECESSIDADE DE SUA INCLUSÃO NO POLO PASSIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1. O objeto do recurso é a correta interpretação e aplicação da tese fixada no Tema 793 da Repercussão Geral, cujo teor é o seguinte: os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 2. A solidariedade atribuída a todos os entes (art. 23, II, da CF) não pode significar possibilidade absoluta de atropelo, por ordens judiciais, da estrutura fixada essencialmente a partir da lógica hierarquizada e sistematizada das ações e serviços públicos de saúde (art. 198, caput e I, da CF), materializada pela divisão de atribuição feita pela Lei 8.080/1990, que instituiu o Sistema Único de Saúde. 3
. A interpretação do Tema 793-RG deve considerar a existência de solidariedade entre todos os entes em caso de competência comum, mas deve observar o direcionamento necessário da demanda judicial ao ente responsável pela prestação específica pretendida
, permitindo-se que o cumprimento seja direto e, eventual ressarcimento, eficaz.
Nesses casos, quando identifica-se a responsabilidade direta da União pelo fornecimento do medicamento ou pelo tratamento pretendido, nos termos da Lei 8.080/1990, sua inclusão no polo passivo da demanda é medida necessária, a ser providenciada pelo juiz da causa, evitando-se o descompasso entre a previsão orçamentária e a concretização da despesas na área da saúde.
4. Da mesma forma, quando se objetivar a incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de
novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, as quais são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, nos termos do art. 19-Q da Lei 8.080/1990, a inclusão da União também se fará necessária
. 5. No caso concreto, entendeu-se pela desnecessidade da inclusão da União no polo passivo, sob o argumento de tratar-se de obrigação solidária de todos os Entes Políticos. Entretanto, cuida-se de pedido de fornecimento de medicamento que não se encontra padronizado para a finalidade desejada; e, apesar de incluído nas políticas públicas do SUS para tratamento de outra enfermidade, é de responsabilidade financeira do Ministério da Saúde por estar inserto no Grupo 1A do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF), o que obriga sua inclusão no polo passivo da demanda. 6. Embargos de Declaração acolhidos com efeitos infringentes.” (Rcl 49.909, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 22.3.2022) (grifos meus)
E também:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INTERPOSIÇÃO EM 06.03.2023. AÇÃO DE RESSARCIMENTO. GASTOS COM FORNECIMENTO E TRATAMENTO ONCOLÓGICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DIREITO À SAÚDE. ART. 196 DA CRFB. TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL. PARTE FINAL. REGRAS DE REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA. ACÓRDÃO PROFERIDO EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO. INOBSERVÂNCIA DO PARADIGMA DA REPERCUSSÃO GERAL. PRECEDENTES. 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 855.178-RG, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe 16.3.2015 (Tema 793), reconheceu a existência de repercussão geral da controvérsia constitucional referente à responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de saúde e reafirmou a jurisprudência pertinente ao tema. 2. No julgamento dos embargos de declaração, ocorrido em 23.05.2019, no citado RE 855.178-RG, de que fui redator para o acórdão, DJe 16.04.2020, esta Corte fixou a seguinte tese:
‘Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro’. 3. Inobservância pela instância de origem da parte final do Tema 793 da repercussão geral. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(Recurso Extraordinário 1.406.436-AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, DJe de 15/06/2023) (grifos meus)
Nesse sentido, dispõe o Enunciado nº 60 da II Jornada de Direito à Saúde do CNJ:
"A responsabilidade solidária dos entes da Federação não impede que o Juízo, ao deferir medida liminar ou definitiva, direcione inicialmente o seu cumprimento a um determinado ente, conforme as regras administrativas de repartição de competências, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento."
No caso em exame, observa-se que a parte autora postula o fornecimento de terapia
não
padronizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para o
quadro clínico em questão
, de modo que incumbe à
União a avaliação para incorporação
.
No âmbito de política de saúde, o método ABA/DENVER/PEDIASUT é elencado como opção terapêutica em Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) do Comportamento Agressivo no Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), aprovado pela Portaria Conjunta nº 07, de 12 de abril de 2022, do Ministério da Saúde
1
.
Todavia, in casu,
não
se verifica diagnóstico de comportamento agressivo grave, conforme preconizado no PCDT, mas Transtorno do Espectro Autista, de menor gravidade.
Uma vez que o
tratamento
requerido
não
está previsto nas políticas públicas do SUS para a condição da parte autora,
a União deve necessariamente compor o polo passivo
, à conta do que dispõe o art. 19-Q da Lei 12.401
2
, que lhe atribui a incorporação de novas tecnologias em saúde, in litteris:
“
Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica,
são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.
”
No mesmo sentido, destaca-se a jurisprudência recente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que corrobora essa orientação:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRESTAÇÃO DE SAÚDE.
TRATAMENTO NÃO INCORPORADO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO
.
A União deve necessariamente compor o polo passivo da relação processual em ação que tenha por objeto procedimento terapêutico não incorporado ao Sistema Único de Saúde.
Orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito do Tema nº 793. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5038420-97.2024.4.04.0000, 5ª Turma, Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO,
POR UNANIMIDADE
, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/02/2025) (grifos meus)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRESTAÇÃO DE SAÚDE.
TRATAMENTO NÃO INCORPORADO AO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO.
A União deve necessariamente compor o polo passivo da relação processual em ação que tenha por objeto procedimento terapêutico não incorporado ao Sistema Único de Saúde. Orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito do Tema nº 793.
(TRF4, AG 5038057-13.2024.4.04.0000, 5ª Turma , Relator para Acórdão OSNI CARDOSO FILHO , julgado em 25/03/2025) (grifos meus)
APELAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. MÉTODO ABA. CABIMENTO. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CUSTEIO DA OBRIGAÇÃO. - O Superior Tribunal de Justiça em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos assentou que a concessão de remédios não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa da comprovação da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento; da ineficácia do tratamento fornecido pelo sistema público de saúde; da incapacidade financeira do postulante e da existência de registro na ANVISA (REsp 1657156/RJ, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25/04/2018, DJe 04/05/2018). - Caso concreto em que restou demonstrada a adequação do tratamento postulado para o diagnóstico de transtorno do espectro autista. - Esta Corte vem decidindo pela manutenção de tratamentos iniciados, por força do princípio da dignidade da pessoa humana. -
Conforme decidido no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, é solidária a responsabilidade dos réus pela implementação do tratamento. No entanto, impõe ao juízo direcionar o cumprimento da obrigação conforme as regras de repartição de competência do SUS, o que impõe verificar se o medicamento é ou não padronizado. Cabe à União suportar a integralidade do ônus financeiro, por se tratar de tratamento não padronizado. (TRF4, AC 5065149-74.2022.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora ANA PAULA DE BORTOLI, juntado aos autos em 23/10/2024)
A corroborar, colaciono precedentes desta Corte que vão ao encontro do exposto:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE (ECA E IDOSO).
TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). TERAPIA ABA. INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO.
I. Caso em Exame:Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela de urgência em ação de obrigação de fazer, na qual se postula a concessão de terapia pelo método ABA e tratamento multidisciplinar. II. Questão em Discussão:A questão em discussão consiste em determinar: i) a necessidade de inclusão da União no polo passivo, em razão da ausência de padronização da terapia ABA no Sistema Único de Saúde (SUS); e ii) os reflexos dessa inclusão no processamento e julgamento da demanda. III. Razões de Decidir:Concluiu-se que a terapia pleiteada, não padronizada no SUS, demanda a inclusão da União no polo passivo, conforme a tese firmada no Tema 793 do STF, que reconhece a solidariedade entre os entes da Federação em demandas prestacionais de saúde. Observou-se que a competência para incorporação, exclusão ou alteração de procedimentos terapêuticos ao SUS é exclusiva da União, nos termos do art. 19-Q da Lei nº 8.080/1990. Ademais, a exclusão do Tema 1234 do STF sobre procedimentos terapêuticos reforça a aplicação da solidariedade estabelecida no Tema 793. Contudo, a inclusão da União não pode ser determinada de ofício, cabendo à parte autora a escolha dos demandados. Assim, determinou-se a intimação da parte autora, na origem, para emendar a inicial e incluir a União no polo passivo, sob pena de extinção do feito. Mantida a tutela de urgência concedida na origem, com base no art. 64, § 4º, do CPC, além de preenchidos os requisitos do art. 300 do CPC. IV. Dispositivo:Provimento em parte do agravo de instrumento. Determinada a intimação da parte autora, na origem, para emendar a inicial, incluindo a União no polo passivo, sob pena de extinção do processo. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50153809420258217000, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em: 28-03-2025) (grifos meus)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR COM ABORDAGEM ABA (APPLIED BEHAVIOR ANALYSIS). AUSÊNCIA DE PADRONIZAÇÃO NO SUS. INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO. NECESSIDADE. (TEMAS 1234 E 793 DO STF). 1. A exclusão dos produtos de interesse para a saúde que não sejam caracterizados como medicamentos, tais como órteses, próteses e equipamentos médicos, bem como aos procedimentos terapêuticos, em regime domiciliar, ambulatorial e hospitalar, do alcance do Tema 1234 do STF importa a aplicação da tese de repercussão geral assentada no Recurso Extraordinário 855.178/SE (Tema 793). 2. Compete exclusivamente à União a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos ao SUS, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90). 3. Caso concreto em que o tratamento multidisciplinar pelo método ABA não está padronizado no SUS, impondo-se a inclusão da União no polo passivo da demanda, com a consequente determinação de emenda à petição inicial para inclusão da União no polo passivo da demanda, sob pena de extinção do processo (art. 115, parágrafo único, do CPC). 4. Manutenção dos efeitos da tutela antecipada deferida (art. 64, § 4º, do CPC). RECURSO PREJUDICADO.(Agravo de Instrumento, Nº 52830500520248217000, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Diego Carvalho Locatelli, Julgado em: 28-03-2025) (grifos meus)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE.
TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR COM ABORDAGEM ABA (APPLIED BEHAVIOR ANALYSIS). AUSÊNCIA DE PADRONIZAÇÃO NO SUS. INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO.
NECESSIDADE. (TEMAS 1234 E 793 DO STF). TUTELA DE URGÊNCIA MANTIDA. PREFACIAL ACOLHIDA. RECURSO PREJUDICADO NO MÉRITO.(Agravo de Instrumento, Nº 50683082220258217000, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cristiane Da Costa Nery, Julgado em: 20-03-2025) (grifos meus)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO.
FORNECIMENTO DE TERAPIA ABA PARA TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS. INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO. NECESSIDADE.
I. Caso em exame: Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de tutela de urgência para obrigar o Município de Porto Alegre/RS ao fornecimento de terapia multidisciplinar pelo método ABA. II. Razões de decidir: A responsabilidade solidária dos entes federados abrange o dever de prestar assistência à saúde, observados os critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, conforme o Tema 793 do STF. Tratando-se de procedimento não padronizado no SUS, é necessária a inclusão da União no polo passivo da demanda, nos termos do item “v” do Tema 793, para eventual redirecionamento da obrigação e ressarcimento de custos. A Lei Estadual 15.322/2019, ao instituir o programa TEAcolhe, não exclui a responsabilidade do Estado e do Município, que respondem solidariamente pelas demandas em saúde. III. Tese de julgamento: O fornecimento de tratamento ou procedimento não padronizado no SUS exige a inclusão da União no polo passivo, em razão de sua competência para incorporação de novas terapias. A responsabilidade solidária dos entes federados permite o redirecionamento da obrigação e o ressarcimento de custos entre eles, conforme as regras de descentralização e hierarquização do SUS. RECURSO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50013652320258217000, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eliane Garcia Nogueira, Julgado em: 12-03-2025) (grifos meus)
Na mesma linha, foram exaradas decisões pela Primeira Vice-Presidência desta Corte, encaminhando acórdãos proferidos por esta e outras Câmaras que julgam a respectiva matéria, para eventual juízo de retratação:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SAÚDE. TEA.
TRATAMENTO. MÉTODO ABA. TEMA 793 DO STF.
AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO ENTE FEDERADO RESPONSÁVEL E ORDEM DE RESSARCIMENTO. PROCESSO ENCAMINHADO PARA ANÁLISE DE POSSIBILIDADE DE RETRATAÇÃO.(Agravo de Instrumento, Nº 51944154820248217000, Primeira Vice-Presidência, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ícaro Carvalho de Bem Osório, Julgado em: 14-01-2025) (grifos meus)
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SAÚDE. HOME CARE. TEMA 793 DO STF. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO ENTE FEDERADO RESPONSÁVEL E ORDEM DE RESSARCIMENTO. PROCESSO ENCAMINHADO PARA ANÁLISE DE POSSIBILIDADE DE RETRATAÇÃO. (Agravo de Instrumento, Nº 51982001820248217000, Primeira Vice-Presidência, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ícaro Carvalho de Bem Osório, Julgado em: 25-02-2025)
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SAÚDE. HOME CARE. TEMA 793 DO STF. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO ENTE FEDERADO RESPONSÁVEL E ORDEM DE RESSARCIMENTO. JULGADO MANTIDO EM SEDE DE JUÍZO DE RETRATAÇÃO. RECURSO ADMITIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50367451520228217000, Primeira Vice-Presidência, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ícaro Carvalho de Bem Osório, Julgado em: 28-02-2025)
Feitas tais ponderações, à luz da exegese consolidada no âmbito do Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, bem como das disposições constitucionais pertinentes e da incumbência conferida à autoridade judicial para direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências do Sistema Único de Saúde
, é patente, no caso concreto, a necessidade de inclusão da União no polo passivo da presente lide, ainda que isso implique deslocamento de competência.
Tal inclusão justifica-se pela busca da efetivação do direito postulado pela parte autora, de um lado, e pela operacionalização do sistema público de saúde, de outro.
Em razão disso, cabível facultar à parte autora a emenda da petição inicial perante o juízo de primeiro grau, a fim de incluir a União no polo passivo da ação.
Todavia, considerando-se a presença dos requisitos autorizadores da tutela de urgência, previsto no artigo 300 do CPC, notadamente diante da indicação de urgência e necessidade dos tratamentos vindicados no laudo que acompanha a inicial, sob pena de piora do estado clínico e comprometimento do desenvolvimento da criança, deve ser preservada a tutela de urgência parcialmente concedida na origem (
9.1
), até que sobrevenha nova apreciação da matéria pelo juízo competente ou, se for o caso, até eventual extinção do feito, nos termos do art. 64, § 4º, do CPC.
[...] "
Com efeito, a situação fática e jurídica apresentada no presente agravo de instrumento, interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul, é idêntica àquela analisada no recurso manejado pelo Município de Farroupilha, impondo-se, por coerência e uniformidade das decisões judiciais,
a adoção da mesma solução.
Assim, reitera-se a necessidade de inclusão da União no polo passivo da demanda, uma vez que o tratamento postulado (psicopedagogia com metodologia ABA) não se encontra padronizado no âmbito do SUS para o diagnóstico específico do autor, sendo atribuição do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC), a incorporação, exclusão ou alteração de novos procedimentos, conforme dispõe o artigo 19-Q da Lei nº 8.080/90.
A manutenção da tutela de urgência, por sua vez, justifica-se pela presença dos requisitos legais, notadamente o periculum in mora, evidenciado pela urgência do tratamento para o adequado desenvolvimento do infante, conforme laudo médico, e a probabilidade do direito, amparada na vasta legislação protetiva do direito à saúde de crianças e adolescentes com deficiência. Tal medida encontra respaldo no artigo 64, § 4º, do Código de Processo Civil, que permite a conservação dos efeitos da decisão proferida por juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente, bem como no artigo 115, parágrafo único, do mesmo diploma, que trata da necessidade de integração do polo passivo em caso de litisconsórcio necessário.
Por fim, ressalta-se que a presente análise se dá em sede de cognição sumária, própria desta fase processual. A discussão mais aprofundada acerca da imprescindibilidade do método ABA para o caso concreto, bem como a eventual ausência de comprovação acerca da ineficácia das terapias pelo método tradicional, disponíveis no SUS, não prescindirá o contraditório, será oportunamente realizada no julgamento colegiado.
Ante o exposto,
DEFIRO PARCIALMENTE O PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO
para determinar que, na origem, seja oportunizado à parte autora o prazo legal para emendar a petição inicial, a fim de incluir a União no polo passivo da demanda, nos termos do art. 115, parágrafo único, do CPC, mantendo-se, contudo, os efeitos da tutela de urgência deferida em parte pelo juízo singular (
9.1
), até nova deliberação pelo juízo competente, conforme autoriza o art. 64, § 4º, do Código de Processo Civil."
E acresço.
Os serviços de Psicopedagogia são disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde, devendo o cumprimento da medida judicial ocorrer,
preferencialmente, pela via pública
. A contratação por meio da rede privada somente se justifica em caso de comprovada ineficácia ou indisponibilidade da terapêutica ofertada pelo SUS.
Nessa toada, ainda que a ausência de requerimento administrativo prévio não impeça o acesso à jurisdição, nos termos do princípio da inafastabilidade (art. 5º, XXXV, da CF), tal circunstância deve ser valorada no contexto do caso concreto, sobretudo em sede de tutela de urgência.
No presente caso, não há qualquer elemento nos autos que comprove a tentativa de utilização do serviço público ou a ineficácia do método tradicional. Impõe-se, portanto, a devida cautela no manejo de recursos públicos, especialmente quando o tratamento requerido se encontra disponível na rede pública.
Assim, é caso de parcial provimento do recurso, a fim de que o cumprimento da medida liminar ocorra,
preferencialmente, por meio da rede pública
, até posterior deliberação do juízo competente ou extinção do feito, em observância ao disposto no art. 64, §4º, do CPC, reiterando-se, ainda, a necessidade de inclusão da União no polo passivo, nos termos do artigo 19-Q da Lei nº 8.080/90, em consonância com o Tema 793 da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Por fim, no que se refere ao prequestionamento, é prescindível a referência e enfrentamento direto aos dispositivos constitucionais e legais invocados pela parte, bastando a solução da controvérsia. Com efeito, a matéria já se encontra devidamente referida ao longo do acórdão, sendo desnecessário, aqui, reproduzir cada dispositivo legal. O órgão judicial não precisa se manifestar sobre todos os argumentos deduzidos pela parte, sendo suficiente expor os motivos do seu convencimento.
De qualquer forma, dou por prequestionada a matéria discutida.
Diante do exposto, em decisão monocrática,
DOU PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO
para determinar que, na origem, seja oportunizado ao autor o prazo legal para emendar a inicial, a fim de incluir a União no polo passivo da demanda, conforme o art. 115, parágrafo único, do CPC, mantendo-se os efeitos da tutela de urgência deferida pelo juízo singular (
Evento 9.1
), com o cumprimento preferencial na rede pública de saúde, até nova deliberação pelo juízo competente, nos termos do art. 64, § 4º, do CPC.
Intime-se as partes.
Diligências legais.
Porto Alegre, 30 de junho de 2025.
1. https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/protocolos/20220419_portal-portaria_conjunta_7_comportamento_agressivo_tea.pdf/view
2. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12401.htm
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear