Marilene Da Silva x Agibank Financeira S.A. - Credito, Financiamento E Investimento
ID: 332163722
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5109159-30.2024.8.24.0930
Data de Disponibilização:
23/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO
OAB/AL XXXXXX
Desbloquear
DAVID EDUARDO DA CUNHA
OAB/SC XXXXXX
Desbloquear
Apelação Nº 5109159-30.2024.8.24.0930/SC
APELANTE
: MARILENE DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: DAVID EDUARDO DA CUNHA (OAB SC045573)
APELADO
: AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTI…
Apelação Nº 5109159-30.2024.8.24.0930/SC
APELANTE
: MARILENE DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: DAVID EDUARDO DA CUNHA (OAB SC045573)
APELADO
: AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)
ADVOGADO(A)
: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO (OAB AL010715A)
DESPACHO/DECISÃO
1.1) Da inicial.
MARILENE DA SILVA
ajuizou Ação de Revisão de Contrato em face do AGIBANK FINANCEIRA S.A. - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, alegando em síntese, que firmou contrato de empréstimo pessoal, a ser pago em 01 parcela de R$ 484,80.
Aduziu a ocorrência de onerosidade excessiva da obrigação, pois as cobranças ilegais e abusivas tornaram as prestações incertas e ilíquidas, e portanto, inexigíveis.
Quanto ao mérito, pugnou pela: I) limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN à época da contratação; II) afastar a mora; III) determinar a repetição de indébito dos valores pagos indevidamente, determinando a compensação dos créditos/débitos.
Ao final, pugnou pela condenação do requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios e a concessão da Justiça Gratuita.
Atribuiu valor à causa e juntou documentos (evento 1, docs. 2/12).
1.2) Da contestação.
Devidamente citado, o requerido apresentou resposta, em forma de contestação, sustentando, preliminarmente, a inépcia da inicial, a ausência de interesse de agir.
No mérito, a licitude do contrato, a legalidade dos juros e das demais taxas pactuadas, requerendo a improcedência da ação.
1.3) Do encadernamento processual.
Determinou-se a emenda da inicial (evento 5).
Petição no evento 10.
Manifestação sobre a contestação ausente.
1.4) Da sentença.
Prestando a tutela jurisdicional, a Dra. GRAZIELA SHIZUIHO ALCHINI prolatou sentença, nos termos:
Diante do exposto, com base nos arts. 485, I e 321, parágrafo único, do CPC,
INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL
e julgo extinto o feito sem resolução de mérito.
Com a conclusão implementada, condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00, diante do comparecimento espontâneo da parte ré, eis que ora indefiro o pedido de justiça gratuita em razão da não comprovação da hipossuficiência alegada, já que possui vínculo empregatício, porém não comprovou os rendimentos obtidos, tampouco a existência de gastos fixos ou extraordinários que a impossibilitem de arcar com as despesas do processo.
A propósito, frise-se que
"o reconhecimento da má-fé da autora é incompatível com a concessão do benefício da justiça gratuita, porquanto estar-se-ia atribuindo ao Poder Judiciário e à sociedade o ônus de arcar com as despesas decorrentes de aventuras jurídicas infundadas e contrárias à ética e à boa-fé processual."
(TJSC, Apelação n. 5021306-36.2020.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 7-6-2022).
Em razão da caracterização da litigância de má-fé, condeno a parte autora ao pagamento de multa no importe de um salário-mínimo vigente (art. 81, § 2º, do CPC).
1.5) Do recurso.
Inconformada com a prestação jurisdicional, a parte autora interpôs o presente recurso de Apelação Cível, aduzindo a concessão da justiça gratuita, a desnecessidade de procuração específica, a procuração digital anexada, a multa pela litigância de má-fé, a desnecessidade de unificação das demandas, requerendo a cassação da sentença e o seu regular prosseguimento.
1.6) Das contrarrazões
Contrarrazões aportadas (evento 29).
Este é o relatório.
Decido.
2.1) Da admissibilidade recursal
A parte autora pleiteou a concessão do pedido de justiça gratuita.
Acerca do assunto, o Código de Processo Civil, em substituição a Lei nº. 1.060/50, dispõe:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. [...]
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. [...]
§ 2 o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
§ 3 o Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.
Considerando os documentos presentes aos autos (eventos 1, 10), sobretudo os contracheques acostados, somada a natureza da ação proposta, vislumbra-se, pelo menos por ora, uma condição de hipossuficiência apta a autorizar a concessão do benefício, uma vez que o pagamento das custas processuais poderá aniquilar a chance de sobrevivência digna da parte autora.
Dessa forma, defiro o benefício da justiça gratuita, dispensando assim, o recolhimento do preparo.
De minha relatoria:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. ADMISSIBILIDADE. JUSTIÇA GRATUITA. PEDIDO REALIZADO PELA PARTE AUTORA. PRESUNÇÃO RELATIVA CONFORTADA PELA PROVA DOCUMENTAL. NECESSIDADE DO BENEPLÁCITO DEMONSTRADA. JUSTIÇA GRATUITA DEFERIDA. [...] (TJSC, Apelação n. 5007960-96.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 21-03-2024).
Logo, conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, dispensado o recolhimento do preparo e evidenciados o objeto e a legitimação.
Ab initio,
deixo de apreciar as teses de impugnação à justiça gratuita e ausência de condições da ação arguidas em contrarrazões (evento 29), pois a via eleita é inadequada para obter a reforma da decisão judicial.
2.2) Do julgamento na forma do art. 932 do CPC
O Código de Processo Civil, com o intuito de promover a celeridade da prestação jurisdicional, em seu art. 932, trouxe a possibilidade julgamento monocrático em determinadas circunstâncias. Veja-se:
Art. 932. Incumbe ao relator: [...]
III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida;
IV - negar provimento a recurso que for contrário a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
VI - decidir o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando este for instaurado originariamente perante o tribunal;
VII - determinar a intimação do Ministério Público, quando for o caso;
VIII - exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal.
Aliás, é a orientação deste Tribunal no art. 132 do Regimento Interno.
Art. 132. São atribuições do relator, além de outras previstas na legislação processual: [...]
XIII – negar seguimento a recurso nos casos previstos em lei;
XIV – não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida;
XV – negar provimento a recurso nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça;
Ainda, tem-se a Súmula 568, do STJ: "
O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.
".
Nesse sentido, desta Câmara:
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU E NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INSURGÊNCIA PRELIMINAR NO SENTIDO DE QUE O APELO NÃO PODERIA TER SIDO JULGADO POR VIA MONOCRÁTICA. TESE INACOLHIDA. RECLAMO CONTRÁRIO A SÚMULAS E ENTENDIMENTOS SEDIMENTADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM JULGAMENTO DE RECURSOS REPRESENTATIVOS DE CONTROVÉRSIA. INTELIGÊNCIA DO ART. 932, INC. IV, ALÍNEAS "A" E "B", DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo n. 0301717-13.2014.8.24.0010, de Braco do Norte, rel. Des. Rogério Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 27-07-2017).
Ademais, qualquer que seja a decisão do relator, está assegurado a parte, nos termos do art. 1.021, do CPC, a interposição de agravo interno. No entanto, cumpre destacar que em eventual manejo deste recurso, "
o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada
" (§ 1º do art. 1.021), "
[...] de forma a demonstrar que não se trata de recurso inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante, sob pena de, não o fazendo, não ter o seu agravo interno conhecido.
" (TJSC, Agravo Interno n. 4025718-24.2019.8.24.0000, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 13-02-2020).
Portanto, diante do exposto, torna-se pertinente o julgamento do presente reclamo, na forma do art. 932, do CPC, já que a discussão de mérito será resolvida com o entendimento dominante do STJ e desta Corte.
2.3) Do mérito
2.3.1) Da unificação de ações
Antes de adentrar a análise do caso concreto, convém destacar que o interesse de agir, entendido também como interesse processual, demanda que, em um exame superficial da narrativa trazida ao Poder Judiciário, a pretensão não tenha sido resolvida extrajudicialmente, bem como dele surja um proveito à parte postulante, um benefício. Haja uma modificação real e não apenas jurídica.
Dispõe a Lei Processual:
Art. 19. O interesse do autor pode limitar-se à declaração:
I - da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica;
II - da autenticidade ou da falsidade de documento.
É da lição de Fredie Didier Jr.:
O exame do interesse de agir (interesse processual) passa pela verificação de duas circunstâncias: a) utilidade e b) necessidade do pronunciamento judicial. Há quem acrescente, ainda, a 'adequação do remédio judicial ou procedimento' como elemento necessário à configuração do interesse de agir, posição com a qual não concordamos, pois procedimento é dado estranho no estudo do direito de ação e, ademais, eventual equívoco na escolha do procedimento é sempre sanável (art 250 e 295, V, do CPC-73). (DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil e processo de conhecimento. 15 ed. rev., ampl. e atual.. Salvador: Editora JusPODIVM, 2013. p. 246)
No mesmo sentido, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery destacam que "
existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático
". (Nery Junior, Nelson. Código de processo civil comentado e legislação extravagante / Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery. - 11. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 526).
A jurisprudência desta Corte não destoa:
APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. BENEFICIÁRIO APOSENTADO. DEMISSÃO. MANUTENÇÃO APÓS. - EXTINÇÃO NA ORIGEM. INTERESSE DE AGIR. PLANO DE SAÚDE. POSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO. PROSSEGUIMENTO. ACOLHIMENTO. - "Há interesse de agir quando é possível constatar, ainda que num exame superficial, ser necessária a demanda, por aparentar a pretensão não ter encontrado solução na esfera extrajudicial; útil, vez que a pretensão formulada, se acolhida, gerará ao autor o benefício pretendido; e, por fim, adequada - ainda que dispensável tal requisito -, eis que adotados procedimento e via próprias" (TJSC, AC n. 2015.051466-0, deste relator, j. em 22.02.2016). - Configura-se o interesse de agir se a parte, demitida e ciente da prorrogação do plano por tempo certo, depara-se com a iminente cessação e, além disso, faz ver a utilidade da pretensão. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0306924-69.2015.8.24.0038, de Joinville, rel. Henry Petry Junior, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 20-02-2017).
In casu,
a parte requerente pretende a revisão do contrato nº 1240098605 (evento 1, CONTR12), ante a inconformidade com os juros remuneratórios, descaracterização da mora e repetição de indébito, submetendo ao crivo do judiciário as cláusulas que entende abusiva.
A ausência de apresentação de cadeia negocial do contrato ou a existência de outras ações da parte autora deflagrada contra instituição financeira ré não tem condão de retirar o interesse de agir da parte. Trata-se de negociações distintas, e portanto, desvinculadas para discussão em juízo.
Ademais, a propositura de mais de uma ação buscando discutir irregularidades contratuais, desde que sejam contratos diferentes com observância da norma processual, não encontra vedação legal e não pode ser suprimida como feito.
Certamente a unificação de demandas similares garante uma prestação jurisdicional mais célere e deveria ser interesse de todos os litigantes. Entretanto, os requisitos impostos à parte na origem não encontram correspondência na norma vigente.
Nesse sentido, desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL, EXTINÇÃO COM FULCRO NO ART. 321, PARÁGRAFO ÚNICO, C/C ART. 485, INCISO I, AMBOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INSURGÊNCIA DA DEMANDANTE. DETERMINAÇÃO DO JUÍZO DE APRESENTAÇÃO DA CADEIA NEGOCIAL RELACIONADA AO CONTRATO SUB JUDICE E REUNIÃO DAS DEMANDAS EM UM ÚNICO PROCESSO. DIVERSOS PACTOS FIRMADOS ENTRE AS PARTES AUTÔNOMOS ENTRE SI. LEGALIDADE DA PROPOSITURA DE MAIS DE UMA AÇÃO REVISIONAL. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. FACULDADE DO CONSUMIDOR. INTERESSE PROCESSUAL DA AUTORA EVIDENCIADO. PRECEDENTES DESTA CORTE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. IMPOSSIBILIDADE, CONTUDO, DE APLICAÇÃO DO ART. 1.013, § 3°, I, CPC/15. NECESSIDADE DE RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5005324-35.2024.8.24.0054, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Machado Junior, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 29-05-2025).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL E DE EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. INTERESSE DE AGIR. PROPOSITURA DE MÚLTIPLAS AÇÕES REVISIONAIS CONTRA O MESMO RÉU, TODAVIA COM CAUSAS DE PEDIR DISTINTAS. INEXISTÊNCIA DE COMANDO LEGAL A IMPOR O AJUIZAMENTO DE DEMANDA ÚNICA PARA DISCUSSÃO DE CONTRATOS DIVERSOS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. A sentença indeferiu a petição inicial e extinguiu a ação revisional de contrato bancário. A parte autora apelou argumentando ter interesse de agir, alegando a possibilidade de múltiplas ações revisionais contra o mesmo réu baseadas em negócios jurídicos distintos. Solicitou que o recurso fosse provido para desconstituir a decisão e que os autos retornassem à origem para o prosseguimento regular da demanda, além de pedir o afastamento da multa por litigância de má-fé. Alternativamente, pediu a redução da multa ao mínimo legal e a dispensa das custas processuais. A parte ré, em contrarrazões, alegou violação ao princípio da dialeticidade. [...] III. RAZÕES DE DECIDIR [...] 5. Interesse de agir: A possibilidade de ajuizamento de múltiplas ações revisionais contra o mesmo réu foi reconhecida, uma vez que não há previsão legal que impeça tal prática, considerando que as ações discutem contratos distintos e não há risco de decisões conflitantes. Sentença desconstituída. Retorno dos autos à origem para o regular prosseguimento do feito. [...] IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso provido. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 5º, inciso LXXIV, art. 85, art. 98, art. 99, § 3º, art. 319; CPC, art. 321, parágrafo único; CPC, art. 485, inciso I; CPC, art. 1.013, § 3º. Jurisprudência relevante citada: TJSC, Ap. Cív. n. 5049493-98.2024.8.24.0930, rel. Des. Vitoraldo Bridi, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 03-12-24. (TJSC, Apelação n. 5050573-97.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Andre Alexandre Happke, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 15-05-2025).
APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA QUE INDEFERIU A INICIAL, DIANTE DO NÃO CUMPRIMENTO A ORDEM DE EMENDA, CONSISTENTE NA REUNIÃO DE TODOS OS CONTRATOS QUE A PARTE AUTORA PRETENDE DISCUTIR/REVISAR E TODOS OS PEDIDOS EM UM ÚNICO PROCESSO. RECURSO DO POLO DEMANDANTE. [...] PRETENDIDA CASSAÇÃO DO DECRETO EXTINTIVO, AO ARGUMENTO DE SER INDEVIDO O INDEFERIMENTO DA INICIAL. SUBSISTÊNCIA DA SÚPLICA. AJUSTES DISTINTOS, EMBORA FIRMADOS COM O MESMO BANCO. MULTIPLICIDADE DE AÇÕES QUE NÃO É VEDADA POR LEI. INEXISTÊNCIA, ADEMAIS, DE RISCO DE DECISÕES CONFLITANTES. CUMULAÇÃO DOS PLEITOS REVISIONAIS EM UMA ÚNICA DEMANDA QUE SE TRATA DE FACULDADE DA PARTE. ATO JUDICIAL TERMINATIVO CASSADO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA PROSSEGUIMENTO DO FEITO. IRRESIGNAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. (TJSC, Apelação n. 5120558-90.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Tulio Pinheiro, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 03-12-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. RECURSO DA PARTE AUTORA. NÃO OBRIGATORIEDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO ÚNICA PARA DISCUSSÃO DE CONTRATOS DIVERSOS. CAUSAS DE PEDIR DISTINTAS. CUMULAÇÃO DE AÇÕES QUE NÃO É VEDADA POR LEI. FACULDADE DA PARTE. NECESSIDADE E UTILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. SENTENÇA CASSADA. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5049493-98.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Vitoraldo Bridi, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 03-12-2024).
Desta Primeira Câmara de Direito Comercial:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. INSURGÊNCIA DO DEMANDANTE. [...] AVENTADA IMPOSSIBILIDADE DO INDEFERIMENTO DA INICIAL E AFASTAMENTO DA MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. TESE ACOLHIDA, POR FUNDAMENTO DIVERSO. INICIAL DA AUTORA QUE PREENCHE OS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 330, §2º, DO CPC. PROCURAÇÃO VÁLIDA. EXISTÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL DO DEMANDANTE. OUTROSSIM, NÃO VERIFICADA HIPÓTESE DE CONEXÃO DOS FEITOS. AJUIZAMENTO DE VÁRIAS AÇÕES PELO AUTOR EM FACE DA MESMA CASA BANCÁRIA QUE VERSAM SOBRE CONTRATOS DISTINTOS. AUSÊNCIA DE RISCO DE PROLAÇÃO DE DECISÕES CONFLITANTES. ALÉM DISSO, CUMULAÇÃO DOS PEDIDOS REVISIONAIS EM UMA ÚNICA DEMANDA QUE SE TRATA DE FACULDADE DA PARTE. CONDUTA QUE NÃO SE AMOLDA À NENHUMA DAS HIPÓTESES DO ART. 80, DO CPC. DEVIDO AFASTAMENTO DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. SENTENÇA REFORMADA. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA CAUSA MADURA. RETORNO DO FEITO À ORIGEM PARA O DEVIDO PROCESSAMENTO E JULGAMENTO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5035180-35.2024.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 06-02-2025).
Para complementar, de minha relatoria:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO (INDEFERIMENTO DA INICIAL). INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. [...] MÉRITO. DEMANDA REVISIONAL QUE BUSCA DISCUTIR ABUSIVIDADE DE TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. INTERESSE PROCESSUAL DA PARTE EVIDENCIADO. DETERMINAÇÃO DO JUÍZO DE APRESENTAÇÃO DA CADEIA NEGOCIAL RELACIONADA AO CONTRATO SUB JUDICE QUE SE MOSTRA DESNECESSÁRIA. CONTRATOS DISTINTOS. AUSÊNCIA DE REQUISITOS. LEGALIDADE DA PROPOSITURA DE MAIS DE UMA AÇÃO BUSCANDO DISCUTIR RELAÇÕES NEGOCIAIS DISTINTAS ENTRE AS PARTES. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. FACULDADE DA PARTE. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RETORNO À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO DO FEITO. [...] RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5037860-27.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 16-05-2024).
Assim sendo, o presente recurso é provido, tornando desnecessária a reunião de eventuais ações conexas.
Por consequência, não há falar em condenação pela litigância de má-fé.
Contudo, considerando que o processo encontra-se apto para julgamento, passa-se a análise das teses trazidas, na forma do art. 1.013, § 3º, inciso I, da Lei Processual.
2.3.2) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor
.
Primeiramente, cabe ressaltar que o contrato realizado entre as partes é regido pelas regras do Código de Defesa do Consumidor, pois presentes os pressupostos consumeiristas (arts. 2º e 3º, parágrafo 2º, CDC), configurando a parte autora como consumidora e a parte ré como fornecedora do serviço de natureza financeira/creditícia.
Inclusive, a matéria restou pacificada, nos termos da Súmula 297 do STJ, sendo aplicável a Lei 8.078/90 às instituições financeiras, conforme se depreende dos julgados abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PRESCRIÇÃO [...] INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. SÚMULA 297/STJ. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO A 12% AO ANO.
[...] 3. A discussão acerca da incidência do Código de Defesa do Consumidor nos contratos celebrados por instituições financeiras ficou superada nesta Corte com a edição da Súmula 297/STJ, que assim dispõe: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." [...]. (REsp 1570268/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/09/2016, DJe 11/10/2016)
E nesse sentido, o Tribunal Catarinense já decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CRÉDITO PESSOAL CONSIGNADO PARA TRABALHADORES DO SETOR PÚBLICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO "PACTA SUNT SERVANDA". INCIDÊNCIA DA SÚMULA 297 DO STJ, ALIADA À INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 6º, V, E 51, IV, DO CDC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, QUE NÃO IMPLICA NA IMEDIATA PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. [...] (TJSC, Apelação n. 5078651-38.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Newton Varella Junior, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 29-02-2024).
E:
APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIAS DE AMBAS AS PARTES. [...] 2 - AVENTADA INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DESCABIMENTO DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. TESES RECHAÇADAS. RELAÇÃO DE CONSUMO. SÚMULA 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE ENTENDE APLICÁVEL O CDC ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. PARTE AUTORA HIPOSSUFICIENTE TÉCNICA E FINANCEIRAMENTE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA ADMISSÍVEL NOS TERMOS DO ART. 6º, VIII, DO CDC. RECURSO DESPROVIDO. [...] (TJSC, Apelação n. 5003051-71.2021.8.24.0092, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 07-03-2024).
Por conseguinte, declara-se a mitigação das regras de direito privado aplicáveis ao contrato firmado, em razão da existência de uma relação de consumo, que se faz necessária a aplicação dos preceitos contidos no Código de Defesa do Consumidor, haja vista tratar-se de uma norma de ordem pública (art. 1º).
Por fim, destaca-se que a apreciação jurisdicional limitar-se-á aos pedidos expostos, pois, muito embora promova-se a aplicação do CDC, ao juiz é defeso promover a revisão
ex officio
de todas as cláusulas contratuais firmadas (Súmula 381 do STJ).
2.3.3) Juros Remuneratórios.
Sustenta a parte apelante abusividade dos juros remuneratórios, pois pactuados em patamar superior à taxa média de mercado.
Para facilitar o raciocínio a seguir estampado, convém registrar que é de conhecimento de todos os operadores jurídicos que o art. 192, § 3º da Constituição Federal, que outrora estabeleceu a limitação dos juros em 12% ao ano, restou revogado pela Emenda Constitucional n. 40 de 29/05/2003, ao argumento de que sua aplicabilidade estava condicionada à edição de legislação infraconstitucional.
É o que dispõe a Súmula 648 do STF e a Súmula Vinculante n. 07:
A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela EC 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar.
Neste condão, tendo em vista a ausência de legislação específica a disciplinar a aplicabilidade dos juros remuneratórios no patamar de 12% ao ano, inconcebível sua incidência no caso em comento.
Em verdade, a limitação dos juros remuneratórios, frente a omissão constitucional e legislativa está pautada na existência ou não de índices que reflitam abusividade capaz de macular/afrontar o equilíbrio contratual e gerar uma onerosidade excessiva ao consumidor e consequentemente um enriquecimento do banco.
Por fim, convém contemplar na presente decisão a inaplicabilidade dos termos legais constantes do Decreto 22.626/33 frente as instituições financeiras. Inteligência encartada na Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal,
in verbis
:
As disposições do Decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional.
Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. PROCESSUAL CIVIL. OMISSÃO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. REVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ.
1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte.
2. A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, submetido a regime dos recursos repetitivos, firmou posicionamento no sentido de que:
a) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto nº 22.626/1933) e Súmula nº 596/STF; b) a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% (doze por cento) ao ano, por si só, não indica abusividade; c) inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591, c/c o art. 406, do CC/2002, e d) admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, haja vista as peculiaridades do julgamento concreto.
3. Na hipótese, para rever a conclusão do acórdão recorrido acerca dos juros remuneratórios, seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos e a interpretação da cláusula contratual, procedimentos vedados pelas Súmulas nºs 5 e 7/STJ.
4. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp n. 2.025.468/RS, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 3/5/2023, DJe de 10/5/2023.)
Desta forma, pode-se concluir que a taxa de juros remuneratórios não sofre a limitação indicada no já revogado § 3º do art. 192 da Constituição Federal.
Todavia, embora o índice dos juros remuneratórios não esteja vinculado a limitação disposta na norma constitucional supra citada, a jurisprudência pátria e até mesmo os Enunciados I e IV do Grupo de Câmaras de Direito Comercial, anotam que é possível estabelecer limitação/redução quando superior àqueles praticados pelo mercado financeiro e dispostos na tabela emitida pelo Banco Central do Brasil.
I - No contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil.
IV - Na aplicação da Taxa médias de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS sob o rito do recurso repetitivo, consolidou a orientação n. 1,
in verbis
:
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d)
É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e
que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto
.
(REsp n. 1.061.530/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009.)
Sabe-se que a taxa média de mercado divulgada pelo Bacen provêm da média dos juros operados pelas instituições financeira para o contrato específico, contemplando, inclusive, o risco do crédito concedido.
No entanto, a referida taxa serve apenas como um referencial para averiguar a abusividade dos juros remuneratórios, de modo que devem ser analisadas as peculiaridades do caso concreto, conforme delimitado no julgamento do REsp n. 2.009.614/SC, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi:
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. REVISÃO. CARÁTER ABUSIVO. REQUISITOS. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. 1- Recurso especial interposto em 19/4/2022 e concluso ao gabinete em 4/7/2022.
2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" não descritas na decisão, acompanhada ou não do simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média praticada no mercado, é suficiente para a revisão das taxas de juros remuneratórios pactuadas em contratos de mútuo bancário; e b) qual o incide a ser aplicado, na espécie, aos juros de mora.
3- A Segunda Seção, no julgamento REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, fixou o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
4-
Deve-se observar os seguintes requisitos para a revisão das taxas de juros remuneratórios: a) a caracterização de relação de consumo; b) a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada; e c) a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.
5-
São insuficientes para fundamentar o caráter abusivo dos juros remuneratórios: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" - ou outra expressão equivalente; b) o simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média de mercado divulgada pelo BACEN e c) a aplicação de algum limite adotado, aprioristicamente, pelo próprio Tribunal estadual.
6- Na espécie, não se extrai do acórdão impugnado qualquer consideração acerca das peculiaridades da hipótese concreta, limitando-se a cotejar as taxas de juros pactuadas com as correspondentes taxas médias de mercado divulgadas pelo BACEN e a aplicar parâmetro abstrato para aferição do caráter abusivo dos juros, impondo-se, desse modo, o retorno dos autos às instâncias ordinárias para que aplique o direito à espécie a partir dos parâmetros delineados pela jurisprudência desta Corte Superior. 7- Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 2.009.614/SC, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 30/9/2022).
Logo, conclui-se que de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça o simples fato das taxas de juros remuneratórios contratadas estarem acima da taxa média de mercado não é capaz, por si só, de caracterizar a sua abusividade.
Assim, sob essa nova diretriz, tem-se que é imprescindível aferição detalhada das peculiaridades do caso em concreto, com o intuito de garantir que a intervenção do Poder Judiciário seja revestida de segurança e certeza quanto ao juízo acerca da abusividade dos juros remuneratórios.
Diante disso, deve-se verificar as seguintes variáveis do caso em concreto para o reconhecimento da abusividade dos juros remuneratórios, quais sejam:
a) existência de relação de consumo;
b) existência de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada;
c) demonstração cristalina da "[...]
situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas
"
(
REsp n. 2.009.614/SC, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 30/9/2022).
A partir disso, passo para apreciação do caso em comento:
No caso, compulsando os elementos que formaram o conjunto probatório, observa-se que as partes firmaram contrato n. 1240098605, no valor de R$250,90, a ser pago em 01 parcela de R$484,80 com desconto em conta corrente (evento 1, CONTR12).
A taxa de juros anual contratada é 137,38% ao ano. Em consulta à tabela das taxas médias de mercado do Banco Central do Brasil, verifica-se que, no momento da celebração da avença entre as partes (25/11/2022), a taxa anual média estipulada foi de 86,35% ao ano (série temporal n. 20742).
Nesse sentido, a partir dos requisitos estabelecidos no REsp n. 2.009.614/SC, constata-se do caso em comento que:
a) a relação contratual entre as partes é de consumo (Súmula 297 STJ);
b) os juros remuneratórios contratados estão demasiadamente acima da taxa média de mercado, o que coloca o consumidor em desvantagem absurdamente exagerada;
c) não há garantia contratual, bem como não há informações sobre a situação da economia na época da pactuação, do custo da captação dos recursos, do risco envolvido na operação em comento e do relacionamento do consumidor com a instituição financeira.
Logo, a instituição financeira não instruiu os autos com as circunstâncias do caso em comento que foram submetidas a apreciação quando da assinatura do contrato, socorrendo-se única e exclusivamente das decisões do Superior Tribunal de Justiça, ao afirmar que a taxa média de mercado não é parâmetro único e exclusivo.
Portanto, em que pese a forma de pagamento do contrato seja em débito em conta e não consignado, bem como, não fora ofertada garantia, porém, repisa-se não há qualquer informação que a parte autora possuía protestos ou restrição de seu nome em órgão de proteção ao crédito quando da contratação ou até mesmo sobre a sua inadimplência. Ou seja, não há nos autos qualquer prova que demonstre os indicativos sobre o resultado da análise do perfil de risco de crédito a ser concedido à parte autora.
Até porque, não só pela vulnerabilidade técnica e inquestionável hipossuficiência do consumidor, fatores que permitem a inversão do ônus da prova, é "[...]
do banco o ônus de provar documentalmente nos autos as motivações que levaram a impor taxas de juros que ultrapassam substancialmente a média de mercado para aquele período aquisitivo, envolvendo singularidades próprias e especificidades da contratação
" (TJSC, Apelação n. 5004246-79.2020.8.24.0075, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rocha Cardoso, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 19-10-2023), até porque há dados - spread bancário - que não são alcançáveis pelo consumidor, configurando prova diabólica.
Entendimento implementado pelas Câmaras de Direito Comercial desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. SENTENÇA QUE DECLAROU A ABUSIVIDADE E REDUZIU A TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO COM ACRÉSCIMO DE 50%. PERCENTUAL PACTUADO EM CONTRATO QUE DEMONSTRA SIGNIFICATIVA DIFERENÇA EM RELAÇÃO À TAXA MÉDIA DIVULGADA PELO BACEN. AUSÊNCIA DE PROVAS A JUSTIFICAREM EXTRAPOLAÇÃO EM PATAMAR TÃO CONSIDERÁVEL. ÔNUS DA PROVA QUE CABIA À CASA BANCÁRIA. ART. 373, II, DO CPC. CASO DOS AUTOS EM QUE SE MOSTRA RECOMENDÁVEL LIMITAR OS JUROS REMUNERATÓRIOS. RECURSO SOMENTE DO RÉU. PRINCÍPIO DA "NON REFORMATIO IN PEJUS". SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO NO PONTO. A jurisprudência dominante prevê a revisão e limitação dos juros fixados à taxa média de mercado, sem acréscimo de 50% ou qualquer outro valor, entretanto, sendo a matéria atacada apenas parte ré/banco, em respeito ao princípio da "non reformatio in pejus", fica mantida a sentença. [...] (TJSC, Apelação n. 5058524-79.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Joao Marcos Buch, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 27-08-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. TOGADO A QUO QUE JULGOU PROCEDENTES OS PEDIDOS DEDUZIDOS NA EXORDIAL. INCONFORMISMO DO RÉU. [...] JUROS REMUNERATÓRIOS. ADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL N. 1.061.530/RS, DE QUE TRATA A MULTIPLICIDADE DE RECURSOS COM FUNDAMENTO IDÊNTICO À QUESTÃO DE DIREITO, COMO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO, SOB A RELATORIA DA MINISTRA NANCY ANDRIGHI, QUE ESTIPULOU: (1) A AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA ESTIPULAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS SUPERIORES A 12% AO ANO; (2) A POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUANDO CARACTERIZADA A RELAÇÃO DE CONSUMO E A ABUSIVIDADE RESTAR CABALMENTE DEMONSTRADA, ANTE AS PECULIARIDADES DO JULGAMENTO EM CONCRETO. ANÁLISE CONFORME OS PARÂMETROS DITADOS NO RESP REPETITIVO N. 1.061.530/RS E RESP N. 2.009.614/SC. CASO VERTENTE EM QUE: I) RESTOU CONFIGURADA A RELAÇÃO DE CONSUMO; II) A AUTORA FOI EXPOSTA A TAXA DE JUROS PACTUADA EXCESSIVAMENTE ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO; III) O BANCO NÃO VERTEU SEQUER JUSTIFICATIVA ACERCA DA ENORME DISCREPÂNCIA DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUANDO O ÔNUS ERA SEU, POR SE TRATAR DE RELAÇÃO DE CONSUMO. ABUSIVIDADE INESCONDÍVEL. LIMITAÇÃO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS AO TETO VEICULADO PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL QUE RESULTA IMPERATIVA. SENTENÇA PRESERVADA. [...] (TJSC, Apelação n. 5076842-47.2022.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. José Carlos Carstens Kohler, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 27-08-2024).
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIAS DE AMBAS AS PARTES. [...] II - APELO DA PARTE AUTORA 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS. POSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DO BACEN, QUANDO CONSTATADA ABUSIVIDADE. CONTRATO DE FINANCIAMENTO QUE APRESENTA TAXAS PACTUADAS EM PERCENTUAIS CONSIDERAVELMENTE ACIMA DA TAXA MÉDIA DO BACEN PARA A ESPÉCIE DE OPERAÇÃO NO PERÍODO DA CONTRATAÇÃO. LIMITAÇÃO NECESSÁRIA. AUSÊNCIA DE PROVAS POR PARTE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUANTO AOS FATORES QUE JUSTIFICARAM REFERIDA DISPARIDADE. RECURSO PROVIDO NO PONTO. [...] (TJSC, Apelação n. 5020254-43.2023.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Dinart Francisco Machado, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 22-08-2024).
Do Tribunal de Justiça Gaúcho:
“Cumpre destacar que, embora a instituição financeira justifique a cobrança de juros mais elevadas em razão do risco da operação, sob a alegação do alto índice de inadimplência dos servidores estaduais e do custo da captação dos recursos, comparado ao custo de outras operações disponíveis no mercado, no presente caso, tais situações não autorizam a aplicação de juros em patamar tão superior à média de mercado divulgada pelo Banco Central, haja vista que os alegados riscos da operação de crédito, que sequer foram demonstrados na espécie, devem ser suportados pela própria instituição financeira e não pelo consumidor.” (Apelação Cível, Nº 51040197520218210001, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cairo Roberto Rodrigues Madruga, Julgado em: 28-06-2023)
Desse modo, a instituição financeira ao ceder o crédito deve/pode avaliar o risco do negócio e, não simplesmente, pela modalidade de contrato, submeter o consumidor a uma taxa de juros que destoa de forma excessiva em relação a taxa média de mercado, sem que haja quaisquer informações sobre as circunstâncias do caso concreto no momento da assinatura do contrato.
No entanto, a instituição financeira ré não se desincumbiu do seu ônus de demonstrar que a parte autora possuía perfil de alto risco de inadimplência capaz de ensejar na aplicação da taxa de juros em percentual tão elevado em comparação com a taxa média de mercado, a qual serve apenas como referencial e não como um limitador.
Já decidiu esta e. Câmara:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA QUE LIMITA AS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADAS À MÉDIA DE MERCADO, DETERMINANDO A REPETIÇÃO DE INDÉBITO/COMPENSAÇÃO, NA FORMA SIMPLES, DE EVENTUAIS VALORES COBRADOS A MAIOR DA PARTE AUTORA, DESCARACTERIZANDO A MORA E CONDENANDO A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS PELA CASA BANCÁRIA (EM RELAÇÃO ÀS TAXAS DE JUROS UTILIZADAS COMO PARÂMETRO DE MERCADO) CUJA REJEIÇÃO IMPORTOU NA SUA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE MULTA FIXADA PELO JUÍZO DE ORIGEM.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA
1. REVISÃO DE CONTRATO. POSSIBILIDADE DE AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS REPUTADAS ILEGAIS SEREM OBJETO DE REVISÃO. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO CONCRETA DAS CLÁUSULAS IMPUGNADAS.
2.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO LEGAL À TAXA CONTRATADA. TAXA MÉDIA QUE NÃO CONSTITUI UM TETO, MAS, SIM, UM PARÂMETRO DE COMPARAÇÃO PARA AFERIR A ABUSIVIDADE DE TAXAS QUE DELA SE DISTANCIEM DE FORMA IRRAZOÁVEL, HIPÓTESE EM QUE AUTORIZADA A INTERVENÇÃO JUDICIAL PARA O FIM DE REDUÇÃO DA TAXA PACTUADA. TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADAS QUE, NO CASO CONCRETO, EXTRAPOLAM DEMASIADAMENTE A MÉDIA PRATICADA PELO MERCADO EM OPERAÇÕES DA MESMA NATUREZA NOS RESPECTIVOS PERÍODOS DE CONTRATAÇÃO. ONEROSIDADE EXCESSIVA VERIFICADA. CONTEXTO EM QUE OS ÍNDICES CONTRATADOS DEVEM SER LIMITADOS ÀS MÉDIAS DE MERCADO DIVULGADAS PELO BACEN
PARA OS RESPECTIVOS PERÍODOS.
PRECEDENTES DA CORTE SUPERIOR E DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NECESSÁRIA REFORMA DA SENTENÇA, NO ENTANTO, PARA CORRIGIR AS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS FIXADAS COMO LIMITE EM RELAÇÃO A DOIS DOS QUATRO CONTRATOS REVISADOS OBJETOS DOS AUTOS, TENDO EM VISTA QUE O TOGADO SINGULAR UTILIZOU, QUANTO A ELES, ÍNDICE INADEQUADO, DE MODALIDADE DIVERSA DAQUELAS EM QUE SE ENQUADRAM OS MENCIONADOS PACTOS IMPUGNADOS.
[...]
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5042443-89.2022.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 14-12-2023).
Bem como, esta e. Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE TAXA ANUAL DE JUROS C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E PEDIDO INCIDENTAL DE EXIBI/ÇÃO DE DOCUMENTOS. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
[...]
JUROS REMUNERATÓRIOS. AFERIÇÃO BASEADA NA OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). TAXA MÉDIA DITADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) QUE INDICA, TÃO SOMENTE, UM CRITÉRIO ÚTIL DE AFERIÇÃO CONSIDERANDO AS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA QUE DEIXOU DE COMPROVAR, MINIMAMENTE, A RAZOABILIDADE DAS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADAS. AUSÊNCIA DE APONTAMENTO DAS CIRCUNSTÂNCIAS RELACIONADAS ÀS OPERAÇÕES BANCÁRIAS EFETUADAS E AO PERFIL DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE INFORMAÇÕES SOBRE O CUSTO DAS OPERAÇÕES, FONTES DE RENDA DO CONTRATANTE, RESULTADO DA ANÁLISE DE RISCO, GARANTIAS, ETC. TAXAS REMUNERATÓRIAS CONTRATADAS QUE DESTOAM SUBSTANCIALMENTE DAS MÉDIAS DE MERCADO. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DAS TAXAS MÉDIAS DO BACEN.
ADEMAIS, IMPOSSIBILIDADE DE SE AFERIR AS TAXAS CONTRATADAS NOS PACTOS NÃO EXIBIDOS. APLICAÇÃO DA PENALIDADE DO ART. 400, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SÚMULA N. 530 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN, SALVO SE AQUELA COBRADA FOR MAIS BENÉFICA AO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. SENTENÇA MANTIDA.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. ALEGADA IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES. IMPOSITIVA A MANUTENÇÃO DA SENTENÇA NA PARTE ONDE DELIBEROU PELA REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO, COM A DEVIDA COMPENSAÇÃO, A FIM DE EVITAR O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. SENTENÇA MANTIDA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS EM FAVOR DA PARTE AUTORA. DESPROVIMENTO DO RECURSO DA PARTE RÉ. HIPÓTESE QUE AUTORIZA A MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRESENÇA CUMULATIVA DOS REQUISITOS FIXADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
RECURSO CONHECIDO E DESROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5096033-78.2022.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Silvio Franco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 25-04-2024).
Ainda:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES.
JUROS REMUNERATÓRIOS. UTILIZAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN, TÃO SOMENTE, COMO REFERENCIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA ABUSIVIDADE. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS ESTIPULADOS NO RESP N. 1.821.182/RS. ONEROSIDADE DO ALUDIDO ENCARGO QUE DEVE SER APURADA DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA, IN CASU, DE JUSTIFICATIVA PLAUSÍVEL POR PARTE DA RÉ PARA PRESERVAÇÃO DAS ELEVADAS TAXAS PACTUADAS ENTRE AS PARTES. MANUTENÇÃO, PORTANTO, DA LIMITAÇÃO DO ENCARGO À MÉDIA DE MERCADO QUE SE IMPÕE.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE ENCARGOS ABUSIVOS. DEVER DE PROMOVER A DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE, NA FORMA SIMPLES, ATUALIZADO COM BASE NOS ÍNDICES OFICIAIS, DIANTE DA AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. DANOS MORAIS. RECONHECIMENTO DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL QUE NÃO CONFIGURA ABALO ANÍMICO PASSÍVEL DE REPARAÇÃO. TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO INAPLICÁVEL À ESPÉCIE. MERO ABORRECIMENTO COTIDIANO.
MANUTENÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS ARBITRADOS PELO MAGISTRADO A QUO. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. (TJSC, Apelação n. 5025371-06.2022.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 14-12-2023).
Com isso, ao analisar os juros de acordo com a orientação do Superior Tribunal de Justiça conclui-se que são abusivos os juros remuneratórios contratados.
Dessa forma, os juros remuneratórios devem ser limitados ao percentual da taxa média de mercado.
2.3.4) Repetição de Indébito.
Pleiteou a parte apelante pela viabilidade da repetição de indébito, diante da abusividade da avença.
O caso em comento é regido pelo Código de Defesa do Consumidor, o qual autoriza em seu artigo 42 a repetição de indébito, no caso do consumidor ser cobrado por quantia indevida.
Desta feita, restando apurado que a parte apelante realizou pagamento indevido, é dever da parte apelada promover a devolução dos mesmos em respeito ao princípio que veda o enriquecimento sem causa (art. 884, CC), compensados na existência de débitos (art. 369, CC).
No que tange a forma da devolução, simples ou em dobro, este Relator, até então, adotava o entendimento que a repetição de indébito deveria ocorrer na forma simples, diante do engano injustificável.
Contudo, diante do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, proferido nos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 1.413.542/RS, fixou-se a tese de que a cobrança indevida em dobro independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor, sendo cabível quando a referida cobrança ser contrária à boa-fé objetiva.
A partir disso, refluindo meu posicionamento sobre a questão, passo a adotar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no qual a repetição de indébito em dobro ocorre independentemente da existência de culpa ou dolo do fornecedor, sendo necessário somente que a cobrança indevida seja contrária à boa-fé objetiva, nos termos do acórdão que fixou a tese:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC. REQUISITO SUBJETIVO. DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA. IRRELEVÂNCIA. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA. ART. 927, § 3º, DO CPC/2015.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. Trata-se de Embargos de Divergência que apontam dissídio entre a Primeira e a Segunda Seções do STJ acerca da exegese do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor - CDC. A divergência refere-se especificamente à necessidade de elemento subjetivo para fins de caracterização do dever de restituição em dobro da quantia cobrada indevidamente.
2. Eis o dispositivo do CDC em questão: "O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável" (art. 42, parágrafo único, grifo acrescentado).
[...]
TESE FINAL
28. Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS
29. Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão.
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
30. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido fixou como requisito a má-fé, para fins do parágrafo único do art. 42 do CDC, em indébito decorrente de contrato de prestação de serviço público de telefonia, o que está dissonante da compreensão aqui fixada.
Impõe-se a devolução em dobro do indébito.
CONCLUSÃO
31. Embargos de Divergência providos. (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021).
Portanto, como a presente cobrança indevida é contrária à boa-fé objetiva, a repetição de indébito deve ser realizada em dobro.
Contudo, deve ser observada a modulação dos efeitos fixada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 1.413.542/RS, razão pela qual a repetição de indébito em dobro incidirá somente em cobranças indevidas realizadas após a 30/03/2021.
Diante disso, em relação aos valores cobrados indevidamente até 30/03/2021, incide a repetição de indébito de forma simples e, após 30/03/2021, de forma dobrada.
Salienta-se que quando da devolução, incide sobre os valores correção monetária pelo INPC, acrescido de juros de mora de 1% ao mês, até a data de 31/08/2024. A partir dessa data, em virtude das alterações promovidas no Código Civil pela Lei nº 14.905/2024, a correção monetária será pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC), e os juros de mora serão calculados pela Selic, deduzida a correção monetária (art. 406, §1º, do CC), seguindo a metodologia do Conselho Monetário Nacional e divulgada pelo Bacen, conforme o art. 406, §2º, do CC.
Caso a taxa Selic apresente resultado negativo, considera-se que como zero os juros de mora, nos termos do parágrafo 3º do art. 406 do Código Civil.
Acolhido o pedido.
2.3.5) Da (des)caracterização da Mora
Sustentou a parte apelante que em razão da abusividade da avença, a mora deve ser afastada.
É o teor da orientação 02 do Superior Tribunal de Justiça,
in verbis:
ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.
Como se vê, os encargos contratuais capazes de descaracterizar a mora são os juros remuneratórios e a capitalização de juros.
Em razão de recentes decisões proferidas pelo STJ, com base no Tema 28, entende-se que o pagamento do valor incontroverso não está relacionado à (des)caracterização da mora, mas apenas às hipóteses de inscrição e manutenção no rol de inadimplentes.
Tema 28 do STJ - O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora.
Noutras palavras, a descaracterização da mora dependerá tão somente da constatação da existência de abusividade em encargo exigido para o período da normalidade contratual e prescinde do depósito do valor tido por incontroverso.
In casu
, houve a limitação dos juros remuneratórios.
Logo, tem-se que a mora restou descaracterizada ante a existência de abusividade em encargo exigido para o período da normalidade contratual, o que se dá independentemente de depósito em juízo do valor incontroverso.
Provido o recurso para reconhecer a descaracterização da mora.
2.4) Da sucumbência
Existindo alteração da sentença no grau recursal, impõe-se a inversão da sucumbência, condenando a parte apelada ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, mantido o mesmo valor fixado na origem.
Diante da fundamentação acima exarada:
- conheço do recurso e dou provimento para afastar a necessidade da unificação de ações no mesmo processo, afastando-se a condenação pela litigância de má-fé, e, com esteio no art. 1.013, § 3º, inc. I, do CPC, julgo procedentes os pedidos revisionais, invertendo-se a sucumbência.
3.0) Conclusão.
Ante o exposto, com esteio no art. 932 do CPC, conheço do recurso para dar-lhe provimento, e com base no art. 1.013, §3º, inc. I, CPC, julgo procedentes os pedidos.
Intime-se.
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear