Ministério Público Da Comarca De Maringá - Paraná x Laercio De Oliveira
ID: 291532003
Tribunal: TJPR
Órgão: 3ª Vara Criminal de Maringá
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0020294-98.2023.8.16.0017
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Passivo:
Advogados:
ANDREA DA GAMA E SILVA VOLPE MOREIRA DE MORAES
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 3ª VARA CRIMINAL DE MARINGÁ - PROJUDI Av. Tiradentes, Nº 380 - 2º Andar - Centro - Maringá/PR…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 3ª VARA CRIMINAL DE MARINGÁ - PROJUDI Av. Tiradentes, Nº 380 - 2º Andar - Centro - Maringá/PR - CEP: 87.013-900 - Fone: 44-3472-2316 - E-mail: terceiravaracriminalmaringa@tjpr.jus.br Autos nº. 0020294-98.2023.8.16.0017 Processo: 0020294-98.2023.8.16.0017 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Furto Qualificado Data da Infração: 23/08/2023 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DA COMARCA DE MARINGÁ - PARANÁ Vítima(s): DOUGLAS PEREIRA DA SILVA Réu(s): LAERCIO DE OLIVEIRA SENTENÇA 1 - RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, através de seu representante, no uso das legais atribuições e com base nos inclusos autos de inquérito policial, ofereceu denúncia em face de LAÉRCIO DE OLIVEIRA, brasileiro, tapeceiro, portador do RG nº 5.713.421-6-PR, inscrito sob o CPF de nº 017.199.499-05, nascido em 23/12/1974, com 48 (quarenta e oito) anos de idade na data dos fatos, natural de Nova Londrina/PR, filho de Maria José de Oliveira e Antonio de Oliveira, residente à Rua Antonio Jorge Abrão nº 16, Residencial Pioneiro Osvaldo Bueno Netto, Maringá/PR, telefone 44 99961-9349, imputando-lhe a prática da infração penal prevista no artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal, conforme a seguinte narrativa da inicial acusatória: “Consta dos autos de Inquérito Policial que no dia 23 de agosto de 2023, por volta das 21h50min, na Avenida São Judas Tadeu, nº 1.728, Parque Grevíleas I, nesta cidade e Comarca de Maringá/PR, o denunciado LAÉRCIO DE OLIVEIRA, agindo dolosamente e ciente da reprovabilidade de sua conduta, com ânimo de assenhoramento definitivo, mediante fraude, consistente em demonstrar interesse em aquisição de automóvel e, assim, oferecendo-se para fazer um ‘test drive’, subtraiu, para si, a motocicleta Honda CB 100R, ano 2012, cor vermelha, placas FHR-7190, chassi nº 9C2SC6910DR000247, de propriedade da vítima Douglas Pereira da Silva – tudo conforme Auto de Prisão em Flagrante de seq. 1.1; Termos de Depoimentos de seqs. 1.2 e 1.4, Autos de Exibição e Apreensão de seqs. 1.6 e 1.7, Boletins de Ocorrência de seqs. 1.8 e 1.16, Fotografias de seqs. 1.9 à 1.15, Auto de Interrogatório de seq. 1.17 e Relatório da Autoridade Policial de seq. 6.1. De acordo com o apurado, no local, data e horário supracitados, o denunciado LAÉRCIO DE OLIVEIRA demonstrou interesse em adquirir a motocicleta acima descrita, de propriedade da vítima Douglas Pereira da Silva, sendo que, ao longo das negociações, afirmou que queria testar o veículo. Após a vítima concordar com o referido teste, o denunciado LAÉRCIO DE OLIVEIRA deixou o palco dos acontecimentos em posse da res furtiva, não tendo mais retornado ao local. Diante do ocorrido, o ofendido Douglas Pereira da Silva prontamente acionou a Autoridade Policial, prestando informações acerca do ocorrido, inclusive, declinando aos agentes policiais o endereço que o rastreador de seu veículo estava apontando. Assim, por volta das 23h20min, equipe policial deslocou-se até o referido endereço, vale especificar, Rua Antônio Jorge Abrão, Residencial Pioneiro Odwaldo Bueno Netto, nesta cidade de Maringá/PR, momento em que agentes lograram êxito em visualizar a motocicleta furtada no quintal do imóvel de numeral nº 16. Em bem-sucedidas diligências, os agentes policiais identificaram o morador do referido endereço como sendo o denunciado LAÉRCIO DE OLIVEIRA, realizando a sua abordagem. Diante do estado de flagrância delitiva, os agentes públicos encaminharam o denunciado LAÉRCIO DE OLIVEIRA, juntamente à motocicleta apreendida, à 9ª Central Regional de Flagrantes, para que fossem tomadas as providências cabíveis.” Com a denúncia foram arroladas a vítima e duas testemunhas para inquirição em audiência. O inquérito policial que embasa a acusação está anexado aos presentes autos (seqs. 1.1 a 1.18, 6.1 e 45.2 a 45.11), com destaque para o auto de prisão em flagrante (seq. 1.1), termo de depoimentos das testemunhas (seqs. 1.2 a 1.5), autos de exibição e apreensão (seqs. 1.6 e 1.7), boletins de ocorrência (seqs. 1.8 e 1.16), fotografias (seqs. 1.9 a 1.15), termo de interrogatório (seqs. 1.17 e 1.18), relatório da autoridade policial (seq. 6.1), extrato da motocicleta (seq. 45.6), termo de declaração da vítima (seq. 45.8) e auto de avaliação (seq. 45.11). A denúncia foi oferecida em 31/08/2023 (seq. 36.1) e recebida em 11/09/2023, determinando-se a citação do acusado (seq. 49.1). Juntou-se laudo de exame de numerações identificadoras da motocicleta (seq. 59.1) e auto de entrega (seq. 59.2). Citado (seq. 63.1), o acusado apresentou resposta à acusação (seq. 72.1), através da Defensoria Pública do Paraná, na qual requereu a concessão da justiça gratuita e observância das prerrogativas constitucionais e legais da Defensoria Pública, em especial intimação pessoal e contagem de prazo em dobro dos prazos processuais. Por fim, arrolou uma testemunha própria, solicitando a oitiva de eventuais testemunhas que porventura o acusado consiga levar a audiência, inclusive requerendo que constasse no mandado de intimação essa garantia. O juízo indeferiu os requerimentos de apresentação tardia do rol de testemunhas e provas, como também a inclusão no mandado de intimação do acusado quanto a possibilidade de apresentação de testemunhas e provas quando da realização da audiência de instrução. Ainda, postergou a análise do pedido de justiça gratuita para o momento da prolação da sentença (seq. 78.1). Em audiência de instrução (seq. 103.1) foram inquiridas a vítima Douglas Pereira da Silva (seq. 102.1) e as testemunhas Maxine Bif (seq. 102.2) e Leandro Caetano Pinto (seq. 102.3). Ao final, a defesa requereu prazo para indicar endereço da testemunha Moacir Luiz dos Santos Neto, que não foi encontrada para ser intimada, sendo designada audiência de instrução e julgamento em continuação, com a intimação do réu, uma vez que presente no ato (seq. 102.4). A Defensoria requereu a intimação da testemunha Moacir para participação na audiência (seq. 111.1), no entanto ele não foi localizado para ser intimado (seq. 127.1). Instada a se manifestar, a Defensora requereu que fosse aguardada a realização da solenidade, para verificar se o acusado compareceria ao ato, para que pudesse informar sobre o endereço atualizado da testemunha (seq. 135.1). Realizada audiência de instrução e julgamento em continuação, o réu, embora intimado, deixou de comparecer, sendo decretada sua revelia (seq. 138.1). Além disso, a defesa desistiu da inquirição da testemunha Moacir, o que foi homologado pelo juízo. Não houve requerimentos pelas partes na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal. Em sede de alegações finais (seq. 141.1), o Ministério Público pediu a condenação do réu nos moldes da denúncia, destacando a credibilidade da palavra da vítima em crimes patrimoniais, que teria sido corroborada pelo depoimento dos agentes policiais perante as autoridades policial e judiciária, os quais se revestem de presunção de veracidade. Sustentou a incidência da qualificadora da fraude, uma vez que o acusado teria simulado ter interesse em fazer um “test drive” no veículo da vítima, apossando-se dele e se evadindo do local. Na dosimetria da pena, pleiteou pela fixação da pena-base no mínimo legal, por não haverem circunstâncias judiciais desfavoráveis, bem como sustentou a ausência de agravantes ou atenuantes e de causas de aumento ou de diminuição de pena. Por fim, pediu a fixação de regime inicial aberto para o cumprimento de pena, com substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito. Por sua vez, a Defensoria Pública apresentou alegações finais (seq. 145.1), argumentando que não há nos autos nenhuma prova concreta de que o acusado tenha tido a intenção de subtrair, com ânimo de assenhoreamento definitivo, a motocicleta da vítima, requerendo assim a absolvição do réu por ausência de dolo. Ainda, pleiteou o afastamento da qualificadora da fraude, aduzindo que o acusado demonstrou interesse legítimo na motocicleta e negociou o bem com a vítima, sem que houvesse apresentado pagamento falso ou documentos falsificados. De forma subsidiária, sustentou a necessidade de desclassificação do crime para o delito de apropriação indébita, alegando que o réu teria recebido o bem de boa-fé e, posteriormente, decidido a não o restituir. Ao final, invocou o princípio do in dubio pro reo, pretendendo a absolvição do acusado, bem como a fixação da pena no mínimo legal. 2 – FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação penal pública incondicionada na qual se imputa ao acusado LAERCIO DE OLIVEIRA a prática da conduta típica descrita no artigo 155, §4º, inciso II, do Código Penal. Inicialmente destaca-se, de um lado, a inexistência de nulidades a serem reconhecidas, e de outro, a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, em especial a justa causa, consubstanciada no lastro probatório mínimo para a deflagração na ação penal. A materialidade delitiva resultou cabalmente comprovada por meio do auto de prisão em flagrante (seq. 1.1), autos de exibição e apreensão (seqs. 1.6 e 1.7), boletins de ocorrência (seqs. 1.8 e 1.16), fotografias (seqs. 1.9 a 1.15), relatório da autoridade policial (seq. 6.1), extrato da motocicleta (seq. 45.6) e pelo auto de avaliação (seq. 45.11), bem como através da prova testemunhal produzida, tanto na fase investigatória quanto na judicial. A autoria dos fatos também é certa e recai sobre o acusado. A vítima Douglas Pereira da Silva, ouvida na delegacia (seq. 45.8) e em Juízo, por meio de videoconferência (seq. 102.1), declarou que já ia fazer um ano desse fato, e não tinha o “filme” todo disso em sua cabeça. Contou que conhecia o acusado de vista, de bares, de aparência, mas não podia dizer que era alguém em quem podia confiar. Relatou que o acusado sempre pedia para dar uma volta na moto e o declarante sempre negava, mas ele insistiu tanto que até deixou ele dar essa volta, falou “cara, então só vai até ali”. Explicou que o acusado trabalhava em uma tapeçaria, era tapeceiro, e respondeu “não, eu só vou ali e já volto, fica tranquilo”. Informou que o réu estava doido para andar na moto, já tinha um tempo que ele pedia, e que acabou ficando com dó e cedeu, confiou, e até quando o réu foi sair com a moto, ele acabou afogando, e o declarante falou para deixar isso quieto, mas o acusado disse “pelo amor de Deus”, insistiu e deu partida na moto. Relatou que novamente disse para o réu “só vai lá e volta, no máximo 10 minutos, 15 minutos” e o acusado concordou, dizendo que ia e voltaria, no entanto, foi o contrário, pois passou meia hora, uma hora, duas horas, duas horas e meia, três horas, o pessoal já começou a lhe apavorar lá na lanchonete onde estava, na conveniência ali no bairro, até que deu quatro horas, quatro horas e meia, e o declarante acionou a polícia e registrou queixa, porque isso para o declarante seria furto. Disse que se não tivesse rastreador na moto, acreditava que não a acharia. Afirmou que o acusado agiu de má-fé, porque se uma pessoa tivesse consideração pela outra, ela nunca faria isso, ou ia dar satisfação. Explanou que o acusado falou que tentou ligar para o declarante, e o declarante não estava com o telefone, mas o réu tinha o celular do “Brahminha” lá da conveniência, ou então ele deveria ter voltado com a moto, não tinha que ter ficado todo esse tempo com a moto, achava que qualquer um faria o que o declarante fez, ou seja, registrado queixa. Reafirmou que acreditava que se não tivesse rastreador na moto, teria perdido a moto, porque ele estava lá para o Cidade Alta. Narrou que localizou o veículo pelo rastreador e que comunicou a Sattrack, porque já era tarde da noite, já estava beirando quase 23h00min, e a Sattrack não funcionava 24h em Maringá, porém achava que era 24h na cidade de Londrina, então conseguiu entrar em contato e eles lhe informaram onde estava a moto, porque pelo fato de o declarante estar sem seu telefone, não conseguia rastrear ela. Relatou que conseguiu ligar na Sattrack de Londrina e eles lhe passaram o endereço exato onde a moto estava, aí o declarante passou para a viatura. Explanou que a viatura acionou outra viatura que estava perto da residência do acusado, e foi onde encontraram a moto. Perguntado pelo Ministério Público se acompanhou a polícia ou se só recuperou a moto depois, na delegacia, respondeu que teve muita vontade de ir onde a moto estava, mas foi aconselhado pela polícia para não ir, porque era um bairro perigoso, e eles lhe falaram para ficar tranquilo, pois já estava indo uma Rotam para lá, as viaturas já estavam a caminho. Questionado se soube onde a moto foi encontrada, se estava em uma casa ou na rua, disse que estava dentro de uma residência, que o réu alegou que era onde a mãe dele residia, mas não sabia dizer se era ou não. Confirmou que a moto foi recuperada intacta, relatando que já não estava mais na cidade, pois estava com a passagem comprada, e foi um amigo seu que foi retirá-la, mas ela estava perfeita, ele lhe mandou fotos e vídeos dela, não teve nenhum dano. Indagado se depois desse fato chegou a ter contato com o acusado, disse que sim, que ele chegou a entrar em contato, falou alguma coisa, e depois ele lhe bloqueou, ou foi o próprio declarante que o bloqueou, não se lembrava do que aconteceu. Contou que tinha um rapaz que trabalhava junto ao acusado e foi lá na casa dos pais do declarante e o acusou de ter sumido com alguma coisa da tapeçaria, coisa que não fez, e esse menino também ameaçou seu pai, sua família, para eles darem dinheiro para ele comprar as ferramentas de volta, sendo que quando as ferramentas sumiram da tapeçaria, o declarante nem estava aqui, então eles lhe acusaram de coisas para extorquir sua família, seu pai acabou dando R$1.000,00 para esse menino que trabalhava junto ao acusado na tapeçaria, não sabia se era o chefe dele. Questionada pela Defensoria Pública se nunca houve a questão de compra e venda e se chegou a emprestar a moto ao acusado, disse que sim. Perguntado sobre até que horas ficava nessa lanchonete onde teve a conversa com o denunciado, relatou que era bem perto de onde morava, então ia frequentemente nessa conveniência, na verdade ia quase todo dia lá. Negou que tivesse falado para o acusado até que horas ficaria na conveniência naquele dia, ressaltando que o que tinha falado para ele é que seria uma voltinha até onde ele trabalhava, era para ir na tapeçaria e voltar, e ele prometeu que sim e não devolveu, foram mais de quatro horas e meia com a moto. Reafirmou que não chegou a falar até que horas ficaria lá, e que o réu sabia muito bem que o declarante sempre ia lá. Explanou que todos já estavam indo embora, a conveniência já estava para fechar e o declarante estava entrando em desespero, não tinha como ficar mais calmo. Disse que não sabia onde o acusado residia, acreditava que ele morava lá na tapeçaria, no mesmo local onde ele trabalhava, ele dormia lá. Relatou que pediu o telefone do acusado para as pessoas que estavam no local, mas ninguém tinha, e ninguém sabia onde era o endereço dele. Negou que tenha ido na tapeçaria algum dia e pedido dinheiro emprestado ao acusado. Questionado pela magistrada se na conveniência o declarante e o acusado ingeriram bebidas alcóolicas, respondeu que quando ia lá sempre bebia, mas com moderação, nunca foi de beber muito álcool, agora quanto ao acusado, não sabia se tinha bebido ou não. Afirmou que estava consciente, e que era impossível ter se esquecido de alguma coisa, estava super consciente, tranquilo. Relatou que não viu se o acusado ingeriu alguma bebida lá, dizendo que ele não tinha sintomas de quem tinha ingerido alguma bebida alcóolica ou usado alguma outra substância, até porque se tivesse transparecido que tinha, nunca o teria deixado andar em sua moto, então não. Importante destacar que a palavra da vítima se reveste de especial relevância, uma vez que confirmou que o acusado pediu para dar “uma volta” em sua motocicleta e não retornou mais, relatando que o veículo foi posteriormente apreendido na garagem da residência da genitora do acusado. A vítima pontuou que conhecia o acusado de vista, e que ele sempre pedia para dar “uma volta” em sua motocicleta, mas que nunca havia deixado. Contou que naquele dia LAERCIO insistiu tanto que acabou cedendo e emprestando sua moto a ele, deixando claro que era para ser um passeio rápido, de no máximo 15 minutos, tendo o acusado concordado com aquilo. Contudo, Douglas explanou que teriam se passado mais de quatro horas sem que o acusado retornasse para restituir a motocicleta. Por esse motivo, a vítima relatou que acabou ligando para a polícia para registrar o boletim de ocorrência, e que mais tarde conseguiu localizar sua motocicleta por conta de seu rastreador, sendo que o veículo teria sido encontrado dentro de uma residência, que o acusado afirmou ser onde a mãe dele residia. Perante a autoridade policial (seq. 45.8), a vítima apresentou versão similar, contando que estava tentando vender sua motocicleta e LAERCIO afirmou que queria compra-la, insistindo muito em dar uma volta nela, sendo que, em razão da insistência dele, acabou a emprestando. Narrou que o acusado saiu com a motocicleta por volta das 18h30min, e que teria dito para voltar em no máximo 30 minutos, porém LAERCIO não retornou mais, razão pela qual decidiu registrar boletim de ocorrência, e como o veículo tinha rastreador, passou a localização para a equipe policial, que conseguiu encontrar a moto em posse do réu. Saliento que a vítima informou que emprestou a motocicleta ao réu por volta das 18h30min, sendo que registrou o boletim de ocorrência de furto às 22h34min (seq. 1.8) e o veículo só foi localizado às 23h20 (seq. 1.16), confirmando sua versão em juízo de que decorreram mais de quatro horas desde que o réu teria saído com a moto, sem que tivesse retornado e voluntariamente restituído o bem. Ademais, a jurisprudência também reforça a importância da palavra da vítima no contexto de crimes patrimoniais como o presente, praticados, em geral, de forma clandestina e sem testemunhas oculares: RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – DANO QUALIFICADO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO – ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO III, DO CÓDIGO PENAL –FURTO – ART. 155, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. PLEITO ABSOLUTÓRIO DO CRIME DE DANO POR AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO – NÃO ACOLHIMENTO – DESNECESSIDADE DE DOLO ESPECÍFICO DE CAUSAR PREJUÍZO. PLEITO ABSOLUTÓRIO DO CRIME DE FURTO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – NÃO ACOLHIMENTO – CONDUTA TÍPICA – MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS – PALAVRA DA VÍTIMA QUE ASSUME ESPECIAL RELEVÂNCIA NOS CRIMES PATRIMONIAIS QUANDO CORROBORADA PELO RESTANTE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, COM FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0002876-66.2019.8.16.0154 - Santo Antônio do Sudoeste - Rel.: SUBSTITUTO ANTONIO CARLOS CHOMA - J. 05.04.2025). Grifo nosso. Aliados à palavra da vítima encontram-se os depoimentos dos policiais que atenderam a ocorrência. O policial militar Maxine Bif, ouvido em juízo (seq. 102.2) e na delegacia (seq. 1.3), declarou que foi repassado na central que uma motocicleta havia sido furtada, então se deslocaram até um estabelecimento comercial e a vítima relatou que um rapaz teria ido ver a moto dele para comprar, algo do tipo, não se recordava muito bem, e não voltou com a moto. Explanou que durante a ocorrência, conseguiram a localização, porque a vítima tinha o rastreador, então se deslocaram até o endereço, a motocicleta estava dentro da casa, entraram em contato com os proprietários e encaminharam o acusado para a delegacia. Afirmou que conversou com o proprietário da moto no dia, e que foram primeiro falar com ele para fazer o b.o do furto. Relatou que tinha algo do tipo de a vítima estar vendendo a moto e o rapaz foi testar, se recordava que era algo assim. Confirmou que conversou com o acusado quando ele foi detido, e ele disse que havia comprado a moto, mas não apresentou documento, não apresentou nada, não tinha nexo as conversas, então falaram que o levariam para a delegacia para esclarecer esse fato. Perguntado pela Defensoria Pública se chegou a ir na loja de conveniência onde a vítima estava, respondeu que lá dentro não, pois quando pararam a viatura perto, a vítima já estava na rua acenando para eles pararem, porque não estavam localizando o endereço. Declarou que não chegaram a conversar com ninguém que estava na conveniência. Contou que a motocicleta estava dentro da casa, dava para ver de fora, era de fácil visualização. De igual maneira, o policial militar Leandro Caetano Pinto, ouvido em juízo (seq. 102.3) e perante a autoridade policial (seq. 1.5), contou que foram acionados via 190, sendo informados que houve um furto de uma motocicleta. Relatou que chegando no local, o proprietário falou que estava vendendo a motocicleta, teria dado para a pessoa fazer um teste e essa pessoa não voltava com a motocicleta, já ia fazer um tempo, e que não retornava as ligações, e tinha um rastreador. Declarou que foram até o local, era uma casa com algumas pessoas no quintal, e perguntaram para o dono da motocicleta (o acusado), informaram a situação para ele, ele falou que tinha a intenção de comprar a motocicleta e que o celular estava sem bateria, e como já havia gerado o alerta de furto da motocicleta, encaminharam as partes para a delegacia para serem ouvidas pelo delegado. Não se recordou se era a casa do réu. Afirmou que a moto estava na garagem da residência, até com a placa virada para a rua, em lugar aparente. Importa ressaltar a credibilidade atribuída ao depoimento de agentes públicos, que possui presunção de veracidade, conforme assinala a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paraná: APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO (ARTIGO 155, §4º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL – POR DUAS VEZES). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA DEFESA. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA EM RELAÇÃO AO FATO 01. ALEGADA AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES DA PRÁTICA DELITIVA. IMPOSSIBILIDADE. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. DEPOIMENTOS DA VÍTIMA E DA TESTEMUNHA – POLICIAL CIVIL – COESOS E CORROBORADOS PELOS DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. DEPOIMENTOS DA EQUIPE POLICIAL QUE CONFIRMAM OS RELATOS DA FASE INQUISITORIAL E A DESCRIÇÃO DO BOLETIM DE OCORRÊNCIA. ELEVADO VALOR PROBATÓRIO. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE E FÉ PÚBLICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS A AFASTAR A CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS AGENTES PÚBLICOS. VÍDEOS E IMAGENS DAS CÂMERAS DE SEGURANÇA. IDENTIFICAÇÃO DO ACUSADO NÃO SOMENTE PELAS SEMELHANÇAS FÍSICAS, COMO TAMBÉM PELA ALTURA, COR DE PELE E PELO USO DO MESMO BONÉ UTILIZADO PELO AUTOR DO FATO 02. CRIMES PRATICADOS COM O MESMO ‘MODUS OPERANDI’. ACERVO PROBATÓRIO CONTUNDENTE. AUSÊNCIA DE DÚVIDA RAZOÁVEL. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DO ‘IN DUBIO PRO REO’. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.1. Nos delitos de natureza patrimonial, comumente praticados na clandestinidade ou longe de testemunhas, a palavra da vítima assume expressivo valor probatório, tendo-se em vista que tais casos dificilmente contam com testemunhas oculares.2. Tese de insuficiência probatória que não se sustenta diante da extensa prova da materialidade e autoria delitiva, em especial os depoimentos da vítima e do policial civil, corroborados pelas imagens das câmeras de segurança que possibilitaram a identificação do acusado como autor de ambos os furtos praticados com o mesmo ‘modus operandi’.3. “O valor de depoimento testemunhal de servidores policiais – especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório – reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar – tal como ocorre com as demais testemunhas – que suas declarações não encontram suporte e nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos” (STF, HC 73518-5).4. A aplicação do princípio do ‘in dubio pro reo’ reclama a existência de dúvida razoável no processo, ao contrário da situação em apreço, em que conjunto probatório a amparar o decreto condenatório é robusto.5. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0014240-53.2022.8.16.0017 - Maringá - Rel.: JOSE AMERICO PENTEADO DE CARVALHO - J. 17.08.2024)Grifo nosso. Destaco que a palavra da vítima foi corroborada pelos depoimentos dos policiais militares, que relataram, de forma uníssona, que foram acionados para atender uma ocorrência em que a vítima teria emprestado sua motocicleta para o acusado fazer um “test drive”, pois estava interessado em compra-la. No entanto, o réu não retornou com o veículo. Ainda, confirmaram que a motocicleta possuía rastreador, e que ao rastreá-la, lograram em aprendê-la estacionada dentro da garagem de uma residência, onde o acusado também estava. O acusado LAERCIO DE OLIVEIRA, interrogado somente na delegacia (seq. 1.18), relatou que não foi embora com a moto, e que tinha a prova de um pix que fez para a vítima. Alegou que a vítima era seu amigo e que não saia de sua tapeçaria. Perguntado se tinha prova de que pagou por essa moto, respondeu que não tinha, e que fez um pix na hora que pegou a moto dele, mas não era um pix do valor da moto, era para ir colocar gasolina na moto, dar um “role” e fazer um “test drive”, porque ia comprar a moto do ofendido, ia financiar. Confirmou que não tinha um pix no valor da moto, tinha um pix da gasolina. Reafirmou que a vítima era seu amigo e não saia de sua tapeçaria, e que achava que ele ligou para a polícia porque pensou que o interrogado iria fazer “cagada”, bater com a moto, e ele quis “tirar o dele da reta”, mas a vítima sabia onde o interrogado morava, ele ia todo dia na tapeçaria pegar R$5,00 (cinco reais), R$10,00 (dez reais) para comprar cigarro. Negou que tenha morado em Telêmaco Borba ou Assaí, dizendo que só morou em Maringá, Cuiabá e Nova Londrina, cidade em que nasceu. Afirmou que o dono da moto era Douglas, que era seu amigo, e era viciado em joguinhos. Disse que não pegou nada na maldade e Douglas sabia disso, e ele ia em sua tapeçaria. Veja-se, portanto, que o acusado negou a prática delitiva, tendo em vista que, apesar de confirmar que foi fazer um “test drive” com a moto, disse que não foi embora com ela, informando inclusive que ia compra-la da vítima, e que teria feito um pix para pagar a gasolina. Apesar das alegações do acusado, verifica-se que sua versão se encontra isolada nos autos. Primeiramente, embora tenha dito por diversas vezes que tinha provas de que pagou à vítima, não apresentou nenhum comprovante nesse sentido, mesmo tendo sido solicitado pelo delegado. Ainda, a vítima afirmou de forma veemente, nas duas ocasiões em que foi ouvida (seqs. 45.8 e 102.1), que sequer chegou a negociar a venda da motocicleta com o acusado. Apesar de ter falado na delegacia que estava planejando vender sua moto, o ofendido nunca relatou que a teria negociado/vendido à LAERCIO. Em juízo, Douglas contou que não houve compra e venda, e que teria apenas emprestado a motocicleta ao acusado para dar uma volta rápida até a tapeçaria onde trabalhava. Da mesma forma, perante a autoridade policial, narrou que não vendeu a moto ao acusado e que nem chegaram a combinar um valor para a venda, tendo apenas a emprestado para que ele desse “uma volta” de no máximo 30 minutos. Assim, nota-se que, ao contrário do que o réu alega, no sentido de que iria comprar a motocicleta da vítima, Douglas afirmou em duas ocasiões que nem mesmo combinaram um valor para a venda, e que só emprestou a motocicleta a LAERCIO porque ele insistiu muito. Ademais, o policial militar Maxine Bif, em juízo (seq. 102.2), relatou que o acusado não apresentou nenhum documento sobre a compra da moto, não tendo comprovado essa suposta aquisição. Em sede de alegações finais (seq. 145.1), a Defensoria Pública sustentou a ausência de dolo específico por parte do acusado, argumentando que não houve o ânimo de assenhoreamento definitivo e pleiteando a absolvição de LAERCIO. Em que pese as argumentações trazidas, entendo que a tese não merece ser acolhida. Primeiramente, pontuo que a vítima, embora tenha emprestado sua motocicleta ao acusado, sempre deixou claro que era apenas para ele dar uma volta rápida e logo retornar, estabelecendo um tempo máximo entre 15 a 30 minutos (cf. declarações na delegacia e em juízo). O réu, por sua vez, teria concordado com isso, dizendo que “ia ali e já voltava”, confirmando, portanto, que seria um passeio rápido. No entanto, verifica-se que se passaram mais de quatro horas desde o momento em que o réu saiu com a motocicleta (18h30min, cf. seq. 45.8) até o momento em que o veículo foi localizado em posse dele (23h20, cf. seq. 1.16), sendo inclusive apreendido quando já estava estacionado em sua garagem. Assim, é inegável que o acusado teve a intenção de subtrair a motocicleta, uma vez que a pegou emprestada alegando que voltaria logo, no entanto, após várias horas, não retornou, sendo que a moto somente foi localizada e recuperada graças ao rastreador que havia nela, e não por ato voluntário do réu. Destaco que o fato de a motocicleta ter sido apreendida dentro da casa do réu (ou de sua genitora) é forte indicativo de que LAERCIO tinha sim o animus de se assenhorar definitivamente do bem, e de que não pretendia restituí-lo à vítima, conforme entendimento jurisprudencial: DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. LATROCÍNIO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PROVAS INDICIÁRIAS E POSSE DA RES FURTIVA. IN DUBIO PRO REO NÃO APLICÁVEL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO NÃO PROVIDO.I. CASO EM EXAME1. Apelação criminal interposta contra sentença condenatória pelo crime de latrocínio (art. 157, § 3º, inc. II, do CP). O réu foi denunciado por, em comunhão de esforços com terceiro, subtrair a motocicleta da vítima mediante disparos de arma de fogo que resultaram em sua morte. A motocicleta foi encontrada na residência do recorrente. A defesa requer a absolvição pelo princípio in dubio pro reo, alegando insuficiência probatória.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. A questão em discussão consiste em saber se há provas suficientes para a condenação do recorrente pelo crime de latrocínio à luz do princípio in dubio pro reo.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O pedido de gratuidade da justiça não comporta conhecimento, pois trata-se de matéria afeta ao juízo da execução, o qual tem competência para aferir a situação econômica do condenado no momento do cumprimento da pena.4. A materialidade do crime está comprovada por boletim de ocorrência, auto de levantamento do local do crime, laudo de necropsia e demais provas documentais constantes dos autos.5. A autoria foi confirmada pelo conjunto probatório, incluindo depoimentos de policiais e testemunhas que indicaram a participação do recorrente, além da apreensão da motocicleta da vítima em sua residência.6. A posse da res furtiva pelo réu gera inversão do ônus da prova, de modo que caberia à defesa justificar a posse do bem subtraído, o que não ocorreu de forma satisfatória.7. A tese defensiva de ausência de testemunhas oculares e fragilidade probatória não se sustenta, pois os elementos indiciários e circunstanciais corroboram a versão acusatória.8. O princípio do in dubio pro reo não se aplica quando há conjunto probatório suficiente para formação de juízo condenatório.IV. DISPOSITIVO9. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0000818-83.2021.8.16.0166 - Terra Boa - Rel.: DESEMBARGADOR ANTONIO CARLOS RIBEIRO MARTINS - J. 14.04.2025) Verifica-se, então, que havendo a apreensão da res furtiva em posse do acusado, inverte-se o ônus da prova, cabendo à defesa comprovar que a posse da motocicleta pelo réu era lícita. In casu, nota-se que apesar de a vítima ter inicialmente emprestado a moto para o réu dar uma volta, tratou-se de uma entrega momentânea, sendo que o combinado era de que bem deveria ser restituído ao ofendido minutos depois. No entanto, passaram-se várias horas sem que o acusado tivesse demonstrado qualquer intenção de devolver a motocicleta, tanto que foi a vítima quem teve que rastreá-la para conseguir recuperá-la. E, ainda que tivesse acontecido alguma coisa que impossibilitasse o acusado de devolver o bem dentro do prazo combinado, nota-se que LAERCIO não apresentou nenhuma alegação, e muito menos provas nesse sentido. Embora a vítima tenha relatado que o réu havia dito que tentou lhe ligar no dia dos fatos, isso não restou demonstrado nos autos, embora pudesse ser facilmente comprovado com simples demonstração do histórico de ligações do celular do acusado. Aliás, se estivesse mesmo agindo de boa-fé, o réu poderia ter retornado ao local onde a vítima estava e lhe avisado que devolveria a motocicleta mais tarde, o que, entretanto, também não fez. Assim, pontuo que não consta nos autos nenhuma conduta de LAERCIO que indicasse que sua intenção era de devolver a motocicleta ao ofendido, não tendo o acusado comprovado que tentou ir atrás da vítima para comunicá-la de que ficaria com o bem por mais um tempo, ou que avisou qualquer outra pessoa que estava na conveniência junto a vítima sobre essa situação. Ademais, em seu interrogatório na delegacia (seq. 1.18), o denunciado não apresentou nenhuma justificativa para não ter retornado com a motocicleta no horário combinado, e nem para o fato de a motocicleta estar estacionada em sua casa, apesar de ter dito que apenas faria um “test drive”. Pontuo que o fato de o acusado não ter tentado ocultar o veículo não é indicativo de que ele não tinha dolo de subtrai-lo, tendo em vista que, muito provavelmente, ele acreditava que não seria localizado pela vítima, a qual, por sua vez, afirmou que sequer sabia onde o réu residia. Outrossim, a mera alegação de que havia realizado um pagamento ao ofendido por pix, sem a comprovação (que poderia ter sido facilmente realizada, por comprovante de pagamento), não é o suficiente para provar sua versão. No mais, já foi amplamente demonstrado que não houve negociação da motocicleta entre a vítima e o acusado. Assim, veja-se que embora tenha sido apreendido em posse da motocicleta, o acusado, em nenhum momento, comprovou que a posse era lícita. Ademais, apenas à título de argumentação, destaco que o acusado está sendo processado nos autos nº 0000141-10.2024.8.16.0017, da 4ª Vara Criminal de Maringá, onde foi denunciado pelo crime de furto simples, por ter supostamente subido na motocicleta da vítima, que estava estacionada, e saído em posse do bem, tomando rumo ignorado. Ao ser ouvido em juízo naqueles autos, o réu alegou que conhecia o proprietário da moto e que ele havia autorizado pegá-la, dizendo que nunca agiu de má-fé e que pretendia restituí-la no mesmo dia. Sustentou que pegou a moto porque estava devendo para o ofendido e tinha um dinheiro para receber, sendo que, após receber, pagaria sua dívida com a vítima. Logo, assim como neste feito, verifica-se que o réu alegou que conhecia a vítima e que ela teria lhe emprestado a motocicleta, mas que a restituiria depois, o que, entretanto, não o fez voluntariamente, tendo em vista que em ambos os casos os bens só foram recuperados e restituídos às vítimas por conta da ação policial. Adiante, quanto ao pedido de desclassificação do crime de furto qualificado para o delito de apropriação indébita, também não merece prosperar. Primeiramente, antes de tratar do crime de apropriação indébita, cabe fazer algumas ressalvas quanto ao crime de estelionato, que se assemelha aos delitos de furto mediante fraude e apropriação indébita. Conforme leciona a doutrina, a principal diferença entre o estelionato e o furto cometido por meio de fraude está na forma como a fraude é utilizada para a prática dos delitos: “No furto com fraude o comportamento ardiloso, insidioso, como regra, é utilizado para que seja facilitada a subtração pelo próprio agente dos bens pertencentes à vítima. Ao contrário, no crime de estelionato, o artifício, o ardil, o engodo são utilizados pelo agente para que, induzindo ou mantendo a vítima em erro, ela própria possa entregar-lhe a vantagem ilícita. O furto mediante fraude não se confunde com o estelionato. A distinção se faz primordialmente com a análise do elemento comum da fraude que, no furto, é utilizada pelo agente com o fim de burlar a vigilância da vítima que, desatenta, tem seu bem subtraído, sem que se aperceba; no estelionato, a fraude é usada como meio de obter o consentimento da vítima que, iludida, entrega voluntariamente o bem ao agente.”[1] Dessa forma, no crime de estelionato, a fraude é utilizada para ludibriar a vítima e fazer com que ela, voluntariamente, entregue o bem ao agente. Por outro lado, no furto qualificado pela fraude, o agente se utiliza do comportamento ardiloso para distrair a vítima, e assim realizar a subtração do bem, sem que ela perceba. No presente caso, veja-se que o acusado fingiu que estava interessado em comprar a motocicleta da vítima e pediu para dar uma volta nela, ocasião em que Douglas, de forma voluntária, emprestou o bem ao réu. Em que pese a entrega voluntária do bem pela vítima, verifica-se que o combinado com o acusado seria de que ele apenas faria um test drive rápido e já retornaria, devolvendo o bem a Douglas. Assim, o ofendido, em nenhum momento, dispôs de seu bem de forma definitiva, tratando-se de mera entrega momentânea do bem para o réu dar “uma volta”, tendo certeza de que a motocicleta retornaria para sua esfera de vigilância. Quanto a isso, destaco que recentes entendimentos jurisprudenciais do E. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná têm se firmado no sentido de que a conduta de fingir estar interessado na aquisição de um veículo e solicitar a realização de um test drive para então subtraí-lo configura o crime de furto mediante fraude, e não de estelionato: CRIME DE FURTO QUALIFICADO (ARTIGO 155, PARÁGRAFO 4º, INCISO Ii, DO CÓDIGO PENAL) – APELAÇÃO – pedido de concessão da justiça gratuita e isenção ou redução da pena de multa – não conhecimento – matérias afetas ao juízo da execução - pleito de absolvição, ante a alegada insuficiência probatória – inviabilidade – materialidade e autoria devidamente comprovadas - PALAVRA DA VÍTIMA importância substâncial nos crimes contra o patrimônio, ainda mais quando corroborada com demais elementos de prova – acusada que em companhia do corréu, mediante fraude, fizeram o funcionário do estabelecimento comercial acreditar que tinham a intenção de fazer um test drive e subtraiu o veículo fiat/strada – CONJUNTO PROBATÓRIO SÓLIDO E HARMÔNICO – DEFESA QUE não SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE PROVAR SUA VERSÃO DOS FATOS – dolo evidenciado – pleito de afastamento da qualificadora do concurso de pessoas – impossibilidade – prova testemunhal que confirma a prática do delito em coautoria – acertada a tipificação da conduta criminosa - qualificadora acertadamente aplicada – por consequência, impossível se falar na desclassificação para o delito em sua forma simples – dosimetria – pena-base estabelecida em seu mínimo legal – impossibilidade de qualquer alteração – sentença condenatória mantida – recurso conhecido em parte e, na parte conhecida, desprovido (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0045574-75.2017.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR CARVILIO DA SILVEIRA FILHO - J. 02.12.2024) Ainda, no caso abaixo, também enquadrado como furto qualificado pela fraude, a vítima teria emprestado seu celular ao réu para que ele pudesse supostamente realizar uma ligação, sendo que o acusado acabou tentando subtrair o bem. Trata-se de situação muito parecida com o caso em apreço, em que a vítima emprestou a motocicleta para o acusado momentaneamente, apenas para ele dar “uma volta”, com a expectativa de que o bem seria devolvido logo em seguida: APELAÇÃO CRIMINAL. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO (ART. 155, §4º, INC. II, C/C ART. 14, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DECLARAÇÃO JUDICIAL DA VÍTIMA CORROBORADA PELA PROVA ORAL. CONDENAÇÃO MANTIDA. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME PARA TENTATIVA DE ESTELIONATO. NÃO ACOLHIMENTO. CONDUTA PRATICADA PELO RÉU QUE SE AMOLDA AO CRIME DE FURTO MEDIANTE FRAUDE. VÍTIMA QUE NÃO DISPÔS DEFINITIVAMENTE DO BEM (COMO OCORRE NO ESTELIONATO), TENDO APENAS EMPRESTADO O CELULAR PARA O RÉU FAZER SUPOSTA LIGAÇÃO. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA REFERENTE À FRAUDE. NÃO ACOLHIMENTO. QUALIFICADORA DEVIDAMENTE CARACTERIZADA. CONDUTAS DESCRITAS NA INICIAL ACUSATÓRIA QUE INDICAM O MODO FRAUDULENTO EMPREGADO PELO RÉU. COMPROVAÇÃO DE QUE O ACUSADO LUDIBRIOU A VÍTIMA PARA OBTER O BEM. DOSIMETRIA DA PENA. PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA-BASE PARA O MÍNIMO LEGAL OU DE REDUÇÃO DO PATAMAR DE AUMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. ANTECEDENTES E CONDUTA SOCIAL DESFAVORÁVEIS. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PATAMAR DE AUMENTO PROPORCIONAL. PRETENSÃO DE REDUÇÃO DO AUMENTO REFERENTE À REINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. ACUSADO MULTIRREINCIDENTE. FRAÇÃO DE 1/5 (UM QUINTO) DEVIDAMENTE MOTIVADA. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA, COM A COMPENSAÇÃO COM A REINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. RÉU QUE NÃO CONFESSOU A PRÁTICA DELITIVA. PEDIDO DE INCIDÊNCIA DA TENTATIVA NO GRAU MÁXIMO. NÃO ACOLHIMENTO. ITER CRIMINIS PERCORRIDO QUASE QUE EM SUA INTEGRALIDADE. MANUTENÇÃO DA FRAÇÃO DE ½ (METADE), MAIS BENÉFICA AO AGENTE. PRETENSÃO DE INCIDÊNCIA DO ART. 46 DA LEI DE DROGAS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INDICATIVOS DE QUE O RÉU SEJA INIMPUTÁVEL OU SEMI-IMPUTÁVEL POR DECORRÊNCIA DE SUPOSTA DEPENDÊNCIA QUÍMICA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0004099-83.2023.8.16.0196 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR MARIO NINI AZZOLINI - J. 08.09.2024) Este também é o recente entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina: APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO PELO CONCURSO DE PESSOAS E MEDIANTE FRAUDE (ART. 155, § 4º, II E IV, DO CÓDIGO PENAL ). AGENTE QUE SIMULOU INTERESSE NA COMPRA DE VEÍCULO AUTOMOTOR E, SOB PRETEXTO DE REALIZAR TEST DRIVE, SUBTRAIU A COISA PARA SI. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRETENSA DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O CRIME DE ESTELIONATO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CONSENTIMENTO DO OFENDIDO EM ENTREGAR-LHE O BEM DEFINITIVAMENTE. ARDIL UTILIZADO PARA DIMINUIR A VIGILÂNCIA SOBRE A RES FURTIVA. READEQUAÇÃO TÍPICA QUE NÃO SE DEMONSTRA VIÁVEL. PLEITO DE SUBSTITUIÇÃO DE DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO POR UMA RESTRITIVA DE DIREITOS E UMA DE MULTA. INVIABILIDADE. DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO DO ACUSADO. TIPO PENAL QUE PREVÊ A CUMULAÇÃO DA PENA DE MULTA COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. SUBSTITUIÇÃO NÃO RECOMENDÁVEL. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DO DECISIUM QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0006999-14.2014.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Claudio Eduardo Regis de Figueiredo e Silva, Terceira Câmara Criminal, j. 07-05-2024). Por fim, também é a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: APELAÇÃO. Furto mediante fraude. Recurso defensivo. Absolvição por insuficiência de provas. Impossibilidade. Autoria e materialidade bem demonstradas. Seguras palavras da vítima que encontram respaldo nas demais provas coligidas aos autos. Escusas do acusado que restaram isoladas nos autos. Inviável a desclassificação para o crime de estelionato. Entrega da chave do veículo para teste drive que não foi definitiva. Caracterizada a diminuição da vigilância e não a tradição enganosa da res. Condenação mantida. Dosimetria. Pleito ministerial para aumento da pena-base. Parcial procedência. Bem subtraído de expressivo valor econômico, que acarretou dificuldades financeiras ainda não superadas pela vítima, aliado aos maus antecedentes do réu. Culpa concorrente descaracterizada. Aumento de 1/3 na pena-base. Reprimenda redimensionada. Regime inicial que comporta reparos. Quantum de pena imposta, aliada à reincidência, que autoriza a fixação do regime semiaberto para início de cumprimento. Recursos parcialmente providos. (TJSP; Apelação Criminal 0000037-79.2017.8.26.0568; Relator (a): Leme Garcia; Órgão Julgador: 16ª Câmara de Direito Criminal; Foro de São João da Boa Vista - Vara Criminal; Data do Julgamento: 19/06/2023; Data de Registro: 19/06/2023) Assim, o que se entende é que nos casos em que a vítima não entrega o bem ao agente de forma definitiva, mas apenas para uso momentâneo, acreditando que o réu irá restituí-la, caracteriza-se o delito de furto mediante fraude, uma vez que, nesses casos, o ardil é utilizado para reduzir a vigilância da vítima sobre o bem, e não para fazer com que o ofendido, de forma definitiva, abra mão do bem, como ocorreria, por exemplo, no caso em que o réu entrega cheques falsos à vítima para que ela lhe venda um veículo, entregando-o definitivamente, e não apenas o emprestando – o que, sem dúvidas, caracterizaria o delito estelionato. Diante de tudo o que fora exposto, restou evidente que a conduta perpetrada pelo acusado não se se amolda ao crime de estelionato, cabendo agora verificar se poderia ser tipificado como o delito de apropriação indébita. Na apropriação indébita, o agente detém a posse ou detenção lícita do bem, e o dolo de se apropriar surge após isso, ou seja, o agente recebe o bem de boa-fé, mas depois de estar em sua posse/detenção, passa a agir como se dono fosse, deixando-o de restituí-lo à vítima[2]. In casu, os elementos colhidos nos autos, em especial as declarações quanto ao comportamento do acusado antes de sair com a motocicleta, indicam que ele agiu com animus furandi, e que seu dolo era anterior à posse do bem. Primeiramente, conforme relatado pela vítima, o acusado sempre insistiu muito em andar em sua motocicleta, sendo que quando Douglas permitiu, o réu foi tentar dar partida na moto e acabou afogando, momento em que o ofendido achou melhor “deixar quieto”, mas o réu novamente insistiu em andar na moto, dizendo “pelo amor de Deus” e demonstrando extremo desejo de ficar com o bem. Ademais, apesar de não ter efetivado a negociação com a vítima, o acusado fingiu ter interesse em adquirir a motocicleta para, com isso, poder sair com ela, ou seja, utilizou-se de ardil para que a vítima reduzisse sua vigilância e lhe emprestasse o bem. Logo, ao contrário do que exige o tipo penal previsto no artigo 168 do Código Penal, verifica-se que o acusado, antes mesmo de entrar na posse do bem, já possuía o dolo de toma-lo para si, tanto que agiu de forma fraudulenta, simulando que desejava fazer um test drive no veículo e alegando que queria compra-lo, para com isso entrar na posse do bem. Assim, restando comprovado o dolo anterior do acusado, é incabível a desclassificação do delito de furto qualificado para o crime de apropriação indébita: DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES. RECURSO DOS RÉUS. APELAÇÃO (01). PEDIDO DE FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL, REDUÇÃO DA PENA EM RAZÃO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA, APLICAÇÃO DA MULTA NO MÍNIMO LEGAL E A ISENÇÃO DE CUSTAS JUDICIAIS. CONHECIDO EM PARTE, E NA PARTE CONHECIDA, NÃO PROVIDO. APELAÇÃO (02). PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO, REVISÃO DA DOSIMETRIA, MODIFICAÇÃO DO REGIME PRISIONAL E BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. RECURSO CONHECIDO EM PARTE, E NA PARTE CONHECIDA, PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME1. O Ministério Público denunciou dois réus pela prática de furto qualificado pelo concurso de agentes, conforme artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal. Relatou-se que os acusados, em comunhão de esforços, subtraíram cartões bancários de uma vítima adormecida em transporte público e realizaram transações totalizando R$ 5.500,00.2. A sentença de primeiro grau julgou procedente a denúncia, condenando o primeiro réu a 2 anos e 6 meses de reclusão em regime semiaberto e a segunda ré a 2 anos e 3 meses de reclusão em regime aberto, além do pagamento de multa e indenização à vítima.3. Ambos os réus interpuseram apelações. Apelação (01). A ré Rosângela, pleiteando pleiteia a fixação da pena-base no mínimo legal, a redução da pena em razão da participação de menor importância, a aplicação da multa no mínimo legal e a isenção de custas judiciais. Apelação (02). Por sua vez, o réu Edson, pleiteando desclassificação do crime, revisão da dosimetria, modificação do regime prisional e benefícios da justiça gratuita. O Ministério Público, em contrarrazões, defendeu a manutenção integral da sentença, enquanto a Procuradoria-Geral de Justiça opinou por provimento parcial da Apelação (02).II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO4. Há quatro questões em discussão: (i) saber se o crime praticado pelo apelante Edson poderia ser desclassificado para apropriação indébita; (ii) saber se a dosimetria da pena aplicada aos réus merece reparo; (iii) saber se o regime inicial de cumprimento da pena poderia ser modificado; (iv) saber se os pedidos relacionados à justiça gratuita e à multa são passíveis de conhecimento no presente momento.III. RAZÕES DE DECIDIR5. Não foram conhecidos os pedidos de ambos os apelantes relacionados à concessão do benefício da justiça gratuita e à redução ou isenção da multa penal, pois são matérias afetas ao juízo da execução, conforme precedentes desta Corte (TJPR, Apelação 0004492-92.2019.8.16.0084) e entendimento consolidado no STJ.6. Quanto ao apelo de Rosangela da Silveira, apelação (01), foi rejeitada a tese de participação de menor importância, por configurar inovação recursal. A pena imposta foi mantida, considerando-se que a valoração negativa das circunstâncias do crime está devidamente fundamentada e proporcional ao prejuízo causado à vítima.7. Quanto ao apelo de Edson Ivandel Scherer, apelação (02): a. A desclassificação para apropriação indébita foi afastada, pois o dolo prévio à subtração do bem caracteriza furto qualificado, conforme entendimento pacífico do STJ e desta Corte (STJ, HC 723.349/SP; TJPR, Apelação 0015777-72.2017.8.16.0013). b. Foi reconhecida a atenuante da confissão espontânea, sendo sua pena reduzida para 2 anos de reclusão. No entanto, manteve-se o regime semiaberto devido à reincidência, conforme artigos 33, §2º, alínea "c", e §3º, do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE8. Apelação (01) de Rosangela da Silveira parcialmente conhecida e, na parte conhecida, não provida. Apelação (02) de Edson Ivandel Scherer parcialmente conhecida e, na parte conhecida, parcialmente provida para readequação da pena, mantendo-se o regime inicial semiaberto.Tese de julgamento: "Não se conhece dos pedidos relacionados à concessão de justiça gratuita e à redução da multa penal, pois são matérias afetas ao juízo da execução. A valoração negativa das circunstâncias do crime é legítima quando o prejuízo causado ultrapassa o usual, sendo proporcional à pena aplicada. O dolo prévio à subtração do bem configura furto qualificado, afastando a desclassificação para apropriação indébita. A atenuante de confissão espontânea pode ser compensada integralmente com a agravante da reincidência, observada a proporcionalidade." (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003869-81.2018.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: SUBSTITUTO EVANDRO PORTUGAL - J. 24.03.2025) DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO POR ABUSO DE CONFIANÇA EM CONTINUIDADE DELITIVA (ART. 155, § 4º, II C/C ART. 71, AMBOS DO CP). PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO COM BASE NO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO ACOLHIMENTO. CRIME PRATICADO NA FORMA QUALIFICADA, CUJO VALOR SUBTRAÍDO FOI SUPERIOR A 10% DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. FATORES QUE IMPEDEM A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO BAGATELAR. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA. IMPOSSIBILIDADE. ELEMENTARES DO FURTO QUALIFICADO DEVIDAMENTE EVIDENCIADAS. ANIMUS FURANDI DE VALORES SOB DETENÇÃO SUPERVISIONADA. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.I. CASO EM EXAME: O apelante foi condenado pela prática do crime de furto qualificado pelo abuso de confiança (art. 155, § 4º, II, c/c o art. 71, ambos do CP), à pena de 2 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, além de 12 dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, e fixada indenização de R$ 864,79 pelos danos patrimoniais causados à vítima. 1.2 A defesa apelou requerendo a aplicação do princípio da insignificância para reconhecimento da atipicidade material e a absolvição do réu, e, subsidiariamente, a desclassificação do crime de furto qualificado para apropriação indébita.II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO: 2.1. Se há a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância. 2.2. Subsidiariamente, se cabe a desclassificação do crime de furto qualificado para apropriação indébita.III. RAZÕES DE DECIDIR: 3.1. Não é possível a aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista que o valor subtraído (R$ 864,79) supera 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos, afastando o caráter bagatelar da conduta. Além disso, a qualificadora do abuso de confiança afasta a insignificância, pois o réu, como funcionário da empresa, tinha acesso ao sistema e se aproveitou dessa posição. 3.2. Também não se acolhe o pedido de desclassificação para apropriação indébita, uma vez que ficou claro o animus furandi (intenção de furtar), com o réu subtraindo valores que deveria entregar ao caixa da empresa. 3.3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao negar a aplicação do princípio da insignificância em casos de furto qualificado, especialmente quando há abuso de confiança ou valores superiores a 10% do salário mínimo vigente à época dos fatos, tudo cf. AgRg no REsp n. 1.996.285/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma; AgRg no AREsp n. 2.378.868/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma; e AgRg no AREsp n. 2.304.544/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma.IV. DISPOSITIVO E TESE: 4.1. Recurso não provido. 4.2. Tese de julgamento: "A qualificadora de abuso de confiança, aliada ao valor subtraído superior a 10% do salário mínimo, afasta a aplicação do princípio da insignificância em crime de furto qualificado. Também não é possível a desclassificação para apropriação indébita quando o réu demonstrou animus furandi desde o início, subtraindo valores sob sua detenção supervisionada."Dispositivos relevantes citados: CP, art. 155, § 4º, inciso II.Jurisprudência relevante citada: AgRg no REsp n. 1.996.285/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma. AgRg no AREsp n. 2.378.868/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma. AgRg no AREsp n. 2.304.544/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0022032-38.2020.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR RENATO NAVES BARCELLOS - J. 07.12.2024) Confirmadas a autoria e materialidade delitiva e afastada a tese defensiva de desclassificação, passa-se a análise do tipo penal. O crime de furto está previsto no artigo 155 do Código Penal e descreve como conduta delituosa a subtração de coisa alheia móvel, para si ou para outrem. A objetividade jurídica deste tipo penal é diretamente a posse e, indiretamente, a propriedade. O tipo objetivo é o núcleo do tipo, ou seja, subtrair. Para a prática do delito exige-se o dolo específico, o qual se caracteriza com a vontade consciente de subtrair, acrescido do elemento subjetivo do injusto, que é a finalidade do agente expressa no tipo “para si ou para outrem”, que é o denominado animus furandi ou animus rem sibi habendi. No caso em tela, as provas coligidas demonstram indubitavelmente que o acusado subtraiu a motocicleta da vítima, avaliada em R$43.756,00 (quarenta e três mil setecentos e cinquenta e seis reais). Desse modo, sua conduta amolda-se perfeitamente ao tipo penal em cotejo. Oportuno apontar, ainda, que o delito se perpetrou na modalidade consumada, nos termos do entendimento adotado de forma pacífica pelo STJ[3], no sentido de se fixar a consumação dos delitos de furto e de roubo, com base na chamada teoria da apprehensio, a qual afirma que a mera inversão da posse da res furtiva é suficiente ao aperfeiçoamento dos atos executórios, sendo desnecessário exercício de posse mansa e pacífica do bem. No caso dos autos, o acusado levou a motocicleta até sua residência, onde somente foi localizada cerca de quatro horas depois, diante do rastreamento realizado pela vítima. Com relação à qualificadora da fraude, em que pese o requerimento da defesa pleiteando seu afastamento, entendo que restou plenamente configurada. Isso porque o acusado, sabendo que a vítima estava tentando vender sua motocicleta, fingiu ter interesse em adquiri-la e pediu para realizar um test drive, tendo subtraído o bem logo em seguida. E, ainda que a vítima tenha alegado que não chegou a negociar o bem com o réu, verifica-se que, de qualquer forma, LAERCIO disse à vítima que apenas queria dar “uma volta” na motocicleta e que logo retornaria, e como Douglas o conhecia, acabou cedendo. Nesse sentido, pontuo que os policiais militares Maxine Bif e Leandro Caetano Pinto afirmaram que a vítima teria dito que estava vendendo a moto e o acusado teria dito que ia testá-la, mas não retornou para devolvê-la (seqs. 102.2 e 102.3). A vítima, em juízo (seq. 102.1), pontuou que o réu pediu para dar uma volta da motocicleta, e como ele insistiu muito, acabou deixando, mas que combinou que seria algo rápido. Na delegacia (seq. 45.8), afirmou que estava querendo vender sua moto e LAERCIO havia se interessado, e sempre pediu para dar uma volta, sendo que naquele dia acabou deixado, mas sem combinar nenhuma venda, e o réu não voltou mais. Desta feita, a conduta se amolda à forma qualificada prevista no artigo 155, §4º, II, do Código Penal, pelo uso de fraude. Nesse sentido, a jurisprudência: APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO (ART. 155, §4º, INCISOS II CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. 1. PLEITO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA DIANTE DA IMPOSSIBILIDADE DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E EMOLUMENTOS. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. 2. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO CRIME DE FURTO POR ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. DESCABIDO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS. RÉ QUE OSTENTA MAUS ANTECEDENTES, POIS POSSUI DIVERSAS CONDENAÇÕES POR CRIMES PATRIMONIAIS. HABITUALIDADE CRIMINOSA QUE IMPEDE O RECONHECIMENTO DA INSIGNIFICÂNCIA. CONDUTA ALTAMENTE REPROVÁVEL. PRECEDENTES. CONDENAÇÃO MANTIDA. 3. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE FURTO QUALIFICADO PARA A MODALIDADE SIMPLES. ARGUIDA A AUSÊNCIA COMPROVAÇÃO QUE A RÉ UTILIZOU DE CONFIANÇA, FRAUDE OU DESTREZA. TESE RECHAÇADA. CONJUNTO PROBATÓRIO APTO A EVIDENCIAR, ESTREME DE DÚVIDAS, QUE A SENTENCIADA AGIU DELIBERADAMENTE COM O PROPÓSITO DE QUE A VÍTIMA REDUZISSE A VIGÍLIA SOBRE A RES . PANORAMA QUE NÃO DEIXA PAIRAR DÚVIDAS A RESPEITO DO DOLO NO EMPREGO DE FRAUDE. MANUTENÇÃO DA QUALIFICADORA QUE SE MOSTRA DE RIGOR. 4. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. IMPROCEDÊNCIA. PALAVRA DA VÍTIMA E TESTEMUNHAS QUE POSSUI ESPECIAL RELEVO PROBATÓRIO E EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADA. 5. INVIÁVEL A SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS – MEDIDA NÃO SOCIALMENTE RECOMENDÁVEL – INTELIGÊNCIA DO ART. 44, INCISO II E § 3º, DO CP. 6. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO DEFENSOR DATIVO PELA ATUAÇÃO NA PRESENTE INSTÂNCIA, CONFORME RESOLUÇÃO CONJUNTA 015/2019 – PGE/SEFA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0001966-40.2019.8.16.0089 - Ibaiti - Rel.: SUBSTITUTO HUMBERTO GONCALVES BRITO - J. 22.03.2025) RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO TENTADO QUALIFICADO – ARTIGO 155, §4º, INCISOS II E IV, C/C ARTIGO 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. PLEITO ABSOLUTÓRIO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – NÃO ACOLHIMENTO – MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS – PALAVRA DAS TESTEMUNHAS E CÂMERAS DE VIGILÂNCIA QUE DEMONSTRAM INEQUIVOCAMENTE A AUTORIA DELITIVA. ALMEJADO AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO FURTO MEDIANTE FRAUDE – INVIABILIDADE – APELANTES QUE SIMULARAM SER CLIENTES DO ESTABELECIMENTO, AO ESCONDEREM OS OBJETOS DO CRIME E PASSAREM OUTRO ITEM NO CAIXA – FRAUDE CARACTERIZADA – PRECEDENTES. SENTENÇA MANTIDA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS À DEFENSORA DATIVA PELA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, COM FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0061246-65.2022.8.16.0014 - Londrina - Rel.: SUBSTITUTO ANTONIO CARLOS CHOMA - J. 05.04.2025) Desta forma, presentes os requisitos do fato típico, quais sejam, conduta, resultado, nexo causal e tipicidade, bem como ausente qualquer causa de excludente de ilicitude, sendo o acusado imputável, tendo consciência da ilicitude de seus atos e de que poderia ter agido de forma diversa, merece o réu LAERCIO DE OLIVEIRA ser condenado pela pratica do crime previsto no artigo 155, § 4º, inciso II do Código Penal. 3 – DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na denúncia, para o fim de CONDENAR o réu LAERCIO DE OLIVEIRA, já devidamente qualificado no preâmbulo, como incurso nas sanções artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal. Passo à análise das circunstâncias judiciais e legais e demais etapas para a fixação da respectiva pena. 3.1. Do crime de furto qualificado Circunstâncias judiciais: Culpabilidade: grau de contrariedade ao dever e intensidade do dolo normal à espécie. Antecedentes criminais: conforme oráculo (seq. 101.1), o réu é primário e não registra maus antecedentes passíveis de consideração para o recrudescimento da pena-base. Personalidade: deve ser aferida com base em critérios objetivos aptos a demonstrar a maior ou menor periculosidade do réu, consubstanciada concretamente a partir de suas atitudes, vida social e familiar, agressividade, dentre outros. Sob essa ótica, a personalidade do réu não fugiu da normalidade. Conduta social: não há informações, devendo ser presumida boa, diante do princípio in dubio pro reo. Motivo: normal ao tipo penal em comento. Circunstâncias: tempo de duração, lugar e atitude assumida no decorrer da realização do ato, normais para o crime em comento. Consequências: normais para a espécie de crime em comento. Comportamento da vítima: não ficou provado nos autos que a vítima tenha contribuído para a prática delitiva. Pena base: A legislação penal vigente não indicou a fração que o magistrado deve utilizar quando verificar a existência de circunstâncias judiciais, ficando a seu critério o numerário a ser utilizado. No entanto, conforme orientação doutrinária e jurisprudencial, a fração ideal a ser adotada é de 1/8 (um oitavo), considerando a existência de 8 (oito) circunstâncias judicias listadas no artigo 59 do Código Penal, salvo casos que justifiquem um número maior. Outrossim, conforme consolidado entendimento da 5ª Turma do STJ[4], esta fração de aumento deve incidir sobre o intervalo entre a pena mínima e a pena máxima. Este também é o entendimento adotado pelo TJPR[5]. No caso do crime de furto qualificado, que tem pena entre as balizas de 2 a 8 anos, a fração, para a pena privativa de liberdade, deve incidir sobre 6 anos. Assim, adotando-se a fração de 1/8, o aumento por cada circunstância judicial desfavorável deve ser de 9 meses de reclusão. Diante da inexistência de circunstância judicial desfavorável, fixo a pena base em 2 anos de reclusão. Quanto a pena de multa, o artigo 60 do Código Penal determina que a pena deve ser fixada com base na situação econômica do réu. De acordo com o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ação penal 470, a quantidade de dias-multa é calculada de acordo com o sistema trifásico, previsto no artigo 68 do Código Penal, ou seja, com a análise das circunstâncias judiciais, agravantes e atenuantes e causas de diminuição e aumento. Este juízo entende que as frações de aumento ou de redução de pena na primeira fase da dosimetria da pena devem incidir sobre o intervalo entre a pena mínima e máxima, em se tratando de pena privativa de liberdade. Contudo, para fins de fixação da pena de multa, tendo em vista o princípio da individualização da pena, impõe-se a incidência das frações de aumento e de diminuição sobre o mínimo legal de pena de multa, posto que as balizas legais são fixas para todas as espécies de sanção penal - de 10 a 360 dias-multa. Dessa forma, diferentes espécies de crimes seriam apenadas, em se tratando de pena de multa, de forma igual, circunstância que ensejaria em ferimento ao princípio da proporcionalidade, assim como o da individualização da pena. Portanto, tendo em vista que a pena de multa deve guardar a devida proporção com a pena privativa aplicada, fixo os dias-multa em 20 dias-multa. Circunstâncias atenuantes e agravantes: Não incidem circunstâncias atenuantes ou agravantes. Causas especiais de diminuição ou aumento: Da mesma forma, não há causas de aumento e diminuição de pena. Pena definitiva: Diante das etapas legais acima especificadas para a fixação das reprimendas penais, fica o acusado condenado à pena privativa de liberdade de 2 anos de reclusão e à pena de multa em 20 dias-multa. 3.2. Valor do dia-multa: Estabeleço o valor do dia-multa em 1/30 do salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, em atenção ao artigo 49, §1º, do Código Penal. 3.3. Detração: O artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal, determina que o tempo de prisão cautelar será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. O acusado não foi preso na presente demanda. 3.4. Regime inicial de cumprimento da pena: Considerando a pena aplicada in concreto estabeleço o regime aberto como o inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade, por ser o regime mais indicado, considerando-se a análise realizada com base nos elementos do artigo 59 do Código Penal, mediante o cumprimento das seguintes condições: a) recolhimento em casa de albergado ou, se não houver, na própria residência, para o repouso, das 22:00 às 06:00 horas, e nos dias de folga (domingos e feriados), no período integral; b) proibição de se ausentar da Comarca de residência sem prévia autorização judicial; c) comparecimento mensal em Juízo para informar e justificar suas atividades; d) comparecimento à programa de recuperação e reeducação (artigo 152, parágrafo único, da Lei de Execução Penal – Lei nº. 7.210/84). Deixo de fixar a prestação de serviços à comunidade e a proibição de frequência a determinados lugares como condições do regime aberto, ante o teor da Súmula nº 493 do Superior Tribunal de Justiça[6], cujo posicionamento o E. Tribunal de Justiça do Paraná se alinha[7]. 3.5. Substituição por restritivas de direito: Considerando que a pena privativa de liberdade aplicada ao sentenciado é inferior a quatro anos e que ele preenche os demais requisitos constantes dos incisos I, II e III, do artigo 44 do Código Penal, afigura-se viável e socialmente recomendável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. Sendo assim, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritiva de direitos, na forma do §2º do artigo 44 do Código Penal, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo prazo da condenação e à razão de uma hora por dia de condenação (CP, art. 55), em instituição a ser designada pelo Juízo da execução, e em limitação de final de semana, sendo, em ambos os casos, observada a detração. Justifica-se a imposição da limitação de final de semana e da prestação de serviços à comunidade como modalidades de penas restritivas de direitos, pela maior adequação dos efeitos de tais sanções ao fato criminoso e à condição social e características subjetivas do sentenciado, concretizando-se, desta forma, a restauração do dano causado e o primado da ressocialização – potencializado com a interação propiciada pelo trabalho comunitário e a consequente conscientização do senso de coletividade, indissociável da Paz Social. 3.6. Suspensão condicional da pena: Deixo de aplicar a suspensão condicional da pena (“ex vi” do artigo 77 do Código Penal), tendo em vista a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. 3.7. Da prisão preventiva: Conforme determina o artigo 387, §1º, do Código de Processo Penal, o juiz, ao proferir sentença condenatória, decidirá fundamentadamente sobre a necessidade ou não de imposição de prisão preventiva ao acusado ou outra medida cautelar. Assim, diante da ausência dos requisitos elencados no artigo 312, do Código de Processo Penal, deixo de decretar a prisão preventiva do réu. 3.8. Do valor mínimo para a reparação dos danos: Deixo de fixar indenização civil para reparação dos danos causados pela infração, nos moldes que estabelece o artigo 387, IV, do Código de Processo Penal, por não haver requerimento da vítima ou do Ministério Público neste sentido, bem como pelo fato de a vítima ter recuperado o bem subtraído (seq. 59.2). 4. Destinação de bens: Quanto à motocicleta e ao capacete, verifica-se que foram restituídos à vítima, conforme auto de entrega à seq. 59.2. 5. Disposições finais: Condeno o acusado ao pagamento das custas processuais, na forma do artigo 804 do Código de Processo Penal, e, por via oblíqua, indefiro o requerimento de concessão de justiça gratuita feito na resposta à acusação (seq. 72.1). Em que pese o réu tenha sido assistido pela Defensoria Pública, a situação de hipossuficiência não foi comprovada, sendo que o réu declarou que trabalhava em uma tapeçaria. No mais, se assim entender necessário, poderá pleitear o parcelamento da dívida. Com o trânsito em julgado, realizem-se as seguintes comunicações e diligências: a) oficie-se ao Tribunal Regional Eleitora do Paraná, comunicando a condenação do réu, com a sua devida identificação, acompanhada de cópia da presente decisão; b) expeça-se GUIA DE EXECUÇÃO, comunicando-se. Remeta-se o expediente, devidamente instruído, à Vara de Execuções Penais com competência para a execução da pena privativa de liberdade; c) tratando-se de condenação no regime fechado cujo apenado se encontra preso, deve, de logo, o mandado de prisão ser transferido, pelo sistema BNMP, à Vara de Execuções Penais competente; d) remetam-se os autos ao contador para liquidação da sentença, com o cálculo da pena de multa (no valor da moeda corrente), das custas e demais despesas processuais; e) verifique-se a existência de depósito a título de fiança em valor suficiente para compensação, conforme art. 336 do Código de Processo Penal e art. 4º da Instrução Normativa 02/2015 do CN-CGJ; f) em caso negativo ao item anterior, promova-se a intimação do(s) condenado(s) para, no prazo de dez (10) dias, pagar a importância correspondente ao valor da multa, com a emissão das respectivas guias, com os cuidados do art. 7º da Instrução Normativa 02/2015 do CGJ. Bem ainda, conste no mandado de intimação advertência nos termos dos arts. 847-858 do Código de Normas do Foro Extrajudicial; e, que as guias estão disponíveis no endereço eletrônico do Tribunal de Justiça do Paraná; Comunique-se a vítima desta decisão, por telefone, e-mail ou carta com A.R (artigo 201, §2º, CPP). Cumpram-se as demais disposições do Código de Normas atinentes à espécie. Sentença assinada, registrada e publicada digitalmente. Intimem-se. MÔNICA FLEITH Juíza de Direito (Documento assinado digitalmente) [1] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado, 11ª ed., Impetus: Rio de Janeiro, 2017, p. 806 a 815. [2] O agente, portanto, para que possa praticar a infração penal em estudo, deve agir com o chamado animus rem sibi habendi, ou seja, a vontade de ter a coisa para si, como se fosse dono. Para que se possa configurar o dolo correspondente ao crime de apropriação indébita, ele deverá surgir, obrigatoriamente, após o agente ter a posse ou a detenção da coisa alheia móvel, pois, caso contrário, o fato poderá se consubstanciar em outra infração penal, a exemplo do crime de estelionato (GRECO, Rogério. Código Penal Comentado, 11ª ed., Impetus: Rio de Janeiro, 2017, p. 926). [3] STJ, Súmula 582. Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada. [4] PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. FURTO DUPLAMENTE QUALIFICADO MAJORADO. DOSIMETRIA. VALORAÇÃO DE UMA DAS QUALIFICADORAS NA PRIMEIRA FASE DA INDIVIDUAÇÃO DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AUMENTO PROPORCIONAL. ORDEM NÃO CONHECIDA. 1. (...). 2. A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. Assim, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e os critérios concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, por exigirem revolvimento probatório. 3. (...). 4. No caso, considerando o aumento ideal em 1/8 por cada circunstância judicial negativamente valorada, a incidir sobre o intervalo de pena abstratamente estabelecido no preceito secundário do tipo penal incriminador, que corresponde a 6 anos, chega-se ao incremento de cerca de 9 meses por cada vetorial desabonadora. Assim, não há se falar em desproporcionalidade na pena imposta na primeira etapa da dosimetria a justificar a concessão da ordem de ofício. 5. Writ não conhecido. (STJ. Processo HC 407727 / MG HABEAS CORPUS 2017/0168766-6. Relator Ministro RIBEIRO DANTAS. QUINTA TURMA. Data do Julgamento: 22/08/2017. Data da Publicação/Fonte DJe 30/08/2017). Grifo nosso. Julgados da 5ª Turma do STJ no mesmo sentido: HC 394916 / RJ, HC 384941 / SC, HC 377270 / RS, HC 394330 / SP. [5] APELAÇÃO CRIME - DELITOS DE AMEAÇA E RESISTÊNCIA - 1. DOSIMETRIA DA PENA - CÁLCULO DA PENA-BASE - PLEITO DE REDUÇÃO - NÃO ACOLHIMENTO - 2. SEGUNDA FASE DE FIXAÇÃO DA PENA - CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES - APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DE 1/6 - INCIDÊNCIA SOBRE A PENA-BASE - PENA MODIFICADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. No cálculo da pena-base, o aumento, para cada circunstância judicial negativamente valorada, deve incidir sobre o quantum de um oitavo (1/8) entre o intervalo das penas mínima e máxima cominadas ao delito. 2. Na segunda fase de fixação da pena, o aumento de 1/6 para cada circunstância agravante, deve incidir sobre a pena-base, não sobre o intervalo entre a pena mínima e máxima prevista no tipo penal. (Processo: 1580123-3. Acórdão: 51696. Relator: Luis Carlos Xavier. Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal. Data Publicação: 07/08/2017. Data Julgamento: 13/07/2017). No mesmo sentido: acórdãos 1662249-6, 1671515-4 (1ª Turma do TJPR) e 1634022-4 (4ª Turma do TJPR). [6] “493. É inadmissível a fixação de pena substitutiva (art. 44 do CP) como condição especial ao regime aberto”. [7] TJPR – 2ª C. Criminal – AC 1658301-2 – Rel. Des. José Mauricio Pinto de Almeida. Unânime. J. 10/08/2017
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