Processo nº 0800117-28.2025.8.18.0026
ID: 280245900
Tribunal: TJPI
Órgão: 2ª Vara da Comarca de Campo Maior
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0800117-28.2025.8.18.0026
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FABIO FRASATO CAIRES
OAB/PI XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ 2ª Vara da Comarca de Campo Maior DA COMARCA DE CAMPO MAIOR Rua Aldenor Monteiro, S/N, Fórum Des. Manoel Castelo Branco, Parque Zurick, CAMPO MAIOR - PI - CEP: 642…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ 2ª Vara da Comarca de Campo Maior DA COMARCA DE CAMPO MAIOR Rua Aldenor Monteiro, S/N, Fórum Des. Manoel Castelo Branco, Parque Zurick, CAMPO MAIOR - PI - CEP: 64280-000 PROCESSO Nº: 0800117-28.2025.8.18.0026 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado, Repetição do Indébito] AUTOR: JOSE FRANCISCO GUADALUPE DA SILVA REU: BANCO BMG SA SENTENÇA Vistos. Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO c/c INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS proposta por JOSE FRANCISCO GUADALUPE DA SILVA em face de BANCO BMG SA todos devidamente qualificados. A parte autora alega, em síntese, que recebe o benefício, NB 540.995.456-0, com renda mensal de um salário, e que sofre com os descontos indevidos em seu benefício, em razão da contratação de empréstimos fraudulentos. Disse que no dia 08/11/2024 o Requerente compareceu ao INSS e visualizou em seu extrato do consignado a existência de empréstimos. Diante disso, a parte autora verificou os descontos irregulares de seu benefício previdenciário, momento que constatou que possuía os seguintes dados: CONTRATO: 18394757 BANCO: BANCO BMG S.A. RESERVA ATUALIZADO: R$70,60 LIMITE DO CARTÃO: R$1.666,00. No entanto, o Requerente desconhece qualquer transação realizada com a Requerida, sendo que desconhece totalmente os serviços prestados pela mesma. Requer a procedência da ação para que seja declarado nulo o contrato supostamente firmado entre as partes, bem como reconhecer a responsabilidade objetiva do banco requerido, condenando-o na repetição do indébito e consequentemente a devolução em dobro de tudo o que foi pago indevidamente, assim como, a condenação em indenização pelos danos morais injustamente suportados. Em sede de contestação (ID nº 73161355), o requerido, preliminarmente, falta de interesse de agir. No mérito, alega a regularização e legalidade da contratação, e a inaplicabilidade de qualquer indenização. Ao final, requer a improcedência da ação. Réplica à Contestação de ID nº 76035963. É, em síntese, o relatório. DECIDO. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO De acordo com o art. 355, I, CPC, o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença quando não houver necessidade de produção de outras provas. O STJ entende que no sistema de persuasão racional adotado pelo Código de Processo Civil nos arts. 130 e 131, em regra, não cabe compelir o magistrado a autorizar a produção desta ou daquela prova, se por outros meios estiver convencido da verdade dos fatos, tendo em vista que o juiz é o destinatário final da prova, a quem cumpre a análise da conveniência e necessidade de sua produção. (STJ - AgInt no AREsp: 1249277 SP 2018/0032181-5, Relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 16/10/2018, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/10/2018) É o caso dos autos. A matéria envolvida pela lide diz respeito unicamente à questão aos documentos que embasam a presente ação, não havendo mais provas a se produzir ou discussão sobre fatos que já não estejam comprovados documentalmente, pelo que passo ao julgamento antecipado do mérito. PRELIMINARES FALTA DE INTERESSE DE AGIR Em sede de preliminar, alega o demandado ausência de interesse de agir sob o argumento de que o autor não postulou sua pretensão administrativamente, bem como não notificou o banco réu sobre o evento que supostamente teria lhe causado danos. O interesse de agir da parte autora, independentemente de se discutir sobre ter ou não esgotado a via administrativa, encontra-se caracterizado em função do disposto no artigo 5º, XXXV, da CF, uma vez que ao Poder Judiciário não é dado declinar quanto à apreciação de controvérsias referentes às alegações sobre lesão ou ameaça de direito. Portanto, não é obrigatório o esgotamento da via administrativa para invocar a atividade jurisdicional, por não ser um requisito necessário, não havendo, pois, que se falar em ausência de interesse. Assim, considero perfeitamente lícito o exercício do direito de ação da promovente em face do requerido. Diante das razões acima expostas, rejeito a preliminar suscitada pela parte requerida. DO MÉRITO O cerne da questão reside em verificar se houve a contratação do negócio jurídico que deu origem aos descontos, bem como se a parte autora efetivamente fez o uso do mesmo de forma a autorizar o desconto mensal em seu provento. No caso concreto, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, conforme orienta a Súmula n. 297 do STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.'' Resta evidente, também segundo as regras ordinárias de experiência, a hipossuficiência da parte autora, pessoa humilde, de poucos rendimentos e idosa, em face da instituição financeira. Por isso, o requerente faz jus ao benefício da inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Dessa forma, a partir da afirmação da parte autora de que não firmou o contrato de empréstimo que ensejou os descontos em seu benefício previdenciário, incumbia ao banco demandado demonstrar a regularidade da contratação, o que não ocorreu, conforme demonstrado adiante. Nesta seara, incidem no caso as normas da Lei 8.078/90, mais precisamente o preceito contido no caput e §1º, I a III, de seu artigo 14, que consagra a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores. “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido”. (grifo nosso) Na responsabilidade pelo fato do serviço, hipótese de que se cuida na espécie, o ônus da prova acerca da inexistência de defeito na prestação da atividade é do fornecedor, a teor do disposto no art. 14, § 3º, I e II, do CDC. “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.” (grifo nosso) Pois bem, compulsando os autos, verifica-se que o contrato (ID nº 73202758) foi realizado por aparelho celular, com envio de fotografias de documentação pessoal. No entanto, a forma de contratação com a parte Autora viola os preceitos dos atos normativos constantes no INSS/PRES n.º 28, de 16 de maio de 2008, tendo em vista que a parte autora é pessoa idosa, de pouca instrução e retira da sua aposentadoria estes valores para sua subsistência que se encontram comprometidos pelo desconto, sendo notaria a violação contratual, nos termos da art. 3.º da instrução normativa: Art. 3.º [...] Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que: II - mediante contrato firmado e assinado [...], junto com a autorização de consignação assinada; III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico (assinatura digital realizada por intermédio de certificados digitais ICP Brasil – acrescentou-se) e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência. Art. 5.º A instituição financeira, independentemente da modalidade de crédito adotada, somente encaminhará o arquivo para averbação de crédito após a devida assinatura do contrato por parte do beneficiário contratante, ainda que realizada por meio eletrônico (assinatura digital realizada por intermédio de certificados digitais ICP Brasil – acrescentou-se) Art. 6.º A inobservância do disposto no art. 5.º implicará total responsabilidade da instituição financeira envolvida [...]. Frente a isso, o requerido deixa de comprovar o ônus que lhe incumbia, não apresentando fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, na forma do art. 373, II, CPC. É a jurisprudência: ''APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA REJEITADA. DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA. APLICABILIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES.RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES, DESCONTADO O VALOR DEPOSITADO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-FÉ. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.COMPROVAÇÃO DO DEPÓSITO EM CONTA DA AUTORA. MERO ABORRECIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível nº 201900718412 nº único0001148-15.2018.8.25.0076 - 1ª CÂMARA CÍVEL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator (a): Roberto Eugenio da Fonseca Porto - Julgado em 07/10/2019) (TJ-SE - AC: 00011481520188250076, Relator: Roberto Eugenio da Fonseca Porto, Data de Julgamento: 07/10/2019, 1ª CÂMARA CÍVEL)'' Portanto, não tendo o réu se desincumbido do seu ônus, DECLARO A NULIDADE DO CONTRATO DISCUTIDO NOS AUTOS. Dessa forma, nos termos do art. 42, CDC, todos os valores EFETIVAMENTE DESCONTADOS na conta da autora deverão ser devolvidos em dobro, com correção monetária e juros de mora de 1% ao mês contados a partir de cada desconto. Nesse sentido: ''PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INCIDÊNCIA. PESSOA IDOSA E ANALFABETA. CONTRATO BANCÁRIO NULO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. SENTENÇA MANTIDA IN TOTUM. RECURSO CONHECIDO EIMPROVIDO. 1. Configurada está a conduta ilícita praticada pelo ora apelante, responsável pelo desconto indevido no benefício previdencíário do apelado, com base num contrato de empréstimo evidentemente nulo. 2. A restituição em dobro dos valores indevidamente abatidos é medida que se impõe \"ex vi\" do arí. 42, parágrafo único do CDC. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito. 3. Os descontos consignados nos proventos de aposentadoria encontram-se evidenciados e ocasionaram ao recorrido, idoso, adversidades que ultrapassam o mero aborrecimento, sendo suficiente para ensejar a indenização por Danos Morais. 4. Sentença mantida. 5. Recurso conhecido e improvido. (TJPI | Apelação Cível Nº 2016.0001.011990-4 | Relator: Des. José Ribamar Oliveira | 2ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 26/02/2019)'' Do exposto, merece guarida o pleito inicial. Pois não se pode falar em engano justificável, capaz de excluir a reconhecida má-fé, uma vez que o banco réu detinha as ferramentas necessárias para não proceder à cobrança indevida em benefício previdenciário/conta de idoso. Sendo certo que as instituições financeiras adotam os critérios de segurança que melhor lhe convém, porém não podem se eximir da responsabilidade no caso de alguém vir a sofrer danos em razão de eventuais falhas ocorridas na prestação do serviço. DO DANO MORAL Cabível a reparação moral em favor da requerente em razão de ter descontos indevidos em seus proventos, extrai-se dos autos que o Autor é uma pessoa idosa que necessita do seu subsídio para a sua subsistência. Ameaçar o direito à sobrevivência digna de uma pessoa constitui dano moral por excelência, mediante ofensa a direitos da personalidade, e encontra amparo no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, constituindo um dos fundamentos da república. Em tais situações os danos morais se presumem, verificam-se “in re ipsa”, ou seja, decorrem da força dos próprios fatos, pouco importando inexista prova quanto ao efetivo prejuízo sofrido pela vítima em face do evento danoso. Pela dimensão do fato e sua natural repercussão na esfera do lesado, é impossível deixar de imaginar que o dano não se configurou. Os danos morais, nessas circunstâncias, são inerentes ao ilícito civil, decorrendo daí o dever de indenizar, sem exigir qualquer outro elemento complementar para sua demonstração. Nesse sentido: Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado do Piauí GABINETE DO Desembargador JOSÉ WILSON FERREIRA DE ARAÚJO JÚNIOR PROCESSO Nº: 0800898-05.2022.8.18.0075 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Cláusulas Abusivas] APELANTE: MARIA LUCIA DE SOUSA MOURAAPELADO: BANCO BRADESCO S.A. DECISÃO TERMINATIVA EMENTA. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA. AUSÊNCIA DE INSTRUMENTO CONTRATUAL. AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE PAGAMENTO. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 18 DO TJPI E SÚMULA Nº 26 DO TJPI. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I – RELATÓRIO Trata-se de recurso de apelação interposto por BANCO BRADESCO S.A. em face de sentença proferida pelo juízo da Vara Única da Comarca de Simplício Mendes/PI que, nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA, ajuizada por MARIA LUCIA DE SOUSA MOURA, julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para determinar o cancelamento do contrato de empréstimo consignado objeto desta ação, bem como condenar a instituição a restituir em dobro os valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da requerente e ao pagamento da quantia de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) a título de danos morais. Por fim, condenou o requerido ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação. Em suas razões recursais (ID. 24015281), a parte Apelante requer o provimento ao apelo, a fim de que, neste plano recursal, haja a reforma integral da sentença vergastada, aduzindo, em suma, a regularidade da contratação e a disponibilização da quantia contratada. Contrarrazões à apelação, a parte Apelante alega, preliminarmente, a ofensa ao princípio da dialeticidade e, quanto ao mérito, pugna pelo não provimento ao recurso, sob o fundamento de que a instituição financeira deixou de comprovar a regularidade da contratação. Diante da recomendação do Ofício Circular 174/2021 – OJOI/TJPI/PRESIDENCIA/GABJAPRE/GABJAPRES2, deixo de remeter os autos ao Ministério Público, por não vislumbrar interesse público que justifique sua atuação. É o relatório. II – DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO Atendidos os pressupostos recursais intrínsecos (cabimento, interesse, legitimidade e inexistência de fato extintivo do direito de recorrer) e os pressupostos recursais extrínsecos (regularidade formal, tempestividade e preparo), o recurso deve ser admitido, o que impõe o seu conhecimento. III – FUNDAMENTAÇÃO Cinge-se a controvérsia acerca da pretensão da parte Recorrente em ver reconhecida a regularidade da contratação em análise. De início, não há dúvida de que a referida lide, por envolver a discussão acerca de falha na prestação de serviços é regida pela ótica do Código de Defesa do Consumidor, o que, inclusive, restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme a redação: STJ/SÚMULA Nº297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Nas referidas ações, em regra, é deferida em favor da parte Autora a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência técnica financeira, a fim de que a Instituição bancária Requerida comprove a existência do contrato, bem como o depósito da quantia contratada. Esta é uma questão exaustivamente debatida nesta E. Câmara Especializada Cível, possuindo até mesmo disposição expressa na Súmula nº 26 deste TJPI, in litteris: TJPI/SÚMULA Nº 26 – Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art., 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo de seu direito, de forma voluntária ou por determinação do juízo. Nesse contexto, é imprescindível que se reconheça a vulnerabilidade do consumidor, contudo, a aplicação da norma consumerista não significa que a demanda promoverá um favorecimento desmedido de um sujeito em prol de outro, pois o objetivo da norma é justamente o alcance da paridade processual. Do conjunto probatório colhido dos autos, verifica-se que a instituição financeira não se desincumbiu do seu dever de comprovar a contratação com a devida juntada do instrumento contratual. De igual modo, em análise minuciosa dos autos, verifica-se que o banco Requerido deixa de juntar documento que comprove a efetiva disponibilização da quantia supostamente contratada. Assim, frente a esses fatos, forçosa é a declaração de nulidade do contrato, conforme decidido pelo juízo sentenciante, o que acarreta ao Banco, o dever de restituir à Autora os valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, como já sumulado por este Tribunal, verbis: TJPI/SÚMULA Nº 18: A ausência de transferência do valor do contrato para conta bancária de titularidade do mutuário enseja a declaração de nulidade da avença e seus consectários legais e pode ser comprovada pela juntada aos autos de documentos idôneos, voluntariamente pelas partes ou por determinação do magistrado nos termos do artigo 6º do Código de Processo Civil. A conduta do banco Apelante de efetuar descontos no benefício previdenciário da consumidora, tomando como base uma contratação nula caracteriza ato ilícito, acarreta, no caso em apreço, a aplicação do disposto no parágrafo único, do art. 42, do CDC. Vejamos: Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. À vista disso, a Corte Cidadã, no informativo 803 (EAREsp 1.501.756-SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 21/2/2024), entendeu que a incidência do parágrafo único do art. 42 do CDC (repetição em dobro) independe de culpa, dolo ou má-fé, visto que havendo a cobrança/recebimento de valor indevido pelo fornecedor, a responsabilidade recairá de forma objetiva, isto sem a necessidade de apelo ao elemento volitivo. Nesse ponto, aplica-se como termo inicial para a contagem dos juros de mora a data citação, como assim dispõe a redação do art. 405 do CC, enquanto que para a correção monetária utiliza-se a data de cada desembolso, ou seja, a partir da data do efetivo prejuízo, nos termos da Súmula nº43 do STJ. No que versa aos índices a serem aplicados, a partir de 30.8.2024, com o vigor pleno da Lei n. 14.905/2024, a atualização dos débitos judiciais, na ausência de convenção ou de lei especial em sentido contrário, passa a se dar pelos índices legais de correção monetária e/ou de juros de mora previstos nos arts. 389, p. único, e 406, § 1º, ambos do CC, sendo estes: IPCA para correção monetária e Taxa Selic - deduzido o IPCA - para os juros moratórios. Em relação ao quantum indenizatório, conquanto inexistam parâmetros legais para a sua estipulação, não se trata aqui de tarefa puramente discricionária, uma vez que a doutrina e a jurisprudência estabelecem algumas diretrizes a serem observadas. Assim, o julgador deve pautar-se por critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando, ainda, a dupla natureza desta condenação: punir o causador do prejuízo e garantir o ressarcimento da vítima. Nesse contexto, é assente na doutrina e na jurisprudência que a indenização por danos morais, além de servir para compensar a vítima pelos danos causados, deve possuir o caráter pedagógico, funcionando como advertência para que o causador do dano não reincida na conduta ilícita. Diante dessas ponderações, e considerando que não houve recurso voluntária da parte autora, entendo ser legítima a fixação do valor da condenação da verba indenizatória no patamar de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais). Sobre este montante, aplica-se como termo inicial para a contagem dos juros de mora a data citação, como assim dispõe a redação do art. 405 do CC, enquanto que para a correção monetária utiliza-se a data do arbitramento do valor da indenização, no caso, a data do julgamento, na forma da súmula 362 do STJ. No que versa aos índices a serem aplicados, nos termos dos arts. 389, p. único, e 406, § 1º, ambos do CC, adota-se o IPCA para correção monetária e Taxa Selic - deduzido o IPCA - para os juros moratórios. IV – DISPOSITIVO Por todo o exposto, CONHEÇO do recurso, para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo incólume os termos da sentença vergastada. Para mais, MAJORO os honorários de sucumbência para 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Intimem-se as partes. Transcorrendo in albis o prazo recursal, arquivem-se os autos, dando-se baixa na distribuição. DES. JOSÉ WILSON FERREIRA DE ARAÚJO JÚNIOR Relator (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0800898- 05.2022.8.18.0075 - Relator: JOSE WILSON FERREIRA DE ARAUJO JUNIOR - 2ª Câmara Especializada Cível - Data 07/05/2025) Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONTRATAÇÃO. NULIDADE DO CONTRATO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. RECURSO DESPROVIDO, COM DETERMINAÇÕES DE OFÍCIO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta contra sentença proferida em ação de repetição de indébito c/c indenização por danos morais. A sentença declarou a nulidade do contrato nº 346586811-9, condenando o banco à restituição em dobro dos valores descontados indevidamente do benefício previdenciário da autora e ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 1.500,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se houve comprovação da contratação do empréstimo consignado; (ii) estabelecer a validade da condenação à restituição em dobro dos valores descontados indevidamente; (iii) determinar se a indenização por danos morais era devida e se o valor fixado deveria ser alterado. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O banco não comprova a existência do contrato nem a efetiva disponibilização dos valores à autora, ônus que lhe competia, ensejando a nulidade da avença e a devolução dos valores descontados. 4. Nos termos da Súmula nº 18 do TJPI, a ausência de comprovação do repasse do valor ao consumidor autoriza a declaração de nulidade do contrato e a restituição dos valores indevidamente descontados. 5. A repetição do indébito deve ocorrer em dobro, conforme jurisprudência do STJ e da 3ª Câmara Especializada Cível, salvo quanto aos valores eventualmente prescritos nos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. 6. O desconto indevido em benefício previdenciário configura dano moral in re ipsa, sendo desnecessária a comprovação de sofrimento concreto para a indenização. 7. O valor da indenização por danos morais, fixado em R$ 1.500,00, não pode ser majorado em razão da vedação à reformatio in pejus, pois o recurso é exclusivo da instituição financeira. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido, com determinações de ofício. Tese de julgamento: 1. A instituição financeira tem o ônus de comprovar a contratação do empréstimo consignado e a efetiva disponibilização dos valores ao consumidor. 2. A ausência de comprovação da contratação enseja a nulidade do contrato e a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, salvo quanto aos valores prescritos. 3. O desconto indevido em benefício previdenciário configura dano moral in re ipsa, dispensando prova do sofrimento concreto. 4. A indenização por danos morais deve ser fixada observando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sendo vedada a reformatio in pejus quando o recurso for exclusivo do réu. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, V e X; CC, arts. 186, 405, 406, 944 e 945; CPC, arts. 219, caput, 240, caput, 487, I, e 1.003, § 5º; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 42, parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas nºs 43, 54 e 362; STJ, EAREsp nº 676.608/RS; STJ, REsp nº 1.962.674/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 24/5/2022; TJPI, Súmulas nºs 18 e 26. (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0804514-08.2022.8.18.0036 - Relator: LUCICLEIDE PEREIRA BELO - 3ª Câmara Especializada Cível - Data 20/03/2025) Concernente à quantificação do dano moral, há que se levar em conta os critérios da razoabilidade, proporcionalidade e equidade, sem olvidar o grau de culpa dos envolvidos, a extensão do dano, bem como a necessidade de efetiva punição do ofensor, a fim de evitar que reincida na sua conduta lesiva. Incumbe ao julgador, na quantificação dos danos morais ou extrapatrimoniais, levar em conta as peculiaridades do caso concreto, estimando valor que não se preste a ensejar o enriquecimento sem causa da ofendida, porém seja suficiente para significar adequada reprimenda ao ofensor, evitando que reincida no comportamento lesivo. Sopesados tais vetores, considerando a gravidade da conduta ilícita e a extensão dos prejuízos causados ao sujeito lesado, bem como o número de parcelas descontadas arbitro o valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhetos reais) a título de reparação do dano moral a serem pagos a parte autora. DA COMPENSAÇÃO DO VALOR RECEBIDO Em que pese os danos suportados e aborrecimentos para desfazimento de empréstimo consignado, é de se observar que o banco requerido juntou aos autos comprovante de depósito atinente ao contrato em favor da conta bancária da parte autora, conforme TED ID nº 73202760. O fato de declarar nulo o contrato de empréstimo consignado não ilide a obrigação de o autor devolver o valor creditado na sua conta bancária em razão desse empréstimo, sob pena de caracterizar enriquecimento sem causa, o que é vedado pelo ordenamento jurídico (art. 884, CC). Nesse sentido: ''APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL c.c. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - Empréstimo Consignado não contratado - Sentença de parcial procedência - Insurgência da instituição financeira/ré - Ilegitimidade passiva - Inocorrência - Banco C6 Consignado S.A. atual denominação do Banco Ficsa S.A. conforme comprovado em ficha cadastral juntado aos autos - Preliminar afastada - Autor que refuta a contratação do empréstimo consignado cujas parcelas foram descontadas de seu benefício previdenciário - Réu que não se desincumbiu de demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do artigo 333, II, Código de Processo Civil - Desconstituição e declaração de nulidade da operação financeira questionada - Negócio jurídico inexistente - Retorno das partes ao status quo ante é medida que se impõe - Devolução, pelo autor, da quantia indevidamente creditada em sua conta bancária, abatidos os descontos realizados em seu benefício previdenciário, sob pena de enriquecimento sem causa - Compensação de valores permitida - Sentença de parcial procedência reformada nesse ponto - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(TJ-SP - AC: 10016320920208260369 SP 1001632-09.2020.8.26.0369, Relator: Lavínio Donizetti Paschoalão, Data de Julgamento: 21/07/2021, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/07/2021)'' Nessa senda, deverá ser observada a compensação do valor depositado em conta bancária do autor (ID 73202760), sob pena de enriquecimento ilícito. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados pelo autor, resolvendo o mérito nos termos do art. 487, I, do CPC, em face da parte Ré. para: a) DECLARAR a nulidade do contrato discutido nos autos, bem como a inexistência de quaisquer débitos dele oriundos; b) CONDENAR o réu a devolver em dobro os valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da parte Requerente (art. 42, parágrafo único, do CDC), acrescidos de juros de 1% ao mês a partir dos descontos e correção monetária pelo INPC; observado o abatimento do valor depositado na conta bancária do Autor (ID 73202760) a título de compensação, sob pena de enriquecimento ilícito. c) CONDENAR o Banco Réu a pagar à parte Autora, a título de reparação por danos morais, o valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhetos reais) , acrescidos de juros de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir da publicação da sentença. Deverá a parte ré arcar com as custas processuais e com honorários advocatícios aos procuradores do autor, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação com fulcro no art. 86, parágrafo único, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquive-se, com baixa na distribuição. Expedientes necessários. Cumpram-se. CAMPO MAIOR-PI, 25 de maio de 2025. CARLOS MARCELLO SALES CAMPOS Juiz(a) de Direito da 2ª Vara da Comarca de Campo Maior
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