1. Thiago Santana Da Costa (Agravante) x 2. Ministério Público Do Estado De São Paulo (Agravado)
ID: 342603801
Tribunal: STJ
Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL
Classe: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
Nº Processo: 1503631-50.2022.8.26.0536
Data de Disponibilização:
05/08/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
SANDY BESERRA LIRA
OAB/SP XXXXXX
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DEMÉTRIO WEILL PESSÔA RAMOS
OAB/DF XXXXXX
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MARCO ANTONIO DE MAGALHAES GUIMARAES
OAB/DF XXXXXX
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JULIANA CLAUDINA DOS SANTOS COTTINI
OAB/SP XXXXXX
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AREsp 2835936/SP (2025/0010167-9)
RELATOR
:
MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
AGRAVANTE
:
THIAGO SANTANA DA COSTA
ADVOGADOS
:
JULIANA CLAUDINA DOS SANTOS COTTINI - SP227325
MARCO ANTONIO DE MAGALHAE…
AREsp 2835936/SP (2025/0010167-9)
RELATOR
:
MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
AGRAVANTE
:
THIAGO SANTANA DA COSTA
ADVOGADOS
:
JULIANA CLAUDINA DOS SANTOS COTTINI - SP227325
MARCO ANTONIO DE MAGALHAES GUIMARAES - DF029246
DEMÉTRIO WEILL PESSÔA RAMOS - DF036526
SANDY BESERRA LIRA - SP482954
AGRAVADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORRÉU
:
VITALINO SANTIAGO DA RESSUREIÇÃO JÚNIOR
DECISÃO
Trata-se de agravo em recurso especial interposto por THIAGO SANTANA DA COSTA contra julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação Criminal n. 1503631-50.2022.8.26.0536).
Depreende-se do feito que o recorrente foi condenado à pena de 8 anos e 9 meses de reclusão e a pagar 875 dias-multa, como incurso no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006; à pena de 5 anos e 3 meses de reclusão e a pagar 17 dias-multa, como incurso no art. 16, caput e § 1º, inciso IV, da Lei n. 10.826/2003; e à pena de 7 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão e a pagar 25 dias-multa, como incurso no art. 2º, caput e § 2º, da Lei n. 12.850/2013. Em razão do concurso material, as penas privativas de liberdade foram somadas, perfazendo 21 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática de tráfico de drogas e condutas afins, porte ilegal de arma de fogo de uso restrito e organização criminosa, todos combinados na forma do art. 69 do diploma penal repressivo (e-STJ fls. 1.258/1.288).
A Corte de origem, em análise de Apelação Criminal n. 1503631-50.2022.8.26.0536, negou provimento ao apelo, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos (e-STJ fls. 1.497/1.537).
Daí o agravo em recurso especial, no qual alega a defesa:
a) Nulidade da prova encartada aos autos, posto que obtida mediante mandados de busca e apreensão domiciliar nulos, sendo o mandado relativo ao Morro do José Menino genérico por não especificar o endereço exato, e o mandado relacionado à residência do acusado em São Vicente cumprido em local diverso do autorizado (e-STJ fls. 1.362/1.404, 1.546, 1.548).
b) Nulidade das apreensões dos celulares, justificando que, até o momento da apreensão de tais objetos, não haviam sido localizadas drogas ou outros bens ilícitos na posse direta do acusado, não havendo situação de flagrância (e-STJ fls. 1.362/1.404, 1.548).
c) Alegação de ausência de elementos sólidos de materialidade e autoria para lastrear a condenação criminal (e-STJ fls. 1.362/1.404).
d) Necessidade de redução da pena aplicada, caso não verificadas as nulidades apontadas (e-STJ fls. 1.362/1.404).
e) Contrariedade ao art. 157, caput e § 1º do CPP (prova ilícita); ao art. 240, § 1º e § 2º do CPP (busca e apreensão irregular); ao art. 243 do CPP (apreensão de celulares em contrariedade à decisão); e ao art. 5º, inciso XI, da CF (violação de domicílio) (e-STJ fls. 1.546/1.548).
f) Alegação de que o recurso especial não foi interposto sem a fundamentação necessária, e todos os argumentos do aresto foram devidamente atacados (e-STJ fl. 1.595).
g) Alegação de que o recurso especial não se baseou em dissídio jurisprudencial, e não se busca reexame ou rediscussão de provas, mas sim a legalidade da busca e apreensão domiciliar e a valoração jurídica da prova produzida (e-STJ fls. 1.596/1.597).
Requer, ao final:
a) Sejam dados conhecimento e provimento ao presente recurso especial, para reconhecer a ilegalidade do mandado de busca e apreensão, bem como da busca pessoal e domiciliar, declarando-se, assim, a nulidade da prisão em flagrante e de todos os atos dela decorrentes (e-STJ fls. 1.553/1.554).
b) Consequentemente, seja declarada prejudicada a materialidade e, por conseguinte, seja absolvido o recorrente, nos termos do art. 386, inciso II, do CPP (e-STJ fl. 1.554).
c) Na remota hipótese do não conhecimento do presente recurso especial, seja concedido habeas corpus de ofício, na forma do art. 654, § 2º, do CPP, afastando-se as ilegalidades ora expostas, determinando-se a absolvição do recorrente, com fulcro no art. 386, II e VII, do CPP (e-STJ fl. 1.554).
A Procuradoria-Geral da República opinou pelo não conhecimento do agravo (e-STJ fls. 1.636/1.638).
É o relatório.
Decido.
Sobre as teses levantadas, assim se manifestou o Juiz singular (e-STJ fls. 1.264/1.288):
Inicialmente, cumpre-me repelir a alegação de que este juízo prevaricou. Quando as Dr. Advogadas imputaram a prática de crime pela autoridade policial, este juízo imediatamente solicitou a apuração da acusação à autoridade censora que tem atribuição para investigar o informe. Aguarda-se o resultado da investigação. Também devo repelir a alegação de que este juízo deliberadamente retardou julgamento do pedido de liberdade provisória feito pelas Dr. Defensoras em favor do acusado com o objetivo de impedir a interposição de habeas corpus antes do recesso forense. Como é possível ver nos autos 001713-68 que estão em apenso, as Dr. Defensoras requereram a revogação da prisão preventiva em 11.11.2022 (fl. 1). Aquela data foi uma sexta-feira, véspera de feriado prolongado que se estendeu até 15.11.22, uma terça-feira. No mesmo 11.11.22 o cartório, diligentemente, encaminhou os autos ao Ministério Público, que apresentou manifestação (fl. 36). No primeiro dia útil seguinte, 16.11.22, quarta-feira, as Dr. Defensoras, antes que os autos pudessem ser conclusos ao juízo, renovaram o pedido, juntando documentos (fl. 43). Naquela mesma data, o juízo determinou que se abrisse vista ao Ministério Público para que ele tivesse ciência dos documentos juntados (fl. 63). Naquela mesma quarta-feira, o cartório, com toda presteza, abriu vista à Dr. Promotora de Justiça que, imediatamente, se manifestou (fl. 65). Os autos foram conclusos em 17.11.22 (quinta-feira), às 16h16min. O juízo, dentro do prazo legal, baixou decisão em 21.11.22, segunda-feira (fl. 71). A decisão de indeferimento foi encaminhada à publicação no diário oficial na mesma data (fl. 80). Em 6.12.22, o juízo recebeu requisição de informações em habeas corpus e as prestou no mesmo dia (fl. 84 e 130). Logo, não houve retardo. Portanto, as acusações feitas pelas Dr. Defensoras a este juízo estão baseadas em alegações que se afastam da verdade. Passo ao mérito. O acusado, que durante a lavratura do auto de prisão em flagrante delito permaneceu calado (fl.11), diante do juízo, negou as imputações. Afirmou perfeito desconhecimento a respeito da droga e das armas apreendidas. Asseverou que jamais fez parte de organização criminosa. Disse que as acusações foram engendradas pelos policiais porque ele não se dobrou a sucessivas extorsões. Negou ter o apelido de "Nego Ney". Admitiu ter o cognome de "Tigrão" desde criança. Confessou ainda que, na adolescência e início da juventude, praticara atos infracionais e delitos. Ressalvou que jamais participou do crime organizado. Sofreu duas condenações. Cumpriu integralmente as penas. Reinserira-se na sociedade. Fazia um ano e sete meses que trabalhava em uma vidraçaria quando se deu sua prisão. Para evitar problemas, mudara-se do morro José Menino para São Vicente. Ia à antiga moradia com pouca frequência, apenas para visitar a mãe, cardíaca e diabética, e o pai de criação. Usava transporte público ou a motocicleta da esposa. Tomara por companheira uma namorada de infância. Após inúmeras tentativas, sua mulher havia engravidado. Tratava-se de gravidez de risco que exigia dele total assistência. A esperada criança nasceria em dois meses quando se deram os fatos. Portanto, para segurança da própria família, ele jamais se envolveria em delitos. Asseverou que não tinha nenhuma relação com o endereço onde foram apreendidas droga e as armas. A casa de sua mãe era bem distante daquele local. Afirmou que não conhece Vitalino. Negou o acusado que usasse com frequência o Fiat Strada e o Chevrolet Ônix, mencionados nos autos. Às vezes, os tomava emprestados a Alysson seu amigo de muitos anos. Esporadicamente, pilotava a motocicleta da companheira. Negou que costumasse deixar os veículos nas proximidades do morro. Disse que, algumas semanas antes dos fatos, fora abordado pelos policiais civis que funcionam nesta persecução, no supermercado Carrefour, em São Vicente. Eles o acusaram de ser comandante do tráfico e lhe exigiram dinheiro. Aqueles mesmos policiais, tempos antes o haviam prendido em uma barbearia sob a equivocada afirmação de que pendia mandado de prisão contra ele. Quando ele resistiu à extorsão e disse que não mantinha relações com o crime, os policiais replicaram que iriam prejudicá-lo. Para justificar a posse do Fiat Strada no dia da prisão, o réu disse que Alysson, o proprietário do veículo, é seu amigo de infância. Aduziu que jamais soube de envolvimento de Alysson com o tráfico. Na noite anterior à prisão, pediu o automóvel emprestado ao amigo, para levar a esposa a uma sessão de fotos. Na manhã da data dos fatos, como pretendesse pintar o quarto da filha que nasceria em dois meses, foi com o Fiat Strada à Obramax, em Praia Grande, comprar tinta. Quando saía da loja, foi abordado por três equipes da polícia civil, que eram comandadas pelo delegado de polícia Francisco Wenceslau. Os policiais o chamaram pelo nome e pelo apelido de "Tigrão". Sem explicações, de modo vexatório, eles o algemaram. Apreenderam em poder dele um único celular. O réu não soube descrever o aparelho. Eles anunciaram que o levariam para casa. No caminho, fizeram diversas perguntas. A autoridade policial lhe exigiu dinheiro. Pararam a cinco casas de distância da residência dele. Com a chave que arrecadaram no Fiat Strada tentaram abrir o portão. O réu os alertou que aquela não era sua casa. Ele apontou aos policiais qual era sua residência. Mesmo não lhe tendo sido apresentado mandado, ele lhes autorizou o ingresso na moradia, pois não tinha o que temer. Os policiais realizaram longa busca no imóvel, mas nada ilícito encontraram. Ao final, da procura, o réu foi conduzido ao 1º distrito policial. Na entrada da delegacia, o réu viu, sobre uma mesa, drogas e armas. Muito assustado não deu muita importância àquilo. Foi colocado em uma cela com dois rapazes que prestavam depoimento. Eles lhe contaram que dormiam, quando a polícia lhes invadiu as casas, no morro José Menino. Os policiais não lhes exibiram mandado de busca. Depois, sem qualquer explicação, eles os conduziram ao distrito policial. Após cerca de nove horas, os policiais retiraram os dois rapazes que estavam no cárcere. O delegado de polícia surgiu e perguntou se o réu reconhecia o material apreendido. Ele respondeu negativamente. O Dr. Francisco Wenceslau novamente exigiu dinheiro do acusado. Diante da recusa, a autoridade policial disse que nem mesmo interrogaria o réu. Negou o acusado que houvesse advogado de sua confiança no distrito policial e na audiência de custódia. Negou o réu que fosse o autor das mensagens registradas no relatório da autoridade policial e no laudo de fl. 746/855. Afirmou desconhecer o celular de onde foram extraídas aqueles registros. Insistiu que o mandado de busca foi emitido para endereço diverso do seu. Afirmou que as casas 941 e 731 da Rua Donald Kealman são separadas. Malgrado o esforço das Dr. Defensoras, a versão do acusado não pode ser aceita, visto que desmentida pela prova. O acusado estava assistido pelo Dr. Ghaio César de Castro Lima (fl. 11). Trata-se de advogado atuante nesta comarca há muitos anos. Ele exerceu plenamente a advocacia na ocasião. Inclusive, por não ter tido oportunidade de se inteirar da longa investigação, ele aconselhou o acusado a permanecer calado. A afirmação de que o Dr. Ghaio não estava presente é injuriosa e ofende a honra profissional do causídico. Na audiência de custódia, o acusado constituiu formalmente o Dr. Ghaio e também o Dr. Thiago Serralva Huber (fl. 83). Alguns dias depois, o acusado constituiu defensor o Dr. Raul Fernando Marcondes (fl. 107/108). Portanto, não é verdade, como sugeriu o acusado que, até o ingresso das Dr. Defensoras nos autos, ele permaneceu indefeso sujeito a extorsão praticada pela autoridade policia na carceragem, enquanto era lavrado o auto de prisão em flagrante delito. É bem verdade que Rosângela Santos tentou dar ares de veracidade ao relato do acusado, seu companheiro. Ela disse que, na manhã dos fatos, sua residência foi invadida por policiais que não lhe apresentaram mandado de busca. Os investigadores, logo em seguida, trouxeram o acusado algemado. Eles deram longa busca no imóvel. Nada de ilícito foi encontrado. Foram arrecadados apenas a escritura de um imóvel em nome da depoente e um caderno em que ela fazia a contabilidade do comércio de cosméticos ao qual se dedicava. Uma policial apreendeu o telefone da depoente e o examinou sem autorização. Quando constatou que ele nada continha de suspeitou, devolveu-o. Ela afirmou ser dona da motocicleta apreendida. Disse que a comprara por R$ 11.000,00 em dinheiro. Aduziu que tinha R$ 6.000,00 guardados em casa, fruto de anos de economias. Tomou R$ 5.000,00 emprestados à amiga Caroline Tereza de Andrade. Pagou o empréstimo aos poucos, como lhe foi sendo possível. Eventualmente, emprestou o veículo ao réu. O depoimento, no entanto, não é digno de crédito, visto que não foi ditado por compromisso com a verdade, mas pelo afeto que depoente nutre pelo acusado. Tanto é assim que, ela se afastou da verdade. Inicialmente, disse que o mandado de busca não lhe fora exibido. No entanto, ao se lembrar de que firmara a contra-fé, aduziu que o mandado lhe fora entregue após a busca. Portanto, rejeito a versão do acusado e passo a reconstruir a realidade a partir dos demais elementos de convicção. Os Dr. Francisco Wenceslaw e Luís Salvador, delegados de polícia, Paulo Álvaro Ribeiro, Rodrigo Camargo, Lival Feijó e Marcos Antonio Pina, investigadores de polícia, em testemunhos harmônicos e complementares, relataram que, comandados pelo primeiro, que é auxiliado pelo segundo, formam uma das equipes da DIG Santos. As testemunhas desempenharam diferentes tarefas na investigação, razão pela qual necessária é a união dos seis testemunhos para de ter a extensão exata das apurações. Esclareceram as testemunhas que a unidade policial onde lotadas, entre outras atribuições, investiga o crime organizado e o tráfico de drogas. Durante o trabalho desenvolvido na área, recolhem frequentemente informações sobre as atividades do PCC. Em cruzamento de informes obtidos em outras diligências, colhendo contribuições de informantes e ouvindo denúncias inqualificadas, eles tiveram notícias de que um homem apelidado Nego Ney ou Tigrão se dedicava ao ilícito. Os informes diziam que o suspeito cumprira pena por tráfico de drogas na juventude. Egresso do sistema penitenciário, ele retomara o controle dos pontos de tráfico existentes no Morro José Menino, onde fora criado. Ademais, ele se mudara do outeiro, a fim de, quebrando contato direto com a mercancia, evitar responsabilização. Radicara-se em São Vicente. No entanto, diziam as notícias, ele era presença frequente no morro. Deslocava-se em um Ônix azul marinho ou em um Fiat Strada branco. Deixava os automóveis estacionados na avenida da praia, a fim de não tê-los relacionados com o tráfico, e subia o morro conduzido por terceiros. As informações também diziam, que o suspeito fazia parte do "Grupo dos 14". Dentro do PCC, tal célula criminosa era responsável pela direção superior de todas as atividades ilícitas da quadrilha na Baixada Santista. Ele era apontado como o "resumo" do PCC em Santos, a quem cabia a última palavra sobre a admissão de novos membros da organização criminosa, ato conhecido como "batismo", e a decisão superior dos apelidados "Tribunais do Crime", conhecidos como "Ideias", o qual distribuía justiciamentos a membros da organização e a moradores das comunidades controladas pelo crime. Os informes também diziam que Vitalino, conhecido como "Tuiu", era o gerente responsável pela operação do comércio ilícito no morro. Ele se reportava diretamente ao acusado. Usava imóvel da própria família, onde residia, na Rua F, 2104, no outeiro, para guardar drogas e armas, inclusive de grosso calibre. O conteúdo das notícias fez os policiais crerem que elas haviam partido de pessoas inconformadas com decisões baixadas pelo réu na condição de juiz superior no "Tribunal do Crime". Diante da frequência com que as noticias se repetiam, os policiais passaram a investigar. Não podiam realizar incursões no próprio Morro. Boa parte das vielas do outeiro, inclusive a Rua F, eram controladas pelo tráfico organizado. Havia notícia de que pessoas, moradoras e transeuntes, haviam sido obrigados a abrir as janelas de seus veículos e se identificar aos "olheiros" da organização criminosa, os quais reagiam violentamente, inclusive a bala, a qualquer tentativa de ingresso de policiais naquela área. Portanto, toda ação no outeiro deveria ser sempre realizada de modo ostensivo, com grande aparato, a fim de desestimular reação armada. Era previsível que uma ação fortuita, uma campana, feita por uma única equipe, desaguaria em confronto colocando em risco policial e os moradores da populosa comunidade. Também não era possível obter fotografias detalhadas do local por meio de drones porque as diversas torres existentes nos morros próximos perturbavam os controles dos dispositivos. Por conseguinte, a apuração se iniciou timidamente. Os policiais encontraram o registro de uma prisão de uma pessoa que atendia pelos apelidos "Tigrão" e "Nego Ney" em uma barbearia, no sopé do Morro José Menino. Dizia a notícia que o suspeito estava foragido do sistema penitenciário. Homiziara-se no morro José Menino, de onde raramente descia. Uma antiga equipe da DIG, cujos componentes não faziam mais parte da delegacia na época dos fatos, recapturaram o suspeito na mencionada barbearia. A partir desse informe, os policiais encontraram a qualificação e a fotografia do réu. Com estas, encontraram um boletim de ocorrência que deva conta de ter sido o acusado surpreendido por policiais militares, na área continental da vizinha São Vicente, conduzindo uma motocicleta e portando mais de R$ 2.000,00, cuja origem ele não soube esclarecer. Confirmados parcialmente os informes iniciais, a partir daquele boletim de ocorrência, os investigadores encontraram o endereço do réu em São Vicente. Passaram a monitorar o endereço. Confirmaram que o réu fazia uso dos automóveis anteriormente descritos. Ele foi visto pelas equipes de investigação dirigindo-se ao sopé do morro, onde deixou estacionado o automóvel que o servia e, em seguida, sendo conduzido ao outeiro por terceiros. Em diligências de campo, os policiais conseguiram confirmar junto a moradores do Morro, que exigiram a segurança do anonimato, o endereço de Vitalino, "Tuiu", na Rua F, junto à casa da irmã dele, Rosana. Os investigadores relataram todo o apurado à autoridade policial que solicitou autorização judicial para dar busca nas residências do réu e de Vitalino. De posse dos mandados, na manhã dos fatos, parte dos policiais foi, inicialmente, à residência do acusado, em São Vicente. Constataram que nenhum dos automóveis do réu estava estacionado em frente ao imóvel. Concluíram que ele não estaria no local. Então, seguiram para o Morro José Menino. Com largo apoio de diversas equipes, inclusive do GOE, alguns dos policiais avançaram até a Rua F. Feita a segurança de perímetro, bateram ao endereço mencionado no mandado. Após alguma insistência, foram recepcionados por Zilda Conceição, a qual, aparentemente, dada a coincidência de sobrenomes, é parente de Vitalino. Os policiais lhe exibiram mandado judicial. Ela lhes abriu o portão frontal do imóvel. Os investigadores constataram que o imóvel era composto de cinco pequenos cômodos que se abriam todos para o mesmo corredor. No primeiro, residia Zilda. Nada ilícito havia naquele dormitório. Ela disse não ter nenhuma relação com os demais cômodos. No segundo, o telhado cedera aparentemente fazia poucos dias. Havia uma grande confusão de detritos molhados por água da chuva. Em meio a eles, havia uma impressionante quantidade, cerca de 3.500, de tubos plásticos, daqueles usualmente empregados para embalar cocaína e crack. No terceiro e quinto cômodos estavam dois homens, Luis Salvador e Adílio. Cada um deles, portava uma pequena quantidade de maconha. Diligências posteriores revelaram que eles alugavam aqueles cômodos para residência unipessoal. Revelaram também que eles não tinham relação com o ilícito. O quarto cômodo estava trancado. Foi necessário arrombar a porta. Em seu interior, estava o restante do material apreendido: uma grande quantidade de cocaína, um revólver, duas pistolas, dois fuzis, diversos acessórios capazes de aumentar a letalidade e a precisão de armas de fogo, copiosa quantidade de munição, rádios comunicadores e balanças de precisão, entre outros objetos utilizados no tráfico. Os policiais arrecadaram aquele imensa quantidade de objetos e levaram tudo para a delegacia de polícia. A partir daí, tentaram localizar o acusado. Por meio do sistema Detecta, constataram que o réu transitava pelas ruas de Praia Grande. A consulta do sistema de localização em tempo real conduziu os policiais ao estacionamento da loja Obramax, onde, de fato, estava o Fiat Strada. Abordaram o réu assim que ele saiu do estabelecimento. Deram-lhe ciência da razão da diligência e lhe informaram da apreensão ocorrida no Morro José Menino. Em poder do acusado, arrecadaram três telefones celulares. Em seguida, conduziram-no à residência dele, na Rua Donald Kealman. Ali, constataram que a motocicleta pertencente à esposa do réu estava na garagem que fica na área frontal do imóvel. Avançaram até os cômodos alugados pelo réu que ficam no andar superior da edícula existente nos fundos do imóvel. Na moradia, encontraram a esposa do acusado. Deram busca no imóvel e na motocicleta. Nada ilegal foi encontrado. Terminada a busca domiciliar, seguiram para a delegacia de polícia. O réu se negou a fornecer as senhas para desbloqueio dos celulares. Todavia, no curso da diligência a tela de um dos aparelhos, aquele que tinha carcaça verde, exibiu sucessivas notificações, em que um indivíduo que se apresentava como Luam informava ao réu a respeito da apreensão das drogas e armas. Nos dias subsequentes, avançaram as diligências. Apurou-se que os veículos Ônix e Fiat Strada estavam registrados em nome de Alysson Rafael Reis Lopes, residente na Avenida Dique do Piçarro, nº 178, São Vicente. Os policiais cruzaram aquela informação com boletins de ocorrência. Apuraram que, naquele endereço, algumas semanas antes dos fatos, fora arrecadada uma grande quantidade de maconha e de haxixe, cuja propriedade fora atribuída a Fabrício Reis Macedo, conhecido como "Bandi", primo ou irmão de Alysson. Com autorização judicial, o celular de carcaça verde foi aberto. Ele continha diversos registros relativos ao tráfico de drogas. Um contato do réu, identificado como Neguinho, no entender da investigação, apelido de Vitalino, também noticiou ao acusado, em tempo real, a apreensão da droga e das armas, a exemplo de Luam. Nas conversas, o réu demonstrava receio de que seus comparsas fossem detidos. Em outros diversos diálogos, o acusado negociou a compra e a revenda de drogas. Havia ainda conversas em que o acusado negociou a venda do Chevrolet Ônix e também de uma possível venda do Fiat Strada, a demonstrar que era ele, efetivamente, o dono dos veiculos. Também no celular estavam mensagens em que o acusado negociou a venda de uma arma de grosso calibre. Ele precisara de dinheiro para socorrer José Carlos dos Santos, conhecido como "Beiby". As conversas revelaram amizade íntima entre o réu e Beiby. Este era padrinho daquele no PCC. Acometido por grave doença, Beiby precisava de urgente cirurgia. Estava foragido do sistema penitenciário. Logo, precisava se valer de recursos de saúde particulares. Ele pediu ajuda financeira ao acusado que, com a venda da arma, procurou atender-lhe à solicitação. Também nas conversas, havia diversos registros a demonstrar que o acusado fazia parte do PCC, organização criminosa em que ele exercia função proeminente. De fato, ele era mencionado como membro do Grupo dos 14, célula da organização criminosa responsável pela direção das atividades ilícitas nesta região. Nas conversas, eram-lhe submetidos nomes que pretendiam ingressar na quadrilha. Também eram apresentados a ele conflitos entre membros da organização, para que ele fizesse o julgamento e decidisse punições. Também eram submetidos ao acusado a escala de familiares de presos que deveriam levar informes do PCC aos presídios. Os testemunhos merecem crédito. O STF reconheceu que a simples condição de policial não torna a testemunha impedida nem suspeita (RTJ 68/54). Nos testemunhos, não se encontra indício de que os policiais busquem uma condenação injusta nem de que pretendam exclusivamente ratificar seu trabalho. A arguição de suspeição feita pelas Dr. Defensoras contra os policiais é desmentida pela prova. Elas afirmaram que as testemunhas, inclusive a autoridade policial, respondem pelos crimes de corrupção e apropriação indébita. Contudo, elas não apontaram de qual banco de antecedentes criminais elas tiraram essa informação. A acusação é vazia. A alegação de que o Dr. Francisco Wenceslau exigiu das Drs. Defensoras um fuzil em troca da libertação do réu é inverossímil. Quando da prisão e nos dias imediatamente após a lavratura do auto de prisão em flagrante delito, o réu era patrocinado por outros profissionais, que inclusive o assistiram durante a audiência de custódia (fl. 83/85). Ele foi imediatamente apresentado ao juízo de custódia. As Dr. Defensoras somente compareceram aos autos em 10.11.22 (fl. 132), quando já havia sido decretada a prisão preventiva do réu pelo juízo da custódia. Por conseguinte, naquela ocasião, a autoridade policial nem mesmo poderia deliberar sobre a liberdade do acusado. As Dr. Defensoras também se afastam da verdade quando afirmam que o Dr Francisco Wenceslau, em ato de prevaricação, se recusou a interrogar o acusado durante a lavratura do auto de prisão em flagrante delito. Como está registrado a fl.11, o réu, acompanhado por advogado de sua confiança, Dr. Ghaio Cesar Lima, optou por se manter calado porque seu patrono não tivera oportunidade de se inteirar de toda investigação que precedera à expedição dos mandados de busca domiciliar. A autoridade policial acolheu a opção do réu e de sua defesa. Mais do que isso, ele permitiu ao Dr. Advogado que solicitasse esclarecimentos às pessoas que foram ouvidas como testemunha no auto de prisão em flagrante delito, em rara homenagem ao princípio da ampla defesa. Também se afastam da verdade as Dr. Defensoras quando alegam que a autoridade policial, em novo ato de prevaricação, retardou a emissão do relatório do inquérito. O relatório está a fl. 94/102. Ele foi emitido em 23.11.22, portanto, dentro do prazo de trinta dias previsto pelo artigo 51 da Lei 11.343/06. Ao contrário do que pareceu às Dr. Defensoras não houve ilegalidade na anterior prisão do acusado na barbearia. Quando o réu foi detido, de fato, havia um mandado de prisão contra ele em aberto. Somente após a detenção do acusado a VEC constatou que a pena anteriormente imposta ao réu fora extinta pela prescrição (fl. 532/534). Logo, não ocorreu abuso de autoridade por parte dos agentes policiais. De qualquer modo, não foi a equipe que fez as diligências que deram origem ao presente aquela que deteve o réu. Portanto, rejeito a alegação de que os policiais tenham quebrado o princípio constitucional da impessoalidade e tenham utilizado a persecução criminal para prejudicar injustamente o réu. Os policiais, exaustivamente sabatinados deram aos fatos versões harmônicas e complementares. Não há nenhuma divergência notável entre os relatos, o que é penhor da credibilidade dos testemunhos. De resto, os testemunhos são confirmados pelo restante da prova. O relatório de investigação que embasou a representação pela busca domiciliar vem juntado a fl. 43/52 e 3/12 dos autos em apenso. Como o juízo registrou a fl. 25/28 dos autos em apenso: O relatório de investigação subscrito pelos policiais Rodrigo e Paulo Álvaro e encampado pela autoridade policial, contém severos indícios de que os representados se dedicam ao comércio ilícito de drogas e que as guardam em suas casas, juntamente com armas e outros objetos relacionados ao comércio ilícito. Informa a equipe policial que, graças ao trabalho permanente de inteligência que visa conhecer a atuação da Facção Criminosa PCC, presente no Morro do José Menino, receberam informações de que o representado Thiago é a principal figura de liderança local. Afirmam os policiais que o Morro do José Menino é um dos mais violentos desta cidade, palco de constantes confrontos entre criminosos e policiais, sendo frequente a presença de homens armados pelas ruas dia e noite. Em 2019, equipes da Delegacia Especializada em Investigações de Entorpecentes, realizaram a prisão do representado Thiago, que permanecera por cerca de dois anos foragido. Ele ostentava a qualidade de chefe do tráfico e fomentador da distribuição de drogas em grande parte das “biqueiras” do Morro do José Menino. O representado possui diversos apontamentos criminais, inclusive por tráfico de drogas. Egresso do sistema prisional, Thiago manteve sua liderança no local. Com o intuito de dificultar os trabalhos policiais, passou a se intitular pelo vulgo “NEGO NEY” e mudou-se do morro do José Menino. Mudou-se com sua companheira ROSANGELA SANTOS DE OLIVEIRA, para a região da área continental de São Vicente, onde é visto conduzindo a motocicleta Honda Biz cinza, de placa EXW-7C39, registrada em nome de Rosangela, e dois automóveis, um Fiat Strada branco, de placas DSI- 2G32, e um GM Ônix, cinza de placas CKU-9G68, em nome de ALYSSON RAFAEL REIS LOPES, pessoa sem passagens criminais. Thiago continua a frequentar o morro. Desloca-se de carona ou em automóveis de aplicativo. Desde sua prisão em 2019 até hoje, manteve suas ordens e representação delegada a seu gerente VITALINO SANTIAGO DA RESSUREIÇÃO JR, vulgo “TUIÚ”, também representado, que já foi preso por tráfico de entorpecentes, quando atuava como “vapor” na “biqueira”. Em Agosto de 2022, Thiago foi surpreendido por policias militares ao dirigir a motocicleta de sua esposa - Honda Biz de placa EXW-7C39 - sem utilizar capacetes, portando consigo um aparelho celular e a quantia R$ 2.322, no Bairro Rio Branco em São Vicente, fato este que gerou o registro de boletim de ocorrência FI1397-1/2022 – 03º DP de São Vicente. Em diligências de campo, os policiais verificaram o automóvel do representado Thiago estacionado em ruas daquele mesmo bairro. Os policiais localizaram então sua residência e passaram a acompanhar sua rotina. Notaram que ele costuma conduzir seu veículo até locais distantes de sua residência, estaciona-lo em locais públicos onde já o aguardam uma motocicleta ou motorista de aplicativo e de tais pontos, seguir para o Morro do José Menino. Observaram, ainda, que o representado costuma utilizar dois aparelhos celulares. Ainda segundo os policiais, atualmente Thiago exerce a função de RESUMO DA DISCIPLINA, participando do grupo denominado “OS 14”, que é composto por apenas quatorze membros da Facção Criminosa PCC na região, cuja responsabilidade é conduzir as “idéias”: julgamentos e tribunais do crime, proferindo sentenças e determinando as punições. A equipe policial recebeu recentes informações de que o representado Vitalino estaria armazenando diversas armas, dentre elas um fuzil. Ele foi visto trazendo a arma pendurada em seu corpo. Ele também recebeu uma grande quantidade de drogas, que estariam em sua residência, uma casa localizada na Rua F, de n. 2104, na encosta do morro José Menino, cujo acesso se dá a pé, através da subida de uma escadaria. Não há a possibilidade de realizar campanas ou aproximação no local, pela presença de “biquerias” fortemente armadas, que se comunicam entre si por meio de rádios. As pessoas nesses pontos monitoram movimentos da polícia. Pessoas residentes da localidade, que apesar de não quererem se identificar, confirmaram que o representado Vitalino reside na referida casa, ao lado da casa de sua irmã Sra. ROSANA FRANCISCA DA CONCEIÇÃO. Ele é frequentemente visto entrando no local. Portanto, ao contrário do que pareceu às Dr. Defensoras, o pedido de busca não foi lastreado exclusivamente em denúncias inqualificadas, sem que houvesse prévia diligência de campo. De fato, não houve prévia observação do endereço da Rua F, no morro José Menino. Esclareceram os policiais que aquela residência fica em área de risco. Está situada em uma das vielas que fica à meia encosta do morro José Menino. Infelizmente, o crime organizado mantém vigilância frequente sobre o trânsito das vias daquela comunidade. O informe dos policiais é confirmado pelos diálogos eletrônicos mantidos pelo acusado com seus prepostos. Por exemplo, a fl. 765/774 o réu conversa com Luam, que informa como está o movimento nas ruas do outeiro e registra a chegada de uma pessoa que era esperada. É bem verdade que, no alto do morro, existe uma plataforma utilizada pelos praticantes de asa delta e de esportes semelhantes. Contudo, a existência da passagem de esportistas e turistas em direção à plataforma não infirma o relato dos policiais. Felizmente, o crime organizado não é capaz de manter controle sobre todas as atividades desenvolvidas no Morro José Menino. Tanto é assim, que a maioria absoluta da população ali radicada é trabalhadora e procura dar a sua família uma vida honrada e com o mínimo de conforto. Na verdade, as pessoas dedicadas ao tráfico apenas conseguem impedir a ação de policiais e eventual intervenção de facções inimigas. Contudo, é sempre previsível que uma ação velada de policiais, como uma campana, possa redundar em conflito, pondo em risco a população. Intervenção policial no local, somente é possível mediante prévio planejamento e com o emprego de meios suficientes para dissuadir qualquer oposição. Aliás, como se deu na espécie. Nos áudios mencionados pelo Ministério Público em suas alegações finais, é possível ouvir Luam relatar ao réu que, colhido de surpresa pelo número de policiais, ele pudera apenas se esconder para não ser preso. Por isso, não é possível executar observação prolongada naquelas vielas. Portanto, embora não tenha havido campana, a polícia usou de outros meios para obter os indícios de crime e de autoria que autorizaram a busca. As apreensões ocorridas no morro José Menino, no momento da detenção do acusado e na residência deste estão registradas nos autos de exibição e apreensão de fl. 28 e 31. A fl. 62/67 estão fotografias do vasto material arrecadado. Os policiais relataram todos os lances do cumprimento dos mandados (fl.94/102 e 103/106). Ao contrário do que pareceu às Dr. Defensoras, o mandado de busca domiciliar que foi cumprido no Morro José Menino atendeu aos requisitos do artigo 243, CPP. Cópia do mandado está a fl. 30/31 dos autos 1504087-19, em apenso. Nele é possível ver que a autorização especificou o objeto da busca, o imóvel existente na Rua F, nº 2104, Morro José Menino, nesta Cidade. Por conseguinte, ao contrário do que foi afirmado pelas Dr. Defensoras a ordem não foi genérica, ela circunscreveu o prédio onde deveria se dar a procura. Os policiais conseguiram especificar bem o imóvel onde se daria a busca, permitindo ao juízo a expedição de mandado exato. Pouco importa que o imóvel fosse ocupado por moradores diversos. Ele é um só, ainda que, intramuros, esteja partilhado independentemente pelos moradores. O cumprimento da ordem observou as formalidades legais. Os policiais se apresentaram à moradora Zilda que lhes abriu o portão frontal, a quem exibiram o mandado de busca domiciliar. A partir daquele momento para segurança própria e das pessoas que estavam no prédio, eles deveriam ter agido como efetivamente o fizeram: tomaram o controle da situação, entrando em cada um dos cômodos, a fim de prevenir uma eventual resistência armada. Portanto, não há ilegalidade no fato de que os policiais tenham abordado Reginaldo e Adílio, quando eles ainda dormiam. Aliás, as portas dos cômodos de ambas as testemunhas estavam abertas. Reginaldo Bezerra relatou que, na época dos fatos, residia em uma dos cômodos do imóvel da Rua F, que ele locara de Rosana. O dormitório ficava era um em meio a outros três. Não conhecia os demais moradores, com quem raras vezes se encontrava. Sabia que, em uma delas, residia um rapaz que trabalhava no VLT. Na terceira casa, morava um outro homem, mas que ele viu poucas vezes, e sempre de passagem. Sequer sabe descrever sua fisionomia. Na parte debaixo do mesmo terreno, havia outros dois cômodos. Sabe que, naqueles, moravam duas senhoras que ele não conheceu. A apreensão de drogas pegou a testemunha de surpresa. Ela nunca havia notado algo de errado no local. Não conhecia o réu nem Vitalino. A primeira vez que o viu foi na data da detenção, quando foram colocados na mesma cela. Os policiais não apresentaram a ele mandado de busca e apreensão. Eles entraram no cômodo, cuja porta estava aberta e pediram-lhe que permanecesse sentado na cama, enquanto eles faziam buscas. Ele estava dormindo e foi acordado pelos policiais. Perguntado pelos policiais, disse que tinha apenas uma “paranga” de maconha para consumo pessoal. O policial perguntou se podia pegar sua chave para tentar abrir o cômodo vizinho. Depois ele foi informado pelo policial que seria conduzido à delegacia porque fora encontrada droga na porta ao lado. Na delegacia, foi levado a uma cela, onde permaneceu por doze horas sem que lhe fosse dada qualquer informação. Os policiais pegaram seu celular e o deixaram só com a roupa do corpo. Adílio Maurício também relatou que fora supreendido pela ação policial. Foi acordado pelos investigadores de polícia. Eles não lhe apresentaram mandado de busca e apreensão. Os policiais não pediram permissão para entrar. O cômodo estava com a porta aberta. A testemunha permaneceu algemada enquanto os policiais procuravam armas e drogas. Quando saiu de casa, detido, viu que na parte de fora havia armas e drogas. Relatou que são sete os cômodos, um ao lado do outro. Afirmou nunca ter visto o réu e que não conhece os vizinhos, pois tem todo o tempo ocupado pelo trabalho e pelo estudo. Confirmou que a dona do imóvel é Rosana, pessoa que lhe alugou o quarto. Como se vê, os testemunhos confirmaram a notícia inicial de que o imóvel pertence à família de Vitalino, sendo administrado por Rosana, irmã deste. Não houve ilegalidade na condução das testemunhas ao distrito policial. As drogas e armas estavam no cômodo vizinho àqueles ocupados Reginaldo e Adílio. Portanto, era necessário apurar se eles tinham relação com o ilícito. Inaplicável à espécie e o precedente jurisprudencial do STJ invocado pela defesa a fl. 1234/1235. Aqui, não houve a expedição de ordem de busca contra todo um conjunto habitacional formado por unidades autônomas. A busca, neste caso, se circunscreveu a um único imóvel. Também não houve nulidade na busca ocorrida em São Vicente. Ao contrário do que insistem afirmar as Dr. Defensoras, houve investigação prévia contra o acusado. Elas estão registradas a fl. 43/52. A fl. 48, os policiais juntaram fotografias do acusado em frente ao imóvel da Rua Donald Kealman. Mais do que isso, existem duas fotos do portão de entrada da residência do réu. Trata-se do mesmo portão que a defesa admite ser o da moradia do acusado, retratado nas diligências realizadas pelas Dr. Defensoras (fl. 897/900 e 931). Por conseguinte, as Dr. Defensoras se afastam da verdade quando insistem em dizer que os policiais não sabiam qual era a casa do réu. Na verdade as Dr. Defensoras criaram um incidente indevido nestes autos, o qual está mais do que esclarecido. Entre as pessoas ouvidas como testemunha está Sebastião Alves da Silva, proprietário do imóvel, senhorio do acusado. Ele esclareceu que o imóvel recebeu dupla numeração, uma ditada pela Sabesp e outra imposta pela municipalidade. Assim é que o prédio ostenta as numerações 731 e 941. O prédio era inicialmente, unifamiliar. Sua frente era fechada por apenas dois grandes portões destinados a automóveis, exatamente como é possível ver na fotografia de fl. 51. Mais tarde, Sebastião, dividiu o imóvel em três unidades a fim de serem alugadas. Para tanto, ele abriu um portão de pedestres que dá acesso exclusivamente a um corredor lateral, que leva às unidades destinadas a locação, edificadas nos fundos do imóvel. O réu era inquilino de uma dessas unidades. Contudo, como Sebastião fosse proprietário de todos os imóveis e houvesse boa relação entre os inquilinos, o acusado era autorizado a guardar veículos na área frontal do prédio, em frente à entrada das unidades locadas a terceiros. Os informes prestados pela testemunha são confirmados pelo relatório de fl. 650 e 657/665. Portanto, ao contrário do que às Dr. Defensoras insistem em repetir, não são dois os imóveis. Trata-se de um único prédio que foi repartido em unidades para locação pelo senhorio. Pouco importa que a numeração mais próxima ao portão de pedestres seja 941 e não 731. As duas numerações se referem ao mesmo imóvel. Aliás, todos os imóveis daquela rua possuem duas numerações. De qualquer forma a busca se circunscreveu aos cômodos ocupados exclusivamente pelo acusado. Não são aplicáveis à espécie os precedentes jurisprudenciais invocados pela defesa a fl. 1242 e seguintes. Como já foi dito, a busca foi judicialmente autorizada e a autorização judicial não se fiou em denúncia inqualificada, mas em prévia investigação. Por conseguinte, afirmo a higidez da prova colhida nas buscas domiciliares. A apreensão é prova da materialidade dos delitos de tráfico de drogas e de guarda de arma e munição. A natureza tóxica das substâncias apreendidas está demonstrada pelo laudo de exame químico toxicológico juntado a fl. 144/146. Foram apresentados aos peritos: microtubos plásticos do tipo “Eppendorf” dotados de tampa própria encerrando porção de material sólido particulado, além de microtubos plásticos do tipo “Eppendorf” dotados de tampa própria, encerrando porção de material sólido particulado, acondicionados em invólucros plásticos fechados por aquecimento encerrando porção de material sólido particulado, bem como, microtubos plástico do tipo “Eppendorf” dotados de tampa própria encerrando porção de material sólido particulado, acondicionados em invólucros plásticos fechados por pressão (tipo “zip”) com foto “Pablo Escobar” e, finalmente, invólucros plásticos fechados por nó encerrando porção de material sólido particulado. A massa líquida do material particulado tem massa líquida de 2140,5g. Era cocaína. O laudo está formalmente em ordem e merece crédito. Ele é complementado pelo laudo de exibição e apreensão que revela que eram 240 pequenas porções, além de sua porções mais alentadas. Ao lado da droga, foi apreendido vasto material usualmente relacionado ao comércio ilícito, o qual é objeto do laudo de fl. 239/246. Foram arrecadas oito balanças, duas seladoras, facas, placas de metal e quase dois quilos de embalagens plásticas virgens. Esse material é próprio para repartir o tóxico em pequenas porções destinadas ao comércio a varejo. Também foram apreendidos dez rádios comunicadores e dois carregadores para rádios comunicadores. Esses são instrumentos de comunicação usualmente empregados pelos grupos criminosos que exploram o tráfico de drogas. Essas quadrilhas dão funções especializadas aos membros engajados nos pontos de vendas. Enquanto alguns preparam as porções do tóxico, outros as guardam. Alguns fazem as vendas e outros funcionam como caixa. Alguns mantêm a vigilância das vias próximas aos pontos de venda e outros montam guarda, portando armas. Esses vários elementos se comunicam por meio de rádios transmissores. Portanto, está comprovada a materialidade do crime contra a saúde pública. A droga se destinava ao comércio ilícito. Revelam-no sua quantidade, variedade e forma de embalagem. O material relacionado à comércio ilegal revela mercancia em larga escala. Além disso, durante as buscas foram arrecadados um revólver, duas pistolas e dois fuzis, além de copiosa munição. As armas de fogo e os demais objetos foram submetidos à perícia que foi reduzida a laudo a fl. 147/179. O exame confirmou a potencialidade lesiva do armamento, bem como a supressão de seus números identificadores. O mesmo trabalho técnico descreve os acessórios apreeendidos, capazes de aumentar muito o poder de fogo e a precisão das armas de fogo, a saber: um conversor de pistola em carabina, um suporte foregrip, um trilho, duas miras holográficas e uma luneta (fl. 163). Indiscutível, pois a prova da materialidade da guarda de arma. A autoria da guarda da droga e das armas também ficou evidenciada, apesar de o acusado não ter sido flagrado na detenção direta dos objetos apreendidos. Como foi visto, o acusado já era apontado nas notícias iniciais dos crimes como sendo o responsável pelo comércio ilícito e pela guarda das armas. Essas informações foram confirmadas pelas diligências encetadas pelos investigadores de polícia. Como foi relatado pelos policiais, o acusado era frequente no morro, apesar de todo o cuidado para passar despercebido. Ademais, foram apreendidos com o réu três aparelhos celulares. Aquele de IMEI interno 356057366960680 e 356057366909653 identificado como peça 3 no laudo de fl. 746/855 continha diversas mensagens que demonstram que o acusado era de fato o responsável pela droga e pelas armas de fogo. Ao contrário do que pareceu às Dr. Defensoras a apreensão dos celulares não é ilícita. Não houve desrespeito à ordem judicial. Quando os telefones foram arrecadados, já haviam sido apreendidas as drogas e as armas. Por conseguinte, a condição imposta pelo juízo para a arrecadação dos dispositivos eletrônicos fora satisfeita. Os telefones eram de uso do acusado. Eles foram apreendidos em mãos do réu. Ademais, como se vê a fl. 791, o réu postou selfie em uma das conversas. Em alguns diálogos, ele se apresenta pelo apelido "Nego Ney" ou por este cognome é tratado. No aparelho eletrônico acima especificado, havia diversos registros a demonstrar que o acusado era o responsável pelas armas e pelas drogas apreendidas. No extrato da memória do celular, reproduzido pelo Ministério Público a fl. 1209, é possível ver Luam, preposto do acusado na guarda dos bens, em tempo real, informando a apreensão da droga e dos objetos. Na conversa por meio de mensagens escritas, onde o acusado se apresenta como Foco, Força, Fé sempre, ele também trata da apreensão dos dois fuzis e da sacola de drogas (fl. 1210). Luam, como revela o número do telefone empregado no diálogo, relata ao acusado que está vendo a ação dos policiais. Ele permanece escondido. Não pode deixar o esconderijo, uma vez que, caso se movimente, provavelmente será preso. Nos áudios que podem ser acessados como é explicado a fl. 1212, ouve-se a conversa travada entre o réu e Luam. Este informa àquele, em tempo real, que policiais civis haviam entrado na casa de Vitalino, que ora chamam de Tuiu, ora de Neguinho. O réu quer informações, mas Luam está escondido, para não ser preso. O acusado exige que Luam confirme se Tuiu foi detido. Acrescenta que, se o corréu estiver preso, ele providenciará imediatamente a intervenção de um advogado, a fim de que este converse com o corréu antes que este dê informações aos policiais. Ademais, o réu quer que Luam verifique até que ponto foi a busca, se ela arrecadou todos os bens da quadrilha. Ele lamenta o grave prejuízo que a ação policial lhe causou. Ajunta que tentará diminuir os efeitos negativos, evitando que seu nome seja mencionado. Existem outras conversas mantidas entre Luam e o acusado, as quais demonstram que o réu mantinha estrito controle sobre o tráfico de drogas e a guarda de armas no morro. Esses diálogos estão registrados a partir de fl. 765, no laudo de transcrição dos registros do celular. Nas conversas, o réu exige e recebe informações a respeito da venda de drogas, inclusive sobre o abastecimento dos pontos de venda. Ele informa a chegada de carregamentos e exige especial cuidado no trato do tóxico. Ele também é informado a respeito da movimentação de dinheiro. Exige a prestação de contas de Luam. Acolhe os pedidos de moratória feitos pelo comparsa. Adverte Luam da chegada de possíveis interessados no tóxico, bem como sobre a movimentação de policiais no outeiro. A autoridade policial, no relatório em que apresenta parte das mensagens temporárias que pôde ler no celular, registra que o réu também troca mensagens com Luam a respeito das armas pertencentes à quadrilha (fl.192/208). A união dos testemunhos às demais provas, em especial o registro do celular do réu, permitem afirmar que o acusado era responsável pela guarda da droga e das armas apreendidas. A conduta do réu se subsume à definição do artigo 33, caput , Lei 11343/06. No que se refere às armas, malgrado o respeito devido ao entendimento adotado pelo Ministério Público, o qual, reconheço, tem consistente apoio jurisprudencial, penso que houve um único delito. A posse contemporânea de arma de uso permitido e de uso restrito, bem como de munições, configura um único atentado à incolumidade pública, no especial aspecto de segurança pública. O número e as características das armas e acessórios informam a fixação da pena, mas não caracterizam delitos diversos. A participação do acusado em organização criminosa armada também está bem demonstrada. Como foi visto, desde a notícia inicial de crime, que foi confirmada pela apreensão do tóxico e das armas, o acusado era apontado como um dos chefes do PCC nesta região. A afirmação das testemunhas nesse sentido está solidamente confirmada pelos diálogos mantidos pelo réu por meio de seu celular. São vários os registros que revelam a proeminente função do acusado na organização criminosa. Apenas exemplificativamente, registro algumas: A fl. 775 e seguintes, estão registrados diálogos mantidos pelo acusado em um grupo de whatsapp chamado "capota mas não breca". A finalidade do grupo é anunciada logo no início da transcrição. Trata-se do ambiente em que "os membros do resumo final", ou seja, a alta direção do PCC nesta região, deve dialogar. O grupo é claramente chamado de "Os 14", como se vê a fl. 776, o que confirma os testemunhos. Nas conversas que se seguem, o grupo trata da admissão de novos integrantes na organização criminosa. Eles decidem se candidatos são ou não adequados. Também discutem a readmissão de um antigo filiado à organização. Outrossim, tomam decisões a respeito de pessoas que devem dinheiro à organização criminosa ou que tenham praticado atos reprovados pela quadrilha. Decidem a concessão de moratórias dos débitos, as formas de cobrança e penas. As conversas que se estendem até fl. 787 são especialmente impressionantes, quando, a partir de fl. 781, o grupo estabelece uma escala de revezamento entre familiares de presos que deveriam levar os comunicados da organização, inclusive aqueles atinentes às eleições nacionais de 2022, ao interior dos presídios do Estado de São Paulo. Os diálogos demonstram que o acusado foi admitido na organização criminosa por indicação de José Carlos dos Santos, conhecido como "Beiby"(fl. 793/799). O acusado chama José Carlos de padrinho. Como revelam as mensagens trocadas entre o acusado e "Beiby", este está doente. Precisa urgentemente de uma cirurgia. Para demonstrar a necessidade, posta foto de si próprio em uma cama ligada hospitalar, estando ele ligado a aparelhos. O réu se dispõe a ajuda-lo, demonstrando um certo temor reverencial. Pergunta o orçamento do tratamento. Ajunta que disporá de uma arma de grosso calibre, para levantar do dinheiro necessário. O acusado, a seu turno, é tratado por outros membros da organização criminosa com o mesmo temor reverencial. A fl. 877 e seguintes, temos a conversa entre o réu e Davi 1, o qual intercede junto ao acusado em favor de alguém que está preso. Chama o réu de padrinho. Informa o acusado do andamento dos atos burocráticos policiais. O réu lhe cobra notícias sobre a qualidade da atuação do advogado. As conversas entre o réu e Samuel Hebreu, juntadas a fl. 800/812, revelam uma sucessão de consultas em que são submetidas ao acusado propostas de ingresso de novos participantes na organização criminosa e questões para que o acusado aplique penas a devedores e a condenados da organização. A fl. 817, temos o diálogo entre o acusado e Bandi. Este relata àquele que policiais da DIG haviam invadido o local onde ele mantinha um depósito de drogas e apreendido todo o tóxico. Ele diz ao réu que precisa de dinheiro. O acusado responde que vai tomar providências. As fotos contidas na conversa revelam que o acusado e Bandi, este é na verdade Fabrício Reis Macedo, falavam da apreensão de maconha e haxixe no Dique do Piçarro, fato mencionado pelas testemunhas. Em outras conversas, é possível ver o réu negociando drogas em grandes quantidades (fl. 825, contato: Sem Batata; fl. 827, contato: Saladino; fl. 835, contato: Moisés; fl. 840, contato: Isaías; fl. 846, contato: Killer). As conversas telefônicas confirmam que o acusado é alta liderança do PCC, como relatado pelos policiais. Trata-se de organização criminosa armada, como também está demonstrado nos autos. Os registros de telefone demonstram estabilidade e permanência. Os membros da organização se encontram atados uns aos outros por duradouros laços, a ponto de se tratarem por padrinho e afilhado. O grupo criminoso é fortemente hierarquizado. Existe nele uma burocracia uniforme nas comunicações. Os casos eram submetidos à decisão do réu por meio de ficha-relatório. A chefia do grupo, na Baixada Santista, era exercida de forma colegiada por 14 membros. Nesses termos, a condenação é de rigor. Na dosagem da pena, verifico que o réu ostenta antecedente criminal (fl. 68, processo 0002865-30). As informações sobre a conduta social do acusado que instruíram pedido de liberdade provisória foram desacreditas pelo restante da prova, a qual demonstra que o réu, ao contrário de manter atividade lícita, dedica-se diuturnamente à prática de crimes. O juízo de reprovação que recai sobre ele é intenso. A quantidade de droga é relevante. Trata-se de cocaína, tóxico especialmente aditivo. O vasto material relacionado ao comércio que foi apreendido e as conversas telefônicas demonstram mercancia em larguíssima escala. O material bélico arrecadado é impressionante. O poder de fogo, incrementado pelos acessórios, é considerável. Ao lado das armas havia importante lote de diversas munições. A organização criminosa é longeva, conta com sólida hierarquia, está baseada em notável código de disciplina, a qual é aplicada por impressionante burocracia. Arvora-se a organização criminosa em poder paralelo ao Estado, inclusive distribuindo penas. Portanto fixo a pena base em sete anos e seis meses de reclusão e 750 dias-multa para o tráfico; em quatro anos e seis meses de reclusão e quinze dias-multa para a posse de arma de fogo e em quatro anos e seis meses de reclusão e quinze dias-multa para a organização criminosa. O acusado é reincidente por tráfico (fl. 69, processo 0000424-77). Por conseguinte, com fundamento no artigo 61, inciso I, CP, aumento as penas de 1/6 e as estabeleço provisoriamente em oito anos e nove meses de reclusão e 875 dias-multa para o tráfico; em cinco anos e três meses de reclusão e dezessete dias-multa para a posse de arma de fogo e em cinco anos e três meses de reclusão e dezessete dias-multa para a organização criminosa. À míngua de causas de alteração, faço definitivas as penas do tráfico e da posse de arma. Reconhecido o emprego de arma, com base no artigo 2º § 2º, da Lei 12850/13, aumento a pena da organização criminosa de metade e a fixo definitivamente em sete anos, dez meses e quinze dias de reclusão e 25 dias-multa. As penas privativas de liberdade, que somam 21 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão serão descontadas em regime inicial fechado, dadas a reincidência e as circunstâncias judiciais desfavoráveis, na forma dos artigos 33 e 59, inciso III, CP. Impossível é a concessão de benefícios. Atento às condições econômicas do réu, arbitro o valor de cada dia-multa no mínimo. O montante da multa deve ser mantido, visto que estabelecido pelo legislador no exercício de sua competência constitucional exclusiva. Trata-se de opção política válida. Eventual incapacidade econômica do réu será verificada pelo juízo da execução. O A. STF afirma constitucionalidade do preceito secundário (ARE 1340544 / SC; ARE 1235253 / SP - SÃO PAULO). Posto isso, em nome do Povo e da República do Brasil, julgo procedente em parte a acusação contra THIAGO SANTANA DA COSTA , RG 44.424.112, nascido em 21.07.1986. Declaro o réu incurso nas sanções do artigo 33, caput , da Lei 11343/-06, e o condeno a cumprir oito anos e nove meses de reclusão e a pagar 875 dias-multa. Declaro o réu incurso ainda nas sanções do artigo 16, caput e parágrafo 1º, inciso IV, da Lei 10826/03, e o condeno a cumprir cinco anos e três meses de reclusão e a pagar dezessete dias-multa. Finalmente, declaro o acusado incurso nas sanções do artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei 12.850/13, e o condeno a cumprir sete anos, dez meses e quinze dias de reclusão e a pagar 25 dias-multa. As penas privativas de liberdade que somam 21 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão serão descontadas em regime inicial fechado. Os dias multa, na unitária mínima, serão calculados e atualizados como acima disposto. Continuam presentes as razões da prisão preventiva. Portanto, o acusado não poderá recorrer em liberdade. Recomende-se ele na prisão onde se encontra. Decreto em favor do Estado a perda do veículo Fiat Strada. Como demonstram os diálogos de fl. 812 e seguintes, o veículo, embora registrado em nome de Alysson Rafael Reis Lopes, na verdade, pertence ao acusado. Tanto é assim que, na referida conversa, o réu trata da venda do veículo. Contudo, julgo improcedente o pedido de perda da motocicleta apreendida nos autos em favor da União. O veículo está registrado em nome de Rosângela Oliveira, companheira do acusado. O Dr. Francisco Wenceslau esclareceu que não apurou indícios de que a motocicleta tenha sido empregada para transportar drogas nem de que ela pertença ao acusado. À devolução da motocicleta. À destruição da droga, das armas e das munições nos termos da legislação e das normas administrativas em vigor. Defiro o compartilhamento das provas colhidas neste processo com a polícia civil e com o Ministério Público. O Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de afirmar a constitucionalidade e a legalidade de compartilhamento, em casos como o presente, em que houve serendipidade (AP 693, Ministra Rosa Weber, publicação 21.8.14; HC 198963 MC, Ministro Marco Aurélio, publicação 26.3.21; RCL 53025, Ministro Dias Tófoli, publicação: 27.5.22). No mesmo sentido a jurisprudência do STJ: HC 497425, Ministra Laurita Vaz, julgamento 16.3.21; AgRg no Agravo em Recurso Especial 2037.992, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgamento 6.9.22). Contudo, as autoridades interessadas no compartilhamento deverão instaurar os procedimentos investigatórios e solicitar a este juízo as provas de que especificamente necessite. A cautela é necessária para que não se crie uma devassa e se mantenham as investigações dentro de balizas verificáveis. Desde já, no entanto, determino que se encaminhe a conversa de fl. 817 e seguintes ao Ministério Público a fim de que se apure do que se trata a alegada exigência feita a Bandi. Condeno o acusado ao pagamento das custas processuais.
Já a Corte de origem fundamentou seu entendimento nos seguintes termos, in verbis (e-STJ fls. 1.504/1.538):
No presente caso, não se evidencia a ilicitude das provas obtidas, por afronta ao direito a inviolabilidade do domicílio. Com efeito, a entrada dos policiais no endereço situado no Morro do José Menino, ocorreu em cumprimento a mandado de busca e apreensão domiciliar, expedido pelo MM. Juiz de Direito da 5ª Vara Criminal do Foro de Santos, aos 19 de Outubro de 20202, conforme fls. 30/31 dos autos em apenso nº 1504087-19.2022.8.26.0562. Ademais, não há que se falar em nulidade do referido mandado, o qual especificou o imóvel objeto da busca e apreensão domiciliar, qual seja, aquele situado na Rua F, nº 2104, Morro do José Menino, Santos/SP. Assim, ao contrário do sustentado pela combativa Defesa, a ordem não foi genérica, pois circunscreveu o prédio onde deveria se dar a procura. Nesse ponto, como bem salientou o ilustre membro do Ministério Público, “O artigo 243, inciso I, do Código de Processo Penal, é cristalino ao afirmar que o mandado de busca deve indicar a casa em que será realizada a diligência o mais precisamente POSSÍVEL e, no caso dos autos, a Autoridade Policial especificou o local o tanto quanto possível, considerando-se a conhecida dificuldade de se incursionar com viaturas policiais no local ocupado pelo crime organizado (vide relatório de investigação de fls. 03/12 dos autos nº 1504087-19.2022.8.26.0562, instruído, inclusive, com fotos do local da incursão fls. 09 e 11).” (fl. 1413). Assim, considerando que o Morro do José Menino é um dos morros mais críticos e violentos da cidade de Santos, a falta de especificação da casa onde se daria a busca não enseja a nulidade das provas obtidas no presente feito, haja vista equipe policial não conseguiria, sem grande estrutura, entrar na comunidade para averiguar os detalhes do endereço fornecido pelas testemunhas, a qual contava, inclusive, com forte esquema de segurança formado pela facção criminosa (fls. 765/774, fls. 03/12 dos autos nº 1504087- 19.2022.8.26.0562). Nesse sentido: “O fato de o nome do proprietário ou morador e o endereço exato não terem sido previamente identificados não enseja nulidade, haja vista que o diploma processual penal exige apenas que o mandado o identifique o mais precisamente possível, e não exatamente, o que evidencia a dificuldade de acesso e localização do local indicado para se proceder à medida constritiva.” (AgRg no RHC n. 170.476/RS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 10/3/2023). Do mesmo modo, não há que se falar em suposta nulidade do mandado de busca expedido para o endereço situado na Rua Dr. Donald Kealman, 731, Rio Branco, São Vicente SP, sob alegação de que teria sido cumprido em endereço diferente daquele para o qual foi expedido. Com efeito, conforme esclarecido pela testemunha Sebastião Alves da Silva, o imóvel de São Vicente se trata de um único prédio, dividido informalmente em unidades residências para locação, dotadas de entradas independentes. O imóvel é identificado por duas numerações, sendo que o nº 941 da SABESP, enquanto o nº 731 é da Prefeitura. Assim, o depoimento de Sebastião pôs fim a questão levantada pela nobre defesa a respeito do número da residência do acusado, sendo corroborado, ainda, pelo relatório de fl. 650 e 657/665. Nesse ponto, como bem ressaltou o culto Magistrado, “As impetrantes se apegam nessa peculiaridade do imóvel possuir dois números para afirmar que a ordem de busca foi destinada a outro prédio. Insistir na alegação mesmo após todos os esclarecimentos havidos beira a má-fé.”. (fl. 1184). Desse modo, evidencia-se que inexistiu qualquer irregularidade nos mandados de busca e apreensão, os quais cumpriram a exigência legal de indicar, o mais precisamente possível, os imóveis em que seriam realizadas as diligências, em consonância com o artigo 243, inciso I, do Código de Processo Penal. Noutro giro, melhor sorte não assiste à combativa Defesa quando postula o reconhecimento da nulidade das apreensões dos celulares. Depreende-se dos autos que, no momento em que os telefones foram arrecadados, já haviam sido apreendidas as drogas e as armas no endereço do Morro do José Menino, haja vista que os mandados de busca foram cumpridos de forma concomitantes. Assim, verifica-se a perfeita caracterização da situação de flagrância, autorizando-se a arrecadação dos dispositivos eletrônicos. Cumpre destacar que o crime de tráfico de entorpecentes quando praticado nas modalidades “ter em depósito”, “transportar”, “trazer consigo” e “guardar” é caracterizado como crime permanente, o que torna constante o estado de flagrância do agente enquanto perdurar a prática dos referidos verbos nucleares, tornando legítima as apreensões dos celulares. Desse modo, não se extrai ilegalidade nas buscas e apreensões domiciliares realizada pelos policiais, vez que previamente autorizadas pela autoridade judicial, afastando-se a alegação de violação à garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio, prevista no art. 5º, inciso XI da Constituição Federal. Afastadas as preliminares, passa-se a análise do mérito do recurso interposto. Pois bem, em que pesem os argumentos expostos pela D. Defesa, o conjunto probatório é cristalino, apontando a materialidade e a autoria do crime imputado ao apelante. Pois bem, em que pesem os argumentos expostos, o conjunto probatório é cristalino, apontando a materialidade e a autoria dos crimes imputados ao apelante. A materialidade delitiva resultou comprovada por meio do auto de prisão em flagrante (fls. 01/03); boletim de ocorrência (fls. 12/22); auto de exibição e apreensão (fls. 28/31); auto de constatação preliminar (fls. 32/33); fotografias do vasto material arrecadado armas, munições e drogas (fls. 62/67); relatórios que detalham todos os lances da ação policial (fls. 43/52 e fls. 03/12); relatórios dos cumprimentos dos mandados de busca e apreensão (fls. 94/102, fls. 103/106, 911/919); laudo de exame químico-toxicológico, que atestou que as substâncias apreendidas eram proibidas (fls. 387/389); laudo das armas e acessórios apreendidos o qual confirmou a potencialidade lesiva do armamento, bem como a supressão de seus números identificadores; descreveu os acessórios apreendidos, capazes de aumentar muito o poder de fogo e a precisão das armas de fogo, a saber: um conversor de pistola em carabina, um suporte foregrip, um trilho, duas miras holográficas e uma luneta (fls. fls. 144/179 e fls.. 390/422); laudo sobre o vasto material usualmente relacionado ao comércio ilícito - oito balanças, duas seladoras, facas, placas de metal e quase dois quilos de embalagens plásticas virgens, além de dez rádios comunicadores e dois carregadores para rádios comunicadores - instrumentos de comunicação usualmente empregados pelos grupos criminosos que exploram o tráfico de drogas (fls. 239/253, fls. 423/430); laudo sobre os três aparelhos celulares do apelante THIAGO , dando conta de diversas mensagens que demonstram que o acusado era de fato o responsável pela droga e pelas armas de fogo (fls. 747/855, fls.955/1064); bem como pelas demais provas produzidas durante a instrução criminal. Por sua vez, a autoria delitiva é extraída das declarações prestadas pelas testemunhas de acusação, Dr. Francisco Wenceslaw e Luís Salvador , delegados de polícia , Paulo Álvaro Ribeiro, Rodrigo Camargo, Lival Feijó e Marcos Antonio Pina, investigadores de polícia (fl. 585 mídia audiovisual), bem como pela testemunha Sebastião Alves da Silva, proprietário do imóvel locado ao acusado (fls. 877/879 - mídia audiovisual). Adota-se, transcrevendo, o resumo dos depoimentos colhidos em juízo feito pelo d. Juiz sentenciante, posto que bem compilada a prova oral registrada nos autos: “(...) Rosângela Santos de Oliveira (...) disse que, na manhã dos fatos, sua residência foi invadida por policiais que não lhe apresentaram mandado de busca. Os investigadores, logo em seguida, trouxeram o acusado algemado. Eles deram longa busca no imóvel. Nada de ilícito foi encontrado. Foram arrecadados apenas a escritura de um imóvel em nome da depoente e um caderno em que ela fazia a contabilidade do comércio de cosméticos ao qual se dedicava. Uma policial apreendeu o telefone da depoente e o examinou sem autorização. Quando constatou que ele nada continha de suspeitou, devolveu-o. Ela afirmou ser dona da motocicleta apreendida. Disse que a comprara por R$ 11.000,00 em dinheiro. Aduziu que tinha R$ 6.000,00 guardados em casa, fruto de anos de economias. Tomou R$ 5.000,00 emprestados à amiga Caroline Tereza de Andrade. Pagou o empréstimo aos poucos, como lhe foi sendo possível. Eventualmente, emprestou o veículo ao réu. Os Dr. Francisco Wenceslaw e Luís Salvador, delegados de polícia, Paulo Álvaro Ribeiro, Rodrigo Camargo, Lival Feijó e Marcos Antonio Pina, investigadores de polícia, em testemunhos harmônicos e complementares, relataram que, comandados pelo primeiro, que é auxiliado pelo segundo, formam uma das equipes da DIG Santos. As testemunhas desempenharam diferentes tarefas na investigação, razão pela qual necessária é a união dos seis testemunhos para de ter a extensão exata das apurações. Esclareceram as testemunhas que a unidade policial onde lotadas, entre outras atribuições, investiga o crime organizado e o tráfico de drogas. Durante o trabalho desenvolvido na área, recolhem frequentemente informações sobre as atividades do PCC. Em cruzamento de informes obtidos em outras diligências, colhendo contribuições de informantes e ouvindo denúncias inqualificadas, eles tiveram notícias de que um homem apelidado Nego Ney ou Tigrão se dedicava ao ilícito. Os informes diziam que o suspeito cumprira pena por tráfico de drogas na juventude. Egresso do sistema penitenciário, ele retomara o controle dos pontos de tráfico existentes no Morro José Menino, onde fora criado. Ademais, ele se mudara do outeiro, a fim de, quebrando contato direto com a mercancia, evitar responsabilização. Radicara-se em São Vicente. No entanto, diziam as notícias, ele era presença frequente no morro. Deslocava-se em um Ônix azul marinho ou em um Fiat Strada branco. Deixava os automóveis estacionados na avenida da praia, a fim de não tê-los relacionados com o tráfico, e subia o morro conduzido por terceiros. As informações também diziam, que o suspeito fazia parte do "Grupo dos 14". Dentro do PCC, tal célula criminosa era responsável pela direção superior de todas as atividades ilícitas da quadrilha na Baixada Santista. Ele era apontado como o "resumo" do PCC em Santos, a quem cabia a última palavra sobre a admissão de novos membros da organização criminosa, ato conhecido como "batismo", e a decisão superior dos apelidados "Tribunais do Crime", conhecidos como "Idéias", o qual distribuía justiciamentos a membros da organização e a moradores das comunidades controladas pelo crime. Os informes também diziam que Vitalino, conhecido como "Tuiu", era o gerente responsável pela operação do comércio ilícito no morro. Ele se reportava diretamente ao acusado. Usava imóvel da própria família, onde residia, na Rua F, 2104, no outeiro, para guardar drogas e armas, inclusive de grosso calibre. O conteúdo das notícias fez os policiais crerem que elas haviam partido de pessoas inconformadas com decisões baixadas pelo réu na condição de juiz superior no "Tribunal do Crime". Diante da frequência com que as noticias se repetiam, os policiais passaram a investigar. Não podiam realizar incursões no próprio Morro. Boa parte das vielas do outeiro, inclusive a Rua F, eram controladas pelo tráfico organizado. Havia notícia de que pessoas, moradoras e transeuntes, haviam sido obrigados a abrir as janelas de seus veículos e se identificar aos "olheiros" da organização criminosa, os quais reagiam violentamente, inclusive a bala, a qualquer tentativa de ingresso de policiais naquela área. Portanto, toda ação no outeiro deveria ser sempre realizada de modo ostensivo, com grande aparato, a fim de desestimular reação armada. Era previsível que uma ação fortuita, uma campana, feita por uma única equipe, desaguaria em confronto colocando em risco policial e os moradores da populosa comunidade. Também não era possível obter fotografias detalhadas do local por meio de drones porque as diversas torres existentes nos morros próximos perturbavam os controles dos dispositivos. Por conseguinte, a apuração se iniciou timidamente. Os policiais encontraram o registro de uma prisão de uma pessoa que atendia pelos apelidos "Tigrão" e "Nego Ney" em uma barbearia, no sopé do Morro José Menino. Dizia a notícia que o suspeito estava foragido do sistema penitenciário. Homiziara-se no morro José Menino, de onde raramente descia. Uma antiga equipe da DIG, cujos componentes não faziam mais parte da delegacia na época dos fatos, recapturaram o suspeito na mencionada barbearia. A partir desse informe, os policiais encontraram a qualificação e a fotografia do réu. Com estas, encontraram um boletim de ocorrência que deva conta de ter sido o acusado surpreendido por policiais militares, na área continental da vizinha São Vicente, conduzindo uma motocicleta e portando mais de R$ 2.000,00, cuja origem ele não soube esclarecer. Confirmados parcialmente os informes iniciais, a partir daquele boletim de ocorrência, os investigadores encontraram o endereço do réu em São Vicente. Passaram a monitorar o endereço. Confirmaram que o réu fazia uso dos automóveis anteriormente descritos. Ele foi visto pelas equipes de investigação dirigindo-se ao sopé do morro, onde deixou estacionado o automóvel que o servia e, em seguida, sendo conduzido ao outeiro por terceiros. Em diligências de campo, os policiais conseguiram confirmar junto a moradores do Morro, que exigiram a segurança do anonimato, o endereço de Vitalino, "Tuiu", na Rua F, junto à casa da irmã dele, Rosana. Os investigadores relataram todo o apurado à autoridade policial que solicitou autorização judicial para dar busca nas residências do réu e de Vitalino. De posse dos mandados, na manhã dos fatos, parte dos policiais foi, inicialmente, à residência do acusado, em São Vicente. Constataram que nenhum dos automóveis do réu estava estacionado em frente ao imóvel. Concluíram que ele não estaria no local. Então, seguiram para o Morro José Menino. Com largo apoio de diversas equipes, inclusive do GOE, alguns dos policiais avançaram até a Rua F. Feita a segurança de perímetro, bateram ao endereço mencionado no mandado. Após alguma insistência, foram recepcionados por Zilda Conceição, a qual, aparentemente, dada a coincidência de sobrenomes, é parente de Vitalino. Os policiais lhe exibiram mandado judicial. Ela lhes abriu o portão frontal do imóvel. Os investigadores constataram que o imóvel era composto de cinco pequenos cômodos que se abriam todos para o mesmo corredor. No primeiro, residia Zilda. Nada ilícito havia naquele dormitório. Ela disse não ter nenhuma relação com os demais cômodos. No segundo, o telhado cedera aparentemente fazia poucos dias. Havia uma grande confusão de detritos molhados por água da chuva. Em meio a eles, havia uma impressionante quantidade, cerca de 3.500, de tubos plásticos, daqueles usualmente empregados para embalar cocaína e crack. No terceiro e quinto cômodos estavam dois homens, Luis Salvador e Adílio. Cada um deles, portava uma pequena quantidade de maconha. Diligências posteriores revelaram que eles alugavam aqueles cômodos para residência unipessoal. Revelaram também que eles não tinham relação com o ilícito. O quarto cômodo estava trancado. Foi necessário arrombar a porta. Em seu interior, estava o restante do material apreendido: uma grande quantidade de cocaína, um revólver, duas pistolas, dois fuzis, diversos acessórios capazes de aumentar a letalidade e a precisão de armas de fogo, copiosa quantidade de munição, rádios comunicadores e balanças de precisão, entre outros objetos utilizados no tráfico. Os policiais arrecadaram aquele imensa quantidade de objetos e levaram tudo para a delegacia de polícia. A partir daí, tentaram localizar o acusado. Por meio do sistema Detecta, constataram que o réu transitava pelas ruas de Praia Grande. A consulta do sistema de localização em tempo real conduziu os policiais ao estacionamento da loja Obramax, onde, de fato, estava o Fiat Strada. Abordaram o réu assim que ele saiu do estabelecimento. Deram-lhe ciência da razão da diligência e lhe informaram da apreensão ocorrida no Morro José Menino. Em poder do acusado, arrecadaram três telefones celulares. Em seguida, conduziram-no à residência dele, na Rua Donald Kealman. Ali, constataram que a motocicleta pertencente à esposa do réu estava na garagem que fica na área frontal do imóvel. Avançaram até os cômodos alugados pelo réu que ficam no andar superior da edícula existente nos fundos do imóvel. Na moradia, encontraram a esposa do acusado. Deram busca no imóvel e na motocicleta. Nada ilegal foi encontrado. Terminada a busca domiciliar, seguiram para a delegacia de polícia. O réu se negou a fornecer as senhas para desbloqueio dos celulares. Todavia, no curso da diligência a tela de um dos aparelhos, aquele que tinha carcaça verde, exibiu sucessivas notificações, em que um indivíduo que se apresentava como Luam informava ao réu a respeito da apreensão das drogas e armas. Nos dias subsequentes, avançaram as diligências. Apurou-se que os veículos Ônix e Fiat Strada estavam registrados em nome de Alysson Rafael Reis Lopes, residente na Avenida Dique do Piçarro, nº 178, São Vicente. Os policiais cruzaram aquela informação com boletins de ocorrência. Apuraram que, naquele endereço, algumas semanas antes dos fatos, fora arrecadada uma grande quantidade de maconha e de haxixe, cuja propriedade fora atribuída a Fabrício Reis Macedo, conhecido como "Bandi", primo ou irmão de Alysson. Com autorização judicial, o celular de carcaça verde foi aberto. Ele continha diversos registros relativos ao tráfico de drogas. Um contato do réu, identificado como Neguinho, no entender da investigação, apelido de Vitalino, também noticiou ao acusado, em tempo real, a apreensão da droga e das armas, a exemplo de Luam. Nas conversas, o réu demonstrava receio de que seus comparsas fossem detidos. Em outros diversos diálogos, o acusado negociou a compra e a revenda de drogas. Havia ainda conversas em que o acusado negociou a venda do Chevrolet Ônix e também de uma possível venda do Fiat Strada, a demonstrar que era ele, efetivamente, o dono dos veículos. Também no celular estavam mensagens em que o acusado negociou a venda de uma arma de grosso calibre. Ele precisara de dinheiro para socorrer José Carlos dos Santos, conhecido como "Beiby". As conversas revelaram amizade íntima entre o réu e Beiby Este era padrinho daquele no PCC. Acometido por grave doença, Beiby precisava de urgente cirurgia. Estava foragido do sistema penitenciário. Logo, precisava se valer de recursos de saúde particulares. Ele pediu ajuda financeira ao acusado que, com a venda da arma, procurou atender-lhe à solicitação. Também nas conversas, havia diversos registros a demonstrar que o acusado fazia parte do PCC, organização criminosa em que ele exercia função proeminente. De fato, ele era mencionado como membro do Grupo dos 14, célula da organização criminosa responsável pela direção das atividades ilícitas nesta região. Nas conversas, eram-lhe submetidos nomes que pretendiam ingressar na quadrilha. Também eram apresentados a ele conflitos entre membros da organização, para que ele fizesse o julgamento e decidisse punições. Também eram submetidos ao acusado a escala de familiares de presos que deveriam levar informes do PCC aos presídios. (...) Cumpre destacar que a testemunha de defesa Rosângela Santos é esposa do apelante, motivo pelo qual sua versão dos fatos não é digna de crédito, evidenciada sua intenção de favorecer o acusado. Com efeito, como bem destacou o ilustre Procurador de Justiça, “As informações apontadas pela testemunha de defesa, considerando ser esposa do apelante, devem ser consideradas com parcimônia, haja vista sua parcialidade e o firme conjunto probatório exibido no autos pela acusação que contradiz com bases sólidas, as tentativas da defesa de afastar a responsabilidade do apelante que, ao contrário do que sustenta a defesa, foi suficientemente demonstrada nos autos.” (fl. 1473). No tocante às testemunhas de acusação, convém salientar que o fato de serem delegados de polícia e policiais civis não torna, por si só, suas declarações incrédulas ou desprovidas de confiança, sobretudo quando coerentes e harmônicas com os demais elementos dos autos. Nessa linha de raciocínio, colaciona-se precedente do Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSO PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS . SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO. REEXAME DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTO DE POLICIAIS. CREDIBILIDADE. SUPERVENIÊNCIA DO TRÂNSITO EM JULGADO. MATÉRIA RESERVADA PARA REVISÃO CRIMINAL (...) 3. Mostra-se incabível na via eleita a desclassificação do crime de tráfico para o de uso de entorpecentes, pois imprescindível para tanto a revaloração probatória. 4. Orienta-se a jurisprudência no sentido de que os depoimentos dos agentes policiais, colhidos sob o crivo do contraditório, merecem credibilidade como elementos de convicção, máxime quando em harmonia com os elementos constantes dos autos. 5. Habeas corpus não conhecido” (HC 262.582/RS, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, 6ª Turma, julgado em 10.3.2016, DJe 17.3.2016). Os delegados e os policiais descreveram satisfatoriamente as diligências empreendidas, motivadas pelo combate ao crime, apresentaram declarações coerentes, claras, e narraram os fatos com precisão, informando de modo consonante os detalhes da prisão em flagrante do recorrente. Ademais, não se observa nenhuma discrepância capaz de gerar suspeitas em seus depoimentos, não havendo qualquer indício que demonstre intenção dos depoentes em incriminar injustamente o acusado. As apreensões somente foram possíveis pela firme disposição dos policiais no cumprimento do dever, sendo certo que o esforço empreendido pelos agentes da autoridade não se mostra coerente ou crível para uma simples falsa incriminação. Assim, os depoimentos dos agentes são válidos e devem ser avaliados como qualquer depoimento, merecendo credibilidade como elemento apto à formação da convicção do magistrado. Por sua vez, o apelante, em juízo, negou as imputações (fls. 1170/1172 - mídia audiovisual). Em síntese, negou ter o apelido de "Nego Ney" e afirmou perfeito desconhecimento a respeito da droga, armas, celulares e demais objetos apreendidos. Ressaltou que jamais fez parte de organização criminosa e que as acusações foram engendradas pelos policiais. Sem credibilidade alguma a palavra do apelante, que não encontrou eco na prova, pois não parece crível que os policiais agentes da autoridade, encarregado de combater o crime fosse falsear, coagindo e distorcendo os fatos, apenas com o objetivo de elegê-los para falsamente incriminar. As alegações eleitas pelo réu no sentido de excessos e desvios policiais são desgastadas. Nesse sentido: “ Registre-se, aqui, que tem se tornado cada vez mais comum a invocação de flagrantes forjados, como forma de ilidir o honesto e competente trabalho de agentes da lei ” (Apelação nº 0003316-21.2012 TJSP, Colenda 4ª Câmara Criminal - Rel. Exmo. Des. EDISON BRANDÃO , julg. 25.06.2013). De nenhuma originalidade as versões de autodefesa. Neste sentido: “(...) Vale conferir a sólida argumentação do culto Des. Osni Pereira, retirada de voto apresentado quando de julgamento de caso análogo por envolver o debate a respeito do testemunho policial: “ São cansativas as alegações costumeiras contra a palavra dos policiais, como se eles sempre agissem fora da lei, em prejuízo de todos os acusados presos e autuados em flagrante. Mas, os depoimentos prestados por policiais não podem ser sumariamente desprezados apenas em razão de sua condição funcional, devendo ser aferida a sua credibilidade em função do exame atento do conjunto probatório existente nos autos. E na espécie em julgamento, nada indica que os policiais militares ouvidos como testemunhas possam ter pretendido forjar essa acusação contra o apelante, a quem nem sequer conheciam” (TJSP, Apelação Criminal nº 0008782-89.2011.8.26.0590, 16ª Câm. Crim., julgado em 27/01/2015, V.U.), in Apelação nº 0000725-31.2015.8.26.0594, da Comarca de Bauru, Colenda 1ª Câmara de Direito Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, Rel.: Exmo. Des. DINIZ FERNANDO , julg., em 26 de junho de 2017. Assim, sem proveito as alegações do apelante que, afirmando desvios e excessos nas diligências policiais, imputa isoladamente aos agentes da lei imotivada denunciação caluniosa. Têm incidência, com todo vigor, as regras de experiência comum ( “praesumptiones hominis” ), pelo que ordinariamente ocorre, conforme disciplinam os arts. 3º, 239 e 155, todos do Código de Processo Penal e art. 375 do Código de Processo Civil, trazendo nenhum crédito a versão defensória. Não se desincumbiu o apelante do ônus que lhe é imposto no art. 156, do Código de Processo Penal, não sendo de se acolher as versões de autodefesa. Nesse sentido: “PROVA. defesa fundamentada em fato singular. ônus da prova. Cabe ao acusado que fundamenta defesa em fato singular e contrário ao que normalmente ocorre em circunstâncias semelhantes, o ônus da prova do argumento.” ( JUTACRIM 54/243, Rel. VALENTIM SILVA ). Preleciona Júlio Fabbrini Mirabete : “... ônus da prova (onus probandi) é a faculdade que tem a parte de demonstrar no processo a real ocorrência de um fato que alegou em seu interesse. Dispõe a lei que a prova da alegação incumbe a quem a fizer, princípio que decorre inclusive na paridade de tratamento das partes ” (Código de Processo Penal Interpretado, 11ª ed. São Paulo: Atlas. p. 474/475). O direito de não se auto acusar não é franquia para que pratique, o réu, outros crimes, acusando falsamente os agentes da lei. Nesse sentido: “O princípio nemo tenetur se detegere, que emerge dos artigos 186 e 198 do C.P.P., não vai ao ponto de conferir imunidade a indiciado ou acusado perante o art. 307 da lei penal substantiva. Uma coisa é calar o mesmo ou alterar a verdade sobre fato ou fatos delituosos que lhe são imputados e suas circunstâncias, pois em função do aludido princípio não está obrigado a declarações auto-incriminatórias, outra é falsear elementos de sua própria identidade, para obter vantagem em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem” ( TARJ - AC- voto vencido Juiz Mariante da Fonseca - RT 532/415); sem divergir RT 547/324 e RJTJSP 14/454. Assim: “(...) A liberdade de mentir, sem sanção processual, não é ilimitada e não importa na impunidade pelos crimes que venham a ser praticados através das declarações mendazes (...)” (Apelação nº 0001440-02.2011.8.26.0372, da Comarca de Várzea Paulista, Colenda 13ª Câmara de Direito Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, Rel.: Exmo. Des. MARCELO GORDO , julg. em 21 de julho de 2016). É ônus da defesa provar o que alega, pois allegare sine probare et non allegare paria sunt alegar e não provar é o mesmo que não alegar (Nicola Framarino dei Malatesta. A Lógica das Provas em Matéria Criminal, São Paulo: Saraiva, 1960, p. 179). Com todo o vigor tem cabida, como referido, o brocardo allegare sine probare et non allegare paria sunt (alegar e não provar é o mesmo que não alegar). Nesse sentido leciona também HÉLIO TORNAGHI : “O sentido do artigo 156 (do CPP) deve ser esse: ressalvadas as presunções, que invertem o ônus da prova, as alegações relativas ao fato constitutivo da pretensão punitiva têm de ser provadas pelo acusador e as referentes a fatos impeditivos ou extintivos deve ser provados pelo réu” (HÉLIO TORNAGHI. Instituições de Processo Penal, Forense, Rio, 1959, IV/232). Infere-se que, na hipótese em tela, resultaram consolidadas, à saciedade, as relevantes circunstâncias indicativas dos delitos imputados ao réu, pelos elementos da prova testemunhal, pelas armas, munições, acessórios e drogas apreendidas, aliados ao vasto material usualmente relacionado ao comércio ilícito e a forma como estavam acondicionadas as substâncias proibidas. Com efeito, conforme o laudo de exame químico toxicológico juntado a fls. 387/389, foram apresentados aos peritos: microtubos plásticos do tipo “Eppendorf” dotados de tampa própria encerrando porção de material sólido particulado; microtubos plásticos do tipo “Eppendorf” dotados de tampa própria, encerrando porção de material sólido particulado, em invólucros plásticos fechados por aquecimento encerrando porção de material sólido particulado, bem como, microtubos plástico do tipo “Eppendorf” dotados de tampa própria encerrando porção de material sólido particulado, acondicionados em invólucros plásticos fechados por pressão (tipo “zip”) com foto “Pablo Escobar” e, finalmente, invólucros plásticos fechados por nó encerrando porção de material sólido particulado. A massa líquida do material particulado, identificado como cocaína, somou 2.140,5g. Além disso, o laudo de fls. 239/253 e 423/430 descreve o vasto material apreendido e usualmente relacionado ao comércio ilícito, a saber: oito balanças, duas seladoras, facas, placas de metal e quase dois quilos de embalagens plásticas virgens - material próprio para repartir o tóxico em pequenas porções destinadas ao comércio a varejo. Foram apreendidos também dez rádios comunicadores e dois carregadores para rádios comunicadores - instrumentos de comunicação usualmente empregados pelos grupos criminosos que exploram o tráfico de drogas. Dessa forma, considerando-se que os elementos fático-probatórios são contundentes em demonstrar que o réu tinha em depósito, guardava e vendia substâncias ilícitas, sem autorização legal e com propósito de disseminação do vício com animus lucrandi , a condenação é medida impositiva, por infração ao art. 33, caput , da Lei de Drogas. Destaca-se que o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que, "para a ocorrência do elemento subjetivo do tipo descrito no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, é suficiente a existência do dolo, assim compreendido como a vontade consciente de realizar o ilícito penal, o qual apresenta 18 (dezoito) condutas que podem ser praticadas, isoladas ou conjuntamente " (REsp 1.361.484/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/6/2014, DJe 13/6/2014). Oportuno registrar, ainda, que “ sendo o tráfico de entorpecentes uma atividade essencialmente clandestina e crime de perigo abstrato, punindo-se a conduta de quem expõe a saúde pública a risco, não se torna indispensável prova da efetiva prática de atos de mercancia. Bastam a materialidade delitiva e elementos indiciários que demonstrem a conduta do acusado ” (TJMG, Ap 0434130-72.2009.8.13.0106, 4ª Câm. Crim., rel. Des. Eduardo Brum, j. 17/11/2010, DJ 30/11/2010). “ O tipo penal de tráfico é de conteúdo variado ou misto alternativo, pois qualquer das condutas escritas tipifica o delito. Assim, mesmo que o agente não tenha comercializado a droga, a simples guarda é suficiente para que se configure o tráfico de entorpecentes ” (TJRS, Ap. 697.020.717, Câm., j. 30-4-1997, Rel. Des. Érico Barone Pires, RT 745/633). Nesse sentido: “ Ressalto que não se faz necessária a mercancia para que se configure o delito em tela. O crime de tráfico de entorpecentes é de múltiplas ações e de perigo abstrato. No caso dos autos, o delito consumou-se pelo simples fato de ter em depósito ou guardar droga. Nessas circunstâncias a mercancia consubstancia mero exaurimento do crime” (TJSP - Apelação criminal nº 911.741.3/0, Rel.: Exmo. Des. FÁBIO GOUVEIA). Posto isso, examinando-se a grande quantidade e a natureza das drogas apreendidas - 2.140,5g da substância ilícita “cocaína”, mais procurada e disseminada que outras, de grande poder degenerador da personalidade, de alto índice viciante, geradora de invencíveis problemas na saúde pública e de conhecida potencialidade letal, a forma como estavam acondicionadas; o vasto material apreendido e usualmente relacionado ao comércio ilícito; a segura incriminação feita pelos agentes da autoridade, incumbidos por dever de ofício da repressão penal; e as inadmissíveis alegações do réu, não secundadas por qualquer elemento sério de convencimento, a conduta não se pode afastar do tipo do artigo 33, caput , da Lei nº 11.343/2006. Com efeito, ao cabo das diligências, restou constatado que o apelante fazia a difusão espúria de drogas proibidas aliás, de grande poder destrutivo , com animus lucrandi, de maneira profissionalizada, própria de quem é estabelecido no ramo do crime. Destarte, nenhum elemento de convencimento foi trazido para que fosse agasalhada qualquer das alegações da ilustre Defesa, motivo pelo qual, emerge demonstrada a subsunção da conduta do acusado às formas puníveis do art. 33, caput , da Lei nº 11.343/2006, e comprovado o dolo, na ausência de excludente da ilicitude ou da culpabilidade, a condenação é de rigor. Ademais, devidamente demonstrado nos autos que o réu, apelidado de “Tigrão” ou “Nego Ney”, integra a organização criminosa armada, definida pelo artigo 1º, §1º da Lei nº 12.850/13, conhecida como Primeiro Comando da Capital, exercendo cargo de alta liderança e sendo o responsável pela guarda da droga e das armas apreendidas. Dispõe os artigos 1º e 2º da Lei nº 12.850/13: “Art. 1 - Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado. § 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas. § 1º Nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa. § 2º As penas aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo. § 3º A pena é agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da organização criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução.” Importa notar que o robusto conjunto probatório foi suficientemente analisado pelo MM. Juiz sentenciante. A propósito, pela pertinência e clareza do exposto, destaca-se trecho da resp. sentença: “(...) Como foi visto, desde a notícia inicial de crime, que foi confirmada pela apreensão do tóxico e das armas, o acusado era apontado como um dos chefes do PCC nesta região. A afirmação das testemunhas nesse sentido está solidamente confirmada pelos diálogos mantidos pelo réu por meio de seu celular. São vários os registros que revelam a proeminente função do acusado na organização criminosa. Apenas exemplificativamente, registro algumas: A fl. 775 e seguintes, estão registrados diálogos mantidos pelo acusado em um grupo de whatsapp chamado "capota mas não breca". A finalidade do grupo é anunciada logo no início da transcrição. Trata-se do ambiente em que "os membros do resumo final", ou seja, a alta direção do PCC nesta região, deve dialogar. O grupo é claramente chamado de "Os 14", como se vê a fl. 776, o que confirma os testemunhos. Nas conversas que se seguem, o grupo trata da admissão de novos integrantes na organização criminosa. Eles decidem se candidatos são ou não adequados. Também discutem a readmissão de um antigo filiado à organização. Outrossim, tomam decisões a respeito de pessoas que devem dinheiro à organização criminosa ou que tenham praticado atos reprovados pela quadrilha. Decidem a concessão de moratórias dos débitos, as formas de cobrança e penas. As conversas que se estendem até fl. 787 são especialmente impressionantes, quando, a partir de fl. 781, o grupo estabelece uma escala de revezamento entre familiares de presos que deveriam levar os comunicados da organização, inclusive aqueles atinentes às eleições nacionais de 2022, ao interior dos presídios do Estado de São Paulo. Os diálogos demonstram que o acusado foi admitido na organização criminosa por indicação de José Carlos dos Santos, conhecido como "Beiby"(fl. 793/799). O acusado chama José Carlos de padrinho. Como revelam as mensagens trocadas entre o acusado e "Beiby", este está doente. Precisa urgentemente de uma cirurgia. Para demonstrar a necessidade, posta foto de si próprio em uma cama ligada hospitalar, estando ele ligado a aparelhos. O réu se dispõe a ajuda-lo, demonstrando um certo temor reverencial. Pergunta o orçamento do tratamento. Ajunta que disporá de uma arma de grosso calibre, para levantar do dinheiro necessário. O acusado, a seu turno, é tratado por outros membros da organização criminosa com o mesmo temor reverencial. A fl. 877 e seguintes, temos a conversa entre o réu e Davi 1, o qual intercede junto ao acusado em favor de alguém que está preso. Chama o réu de padrinho. Informa o acusado do andamento dos atos burocráticos policiais. O réu lhe cobra notícias sobre a qualidade da atuação do advogado. As conversas entre o réu e Samuel Hebreu, juntadas a fl. 800/812, revelam uma sucessão de consultas em que são submetidas ao acusado propostas de ingresso de novos participantes na organização criminosa e questões para que o acusado aplique penas a devedores e a condenados da organização. A fl. 817, temos o diálogo entre o acusado e Bandi. Este relata àquele que policiais da DIG haviam invadido o local onde ele mantinha um depósito de drogas e apreendido todo o tóxico. Ele diz ao réu que precisa de dinheiro. O acusado responde que vai tomar providências. As fotos contidas na conversa revelam que o acusado e Bandi, este é na verdade Fabrício Reis Macedo, falavam da apreensão de maconha e haxixe no Dique do Piçarro, fato mencionado pelas testemunhas. Em outras conversas, é possível ver o réu negociando drogas em grandes quantidades (fl. 825, contato: Sem Batata; fl. 827, contato: Saladino; fl. 835, contato: Moisés; fl. 840, contato: Isaías; fl. 846, contato: Killer). As conversas telefônicas confirmam que o acusado é alta liderança do PCC, como relatado pelos policiais. Trata-se de organização criminosa armada, como também está demonstrado nos autos. Os registros de telefone demonstram estabilidade e permanência. Os membros da organização se encontram atados uns aos outros por duradouros laços, a ponto de se tratarem por padrinho e afilhado. O grupo criminoso é fortemente hierarquizado. Existe nele uma burocracia uniforme nas comunicações. Os casos eram submetidos à decisão do réu por meio de ficha-relatório. A chefia do grupo, na Baixada Santista, era exercida de forma colegiada por 14 membros.” Para que não passe sem apreciação, devidamente demonstrado nos autos que na atuação da organização criminosa havia o emprego de arma de fogo de rigor a incidência do artigo 2º, caput e parágrafo 2º, da Lei 12.850/13. Da mesma forma, os elementos fático-probatórios são contundentes em demonstrar que na data dos fatos o apelante portava armas uso restrito, com numeração suprimida, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Disciplina a Lei nº 10.826/2003, em seu artigo 16: “Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: (...) IV portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado;” Os policiais, em juízo, declararam com firmeza que foram apreendidas com réu um revólver, duas pistolas e dois fuzis, além de copiosa munição. O laudo técnico de fls. 144/179 confirmou a potencialidade lesiva do armamento, bem como a supressão de seus números identificadores. Além disso, também foram apreendidos acessórios, capazes de aumentar muito o poder de fogo e a precisão das armas de fogo, a saber: um conversor de pistola em carabina, um suporte foregrip, um trilho, duas miras holográficas e uma luneta (fl. 163). Não bastasse, foram apreendidos com o réu três aparelhos celulares. Aquele de IMEI interno 356057366960680 e 356057366909653, identificado como peça 3 no laudo de fl. 746/855, continha diversas mensagens que demonstram que o acusado era de fato o responsável pela droga e pelas armas de fogo. Convém notar que, sendo crime de mera conduta e de perigo abstrato, para a tipificação penal, prescindível, inclusive, estar a arma municiada. E, “ Como sabido, o porte de munições é delito de perigo abstrato, frise-se, a probabilidade de vir a ocorrer algum dano, pelo mau uso da arma, acessório ou munição, é presumido pelo tipo penal ”. (NUCCI, Guilherme de Souza, Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, RT, 5ª Ed., p.90.), afastando a necessidade de comprovação nesse sentido. Para a configuração do delito, basta o porte de arma de fogo, acessório ou munição, de uso restrito, desprovido de competente autorização ou em desacordo com determinação legal. Neste sentido, Superior Tribunal de Justiça: “Habeas corpus - Porte ilegal de arma de fogo. Arma desmuniciada - Irrelevância Tipicidade configurada. O porte ilegal de arma de fogo coloca em risco a paz social, não sendo escusável pelo fato de a arma estar desmuniciada. Entende-se como suficiente para a configuração do delito previsto no art. 14, da Lei n.º 10.826/03, tão-somente o porte de arma sem a devida autorização da autoridade competente. Ordem denegada. (HC n. 98.296/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz); “Penal - Processual penal - Recurso especial - Art. 14 da lei 10.826/03 - Delito de porte ilegal de arma de fogo - Arma desmuniciada Irrelevância - Recurso conhecido e provido. A objetividade jurídica dos crimes tipificados na Lei de Porte de Armas não se restringe à incolumidade pessoal, alcançando, também, a liberdade pessoal, protegidas mediatamente pela tutela primária dos níveis da segurança coletiva, o que determina a irrelevância da eficácia da arma para a configuração do tipo penal. Recurso especial conhecido e provido para restabelecer a sentença condenatória. (REsp nº 1.103.293 Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima). Em reforço decisão desta Colenda Câmara de Direito Criminal: APELAÇÃO CRIMINAL Posse irregular de arma de fogo de uso permitido e receptação Recurso da defesa Absolvição por falta de provas Improcedência Os firmes e coesos depoimentos dos policiais bastam para a comprovação dos fatos imputados ao agente Receptação e posse ilegal de armas de fogo devidamente caracterizados Atipicidade da conduta Arma desmuniciada Impossibilidade Delito de mera conduta Se o apelante possuía arma de fogo e munições de uso permitido em sua residência, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, a conduta se apresenta típica, antijurídica e punível - É inaplicável o princípio da consunção entre os delitos de receptação e porte ilegal de arma de fogo, por ser diversa a natureza jurídica desses tipos penais Precedentes - Redução pena-base Inadmissibilidade Réu que possuía maus antecedentes pela prática de delitos dolosos Logo, correto o aumento das penas-base em 1/3, por se tratar de persistência na prática delitiva Reconhecimento da atenuante da confissão Inviabilidade, pois se tratar de confissão qualificada - Concurso formal Inadmissibilidade - O entendimento hoje predominante nos Tribunais Superiores é no sentido de que, em se tratando de crimes com tutelas penais diferenciadas, o cúmulo de sanções se impõe - Regime aberto Impossibilidade - Nenhuma ilegalidade se afigura na imposição de regime prisional mais rigoroso quando, no processo de individualização da pena, registram-se circunstâncias desfavoráveis ao acusado, à luz do disposto no artigo 59 do Código Penal Recurso defensivo não provido. (TJSP; Apelação Criminal 0047614-89.2016.8.26.0050; Relator (a): Sérgio Ribas; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Criminal; Foro Central Criminal Barra Funda - 17ª Vara Criminal; Data do Julgamento: 24/10/2019; Data de Registro: 24/10/2019, gn) Ressalte-se que o MM. Juiz a quo , no tocante às armas, entendeu que houve um único delito, considerando que “A posse contemporânea de arma de uso permitido e de uso restrito, bem como de munições, configura um único atentado à incolumidade pública, no especial aspecto de segurança pública. O número e as características das armas e acessórios informam a fixação da pena, mas não caracterizam delitos diversos.” (fl. 1283). Assim, presentes os elementos do tipo penal incriminador, a ofensividade e bem marcado dolo com que se houve o réu, na ausência de justificativa ou dirimente, a condenação por infração aos artigos artigo 33, caput , da Lei 11343/-06, artigo 16, caput e parágrafo 1º, inciso IV, da Lei 10826/03, e artigo 2º, caput e parágrafo 2º, da Lei 12.850/13 é de rigor. Tecidas tais considerações, passa-se ao exame da dosimetria das penas e do regime prisional aplicados na r. sentença. Na primeira fase, nos termos do artigo 59, caput , do Código Penal e 42 da Lei de Drogas, aos maus antecedentes ostentados pelo réu (fl. 68, processo 0002865-30) e considerando que a “conduta social do acusado que instruíram pedido de liberdade provisória foram desacreditas pelo restante da prova, a qual demonstra que o réu, ao contrário de manter atividade lícita, dedica-se diuturnamente à prática de crimes.”, bem como que o “juízo de reprovação que recai sobre ele é intenso. A quantidade de droga é relevante. Trata-se de cocaína, tóxico especialmente aditivo. O vasto material relacionado ao comércio que foi apreendido e as conversas telefônicas demonstram mercancia em larguíssima escala. O material bélico arrecadado é impressionante. O poder de fogo, incrementado pelos acessórios, é considerável. Ao lado das armas havia importante lote de diversas munições. A organização criminosa é longeva, conta com sólida hierarquia, está baseada em notável código de disciplina, a qual é aplicada por impressionante burocracia. Arvora- se a organização criminosa em poder paralelo ao Estado, inclusive distribuindo penas.” (fl. 1285), fixou as basilares acima do mínimo legal, em 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 750 (setecentos e cinquenta) dias-multa para o tráfico; em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 15 (quinze) dias- multa para a posse de arma de fogo; e em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa para a organização criminosa. Na hipótese sub judice , tem-se como razoável o incremento das basilares, tendo em vista a grande quantidade e elevado potencial deletério para a saúde humana da droga encontrada (2.140,5g de cocaína), aliada ao vasto armamento apreendido e a comprovação de integrante de sólida e longeva organização criminosa conhecida como Primeiro Comando da Capital PCC. Este é o posicionamento do C. Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS . TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE DE INTIMAÇÃO DO DEFENSOR DATIVO. TESE NÃO ENFRENTADA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ALEGAÇÃO DE EXCESSO NA DOSIMETRIA DA PENA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. DEVIDA FUNDAMENTAÇÃO QUANTO ÀS VETORIAIS CONSIDERADAS REPROVÁVEIS. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A irresignação sobre a nulidade da intimação do defensor dativo não foi debatida na instância ordinária, circunstância que impede o pronunciamento desta Corte Superior a respeito, sob pena de se incorrer em indevida supressão de instância. 2. Quanto à culpabilidade, às circunstâncias e à quantidade de drogas, a fundamentação apresentada mostra-se idônea, baseada em elementos concretos, cuja avaliação está situada no campo da discricionariedade do julgador. 3. A quantidade e a natureza da droga apreendida é fundamento idôneo para exasperar a pena-base e deve preponderar sobre as demais circunstâncias judiciais, não se constatando ilegalidade na dosimetria da reprimenda fixada, tendo em vista a apreensão de 740g de cocaína .” 4. Agravo regimental desprovido”. (STJ, AgRg no HC 839.686, Órgão Julgador: 6ª Turma, Min. Rel. Laurita Vaz, Data do Julgamento: 25/09/2023, g.n.). “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO, TRÁFICO E POSSE OU PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. PENA-BASE. CULPABILIDADE. APREENSÃO DE GRANDE QUANTIDADE DE MUNIÇÃO E ARMAS. FUNDAMENTO IDÔNEO. REFORMATIO IN PEJUS. INOCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO DEFINITIVA DESLOCADA DA SEGUNDA PARA A PRIMEIRA FASE. PENA FINAL REDUZIDA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. É firme nesta Corte o entendimento de que a apreensão de expressiva quantidade de armas e/ou munições desborda das elementares do tipo penal previsto no art. 16 da Lei 10.826/03, revelando a maior reprovabilidade da conduta, de sorte a justificar idoneamente a elevação da pena-base. 2. A Corte a quo, em recurso exclusivo da defesa, deslocou uma condenação pretérita que tecnicamente não se enquadrava no conceito de reincidência para a primeira fase de dosimetria, a fim de negativar o vetor dos maus antecedentes, até então neutralizado, o que, no entanto, não configura reformatio in pejus, haja vista a redução da pena final. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ AgRg no HC: 578649 SC 2020/0104171-9, Relator: Ministro NEFI CORDEIO, Data de Julgamento: 12/08/2020, T6 SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/08/2020). Da mesma forma, cabe notar que: “ Somente quando todas as circunstâncias judiciais forem favoráveis ao réu a pena deve ser fixada no mínimo legal. Em verdade, se uma delas lhe for desfavorável, o juiz deve elevá-la acima do piso. E, nesse contexto, se todas ou quase todas circunstâncias inominadas apresentarem-se como prejudiciais ao acusado, nada impede a imposição da pena máxima. Todavia, instalou-se na prática forense o raciocínio equivocado pelo qual a pena-base equivale à pena mínima, o que não se compactua com o espírito da legislação penal.” (MASSON, Cleber Rogério Direito Penal Esquematizado Parte Geral 4ª ed. São Paulo: Método, 2011, p. 628). Oportuno realçar, também, que o “legislador ordinário não estabeleceu percentuais fixos para nortear o cálculo da pena-base, deixando a critério do julgador encontrar parâmetros suficientes a desestimular o acusado e a própria sociedade a praticarem condutas reprováveis semelhantes, bem como a garantir a aplicação da reprimenda necessária e proporcional ao fato praticado” (HC 283.706/SP, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, julgado em 10/10/2017, DJe 23/10/2017). Desse modo, por não se entender desarrazoado o aumento da pena- base, ante os fundamentos expostos, fica mantida como lançada. Na segunda fase, ausentes circunstâncias atenuantes e presente a agravante da reincidência específica (processo 0000424-77, tráfico - fl. 69), a pena foi aumentada em 1/6 (um sexto), resultando em 08 (oito) anos e 09 (nove) meses de reclusão e 875 (oitocentos e setenta e cindo) dias-multa para o tráfico; em 05 (cinco) anos e 03 (três) meses de reclusão e 17 (dezessete) dias-multa para a posse de arma de fogo; e em 05 (cinco) anos e 03 (três) meses de reclusão e 17 (dezessete) dias- multa para a organização criminosa. Na terceira fase, à míngua de causas de alteração, as penas do tráfico e da posse de arma tornaram-se definitivas. Destaca-se que a aplicação da causa de diminuição de pena insculpida no §4º, do artigo 33, da Lei de Drogas, restou vedada por ausência de preenchimento dos requisitos legais. A benesse sob comento trata da figura do “traficante privilegiado”, também chamada de “traficância menor” ou “traficância eventual”, estabelecendo a redução de pena de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas e nem integre organização criminosa. No caso dos autos, o apelante ostenta reincidência específica pela prática do delito de tráfico de drogas, fator que aliado as circunstâncias da sua prisão em flagrante, em que foi surpreendido com considerável quantidade de armas, munições e drogas de elevada nocividade (2.140,5 gramas de cocaína), além de evidenciada a prática do crime de integrar pessoalmente organização criminosa, revelam que que o réu se dedicava à atividade criminosa e faz da difusão do vício, com animus lucrandi, modus vivendi . Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. MINORANTE. REINCIDÊNCIA OU MAUS ANTECEDENTES. DECURSO DE CINCO ANOS DO TRÂNSITO EM JULGADO. IRRELEVÂNCIA. MAUS ANTECEDENTES. CONCEITO AMPLO. 1. A reincidência e os maus antecedentes constituem óbices legais à concessão da minorante do tráfico privilegiado, consoante previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. 2. O fato de se tratar de condenação antiga, transitada em julgado há mais de 5 anos, não impede sua consideração para fins de afastamento da minorante, seja a título de reincidência, caso não superado o prazo de cinco anos entre a data do cumprimento da pena relativa ao crime anterior ou a declaração de extinção de sua punibilidade, seja como maus antecedentes, cujo conceito, por ser mais amplo, "abrange não apenas as condenações definitivas por fatos anteriores cujo trânsito em julgado ocorreu antes da prática do delito em apuração, mas também aquelas transitadas em julgado no curso da respectiva ação penal, além das condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos, as quais também não induzem reincidência, mas servem como maus antecedentes" (HC 246.122/SP, Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, DJe 15/3/2016), afastando, do mesmo modo, a aplicação do redutor. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 733.090/SP, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 20/9/2022, DJe de 23/9/2022.) O bem jurídico, no tráfico de drogas, foi violado com intensidade significativa, porquanto as drogas não circulam com a expressão do que foi apreendido na posse do réu sem maior proximidade com fonte distribuidora. Nesse sentido já entendeu o C. Superior Tribunal de Justiça: “3. É pacífico o entendimento nesta Corte Superior de que a quantidade e/ou a natureza da droga podem justificar a não aplicação da minorante prevista no art. 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, quando evidenciarem a dedicação à atividade criminosa.” (Ag. Int. no HC 439498/SP, Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, j. em 05/06/2018). Aliás, é de trivial sabença que a elevada quantidade de drogas aprendidas somente é confiada àqueles que integram organização criminosa. Ainda, para ilustrar a inviabilidade de causa de diminuição de pena: “PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA. INAPLICABILIDADE. NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA. NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO LEGAL RELATIVO À NÃO DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte de Justiça Superior tem asseverado que a expressiva quantidade e a natureza do entorpecente apreendido em poder do acusado constitui circunstância hábil a impedir a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, a depender das peculiaridades da hipótese concreta. In casu, trata-se de apreensão de 54 pedras de crack - "50 embaladas de dez em dez e quatro avulsas" -, circunstância esta que impede a aplicação do mencionado redutor de pena. 2. Agravo regimental a que se nega provimento”. (AgRg no REsp: 1302590 RS 2012/0016349-7, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA , j. 11/03/2014, Colenda SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/03/2014). Claro o profissionalismo e forte a consciência da ilicitude, não se tratando de traficante novato, “de primeira viagem”, que, assim, não é merecedor do redutor do parágrafo 4º, do artigo 33, da Lei Especial (GUILHERME DE SOUZA NUCCI, in Leis Penais Especiais, RT, 2ª edição, 2007, p. 330). Marcada, como dito, a dedicação à espúria difusão de drogas proibidas, com animus lucrandi e com modus vivendi, que é resultante de livre escolha do acusado, com absoluta consciência da ilicitude, não se trata de iniciante no tráfico de drogas. Nesse sentido: “De se ver que a mens legis da causa de diminuição de pena seria alcançar aqueles pequenos traficantes, circunstância diversa da vivenciada nos autos, dada a apreensão de expressiva quantidade de entorpecente, com alto poder destrutivo” (Superior Tribunal de Justiça. HC n. 190426 / MS. Ministro OG FERNANDES . DJ 04.04.2011). Portanto, inviável a aplicação do redutor previsto no §4º do artigo 33 da Lei de Drogas, conforme estabelecido na resp. sentença. No tocante ao crime de organização criminosa, na terceira fase, ausentes causas de diminuição de pena e reconhecido o emprego de arma, com base no artigo 2º § 2º, da Lei 12850/13, a pena foi aumentada de metade (1/2), perfazendo, em definitivo, 07 (sete) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa. Os crimes foram praticados em concurso material, motivo pelo qual as penas foram somadas, conforme disciplina o art. 69, caput do Código Penal, obtendo-se 21 (vinte e um) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Devidamente eleito o regime inicial fechado para o apelante, consoante disciplina o artigo 33, §§ 2º e 3°, c.c. artigo 59, III, ambos do Código Penal, considerando-se o quantum de reprimenda aplicada, a reincidência específica ostentada pelo apelante, bem como as circunstâncias desfavoráveis do caso concreto expressiva quantidade das drogas, armas e munições apreendidas. Nesse sentido, mutatis mutandis , decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça: “ (...) Em atenção ao art. 33, § 2º, alínea "c", do CP, c/c o art. 42 da Lei n. 11.343/2006, embora estabelecida a pena definitiva do acusado em 5 anos de reclusão, a quantidade, a natureza deletéria e a variedade dos entorpecentes apreendidos (30 microtubos plásticos contendo cocaína, pesando aproximadamente 43,3g, 75 "buchas" de maconha, pesando aproximadamente 101g, e 22 pedras de crack, pesando aproximadamente 8,9g), bem como a existência de circunstância judicial negativa justificam a manutenção do regime prisional mais gravoso, no caso, o fechado (...) ” (AgRg no AREsp n. 1.835.048/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 18/5/2021, DJe de 24/5/2021.); ainda: “ (...) A condenação a pena entre 4 e 8 anos de reclusão, que, em tese, admitiria a fixação do regime semiaberto, enseja, em caso de reincidência, conforme os parâmetros legais (art. 33, §§ 2º, a e b, e 3º, do Código Penal), a imposição do regime prisional fechado (...)” (AgRg no HC n. 563.878/MG, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 8/6/2021, DJe de 10/6/2021). A respeito, destaca-se precedente do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REVISÃO CRIMINAL NÃO CONHECIDA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. DISCRICIONARIEDADE. PERSUASÃO RACIONAL. REVISÃO ADMITIDA TÃO SOMENTE QUANDO DESNECESSÁRIA A DILAÇÃO PROBATÓRIA. MAUS ANTECEDENTES. PERÍODO DEPURADOR. INAPLICABILIDADE. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENAL. PARÂMETROS LEGAIS OBSERVADOS. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O exame pelo Superior Tribunal de Justiça de matéria que não foi apreciada pelas instâncias ordinárias enseja indevida supressão de instância, com explícita violação da competência originária para o julgamento de habeas corpus (art. 105, I, c, da Constituição Federal). 2. A dosimetria da pena é o procedimento em que o magistrado, utilizando-se do sistema trifásico de cálculo, chega ao quantum ideal da pena com base em suas convicções e nos critérios previstos abstratamente pelo legislador. 2. O cálculo da pena é questão afeta ao livre convencimento do juiz, passível de revisão em habeas corpus somente em situações excepcionais de notória ilegalidade ou de abuso de poder que possam ser aferidas de plano, sem necessidade de dilação probatória. 3. O período depurador não se aplica às condenações consideradas como maus antecedentes, diante dos efeitos do princípio da perpetuidade, diferentemente da reincidência, que é regida pela temporariedade. 4. A condenação a pena entre 4 e 8 anos de reclusão, que, em tese, admitiria a fixação do regime semiaberto, enseja, em caso de reincidência, conforme os parâmetros legais (art. 33, §§ 2º, a e b, e 3º, do Código Penal), a imposição do regime prisional fechado. 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 563.878/MG, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 8/6/2021, DJe de 10/6/2021.) No mesmo sentido, já se manifestou esta Colenda Câmara de Direito Criminal: Apelação Tráfico de drogas Recursos da acusação e da defesa. Apelo ministerial Elevação da pena-base Drogas de natureza diversificada e em quantidade elevada Inteligência do art. 42 da Lei 11.343/06 Afastamento da compensação entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea Reincidência como circunstância preponderante no concurso de agravantes e atenuantes (art. 67 do CP) Compensação inviável Jurisprudência do STF Reprimenda elevada Recurso provido. Apelo defensivo Agravante do art. 61, II, "j", do CP mantida Crime praticado em ocasião de calamidade pública Desnecessária comprovação cabal do nexo de causalidade entre o delito e a pandemia COVID-19 Precedentes desta C. Câmara Reincidência que inviabiliza a aplicação do "tráfico privilegiado" e a fixação de regime inicial diverso do fechado Recurso não provido . (TJSP; Apelação Criminal 1501527-32.2020.8.26.0544; Relator (a): Juscelino Batista; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Criminal; Foro de Jundiaí - 1ª Vara Criminal; Data do Julgamento: 21/05/2021; Data de Registro: 14/05/2021 G.N.). Claro, pois, que regime mais brando não se mostra suficiente, uma vez que os mecanismos de prevenção e repressão do Estado não são aptos a demover o apelante do impulso criminoso. Nesse passo, em que pesem os argumentos expostos, entende-se incabível a imposição de regime mais ameno, mostrando-se necessário o cumprimento de todas as etapas de ressocialização. Depreende-se, portanto, que as penas foram corretamente fixadas, observou-se o critério trifásico estabelecido no artigo 68 do Código Penal, e todas as fases de dosimetria restaram fundamentadas dentro dos parâmetros legais, não merecendo qualquer reparo as reprimendas impostas na decisão combatida.
A revisão da decisão impugnada revela a escorreita aplicação do direito e a sólida valoração das provas pelas instâncias ordinárias, cujos fundamentos se coadunam com a jurisprudência dominante desta Corte Superior. Com efeito, a validade das buscas domiciliares foi devidamente demonstrada, observando-se a exigência legal de especificação dos locais "o mais precisamente possível", em especial face às notórias dificuldades de incursão em áreas controladas pelo crime organizado, bem como a correta elucidação da dupla numeração do imóvel em São Vicente, a qual não desvirtua a autorização judicial. A apreensão dos telefones celulares, por sua vez, mostra-se legítima em razão da natureza permanente do crime de tráfico de drogas, que mantém o estado de flagrância, e da evidente conexão com a atividade criminosa. No mérito, a materialidade e a autoria dos delitos foram inequivocamente comprovadas pelo vasto acervo probatório, notadamente pelos depoimentos harmônicos dos policiais – dotados de presunção de veracidade e corroborados por outros elementos –, e pela contundente prova digital extraída do aparelho celular do acusado, que detalha sua proeminente liderança na organização criminosa e sua direta participação no comércio de entorpecentes e armas de fogo.
Nesse mesmo sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E RECEPTAÇÃO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. ALEGADA NULIDADE DAS PROVAS DECORRENTES DO CUMPRIMENTO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. LOCAL DESABITADO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. DESCONSTITUIR A CONCLUSÃO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INADMISSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Não há falar em violação ao princípio da colegialidade na decisão proferida nos termos do art. 34, XVIII, a, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça - RISTJ que dispõe que cabe ao relator, em decisão monocrática, "não conhecer do recurso ou pedido inadmissível, prejudicado ou daquele que não tiver impugnado especificamente todos os fundamentos da decisão recorrida", lembrando, ainda, a possibilidade de apreciação pelo órgão colegiado por meio da interposição do agravo regimental.
2. Não se constata nulidade na prova obtida durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão, pois, inicialmente os policiais se dirigiram ao endereço nele constante e no local apreenderam, no quarto do réu, porções de drogas - 103 eppendorfs, contendo 31,5g de cocaína -, uma balança de precisão, um rolo de plástico filme, e a quantia de R$1.097,00 em cédulas diversas, além de uma arma de fogo, calibre 38. As drogas e objetos relacionados ao tráfico, além arma de fogo, foram localizados no endereço para o qual o mandado de busca e apreensão foi expedido, não havendo que se cogitar em ilegalidade quanto às apreensões ocorridas no local.
3. Quanto ao segundo endereço, nos termos do acórdão, se tratava de um lote desabitado, cuja propriedade teria sido assumida pelo réu aos policiais durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão, justificando, excepcionalmente, a continuidade da diligência a fim de se evitar o perecimento da prova.
4. O Tribunal a quo asseverou a existência de elementos apenas indiciários e não probatórios até aquele momento, o que inviabilizaria a análise definitiva sobre a matéria na via estreita do habeas corpus, não afastando a possibilidade de rediscussão do tema em sede própria.
5. Nesse contexto, para se acolher a tese da defesa e concluir pela nulidade da prisão, desconstituindo os fundamentos adotados pela Corte estadual, seria necessário o reexame de todo o conjunto probatório, providência vedada em habeas corpus, procedimento de cognição sumária e rito célere.
6. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 929.792/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 1/7/2025, DJEN de 4/7/2025.)
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E PORTE DE ARMAS. PRISÃO PREVENTIVA. RECURSO IMPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto contra decisão que indeferiu liminarmente habeas corpus, mantendo a prisão preventiva do agravante por tráfico de drogas e porte de armas. O agravante foi preso em flagrante durante cumprimento de mandado de busca e apreensão, com apreensão de armas, drogas e outros objetos relacionados a atividades criminosas.
II. Questão em discussão
2. A questão em discussão consiste em verificar a legalidade da decretação da prisão preventiva, analisando-se a presença dos requisitos previstos nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal e a suficiência de medidas cautelares diversas da prisão.
3. Alega-se fato novo, com o corréu assumindo integralmente a responsabilidade pelos entorpecentes e armas apreendidos, o que, segundo a defesa, afastaria o vínculo do agravante com a atividade criminosa.
III. Razões de decidir
4. A prisão preventiva está fundamentada na necessidade de garantir a ordem pública, em razão da gravidade concreta das condutas, evidenciada pela quantidade e natureza das drogas e armas apreendidas.
5. A jurisprudência entende que a apreensão de armas e drogas em contexto de tráfico justifica a prisão preventiva, devido à periculosidade do acusado e à necessidade de acautelar a ordem pública.
6. As condições pessoais favoráveis do agravante não são suficientes para afastar a prisão preventiva quando há fundamentação concreta para sua manutenção.
7. Medidas cautelares alternativas são insuficientes para garantir a ordem pública, dada a gravidade das condutas e o risco de reiteração delitiva.
8. O fato novo alegado deve ser apurado pelas instâncias ordinárias durante a instrução criminal, pois demanda dilação probatória, incabível na via estreita do habeas corpus.
IV. Dispositivo e tese
9. Recurso improvido.
Tese de julgamento: "1. A prisão preventiva pode ser mantida quando fundamentada na gravidade concreta das condutas e na necessidade de garantir a ordem pública. 2. A apreensão de armas e drogas em contexto de tráfico justifica a prisão preventiva. 3. Fatos novos que demandam dilação probatória devem ser apurados nas instâncias ordinárias."
(AgRg no HC n. 1.000.733/RS, relator Ministro Carlos Cini Marchionatti (Desembargador Convocado TJRS), Quinta Turma, julgado em 11/6/2025, DJEN de 18/6/2025.)
Ante o exposto, conheço do agravo para negar provimento ao recurso especial.
Publique-se. Intimem-se.
Relator
ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
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