Processo nº 7000177-93.2024.7.07.0007
ID: 334896488
Tribunal: STM
Órgão: Auditoria da 7ª CJM
Classe: AçãO PENAL MILITAR - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 7000177-93.2024.7.07.0007
Data de Disponibilização:
25/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ITHALO QUEIROZ CARVALHO
OAB/RN XXXXXX
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Ação Penal Militar - Procedimento Ordinário Nº 7000177-93.2024.7.07.0007/PE
ACUSADO
: DEBORA SOUSA PAULA
ADVOGADO(A)
: ITHALO QUEIROZ CARVALHO (OAB RN015151)
SENTENÇA
JUIZA FEDERAL: Maria do Socorro…
Ação Penal Militar - Procedimento Ordinário Nº 7000177-93.2024.7.07.0007/PE
ACUSADO
: DEBORA SOUSA PAULA
ADVOGADO(A)
: ITHALO QUEIROZ CARVALHO (OAB RN015151)
SENTENÇA
JUIZA FEDERAL: Maria do Socorro Leal
MPM: Antonio Carlos Gomes Facuri
Conselho Permanente de Justiça para a Aeronáutica (
Maj Harley de Macedo Cordeiro
,
Cap Diana Bertoldo Moro
,
1º Ten. Sérgio Luiz de Medeiros e
1º Ten Thais Aguiar de Medeiros)
O Ministério Público Militar (MPM) ofereceu denúncia contra a 2S SAD
DEBORA SOUSA PAULA
, já qualificada nos autos, por ter desrespeitado a 2S BCT
Juliana Castro de Almeida
, militar hierarquicamente superior em questão atinente ao serviço, na presença de outros militares (
Evento 1 - Doc 1
).
Consta nos autos, em suma, que, no dia 8 de fevereiro de 2024, durante uma discussão entre as militares 2S BCT
Juliana Castro de Almeida
e 2S SAD Débora Sousa Paula, houve divergência de opiniões quanto à obrigatoriedade de comparecimento dos militares de escala operacional à solenidade de passagem de comando da BANT. A 2S SAD Débora defendia que os militares da escala deveriam comparecer ao evento, alegando ter recebido orientação do seu chefe imediato, o 1º Tenente Rivas. Por sua vez, a 2S BCT Juliana informou que, conforme determinação do Major Boareto, não haveria necessidade da presença desses militares na referida solenidade. Durante o desentendimento, a acusada, ciente de que a ofendida fazia uso de medicação controlada, teria desrespeitado-a ao chamá-la de
“louca”
e afirmar que estaria em
“surto psicótico”
, utilizando tom desrespeitoso e agressivo.
Dessa forma, estaria a acusada incursa no artigo 160 (desrespeito a superior), do Código Penal Militar (CPM).
Nos autos do Inquérito Policial Militar (IPM):
- PORTARIA CINDACTA III N° 115/CMDO, DE 28 DE ABRIL DE 2024. Protocolo COMAER n° 67614.009035/2024-42 (Evento 1, INIC1).
- FOLHA DE QUALIFICAÇÃO DA INVESTIGADA (Evento 14,AUTO_QUALIFIC2).
- FOLHA DE ALTERAÇÕES -
JULIANA CASTRO DE ALMEIDA
(Evento 14, FL_ALTERA5, FL_ALTERA6).
- Inquirição da Ofendida (Evento 14, DEPOIM_TESTEMUNHA7).
- NS da BANT que trata da Solenidade Militar alusiva à passagem de Comando da BANT ( Evento 14, INQ12, fls. 1-13)
- Quadro de Trabalho Semanal do DTCEA-NT da semana constando o evento da formatura de passagem e Comando da BANT ( Evento 14, INQ12, fl. 14).
- Cópia da mensagem via aplicativo de smartphone onde constam as interagdes entre o Comandante do DTCEA-NT com a Sgt Juliana, tratando sobre os eventos da formatura de passagem de Comando da BANT ( Evento 14, INQ12, 15).
- Copia da mensagem via aplicativo de smartphone onde consta a retratação da 2S Débora para a 2S Juliana,após ter tomado conhecimento da oficialização do fato gerador deste procedimento investigatrio (Evento 14, INQ12, 16)
- Planta baixa da Secretaria do Seção Administrativa do DTCEA-NT, bem com folos que demonstrem a disposição das estações de trabalho com identificagdo das posições dos militares que as ocupam ( Evento 14, INQ12, fls. 17- 21).
- Interrogatório da investigada (Evento 14, AUTO_QUALIFIC14).
- NS da BANT que trata da Solenidade Militar alusiva à passagem de Comando da BANT (Evento 14, INQ12, fls. 1-11).
- Quadro de Trabalho Semanal do DTCEA-NT da semana constando o evento da formatura de passagem e Comando da BANT (Evento 14, INQ12, fl. 14).
- Cópia da mensagem via aplicativo de smartphone onde constam as interações entre o Comandante do DTCEA-NT com a Sgt Juliana, tratando sobre os eventos da formatura de passagem de Comando da BANT (Evento 14, INQ12, fl. 15).
- Copia da mensagem via aplicativo de smartphone onde consta a retratação da 2S Débora para a 2S Juliana,apés ter tomado conhecimento da oficialização do fato gerador deste procedimento investigatrio ( (Evento 14, INQ12, fl. 16).
- Planabaixa da Secretaria do Seção Administrativa do DTCEA-NT, bem com folos que demonstrem a disposição das estações de trabalho com identificagdo das posições dos militares que as ocupam (Evento 14, INQ12, fls. 17-21).
- Relatório do IPM (Evento 14, REL_FINAL_IPL19, REL_FINAL_IPL20, REL_FINAL_IPL21 e REL_FINAL_IPL22).
- Solução do IPM (Evento 14, SOL_IPM23).
A denúncia foi recebida em
11 SET 2024
, dando início à presente ação penal militar (
Evento 1 - Doc 2
).
Certidões de antecedentes criminais foram acostadas, com nada consta em desfavor da acusada (
Eventos 8, 9, 10, 107, 109 e 110
).
A ré foi validamente citada, tendo informado possuir como advogado constituído o Dr. Ithalo Queiroz, OAB/RN nº 15.151 para acompanhar sua defesa técnica (
Evento 19
).
Proferido despacho determinando a expedição de ofício à administração militar, a fim de obter informações sobre o período provável de licença-maternidade a ser gozado pela ré, em face da aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (
Evento 27
), tendo sido prestado os devidos esclarecimentos pela autoridade militar (
Evento 36
).
Em resposta à acusação, a defesa da 2S SAD DÉBORA SOUSA PAULA requereu a absolvição sumária (
Evento 30
).
A ofendida apresentou petição requerendo a habilitação do Dr. Lucas Matheus, OAB/RJ nº 256.936, como assistente de acusação (
Evento 54
), deferido por este juízo (
Evento 68
), após anuência do MPM.
O Conselho Permanente de Justiça para a Aeronáutica (CPJ-Aer), por unanimidade, conheceu da resposta à acusação e negou-lhe provimento, confirmando, assim, o recebimento da denúncia (
Evento 86
).
A ofendida foi ouvida, as testemunhas, inquiridas, e a acusada, qualificada e interrogada (
Evento 87
).
Na fase do art. 427 do Código de Processo Penal Militar (CPPM), as partes nada requereram (
Eventos 92 e 96
).
Em alegações escritas (art. 428 do CPPM), o MPM pugnou pela improcedência da pretensão punitiva, entendendo que não restou comprovada a existência do crime de desrespeito a superior, tampouco de crime contra a honra (
Evento 101
).
Por outro lado, o assistente de acusação apresentou alegações escritas em sentido oposto ao MPM, pugnando pela condenação da acusada pelo crime de desrespeito a superior, por estarem preenchidos os requisitos do tipo penal em comento (
Evento 106
).
Por sua vez, a defesa da acusada pugnou pela absolvição, em essência, por não ter sido demonstrado elementos suficientes para condenação, haja vista notória ausência de dolo por parte da ré (
Evento 116
).
Em decisão saneadora, concluiu-se que o feito estava pronto para julgamento (
Evento 118
).
A sessão, com a íntegra das alegações orais e votos, foi registrada em mídia audiovisual anexada aos autos.
É o que importa relatar.
Tudo bem visto e ponderado, o Conselho passou a deliberar.
Preliminarmente, não há nulidades a inquinar o feito.
É importante destacar que, apesar do MPM ter pugnado pela improcedência da pretensão punitiva, veiculada em alegações escritas, em face do princípio da indisponibilidade da ação penal. tal opinião ministerial não vincula o órgão julgador, de acordo com o disposto no art. 437 do CPPM:
Art. 437. O Conselho de Justiça poderá:
a) dar ao fato definição jurídica diversa da que constar na denúncia, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave, desde que aquela definição haja sido formulada pelo Ministério Público em alegações escritas e a outra parte tenha tido a oportunidade de respondê-la;
b)
proferir sentença condenatória por fato articulado na denúncia, não obstante haver o Ministério Público opinado pela absolvição
, bem como reconhecer agravante objetiva, ainda que nenhuma tenha sido argüída.
Por sua vez, o Código de Processo Penal (CPP) estabelece:
Art. 385. Nos crimes de ação pública,
o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição
, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
Logo, a possibilidade de o julgador condenar o réu, ainda que exista pleito de absolvição do órgão ministerial, concretiza o princípio da livre convicção motivada, o que não compromete a sua imparcialidade.
Outro não é o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF):
AGRAVO INTERNO EM HABEAS CORPUS. SISTEMA ACUSATÓRIO. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. VINCULAÇÃO DO TRIBUNAL. AUSÊNCIA. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL. AGRAVAMENTO DA SITUAÇÃO JURÍDICA DO RÉU. INEXISTÊNCIA. INOCORRÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS. REINCIDÊNCIA. TRÁFICO PRIVILEGIADO NÃO CONFIGURADO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO HABEAS CORPUS. 1.
O sistema acusatório deve ser harmonizado com o princípio do livre convencimento motivado, não estando o Tribunal, no julgamento de apelação, vinculado a eventual manifestação do Ministério Público em favor do réu
. 2. Inexiste afronta à parte final do art. 617 do Código de Processo Penal quando, em recurso exclusivo da defesa, correção de erro material não agrava a situação jurídica do réu. 3. A reincidência é razão suficiente para o afastamento da causa de diminuição atinente ao tráfico privilegiado. 4. Agravo interno desprovido. (HC: 232712 SC, Relator.: Min. NUNES MARQUES, Data de Julgamento: 07/10/2024, Segunda Turma, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 23-10-2024 PUBLIC 24-10- 2024)
AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SISTEMA ACUSATÓRIO. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ A MANIFESTAÇÃO DO ÓRGÃO ACUSATÓRIO PELA IMPRONÚNCIA OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA OUTRO DELITO. ALEGADA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. NECESSÁRIO REEXAME DE ELEMENTOS FÁTICO-PROBATÓRIOS. ENUNCIADO N. 279 DA SÚMULA. 1.
O sistema acusatório deve ser harmonizado com o princípio do livre convencimento motivado, não estando o juiz, na sentença de pronúncia, vinculado a eventual manifestação do Ministério Público, em alegações finais, pela impronúncia ou desclassificação para outro delito
. 2. Para dissentir da conclusão alcançada pelo Colegiado de origem – existência de indícios de materialidade e autoria de crime doloso contra a vida –, seria indispensável o revolvimento fático-probatório. Incidência do enunciado n. 279 da Súmula do Supremo. 3. Agravo interno desprovido. (ARE: 1437269 SP, Relator.: NUNES MARQUES, Data de Julgamento: 22/08/2023, Segunda Turma, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 12-09-2023 PUBLIC 13-09-2023)
Assim, em que pese não ter sido arguida pela defesa em sede de preliminar, não há se falar em vinculação do órgão julgador no pronunciamento da sentença à eventual manifestação ministerial de improcedência da pretensão punitiva.
No mérito
, observamos que o
Parquet
denunciou a 2S SAD
DEBORA SOUSA PAULA
por ter praticado conduta que se enquadraria no artigo 160 do CPM:
Desrespeito a superior
Art. 160. Desrespeitar superior diante de outro militar:
Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave
Trata-se de crime propriamente militar, de subsidiariedade expressa, que possui como objetividade jurídica a tutela da hierarquia e disciplina militares e se efetiva pelo desrespeito do subordinado para com o seu superior.
A jurisprudência do Superior Tribunal Militar (STM) destaca que, para a configuração desse delito, é essencial a presença de dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de desrespeitar o superior, atingindo sua dignidade, decoro ou autoridade:
APELAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR. ABSOLVIÇÃO. DESRESPEITO A SUPERIOR . ART. 160 DO CPM. ATIPICIDADE. AUSÊNCIA DE DOLO .
O bem jurídico tutelado pela norma castrense descrita no art. 160 do CPM é o respeito devido pelos subordinados aos seus superiores
, em inequívoca consequência do dever de observância dos Princípios Constitucionais da Hierarquia e da Disciplina.A Teoria Finalista da Ação introduziu a análise do dolo e da culpa na tipicidade.
Portanto, restando comprovado que o agente não agiu livre e conscientemente, inexiste o crime impondo-se, por conseguinte, a absolvição pela atipicidade da conduta
. (STM - AP: 547420117070007 PE 0000054-74.2011.7.07 .0007, Relator.: Cleonilson Nicácio Silva, Data de Julgamento: 06/09/2012, Data de Publicação: 25/09/2012 Vol: Veículo: DJE) (
grifo nosso
)
APELAÇÃO INTERPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR. CRIMES CAPITULADOS NOS ARTS. 160 E 223, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DO CPM. DESRESPEITO A SUPERIOR . AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. AMEAÇA INIDÔNEA. RECURSO NÃO PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME . I -
Não se verifica a prática do crime de desrespeito a superior (art. 160 do CPM) sem a comprovação da presença de dolo específico na conduta perpetrada
. É necessária a presença dos elementos objetivos, que consistem em desacatar, menosprezar, insultar ou ofender superior, atingindo sua dignidade, decoro, honra ou visando enfraquecer sua autoridade. II - Para se consumar o crime de ameaça (art . 223,"caput", do CPM), é imprescindível que esta seja crível e grave, capaz de gerar temor ao ofendido e que o autor tenha o dolo de, efetivamente, concretizá-la. Apelo conhecido e não provido. Decisão unânime. (STM - APELAÇÃO: 0000072-27 .2013.7.07.0007, Relator.: JOSÉ COÊLHO FERREIRA, Data de Julgamento: 09/06/2015, Data de Publicação: 26/06/2015) (
grifo nosso
)
Além disso, segundo o STM, a conduta deve ocorrer na presença de outro militar, sendo este um elemento objetivo do tipo penal:
APELAÇÃO. DESRESPEITO A SUPERIOR (CPM, ART. 160). VONTADE LIVRE E CONSCIENTE DE DESRESPEITAR . FATO TÍPICO. INEXISTÊNCIA DE EXCLUDENTES DE ILICITUDE E DE CULPABILIDADE. INCABÍVEL A CONVERSÃO DA CONDUTA EM TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR. APLICAÇÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA . IMPOSSIBILIDADE POR EXPRESSA VEDAÇÃO LEGAL.
Os autos evidenciaram a vontade livre e consciente do Réu de praticar a conduta prevista no art. 160 do CPM, o qual desrespeitou superior na presença de outros militares, ensejando a sua prisão em flagrante delito
. A conduta típica está devidamente comprovada nos autos, não se verificando elementos aptos a excluírem a ilicitude ou a culpabilidade . A reprimenda penal há de ser aplicada ao agente que comete conduta tipificada como crime, não se podendo considerar a prática delitiva prevista no art. 160 do CPM como transgressão disciplinar, até porque não existe norma legal nesse sentido. O art. 88, inciso II, alínea a, do Código Penal Militar é compatível e está em perfeita sintonia com as normas e princípios constitucionais, conforme precedentes do Excelso Pretório e deste Tribunal . Apelo defensivo não provido. Decisão unânime. (STM - AP: 00000260520127060006 BA, Relator.: Lúcio Mário de Barros Góes, Data de Julgamento: 18/02/2014, Data de Publicação: Data da Publicação: 25/02/2014 Vol: Veículo: DJE) (
grifo nosso
)
EMENTA: APELAÇÃO. DESRESPEITO A SUPERIOR. ART. 160 DO CPM . AUTORIA E MATERIALIDADE. COMPROVAÇÃO. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO . PRESENÇA. INIMPUTABILIDADE. ABSOLVIÇÃO IMPRÓPRIA. MANUTENÇÃO . DECISÃO POR MAIORIA.
Militar que, na presença de colegas de caserna, enfrenta e menospreza seu superior, viola o disposto no art. 160 do CPM
. Sem embargo de, ao tempo do crime, apresentar síndrome psicótica, conforme se extrai do laudo psiquiátrico, a inimputabilidade do sujeito ativo, segundo a teoria tripartite, não tem o condão de afastar o elemento volitivo da conduta . A repercussão da inimputabilidade é, pois, circunscrita à culpabilidade, não havendo que falar em afastamento dos aspectos objetivos e subjetivos do tipo penal de desrespeito a superior. Logo, desmerece guarida a tese de ausência de dolo e de atipicidade da conduta. Destarte, deve prevalecer a solução levada a cabo pela decisão primeva que absolveu o réu por se tratar de inimputável (art. 439, alínea d, do CPPM, c/c o art . 48, caput, do CPM) e aplicou, com base no art. 120 do CPM, no art. 160 do CPPM e no art. 96, II, c/c o art . 12, ambos do CP, medida de segurança consubstanciada em Tratamento Ambulatorial Psiquiátrico, pelo prazo mínimo de 1 (um) ano. Recurso não provido. Decisão majoritária. (STM - APELAÇÃO: 7000382-51 .2018.7.00.0000, Relator.: MARIA ELIZABETH GUIMARÃES TEIXEIRA ROCHA, Data de Julgamento: 04/04/2019, Data de Publicação: 14/05/2019) (
grifo nosso
)
EMENTA: APELAÇÃO. MPM. ART. 160 DO CPM . DESRESPEITO A SUPERIOR. DELITO PRATICADO NA PRESENÇA DE OUTROS MILITARES. PRESENÇA DAS ELEMENTARES DO TIPO. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA . REFORMA DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. PROVIMENTO. CONDENAÇÃO. DECISÃO POR MAIORIA .
O militar que, na presença de companheiros de farda, de forma dolosa e desrespeitosa, arremessa uma mesa na direção do Superior hierárquico, incorre nas sanções do art. 160 do CPM
. O conjunto probatório produzido nos autos revela, de forma clara, a ocorrência do crime, não havendo qualquer contradição nos depoimentos das testemunhas. O fato de as testemunhas serem Oficiais da Marinha, e o acusado praça, em nada influi para o valor desse meio de prova, eis que os militares prestaram o depoimento sob o juramento dizer a verdade . Destarte, preenchidas as elementares do tipo penal em comento, a conduta do apelado se amolda perfeitamente ao delito previsto no art. 160 do CPM, e deve ser fortemente coibida no seio da caserna. Assim, não havendo qualquer causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade, a condenação é medida que se impõe. Provimento do Apelo ministerial . Decisão por maioria. (STM - APELAÇÃO: 7000080-51.2020.7 .00.0000, Relator.: ODILSON SAMPAIO BENZI, Data de Julgamento: 25/06/2020, Data de Publicação: 04/08/2020) (
grifo nosso
)
EMENTA: APELAÇÃO. ARTIGO 160 DO CPM. DESRESPEITO A SUPERIOR. FATO PRATICADO DIANTE DE OUTRO MILITAR . TUTELA DA DISCIPLINA E DA HIERARQUIA MILITAR. CONFIGURAÇÃO DE TODAS AS CIRCUNSTÂNCIAS DO TIPO INCRIMINADOR. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. REPRIMENDA CORRETAMENTE SOPESADA . DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. UNANIMIDADE . 1. O ato de desrespeitar consiste em qualquer ação ou omissão que se traduza numa conduta de não dispensar ao superior hierárquico o devido respeito.
É mandatório que tal fato seja praticado diante de outro militar que tenha presenciado a conduta ilícita do subordinado para com o superior ou, ao menos, tenha percebido a conduta desrespeitosa exteriorizada
, desde que o fato não constitua crime mais grave. O tipo penal tutela a disciplina militar que ao lado da hierarquia são as bases institucionais, estruturantes e fundamentais das Forças Armadas, as quais foram erigidas a princípios constitucionais pelo art . 142 da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. 2. Resta configurado em todas as suas circunstâncias o tipo incriminador do art. 160 do CPM, uma vez que o Apelante desrespeitou seu superior hierárquico diante de outros militares . Além disso, resta configurado o dolo do tipo, posto que o Apelante não atendeu, de pronto, ao chamado do Superior e, ainda, permaneceu discutindo em voz alta com o referido Oficial. O Apelante faltou com o respeito devido ao seu superior de forma livre, voluntária e consciente, apontando-lhe o dedo em riste e mandando o Oficial falar baixo, embora tivesse sido advertido para manter a calma. 3. Não há que se falar em ofensa ao princípio da proporcionalidade, uma vez que a reprimenda aplicada foi corretamente sopesada . 4. Amoldando-se a conduta do Apelante ao tipo penal do art. 160 do CPM, não há que se falar em desclassificação para transgressão disciplinar. Decisão por unanimidade . (STM - APELAÇÃO: 7000882-49.2020.7.00 .0000, Relator.: CELSO LUIZ NAZARETH, Data de Julgamento: 09/09/2021, Data de Publicação: 07/10/2021) (
grifo nosso
)
No caso dos autos, os fatos se iniciaram com uma discussão entre a 2S DEBORA e a 2S JULIANA, motivada por uma divergência de opinião entre ambas, que dizia respeito a necessidade ou não de militares de escala comparecem à formatura de passagem de comando da BANT.
A prova que fora produzida em juízo é essencialmente testemunhal.
A ofendida,
2S
Juliana Castro de Almeida
,
relatou um incidente ocorrido após um treinamento para formatura. Segundo Juliana, o Major Boareto a informou, na presença da Sargento Elaine, sobre a possibilidade de dispensar militares de escala (controladores e meteorologistas) da solenidade, visando conceder-lhes folga no feriado de carnaval. A Sargento Débora não estava presente quando essa orientação foi dada.
Ao retornar à seção administrativa, Juliana solicitou à Sargento Débora que transmitisse a informação ao Tenente Rivas, seu chefe. Débora, ao retornar, informou que o Tenente Rivas desejava um efetivo mínimo na formatura e que, se necessário, o pessoal da escala completaria o quadro. Juliana discordou, insistindo que a ordem do Major era para liberar o pessoal da escala e, por isso, enviou uma mensagem direta ao Major para confirmar.
Nesse ponto, a Sargento Débora teria afirmado que, se alguém fosse liberado, seriam os oficiais mais antigos, escalando a discussão. Juliana alegou que Débora começou a gritar, chamando-a repetidamente de "louca" e afirmando que estava tendo um "surto psicótico". Juliana admitiu ter se exaltado e usado um palavrão em resposta à afirmação de Débora de que falaria como quisesse, exigindo respeito.
A discussão prosseguiu com Débora gritando e repetindo os insultos, além de mencionar "essas coisinhas que você fica tomando", referindo-se à medicação de Juliana. A Sargento Elaine interveio fisicamente, colocando-se entre as duas, pois Débora "ia para cima dela". Após a saída de Elaine, Juliana afirmou que Débora se aproximou, apontou o dedo em seu rosto e questionou repetidamente "vai fazer o quê comigo?". Juliana permaneceu sentada, e o Tenente Rivas só se manifestou após a saída da Sargento Débora da sala.
Informou que ela e a Sargento Débora se conhecem desde 2007/2008, tendo feito um cursinho juntas e se reencontrado profissionalmente em 2023. Ela ressaltou ser mais antiga que Débora por tempo de serviço, fato que Débora tinha conhecimento. Embora já tivessem tido divergências de opiniões no trabalho, nunca haviam chegado a esse nível de desrespeito.
Sentiu que sua autoridade foi publicamente desrespeitada e que seu discernimento foi questionado devido ao uso de medicamento controlado, do qual, segundo ela, todos tinham conhecimento. Ela esclareceu que possui transtorno de ansiedade e episódios de pânico, tendo iniciado tratamento psiquiátrico em outubro de 2023, após ser afastada de sua função de controladora de tráfego aéreo por perda auditiva. A discussão, segundo Juliana, piorou sua condição, exigindo aumento na dosagem dos medicamentos. Por fim, afirmou que o uso de expressões como "tá louco" ou "surtando" não era comum no ambiente de trabalho.
A testemunha
1º Tenente Alexandre do Amparo Rivas
confirmou a ocorrência de uma discussão acalorada sobre a escala de militares para a formatura. Ao chegar à secretaria, percebeu uma "certa discordância" entre as Sargentos Débora e Juliana. Ele atribuiu a origem do problema à divergência de ideias: a Sargento Débora, da administração, acreditava que todos deveriam colaborar com a formatura, enquanto a Sargento Juliana, controladora, entendia que, se possível, o pessoal da escala deveria ser liberado em momentos de formatura.
Relatou ter ouvido a Sargento Débora dizer "Você tá maluca?" ou "Você é louca?" para a Sargento Juliana, mas interpretou essas expressões como uma forma de discordância, e não como uma ofensa direta. Após a Sargento Juliana pedir respeito, a Sargento Débora repetiu a expressão uma ou duas vezes, e em seguida, a Sargento Juliana utilizou uma palavra de baixo calão. Foi nesse momento que a Sargento Elaine interveio para separá-las. Ele não viu nenhuma das duas apontar o dedo, observando apenas que movimentavam os braços devido à agitação.
Confirmou que a Sargento Juliana era mais antiga que a Sargento Débora, e que esse fato era de conhecimento notório na seção. Em sua percepção, houve falta de respeito mútuo pelo ambiente militar. Ele ressaltou que não viu intenção de uma desrespeitar a outra, pois ambas estavam exaltadas, o que levou ao desrespeito no ato em si, no contexto geral da discussão, e não como um ato isolado de um militar querendo ofender ou desrespeitar o outro. Horas depois do ocorrido, ao visitar a Sargento Juliana em sua casa, não percebeu sinais de abalo emocional nela.
Explicou que não fez um registro oficial imediato para preservar o clima organizacional e porque viajaria no dia seguinte. Sua intervenção ocorreu quando a Sargento Elaine, após duas tentativas, não conseguiu acalmar a situação. Ele deu a ordem para pararem e pediu para a Sargento Débora "tomar uma água" fora da sala.
Afirmou que a Sargento Débora nunca teve problemas semelhantes ou conduta desrespeitosa anterior em sua gestão. Por outro lado, disse ter ouvido "conversa de corredor" sobre a Sargento Juliana já ter tido problemas com outras pessoas. Ele confirmou que era comum e jocoso o uso de expressões como "tá louco", "surtando", "tá com problema" no ambiente de trabalho devido à alta demanda. Inclusive, revelou que ele próprio tomava medicação para ansiedade e brincava sobre isso, sendo chamado de "Rivotril" pelo comandante em tom de brincadeira. Ele reiterou que não considerou os termos da Sargento Débora como ofensa direta ou quebra de hierarquia no momento, pois os interpretou como discordância no calor da discussão.
Por sua vez, a testemunha
1º Sargento Elaine Rojas Nogueira
confirmou o treinamento para a formatura e a informação do Major Boareto sobre a possibilidade de dispensar o pessoal da escala. Ao retornarem para a seção, Elaine e Juliana compartilharam a informação com o Tenente Rivas e a Sargento Débora. A Sargento Débora, segundo Elaine, não concordou com a dispensa, questionando a liberação dos militares mais antigos.
Observou que tanto Juliana quanto Débora são cariocas e têm o "jeito de falar alto". A discussão escalou além do normal, levando-a a intervir. Ela se levantou e ficou entre as duas por receio de que algo acontecesse, pois ambas estavam muito exaltadas, quase gritando. Elaine pediu para que se acalmassem, lembrando-as de que não eram elas quem definiam a escala.
Recordou que a Sargento Débora fez menção à "loucura", dizendo algo como "você está surtando, está ficando muita doida". Nesse momento, a Sargento Juliana se exaltou ainda mais. Elaine não se recordava da Sargento Débora ter apontado o dedo no rosto da Sargento Juliana.
Confirmou que a Sargento Juliana era mais antiga que a Sargento Débora, e que esse fato era de conhecimento da seção. Contudo, em sua visão, houve apenas uma animosidade entre elas, sem intenção de quebrar a hierarquia ou a disciplina, pois as duas já se conheciam desde a adolescência. Ela afirmou nunca ter presenciado problemas graves entre as duas anteriormente, mas que a Sargento Débora reclamava que a Sargento Juliana tinha um jeito "muito grosseiro" de falar com as pessoas.
Confirmou também que o uso de expressões como "tô louco", "surtando" e "enlouquecendo" era comum no ambiente de trabalho em razão da alta demanda. Elaine considerou a discussão apenas uma desavença comum e não sentiu que houve intenção de machucar a Sargento Juliana. Ela acreditou que o uso de palavras de baixo calão pela Sargento Juliana foi o que escalou ainda mais a situação, pois a Sargento Débora não gostava de palavrão.
Por fim, relatou ter tido a impressão de que, em momento posterior, a Sargento Juliana tentou induzi-la a recordar gestos específicos (como a Sargento Débora simulando tomar remédio), dos quais Elaine não se lembrava claramente de ter visto. Essa situação a fez sentir que a Sargento Juliana estava tentando manipular a situação.
Em seu interrogatório, a
2S
DEBORA SOUSA PAULA
negou a veracidade dos fatos da denúncia. Confirmou o treinamento da formatura, mas esclareceu que não estava próxima às Sargentos Juliana e Elaine quando o Major Boareto mencionou a possibilidade de liberar o pessoal da escala.
Disse que a Sargento Juliana pediu que ela transmitisse essa informação ao Tenente Rivas, o que ela fez enquanto despachava outras demandas com ele. Ao retornar à seção, informou que o Tenente Rivas acreditava ser necessário um quantitativo mínimo de militares para a formatura, e que todas as informações visavam assessorar o comandante, não sendo uma ordem definitiva. Débora afirmou que a Sargento Juliana ficou muito descontente, pois, em sua visão, a fala do Major já era uma ordem.
O debate escalou, segundo Débora, quando a Sargento Juliana mencionou que os militares da escala poderiam fazer relatório de fadiga. Débora discordou dela, explicando que, por ser da Administração, sabia que esses militares não excederiam a carga horária regulamentar. Foi neste momento de discordância que ela admitiu ter usado a expressão "tá louca", no sentido de contrapor uma ideia, e não com a intenção de ofender ou zombar.
Enfatizou que não sabia da condição de saúde da Sargento Juliana, nem do uso de medicamentos por parte dela, e negou ter feito gestos simulando o uso de remédios ou apontado o dedo. Ela acreditava que apenas a Sargento Elaine, por ser mais próxima, tinha conhecimento sobre a medicação de Juliana.
Alegou que, após sua expressão, Juliana respondeu repetidas vezes "tá louco é o caralho". Ao ver a Sargento Juliana muito exaltada, Débora disse ter se levantado com a intenção de pegar sua garrafa d'água e sair da sala para se acalmar. Nesse momento, a Sargento Juliana a mandou sentar "em tom de ordem, com raiva, com ressentimento". Débora negou ter respondido naquele instante, e disse que o Tenente Rivas interveio, pedindo para que ela fosse beber uma água.
Afirmou que a discussão foi um debate sobre a liberação do pessoal da escala, e que o desdobramento da discussão só ocorreu quando a Sargento Juliana começou a xingar. Débora reconheceu que a Sargento Juliana era "um pouco mais antiga por alguns meses", mas negou que Juliana exercesse função com ascendência sobre a sua, afirmando que ambas eram auxiliares administrativos sob o mesmo comando do Tenente Rivas.
Relatou que nunca tiveram problemas graves antes, apenas discordâncias de opiniões, e que já havia dito à Sargento Juliana que achava seu jeito de falar com outras pessoas um pouco agressivo. Ela reiterou que não tinha nenhuma intenção de ofender a Sargento Juliana, e tentou cumprimentá-la após o ocorrido, mas Juliana não respondeu. Posteriormente, Débora enviou uma mensagem de WhatsApp pedindo desculpas, não por desrespeito hierárquico, mas "devido ao fato de gostar dela e não ter desejado o mal-estar entre elas".
Pois bem.
Conforme os elementos coligidos nos autos, mormente os depoimentos da vítima 2S
Juliana Castro de Almeida
, das testemunhas 1º Tenente Alexandre do Amparo Rivas e 1S Elaine Rojas Nogueira, e do interrogatório da acusada 2S Débora Sousa Paula, verifica-se a ausência de dolo na conduta imputada à 2S Débora, afastando-se, consequentemente, a tipicidade penal do delito de desrespeito a superior hierárquico.
É fundamental notar que, para a configuração do crime de desrespeito a superior, a conduta deve ter como objetivo direto e consciente minar a autoridade militar, e não apenas ocorrer em um contexto de desentendimento pessoal acalorado.
As narrativas são uníssonas ao descrever um cenário de discussão acalorada, na qual ambas as partes, envolvidas em uma divergência de ideias acerca da dispensa de militares para a formatura, apresentaram condutas exaltadas. O 1º Tenente Rivas, chefe das envolvidas, foi preciso ao identificar a origem do embate na contraposição de perspectivas – a da administração, representada pela 2S Débora, que visava à colaboração generalizada, e a da área operacional, defendida pela 2S Juliana, que preconizava a liberação do pessoal da escala. Tal contexto indica um desentendimento funcional, e não um propósito deliberado de minar a autoridade.
Ademais, a prova testemunhal, particularmente a do 1º Tenente Rivas e da 1S Elaine Nogueira, é enfática ao asseverar a comunalidade e o caráter jocoso de expressões como "tá louco" ou "surtando" no ambiente de trabalho militar, em face da alta demanda e estresse. A própria 2S Débora, ao admitir ter proferido a expressão "tá louca", esclareceu que o fez no sentido de contrapor uma ideia, e não com intenção ofensiva ou zombeteira. Essa justificativa encontra ressonância na cultura organizacional retratada pelos demais depoentes, o que mitiga a interpretação de um dolo específico de ofensa à hierarquia.
A alegação da 2S Juliana quanto à menção a sua medicação também se esvazia diante do desconhecimento da acusada sobre a condição de saúde da vítima. A 2S Débora foi categórica ao afirmar que não tinha ciência do tratamento psiquiátrico da 2S Juliana ou do uso de fármacos, o que afasta qualquer intento de vilipendiar sua dignidade com base em tal condição.
Outrossim, a dinâmica da discussão revela uma escalada mútua da altercação. A 1S Elaine, inclusive, sugere que o uso de palavra de baixo calão pela 2S Juliana, em resposta à 2S Débora, contribuiu para o acirramento da situação. A reação da 2S Débora, de tentar se afastar e buscar água, e a posterior tentativa de reconciliação – com um cumprimento não correspondido e o envio de mensagem de desculpas,
"não por desrespeito hierárquico, mas devido ao fato de gostar dela"
– robustecem a tese da ausência de um ânimo deliberado de desrespeito à superioridade hierárquica. Tais atitudes são incompatíveis com o dolo de desrespeito, mas condizentes com o arrependimento por um desentendimento pessoal.
Ainda que a 2S Juliana fosse ligeiramente mais antiga, a 2S Débora pontuou, e a prova não contradiz, que ambas exerciam funções de auxiliar administrativo sob o mesmo comando, o que enfraquece a imputação de uma afronta funcional direta no contexto da discussão.
É importante consignar que, embora a 2S Juliana tenha expressado ter se sentido ofendida e desrespeitada em sua autoridade e discernimento, e que a discussão tenha impactado sua condição de saúde preexistente, tal percepção subjetiva, por mais legítima que seja, não é suficiente para configurar o elemento volitivo do dolo no tipo penal do desrespeito a superior.
Para a configuração do crime de desrespeito a superior, imperiosa a existência de um
dolo específico, isto é, a vontade livre e consciente de ultrajar ou vilipendiar a autoridade militar, atentando contra seus pilares de hierarquia e disciplina. A mera ocorrência de um embate verbal acalorado, fruto de desavenças pessoais e profissionais, sem a intenção manifesta de ofender a dignidade ou a autoridade funcional, e sem prejuízo real e doloso à ordem militar, não se subsome ao tipo penal em comento. O evento, conforme se depreende dos autos, configurou-se como um embate mútuo de emoções exaltadas, sem o propósito de ofensa criminal.
Por outro lado, não se sustenta, neste caso, a aplicação do erro de fato sobre a qualidade da pessoa, conforme previsto no artigo 36 do Código Penal Militar. Ficou cabalmente demonstrado que a antiguidade da 2S Juliana em relação à 2S Débora era um fato de conhecimento notório na seção. As testemunhas, 1º Tenente Rivas e 1S Elaine, confirmaram essa percepção geral. Além disso, a própria 2S Débora, em seu interrogatório, admitiu que a 2S Juliana era "um pouco mais antiga por alguns meses".
A despeito de qualquer alegação de desconhecimento por parte da 2S Débora quanto à superioridade hierárquica da vítima, tal erro não pode ser considerado inescusável. A informação sobre a antiguidade e, consequentemente, a qualidade hierárquica da 2S Juliana, era de fácil e amplo acesso no ambiente de trabalho militar. Um simples questionamento ou a consulta a registros básicos da unidade seriam suficientes para dirimir qualquer dúvida.
O
Artigo 36 do Código Penal Militar
estabelece:
"Art. 36. É isento de pena quem, ao praticar o crime, supõe, por êrro plenamente escusável, a inexistência de circunstância de fato que o constitui ou a existência de situação de fato que tornaria a ação legítima."
Ressalte-se que para que o erro de fato seja considerado uma causa de isenção de pena, ele deve ser
plenamente escusável
, ou seja, insuperável e inevitável mesmo com o emprego da diligência ordinária. No presente caso, a 2S Débora possuía todas as condições de obter facilmente a informação correta sobre a hierarquia, tornando seu eventual desconhecimento um erro inescusável, incapaz de afastar a tipicidade da conduta ou a culpabilidade. Note-se que o erro que afastaria o dolo no crime de desrespeito a superior seria o completo desconhecimento da qualidade de superior, o que, no presente caso, não ocorreu.
No presente caso, a ausência de dolo não reside na falta de percepção da hierarquia, mas sim na inexistência da vontade livre e consciente de ofender a dignidade ou autoridade funcional da superior. Na verdade, o que se verificou nos autos foi um embate de ideias e emoções, onde a expressão utilizada pela acusada ocorreu no calor do momento, contextualizada por um ambiente de trabalho com alta demanda e por uma dialética que, embora ríspida, não visava à subversão da ordem militar.
Da mesma forma, as elementares dos crimes contra a honra também não restaram configuradas no caso concreto, conforme, inclusive, já pontuado pelo Membro Ministerial.
Dessa forma, estando ausente o dolo na conduta da acusada, isto é, a vontade livre e consciente de desrespeitar a superior hierárquica, e considerando que o contexto da discussão se deu em um momento de tensão mútua, sem propósito de ofensa direta ou afronta à hierarquia e disciplina militar, impõe-se o decreto absolutório.
Pelo exposto, o Conselho Permanente de Justiça para a Aeronáutica (CPJ-Aer) julga
IMPROCEDENTE
a pretensão punitiva para
ABSOLVER
a
2S
DEBORA SOUSA PAULA
, por unanimidade, com fundamento no art. 439, “b”, do Código de Processo Penal Militar.
Registre-se.
Comunique-se.
Intimem-se.
Demais providências de praxe pela Secretaria.
Sala de Sessões da Auditoria da 7ª Circunscrição Judiciária Militar.
Recife (PE), data da assinatura eletrônica.
MARIA DO SOCORRO LEAL
Juíza Federal da Justiça Militar
Considerando a impossibilidade técnica de documentos serem assinados por mais de um usuário no sistema e-Proc JMU, os votos dos seguintes Juízes(as) Militares, registrados em Ata e proferidos em sessão pública, são declarados pelo Exma Juiza Federal da Justiça Militar, para fins de formalização da sentença (art. 438, § 1º, do Código de Processo Penal Militar):
Maj Harley de Macedo Cordeiro
,
Cap Diana Bertoldo Moro
,
1º Ten Sérgio Luiz de Medeiros e
1º Ten Thais Aguiar de Medeiros.
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