Processo nº 0230413-30.2024.8.06.0001
ID: 258448966
Tribunal: TJCE
Órgão: 36ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0230413-30.2024.8.06.0001
Data de Disponibilização:
18/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO FÓRUM CLÓVIS BEVILÁQUA 36ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE FORTALEZA Rua Desembargador Floriano Benevides Magalhães, 220, Setor Verde, Nível 3, sala 310, Edson Q…
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO FÓRUM CLÓVIS BEVILÁQUA 36ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE FORTALEZA Rua Desembargador Floriano Benevides Magalhães, 220, Setor Verde, Nível 3, sala 310, Edson Queiroz, Fortaleza/CE, CEP 60811-690 - (85) 3108-0872 - for.36civel@tjce.jus.br Processo 0230413-30.2024.8.06.0001 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) [Usufruto] AUTOR: ANDRE PARENTE ALVES CAVALCANTI FILHO REU: CAROLINE ARAUJO BRAGA SENTENÇA EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE EXTINÇÃO DE USUFRUTO VITALÍCIO. NU-PROPRIETÁRIO EM DESFAVOR DA USUFRUTUÁRIA. INADIMPLEMENTO CONTUMAZ DE OBRIGAÇÕES INERENTES AO IMÓVEL. TAXAS CONDOMINIAIS E TRIBUTOS (IPTU). "PROTER REM". DÍVIDA VULTOSA. RISCO CONCRETO DE PERDA DO BEM POR EXECUÇÃO. DEVER LEGAL DO USUFRUTUÁRIO DE ARCAR COM AS DESPESAS ORDINÁRIAS E TRIBUTOS (ART. 1.403, I E II, DO CÓDIGO CIVIL). CULPA DA USUFRUTUÁRIA CONFIGURADA. DETERIORAÇÃO ECONÔMICA E JURÍDICA DO BEM. AMEAÇA À PROPRIEDADE DEVIDAMENTE CONFIGURADA NA HIPÓTESE DOS AUTOS. EQUIPARAÇÃO À RUÍNA PARA FINS DE EXTINÇÃO (ART. 1.410, VII, DO CÓDIGO CIVIL). ABANDONO DO IMÓVEL PELA USUFRUTUÁRIA. NÃO USO E NÃO FRUIÇÃO DA COISA. CAUSA AUTÔNOMA DE EXTINÇÃO (ART. 1.410, VIII, DO CÓDIGO CIVIL). ALEGAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS PESSOAIS (DESEMPREGO, CESSAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA) PELA USUFRUTUÁRIA. IRRELEVÂNCIA JURÍDICA PARA AFASTAR A RESPONSABILIDADE PELAS OBRIGAÇÕES "PROPTER REM" E DEVERES LEGAIS DO USUFRUTO. IMPOSSIBILIDADE DE TRANSFERÊNCIA DO ÔNUS AO NU-PROPRIETÁRIO. SENTENÇA PELA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. Vistos etc. I - RELATÓRIO Trata-se de ação declaratória de extinção de usufruto c/c pedido de tutela de urgência ajuizada por André Parente Alves Cavalcanti Filho em desfavor de Caroline Araújo Braga, distribuída e processada neste juízo. Em petição inicial, de ID 121732912, a parte autora alega que, em virtude do divórcio de seus pais em 23/08/2002, passou a ser proprietário de um imóvel situado à Rua República do Líbano, nº 710, apartamento 200, bairro Meireles, Fortaleza/CE; no entanto, o referido imóvel foi gravado com cláusula de usufruto vitalício pela sua mãe, ora promovida. Relata que, desde a época do divórcio de seus genitores, o promovente e a promovida passaram a residir no imóvel e ambos arcavam com as despesas oriundas da moradia, tais como taxas condominiais e IPTU. Contudo, a promovida deixou de honrar com suas obrigações desde abril de 2020, sem arcar com as taxas condominiais e demais despesas, de modo que até a data do ajuizamento da presente ação, somente a dívida condominial resultou no valor de R$ 266.100,24 (duzentos e sessenta e seis mil, cem reais, e vinte e quatro centavos). Destaca o promovente que essa dívida lhe gerou sérios problemas, pois, em razão dos débitos condominiais, o seu nome fora negativado junto às plataformas de proteção ao crédito, com dificuldade de obtenção de crédito no mercado, além de ter sido alvo na ação judicial de execução, nos autos do processo de n. 3000027-07.2021.8.06.0016, em trâmite na 21ª Unidade dos Juizados Especiais Cíveis. Ademais, afirma que, em outubro de 2023, a promovida abandonou o imóvel e passou a residir em novo endereço, encontrando-se a residência em estado de deterioração e abandono. Ante as razões expostas, ingressou o autor com a presente ação a fim de requerer: a) a concessão do benefício da justiça gratuita; b) a concessão da tutela de urgência a fim de autorizar o promovente a proceder com a venda do imóvel; c) o julgamento procedente do feito a fim de declarar extinto o usufruto vitalício da promovida sobre o imóvel; d) a condenação da promovida ao pagamento de custas e honorários advocatícios sucumbenciais; Decisão interlocutória proferida pelo juízo da 1ª Vara de Família desta Comarca declinando a competência em favor de uma das varas cíveis residuais, em ID 121729922. Distribuídos por sorteio, vieram-me os autos conclusos. Emenda à inicial feita, em ID 121731523, para retificar o valor da causa. Decisão interlocutória proferida por este juízo, em ID 121731531, na qual indeferiu a tutela de urgência pleiteada. Petição intermediária atravessada, em ID 124749093, o autor formulou um novo pedido de tutela de urgência para que a promovida se abstenha de locar o imóvel objeto da ação, assim como se prive de divulgá-lo, ofertá-lo e negociá-lo por qualquer meio. Decisão interlocutória, em ID 124806904, na qual foi deferida a tutela pretendida. Contestação ofertada, em ID 130656678, a promovida sustenta que desde junho de 2023 não reside mais no imóvel em razão de idas e vindas do promovente à moradia, bem como que o fato de não ter mais arcado com as despesas oriundas da residência se deu em razão do seu desemprego e do fim do pagamento da pensão alimentícia, que era realizada pelo pai do autor. Acrescenta que o imóvel, à época de sua compra, custou R$ 330.00,00 (trezentos e trinta mil reais) e que R$ 30.000,00 (trinta mil reais) foi dado a título de sinal com recursos exclusivos da demandada. Não somente, afirma ainda que o imóvel foi oferecido para fins de locação pela promovida em excelente estado, de modo que não há o que se falar em deterioração da propriedade, além de não necessitar de autorização do nu-proprietário para fins locatícios. Ante o exposto, requer o julgamento improcedente da demanda. Comunicação de interposição de Agravo de Instrumento pela promovida, em ID 134278157, cuja decisão indeferiu o pedido de efeito suspensivo. Réplica, em ID 137483427, a parte autora reiterou as alegações formuladas na inicial e requereu a aplicação dos efeitos da revelia, bem como a procedência do pleito autoral. Petição, de ID 137483432, o autor informou não possuir interesse na produção de novas provas e requereu o julgamento antecipado da lide. Por sua vez, a autora manifestou interesse na produção de prova testemunhal e no depoimento pessoal do autor, conforme petição, de ID 137947357. Por fim, vieram-me os autos conclusos a julgamento. É o relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, indefiro o pedido de produção de prova em audiência, testemunhal e depoimento pessoal, formulado pela promovida, eis que cabe ao julgador constatar nos autos a existência de provas suficientes para o seu convencimento, pois, como destinatário da prova, é livre para determinar as provas necessárias, bem como indeferir as inúteis ou protelatórias, nos termos do art. 370, parágrafo único do Código de Processo Civil. No presente caso, a prova documental acostada aos autos é suficiente para dirimir a controvérsia instalada nos autos, relacionada à possibilidade de extinção do usufruto vitalício, de modo que a realização de audiência em nada contribuiria para o esclarecimento dos fatos e seria providência de natureza protelatória. Com efeito, tenho que não há necessidade, portanto, de maiores esclarecimentos, por meio de oitiva de testemunha para a elucidação dos fatos, uma vez que a farta prova documental já coligida aos autos mostra-se plenamente suficiente para o julgamento da controvérsia, qual seja, da possibilidade de extinção do usufruto vitalício. A matéria fática relevante - inadimplência das obrigações e não uso do imóvel - encontra-se satisfatoriamente demonstrada por documentos, o que torna prescindível a oitiva de testemunhas ou esclarecimentos adicionais das partes, cujas versões já foram detalhadamente expostas na petição inicial e na contestação. No tocante ao pedido do autor, para aplicar os efeitos da revelia, em virtude da suposta impugnação genérica feita pela promovida, em contestação, nos termos do art. 341 do CPC/2015, não merece acolhimento, haja vista que a peça de defesa apresentada pela promovida, conquanto sucinta em alguns pontos, realmente enfrenta as questões centrais da lide e apresenta possíveis justificativas para a conduta narrada na peça exordial, de modo que não se caracteriza como manifestamente genérica a ponto de justificar a presunção de veracidade dos fatos alegados na inicial. Defiro, por outro lado, o pedido de gratuidade da justiça, formulado pela promovida, tendo em vista os elementos presentes nos autos que indicam sua hipossuficiência financeira, corroborada pela assistência prestada pela Defensoria Pública. Feitos esses esclarecimentos iniciais, passo a análise do mérito. O cerne da controvérsia consiste em decidir se a conduta da promovida, usufrutuária vitalícia do imóvel descrito nos autos, configura (ou não) causa legal para a extinção do direito real de usufruto que lhe foi outorgado, em razão da alegada inadimplência contumaz de suas obrigações financeiras relativas ao bem e do seu subsequente abandono. Sustenta a promovida que sempre utilizou o imóvel e que o abandonou, em junho de 2023, em razão do seu desemprego e do fim do pagamento da pensão alimentícia, que era realizada pelo pai do autor. E, por consequência, não teve condições de arcar com as despesas oriundas do imóvel que usufruía. Sobre a matéria discutida nos autos, destaco que o usufruto é direito real limitado, o qual confere ao usufrutuário as faculdades de usar e fruir do bem, enquanto a substância e a disposição permanecem com o nu-proprietário (art. 1.394 do Código Civil). Trata-se de desmembramento temporário dos poderes inerentes ao domínio, que impõe ao beneficiário não apenas direitos, mas também deveres inafastáveis, essenciais à preservação da coisa e ao respeito ao direito do nu-proprietário. Nesse contexto fático-jurídico, esse direito é menos amplo que o direito de propriedade, que priva o titular de alguns poderes inerentes ao domínio; contudo, não perde a substância. Por oportuno, registro a lição de Maria Helena Diniz, em Curso de Direito Civil Brasileiro - Direito das Coisas, vol. 4, 2024, p. 475: "No usufruto têm-se dois sujeitos: o usufrutuário, que detém os poderes de usar e gozar da coisa, explorando-a economicamente, e o nu-proprietário, que faz jus à substância da coisa, tendo apenas a nua-propriedade, despojada de poderes elementares. Conserva, porém, o conteúdo do domínio, o jus disponendi, que lhe confere a disponibilidade do bem nas formas permitidas por lei, mantendo, portanto, a condição jurídica de senhor do referido bem. (...)" Por conseguinte, o Código Civil determina as condições para a existência desta relação jurídica e suas formas de extinção. O art. 1.403 do mencionado Código prevê que incumbe ao usufrutuário as prestações e os tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa usufruída. De outro giro, o art. 1.410 dispõe sobre as formas de extinção do usufruto, que visa coibir abusos pelo usufrutuário: Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis: I - pela renúncia ou morte do usufrutuário; II - pelo termo de sua duração; III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer; IV - pela cessação do motivo de que se origina; V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407, 1.408, 2ª parte, e 1.409; VI - pela consolidação; VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395; VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399). No caso, a parte autora fundamenta o seu pedido de extinção do usufruto no suposto abandono do imóvel por parte da requerida ao aduzir que esta deixou de quitar os débitos condominiais, que deu ensejo a processo judicial movido em seu desfavor para pagamento de taxas ordinárias do imóvel. Da análise do conjunto probatório dos autos, vejo que o imóvel registrado na matrícula nº 18.909, consistente no apartamento nº 200 do Edifício Green Star, situado à Rua da República do Líbano, nº 710, Fortaleza/CE, foi doado ao autor em virtude do divórcio dos seus genitores, tendo sido instituído usufruto vitalício do imóvel a promovida Caroline Araújo Braga, conforme escritura pública apresentada, em ID 121732902. Ademais disso, infere-se dos documentos apresentados nos autos, em ID 121731557, que as taxas condominiais do imóvel dado em usufruto encontram-se inadimplidas desde 10/04/2020, situação que chegou a motivar a propositura da ação de execução de nº 3000027-07.2021.8.06.0016, em trâmite na 21ª Unidade dos Juizados Especiais Cíveis, que pode, ainda, conduzir à alienação judicial do imóvel. Ressalto que a existência dos débitos condominiais é fato incontroverso nos autos, uma vez que a própria promovida confessa que não adimpliu a dívida, sob o argumento de estar em dificuldade financeira, conforme pág.3 do ID 130656678. O art. 1.043, II do Código Civil estabelece a obrigação do usufrutuário de pagar "as prestações e os tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa usufruída" e, como prestações, deve-se considerar o pagamento das despesas ordinárias do condomínio, consoante a jurisprudência pacífica do STJ (REsp nº 425.015/SP e REsp nº 202.261/SP). Com efeito, a natureza propter rem da dívida condominial significa que o próprio imóvel responde pelo débito, o que pode culminar em sua penhora e alienação judicial para satisfação do crédito condominial, de sorte a acarretar prejuízo direto e substancial ao autor. Em sendo assim, tenho que é razoável concluir-se pela evidente omissão quanto ao adimplemento das despesas relativas ao imóvel, sendo, portanto, clara a hipótese de deterioração e abandono do bem, de modo que não pode o autor ficar à mercê de ações que maculam o seu nome e que podem levar o bem à leilão judicial. A propósito, destaco jurisprudência pátria sobre o assunto (destacou-se): APELAÇÃO. Ação de extinção de usufruto c.c. obrigação de fazer . Sentença de parcial procedência. Insurgência do usufrutuário. Inadimplência de débitos tributários que autoriza a extinção do usufruto com fundamento no art. 1 .410, VII, do C.C., uma vez que pode ensejar a expropriação do bem, o que, do ponto de vista substancial, não se distancia de sua deterioração ou de sua ruína. Regularização das pendências fiscais após a prolação da sentença que não tem o condão de reformá-la, inclusive porque dentre as obrigações que foram impostas no decisum encontra-se justamente a de pagamento de tais débitos. Recurso a que se nega provimento. (TJ-SP - Apelação Cível: 1008084-63.2021.8 .26.0510 Rio Claro, Relator.: Maurício Campos da Silva Velho, Data de Julgamento: 03/05/2023, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/05/2023) (destaquei). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE USUFRUTO. DÉBITOS DE TAXAS CONDOMINIAIS. APLICAÇÃO DO ARTIGO 1410, VII, DO CPC. AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE COBRANÇA DAS TAXAS CONDOMINIAIS EM FASE DE EXECUÇÃO. EXTINÇÃO DO USUFRUTO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. Sendo as despesas condominiais responsabilidade do usufrutuário, o inadimplemento implica em descumprimento ao disposto do artigo 1403 CC e configura a hipótese prevista no artigo 1410, VII CC, de modo que se justifica a extinção do usufruto. (TJ-PR 0010501-33.2016 .8.16.0001 Curitiba, Relator.: Marcelo Gobbo Dalla Dea, Data de Julgamento: 13/02/2019, 18ª Câmara Cível, Data de Publicação: 14/02/2019) (destaquei). Ademais disso, vejo que a justificativa apresentada pela promovida (dificuldades financeiras decorrentes de desemprego e do suposto fim do pagamento de pensão alimentícia pelo ex-cônjuge, pai do autor) é juridicamente irrelevante para afastar a sua responsabilidade perante o nu-proprietário e a obrigação de zelar pelo bem. A omissão da usufrutuária, em adimplir, por longo período, débitos de tamanha monta configura, sem dúvida, a culpa exigida pelo inciso VII do artigo 1.410. A "deterioração" ou "ruína" mencionada no dispositivo não se limita ao aspecto físico do bem. Ela abrange também a deterioração econômica e jurídica, que ocorre quando o acúmulo de dívidas propter rem ameaça a própria subsistência da propriedade, sujeitando o imóvel à penhora e à expropriação judicial para satisfação dos credores. O risco concreto de perda do bem, evidenciado pela existência da ação de execução movida pelo condomínio, equivale à ruína do direito do nu-proprietário, de modo a frustrar a finalidade protetiva da norma. Portanto, a inércia da usufrutuária em prover a conservação econômica do bem, ao não quitar as despesas que lhe incumbiam, caracteriza grave violação de seus deveres. Em complemento, vejo que a prova dos autos e a própria confissão da promovida, em contestação, demonstram que deixou de residir no imóvel desde junho de 2023, o que caracteriza o não uso previsto no inciso VIII do artigo 1.410. É cediço que o usufruto é concedido para que o usufrutuário utilize a coisa ou dela perceba os frutos. O abandono físico do imóvel, aliado à completa omissão quanto às suas obrigações financeiras, esvazia o conteúdo econômico e social do instituto. A mera intenção de locar o imóvel, manifestada tardiamente e sequer concretizada (além de obstada judicialmente), não tem o poder de afastar a constatação do não uso prolongado e injustificado. É pacífico o entendimento doutrinário civilista de que o direito real de usufruto não se coaduna com o abandono e a negligência. Por fim, a alegação de que a promovida teria contribuído com R$ 30.000,00 para a aquisição do imóvel no passado é igualmente irrelevante para a presente lide. A relação jurídica estabelecida é de usufruto, instituído por ato de vontade (doação com reserva ou instituição posterior), e são as regras deste instituto que devem ser observadas. Eventuais direitos decorrentes dessa suposta contribuição deveriam ter sido discutidos em momento processual oportuno, na esfera do direito de família ou obrigacional, de modo que não interferem nas obrigações atuais da usufrutuária. Em sendo assim, restam robustamente comprovadas e juridicamente configuradas duas causas autônomas para a extinção do usufruto: a culpa da usufrutuária, que deixou o imóvel arruinar-se economicamente pela inadimplência de suas obrigações (art. 1.410, VII, CC), e o não uso ou fruição da coisa (art. 1.410, VIII, CC). A procedência do pedido da parte promovente é medida de rigor, pois visa a restabelecer a plenitude do direito de propriedade do autor e, por conseguinte, a salvaguardar o bem imóvel do risco iminente de perda decorrente da conduta negligente da requerida. III - DISPOSITIVO Ante todo o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido da parte promovente para: I) ratificar a tutela provisória de urgência, deferida em ID 124806904; e II) declarar extinto o usufruto da promovida existente sobre o imóvel registrado na matrícula de nº 18.909, consistente no apartamento nº 200, do Edifício Green Star, situado na Rua da República do Líbano, nº 710, Fortaleza/CE, de modo que extingo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I do CPC. Condeno a promovida ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, os quais, todavia, ficam com a sua exigibilidade suspensa em razão da gratuidade judiciária deferida, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, expeça-se competente instrumento ao Cartório de Registro de Imóveis para cancelamento do usufruto de Caroline Araújo Braga sobre o imóvel citado. Posteriormente, arquivem-se os autos com as devidas cautelas legais. Expedientes necessários. Fortaleza/CE, data da assinatura eletrônica. LUCIANO NUNES MAIA FREIREJuiz de Direito
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