Processo nº 0259815-64.2021.8.06.0001
ID: 281927168
Tribunal: TJCE
Órgão: 26ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0259815-64.2021.8.06.0001
Data de Disponibilização:
28/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FILIPE DA SILVA SANTOS
OAB/CE XXXXXX
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DIEGO RODRIGUES BEZERRA PEDROSA
OAB/CE XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ COMARCA DE FORTALEZA 26ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza Rua Desembargador Floriano Benevides Magalhães, 220, Edson Queiroz, Fortaleza/CE - CEP: 60811-…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ COMARCA DE FORTALEZA 26ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza Rua Desembargador Floriano Benevides Magalhães, 220, Edson Queiroz, Fortaleza/CE - CEP: 60811-690, Fone: (85) 3108-0791, E-mail: for.26civel@tjce.jus.br SENTENÇA Processo n.º: 0259815-64.2021.8.06.0001 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Contratos Bancários] AUTOR: ULTRA SOM SERVICOS MEDICOS LTDA REU: SUZIANE DE SOUSA LIMA Vistos. Trata-se de Ação de Cobrança aforada por Ultra Som Serviços Médicos LTDA em desfavor de Suziane de Sousa Lima, nos termos da inicial (ID 119579638) e documentos que a acompanham. Inicialmente, a parte autora informa que a sociedade empresária Hospital Eugênia Pinheiro foi incorporada, destacando que todos os direitos e obrigações da empresa incorporada foram automaticamente transferidos à sociedade incorporadora requerente. Relata que é prestadora de serviços médicos, paramédicos, odontológicos e hospitalares, incluindo pronto-socorro, laboratório clínico, exames especializados e serviços de diagnóstico, tendo prestado atendimento à parte requerida, com consequente emissão de termo de responsabilidade financeira. Alega que a requerida figura como dependente de seu esposo, o qual firmou, em 17/06/2020, proposta de adesão ao plano de saúde denominado "Mix IX", registrado sob o nº 458980087, na modalidade "Coletivo Empresarial", com segmentação "Ambulatorial + Hospitalar com Obstetrícia" e padrão de acomodação em enfermaria, junto à operadora Hapvida Assistência Médica LTDA. Assevera que foram realizados dois atendimentos com internação no período de 17/09/2020 a 21/09/2020: um em favor da requerida e outro em benefício de seu filho recém-nascido. Informa que, embora o contrato firmado preveja carência de 180 dias para internações, conforme disposto no Manual de Orientação e na Declaração de Ciência das Condições Gerais do Contrato de Prestação de Serviços Médicos e/ou Odontológicos, os serviços foram utilizados antes do término do referido prazo de carência. Destaca que, ciente das cláusulas contratuais, a requerida tornou-se responsável pelo pagamento das despesas decorrentes dos atendimentos, vencidas em 22/09/2020, as quais totalizam o valor de R$ 20.675,90 (vinte mil, seiscentos e setenta e cinco reais e noventa centavos). Ressalta que, após o atendimento inicial e verificação do quadro clínico, o titular do plano foi informado sobre a negativa de cobertura por parte da operadora, bem como das alternativas disponíveis, incluindo a possibilidade de transferência para o Sistema Único de Saúde (SUS). Esclarece que, diante da ausência de cobertura em razão da carência contratual, as despesas posteriores ao período de urgência e emergência deveriam ser arcadas pelo titular do plano, caso optasse pela continuidade do atendimento fora do SUS. Afirma que, mesmo ciente das condições contratuais e da ausência de cobertura, o titular optou pela permanência no hospital, assumindo responsabilidade civil pelo custeio dos serviços. Por fim, sustenta que a requerida não efetuou o pagamento das despesas até a presente data, encontrando-se inadimplente. Diante disso, requer a condenação da parte requerida ao pagamento do montante atualizado de R$ 29.021,76 (vinte e nove mil, vinte e um reais e setenta e seis centavos). Decisão de ID 119574385, determina a citação do requerido, bem como remete os autos ao CEJUSC - Centro Judiciário de Solução de Conflitos a fim de que seja realizada audiência de conciliação. Em sua contestação com reconvenção (ID 119574413), a parte requerida, em preliminar, requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita, por não possuir condições de arcar com as custas processuais sem prejuízo de seu sustento. No mérito, narra que, no final da tarde do dia 17 de setembro de 2020, passou a sentir fortes dores e, acompanhada de uma vizinha, dirigiu-se ao Hospital Ana Lima, no município de Maracanaú, para atendimento em caráter de urgência e emergência. Relata que, ao chegar àquela unidade hospitalar, foi informada de que, em razão da complexidade do seu quadro clínico, deveria ser encaminhada ao Hospital Eugênia Pinheiro, em Fortaleza, por este dispor de maior estrutura para o atendimento necessário, afirmando que, em nenhum momento, foi esclarecida sobre a gravidade de sua situação, tendo apenas recebido a orientação de que precisava ser transferida para outra unidade de saúde. Relata que, solicitou um transporte por meio de aplicativo para se deslocar até o Hospital Eugênia Pinheiro, e que ao dar entrada no referido hospital, em estado de desespero e com intensas dores, passou pela triagem e foi imediatamente encaminhada para a sala de cirurgia. Aduz que, apenas nesse momento, foi informada de que estava enfrentando complicações gestacionais e que seria necessário realizar um parto cesariano de emergência, destacando que antes de ser levada à sala de cirurgia, comunicou à equipe médica que seu plano de saúde se encontrava em período de carência, razão pela qual não haveria cobertura para o parto. Solicitou, então, ser transferida para o Hospital da Mulher, onde já havia programado o parto, explicando que, além de não possuir recursos financeiros para arcar com o procedimento, tinha ciência da ausência de cobertura contratual por conta da carência. Afirma, contudo, que sua solicitação não foi considerada pela equipe médica, que deu prosseguimento ao atendimento, justificando que tanto ela quanto sua filha corriam risco de vida, sustentando que, a partir desse ponto, não se recorda de mais nada, tendo despertado da anestesia já operada, momento em que foi instruída a assinar diversos documentos que lhe foram apresentados em uma prancheta. Assegura que não esperava o nascimento da filha naquela ocasião, uma vez que se encontrava com apenas seis meses de gestação, fora do período previsto para o parto, ressaltando que dois dias antes dos fatos, havia realizado exame de ultrassom, sem qualquer indicação de anormalidade em sua gestação ou no feto. Relata, que sua filha nasceu prematura, com apenas 29 semanas de gestação, vindo a óbito quatro dias depois, em 21/09/2020, em decorrência da prematuridade, apontando, ainda, que após o falecimento da filha, foi impedida, por diversas vezes, de vê-la. Acrescenta que o hospital chegou a obstruir a saída da autora e de seu marido da unidade para participarem do funeral e sepultamento da criança, condicionando a liberação à quitação prévia das despesas hospitalares. Diante disso, em sede de reconvenção, requer a declaração de nulidade da suposta dívida cobrada pela parte autora/reconvinda, bem como a condenação desta ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Ao final, requer a total improcedência dos pedidos formulados na demanda principal. Ato ordinatório de ID 119574417, abre prazo para que a parte autora apresente réplica à contestação. Em sua réplica (ID 119574419), a parte autora, inicialmente, impugna o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita formulado pela parte requerida. Alega que, no momento da chegada da requerida à unidade hospitalar, não foi colhida assinatura em nenhum documento relativo a procedimentos de risco. Destaca, conforme demonstrado nos documentos acostados aos autos, que a cirurgia foi realizada no dia 17/09/2020, e apenas no dia 18/09/2020 foi prestado o atendimento médico-hospitalar completo, ocasião em que a paciente assinou o termo de responsabilidade e confissão de dívida. Informa que a requerida aderiu ao plano de saúde em 17/06/2020 e, apenas três meses depois, em 17/09/2020, utilizou os serviços médicos relacionados ao parto, sem ter cumprido o prazo de carência mínima de 300 (trezentos) dias previsto contratualmente para esse tipo de procedimento. Sustenta que a requerida não apresentou qualquer prova documental de que tenha solicitado a sua transferência para hospital da rede pública, declarando, em sua narrativa, que tinha ciência da ausência de cobertura do plano. Argumenta que, ainda que o atendimento médico se caracterize como situação de urgência/emergência, a cobertura pelo plano de saúde está restrita às 12 (doze) primeiras horas, conforme previsto no artigo 35-C, inciso I, da Lei nº 9.656/98, sendo que, ultrapassado esse prazo, as despesas passam a ser de responsabilidade do beneficiário. Assevera que não houve, por parte da autora, qualquer conduta ilícita que justifique a pretensão de indenização por danos morais, inexistindo, portanto, dever de reparação. Ao final, reitera integralmente os pedidos formulados na petição inicial. Decisão de ID 119574421, determina a intimação das partes para, em até 15 dias, manifestarem interesse na produção de novas provas, cientes de que, na ausência de requerimento, os autos voltariam conclusos para a sentença. Em petição de ID 119577926, o autor/reconvindo requer a juntada aos autos dos prontuários médicos que comprovam o histórico de procedimentos realizados pela autora, bem como pleiteia a decretação do segredo de justiça, em razão da presença de dados sensíveis na documentação apresentada. Por meio da petição de ID 119577938, o requerido/reconvinte requer a decretação da revelia do reconvindo, sob o argumento de que a contestação à reconvenção foi apresentada intempestivamente. Requer, ainda, a designação de audiência de instrução e a condenação da parte adversa ao pagamento de indenização por danos morais, em razão de alegada violação à sua privacidade decorrente da juntada dos documentos em sua última petição. Decisão de ID 119577949, indefere a impugnação ao pedido de gratuidade da justiça formulada pelo autor, ao tempo em que concede o referido benefício à parte requerida, decreta a revelia do reconvindo e determina a designação de audiência de instrução para produção de prova testemunhal. Termo de audiência, constante do ID 119577966, registra a oitiva da testemunha Sheila Maria Nascimento Lima e do informante Mário Rocha Neto. Memoriais apresentados pelas partes conforme documentos de ID 119577970 e 119577971. Relatados, DECIDO. Ressalte-se, desde já, que a presente lide deve ser analisada em conformidade com o Código de Defesa do Consumidor, haja vista que a relação jurídica estabelecida entre as partes na lide em questão é de consumo, porquanto se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor previstos nos arts. 2º e 3º do CDC. DO MÉRITO - Cinge-se a controvérsia em apurar acerca da validade da cobrança dos serviços médico-hospitalares prestados à requerida durante o período de carência contratual do plano de saúde, bem como da existência de eventual responsabilidade civil do autor por suposta violação de direitos da paciente no curso do atendimento. Verificam-se, ainda, outros pontos controvertidos nos autos, tais como a existência do Termo de Confissão de Dívida, sua validade, a eventual ilicitude da obrigação dele decorrente e a possibilidade de responsabilização da operadora do plano de saúde pelas despesas médicas cobradas pela empresa autora. É certo que os autos trazem prova inequívoca da situação de emergência médica, evidenciada pela documentação que demonstra a realização de parto cesáreo em gestação de 29 (vinte e nove) semanas, com diagnóstico de pré-eclâmpsia grave (ID 119574411, fl. 8). A natureza emergencial do procedimento também está demonstrada no Formulário Perioperatório (ID 119577931, fl. 3), juntado pela própria autora, o qual descreve a cirurgia como emergencial. A Ficha de Anestesia (ID 119577932, fl. 3) confirma que o procedimento de anestesia foi realizado sob raquianestesia, iniciado às 22h50 e finalizado às 23h35 do dia 17/09/2020. O Termo de Assunção de Responsabilidade Financeira e Confissão de Dívida (ID 119579642) foi assinado no dia 18/09/2020, após a cirurgia, mas antes da conclusão do período de internação da requerida e de seu recém-nascido, cuja alta médica ocorreu apenas em 21/09/2020 (ID 119579646). Em contestação, a parte requerida sustenta que assinou o referido termo em momento inoportuno, no período pós-operatório, sob a crença de que se tratava de documentos relacionados aos riscos do procedimento cirúrgico, não à assunção de dívida. Diante do conjunto probatório, é possível constatar que a assinatura do Termo ocorreu sob evidente pressão psicológica, diante da urgência da internação do recém-nascido em razão de sua condição de extrema prematuridade. Restando configurado vício na formação do negócio jurídico, impõe-se o reconhecimento da desvantagem excessiva imposta à requerida, cuja manifestação de vontade mostrou-se viciada pelas circunstâncias extremas em que se encontrava no momento da assinatura. É inequívoca, portanto, a irregularidade da exigência de assinatura do Termo de Confissão de Dívida em contexto de urgência/emergência e em período de evidente fragilidade física e emocional da paciente, justificando-se o reconhecimento da inexigibilidade do documento. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. NEGATIVA DE INTERNAÇÃO MOTIVADA NA FALTA DE CUMPRIMENTO DE PRAZO DE CARÊNCIA. LIMITAÇÃO. ABUSIVIDADE. SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA CONFIGURADA. LIMITAÇÃO DE ATENDIMENTO A 12 HORAS. IMPOSSIBILIDADE, EM SE TRATANDO DE PLANO DE SAÚDE NA SEGMENTAÇÃO HOSPITALAR. TERMO DE ASSUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE FINANCEIRA E CONFISSÃO DE DÍVIDA. DOCUMENTO ASSINADO POR FILHA EM SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA MÉDICA VIVENCIADA PELA GENITORA, IDOSA COM 76 ANOS DE IDADE. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS EM HOSPITAL INTEGRANTE DO MESMO GRUPO ECONÔMICO DE PLANO DE SAÚDE. ONEROSIDADE EXCESSIVA. ESTADO DE PERIGO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cinge-se a controvérsia recursal em verificar o acerto da decisão do douto juízo de primeiro grau, que julgou improcedente a ação monitória por considerar a negativa de cobertura abusiva e indevida, pois a parte Autora, ora Apelante, aproveitou-se da situação de desespero da filha da paciente, ora Apelada, induzindo-a a assinar um termo de responsabilidade financeira e confissão de dívida. 2. Os contratos de plano de saúde têm como principal objeto a disponibilização dos meios necessários, compreendidos como hospitais, profissionais e materiais, para manutenção e restabelecimento da saúde do segurado em caso de eventual necessidade. 3. No caso específico, verifica-se que a genitora da Apelada, Sra. Olímpia Carolino Dantas, idosa com 76 (setenta e seis) anos de idade, foi atendida no Hospital Antônio Prudente no dia 22/10/2019, e, na ocasião, necessitou de internação em virtude de volumosa formação expansiva mediastinal, derrame pleural volumoso e derrame pericárdico volumoso com indicação de abordagem cirúrgica, conforme relatório médico acostado à fl. 204, sendo solicitado a internação, a qual foi negada pela operadora de plano de saúde HAPVIDA por motivo de não cumprimento de período de carência. Na ocasião, verifica-se que a filha da Sr . Olímpia Carolino Dantas, ora Apelada, assinou Termo de Assunção de Responsabilidade Financeira e Confissão de Dívida, tendo em vista a necessidade de continuidade da internação hospitalar da sua genitora (fls. 100/101), vindo a idosa a falecer no referido hospital, no dia 11/01/2020. 4. Assim, como o caso envolvia situação de urgência/emergência de uma idosa de 76 (setenta e seis) anos de idade, e também porque ficou evidenciado a necessidade de internação para abordagem cirúrgica, que, por si, trazia risco à saúde da idosa, não podia haver óbice ao deferimento da conduta pelo fato da mesma não ter cumprido o período de carência contratual. 5. Ademais, verifica que a Sra. Olímpia era usuária do plano de saúde Free Life, e que a partir de janeiro de 2019 todos os usuários do referido plano migraram automaticamente para o plano HAPVIDA, com aproveitamento de todas as condições firmadas anteriormente, inclusive períodos de carência, conforme se observa no item 3 do documento acostado às fls. 207/208. Em nenhuma hipótese poderia ter sigo negada a internação da genitora da Apelada, ainda mais que, havendo potencialidade de dano irreversível, qual seja, a piora do estado de saúde da paciente, impõe-se o necessário sopesamento de valores, privilegiando-se, por óbvio, os valores da vida e da saúde. 6. Por fim, quanto ao Termo de Assunção de Responsabilidade Financeira e Confissão de Dívida, a bem da verdade, trata-se de um contrato com cláusulas contratuais padronizadas e impositivas, que submete o pretendente à sua aceitação, sob pena de não ver concretizado o tratamento, inclusive cabendo salientar que tal termo é assinado no momento de maior vulnerabilidade do parente/familiar. Com efeito, dispõe o artigo 156 do Código Civil, que "Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido pela necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa." É notório que a exigência da assinatura do termo pela Apelada ocorreu em um contexto de necessidade urgente de tratamento médico, onde se caracterizou um estado de perigo. A filha da paciente, ora Apelada, se viu obrigada a assinar o termo de responsabilidade financeira e confessar a dívida como condição para o tratamento hospitalar de emergência, impulsionada pela necessidade de proteger a vida e/ou a saúde de sua genitora. 7. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer do recurso mas para negar-lhe provimento, nos termos do voto do relator. Fortaleza, data e assinatura digital constantes no sistema processual eletrônico. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Relator (TJ-CE - Apelação Cível: 0200099-43 .2020.8.06.0001 Fortaleza, Relator.: JOSE RICARDO VIDAL PATROCÍNIO, Data de Julgamento: 13/03/2024, 1ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 13/03/2024) (G.N) SAÚDE. APELO. AÇÃO DE COBRANÇA POR PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS HOSPITALARES. IMPROCEDÊNCIA. RÉU-RECORRIDO QUE DETÉM PLANO DE SAÚDE NO SEGUIMENTO COLETIVO POR ADESÃO, COM COBERTURA HOSPITALAR. MESMO ASSIM A ORA RECORRENTE BUSCA A COBRANÇA PELOS SERVIÇOS HOSPITALARES DURANTE A INTERNAÇÃO DO FILHO DO AQUI RECORRIDO (BENEFICIÁRIO), QUE SEGUNDO A RÉ-APELANTE NÃO ESTARIAM COBERTOS POR QUESTÃO DE CARÊNCIA CONTRATUAL. PACIENTE EM NOTÓRIA SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA (REALIZANDO UMA CIRURGIA CARDÍACA COM INTERNAÇÃO EM UTI INFANTIL E VINDO, AO FINAL, A FALECER). DEVER DE COBERTURA, ANTE A CARÊNCIA REDUZIDA PARA O PRAZO DE 24HRS (LAPSO DE TEMPO CUMPRIDO PELO RECORRIDO). A COBRANÇA DEVERIA SER DIRIGIDA À OPERADORA DE SAÚDE PELOS SERVIÇOS PRESTADOS EM FAVOR DO FILHO DO RECORRIDO. AUSÊNCIA DO DEVER DO APELADO DE ARCAR COM OS CUSTOS HOSPITALARES, JÁ QUE O SEU CONTRATO SE DÁ SIM NO TIPO HOSPITALAR. CONFISSÃO DE DÍVIDA INVALIDADA, PORQUANTO ASSINADA EM EMERGÊNCIA MÉDICA E NÍTIDO ESTADO DE PERIGO. COBRANÇA DA INTERNAÇÃO INDEVIDA. PRECEDENTES DESTE COLENDO COLEGIADO EM CASO SIMILAR. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em unanimidade de votos, por conhecer e desprover o recurso. Fortaleza, 02 de outubro de 2024 RELATOR (TJ-CE - Apelação Cível: 02527412220228060001 Fortaleza, Relator.: EMANUEL LEITE ALBUQUERQUE, Data de Julgamento: 02/10/2024, 1ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 04/10/2024) (G.N) DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE COBRANÇA DE DESPESAS MÉDICAS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. TESES. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO HOSPITALAR. AÇÃO RESPALDADA EM TERMO DE ASSUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE FINANCEIRA E CONFISSÃO DE DÍVIDA. APELADO QUE NÃO ESTAVA COBERTO PELO PLANO. INOBSERVÂNCIA AO PERÍODO DE CARÊNCIA. ARGUMENTOS REJEITADOS. RECUSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A discussão em espeque deve ser apreciada sob os auspícios do Código de Defesa do Consumidor, na medida em que se trata de evidente relação de consumo, consoante dispõe o artigo 3º, § 2º do CDC. 2. Não poderia o Apelante condicionar a continuidade da prestação do serviço à assinatura de um contrato, uma vez claramente configurada a situação de estado de perigo Apelado, tal como dispõe o art. 156 do Código Civil. 3. O Apelado estava resguardado pelo art. 12, V, c, da Lei de n.º 9 .656/98, pois ainda que seja cabível a fixação de período de carência nos contratos de plano de saúde, nos casos de urgência e emergência, tal prazo será de no máximo vinte e quatro horas. 4. Destaque-se que as despesas decorrente do internamento poderão cobradas pelo Apelante ao Plano de Saúde HAPVIDA. 5. Recurso parcialmente conhecido e não provido. Decisão unânime. (TJ-AL - Apelação Cível: 0734148-30.2021 .8.02.0001 Maceió, Relator.: Des. Carlos Cavalcanti de Albuquerque Filho, Data de Julgamento: 15/05/2024, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/05/2024) (G.N) Cumpre destacar que a requerida era beneficiária de plano de saúde vinculado à operadora que integra a mesma sociedade empresarial da autora, tendo sido internada em hospital igualmente pertencente ao referido grupo empresarial, em razão de quadro clínico caracterizado como de urgência e emergência. É incontroverso que aos contratos de plano ou seguro de saúde aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, nos termos da jurisprudência consolidada, especialmente em razão da natureza contratual de adesão e da hipossuficiência técnica e econômica do consumidor frente à operadora. Assim, não se pode admitir a negativa de cobertura dos serviços prestados em situação de urgência e emergência, sob pena de se frustrar o objeto central do contrato - o acesso à assistência à saúde - em prejuízo do consumidor e em benefício desproporcional à fornecedora. Dessa forma, cabe à autora suportar as despesas médicas decorrentes dos procedimentos realizados em favor da requerida e de seu recém-nascido, uma vez que, nas hipóteses de urgência e emergência, o prazo de carência é limitado, por força do art. 12, inciso V, da Lei nº 9.656/98, a no máximo 24 (vinte e quatro) horas: Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas: V - quando fixar períodos de carência: a) prazo máximo de trezentos dias para partos a termo; b) prazo máximo de cento e oitenta dias para os demais casos; c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência; No mesmo sentido dispõe o art. 35-C, incisos I e II, da mesma Lei: Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional; Nesse sentido: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. LEI DOS PLANOS DE SAÚDE. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIÇOS HOSPITALARES INADIMPLIDOS. AUSÊNCIA DE COBERTURA PELA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE. COBRANÇA DIRECIONADA À BENEFICIÁRIA DO SERVIÇO. ATENDIMENTO DE URGÊNCIA/EMERGÊNCIA DECORRENTE DE COMPLICAÇÃO NO PROCESSO GESTACIONAL. PLANO COM SEGMENTAÇÃO AMBULATORIAL E HOSPITALAR, SEM OBSTETRÍCIA. DEVER DE COBERTURA PELA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE O PLANO E O NOSOCÔMIO. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO CONSUMIDOR. PRETENSÃO IMPROCEDENTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. O cerne da controvérsia recursal consiste em analisar se a apelante, autora na origem, deve ter reconhecido o direito de cobrar pelos serviços hospitalares prestados à primeira apelada, Tainara Braga de Oliveira, e a seu filho, por ocasião de complicações na gravidez. É certo que a primeira requerida/apelada era beneficiária de plano de saúde ofertado pela Hapvida na modalidade ambulatorial + hospitalar sem obstetrícia, e que, quando estava ainda com 23 (vinte e três) semanas de gestação, veio a precisar de atendimento de urgência/emergência, razão pela qual procurou o hospital promovente. Ao ser atendida, foi informada de que seu estado de saúde era grave e que precisaria realizar um parto de emergência. Assim, ficou internada entre os dias 03/10/2019 a 04/10/2019, enquanto seu filho recém-nascido recebeu cuidados apenas no dia 03/10/2019, vindo a óbito com um dia de nascido. A Lei dos Planos de Saúde prevê cobertura obrigatória do plano de saúde para casos de urgência, como os decorrentes de complicação durante a gravidez (art. 35-C, II). Por sua vez, a Resolução CONSU nº 13/1998 dispõe que ¿Os contratos de plano hospitalar, com ou sem cobertura obstétrica, deverão garantir os atendimentos de urgência e emergência quando se referirem ao processo gestacional.¿ Na espécie, é inegável que a autora era beneficiária de plano com segmentação hospitalar, e, por isso, deveria ter garantido o atendimento em situação de urgência ou emergência relacionada a complicações do processo de gestação, ainda que não tivesse cobertura de obstetrícia. De acordo com a linha jurisprudencial do c. Superior Tribunal de Justiça, é solidária a responsabilidade da instituição hospitalar pelo custeio dos procedimentos hospitalares realizados em atendimentos de emergência gestacional. Além disso, como o plano da beneficiária era de segmentação hospitalar, revela-se abusiva a cláusula contratual que limita no tempo a internação hospitalar do segurado, conforme a súmula 302 do STJ. Considerando o dever de cobertura da internação pela operadora do plano de saúde, que fora descumprido, e a responsabilidade solidária entre o nosocômio e a operadora, à luz do art. 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, é de rigor a manutenção da improcedência do pleito autoral. Recurso conhecido e desprovido. DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Relator (TJ-CE - Apelação Cível: 0267037-83.2021.8.06 .0001 Fortaleza, Relator.: JOSE RICARDO VIDAL PATROCÍNIO, 1ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 24/01/2024) (G.N) RECURSOS DE APELAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA E DANOS MORAIS. RELAÇÃO CONSUMERISTA (SÚMULA 608, STJ). INTERNAÇÃO DE URGÊNCIA. COMPROVADA A NECESSIDADE. RELATIVIZAÇÃO DO PERÍODO DE CARÊNCIA CONTRATADO. PRECEDENTES. DANOS MORAIS VERIFICADOS. MAJORAÇÃO DO MONTANTE DA CONDENAÇÃO. RECURSO DO RÉU CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS MAJORADOS. 01. Cuida-se de Recursos de Apelação Cível que visam a reforma da sentença que entendeu pela procedência da Ação de Obrigação de Fazer, na qual alega o autor que é beneficiário do plano de saúde firmado com a requerida e que necessitou de internação urgente em razão de seu quadro delicado de saúde, mas que o plano de saúde não teria autorizado a internação do autor em vista do não exaurimento do prazo de carência. A sentença recorrida determina ao plano de saúde que povidencie a internação e tratamento do autor, além de fixar indenização por danos morais em R$3.000,00 (três mil reais). 02. Em suas razões de apelo, o réu refere-se a possibilidade de negativa de internação do autor em razão de não ter se exaurido o prazo de carência da contratação, além de referir-se à legalidade do procedimento seguido, bem como que o tratamento do autor não é de emergência e, por fim, refere a não demonstração de dano moral. Por seu turno, o autor apresenta em seu apelo a necessidade de reforma da sentença apenas para que seja condenado o réu no pagamento de multa por descumprimento da tutela de urgência, além de requerer a majoração da indenização por danos morais. APELAÇÃO DO HAPVIDA 03. Trata-se de relação regida pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), uma vez que verificada a figura do consumidor e do fornecedor de serviços, consoante descrição contida nos arts . 2º e 3º, do CDC. Ademais, cumpre referir tratar-se de contrato de adesão, formulado de modo unilateral pela prestadora de serviços, nos termos do art. 54, do CDC. Súmula 608, do STJ. 04. As cláusulas contratuais firmadas em contratos como o que agora se analisa deverão ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, além do que devem ser afastadas aquelas cláusulas que prevejam limitações desarrazoadas e desproporcionais aos direitos do consumidor, como a que agora se analisa que afasta a possibilidade de tratamento do autor apenas e tão somente em decorrência da necessidade de observância do prazo de carência. 05. No caso, indene de dúvidas que presente situação de emergência e urgência, uma vez que o autor procurou o nosocômio com muitas dores e um quadro de pneumonia e hepatoesplenomegalia, impondo-se o dever do réu em fornecer a cobertura do tratamento ora solicitado, como bem refere o art . 35-C, I, da Lei 9.656/98 ao prever a obrigatoriedade de cobertura de atendimento nos casos de emergência, como tais definidos os que implicarem risco imediato de vida ou lesões irreparáveis para a paciente, demonstrado de forma inconteste por declaração médica. 06. Ainda que presente no contrato firmado entre as partes a necessidade de observância de um prazo de carência, tal fato, por si só, não afasta a obrigatoriedade de o plano de saúde cuidar da saúde do autor em casos em que demonstrada a emergencialidade e urgência de tratamento. Eventual limitação a prestação desse serviço mostra-se abusiva e deve ser desconsiderada. Súmula nº 597. Precedentes. 07. A jurisprudência dessa Corte Alencarina é firme ao dispor que a recusa indevida negativa de prestação de serviços pelo plano de saúde em casos como o que aqui se analisa, dá ensejo à reparação dos danos morais causados ao consumidor/cliente, notadamente em razão de agravar a situação de aflição psicológica e de angústia do usuário. Precedentes. APELAÇÃO DO AUTOR 08. Apesar das dificuldades de cumprimento da tutela de urgência, alegadas pelo autor, as providências necessárias ao tratamento do autor foram cumpridas. O cumprimento das medidas necessárias ao tratamento do autor podem ter sido realizadas a destempo do que imaginou o autor e sua genitora, contudo, inexistem provas nos autos que deem conta de qualquer mora por parte do plano de saúde no cumprimento ao decidido na interlocutória suso referida, ônus este que caberia à parte autora (art. 373, I, do CPC), não cabendo, assim, a condenação do réu no pagamento de multa por descumprimento da tutela de urgência concedida. 09. No que diz respeito ao quantum debeatur da indenização por danos morais, tenho que o dano moral não pode representar fonte de lucro, posto que fundado na dor, no sentimento de perda de um ente familiar, como é caso em comento. Devendo, pois, a indenização ser suficiente para reparar o dano o mais completamente possível, e, qualquer quantia que lhe sobejar, importará enriquecimento sem causa. Em análise ao caso em discussão e aos precedentes desta Corte de Justiça em casos similares, mister que seja fixada a indenização por danos morais em R$5.000,00 (cinco mil reais). 10. Recursos de Apelação conhecidos, para desprover o apelo do HAPVIDA e dar parcial provimento ao apelo da parte autora, mas apenas para majorar o valor da indenização por danos morais para R$5.000,00 (cinco mil reais), mantendo os demais termos da sentença de piso. Na oportunidade, majoro os honorários sucumbenciais devidos pelo réu, fixando-os no montante correspondente a 15% (quinze por cento) do valor atualizado da condenação, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Desembargadores integrantes da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por votação unânime, em conhecer dos Apelos, para, no mérito, negar provimento ao recurso da HAPVIDA e dar parcial provimento ao recurso da parte autora, nos termos do voto da eminente relatora. Fortaleza, 03 de abril de 2024. VILMA FREIRE BELMINO TEIXEIRA Juiza Convocada (TJ-CE - Apelação Cível: 0202340-53.2021 .8.06.0001, Relator.: VILMA FREIRE BELMINO TEIXEIRA PORT. 470/2024, Data de Julgamento: 03/04/2024, 3ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 04/04/2024) (G.N) RECURSO INOMINADO DA RÉ - Recorrida gestante, que fora submetida a parto de gêmeos prematuros - Desnecessidade de prova pericial - Caso comprovado de emergência, que não se submete ao disposto no artigo 12, inciso V, alínea a, da Lei nº 9.656/98, que versa exclusivamente sobre partos a termo - Precedentes - Súmula nº 103, do TJSP - Tutela jurisdicional cumprida - RECURSO DESPROVIDO, nos termos do artigo 46, da Lei nº 9.099/95. (TJ-SP - Recurso Inominado Cível: 1018317-66.2023.8.26.0602 Sorocaba, Relator.: Marco Antonio Barbosa de Freitas - Colégio Recursal, Data de Julgamento: 06/02/2024, 6ª Turma Recursal Cível, Data de Publicação: 06/02/2024) (G.N) Portanto, resta inequívoco que a negativa de cobertura, ou sua posterior imputação de custos à consumidora, viola não apenas os princípios da boa-fé e da função social do contrato, mas também normas de ordem pública voltadas à proteção da saúde e do consumidor. DA RECONVENÇÃO - Com efeito, tem-se que o dano moral sofrido deve, portanto, ser reconhecido, já que os danos experimentados pela autora ultrapassam o mero dissabor ou aborrecimento, notadamente, atinge a integridade psíquica, a tranquilidade e a honra subjetiva do consumidor, os quais integram os direitos da personalidade. Conforme relatado nos autos e não infirmado de forma eficaz pela parte autora, após o falecimento da filha recém-nascida da requerida, ocorrido em 21/09/2020, a autora impôs obstáculos indevidos ao acesso da genitora ao corpo da criança, inclusive condicionando a liberação para o velório e sepultamento ao pagamento prévio das despesas hospitalares decorrentes do parto e da internação, situação que extrapola os limites de qualquer atuação contratual legítima. A alegação de que o hospital condicionou a liberação do corpo da recém-nascida ao pagamento de parte das despesas médicas restou corroborada pelos relatos colhidos em audiência, especialmente pelas declarações da testemunha Sheila Maria do Nascimento Lima. Ao ser indagada sobre o episódio, informou que os pais chegaram da unidade visivelmente abalados, chorando, e afirmaram, que a liberação do corpo da filha estava sendo condicionada ao pagamento de valores pendentes ao Hospital. Ao ser indagado sobre a tentativa de retenção do corpo da filha, o informante Mário Rocha Neto declarou que foi conduzido a uma sala reservada por uma funcionária do hospital, acompanhada de um homem que ele acreditou estar ali para intimidá-lo, e na ocasião, foi-lhe informado que havia um débito hospitalar próximo a R$ 30.000,00, e que só poderia levar o corpo da filha para sepultamento mediante o pagamento integral ou de pelo menos 50% do valor. Relatou que, em meio ao desespero, chegou a afirmar que, diante da impossibilidade financeira, o hospital ficasse com o corpo e o enterrasse, desde que depois informasse o local do sepultamento, e que somente após essa manifestação, e diante do seu evidente estado emocional, o hospital permitiu a retirada do corpo, avisando que a cobrança seria feita posteriormente. Trata-se de situação extrema, de profunda vulnerabilidade emocional, em que os genitores, já devastados pela perda de um recém-nascido prematuro, ainda se depararam com a exigência de pagamento como condição para a liberação do corpo da filha. A conduta adotada pela autora configura evidente abuso de direito, nos termos do art. 187 do Código Civil, uma vez que o exercício de um suposto direito ao recebimento de valores devidos não pode se dar por meio de coação emocional ou chantagem moral em momento de extrema fragilidade da usuária do serviço de saúde, o que se observa, na espécie, é a imposição de uma verdadeira barreira emocional e psicológica à vivência do luto, circunstância que agrava significativamente o sofrimento da mãe, sendo inegável a repercussão negativa dessa conduta em sua esfera íntima. A dignidade da pessoa humana, princípio basilar do ordenamento jurídico brasileiro (art. 1º, III, da Constituição Federal), deve ser resguardada em todos os momentos da vida, especialmente diante de situações de perda e luto, quando se impõe ainda maior cuidado e respeito ao sofrimento alheio. Não se pode admitir que o descumprimento de obrigação contratual, por mais legítimo que seja o crédito perseguido, justifique a prática de atos atentatórios à dignidade do consumidor. Nesse sentido, a proteção do consumidor encontra guarida no art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor, que assegura a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais. Assim, evidenciado o sofrimento exacerbado causado à requerida diante da perda de sua filha, agravado pela negativa de acesso ao corpo da criança e pela coação exercida para pagamento imediato das despesas médicas como condição para liberação, restam preenchidos os requisitos da responsabilidade civil: conduta, dano e nexo causal. Assim, ostentando a alegação autoral presunção de veracidade em face da revelia decretada, tem-se que os fatos narrados nos autos tiveram o condão de causar abalo moral à parte reconvinte, eis que se mostra evidente os danos causados pela conduta abusiva da reconvinda. Nesse cenário, merece acolhimento o pleito autoral, quanto à compensação por danos morais, nos termos do artigo 186, do Código Civil e do art. 5º, incisos V e X, da CF, uma vez que o dano extrapatrimonial é configurado quando há violação a direitos relativos à personalidade do indivíduo, gerando o dever de indenizar. Quanto ao valor da indenização, cabe ao juiz fixá-lo em observância aos primados da razoabilidade e proporcionalidade, sem descuidar dos propósitos punitivo, preventivo e compensador, daí porque à vista da capacidade econômica da parte, o arbitramento de compensação em R$ 100.000,00 (cem mil reais), guarda perfeita proporção com a gravidade e as consequências do ilícito praticado em face da parte autora. No que se refere à pretensão formulada pela requerida na petição de ID 119577938, consistente em novo pedido de indenização por danos morais em razão da juntada de documentos médicos pela parte autora, verifica-se que tal pedido não se confunde com o objeto da presente lide, tampouco encontra fundamento na via processual eleita. Trata-se de matéria que, por sua natureza, demanda a propositura de ação autônoma, diante disso, deixo de conhecer do pedido. Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil: a) Julgo IMPROCEDENTE os pedidos formulados na petição inicial; b) Julgo PROCEDENTE o pedido reconvencional, para condenar o autor/reconvindo ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a título de indenização por danos morais, quantia que deverá ser corrigida monetariamente pelo IPCA/IBGE, a partir desta decisão, incidindo juros de mora a partir da citação, conforme o teor do art. 405 do Código Civil, pela taxa SELIC, nos termos dos arts. 389 e 406 do Código Civil. Dessa forma, resta extinto o presente feito, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I do CPC. Em razão da sucumbência, condeno o autor/reconvindo ao pagamento integral das custas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa principal e em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação fixada na reconvenção, nos termos do art. 85, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil. Por fim, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Código de Processo Civil. Na hipótese de interposição de apelo, por não haver mais o juízo de prelibação nesta Instância (art. 1.010 do Código de Processo Civil), sem necessidade de nova conclusão, intime-se a parte recorrida para oferecer contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. E, em havendo recurso adesivo, também deverá ser intimado o adverso para resposta em 15 (quinze) dias. Após tais providências, remetam-se os autos ao Egrégio Juízo ad quem com as nossas homenagens. P.I.C. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. Ana Raquel Colares dos Santos Juíza de Direito
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