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"1036500-16.2021.8.26.0001" - Resultados da Busca

Processo nº 3000652-95.2024.8.06.0158

ID: 314586951

Tribunal: TJCE Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Russas Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 3000652-95.2024.8.06.0158

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

NELSON MONTEIRO DE CARVALHO NETO

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

NELSON MONTEIRO DE CARVALHO NETO

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

BRUNO COELHO SILVA DE CAMARGO

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

COMARCA DE RUSSAS GABINETE DO JUIZ DA 1ª VARA CÍVEL Processo Nº: 3000652-95.2024.8.06.0158 Classe Processual: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Assunto(s): [Indenização por Dano Moral, … COMARCA DE RUSSAS GABINETE DO JUIZ DA 1ª VARA CÍVEL Processo Nº: 3000652-95.2024.8.06.0158 Classe Processual: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Assunto(s): [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Cancelamento de vôo] AUTOR: GASTAO SILVES FERREIRA FREDERICO REU: GENERAL ATLANTIC REPRESENTACOES LTDA. e outros SENTENÇA Vistos. I - RELATÓRIO. Apesar de dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº 9.099/95, faço-o de maneira sucinta para melhor compreensão dos fatos. Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por GASTÃO SILVES FERREIRA FREDERICO contra KIWI.COM (representada no Brasil pela GENERAL ATLANTIC REPRESENTAÇÕES LTDA) e COMPANIA PANAMENA DE AVIACION S/A (COPA AIRLINES), todos qualificados nos autos. Em síntese, o autor aduz que foi convidado pela Universidade Federal de Pointe-à-Pitre, no Caribe, para participar do programa Professor Visitante em maio de 2024. Para isso, adquiriu passagens aéreas pela Kiwi.com, com bilhetes da Copa Airlines, saindo de São Paulo com conexões no Panamá e República Dominicana, além de reservar hospedagem no destino, totalizando investimento de aproximadamente R$ 10.000,00. Alega que, ao tentar embarcar em 03/05/2024, foi impedido por não portar o Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela emitido pela ANVISA, tendo apenas um comprovante vacinal de Cabo Verde, datado de 1983. Sustenta que tal exigência específica nunca lhe foi informada pelas rés e que foi tratado de forma discriminatória pelo funcionário da companhia aérea. Em razão disso, perdeu não apenas os valores gastos com passagens e hospedagem, mas também a bolsa-salário do programa, avaliada em 4.500,00 euros. Pleiteia indenização por danos materiais de R$ 34.562,43 e danos morais de R$ 10.000,00. A GENERAL ATLANTIC contestou (ID 105634822) alegando inépcia da inicial e ilegitimidade passiva, sustentando não ter relação jurídica com a KIWI.COM. No mérito, negou qualquer responsabilidade pelos danos alegados. A COPA AIRLINES, em sua contestação (ID 105614621), defendeu a aplicação da Convenção de Montreal, a impossibilidade de inversão do ônus da prova e, no mérito, alegou culpa exclusiva do consumidor, argumentando que disponibiliza informações sobre requisitos de entrada nos países em seu site. Em réplica (ID 107027055), o autor reiterou a legitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC e a omissão das rés quanto ao dever de informação. Intimadas para manifestarem interesse na produção de provas, todas as partes requereram o julgamento antecipado da lide (IDs 135079117, 135488332 e 136740254). É o relatório. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO. a) Das preliminares. a.1) Da inépcia da inicial (art. 337, IV, do CPC). A General Atlantic Representações LTDA. suscitou preliminarmente a inépcia da inicial, sob o argumento de que não haveria causa de pedir a seu respeito na petição inicial. Não procede a alegação. A petição inicial narra com clareza os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, com especificação do valor da causa e qualificação das partes, atendendo aos requisitos do art. 319 do CPC. O autor identifica a General Atlantic como representante da KIWI.COM no Brasil, permitindo-lhe compreender as razões que motivaram sua inclusão no polo passivo e exercer plenamente sua defesa. Ademais, eventual ausência de vínculo entre as empresas não caracteriza inépcia da inicial, mas pode configurar ilegitimidade passiva, questão que será analisada a seguir. Rejeito, portanto, a preliminar de inépcia da inicial. a.2) Da ilegitimidade passiva da General Atlantic Representações LTDA (art. 337, XI, do CPC). A General Atlantic alega ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, argumentando que não possui qualquer relação jurídica com a KIWI.COM, não sendo sua acionista, representante ou integrante do mesmo grupo econômico. Analisando os documentos acostados aos autos, verifico que o autor não comprovou o alegado vínculo entre as empresas demandadas. Embora tenha apresentado em réplica print de notícia do site da ré sobre uma "parceria estratégica" com a KIWI.COM, tal documento não é suficiente para comprovar que a parte seria representante legal da KIWI.COM no Brasil ou que ambas integrariam o mesmo grupo econômico. A informação constante no referido print indica apenas um investimento realizado pela GENERAL ATLANTIC SERVICE COMPANY LLC, empresa estrangeira distinta da ré brasileira, na plataforma KIWI.COM. Não há comprovação de relação societária, controle ou administração comum que configure grupo econômico e enseje solidariedade solidária nos termos do art. 265 do Código Civil. Conforme os atos constitutivos apresentados pela GENERAL ATLANTIC (ID 105634559), suas únicas acionistas são as empresas General Atlantic Service Compay LP e General Atlantic Latan Holdings LLC, não havendo menção à KIWI.COM em sua estrutura societária. Ademais, o mero investimento financeiro de uma empresa em outra não é suficiente para caracterizar grupo econômico ou representação legal para fins de responsabilidade solidária por eventuais danos. A autonomia da personalidade jurídica deve ser preservada, nos termos do art. 49-A do Código Civil, salvo quando expressamente prevista a solidariedade ou em casos de abuso da personalidade jurídica, o que não foi demonstrado nos autos. A jurisprudência pátria, inclusive, tem reconhecido a ilegitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC em casos semelhantes, conforme os precedentes citados pela própria demandada (processos nº 1031359-16.2021.8.26.0001 do TJSP, nº 627215-76.2021.8.04.0001 do TJAM, entre outros). Portanto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da General Atlantic Representações LTDA., determinando sua exclusão do polo passivo da demanda. b) Do mérito. b.1) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor e da Convenção de Montreal e da inversão do ônus da prova. O caso em análise envolve relação de consumo, caracterizada nos termos dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o autor adquiriu passagens aéreas como destinatário final do serviço de transporte aéreo. A COPA AIRLINES, por sua vez, alega a aplicação da Convenção de Montreal (Decreto nº 5.910/2006) em detrimento do CDC, com base no julgamento do Tema 210 de Repercussão Geral pelo STF. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 636.331/RJ, fixou a tese de que: Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. O presente entendimento não se aplica às hipóteses de danos extrapatrimoniais. Ocorre que a prevalência da Convenção de Montreal diz respeito especificamente às hipóteses de limitação de responsabilidade nela previstas, como danos à bagagem, atrasos e acidentes, não afastando a aplicação do CDC nas demais situações, como é o caso dos autos, que trata de falha no dever de informação ao consumidor. Portanto, aplica-se ao caso o Código consumerista, sem prejuízo da observância da Convenção de Montreal naquilo que for pertinente. Com relação ao ônus probatório, o art. 6º, VIII, do CDC prevê como direito básico do consumidor: "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências". No caso em tela, considero presentes ambos os requisitos para a inversão do ônus da prova. As alegações do autor são verossímeis, pois demonstrou ter sido impedido de embarcar por não possuir o Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA, apesar de portar comprovante de vacinação contra febre amarela. Ademais, é evidente a hipossuficiência técnica do consumidor em relação à companhia aérea, que possui melhores condições de comprovar o cumprimento de seu dever de informação. Cumpre ressaltar que a inversão do ônus da prova não dispensa o autor de comprovar minimamente os fatos constitutivos de seu direito, o que foi atendido no presente caso com a juntada dos documentos que comprovam a compra das passagens, o impedimento de embarque e os prejuízos sofridos. Logo, é de se manter a inversão, em favor do autor, já mencionada na Decisão de ID 89746788. b.2) Do dever de informação e da responsabilidade da companhia aérea. A questão central da lide consiste em verificar se houve falha no dever de informação por parte da companhia aérea quanto à necessidade de Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela emitido pela ANVISA para ingresso nos países de conexão. O art. 6º, III, do CDC estabelece: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; O art. 14 do mesmo diploma legal dispõe que "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos". Analisando os autos, verifico que a COPA AIRLINES alega disponibilizar em seu site informações sobre a necessidade de vacinação contra febre amarela, bem como ferramenta de consulta de requisitos imigratórios. Contudo, não comprovou ter informado de maneira clara, específica e ostensiva ao autor, no momento da compra ou posteriormente, sobre a necessidade específica do Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA, e não apenas de um comprovante comum de vacinação. É importante ressaltar que a Resolução nº 400/2016 da ANAC estabelece que: Art. 18. Para a execução do contrato de transporte, o passageiro deverá atender aos seguintes requisitos: (...) II - atender a todas as exigências relativas à execução do transporte, tais como a obtenção do visto correto de entrada, permanência, trânsito e certificados de vacinação exigidos pela legislação dos países de destino, escala e conexão; É de ressaltar, no entanto, que esse dever do passageiro não exime a companhia aérea de prestar informações claras e adequadas sobre tais exigências. A exigência do Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela por países como República Dominicana e Panamá é uma informação técnica e específica, que não se confunde com o mero conhecimento sobre a necessidade de vacinação. O autor demonstrou ter tomado a vacina e portava comprovante, mas desconhecia a necessidade de obter o documento específico emitido pela ANVISA. Considero, portanto, que houve falha no dever de informação por parte da companhia aérea, que não comprovou ter prestado ao autor informações claras e adequadas sobre a necessidade do Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA. b.3) Dos danos materiais. Quanto ao ponto, o autor pleiteia indenização por danos materiais no valor de R$ 34.562,43, referente a (i) passagens aéreas: R$ 7.219,78, (ii) reserva de acomodação em Pointe-à-Pitre: 517,00 euros (equivalente a R$ 2.817,65) e (iii) bolsa-salário do programa acadêmico: 4.500,00 euros (equivalente a R$ 24.525,00) Quanto às passagens aéreas e reserva de acomodação, trata-se de despesas comprovadamente realizadas pelo autor e perdidas em razão do impedimento de embarque, configurando danos emergentes, cuja reparação é devida. No tocante à bolsa-salário do programa acadêmico, embora o autor tenha juntado documentos que comprovam o convite para participar do programa Professor Visitante (conforme convenção de acolhimento apresentada), não restou suficientemente demonstrado nos autos informações detalhadas e regulamentação sobre a bolsa pleiteada, bem como os critérios para recebimento do valor apontado. Não está claro se o mero fato de apenas participar do evento garantiria ao autor o recebimento do valor integral de 4.500,00 euros, ou se haveria critérios adicionais ou condicionantes para sua concessão. A convenção de acolhimento juntada aos autos, embora confirme o convite para o programa, não especifica os termos e condições para o pagamento da bolsa-salário. Na troca de mensagens entre o autor e a responsável pelo projeto, há menção a um salário entre 4.000 e 4.500 euros, mas não há documentação oficial que comprove o direito líquido e certo ao recebimento desse valor, nem sua regulamentação institucional. Portanto, reconheço o direito à indenização pelos danos materiais referentes às passagens aéreas e à reserva de acomodação, totalizando R$ 10.037,43, mas julgo improcedente o pedido referente à bolsa-salário, por insuficiência de provas quanto aos critérios de concessão e recebimento do valor pleiteado. b.4) Dos danos morais. O autor alega ter sofrido danos morais em razão do impedimento de embarque, do tratamento desrespeitoso e discriminatório recebido no aeroporto, da impossibilidade de participar do programa acadêmico e do abalo à sua imagem profissional perante a instituição que o convidou. O dano moral configura-se pela ofensa aos direitos da personalidade, causando sofrimento, constrangimento ou abalo psicológico que extrapola o mero dissabor cotidiano. No caso em análise, considero que o impedimento de embarque por falha no dever de informação da companhia aérea, somado à frustração de não poder participar de um programa acadêmico internacional para o qual foi especialmente convidado, bem como ao tratamento discriminatório alegado pelo autor, configura dano moral indenizável. Quanto ao valor da indenização, considerando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a gravidade do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida, entendo adequado fixar a indenização por danos morais em R$ 4.000,00 (quatro mil reais). III - DISPOSITIVO. Ante o exposto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC REPRESENTAÇÕES LTDA, julgando extinto o processo sem resolução do mérito em relação a ela, nos termos do art. 485, VI, do CPC. Outrossim, julgo procedentes em parte os pedidos formulados na inicial, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a Compania Panamena de Aviacion S/A (COPA AIRLINES) ao pagamento de (i) indenização por danos materiais no valor de R$ 10.037,43 (dez mil, trinta e sete reais e quarenta e três centavos), referentes às passagens aéreas e reserva de acomodação, corrigidos monetariamente pelo INPC desde o desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação e (ii) de indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de juros de mora de 1%,desde a citação, e correção monetária pelo INPC a partir do presente arbitramento (Súmula n. 362 do STJ). Por fim, julgo improcedente, também nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, o pedido de indenização por danos materiais referente à bolsa-salário do programa acadêmico, por insuficiência de provas. A partir da vigência do art. 2º da Lei nº 14.905/24, em 29 de agosto de 2024, a correção monetária será pelo IPCA-E (art. 389, parágrafo único, do Código Civil) e os juros de mora serão pela taxa legal (art. 406, do Código Civil), que corresponderá à diferença entre a taxa SELIC e o IPCA, calculada mensalmente pelo Banco Central do Brasil, conforme Resolução CNM nº 5.171/2024, consignando-se que, caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência (art. 406, §3º, do Código Civil). O interessado deverá, preferencialmente, se valer da aplicação interativa fornecida pelo Bando Central do Brasil, de acesso público, cuja determinação de criação conta do art. 4º da lei já citada, para proceder os cálculos correspondentes à incidência destes índices. Custas e honorários advocatícios isentos, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Após o trânsito em julgado, proceda-se a baixa na distribuição e arquivem-se os autos. Russas, data da assinatura digital. PAULO HENRIQUE LIMA SOARES Juiz de Direito Titular

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Processo nº 3000652-95.2024.8.06.0158

ID: 314586999

Tribunal: TJCE Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Russas Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 3000652-95.2024.8.06.0158

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BRUNO COELHO SILVA DE CAMARGO

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

NELSON MONTEIRO DE CARVALHO NETO

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BRUNO COELHO SILVA DE CAMARGO

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COMARCA DE RUSSAS GABINETE DO JUIZ DA 1ª VARA CÍVEL Processo Nº: 3000652-95.2024.8.06.0158 Classe Processual: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Assunto(s): [Indenização por Dano Moral, … COMARCA DE RUSSAS GABINETE DO JUIZ DA 1ª VARA CÍVEL Processo Nº: 3000652-95.2024.8.06.0158 Classe Processual: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Assunto(s): [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Cancelamento de vôo] AUTOR: GASTAO SILVES FERREIRA FREDERICO REU: GENERAL ATLANTIC REPRESENTACOES LTDA. e outros SENTENÇA Vistos. I - RELATÓRIO. Apesar de dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº 9.099/95, faço-o de maneira sucinta para melhor compreensão dos fatos. Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por GASTÃO SILVES FERREIRA FREDERICO contra KIWI.COM (representada no Brasil pela GENERAL ATLANTIC REPRESENTAÇÕES LTDA) e COMPANIA PANAMENA DE AVIACION S/A (COPA AIRLINES), todos qualificados nos autos. Em síntese, o autor aduz que foi convidado pela Universidade Federal de Pointe-à-Pitre, no Caribe, para participar do programa Professor Visitante em maio de 2024. Para isso, adquiriu passagens aéreas pela Kiwi.com, com bilhetes da Copa Airlines, saindo de São Paulo com conexões no Panamá e República Dominicana, além de reservar hospedagem no destino, totalizando investimento de aproximadamente R$ 10.000,00. Alega que, ao tentar embarcar em 03/05/2024, foi impedido por não portar o Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela emitido pela ANVISA, tendo apenas um comprovante vacinal de Cabo Verde, datado de 1983. Sustenta que tal exigência específica nunca lhe foi informada pelas rés e que foi tratado de forma discriminatória pelo funcionário da companhia aérea. Em razão disso, perdeu não apenas os valores gastos com passagens e hospedagem, mas também a bolsa-salário do programa, avaliada em 4.500,00 euros. Pleiteia indenização por danos materiais de R$ 34.562,43 e danos morais de R$ 10.000,00. A GENERAL ATLANTIC contestou (ID 105634822) alegando inépcia da inicial e ilegitimidade passiva, sustentando não ter relação jurídica com a KIWI.COM. No mérito, negou qualquer responsabilidade pelos danos alegados. A COPA AIRLINES, em sua contestação (ID 105614621), defendeu a aplicação da Convenção de Montreal, a impossibilidade de inversão do ônus da prova e, no mérito, alegou culpa exclusiva do consumidor, argumentando que disponibiliza informações sobre requisitos de entrada nos países em seu site. Em réplica (ID 107027055), o autor reiterou a legitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC e a omissão das rés quanto ao dever de informação. Intimadas para manifestarem interesse na produção de provas, todas as partes requereram o julgamento antecipado da lide (IDs 135079117, 135488332 e 136740254). É o relatório. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO. a) Das preliminares. a.1) Da inépcia da inicial (art. 337, IV, do CPC). A General Atlantic Representações LTDA. suscitou preliminarmente a inépcia da inicial, sob o argumento de que não haveria causa de pedir a seu respeito na petição inicial. Não procede a alegação. A petição inicial narra com clareza os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, com especificação do valor da causa e qualificação das partes, atendendo aos requisitos do art. 319 do CPC. O autor identifica a General Atlantic como representante da KIWI.COM no Brasil, permitindo-lhe compreender as razões que motivaram sua inclusão no polo passivo e exercer plenamente sua defesa. Ademais, eventual ausência de vínculo entre as empresas não caracteriza inépcia da inicial, mas pode configurar ilegitimidade passiva, questão que será analisada a seguir. Rejeito, portanto, a preliminar de inépcia da inicial. a.2) Da ilegitimidade passiva da General Atlantic Representações LTDA (art. 337, XI, do CPC). A General Atlantic alega ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, argumentando que não possui qualquer relação jurídica com a KIWI.COM, não sendo sua acionista, representante ou integrante do mesmo grupo econômico. Analisando os documentos acostados aos autos, verifico que o autor não comprovou o alegado vínculo entre as empresas demandadas. Embora tenha apresentado em réplica print de notícia do site da ré sobre uma "parceria estratégica" com a KIWI.COM, tal documento não é suficiente para comprovar que a parte seria representante legal da KIWI.COM no Brasil ou que ambas integrariam o mesmo grupo econômico. A informação constante no referido print indica apenas um investimento realizado pela GENERAL ATLANTIC SERVICE COMPANY LLC, empresa estrangeira distinta da ré brasileira, na plataforma KIWI.COM. Não há comprovação de relação societária, controle ou administração comum que configure grupo econômico e enseje solidariedade solidária nos termos do art. 265 do Código Civil. Conforme os atos constitutivos apresentados pela GENERAL ATLANTIC (ID 105634559), suas únicas acionistas são as empresas General Atlantic Service Compay LP e General Atlantic Latan Holdings LLC, não havendo menção à KIWI.COM em sua estrutura societária. Ademais, o mero investimento financeiro de uma empresa em outra não é suficiente para caracterizar grupo econômico ou representação legal para fins de responsabilidade solidária por eventuais danos. A autonomia da personalidade jurídica deve ser preservada, nos termos do art. 49-A do Código Civil, salvo quando expressamente prevista a solidariedade ou em casos de abuso da personalidade jurídica, o que não foi demonstrado nos autos. A jurisprudência pátria, inclusive, tem reconhecido a ilegitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC em casos semelhantes, conforme os precedentes citados pela própria demandada (processos nº 1031359-16.2021.8.26.0001 do TJSP, nº 627215-76.2021.8.04.0001 do TJAM, entre outros). Portanto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da General Atlantic Representações LTDA., determinando sua exclusão do polo passivo da demanda. b) Do mérito. b.1) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor e da Convenção de Montreal e da inversão do ônus da prova. O caso em análise envolve relação de consumo, caracterizada nos termos dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o autor adquiriu passagens aéreas como destinatário final do serviço de transporte aéreo. A COPA AIRLINES, por sua vez, alega a aplicação da Convenção de Montreal (Decreto nº 5.910/2006) em detrimento do CDC, com base no julgamento do Tema 210 de Repercussão Geral pelo STF. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 636.331/RJ, fixou a tese de que: Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. O presente entendimento não se aplica às hipóteses de danos extrapatrimoniais. Ocorre que a prevalência da Convenção de Montreal diz respeito especificamente às hipóteses de limitação de responsabilidade nela previstas, como danos à bagagem, atrasos e acidentes, não afastando a aplicação do CDC nas demais situações, como é o caso dos autos, que trata de falha no dever de informação ao consumidor. Portanto, aplica-se ao caso o Código consumerista, sem prejuízo da observância da Convenção de Montreal naquilo que for pertinente. Com relação ao ônus probatório, o art. 6º, VIII, do CDC prevê como direito básico do consumidor: "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências". No caso em tela, considero presentes ambos os requisitos para a inversão do ônus da prova. As alegações do autor são verossímeis, pois demonstrou ter sido impedido de embarcar por não possuir o Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA, apesar de portar comprovante de vacinação contra febre amarela. Ademais, é evidente a hipossuficiência técnica do consumidor em relação à companhia aérea, que possui melhores condições de comprovar o cumprimento de seu dever de informação. Cumpre ressaltar que a inversão do ônus da prova não dispensa o autor de comprovar minimamente os fatos constitutivos de seu direito, o que foi atendido no presente caso com a juntada dos documentos que comprovam a compra das passagens, o impedimento de embarque e os prejuízos sofridos. Logo, é de se manter a inversão, em favor do autor, já mencionada na Decisão de ID 89746788. b.2) Do dever de informação e da responsabilidade da companhia aérea. A questão central da lide consiste em verificar se houve falha no dever de informação por parte da companhia aérea quanto à necessidade de Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela emitido pela ANVISA para ingresso nos países de conexão. O art. 6º, III, do CDC estabelece: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; O art. 14 do mesmo diploma legal dispõe que "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos". Analisando os autos, verifico que a COPA AIRLINES alega disponibilizar em seu site informações sobre a necessidade de vacinação contra febre amarela, bem como ferramenta de consulta de requisitos imigratórios. Contudo, não comprovou ter informado de maneira clara, específica e ostensiva ao autor, no momento da compra ou posteriormente, sobre a necessidade específica do Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA, e não apenas de um comprovante comum de vacinação. É importante ressaltar que a Resolução nº 400/2016 da ANAC estabelece que: Art. 18. Para a execução do contrato de transporte, o passageiro deverá atender aos seguintes requisitos: (...) II - atender a todas as exigências relativas à execução do transporte, tais como a obtenção do visto correto de entrada, permanência, trânsito e certificados de vacinação exigidos pela legislação dos países de destino, escala e conexão; É de ressaltar, no entanto, que esse dever do passageiro não exime a companhia aérea de prestar informações claras e adequadas sobre tais exigências. A exigência do Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela por países como República Dominicana e Panamá é uma informação técnica e específica, que não se confunde com o mero conhecimento sobre a necessidade de vacinação. O autor demonstrou ter tomado a vacina e portava comprovante, mas desconhecia a necessidade de obter o documento específico emitido pela ANVISA. Considero, portanto, que houve falha no dever de informação por parte da companhia aérea, que não comprovou ter prestado ao autor informações claras e adequadas sobre a necessidade do Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA. b.3) Dos danos materiais. Quanto ao ponto, o autor pleiteia indenização por danos materiais no valor de R$ 34.562,43, referente a (i) passagens aéreas: R$ 7.219,78, (ii) reserva de acomodação em Pointe-à-Pitre: 517,00 euros (equivalente a R$ 2.817,65) e (iii) bolsa-salário do programa acadêmico: 4.500,00 euros (equivalente a R$ 24.525,00) Quanto às passagens aéreas e reserva de acomodação, trata-se de despesas comprovadamente realizadas pelo autor e perdidas em razão do impedimento de embarque, configurando danos emergentes, cuja reparação é devida. No tocante à bolsa-salário do programa acadêmico, embora o autor tenha juntado documentos que comprovam o convite para participar do programa Professor Visitante (conforme convenção de acolhimento apresentada), não restou suficientemente demonstrado nos autos informações detalhadas e regulamentação sobre a bolsa pleiteada, bem como os critérios para recebimento do valor apontado. Não está claro se o mero fato de apenas participar do evento garantiria ao autor o recebimento do valor integral de 4.500,00 euros, ou se haveria critérios adicionais ou condicionantes para sua concessão. A convenção de acolhimento juntada aos autos, embora confirme o convite para o programa, não especifica os termos e condições para o pagamento da bolsa-salário. Na troca de mensagens entre o autor e a responsável pelo projeto, há menção a um salário entre 4.000 e 4.500 euros, mas não há documentação oficial que comprove o direito líquido e certo ao recebimento desse valor, nem sua regulamentação institucional. Portanto, reconheço o direito à indenização pelos danos materiais referentes às passagens aéreas e à reserva de acomodação, totalizando R$ 10.037,43, mas julgo improcedente o pedido referente à bolsa-salário, por insuficiência de provas quanto aos critérios de concessão e recebimento do valor pleiteado. b.4) Dos danos morais. O autor alega ter sofrido danos morais em razão do impedimento de embarque, do tratamento desrespeitoso e discriminatório recebido no aeroporto, da impossibilidade de participar do programa acadêmico e do abalo à sua imagem profissional perante a instituição que o convidou. O dano moral configura-se pela ofensa aos direitos da personalidade, causando sofrimento, constrangimento ou abalo psicológico que extrapola o mero dissabor cotidiano. No caso em análise, considero que o impedimento de embarque por falha no dever de informação da companhia aérea, somado à frustração de não poder participar de um programa acadêmico internacional para o qual foi especialmente convidado, bem como ao tratamento discriminatório alegado pelo autor, configura dano moral indenizável. Quanto ao valor da indenização, considerando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a gravidade do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida, entendo adequado fixar a indenização por danos morais em R$ 4.000,00 (quatro mil reais). III - DISPOSITIVO. Ante o exposto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC REPRESENTAÇÕES LTDA, julgando extinto o processo sem resolução do mérito em relação a ela, nos termos do art. 485, VI, do CPC. Outrossim, julgo procedentes em parte os pedidos formulados na inicial, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a Compania Panamena de Aviacion S/A (COPA AIRLINES) ao pagamento de (i) indenização por danos materiais no valor de R$ 10.037,43 (dez mil, trinta e sete reais e quarenta e três centavos), referentes às passagens aéreas e reserva de acomodação, corrigidos monetariamente pelo INPC desde o desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação e (ii) de indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de juros de mora de 1%,desde a citação, e correção monetária pelo INPC a partir do presente arbitramento (Súmula n. 362 do STJ). Por fim, julgo improcedente, também nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, o pedido de indenização por danos materiais referente à bolsa-salário do programa acadêmico, por insuficiência de provas. A partir da vigência do art. 2º da Lei nº 14.905/24, em 29 de agosto de 2024, a correção monetária será pelo IPCA-E (art. 389, parágrafo único, do Código Civil) e os juros de mora serão pela taxa legal (art. 406, do Código Civil), que corresponderá à diferença entre a taxa SELIC e o IPCA, calculada mensalmente pelo Banco Central do Brasil, conforme Resolução CNM nº 5.171/2024, consignando-se que, caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência (art. 406, §3º, do Código Civil). O interessado deverá, preferencialmente, se valer da aplicação interativa fornecida pelo Bando Central do Brasil, de acesso público, cuja determinação de criação conta do art. 4º da lei já citada, para proceder os cálculos correspondentes à incidência destes índices. Custas e honorários advocatícios isentos, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Após o trânsito em julgado, proceda-se a baixa na distribuição e arquivem-se os autos. Russas, data da assinatura digital. PAULO HENRIQUE LIMA SOARES Juiz de Direito Titular

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Processo nº 3000652-95.2024.8.06.0158

ID: 314610261

Tribunal: TJCE Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Russas Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 3000652-95.2024.8.06.0158

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

CARLOS HENRIQUE DA ROCHA CRUZ

Polo Passivo:

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

CARLOS HENRIQUE DA ROCHA CRUZ

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

COMARCA DE RUSSAS GABINETE DO JUIZ DA 1ª VARA CÍVEL Processo Nº: 3000652-95.2024.8.06.0158 Classe Processual: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Assunto(s): [Indenização por Dano Moral, … COMARCA DE RUSSAS GABINETE DO JUIZ DA 1ª VARA CÍVEL Processo Nº: 3000652-95.2024.8.06.0158 Classe Processual: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Assunto(s): [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Cancelamento de vôo] AUTOR: GASTAO SILVES FERREIRA FREDERICO REU: GENERAL ATLANTIC REPRESENTACOES LTDA. e outros SENTENÇA Vistos. I - RELATÓRIO. Apesar de dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº 9.099/95, faço-o de maneira sucinta para melhor compreensão dos fatos. Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por GASTÃO SILVES FERREIRA FREDERICO contra KIWI.COM (representada no Brasil pela GENERAL ATLANTIC REPRESENTAÇÕES LTDA) e COMPANIA PANAMENA DE AVIACION S/A (COPA AIRLINES), todos qualificados nos autos. Em síntese, o autor aduz que foi convidado pela Universidade Federal de Pointe-à-Pitre, no Caribe, para participar do programa Professor Visitante em maio de 2024. Para isso, adquiriu passagens aéreas pela Kiwi.com, com bilhetes da Copa Airlines, saindo de São Paulo com conexões no Panamá e República Dominicana, além de reservar hospedagem no destino, totalizando investimento de aproximadamente R$ 10.000,00. Alega que, ao tentar embarcar em 03/05/2024, foi impedido por não portar o Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela emitido pela ANVISA, tendo apenas um comprovante vacinal de Cabo Verde, datado de 1983. Sustenta que tal exigência específica nunca lhe foi informada pelas rés e que foi tratado de forma discriminatória pelo funcionário da companhia aérea. Em razão disso, perdeu não apenas os valores gastos com passagens e hospedagem, mas também a bolsa-salário do programa, avaliada em 4.500,00 euros. Pleiteia indenização por danos materiais de R$ 34.562,43 e danos morais de R$ 10.000,00. A GENERAL ATLANTIC contestou (ID 105634822) alegando inépcia da inicial e ilegitimidade passiva, sustentando não ter relação jurídica com a KIWI.COM. No mérito, negou qualquer responsabilidade pelos danos alegados. A COPA AIRLINES, em sua contestação (ID 105614621), defendeu a aplicação da Convenção de Montreal, a impossibilidade de inversão do ônus da prova e, no mérito, alegou culpa exclusiva do consumidor, argumentando que disponibiliza informações sobre requisitos de entrada nos países em seu site. Em réplica (ID 107027055), o autor reiterou a legitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC e a omissão das rés quanto ao dever de informação. Intimadas para manifestarem interesse na produção de provas, todas as partes requereram o julgamento antecipado da lide (IDs 135079117, 135488332 e 136740254). É o relatório. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO. a) Das preliminares. a.1) Da inépcia da inicial (art. 337, IV, do CPC). A General Atlantic Representações LTDA. suscitou preliminarmente a inépcia da inicial, sob o argumento de que não haveria causa de pedir a seu respeito na petição inicial. Não procede a alegação. A petição inicial narra com clareza os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, com especificação do valor da causa e qualificação das partes, atendendo aos requisitos do art. 319 do CPC. O autor identifica a General Atlantic como representante da KIWI.COM no Brasil, permitindo-lhe compreender as razões que motivaram sua inclusão no polo passivo e exercer plenamente sua defesa. Ademais, eventual ausência de vínculo entre as empresas não caracteriza inépcia da inicial, mas pode configurar ilegitimidade passiva, questão que será analisada a seguir. Rejeito, portanto, a preliminar de inépcia da inicial. a.2) Da ilegitimidade passiva da General Atlantic Representações LTDA (art. 337, XI, do CPC). A General Atlantic alega ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, argumentando que não possui qualquer relação jurídica com a KIWI.COM, não sendo sua acionista, representante ou integrante do mesmo grupo econômico. Analisando os documentos acostados aos autos, verifico que o autor não comprovou o alegado vínculo entre as empresas demandadas. Embora tenha apresentado em réplica print de notícia do site da ré sobre uma "parceria estratégica" com a KIWI.COM, tal documento não é suficiente para comprovar que a parte seria representante legal da KIWI.COM no Brasil ou que ambas integrariam o mesmo grupo econômico. A informação constante no referido print indica apenas um investimento realizado pela GENERAL ATLANTIC SERVICE COMPANY LLC, empresa estrangeira distinta da ré brasileira, na plataforma KIWI.COM. Não há comprovação de relação societária, controle ou administração comum que configure grupo econômico e enseje solidariedade solidária nos termos do art. 265 do Código Civil. Conforme os atos constitutivos apresentados pela GENERAL ATLANTIC (ID 105634559), suas únicas acionistas são as empresas General Atlantic Service Compay LP e General Atlantic Latan Holdings LLC, não havendo menção à KIWI.COM em sua estrutura societária. Ademais, o mero investimento financeiro de uma empresa em outra não é suficiente para caracterizar grupo econômico ou representação legal para fins de responsabilidade solidária por eventuais danos. A autonomia da personalidade jurídica deve ser preservada, nos termos do art. 49-A do Código Civil, salvo quando expressamente prevista a solidariedade ou em casos de abuso da personalidade jurídica, o que não foi demonstrado nos autos. A jurisprudência pátria, inclusive, tem reconhecido a ilegitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC em casos semelhantes, conforme os precedentes citados pela própria demandada (processos nº 1031359-16.2021.8.26.0001 do TJSP, nº 627215-76.2021.8.04.0001 do TJAM, entre outros). Portanto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da General Atlantic Representações LTDA., determinando sua exclusão do polo passivo da demanda. b) Do mérito. b.1) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor e da Convenção de Montreal e da inversão do ônus da prova. O caso em análise envolve relação de consumo, caracterizada nos termos dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o autor adquiriu passagens aéreas como destinatário final do serviço de transporte aéreo. A COPA AIRLINES, por sua vez, alega a aplicação da Convenção de Montreal (Decreto nº 5.910/2006) em detrimento do CDC, com base no julgamento do Tema 210 de Repercussão Geral pelo STF. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 636.331/RJ, fixou a tese de que: Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor. O presente entendimento não se aplica às hipóteses de danos extrapatrimoniais. Ocorre que a prevalência da Convenção de Montreal diz respeito especificamente às hipóteses de limitação de responsabilidade nela previstas, como danos à bagagem, atrasos e acidentes, não afastando a aplicação do CDC nas demais situações, como é o caso dos autos, que trata de falha no dever de informação ao consumidor. Portanto, aplica-se ao caso o Código consumerista, sem prejuízo da observância da Convenção de Montreal naquilo que for pertinente. Com relação ao ônus probatório, o art. 6º, VIII, do CDC prevê como direito básico do consumidor: "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências". No caso em tela, considero presentes ambos os requisitos para a inversão do ônus da prova. As alegações do autor são verossímeis, pois demonstrou ter sido impedido de embarcar por não possuir o Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA, apesar de portar comprovante de vacinação contra febre amarela. Ademais, é evidente a hipossuficiência técnica do consumidor em relação à companhia aérea, que possui melhores condições de comprovar o cumprimento de seu dever de informação. Cumpre ressaltar que a inversão do ônus da prova não dispensa o autor de comprovar minimamente os fatos constitutivos de seu direito, o que foi atendido no presente caso com a juntada dos documentos que comprovam a compra das passagens, o impedimento de embarque e os prejuízos sofridos. Logo, é de se manter a inversão, em favor do autor, já mencionada na Decisão de ID 89746788. b.2) Do dever de informação e da responsabilidade da companhia aérea. A questão central da lide consiste em verificar se houve falha no dever de informação por parte da companhia aérea quanto à necessidade de Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela emitido pela ANVISA para ingresso nos países de conexão. O art. 6º, III, do CDC estabelece: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; O art. 14 do mesmo diploma legal dispõe que "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos". Analisando os autos, verifico que a COPA AIRLINES alega disponibilizar em seu site informações sobre a necessidade de vacinação contra febre amarela, bem como ferramenta de consulta de requisitos imigratórios. Contudo, não comprovou ter informado de maneira clara, específica e ostensiva ao autor, no momento da compra ou posteriormente, sobre a necessidade específica do Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA, e não apenas de um comprovante comum de vacinação. É importante ressaltar que a Resolução nº 400/2016 da ANAC estabelece que: Art. 18. Para a execução do contrato de transporte, o passageiro deverá atender aos seguintes requisitos: (...) II - atender a todas as exigências relativas à execução do transporte, tais como a obtenção do visto correto de entrada, permanência, trânsito e certificados de vacinação exigidos pela legislação dos países de destino, escala e conexão; É de ressaltar, no entanto, que esse dever do passageiro não exime a companhia aérea de prestar informações claras e adequadas sobre tais exigências. A exigência do Certificado Internacional de Vacinação contra febre amarela por países como República Dominicana e Panamá é uma informação técnica e específica, que não se confunde com o mero conhecimento sobre a necessidade de vacinação. O autor demonstrou ter tomado a vacina e portava comprovante, mas desconhecia a necessidade de obter o documento específico emitido pela ANVISA. Considero, portanto, que houve falha no dever de informação por parte da companhia aérea, que não comprovou ter prestado ao autor informações claras e adequadas sobre a necessidade do Certificado Internacional de Vacinação emitido pela ANVISA. b.3) Dos danos materiais. Quanto ao ponto, o autor pleiteia indenização por danos materiais no valor de R$ 34.562,43, referente a (i) passagens aéreas: R$ 7.219,78, (ii) reserva de acomodação em Pointe-à-Pitre: 517,00 euros (equivalente a R$ 2.817,65) e (iii) bolsa-salário do programa acadêmico: 4.500,00 euros (equivalente a R$ 24.525,00) Quanto às passagens aéreas e reserva de acomodação, trata-se de despesas comprovadamente realizadas pelo autor e perdidas em razão do impedimento de embarque, configurando danos emergentes, cuja reparação é devida. No tocante à bolsa-salário do programa acadêmico, embora o autor tenha juntado documentos que comprovam o convite para participar do programa Professor Visitante (conforme convenção de acolhimento apresentada), não restou suficientemente demonstrado nos autos informações detalhadas e regulamentação sobre a bolsa pleiteada, bem como os critérios para recebimento do valor apontado. Não está claro se o mero fato de apenas participar do evento garantiria ao autor o recebimento do valor integral de 4.500,00 euros, ou se haveria critérios adicionais ou condicionantes para sua concessão. A convenção de acolhimento juntada aos autos, embora confirme o convite para o programa, não especifica os termos e condições para o pagamento da bolsa-salário. Na troca de mensagens entre o autor e a responsável pelo projeto, há menção a um salário entre 4.000 e 4.500 euros, mas não há documentação oficial que comprove o direito líquido e certo ao recebimento desse valor, nem sua regulamentação institucional. Portanto, reconheço o direito à indenização pelos danos materiais referentes às passagens aéreas e à reserva de acomodação, totalizando R$ 10.037,43, mas julgo improcedente o pedido referente à bolsa-salário, por insuficiência de provas quanto aos critérios de concessão e recebimento do valor pleiteado. b.4) Dos danos morais. O autor alega ter sofrido danos morais em razão do impedimento de embarque, do tratamento desrespeitoso e discriminatório recebido no aeroporto, da impossibilidade de participar do programa acadêmico e do abalo à sua imagem profissional perante a instituição que o convidou. O dano moral configura-se pela ofensa aos direitos da personalidade, causando sofrimento, constrangimento ou abalo psicológico que extrapola o mero dissabor cotidiano. No caso em análise, considero que o impedimento de embarque por falha no dever de informação da companhia aérea, somado à frustração de não poder participar de um programa acadêmico internacional para o qual foi especialmente convidado, bem como ao tratamento discriminatório alegado pelo autor, configura dano moral indenizável. Quanto ao valor da indenização, considerando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a gravidade do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida, entendo adequado fixar a indenização por danos morais em R$ 4.000,00 (quatro mil reais). III - DISPOSITIVO. Ante o exposto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da GENERAL ATLANTIC REPRESENTAÇÕES LTDA, julgando extinto o processo sem resolução do mérito em relação a ela, nos termos do art. 485, VI, do CPC. Outrossim, julgo procedentes em parte os pedidos formulados na inicial, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a Compania Panamena de Aviacion S/A (COPA AIRLINES) ao pagamento de (i) indenização por danos materiais no valor de R$ 10.037,43 (dez mil, trinta e sete reais e quarenta e três centavos), referentes às passagens aéreas e reserva de acomodação, corrigidos monetariamente pelo INPC desde o desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação e (ii) de indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de juros de mora de 1%,desde a citação, e correção monetária pelo INPC a partir do presente arbitramento (Súmula n. 362 do STJ). Por fim, julgo improcedente, também nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, o pedido de indenização por danos materiais referente à bolsa-salário do programa acadêmico, por insuficiência de provas. A partir da vigência do art. 2º da Lei nº 14.905/24, em 29 de agosto de 2024, a correção monetária será pelo IPCA-E (art. 389, parágrafo único, do Código Civil) e os juros de mora serão pela taxa legal (art. 406, do Código Civil), que corresponderá à diferença entre a taxa SELIC e o IPCA, calculada mensalmente pelo Banco Central do Brasil, conforme Resolução CNM nº 5.171/2024, consignando-se que, caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência (art. 406, §3º, do Código Civil). O interessado deverá, preferencialmente, se valer da aplicação interativa fornecida pelo Bando Central do Brasil, de acesso público, cuja determinação de criação conta do art. 4º da lei já citada, para proceder os cálculos correspondentes à incidência destes índices. Custas e honorários advocatícios isentos, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Após o trânsito em julgado, proceda-se a baixa na distribuição e arquivem-se os autos. Russas, data da assinatura digital. PAULO HENRIQUE LIMA SOARES Juiz de Direito Titular

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Resultados para o tribunal: TJCE

Resultados para "1036500-16.2021.8.26.0001"

Processo nº 3000652-95.2024.8.06.0158

Processo nº 3000652-95.2024.8.06.0158

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